Processo nº 0001897-93.2014.8.09.0051
ID: 336890654
Data de Disponibilização:
29/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
ANA PAULA ALENCAR NUNES
OAB/BA XXXXXX
Desbloquear
PODER JUDICIÁRIO
Tribunal de Justiça do Estado de Goiás
Gabinete da Desembargadora Mônica Cezar Moreno Senhorelo
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0001897-93.2014.8.09.0051
COMARCA DE GOIÂNIA
APELANTE: A…
PODER JUDICIÁRIO
Tribunal de Justiça do Estado de Goiás
Gabinete da Desembargadora Mônica Cezar Moreno Senhorelo
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0001897-93.2014.8.09.0051
COMARCA DE GOIÂNIA
APELANTE: ANA PAULA ALENCAR NUNES
APELADOS: GRACIELLA DE REZENDE ARANTES BARRA E OUTRO
RELATORA: DESª. MÔNICA CEZAR MORENO SENHORELO
5ª CÂMARA CÍVEL
EMENTA
DIREITO CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIA. POSSE MANSA, PACÍFICA E SEM OPOSIÇÃO COM ANIMUS DOMINI. RECONHECIMENTO DO DOMÍNIO. REQUISITOS LEGAIS PREENCHIDOS. PEDIDO RECONVENCIONAL. REINTEGRAÇÃO DE POSSE. POSSE ANTERIOR NÃO DEMONSTRADA. PERDAS E DANOS DECORRENTES DO SUPOSTO ESBULHO NÃO COMPROVADAS. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA.
I. CASO EM EXAME
1. Apelação Cível interposta contra sentença que reconheceu o domínio dos apelados sobre os imóveis objeto da lide, com base na Ação de Usucapião Extraordinária, e julgou improcedente o pedido reconvencional de Reintegração de Posse e indenização por perdas e danos formulado pela parte apelante.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
2. Há 2 (duas) questões em discussão:
(i) saber se os apelados preencheram os requisitos legais para aquisição da propriedade dos imóveis por meio da Ação de Usucapião Extraordinária; e
(ii) saber se a apelante faz jus à Reintegração de Posse e à indenização por perdas e danos decorrentes de alegado esbulho possessório.
III. RAZÕES DE DECIDIR
3. A Usucapião Extraordinária pressupõe posse prolongada, mansa, pacífica, contínua e com ânimo de dono, pelo prazo legalmente previsto, conforme o artigo 1.238 do Código Civil.
4. O conjunto probatório evidencia a existência de posse mansa, pacífica, contínua e com animus domini por período superior a 15 (quinze) anos, incluindo sucessão possessória, com realização de benfeitorias e uso habitual do imóvel pelos apelados.
5. A prova testemunhal também corrobora as alegações dos apelados, confirmando o exercício da posse nos moldes exigidos pela legislação.
6. O pedido reconvencional da apelante não pode ser acolhido por ausência de comprovação da posse anterior, elemento indispensável para a caracterização do esbulho possessório e para o deferimento da reintegração de posse e da indenização correlata.
IV. DISPOSITIVO E TESE
7. Apelação Cível conhecida e desprovida.
Tese de julgamento:
1. A posse prolongada, contínua, mansa, pacífica e com animus domini, exercida por mais de 15 (quinze) anos, autoriza o reconhecimento da Usucapião Extraordinária, nos termos do artigo 1.238 do Código Civil.
2. A ausência de posse anterior impede o reconhecimento do esbulho possessório e, consequentemente, a procedência do pedido de reintegração de posse e de indenização por perdas e danos.
Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, XXIII; CC, arts. 1.196, 1.238 e 1.243; CPC, arts. 85, §11º, e 561.
Jurisprudência relevante citada: TJGO, Apelação Cível 0352427-13.2016.8.09.0001, Rel. Des. Dioran Jacobina Rodrigues, j. 18.12.2023; TJGO, Apelação Cível 0230531-82.2015.8.09.0180, j. 21.11.2024; TJGO, Apelação Cível 5030848-36.2020.8.09.0072, Rel. Des. Algomiro Carvalho Neto, j. 25.04.2025; TJGO, Apelação Cível 0245478-30.2016.8.09.0044, Rel. Des. Mauricio Porfirio Rosa, j. 27.04.2021.
ACÓRDÃO
VISTOS, relatados e discutidos estes autos, em que são partes as mencionadas anteriormente.
ACORDAM os componentes da Terceira Turma julgadora da 5ª Câmara Cível do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, à unanimidade de votos, EM CONHECER DA APELAÇÃO CÍVEL E NEGAR-LHE PROVIMENTO, nos termos do voto da Relatora.
VOTARAM, além da Relatora, o Desembargador Algomiro Carvalho Neto e o Desembargador Fernando de Mello Xavier.
PRESIDIU a sessão o Desembargador Guilherme Gutemberg Isac Pinto.
PRESENTE o Doutor Wagner de Pina Cabral, Procurador de Justiça.
VOTO
Adoto o relatório lançado anteriormente.
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.
Cuida-se, como visto, de Apelação Cível interposta por Ana Paula Alencar Nunes, em face da sentença proferida pela Juíza de Direito da 14ª Vara Cível e Ambiental da Comarca de Goiânia, Dra. Tatianne Marcella Mendes Rosa Borges Mustafa, nos autos da Ação de Usucapião Extraordinário ajuizada por Graciella Rezende Arantes Barra e Outro, ora apelados.
Insurge-se a apelante contra a sentença proferida pelo Juízo de primeiro grau, que acolheu o pedido inicial dos apelados para reconhecer a usucapião do imóvel objeto da demanda em favor deles, e, em decorrência disso, julgou improcedente o pedido reconvencional por ela apresentado.
A apelante alega que não estão presentes os requisitos legais para a declaração da usucapião do imóvel discutido na lide em favor dos apelados e que, por isso, a presente ação deve ser julgada improcedente.
Por outro lado, a apelante argumenta que a posse exercida pelos apelados é irregular e de má-fé, razão pela qual entende ter direito à reintegração da posse do imóvel, bem como à condenação dos recorridos ao pagamento de indenização por perdas e danos, em decorrência dos prejuízos que alega ter sofrido pelo esbulho, razão pela qual requer a procedência do pedido reconvencional.
Passo à análise da insurgência recursal.
A usucapião é uma forma originária de aquisição da propriedade, fundada no exercício prolongado, contínuo, manso e pacífico da posse, com ânimo de dono, desde que preenchidos os requisitos legais estabelecidos em Lei.
Trata-se, portanto, de um instituto que decorre da inércia do proprietário em exercer os poderes inerentes à propriedade e de sua omissão em dar cumprimento à função social do bem, conforme previsto no artigo 5º, inciso XXIII, da Constituição Federal, in verbis:
Art. 5º (omissis).
(…)
XXIII - a propriedade atenderá a sua função social;
Como requisitos comuns para a aquisição da propriedade por meio da usucapião, exige-se a posse mansa, pacífica, contínua e com ânimo de dono, pelo prazo estabelecido em Lei.
No caso da Usucapião Extraordinária, prevista no artigo 1.238 do Código Civil, a Lei exige apenas a posse prolongada, dispensando os requisitos do justo título e da boa-fé. O prazo previsto é de 15 (quinze) anos, podendo ser reduzido para 10 (dez) anos se o possuidor tiver estabelecido no imóvel a sua moradia habitual ou nele realizado obras ou serviços de caráter produtivo.
Nesse sentido, dispõe o referido dispositivo legal:
Art. 1.238. Aquele que, por quinze anos, sem interrupção, nem oposição, possuir como seu um imóvel, adquire-lhe a propriedade, independentemente de título e boa-fé; podendo requerer ao juiz que assim o declare por sentença, a qual servirá de título para o registro no Cartório de Registro de Imóveis.
Parágrafo único. O prazo estabelecido neste artigo reduzir-se-á a dez anos se o possuidor houver estabelecido no imóvel a sua moradia habitual, ou nele realizado obras ou serviços de caráter produtivo.
Na hipótese em exame, trata-se de pedido de reconhecimento de usucapião extraordinária, que exige os seguintes requisitos: (i) posse ad usucapionem; (ii) prazo ininterrupto de 15 (quinze) anos; (iii) posse mansa e pacífica, sem oposição.
A respeito da posse ad usucapionem, convém esclarecer o conceito de posse.
Segundo a Teoria Subjetiva da Posse, desenvolvida por Friedrich Karl Von Savigny, a posse é composta por 2 (dois) elementos essenciais: a) o corpus, que se refere ao poder físico exercido sobre a coisa, ou seja, a possibilidade de utilizá-la e controlá-la materialmente; e b) o animus, que é o elemento volitivo, representando a intenção de agir como verdadeiro proprietário, ou seja, de manter a coisa para si com ânimo de dono.
Para Savigny, é justamente a presença do animus domini que distingue a posse da mera detenção. Assim, se houver apenas o poder físico sobre a coisa, sem a intenção de possuí-la como proprietário, estar-se-á diante de uma situação de detenção, e não de posse propriamente dita.
Esse entendimento é particularmente relevante no âmbito da usucapião, pois a configuração da posse apta a gerar a aquisição da propriedade depende da demonstração desse comportamento típico de quem se considera dono.
A respeito de tal teoria, preleciona a doutrina:
“A posse depende da conjugação dos dois elementos. Se alguém, por exemplo, dispõe do poder físico sobre a coisa, mas sem animus domini, apenas em nome de alguém (alieno nomine), agirá apenas com animus tenendi e não terá posse, mas detenção. O animus não se compõe de qualquer elemento volitivo, mas específico: o de dono. Quem detém a coisa, na condição de representante, não exerce a posse, mas simples detenção, pois destituído do elemento animus. O poder físico, compreendido no elemento corpus, não implica apreensão física da coisa, mas um poder de dominação. Possuidor é quem detém esse poder, afastada igual possibilidade por parte de outrem, salvo com a sua autorização. Na interpretação de Valverde y Valverde," para este jurisconsulto o corpus não é o poder material sobre a coisa, senão que esta se encontre colocada sob a guarda do possuidor, sob a sua custódia, pois, estando assim, a temos em nosso poder e podemos excluí-la da apreensão de outrem ". (NADER, Paulo. Curso de direito civil, volume 4: direito das coisas. / Paulo Nader. - 7. ed. rev., atual. e ampl. - Rio de Janeiro: Forense, 2016. p. 60/61).
Já na Teoria Objetiva da Posse, desenvolvida por Rudolf Von Ihering, em oposição à Teoria Subjetiva de Savigny, o elemento animus é dispensado para a configuração da posse. Para Ihering, basta a existência do corpus, entendido não como simples poder físico sobre a coisa, mas como o exercício de algum dos poderes inerentes à propriedade, ainda que ausente a intenção de agir como proprietário.
Feitos os devidos esclarecimentos, verifica-se nos autos que o genitor da autora Graciella de Rezende Arantes Barra, o falecido Graciano Antônio da Silva e Netto, adquiriu, por volta do ano de 1979, os lotes de nº 08 a 13, bem como o lote 16 da Quadra 29, os quais compõem uma chácara situada na Vila Alto da Glória, nesta capital. Posteriormente, tais bens foram transmitidos à autora por meio de sucessão hereditária.
Os apelados alegam que exercem posse contínua, mansa e pacífica sobre os imóveis há mais de 40 (quarenta) anos.
Para comprovar as alegações, colacionaram aos autos certidões referentes aos lotes usucapiendos, nas quais consta que os imóveis pertenciam originalmente ao proprietário registral Guilhermino Pereira Nunes. Também foram apresentados memoriais descritivos, mapas e fotografias aéreas dos terrenos, conforme documentação constante da mov. 3, p. 32-77 do PDF dos autos físicos digitalizados.
Além disso, foi juntada uma Escritura Pública datada de 12 de novembro de 1979, na qual se registra que o falecido Graciano Antônio da Silva e Netto, genitor da apelada, adquiriu o domínio dos lotes nº 06 a 12 da Quadra A, localizados na Vila Alto da Glória, conforme se extrai dos documentos anexados à mov. 3, p. 79-84 do PDF dos autos físicos digitalizados.
Também há nos autos Escrituras Públicas de Compra e Venda e de Cessão de Transferência de Direitos de Posse, outorgadas em favor de Graciano Antônio da Silva e Netto, datadas de 15 de agosto de 1988, 12 de novembro de 1979 e 06 de outubro de 1987. Esses instrumentos tratam da alienação e transferência de posse de diversos lotes situados nas quadras 26-A, 26, 28, 29, 30 e 31, bem como dos lotes de nºs 01 a 15 e 30 a 35 da Quadra A, conforme se verifica na mov. 3, p. 85-92 do PDF dos autos físicos digitalizados.
Consta, ainda, dos autos documento referente ao Espólio de Graciano Antônio da Silva e Netto, atribuindo à herdeira Graciella de Rezende Arantes Barra, entre outros bens, os lotes de nº 08 a 13 e 16 da Quadra 29, situados na Vila Alto da Glória, reforçando a continuidade possessória por sucessão.
Além dos documentos já mencionados, que conferem credibilidade aos fatos relatados pelos autores, ora apelados, a prova testemunhal produzida em audiência reforça suas alegações, ao confirmar que exercem a posse exclusiva do imóvel há mais de 30 (trinta) anos, de forma contínua, pacífica, ininterrupta e com ânimo de dono, ou seja, como se fossem os legítimos proprietários, sem qualquer contestação ou oposição ao longo de todo esse período.
A seu turno, a testemunha José Francisco Ribeiro dos Santos narrou em juízo (mídia anexada à mov. 149):
“(…) QUE mora no setor desde 1981; QUE a chácara era do senhor Graciano, pai da Graciella (autora), e que eles residiam no local, e com o falecimento dele, ficou a esposa e os filhos e que depois a Graciella casou com o Murilo (autor) e foram residir no local; QUE a Graciella tem 3 (três) filhos maiores de idade e que eles cresceram nessa chácara; QUE a Graciella e o esposo Murilo construíram uma casa no local; QUE não se recorda do número da quadra, mas sabe que é o lote 10 e 11; QUE a quadra é toda fechada, murada e com arame em toda a chácara; QUE são vários lotes na chácara; QUE na chácara possui um salão de festa e que são 3 (três) casas, que é da Graciella, do filho dela e o salão de festa; QUE a chácara era do Graciano e ele faleceu e ficou para a mãe da Graciella e para os filhos; QUE reside na Alameda Barbacena em uma quadra diferente da quadra da chácara da Graciella, mas que é vizinho dela; QUE tem a rua que dá acesso aos lotes da chácara é a Rua 106; QUE não há rua entre os lotes da chácara, pois ela é toda murada, cercada e eles são todos juntos; QUE não se recorda como adquiriu os lotes na época; QUE o salão de festa e as casas da chácara se tratam de construções antigas, pois foram construídas quando a Graciella casou e que isso faz mais de 20 (vinte) anos; QUE mora há 500 (quinhentos) metros da chácara da Graciella; QUE quando foi residir no local em 1981, o senhor Graciano já morava no local; QUE depois que o Graciano faleceu, a esposa e os filhos dele continuaram a residir no local; QUE a chácara foi cercada pelo próprio Graciano; QUE a Graciella sempre residiu no local”. (Grifei e sublinhei).
Por sua vez, a testemunha Elmer Sadi Barbosa, ao ser ouvido em juízo, declarou (mídia anexada à mov. 139):
“(…) QUE mudou para a Vila Alto da Glória em 1997; QUE sempre o setor sempre foi um monte de lote fechado e que chega na chácara; QUE as pessoas que residiam na chácara era o pessoal da dona Stella e seus filhos; QUE os filhos da dona Stella são o Fred, Graciella (autora) e a Isabela; QUE quando foi morar no setor era uma gleba só de terras; QUE a dona Stella morava perto da beira do rio e a Graciella morava em cima; QUE na chácara da Graciella tem um salão de festas e uma oficina do genro dela, pois a filha dela reside lá também; QUE a chácara é preenchida na maior parte com construções; QUE não conhece a Ana Paula (requerida) e nem o pai dela Guilhermino; QUE nunca ouviu falar que a chácara era de outras pessoas; QUE sempre conheceu a chácara como do pessoal do Murilo (autor); QUE na chácara havia cavalo, jegue e cachorros; QUE a única coisa que abriu foi a rua e que a chácara nunca foi aberta; QUE reside na Rua Uberaba, na Quadra 37, Lote 11, do outro lado da chácara; QUE tem uma serralheria desde 1997 na região; QUE as casas da dona Stella e do Murilo eram construções antigas; QUE as casas são conjuntas; QUE a casa de show que possui perto da chácara pertence a outra pessoa (…)”. (Grifei e sublinhei).
Por fim, a testemunha Eduardo Henrique de Deus narrou:
“(…) QUE em 2010 abriu uma construtora no local e ouviu do pessoal que a chácara é da Dra. Graciella e do Murilo, e antigamente era do pai dela (Graciella); QUE a chácara sempre foi uma quadra toda fechada e que agora abriu uma rua por causa de um espaço de eventos; QUE nunca ouviu falar que a chácara pertencesse a outra pessoa; QUE não conhece a Ana Paula e nem o Guilhermino; QUE a quadra 29 é toda fechada e que uma vez fez todo levantamento por causa de uma erosão e que lá possui casas e uma pertence a dona Stella; QUE a sua construtora se encontra localizada antes da BR-153 (…); QUE a chácara era toda fechada, cercada e com as casas deles (Stella e Graciella) dentro; QUE o terreno é grande; (…). ”. (Grifei e sublinhei).
Nesse diapasão, observa-se que a prova testemunhal colhida está em plena consonância com a documentação anexada aos autos. Ademais, os relatos das testemunhas acerca da existência de construções e residências antigas no local foram devidamente corroborados pelo mandado de averiguação constante na mov. 165, o qual confirmou a ocupação e a utilização contínua do imóvel pelos autores, reforçando a verossimilhança de suas alegações quanto ao exercício da posse com animus domini:
“(…) Certifico é dou fé que em cumprimento ao presente mandado, diligenciado ao local indicado no mesmo, e no dia e hora acima informados, PROCEDI A AVERIGUAÇÃO nos imóveis da Rua 106 Qd. 29 lotes 8/9/10/11/12/13/16 (lotes corretos), pois o emissor do mandado incluiu erroneamente o lote 01, e lá estando verificamos que os imóveis não possuem nos boletins de informações cadastrais da prefeitura de Goiânia informações sobre edificações ali existentes, sendo que nos lotes 09,10,11 existe edificação contendo uma casa aparentemente funcionando como residência e com oficina mecânica e um escritório de advocacia da autora (ver fotos), não havia no mandado as CRIs imóveis para saber sua metragem e divisões, estes lotes estão murados. Nos lotes 12,13,08 tem um espaço de festas denominado Villa Verde Eventos, com uma Área de 4000m2 ambiente para até 150 pessoas, bosque iluminado e um gramado de 1.500m2 e utilizado como estacionamento privativo. Cozinha Gourmet com churrasqueira a carvão, fogão e forno a lenha. Cozinha Industrial com bancada de três metros e pia dupla em inox, fogão e forno semi industrial, bancada de madeira, Freezer. Bar rústico, com bancada de aroeira apoiada em dormentes de trilho de trem de ferro. Banheiros amplos com pias e divisórias em granito.
Certifico que no lote 16 ONDE DEVERIA fazer frente para A RUA MONTE ALEGRE, a rua não existe no local, sendo área de mata, e não conseguimos identificá-lo por falta de conhecimentos topográficos e no local não ter nenhuma placa de identificação. No local fomos recebido pela Dra. GRACIELLA DE REZENDE ARANTES BARRA e pelo seu esposo o Sr. MURILO DE CARVALHO BARRAS , que disseram que ali também residem a sua filha NATÁLIA DE RESENDE ARANTES BARRA e o genro HUMBERTO DUTRA FREITAS. (Original sem destaques).
Além disso, é possível inferir que, à época do falecimento do genitor dos apelados, a posse por ele exercida já ultrapassava o prazo legal de 15 (quinze) anos exigido para a configuração da usucapião extraordinária.
Conforme dispõe o artigo 1.243 do Código Civil, é facultado ao possuidor somar à sua posse aquela exercida por seus antecessores, desde que esta tenha ocorrido de forma contínua, pacífica e com o mesmo ânimo de dono (animus domini). Assim, ao considerar a posse exercida inicialmente pelo genitor e, posteriormente, pelos autores/apelados, constata-se o o preenchimento do requisito temporal estabelecido pela legislação.
Assim, à luz do robusto conjunto probatório constante dos autos, não subsistem as alegações da parte requerida, ora apelante, de que os apelados jamais teriam residido no local. As testemunhas ouvidas em juízo apresentaram depoimentos firmes e coerentes, confirmando que os recorridos residem no local há mais de 15 (quinze) anos, exercendo a posse de forma contínua, pacífica e sem interrupções.
Dessa forma, impõe-se a manutenção da sentença recorrida, uma vez comprovado o preenchimento dos requisitos legais exigidos para a declaração de usucapião dos lotes objeto da presente demanda, em favor dos autores, ora apelados.
Nesse sentido:
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIO. CERCEAMENTO DO DIREITO DE DEFESA NÃO CARACTERIZADO. POSSE MANSA E PACÍFICA COMPROVADA. REQUISITOS COMPROVADOS. SENTENÇA MANTIDA. HONORÁRIOS RECURSAIS. (…). 2. Na espécie, comprovada a posse mansa e pacífica sobre o imóvel, bem como o animus domini, impõe-se a aquisição da propriedade pela usucapião extraordinária. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA.(TJGO, PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO -> Recursos -> Apelação Cível 0352427-13.2016.8.09.0001, Rel. Des(a). Dioran Jacobina Rodrigues, Abadiânia - Vara Cível, julgado em 18/12/2023, DJe de 18/12/2023). (grifei).
DIREITO CIVIL. USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIA. POSSE MANSA, PACÍFICA E CONTÍNUA. ANIMUS DOMINI. REQUISITOS CUMPRIDOS. SENTENÇA MANTIDA. (…). 4. As provas demonstram que a parte autora exerceu posse mansa, pacífica e contínua do imóvel por mais de 15 anos, realizando benfeitorias, como a construção de um banheiro e a instalação de energia elétrica, e sem oposição do proprietário anterior. 5. O animus domini, a intenção de agir como proprietário, foi comprovado pelas declarações das testemunhas e pelos investimentos realizados pela parte autora no imóvel. 6. O reconhecimento da posse anterior por parte do réu também evidencia a transferência de direitos possessórios. (...). (TJGO, Apelação Cível 0230531-82.2015.8.09.0180, De minha Relatoria, 5ª Câmara Cível, julgado em 21/11/2024). (grifei).
Em relação ao pedido reconvencional de reintegração de posse e de indenização por perdas e danos, formulado sob a alegação de prejuízos decorrentes de esbulho possessório, adianta-se que tal pretensão não merece acolhimento.
É cediço que o instituto da reintegração de posse constitui o meio processual adequado à disposição do possuidor para reaver a posse de um bem do qual foi injustamente privado, por meio de ato violento, clandestino ou precário praticado por terceiro.
Nesse sentido, o artigo 561 do Código de Processo Civil estabelece os requisitos que devem ser demonstrados pelo promovente da Ação Possessória, a saber:
Art. 561 (…)
I – a sua posse;
II – a turbação ou esbulho praticado pelo réu;
III – a data da turbação ou do esbulho
IV – a continuação da posse, embora turbada, na ação de manutenção; a perda da posse na ação de reintegração.
Nessa linha, é certo que o possuidor tem direito à reintegração na posse quando demonstrar, de forma clara, a sua posse anterior sobre o imóvel, o esbulho praticado pelo réu e a consequente perda da posse.
A ausência de comprovação de qualquer desses requisitos inviabiliza o reconhecimento do esbulho possessório, conduzindo à improcedência da Ação Reintegratória, conforme exige o artigo 561 do Código de Processo Civil.
À luz do artigo 1.196 do Código Civil, considera-se possuidor aquele que exerce, de fato, ainda que de forma parcial, algum dos poderes inerentes à propriedade, como o uso, a fruição ou a disposição da coisa.
Dessa forma, a posse configura-se como uma relação de fato entre a pessoa e o bem, não exigindo, para sua caracterização, a existência de um título jurídico que a vincule à propriedade. O que importa é a exteriorização de domínio, independentemente da titularidade formal do bem.
No caso em exame, verifica-se que a requerida, ora apelada, não logrou êxito em demonstrar o exercício de posse anterior sobre o imóvel objeto da lide, ônus que lhe competia nos termos do artigo 561 do Código de Processo Civil.
Aliás, a partir da análise dos autos, especialmente da contestação com reconvenção apresentada pela recorrente, constata-se que a própria requerida, ora apelante, reconhece expressamente que jamais exerceu a posse sobre os imóveis em questão. Afirma, inclusive, que apenas após atingir a maioridade, no ano de 2010, teve conhecimento de que os referidos lotes passaram a integrar seu patrimônio em virtude do formal de partilha datado de 29/09/2011, decorrente da sucessão de seu genitor Guilhermino Pereira Nunes.
Tal confissão, aliada às provas constantes nos autos, reforça a inexistência de posse anterior por parte da requerida, ora apelante, o que constitui requisito indispensável à procedência da Ação Possessória, conforme dispõe o artigo 561 do Código de Processo Civil.
Dessa forma, afasta-se a alegação de esbulho possessório por parte dos autores, ora apelados, e, por consequência, também se inviabiliza o pedido de indenização por perdas e danos, uma vez que este está diretamente condicionado à configuração do esbulho e à comprovação da posse anterior legítima.
A propósito:
EMENTA: DIREITO CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. REQUISITOS CUMULATIVOS DO ART. 561 DO CPC. AUSÊNCIA DE POSSE PRÉVIA. IMPROCEDÊNCIA. SENTENÇA MANTIDA. (…). 5. No caso concreto, os apelantes não apresentaram elementos que demonstrassem a posse efetiva do imóvel, como contas de consumo ou outras evidências documentais.6. A inexistência de posse anterior inviabiliza o pedido de reintegração de posse (...) (TJGO, PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO -> Recursos -> Apelação Cível, 5030848-36.2020.8.09.0072, ALGOMIRO CARVALHO NETO - (DESEMBARGADOR), 5ª Câmara Cível, julgado em 25/04/2025). (grifei).
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. REQUISITOS DO ARTIGO 561 DO cpc/2015 NÃO COMPROVADOS. ÔNUS DA PROVA QUE INCUMBIA À AUTORA. MAJORAÇÃO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. SENTENÇA MANTIDA. (…). 2. Na hipótese, a Autora/Apelante não se desincumbiu de seu ônus probatório, nos termos do artigo 373, II do NCPC, deixando de demonstrar os fatos constitutivos do seu direito, à medida que não comprovou a posse anterior sobre os imóveis vindicados, o esbulho dos Réus, bem como, a respectiva data. (…). (TJGO, PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO -> Recursos -> Apelação Cível 0245478-30.2016.8.09.0044, Rel. Des(a). MAURICIO PORFIRIO ROSA, 5ª Câmara Cível, julgado em 27/04/2021, DJe de 27/04/2021). (grifei).
Destarte, impõe-se a manutenção da sentença recorrida, uma vez que proferida em consonância com o contexto fático e probatório do feito.
Ante o exposto, CONHEÇO DA APELAÇÃO CÍVEL E NEGO-LHE PROVIMENTO, para manter a sentença inalterada por estes e seus próprios fundamentos jurídicos.
Desprovido o recurso, majoram-se os honorários recursais para 12% (doze por cento) sobre o valor atualizado da causa (R$ 700.000,00), nos termos do artigo 85, §11º, do Código de Processo Civil, ficando a exigibilidade da apelante suspensa em razão dela ser beneficiária da gratuidade da justiça, na forma do artigo 98, §3º, do mesmo Diploma Processual.
Advirto às partes que a eventual oposição de Embargos de Declaração manifestadamente protelatórios, isto é, visando rediscutir a matéria apreciada nesta instância revisora, ensejará a aplicação da multa prevista no artigo 1.026, §2º, do Código de Processo Civil.
É o voto.
Após o trânsito em julgado, determino a remessa dos autos ao juízo de origem, com as respectivas baixas necessárias, retirando o feito do acervo desta relatoria.
Desembargadora Mônica Cezar Moreno Senhorelo
Relatora
Datado e Assinado Digitalmente Conforme Arts. 10 e 24 da Resolução nº 59/2016 do TJGO
DIREITO CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIA. POSSE MANSA, PACÍFICA E SEM OPOSIÇÃO COM ANIMUS DOMINI. RECONHECIMENTO DO DOMÍNIO. REQUISITOS LEGAIS PREENCHIDOS. PEDIDO RECONVENCIONAL. REINTEGRAÇÃO DE POSSE. POSSE ANTERIOR NÃO DEMONSTRADA. PERDAS E DANOS DECORRENTES DO SUPOSTO ESBULHO NÃO COMPROVADAS. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA.
I. CASO EM EXAME
1. Apelação Cível interposta contra sentença que reconheceu o domínio dos apelados sobre os imóveis objeto da lide, com base na Ação de Usucapião Extraordinária, e julgou improcedente o pedido reconvencional de Reintegração de Posse e indenização por perdas e danos formulado pela parte apelante.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
2. Há 2 (duas) questões em discussão:
(i) saber se os apelados preencheram os requisitos legais para aquisição da propriedade dos imóveis por meio da Ação de Usucapião Extraordinária; e
(ii) saber se a apelante faz jus à Reintegração de Posse e à indenização por perdas e danos decorrentes de alegado esbulho possessório.
III. RAZÕES DE DECIDIR
3. A Usucapião Extraordinária pressupõe posse prolongada, mansa, pacífica, contínua e com ânimo de dono, pelo prazo legalmente previsto, conforme o artigo 1.238 do Código Civil.
4. O conjunto probatório evidencia a existência de posse mansa, pacífica, contínua e com animus domini por período superior a 15 (quinze) anos, incluindo sucessão possessória, com realização de benfeitorias e uso habitual do imóvel pelos apelados.
5. A prova testemunhal também corrobora as alegações dos apelados, confirmando o exercício da posse nos moldes exigidos pela legislação.
6. O pedido reconvencional da apelante não pode ser acolhido por ausência de comprovação da posse anterior, elemento indispensável para a caracterização do esbulho possessório e para o deferimento da reintegração de posse e da indenização correlata.
IV. DISPOSITIVO E TESE
7. Apelação Cível conhecida e desprovida.
Tese de julgamento:
1. A posse prolongada, contínua, mansa, pacífica e com animus domini, exercida por mais de 15 (quinze) anos, autoriza o reconhecimento da Usucapião Extraordinária, nos termos do artigo 1.238 do Código Civil.
2. A ausência de posse anterior impede o reconhecimento do esbulho possessório e, consequentemente, a procedência do pedido de reintegração de posse e de indenização por perdas e danos.
Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, XXIII; CC, arts. 1.196, 1.238 e 1.243; CPC, arts. 85, §11º, e 561.
Jurisprudência relevante citada: TJGO, Apelação Cível 0352427-13.2016.8.09.0001, Rel. Des. Dioran Jacobina Rodrigues, j. 18.12.2023; TJGO, Apelação Cível 0230531-82.2015.8.09.0180, j. 21.11.2024; TJGO, Apelação Cível 5030848-36.2020.8.09.0072, Rel. Des. Algomiro Carvalho Neto, j. 25.04.2025; TJGO, Apelação Cível 0245478-30.2016.8.09.0044, Rel. Des. Mauricio Porfirio Rosa, j. 27.04.2021.
Conteúdo completo bloqueado
Desbloquear