Processo nº 5026293-47.2024.8.08.0012
ID: 261321299
Tribunal: TJES
Órgão: Cariacica - Comarca da Capital - 2º Juizado Especial Criminal e Fazenda Pública
Classe: Procedimento do Juizado Especial da Fazenda Pública
Nº Processo: 5026293-47.2024.8.08.0012
Data de Disponibilização:
28/04/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
FRANCISCO MACHADO NASCIMENTO
OAB/ES XXXXXX
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ESTADO DO ESPÍRITO SANTO PODER JUDICIÁRIO Juízo de Cariacica - Comarca da Capital - 2º Juizado Especial Criminal e Fazenda Pública Rua São João Batista, 1000, Fórum Doutor Américo Ribeiro Coelho, Alt…
ESTADO DO ESPÍRITO SANTO PODER JUDICIÁRIO Juízo de Cariacica - Comarca da Capital - 2º Juizado Especial Criminal e Fazenda Pública Rua São João Batista, 1000, Fórum Doutor Américo Ribeiro Coelho, Alto Laje, CARIACICA - ES - CEP: 29151-230 Telefone:(27) 32465537 PROCESSO Nº 5026293-47.2024.8.08.0012 PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL DA FAZENDA PÚBLICA (14695) REQUERENTE: WANDER TEIXEIRA REQUERIDO: MUNICIPIO DE CARIACICA Advogado do(a) REQUERENTE: FRANCISCO MACHADO NASCIMENTO - ES13010 PROJETO DE SENTENÇA Vistos, etc. Trata-se de Ação proposto(a) por WANDER TEIXEIRA, parte(s) devidamente qualificada(s), em face de(o) MUNICIPIO DE CARIACICA, onde se pretende, em síntese, a condenação do ente público ao adimplemento de indenização, a título de danos morais. A parte autora sustentou, em suma, que: [i] “[…] no dia 18/08/2024, o Requerente se dirigiu ao PA de Alto Lage e foi consultado pelo médico Dr. Leodir Dessabato Coelho CRM-ES 21016 a fim de se consultar e buscar receituário para remédios de Parkinson [...]”; [ii] na oportunidade informou acerca de outro problema de saúde [iii] o médico lhe receitou diversos remédios, os quais posteriormente lhe fizeram mal; [iv] retornou ao pronto atendimento e descobriu que o profissional havia efetivado diagnóstico equivocado, tendo feito uso das medicações sem necessidade; o fato lhe gerou danos de cunho extrapatrimonial; [v] e que [vi] por tais motivos, maneja a presente ação. Contestação apresentada pelo MUNICIPIO DE CARIACICA, onde se arguiu, em síntese, que: [i] é parte ilegítima para figurar no polo passivo da lide; [ii] “[…] pretensão indenizatória ora impugnada não possui fundamentos jurídicos bastantes nem sustentação probatória, sobretudo porque os profissionais de saúde responsáveis pelos atendimentos do autor no “PA do Trevo” NÃO praticaram quaisquer ilícitos que pudessem ensejar a reparação civil postulada em face do Município requerido [...]”; [iii] por conseguinte, a pretensão autoral deve ser julgada improcedente. Devidamente intimada para tanto, a parte autora apresentou réplica/resposta à contestação. É o breve relato, apesar de dispensado, na forma do art. 38, in fine, da Lei nº 9.099/95. O feito reúne condições para julgamento de pronto, nos termos dos arts. 354 e 355, do Código de Processo Civil (Lei nº. 13.105/2015). Passo a decidir. No que se refere à arguição preliminar defensiva de ilegitimidade passiva, tenho que a referida tese merece prosperar e que o presente feito deve ser extinto, sem resolução do mérito, nos termos do art. 485, inciso VI, do Código de Processo Civil (Lei nº. 13.105/2015). Consoante assinalado pela parte autora, a hipótese fática sob comento ocorreu no PRONTO ATENDIMENTO MONSENHOR RÔMULO NEVES BALESTREIRO (P.A. DO TREVO DE ALTO LAGE). Ocorre, como bem frisado pelo ente público municipal, que o referido local se encontra submetido a contrato de gestão e aos aditivos posteriores, firmados entre o Município e o IESP, pessoa jurídica de direito privado, qualificada como organização social, tendo por objeto o gerenciamento, a operacionalização, a administração e a execução, pelo contratado, das atividades e serviços de saúde no apontado nosocômio. Ao discorrer sobre a referida temática – contratos de gestão, a Lei nº. 9.637/1998, que dispõe sobre a “qualificação de entidades como organizações sociais, a criação do Programa Nacional de Publicização, a extinção dos órgãos e entidades que menciona e a absorção de suas atividades por organizações sociais”, apresenta esclarecimentos relevantes acerca: [i] da sistemática de qualificação como organizações sociais das pessoas jurídicas de direito privado; e [ii] do contrato de gestão, senão vejamos: Art. 1o O Poder Executivo poderá qualificar como organizações sociais pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, cujas atividades sejam dirigidas ao ensino, à pesquisa científica, ao desenvolvimento tecnológico, à proteção e preservação do meio ambiente, à cultura e à saúde, atendidos aos requisitos previstos nesta Lei. Art. 5o Para os efeitos desta Lei, entende-se por contrato de gestão o instrumento firmado entre o Poder Público e a entidade qualificada como organização social, com vistas à formação de parceria entre as partes para fomento e execução de atividades relativas às áreas relacionadas no art. 1o. Art. 6o O contrato de gestão, elaborado de comum acordo entre o órgão ou entidade supervisora e a organização social, discriminará as atribuições, responsabilidades e obrigações do Poder Público e da organização social. (…) Art. 8o A execução do contrato de gestão celebrado por organização social será fiscalizada pelo órgão ou entidade supervisora da área de atuação correspondente à atividade fomentada. (…) Conquanto não se desconheça a divergência doutrinária e jurisprudencial acerca do regime jurídico a que se submetem as organizações sociais no exercício de contrato de gestão (público, privado ou híbrido), a natureza jurídica do serviço prestado (se público ou de relevância pública), e a responsabilidade do ente e do particular pelos eventuais danos resultantes da atuação da organização, em respeito aos princípios da segurança jurídica e da estabilização das decisões, reforçados pelo CPC/2015, à luz do entendimento fixado pelo P. Supremo Tribunal Federal nos autos da ADI nº. 1.923/DF compactuo da conclusão de que a Administração Pública pode ser responsabilizada, subsidiariamente, pelos danos causados a terceiros no contrato de gestão pela organização social, quando comprovada a omissão no seu dever de fiscalizar, desde que esta (omissão) tenha concorrido diretamente para o evento danoso. Na ADI nº. 1.923/DF, assim dispôs o P. STF: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. TERCEIRO SETOR. MARCO LEGAL DAS ORGANIZAÇÕES SOCIAIS. LEI Nº 9.637/98 E NOVA REDAÇÃO, CONFERIDA PELA LEI Nº 9.648/98, AO ART. 24, XXIV, DA LEI Nº 8.666/93. MOLDURA CONSTITUCIONAL DA INTERVENÇÃO DO ESTADO NO DOMÍNIO ECONÔMICO E SOCIAL. SERVIÇOS PÚBLICOS SOCIAIS. SAÚDE (ART. 199, CAPUT), EDUCAÇÃO (ART. 209, CAPUT), CULTURA (ART. 215), DESPORTO E LAZER (ART. 217), CIÊNCIA E TECNOLOGIA (ART. 218) E MEIO AMBIENTE (ART. 225). ATIVIDADES CUJA TITULARIDADE É COMPARTILHADA ENTRE O PODER PÚBLICO E A SOCIEDADE. DISCIPLINA DE INSTRUMENTO DE COLABORAÇÃO PÚBLICO-PRIVADA. INTERVENÇÃO INDIRETA. ATIVIDADE DE FOMENTO PÚBLICO. INEXISTÊNCIA DE RENÚNCIA AOS DEVERES ESTATAIS DE AGIR. MARGEM DE CONFORMAÇÃO CONSTITUCIONALMENTE ATRIBUÍDA AOS AGENTES POLÍTICOS DEMOCRATICAMENTE ELEITOS. PRINCÍPIOS DA CONSENSUALIDADE E DA PARTICIPAÇÃO. INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO ART. 175, CAPUT, DA CONSTITUIÇÃO. EXTINÇÃO PONTUAL DE ENTIDADES PÚBLICAS QUE APENAS CONCRETIZA O NOVO MODELO. INDIFERENÇA DO FATOR TEMPORAL. INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO DEVER CONSTITUCIONAL DE LICITAÇÃO (CF, ART. 37, XXI). PROCEDIMENTO DE QUALIFICAÇÃO QUE CONFIGURA HIPÓTESE DE CREDENCIAMENTO. COMPETÊNCIA DISCRICIONÁRIA QUE DEVE SER SUBMETIDA AOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA PUBLICIDADE, MORALIDADE, EFICIÊNCIA E IMPESSOALIDADE, À LUZ DE CRITÉRIOS OBJETIVOS (CF, ART. 37, CAPUT). INEXISTÊNCIA DE PERMISSIVO À ARBITRARIEDADE. CONTRATO DE GESTÃO. NATUREZA DE CONVÊNIO. CELEBRAÇÃO NECESSARIAMENTE SUBMETIDA A PROCEDIMENTO OBJETIVO E IMPESSOAL. CONSTITUCIONALIDADE DA DISPENSA DE LICITAÇÃO INSTITUÍDA PELA NOVA REDAÇÃO DO ART. 24, XXIV, DA LEI DE LICITAÇÕES E PELO ART. 12, §3º, DA LEI Nº 9.637/98. FUNÇÃO REGULATÓRIA DA LICITAÇÃO. OBSERVÂNCIA DOS PRINCÍPIOS DA IMPESSOALIDADE, DA PUBLICIDADE, DA EFICIÊNCIA E DA MOTIVAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE DE EXIGÊNCIA DE LICITAÇÃO PARA OS CONTRATOS CELEBRADOS PELAS ORGANIZAÇÕES SOCIAIS COM TERCEIROS. OBSERVÂNCIA DO NÚCLEO ESSENCIAL DOS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA (CF, ART. 37, CAPUT). REGULAMENTO PRÓPRIO PARA CONTRATAÇÕES. INEXISTÊNCIA DE DEVER DE REALIZAÇÃO DE CONCURSO PÚBLICO PARA CONTRATAÇÃO DE EMPREGADOS. INCIDÊNCIA DO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA IMPESSOALIDADE, ATRAVÉS DE PROCEDIMENTO OBJETIVO. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO AOS DIREITOS CONSTITUCIONAIS DOS SERVIDORES PÚBLICOS CEDIDOS. PRESERVAÇÃO DO REGIME REMUNERATÓRIO DA ORIGEM. AUSÊNCIA DE SUBMISSÃO AO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE PARA O PAGAMENTO DE VERBAS, POR ENTIDADE PRIVADA, A SERVIDORES. INTERPRETAÇÃO DOS ARTS. 37, X, E 169, §1º, DA CONSTITUIÇÃO. CONTROLES PELO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO E PELO MINISTÉRIO PÚBLICO. PRESERVAÇÃO DO ÂMBITO CONSTITUCIONALMENTE DEFINIDO PARA O EXERCÍCIO DO CONTROLE EXTERNO (CF, ARTS. 70, 71, 74 E 127 E SEGUINTES). INTERFERÊNCIA ESTATAL EM ASSOCIAÇÕES E FUNDAÇÕES PRIVADAS (CF, ART. 5º, XVII E XVIII). CONDICIONAMENTO À ADESÃO VOLUNTÁRIA DA ENTIDADE PRIVADA. INEXISTÊNCIA DE OFENSA À CONSTITUIÇÃO. AÇÃO DIRETA JULGADA PARCIALMENTE PROCEDENTE PARA CONFERIR INTERPRETAÇÃO CONFORME AOS DIPLOMAS IMPUGNADOS. 1. A atuação da Corte Constitucional não pode traduzir forma de engessamento e de cristalização de um determinado modelo préconcebido de Estado, impedindo que, nos limites constitucionalmente assegurados, as maiorias políticas prevalecentes no jogo democrático pluralista possam pôr em prática seus projetos de governo, moldando o perfil e o instrumental do poder público conforme a vontade coletiva. 2. Os setores de saúde (CF, art. 199, caput), educação (CF, art. 209, caput), cultura (CF, art. 215), desporto e lazer (CF, art. 217), ciência e tecnologia (CF, art. 218) e meio ambiente (CF, art. 225) configuram serviços públicos sociais, em relação aos quais a Constituição, ao mencionar que “são deveres do Estado e da Sociedade” e que são “livres à iniciativa privada”, permite a atuação, por direito próprio, dos particulares, sem que para tanto seja necessária a delegação pelo poder público, de forma que não incide, in casu, o art. 175, caput, da Constituição. 3. A atuação do poder público no domínio econômico e social pode ser viabilizada por intervenção direta ou indireta, disponibilizando utilidades materiais aos beneficiários, no primeiro caso, ou fazendo uso, no segundo caso, de seu instrumental jurídico para induzir que os particulares executem atividades de interesses públicos através da regulação, com coercitividade, ou através do fomento, pelo uso de incentivos e estímulos a comportamentos voluntários. 4. Em qualquer caso, o cumprimento efetivo dos deveres constitucionais de atuação estará, invariavelmente, submetido ao que a doutrina contemporânea denomina de controle da Administração Pública sob o ângulo do resultado (Diogo de Figueiredo Moreira Neto). 5. O marco legal das Organizações Sociais inclina-se para a atividade de fomento público no domínio dos serviços sociais, entendida tal atividade como a disciplina não coercitiva da conduta dos particulares, cujo desempenho em atividades de interesse público é estimulado por sanções premiais, em observância aos princípios da consensualidade e da participação na Administração Pública. 6. A finalidade de fomento, in casu, é posta em prática pela cessão de recursos, bens e pessoal da Administração Pública para as entidades privadas, após a celebração de contrato de gestão, o que viabilizará o direcionamento, pelo Poder Público, da atuação do particular em consonância com o interesse público, através da inserção de metas e de resultados a serem alcançados, sem que isso configure qualquer forma de renúncia aos deveres constitucionais de atuação. 7. Na essência, preside a execução deste programa de ação institucional a lógica que prevaleceu no jogo democrático, de que a atuação privada pode ser mais eficiente do que a pública em determinados domínios, dada a agilidade e a flexibilidade que marcam o regime de direito privado. 8. Os arts. 18 a 22 da Lei nº 9.637/98 apenas concentram a decisão política, que poderia ser validamente feita no futuro, de afastar a atuação de entidades públicas através da intervenção direta para privilegiar a escolha pela busca dos mesmos fins através da indução e do fomento de atores privados, razão pela qual a extinção das entidades mencionadas nos dispositivos não afronta a Constituição, dada a irrelevância do fator tempo na opção pelo modelo de fomento – se simultaneamente ou após a edição da Lei. 9. O procedimento de qualificação de entidades, na sistemática da Lei, consiste em etapa inicial e embrionária, pelo deferimento do título jurídico de “organização social”, para que Poder Público e particular colaborem na realização de um interesse comum, não se fazendo presente a contraposição de interesses, com feição comutativa e com intuito lucrativo, que consiste no núcleo conceitual da figura do contrato administrativo, o que torna inaplicável o dever constitucional de licitar (CF, art. 37, XXI). 10. A atribuição de título jurídico de legitimação da entidade através da qualificação configura hipótese de credenciamento, no qual não incide a licitação pela própria natureza jurídica do ato, que não é contrato, e pela inexistência de qualquer competição, já que todos os interessados podem alcançar o mesmo objetivo, de modo includente, e não excludente. 11. A previsão de competência discricionária no art. 2º, II, da Lei nº 9.637/98 no que pertine à qualificação tem de ser interpretada sob o influxo da principiologia constitucional, em especial dos princípios da impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência (CF, art. 37, caput). É de se ter por vedada, assim, qualquer forma de arbitrariedade, de modo que o indeferimento do requerimento de qualificação, além de pautado pela publicidade, transparência e motivação, deve observar critérios objetivos fixados em ato regulamentar expedido em obediência ao art. 20 da Lei nº 9.637/98, concretizando de forma homogênea as diretrizes contidas nos inc. I a III do dispositivo. 12. A figura do contrato de gestão configura hipótese de convênio, por consubstanciar a conjugação de esforços com plena harmonia entre as posições subjetivas, que buscam um negócio verdadeiramente associativo, e não comutativo, para o atingimento de um objetivo comum aos interessados: a realização de serviços de saúde, educação, cultura, desporto e lazer, meio ambiente e ciência e tecnologia, razão pela qual se encontram fora do âmbito de incidência do art. 37, XXI, da CF. 13. Diante, porém, de um cenário de escassez de bens, recursos e servidores públicos, no qual o contrato de gestão firmado com uma entidade privada termina por excluir, por consequência, a mesma pretensão veiculada pelos demais particulares em idêntica situação, todos almejando a posição subjetiva de parceiro privado, impõe-se que o Poder Público conduza a celebração do contrato de gestão por um procedimento público impessoal e pautado por critérios objetivos, por força da incidência direta dos princípios constitucionais da impessoalidade, da publicidade e da eficiência na Administração Pública (CF, art. 37, caput). 14. As dispensas de licitação instituídas no art. 24, XXIV, da Lei nº 8.666/93 e no art. 12, §3º, da Lei nº 9.637/98 têm a finalidade que a doutrina contemporânea denomina de função regulatória da licitação, através da qual a licitação passa a ser também vista como mecanismo de indução de determinadas práticas sociais benéficas, fomentando a atuação de organizações sociais que já ostentem, à época da contratação, o título de qualificação, e que por isso sejam reconhecidamente colaboradoras do Poder Público no desempenho dos deveres constitucionais no campo dos serviços sociais. O afastamento do certame licitatório não exime, porém, o administrador público da observância dos princípios constitucionais, de modo que a contratação direta deve observar critérios objetivos e impessoais, com publicidade de forma a permitir o acesso a todos os interessados. 15. As organizações sociais, por integrarem o Terceiro Setor, não fazem parte do conceito constitucional de Administração Pública, razão pela qual não se submetem, em suas contratações com terceiros, ao dever de licitar, o que consistiria em quebra da lógica de flexibilidade do setor privado, finalidade por detrás de todo o marco regulatório instituído pela Lei. Por receberem recursos públicos, bens públicos e servidores públicos, porém, seu regime jurídico tem de ser minimamente informado pela incidência do núcleo essencial dos princípios da Administração Pública (CF, art. 37, caput), dentre os quais se destaca o princípio da impessoalidade, de modo que suas contratações devem observar o disposto em regulamento próprio (Lei nº 9.637/98, art. 4º, VIII), fixando regras objetivas e impessoais para o dispêndio de recursos públicos. 16. Os empregados das Organizações Sociais não são servidores públicos, mas sim empregados privados, por isso que sua remuneração não deve ter base em lei (CF, art. 37, X), mas nos contratos de trabalho firmados consensualmente. Por identidade de razões, também não se aplica às Organizações Sociais a exigência de concurso público (CF, art. 37, II), mas a seleção de pessoal, da mesma forma como a contratação de obras e serviços, deve ser posta em prática através de um procedimento objetivo e impessoal. 17. Inexiste violação aos direitos dos servidores públicos cedidos às organizações sociais, na medida em que preservado o paradigma com o cargo de origem, sendo desnecessária a previsão em lei para que verbas de natureza privada sejam pagas pelas organizações sociais, sob pena de afronta à própria lógica de eficiência e de flexibilidade que inspiraram a criação do novo modelo. 18. O âmbito constitucionalmente definido para o controle a ser exercido pelo Tribunal de Contas da União (CF, arts. 70, 71 e 74) e pelo Ministério Público (CF, arts. 127 e seguintes) não é de qualquer forma restringido pelo art. 4º, caput, da Lei nº 9.637/98, porquanto dirigido à estruturação interna da organização social, e pelo art. 10 do mesmo diploma, na medida em que trata apenas do dever de representação dos responsáveis pela fiscalização, sem mitigar a atuação de ofício dos órgãos constitucionais. 19. A previsão de percentual de representantes do poder público no Conselho de Administração das organizações sociais não encerra violação ao art. 5º, XVII e XVIII, da Constituição Federal, uma vez que dependente, para concretizar-se, de adesão voluntária das entidades privadas às regras do marco legal do Terceiro Setor. 20. Ação direta de inconstitucionalidade cujo pedido é julgado parcialmente procedente, para conferir interpretação conforme à Constituição à Lei nº 9.637/98 e ao art. 24, XXIV, da Lei nº 8666/93, incluído pela Lei nº 9.648/98, para que: (i) o procedimento de qualificação seja conduzido de forma pública, objetiva e impessoal, com observância dos princípios do caput do art. 37 da CF, e de acordo com parâmetros fixados em abstrato segundo o que prega o art. 20 da Lei nº 9.637/98; (ii) a celebração do contrato de gestão seja conduzida de forma pública, objetiva e impessoal, com observância dos princípios do caput do art. 37 da CF; (iii) as hipóteses de dispensa de licitação para contratações (Lei nº 8.666/93, art. 24, XXIV) e outorga de permissão de uso de bem público (Lei nº 9.637/98, art. 12, §3º) sejam conduzidas de forma pública, objetiva e impessoal, com observância dos princípios do caput do art. 37 da CF; (iv) os contratos a serem celebrados pela Organização Social com terceiros, com recursos públicos, sejam conduzidos de forma pública, objetiva e impessoal, com observância dos princípios do caput do art. 37 da CF, e nos termos do regulamento próprio a ser editado por cada entidade; (v) a seleção de pessoal pelas Organizações Sociais seja conduzida de forma pública, objetiva e impessoal, com observância dos princípios do caput do art. 37 da CF, e nos termos do regulamento próprio a ser editado por cada entidade; e (vi) para afastar qualquer interpretação que restrinja o controle, pelo Ministério Público e pelo TCU, da aplicação de verbas públicas. (grifou-se) Nesse sentido, ao discorrer acerca das organizações sociais e dos contratos de gestão, o E. Tribunal de Justiça, do Estado do Espírito Santo, asseverou, constante no voto proferido pelo relator substituto, Dr. Marcelo Pimentel, que: “(…) A partir desses fundamentos, o Apelante formulara pedido no sentido de que fosse determinado ao Estado do Espírito Santo que elabore plano de cargos, carreiras e salários dos profissionais da área da saúde e realize concurso público para contratação de médicos pediatras para atuação no Hospital Estadual Infantil e Maternidade Doutor Alzir Bernardino Alves (HIMABA), devendo ainda fazer constar em todos os editais futuros a necessidade de adoção da mesma política salarial utilizada pelo Estado para nortear a remuneração dos profissionais contratados pelas Organizações Sociais. Pois bem. A despeito da combatividade do Apelante, a pretensão de equiparação da política salarial não merece prosperar. Isso porque, ao apreciar a ADI 1923 (Pleno, Relator (a): Min. AYRES BRITTO, Relator (a) p/ Acórdão: Min. LUIZ FUX, DJE de 17-12-2015), o Pretório Excelso emitira juízo de valor acerca da questão, asseverando o seguinte (…) Trata-se de excerto relevante e significativo, quer porque as Organizações Sociais constituem pessoas jurídicas de direito privado, quer porque ‘não são delegatárias de serviço público, ou seja, não exercem, por delegação (concessão, permissão ou autorização de serviços públicos), sob regime jurídico de direito público, atividades de titularidade exclusiva do poder público, e sim atividades privadas de utilidade pública ou interesse social, em seu próprio nome, com incentivo (fomento) do Estado’ (…) . (TJ-ES - APL: 00276401520168080035, Relator: JORGE DO NASCIMENTO VIANA, Data de Julgamento: 09/07/2018, QUARTA CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 18/07/2018) – (grifou-se) Assim, dadas as peculiaridades do contrato e da natureza jurídica do serviço prestado, a r. jurisprudência, que acolho como razão suficiente de decidir, no que importa, compartilha da conclusão de que a responsabilidade do ente público é subsidiária àquela da organização privada e desde que devidamente comprovada a sua omissão na fiscalização do referido contrato, senão vejamos, in verbis: PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO. RESPONSABILIDADE DO ESTADO. ENTIDADE PARAESTATAL. PERSONALIDADE AUTÔNOMA E DISTINTA DO ENTE PATROCINADOR. REGIME JURÍDICO PRIVADO, PARCIALMENTE DERROGADO POR NORMAS DE DIREITO PÚBLICO. CONTRATO DE GESTÃO. QUALIFICAÇÃO DA ENTIDADE COMO ORGANIZAÇÃO SOCIAL. INAPLICABILIDADE DO REGIME JURÍDICO ADMINISTRATIVO TÍPICO DAS PESSOAS DE DIREITO PÚBLICO. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA. CULPA CONFIGURADA. RECURSO DO IMIP DESPROVIDO. RECURSO DO ESTADO PROVIDO. DECISÃO UNÂNIME. 1. O Estado de Pernambuco levanta preliminar de ilegitimidade passiva ad causum, a fim de se eximir da imputação da responsabilidade pela morte do feto da autora nas dependências do Hospital Dom Malan. 2. Ressoa dos fólios que o nosocômio em que se deu o atendimento da autora é gerido pela Fundação Professor Martiniano Fernandes, pessoa jurídica de direito privado que firmou com o Estado contrato de gestão a fim de colaborar com a prestação de serviços públicos relevantes à sociedade e, em contrapartida, receber patrocínio financeiro a fim de potencializar a execução de seus serviços.3. Desse modo, a parceria firmada com particular para prestação de serviços não exclusivos do Estado não implica extensão à entidade privada do mesmo regime jurídico administrativo aplicável aos entes de direito público. Tampouco os atos praticados pelo parceiro privado devem comunicar-se à administração patrocinadora como sendo de sua autoria, pois aí haveria confusão de personalidades jurídicas distintas, sujeitas a regimes jurídicos igualmente diversos. 4. Por isso que, no presente caso, os atos praticados pelo Hospital Dom Malan, sob gestão da fundação IMIP, ora ré, não podem ser diretamente imputados ao Estado, já que a administração pública não pode responder pelo comportamento de entidade autônoma não integrante de seu organismo.5. Os atos praticados pelos agentes do parceiro privado devem ficar circunscritos ao âmbito de responsabilidade da própria entidade paraestatal, sem que sua imputação resvale à pessoa jurídica diversa (regulada por outro estatuto legal), sob pena de confusão de personalidades e violação à autonomia do ente público patrocinador.6. Excluído o Estado da presente lide, resta apreciar as razões recursais derramadas no apelo da Fundação IMIP (…). (TJ-PE - APL: 4678035 PE, Relator: Democrito Ramos Reinaldo Filho, Data de Julgamento: 22/10/2018, 2ª Câmara Extraordinária de Direito Público, Data de Publicação: 17/04/2019) - (grifou-se) PROCESSO Organização Social – Contrato de Gestão – Contrato com terceiro – Inadimplemento – Omissão estatal – Inocorrência – Responsabilidade da Administração – Impossibilidade: – A responsabilidade subsidiária da Administração pelo inadimplemento dos seus contratados em relação a terceiros, salvo na hipótese de encargos previdenciários, depende da demonstração de omissão na fiscalização. (TJ-SP - AC: 10040999020168260048 SP 1004099-90.2016.8.26.0048, Relator: Teresa Ramos Marques, Data de Julgamento: 17/02/2020, 10ª Câmara de Direito Público, Data de Publicação: 18/02/2020) - (grifou-se) APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO. ATO PRATICADO POR ORGANIZAÇÃO SOCIAL. ILEGITIMIDADE DA MUNICIPALIDADE. Cuida-se de ação indenizatória ajuizada em face da municipalidade, diante de erro médico cometido por nosocômio gerido por Organização Social. Ilegitimidade manifesta. Inteligência do artigo 6º da Lei Municipal n.º 5.026/2009 e do contrato firmado entre as partes. Responsabilidade da Organização Social, sendo a responsabilidade do município subsidiária (…). (TJ-RJ - APL: 00730518020168190001, Relator: Des(a). CHERUBIN HELCIAS SCHWARTZ JÚNIOR, Data de Julgamento: 26/11/2019, DÉCIMA SEGUNDA CÂMARA CÍVEL) - (grifou-se) Ocorre, na hipótese, que a parte autora não demonstrou que o patrimônio do MUNICÍPIO DE CARIACICA seria insuficiente a custear a indenização almejada nos autos, a justificar a responsabilização subsidiária do ente público, tampouco apresentou qualquer arrazoado fático ou elemento de prova a sinalizar a omissão da parte requerida. Assim, há de ser reconhecida a ilegitimidade passiva do MUNICÍPIO DE CARIACICA para figurar na presente ação e, via de consequência, o feito, deve ser extinto sem resolução do mérito. Por fim, ante ao teor da petição de ID 65573776, destaco que ao contrário do que se pretende, não é possível perante este Juizado Especial Fazendário, a incidência do instituto de denunciação à lide, conforme preceitua o art. 10 da Lei 9.0999/95. Ademais, pela análise dos autos e da narrativa fática, não se evidencia a efetivação de litisconsórcio passivo necessário. ANTE TODO O EXPOSTO, julgo extinto o presente feito, sem resolução do mérito, na forma do art. 485, inciso VI, do Código de Processo Civil (Lei nº. 13.105/2015). Sem condenação em custas processuais e/ou honorários advocatícios sucumbenciais, atendendo ao disposto no art. 55, da Lei nº. 9.099/1995, aplicado subsidiariamente aos Juizados Especiais da Fazenda Pública (Lei nº. 12.153/2009, art. 27). Deixo de analisar eventual pedido de gratuidade de justiça neste momento processual, tendo em vista que o acesso ao Juizado Especial independe do pagamento de custas no primeiro grau de jurisdição (Lei nº. 9.099/1995, art. 54), devendo tal pleito ser reiterado, se for o caso, em recurso, observando-se os termos dos arts. 99, §7º, e 101, ambos do CPC/2015. Em caso de recurso, a Secretaria do Juízo deverá certificar sua tempestividade e intimar o recorrido para, caso queira, apresentar resposta. Em seguida, transcurso o prazo, com ou sem manifestação da parte recorrida, remetam-se os autos para o E. Colegiado Recursal, uma vez que, nos termos da recomendação do CNJ, agora reforçada pelo Código de Processo Civil, a análise dos pressupostos recursais é da instância revisora, inclusive quanto a eventual requerimento de gratuidade de justiça. Ocorrendo o trânsito em julgado, aguardem-se os requerimentos pelo prazo de 15 (quinze) dias. Após, nada sendo requerido, arquivem-se, com as formalidades legais e devidas baixas. Submeto o presente projeto de sentença à apreciação da d. Juíza de Direito para homologação, nos termos do art. 40, da Lei nº. 9.099/1995. GUTEMBERG PIRES NOVAIS Juiz Leigo SENTENÇA - PROCESSO Nº. 5026293-47.2024.8.08.0012 Homologo o projeto de sentença apresentado pelo Juiz Leigo, na forma do art. 40, da Lei nº. 9.099/1995. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Cariacica-ES, na data lançada no sistema. MARIA JOVITA FERREIRA REISEN Juíza de Direito
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