Processo nº 6087087-67.2024.8.09.0051
ID: 331883043
Tribunal: TJGO
Órgão: Goiânia - 4ª UPJ Varas Cíveis e Ambientais: 13ª, 14ª, 15ª e 16ª
Classe: TUTELA CAUTELAR ANTECEDENTE
Nº Processo: 6087087-67.2024.8.09.0051
Data de Disponibilização:
23/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
PAULO HENRIQUE SILVA PINHEIRO
OAB/GO XXXXXX
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GABRIEL FRANCISCO BARROS DE MIRANDA
OAB/GO XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO
COMARCA DE GOIÂNIA
14ª VARA CÍVEL E AMBIENTAL
Processo nº.: 6087087-67.2024.8.09.0051
Natureza: PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO -> Tutela Provisória de Urgênc…
PODER JUDICIÁRIO
COMARCA DE GOIÂNIA
14ª VARA CÍVEL E AMBIENTAL
Processo nº.: 6087087-67.2024.8.09.0051
Natureza: PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO -> Tutela Provisória de Urgência e Tutela Provisória de Evidência -> Tutela Cautelar Antecedente
Requerente: Mara De Fatima Zaccarelli Bersaneti
Requerido: Banco Mercantil Do Brasil Sa
SENTENÇA
Tratou-se, inicialmente, de Ação de Tutela de Urgência Cautelar em Caráter Antecedente ajuizada por Mara de Fátima Zaccarelli Bersaneti em face de Banco Mercantil do Brasil S.A., ambos devidamente qualificados.
Em síntese, relata a parte autora ser aposentada, recebendo mensalmente a quantia de R$ 2.519,17 (dois mil quinhentos e dezenove reais e dezessete centavos), sendo seus rendimentos creditados na conta bancária pertencente à ré (agência 0027, conta 01.091.030-8), além de que, anteriormente, possuía contratos de empréstimos consignados regularmente pactuados sob nº. 804392553 e nº. 808381761.
Ocorre que, no dia 18/11/2024, a demandante teria sido vítima de um golpe praticado por criminosos que se passaram por agentes do INSS, obtiveram acesso indevido à sua conta bancária e, de modo fraudulento, renegociaram o contrato nº. 808381761, solicitando o crédito de R$ 21.867,81 (vinte e um mil oitocentos e sessenta e sete reais e oitenta e um centavos), além da celebração de outros três contratos: contrato nº. 808381753, para crédito imediato no valor de R$ 5.654,91 (cinco mil seiscentos e cinquenta e quatro reais e noventa e um centavos), contrato nº. 808381760, para crédito imediato no valor de R$ 5.654,91 (cinco mil seiscentos e cinquenta e quatro reais e noventa e um centavos), e o contrato nº. 808381752, para crédito consignado no valor de R$ 4.891,90 (quatro mil oitocentos e noventa e um reais e noventa centavos), totalizando R$ 36.833,42 (trinta e seis mil oitocentos e trinta e três reais e quarenta e dois centavos).
Informa que a ação ilícita foi realizada através de duas transferências indevidas, no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais) cada, para contas bancárias desconhecidas, em nome de William Cesar Ferreira da Silva de Oliveira, inscrito no CPF sob o nº. 173.004.427-14, e Gabriella Freitas, além de descontos relativos a seguros prestamistas, nos valores de R$ 3.396,99 (três mil trezentos e noventa e seis reais e noventa e nove centavos) e R$ 282,38 (duzentos e oitenta e dois reais e trinta e oito centavos).
Narrou que que, ao tomar ciência da fraude, registrou boletim de ocorrência em 19/11/2024 e diligenciou ao banco requerido para resolver a situação, obtendo a devolução parcial nos valores de R$ 12,10 (doze reais e dez centavos) de Gabriella Freitas, em 19/11/2024; R$ 1,00 (um real) de William, em 21/11/2024, e R$ 9.987,90 (nove mil novecentos e oitenta e sete reais e noventa centavos) de Gabriella Freitas, em 26/11/2024, sendo que metade dos valores ainda não foram recuperados, permanecendo ativos os contratos.
Ressalta que, dos valores creditados, remanescem em sua conta bancária apenas a importância de R$ 21.687,73 (vinte e um mil seiscentos e oitenta e sete reais e setenta e três centavos), e o saldo transferido indevidamente e ainda não recuperado perfaz o montante de R$ 9.999,00 (nove mil novecentos e noventa e nove reais). Menciona, além disso, que as parcelas mensais decorrentes dos empréstimos, legais e fraudulentos, totalizam R$ 1.792,40 (um mil setecentos e noventa e dois reais e quarenta centavos), correspondendo a 71% (setenta e um por cento) de sua renda, o que ultrapassa, inclusive, o limite legal de 30% (trinta por cento), comprometendo sua subsistência.
Diante disso, discorreu sobre o direito aplicável à matéria e requisitou o deferimento da tutela de urgência para determinar a suspensão imediata dos descontos provenientes dos empréstimos contratados pelos estelionatários ou, de forma subsidiária, a limitação dos descontos em até 30% (trinta por cento) de seus rendimentos.
Instruiu o pedido com os documentos anexados no evento 01.
Decisão de evento 05 recebeu a exordial, concedeu à parte autora os benefícios da gratuidade da justiça e inverteu o ônus da prova com base no art. 6º, inciso VIII, do CPC. Ainda fora deferida a tutela de urgência requerida, para que a instituição financeira ré promova a suspensão das cobranças no benefício previdenciário da autora, correspondentes aos contratos discutidos nestes autos, sob pena de multa. Ainda, diante da natureza antecipatória da presente tutela cautelar, por força do art. 305, parágrafo único do CPC c/c art. 303, § 1º, inciso I, do CPC, determinou-se a intimação da parte autora para, no prazo de 15 (quinze) dias, aditar a inicial, sob pena de extinção sem resolução de mérito (art. 303, § 2º, do CPC).
Citada (evento 10), a parte requerida informou o cumprimento da decisão liminar e comprovou ter efetuado a suspensão dos descontos referente aos contratos objeto da lide (evento 17).
Em seguida, a instituição financeira ré apresentou contestação e documentos (evento 18). Defendeu que não deve ser responsabilizado pela suposta fraude, uma vez que a autora provavelmente repassou seus dados bancários e pessoais para terceiros desconhecidos. Argumenta que os contratos foram firmados via agência bancária, com utilização de senha eletrônica, e que a responsabilidade é da autora em guardar suas informações pessoais. Alegou, ainda, que não praticou qualquer ato ilícito que justifique a indenização por danos morais. Requereu a improcedência da pretensão autoral, alegando ausência de culpa e excludente de ilicitude por culpa exclusiva da autora ou de terceiros, eximindo sua responsabilidade. Subsidiariamente, pediu a compensação de valores caso seja condenado.
Em evento 20, atendendo à determinação judicial (evento 05), a autora aditou a inicial para formular seus pedidos principais. Reiterou os fatos narrados na inicial, enfatizando a situação de vulnerabilidade decorrente da fraude e dos descontos abusivos que comprometem sua renda. Argumentou que a responsabilidade do banco é objetiva, nos termos do Código de Defesa do Consumidor, e que a instituição financeira não adotou medidas de segurança eficazes para impedir as transações fraudulentas. Ao final, requereu a procedência dos pedidos, com a confirmação da tutela de urgência, o cancelamento dos empréstimos e renegociações contratadas por terceiros, a restituição dos valores debitados e a condenação do banco réu ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais).
Decisão de evento 22 recebeu o aditamento à inicial e determinou a intimação da instituição financeira requerida para se manifestar a respeito.
Em que pese devidamente intimada (evento 24), a parte ré manteve-se inerte.
A parte autora apresentou réplica ao evento 25.
Intimadas para especificarem as provas que pretendiam produzir (evento 27), apenas a autora se manifestou (evento 30), pugnando pelo julgamento antecipado da lide.
Realizada audiência de conciliação na data de 02/07/2025, não se logrou êxito na celebração de acordo (evento 47).
Vieram-me os autos conclusos.
É o necessário relatório.
Decido.
Em detida análise do caderno processual, após o cotejo da pretensão autoral e das teses defensivas, entendo que a presente demanda está apta a receber julgamento antecipado, porquanto a matéria controvertida não necessita de produção de outras provas, incidindo o disposto no artigo 355, inciso I, do Código de Processo Civil.
Analisando-se as circunstâncias do processo, conclui-se que a ausência de prova oral ou mesmo pericial, no caso vertente, não configura cerceamento de defesa, principalmente porquanto a prova, no caso, é essencialmente documental.
A propósito, insta salientar que, consoante dispõe do art. 370 do Código de processo Civil, o juiz é o destinatário final da prova a prova se destina à formação da convicção do magistrado, cabendo a ele deferir ou determinar as provas que entender necessárias à instrução do processo, de ofício ou a requerimento da parte, bem como indeferir as diligências que considerar inúteis ou meramente protelatórias.
Para o caso em análise, da verificação do contexto probatório, infere-se a desnecessidade de outras provas, sejam documentais, perícia ou oitiva de testemunhas/depoimento pessoal.
Assentada tal premissa, observo que o processo se encontra em ordem e as partes representadas, não havendo irregularidades ou nulidades a serem sanadas.
Ressalte-se que o feito teve tramitação normal e que foram observadas as garantias dos sujeitos da relação processual quanto ao contraditório e à ampla defesa. Além disso, estão presentes os pressupostos de existência e validade processuais.
Nestes termos, deve o processo receber julgamento no estado em que se encontra.
E na ordem de enfrentamento das matérias submetidas a apreciação, considerando que não foram arguidas, pela instituição financeira requerida, questões preliminares/prejudiciais de mérito em sua contestação, passo, ‘incontinenti’, à análise do mérito da causa.
Ora, considerando a relação jurídica estabelecida entre os sujeitos processuais, é indubitável a aplicação das disposições do Código de Defesa do Consumidor (CDC), especialmente em razão do entendimento jurisprudencial cristalizado no verbete da Súmula 297 do STJ – Superior Tribunal de Justiça, in verbis: “O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”.
Já no que se refere às questões de fato, isto é, à comprovação dos acontecimentos, ressalto que o art. 14, § 3º, do CDC, diversamente da regra estatuída pelo art. 6º, VIII, do CDC, estabeleceu a inversão legal do ônus da prova (‘ope legis’), não judicial (‘ope iudicis’), nos casos de fato do serviço, distribuindo ao fornecedor o encargo de provar que o prestou de maneira adequada ou que o consumidor ou terceiro agiram com culpa exclusiva.
O sistema criado pelo Código de Defesa do Consumidor estabelece a responsabilidade objetiva dos prestadores de serviço, especialmente nos artigos 3º, § 2º, e 14 daquele Diploma Legal.
Por consequência, o demandado deve responder pelos defeitos resultantes do negócio independentemente de culpa, nos moldes do art. 14, ‘caput’, do CDC, verbis:
“Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação de danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação de serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.”
Trata-se de responsabilidade objetiva pelo fato do serviço, fundada na teoria do risco do empreendimento, segundo a qual, consoante doutrina de Sérgio Cavalieri Filho: “(...) todo aquele que se dispõe a exercer alguma atividade no campo do fornecimento de bens e serviços tem o dever de responder pelos fatos e vícios resultantes do empreendimento independentemente de culpa. Este dever é imanente ao dever de obediência às normas técnicas e de segurança, decorrendo a responsabilidade do simples fato de dispor-se alguém a realizar atividade e executar determinados serviços. Em suma, os riscos do empreendimento correm por conta do fornecedor (de produtos e serviços) e não do consumidor”.
Os requisitos, portanto, para a configuração da responsabilidade são: falha na prestação do serviço, dano e nexo causal.
Nesse tipo de responsabilidade, o fornecedor somente afasta o dever de reparar o dano se provar (ônus seu) a ocorrência de uma das causas que excluem o nexo causal, enunciadas no § 3º do art. 14 do CDC, quais sejam,
“(...)
§ 3º O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar:
I – que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste;
II – a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.”
No caso concreto, narra a parte autora que possuía dois contratos de empréstimos consignados regularmente pactuados: i) contrato nº. 804392553: celebrado em 13/09/2021, no valor original de R$ 15.843,91 (quinze mil oitocentos e quarenta e três reais e noventa e um centavos), com saldo devedor atual de R$ 9.789,64 (nove mil setecentos e oitenta e nove reais e sessenta e quatro centavos), a ser quitado em 68 (sessenta e oito) parcelas de R$ 384,19 (trezentos e oitenta e quatro reais e dezenove centavos), das quais já foram pagas 36 (trinta e seis) parcelas; ii) contrato nº. 808381761: com saldo devedor de R$ 1.467,32 (um mil quatrocentos e sessenta e sete reais e trinta e dois centavos), cujos descontos mensais eram de R$ 382,17 (trezentos e oitenta e dois reais e dezessete centavos, restando de 3 a 4 parcelas para quitação integral.
Ocorre, que, segundo narrativa da exordial, em 18/11/2024, a autora teria sido vítima de um golpe, por meio do qual terceiros fraudadores renegociaram o contrato nº. 808381761 e celebraram três novos contratos de empréstimos, além de realizarem transferências e descontos indevidos, nos seguintes moldes: i) renegociação do contrato nº. 808381761: foi solicitado um crédito de R$ 21.867,81 (vinte e um mil oitocentos e sessenta e sete reais e oitenta e um centavos), abatendo-se o saldo devedor de R$ 1.467,32 (um mil quatrocentos e sessenta e sete reais e trinta e dois centavos), com crédito residual de R$ 20.430,49 (vinte mil quatrocentos e trinta reais e quarenta e nove centavos) na conta da autora; ii) contrato nº. 808381753: contratação de crédito imediato no valor de R$ 5.654,91 (cinco mil seiscentos e cinquenta e quatro reais e noventa e um centavos), com saldo devedor atual de R$ 5.770,85 (cinco mil setecentos e setenta reais e oitenta e cinco centavos), a ser pago em 36 (trinta e seis) parcelas de R$ 451,50 (quatrocentos e cinquenta e um reais e cinquenta centavos); iii) contrato nº. 808381760: contratação de crédito imediato no valor de R$ 5.654,91 (cinco mil seiscentos e cinquenta e quatro reais e noventa e um centavos), com saldo devedor atual de R$ 5.770,85 (cinco mil setecentos e setenta reais e oitenta e cinco centavos), a ser pago em 36 (trinta e seis) parcelas de R$ 451,50 (quatrocentos e cinquenta e um reais e cinquenta centavos); iv) contrato nº. 808381752: contratação de crédito consignado no valor de R$ 4.891,90 (quatro mil e oitocentos e noventa e um reais e noventa centavos), com saldo devedor atual de R$ 4.891,90 (quatro mil oitocentos e noventa e um reais e noventa centavos), a ser pago em 84 (oitenta e quatro) parcelas de R$ 110,01 (cento e dez reais e um centavo).
Nesse contexto, atenta à distribuição do ônus da prova realizada pela própria lei, mas também por este juízo (evento 05), competia à parte requerida apresentar provas da efetiva contratação válida de todos os negócios jurídicos impugnados pela demandante.
Mas analisando todo o conjunto fático probatório, com relação aos documentos colacionados aos autos, conclui-se que a parte ré não comprovou as devidas contratações realizadas pela autora, nos termos do artigo 373, inciso II, do CPC e art. 6º, inciso VIII, do CDC.
Observa-se que a instituição financeira afirma que o negócio jurídico objeto da presente lide foi firmado por meio eletrônico.
A propósito, mister consignar que a assinatura eletrônica garante a validade jurídica do contrato, uma vez que as plataformas se utilizam de uma combinação de diversos pontos de autenticação para garantir a veracidade e integridade dos documentos assinados, como registro do endereço de IP, geolocalização, vinculação ao e-mail do signatário, senha pessoal do usuário, sendo alguns exemplos.
O Egrégio Tribunal de Justiça de Goiás já se manifestou especificamente sobre a validade da contratação de empréstimo consignado mediante assinatura eletrônica, senão vejamos:
“RECURSO DE APELAÇÃO. AÇÃO DECLARATÓRIA C/C RESTITUIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. PROVA DA CONTRATAÇÃO POR MEIO ELETRÔNICO. ASSINATURA ATRAVÉS DE BIOMETRIA FACIAL. INEXISTÊNCIA DE INDÍCIOS DE FRAUDE. REGULARIDADE DA OPERAÇÃO. 1. O banco réu logrou comprovar o vínculo jurídico, por meio da juntada de contrato formalizado por meio eletrônico, no qual verifica-se a imagem capturada por “selfie” no momento da contratação para a realização da biometria facial, a geolocalização da autora, o IP do dispositivo eletrônico por meio do qual foi realizada a operação, além da prova de transferência do crédito para a conta da titularidade da consumidora, que limitou-se a alegações genéricas de ocorrência de fraude contra aposentados, sem nenhum indício concreto de adulteração dos dados constantes da contratação formalizada por meio digital, tampouco solicitou a realização de prova pericial. 2. Regularidade da contratação do empréstimo consignado, diante da existência de prova da manifestação de vontade da autora através de imagem capturada por “selfie” e da disponibilização do crédito por meio de transferência bancária, mormente porque os extratos da movimentação financeira mostram-se ilegíveis. RECURSO DE APELAÇÃO CONHECIDO E DESPROVIDO”. (TJGO, PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO -> Recursos -> Apelação Cível 5294904-63.2023.8.09.0113, Rel. Des(a). REINALDO ALVES FERREIRA, 2ª Câmara Cível, julgado em 07/11/2023, DJe de 07/11/2023) (Destaquei)
Logo, é sabido que o contrato virtual ou por meio eletrônico é aceito atualmente para contratação de negócios jurídicos de forma mais célere, porém a assinatura eletrônica deve ser comprovada por meio de ferramenta que permita confirmar de forma inequívoca a contratação.
No entanto, no caso dos autos, observa-se que houve por caracterizada a falha na prestação do serviço, pois a instituição financeira não demonstrou, na condição de fornecedor do serviço adquirido, prova da regular contratação.
Em que pese o banco tenha apresentado os documentos referentes aos supostos contratos firmados entre as partes, não é possível verificar a autenticidade da suposta assinatura digital aposta no contrato, eis que não se encontram presentes as informações que identificam e registramos signatários e que garantem a assinatura eletrônica válida do documento ao final da operação.
Vale dizer que, analisando o documento em questão, é possível concluir que não consta qualquer certificado ou validação de assinatura digital por biometria facial com indicação de data, hora, geolocalização e IP.
Sendo assim, diante do acima exposto, não há comprovação da existência da certificação digital, seja por biometria facial ou assinatura eletrônica acompanhada de certificado de autenticidade. E, ainda, não trouxe o ‘log’ de dados da operação de forma detalhada ou prova a respeito das circunstâncias em que se deu a transação mediante o uso de senha pessoal e intransferível, como suscitado.
Logo, a instituição financeira ré não se desincumbiu do ônus da prova quanto à legitimidade da contratação e a consequente regularidade dos descontos na verba alimentar da autora, de modo que as cobranças referentes ao suposto empréstimo consignado são indevidas, devendo ser declarada a inexistência da dívida.
Nesse sentido, cito:
“APELAÇÃO CÍVEL. RELAÇÃO DE CONSUMO. INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C DECLARATÓRIA E INDENIZATÓRIA. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. CONTRATAÇÃO DO EMPRÉSTIMO POR MEIO DE RECONHECIMENTO FACIAL (BIOMETRIA). REFINANCIAMENTO DE EMPRÉSTIMO ANTERIOR NÃO RECONHECIDO PELA PARTE AUTORA. FALHA DA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO CONFIGURADA. "BIOMETRIA FACIAL" QUE NÃO PERMITE VERIFICAR A REGULARIDADE DA CONTRATAÇÃO PELO DEMANDANTE. INEXISTÊNCIA DE PROVA SUFICIENTE SOBRE OS TERMOS DO CONTRATO DE REFINANCIAMENTO DE EMPRÉSTIMO, POIS, EM QUE PESE A INSTITUIÇÃO FINANCEIRA DEFENDER A VALIDADE DA ASSINATURA DIGITAL POR MEIO DE BIOMETRIA FACIAL, NÃO SE VERIFICA OS PARÂMETROS USADOS PARA AFERIÇÃO DA SUPOSTA CONTRATAÇÃO PELO CONSUMIDOR. ÔNUS DA PROVADO BANCO RÉU - ART. 373, II, DO CPC. CERTIFICAÇÃO DIGITAL QUE FOI APRESENTADA PELO BANCO APELANTE DE FORMA UNILATERAL, SENDO QUE A INSTITUIÇÃO FINANCEIRA TÃO SOMENTE FORNECEU UMA FOTO DO CLIENTE COMO SE FOSSE A SUA ASSINATURA. INOBSERVÂNCIA NA CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIA ACOSTADA AOS AUTOS SEQUER O TERMO "ASSINADO DIGITALMENTE" PARA QUE PUDESSE CONFIRMAR A ANUÊNCIA DA PARTE AUTORA. CONTRATAÇÃO NA FORMA DIGITAL QUE DEVE SER COMPROVADA PELA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA MEDIANTE A APRESENTAÇÃO DE DADOS CRIPTOGRAFADOS, O QUE NÃO SE DESINCUMBIU O BANCO RECORRENTE. ADEMAIS, SEQUER REQUEREU PROVA PERICIAL PARA ATESTAR A REGULARIDADE DA CONTRATAÇÃO DIGITAL, COM A ASSINATURA ELETRÔNICA - BIOMETRIA FACIAL, NA FORMA DO ARTIGO 373, II, DO CPC. DESCONTO INDEVIDO QUE RESTOU INCONTROVERSO. DANO MORAL CONFIGURADO. TEORIA DO RISCO DO EMPREENDIMENTO. QUANTUM INDENIZATÓRIO NO VALOR DE R$5.000,00 (CINCO MIL REAIS) QUE NÃO MERECE REDUÇÃO, DADAS AS PECULIARIDADES DO CASO CONCRETO E OS PRINCÍPIOS DE PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE, SOBRETUDO SE CONSIDERADO QUE O AUTOR É IDOSO E QUE OS DESCONTOS FORAM EFETUADOS SOBRE PENSÃO PREVIDENCIÁRIA. SÚMULA Nº 343 DO TJRJ. DEVOLUÇÃO EM DOBRO. SENTENÇA QUE SE MANTÉM. DESPROVIMENTO DO RECURSO. (TJ-RJ - APL: 00270185120208190014, Relator: Des (a). ANDRE LUIZ CIDRA, Data de Julgamento: 03/02/2022, DÉCIMA PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 09/02/2022) (Destaquei)
“APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE PROCEDIMENTO COMUM -INEXISTÊNCIA DE DÉBITO - TÍTULO DE CAPITALIZAÇÃO - CONTRATAÇÃO POR MEIO ELETRÔNICO NÃO COMPROVADA -PRINTS DE TELA DO SISTEMA - DANO MORAL - QUANTUM INDENIZATÓRIO - TERMO INICIAL DOS JUROS DE MORA - REPETIÇÃO DE INDÉBITO DE FORMA SIMPLES. Nas ações em que o autor nega a existência de negócio jurídico, o ônus de provar o contrato é do réu, pois não é de se exigir do autor a prova negativa de fato. Os prints de telas eletrônicas, não possuindo assinatura e não acompanhados de cópia dos documentos pessoais do autor, não comprovam a contratação e a legitimidade do débito. "Não se ignora que na contemporaneidade os meios digitais de contratação tem ganhado preponderância, tendo em vista a agilidade que propiciam. No entanto, cabe ao fornecedor que opta for ofertar a possibilidade de contratação nesta modalidade o ônus de se cercar de meios de assegurar a regularidade do negócio". Não comprovada a contratação de aquisição de título de capitalização, os descontos indevidos em benefício previdenciário é fato gerador de dano moral. Para o arbitramento da reparação pecuniária por dano moral, o juiz deve considerar as circunstâncias fáticas, a repercussão do ilícito, as condições pessoais das partes, bem como os princípios da razoabilidade e a proporcionalidade. A indenização adequada não comporta majoração ou redução do quantum. A quantia arbitrada para compensação por dano moral deve ser corrigida monetariamente a partir do arbitramento (Súmula 362 do STJ) e acrescidos juros de mora de 1% ao mês, desde a data do evento danoso ou do primeiro desconto indevido. Para a repetição de indébito em dobro faz-se necessária a prova do pagamento indevido e da má-fé do credor”. (TJ-MG - AC: 10000221983927001 MG, Relator: José Flávio de Almeida, Data de Julgamento: 14/10/2022, Câmaras Cíveis / 12ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 17/10/2022) (Destaquei)
“EMPRÉSTIMOS CONSIGNADOS - Ação declaratória de inexistência de relação jurídica c.c. repetição de indébito e danos morais julgada improcedente, com condenação do autor por litigância de má-fé - Inconformismo do autor - Refinanciamentos de empréstimos consignados por meio de assinatura digital (biometria facial) - Falta de comprovação da existência dos contratos primitivos que deram origem aos refinanciamentos - Fotografia selfie que não é suficiente para reconhecimento da validade da assinatura digital por biometria facial, diante das circunstâncias do caso concreto - Indícios de fraude na contratação - Valores descontados do benefício previdenciário do recorrente que lhe devem ser restituídos pelo banco recorrido, na forma simples - Dano moral configurado - Descabimento da condenação por litigância de má-fé - Sentença reformada - RECURSO PROVIDO”. (TJSP - Recurso Inominado Cível 1008440-96.2021.8.26.0077; Relator (a): Camila Paiva Portero; Órgão Julgador: 1a Turma Cível; Foro de Birigui - Vara do Juizado Especial Cível e Criminal; Data do Julgamento: 20/05/2022; Data de Registro: 20/05/2022) (Destaquei)
Acrescento que não pode a instituição financeira demandada simplesmente afirmar que efetuou a transferência do valor emprestado em benefício da requerente, deveria ter produzido prova para tanto. Ressalte-se, ainda, que os ‘prints’ das telas de seus sistemas não se prestam para comprovar a regularidade da disponibilização do numerário. Nesse sentido:
“APELAÇÃO. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. DESCONTOS EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. COMPENSAÇÃO DE VALORES. DESCABIMENTO. AUSÊNCIA DE COMPROVANTE DE TRANSFERÊNCIA. JUNTADA DE PRINT DE TELA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE TRANSFERÊNCIA DE VALORES. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. Versa o caso acerca da possibilidade de compensação entre os valores constantes na condenação com aqueles que, por ventura, tenham sido creditados na conta bancária da promovente, relativos ao reconhecimento da invalidade do contrato de empréstimo consignado objeto da lide que motivou os descontos no benefício previdenciário da autora, ora apelante. Como cediço, a jurisprudência remansosa entende que mera cópia da tela do computador (print screen), por ser documento produzido unilateralmente, não tem o valor de prova, seja por ser confeccionado sem a participação do consumidor, seja por não se submeter ao contraditório e a ampla defesa na sua elaboração. Dessa forma, tendo havido somente a juntada de um print de tela (fl. 198) com “informações de liberação de pagamento”, percebe-se que a instituição financeira não se desincumbiu do encargo de rechaçar as alegações autorais, comprovando fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito da requerente (art. 373, II, do CPC), uma vez que não produziu prova robusta quanto à regularidade da contratação, tampouco quanto à transferência de quaisquer valores. Destaca-se que o documento exibido à folha 198 não serve como prova, porque trata-se de mero print de texto editável, produzido unilateralmente pela parte apelada, cujo conteúdo diverge do extrato bancário da autora, o qual demonstra a inexistência do depósito do valor do empréstimo. Dessarte, merece provimento o recurso sendo forçoso o afastamento da compensação, porquanto não resta comprovado que foram creditados valores na conta bancária da promovente. Recurso CONHECIDO e PROVIDO”. (Apelação Cível - 0020423-56.2017.8.06.0029, Rel. Desembargador (a) EVERARDO LUCENA SEGUNDO, 2a Câmara Direito Privado, data do julgamento: 15/03/2023, data da publicação: 15/03/2023) (Destaquei)
De qualquer forma, ainda que a instituição financeira tivesse comprovado ter liberado valores na conta da requerente, tal fato, por si só, não acarreta a convalidação do contrato.
No caso em tela, tem-se que o comportamento da requerente denota sua boa-fé, tendo mantido em conta a diferença de R$ 21.687,73 (vinte e um mil seiscentos e oitenta e sete reais e setenta e quatro centavos) e comunicado os fatos à autoridade policial para lavratura de boletim de ocorrência e procurado a instituição financeira administrativamente.
Já o banco réu pauta sua defesa na tese de que as transações se deram a partir do dispositivo móvel da própria demandante, com a utilização de senha e token, sem, contudo, apresentar absolutamente nenhuma prova do quanto alegado.
Não bastasse, os extratos juntados pelo próprio banco revelam que as transações refugiam completamente do perfil de movimentação da autora/correntista, o que apenas ressalta a falha na prestação do serviço, não tendo o setor especializado detectado as transações atípicas.
Inafastável, assim, a responsabilidade objetiva da instituição financeira ré.
A propósito:
“AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS GOLPE DA FALSA CENTRAL TRANSAÇÕES BANCÁRIAS REALIZADAS MEDIANTE FRAUDE. Sentença de procedência declarando a inexigibilidade do débito e condenando o réu à obrigação de restituição dos valores descontados e ao pagamento de indenização por danos morais, na quantia fixada em R$ 3.000,00. Inconformismo do requerido. Transações que fogem ao perfil do cliente comunicadas por ele após a fraude Inércia do réu que se limitou a alegar a ocorrência de culpa exclusiva do consumidor. Má prestação do serviço com evidente falha na segurança. Fortuito interno caracterizado. Súmula 479 do STJ. Responsabilidade objetiva do réu Art. 14, caput, do CDC. Apelante que pretende a redução do valor da indenização pelo dano moral - Manutenção do valor fixado. Observância dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Apelante que inovou ao pedir a compensação ou devolução dos valores depositados na conta do autor. INOVAÇÃO RECURSAL. NÃO ADMITIDA. Não se devolve ao tribunal o conhecimento de matéria estranha ao âmbito do julgamento do órgão a quo - Majoração dos honorários sucumbenciais (art. 85, § 11º, do CPC). CONHECERAM DE PARTE DO RECURSO E, NA PARTE CONHECIDA, NEGARAM PROVIMENTO”. (TJSP; Apelação Cível 1044619-23.2022.8.26.0100; Relator (a): Regina Aparecida Caro Gonçalves; Órgão Julgador: Núcleo de Justiça 4.0 em Segundo Grau Turma I (Direito Privado 2); Foro Regional VII - Itaquera - 3a Vara Cível; Data do Julgamento: 04/09/2024; Data de Registro: 04/09/2024) (Destaquei)
“AÇÃO DE RESSARCIMENTO. Sentença de procedência. Irresignação da requerida. APELAÇÃO. PRELIMINARES DE FALTA DE INTERESSE DE AGIR E DE ILEGITIMIDADE PASSIVA. Rejeição. Alegações que, a despeito da inovação recursal, referem-se a matéria de mérito. Observância, ademais, a teoria da asserção. MÉRITO. Golpe da "falsa central". Perícia realizada que constatou que as transferências PIX foram efetivadas por terceiros, sem qualquer exigência dos tradicionais mecanismos de segurança do banco. Transações realizadas em sequência, em curto espaço de tempo e fora do perfil de consumo da correntista. Falha no sistema de segurança do banco. Ônus da prova não satisfeito pela instituição bancária. Responsabilidade objetiva não afastada. Dever de restituição integral. HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA bem arbitrados. Impossibilidade de arbitramento por equidade, ante ao entendimento fixado pelo C. Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Tema 1076 de seus Recursos Repetitivos. Sentença mantida RECURSO DESPROVIDO. (TJSP; Apelação Cível 1014037-43.2022.8.26.0002; Relator (a): Maria Salete Corrêa Dias; Órgão Julgador: 37a Câmara de Direito Privado; Foro Regional II - Santo Amaro - 7a Vara Cível; Data do Julgamento: 23/08/2024; Data de Registro: 26/08/2024) (Destaquei)
Nesta toada, era encargo da instituição financeira demandada demonstrar a regularidade das transações impugnadas pela parte autora, fato que não ocorreu satisfatoriamente. Tratando-se de relação de consumo, incumbe ao polo passivo elidir, satisfatoriamente, o fato constitutivo do direito explicitado na inicial, nos moldes do art. 373, inciso II, do Código de Processo Civil.
Sendo assim, de rigor o acolhimento do pleito de declaração de inexigibilidade dos contratos de empréstimo e das transações fraudulentas e, corolário lógico, da condenação do banco a restituir à autora os valores que lhe pertenciam e foram descontados para pagamento das parcelas dos mútuos, os quais deverão ser apurados em sede de liquidação de sentença.
Considerando que, em que pese fraudulentas as contratações, a autora não nega ter se beneficiado das quantias comprovadamente disponibilizadas pela instituição financeira ré em conta reconhecida e de titularidade da parte, segue impositiva a devolução, pela demandante, do crédito no valor de R$ 21.687,73 (vinte e um mil seiscentos e oitenta e sete reais e setenta e quatro centavos) ainda mantidos na conta da autora e não movimentados pelos estelionatários, em face dos quais o banco réu deve buscar o ressarcimento dos valores remanescentes, que perfazem R$ 9.999,00 (nove mil novecentos e noventa e nove reais), conforme informações da exordial.
Conclusão outra implicaria no enriquecimento sem causa de uma das partes, o que não pode ser albergado por este juízo, sobretudo quando a própria autora asseverou que ainda mantém em conta quantia significativa, resultante das operações fraudulentas perpetradas em sua conta.
Superada a pretensão declaratória e material, os contornos delimitados se fazem necessários igualmente para a análise sobre o pedido de condenação do banco réu pelos danos suportados pela autora, que os reclama em razão da lesão da sua dignidade, confrontada pela conduta ilícita daquele.
Cumpre salientar que a responsabilidade civil decorrente da prática de ato ilícito encontra a sua regulamentação nos artigos 186 e 927 do Código Civil, dos quais se extrai como requisitos que caracterizam o dever de reparar: a configuração de uma conduta culposa, um dano a outrem e o nexo causal entre aquela e o dano causado.
No entanto, por se tratar o caso de indiscutível relação de consumo (Súmula 297 do STJ), a responsabilidade civil por ato ilícito é objetiva, dispensando qualquer traço de culpa, conforme artigo 14 do CDC, já citado.
Desta forma, a instituição bancária responde objetivamente pelos danos causados ao consumidor, em razão da prestação de serviço defeituosa, prescindindo, portanto, de qualquer perquirição acerca do elemento subjetivo (dolo/culpa), conforme preceitua o dispositivo legal acima transcrito, bastando a constatação do dano sofrido pela consumidora e o nexo causal existente entre aquele (dano) e a conduta do fornecedor (falha na prestação do serviço).
No caso em tela, restou demonstrada a ocorrência de dano moral, pois, conforme exposto em linhas pretéritas, o banco não estava autorizado a descontar no benefício da requerente os valores questionados, porquanto a autora não entabulou os contratos.
Na hipótese, o dano moral é ‘in re ipsa’. Nesse sentido, colaciono precedentes do Egrégio Tribunal de Justiça de Goiás:
“APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE ATO JURÍDICO COMBINADA COM RESTITUIÇÃO EM DOBRO DOS VALORES E REPARAÇÃO POR DANOS MORAIS. CONTRATAÇÃO DE EMPRÉSTIMO. FRAUDE PERPETRADA POR TERCEIROS. ASSINATURA FALSA. COMPROVAÇÃO POR PERÍCIA GRAFOTÉCNICA. DANO MORAL OCORRÊNCIA. QUANTUM FIXADO. RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. MANUTENÇÃO. REPETIÇÃO EM DOBRO. PRESENÇA DE MÁ-FÉ. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. INOCORRÊNCIA. SENTENÇA MANTIDA. 1. Sabido que a responsabilidade das instituições financeiras por fortuito interno decorrente de fraudes e delitos cometidos por terceiros é objetiva (súmula 479 do Superior Tribunal de Justiça). 2. No caso, a ilegalidade do ato e a responsabilidade do apelante restam evidenciadas, notadamente pelos documentos acostados nos autos que comprovam a celebração de um segundo contrato (708926257-5), com termos diversos do primeiro (097650961-79), sem o seu consentimento, com evidente aposição de assinatura falsa, atestada por laudo pericial. 3. Na hipótese de transação bancária fraudulenta, torna-se desnecessária a comprovação dos danos morais, porque concebido in re ipsa, sendo suficiente, para tanto, a efetiva demonstração do episódio experimentado pelo jurisdicionado, porque a violação dos direitos da personalidade se revela inerente à ilicitude do ato praticado. 4. Levando-se em consideração as peculiaridades do caso concreto, a situação econômico-financeira do Banco ofensor e do ofendido, a gravidade e a repercussão do fato na vida deste, entende-se que o valor R$ 8.000,00 (oito mil reais), a título de indenização por danos morais, mostra-se razoável. 5. Com relação à repetição do indébito, a restituição do valor em dobro se justifica, tendo em vista que o consumidor teve descontado em seus vencimentos valores indevidos, incidindo na espécie o parágrafo único do art. 42, do Código de Defesa do Consumidor, que dispõe que o consumidor cobrado por quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou, corrigido e acrescido de juros. 6. Com relação ao pedido de condenação do apelante ao pagamento de multa por litigância de mé-fé, constata-se que o autor comprovou o fato constitutivo de seu direito (artigo 373, I, do Código de Processo Civil), de modo que, quando a parte utiliza dos meios disponíveis na lei na busca de direitos dos quais entende ser titular, não incorre em litigância de má-fé, sobretudo porque esta não é presumida. 7. Desprovido o recurso apelatório, cumpre aplicar majoração dos honorários sucumbenciais, nesta seara recursal, para 15% (quinze por cento), conforme artigo 85, § 11, do Código de Processo Civil. RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDO E DESPROVIDO”. (TJGO, PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO -> Recursos -> Apelação Cível 5250351-30.2017.8.09.0051, Rel. Des (a). DESEMBARGADOR ANDERSON MÁXIMO DE HOLANDA, Goiânia - 10ª Vara Cível, julgado em 09/08/2021, DJe de 09/08/2021) (Destaquei)
“APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ANULATÓRIA DE DÉBITO C/C INDENIZATÓRIA. EMPRÉSTIMO NÃO CONTRATADO PELO CONSUMIDOR. MÁ PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. DANO MORAL. VALOR INDENIZATÓRIO. PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. RESTITUIÇÃO. INTERESSE RECURSAL. 1. As instituições bancárias respondem objetivamente pelos danos causados por fraudes ou delitos praticados por terceiros, como abertura de conta-corrente ou recebimento de empréstimos mediante fraude ou utilização de documentos falsos, porquanto tal responsabilidade decorre do risco do empreendimento, caracterizando-se como fortuito interno (inteligência da súmula 479 do STJ). 2. A reparação dos danos morais, no caso, independe de prova do prejuízo, pois decorre do próprio evento danoso, sendo o dano considerado in re ipsa. 3. A fixação do valor devido, a título de danos morais, deve obedecer aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, servindo como forma de compensação da dor impingida e, ainda, como meio de coibir o agente da prática de outras condutas semelhantes. 4. Falta interesse recursal ao apelante, quando pleiteia reforma da sentença na parte em que não foi sucumbente. APELO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESTA PARTE, PARCIALMENTE PROVIDO”. (TJGO, Apelação (CPC) 0360912- 80.2015.8.09.0051, Rel. CARLOS HIPOLITO ESCHER, 4a Câmara Cível, julgado em 27/02/2018, DJe de 27/02/2018) (Destaquei)
Assim, uma vez firmada a existência dos danos morais, passo a analisar o quantum indenizatório.
A fixação do quantum da reparação do dano moral é matéria de assaz controvérsia doutrinária e jurisprudencial diante da ausência de critérios legais objetivos. O art. 944 do Código Civil prescreve que a indenização se mede pela extensão do dano, que no presente revela-se pequena.
A propósito do tema, no que concerne à reparação do dano, oportuno lembrar aqui a lição de Maria Helena Diniz, quando se detém no estudo da fixação do dano moral:
“Na avaliação do dano moral o órgão judicante deverá estabelecer uma reparação equitativa, baseada na culpa do agente, na extensão do prejuízo causado e na capacidade econômica do responsável. Na reparação do dano moral o juiz determina, por equidade, levando em conta as circunstâncias de cada caso, o quantum da indenização devida, que deverá corresponder à lesão e não ser equivalente, por ser impossível tal equivalência”. (in Cursos de Direito Civil Brasileiro - Vol. VII 5ª ed. - Saraiva - 1990 - p.79)
Assim, tenho que o quantum indenizatório deva ser arbitrado em R$ 10.000,00 (dez mil reais), valor que preenche o caráter punitivo e compensatório da reparação, bem como a proibição do enriquecimento sem causa da parte, estando em conformidade com a capacidade econômica do ofensor, a natureza e a extensão da lesão, pautado nos princípios da proporcionalidade e razoabilidade, sobretudo porque, na hipótese, não houve outras consequências, como negativação indevida, por exemplo.
Diante do todo acima exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos iniciais para:
i) declarar a inexistência de qualquer débito oriundo da renegociação do contrato de nº. 808381761, bem como dos contratos nº. 808381753, nº. 808381760 e nº. 808381752, restabelecendo-se/mantendo-se os contratos originais e comprovadamente firmados pela autora (de nº. 804392553 e nº. 808381761), nos exatos moldes contratados;
ii) condenar a instituição financeira ré à restituição dos valores descontados indevidamente em razão das operações reconhecidamente fraudulentas, acrescidos de correção monetária pelo IPCA-IBGE, desde as datas de cada desconto e de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, a contar da citação, a serem apurados na fase de liquidação de sentença;
iii) condenar a instituição financeira requerida a pagar à parte autora, a título de indenização por danos morais, a quantia equivalente a R$ 10.000,00 (dez mil reais), que deverá ser acrescida de correção monetária, pelo IPCA-IBGE, a partir desta data, e de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, a partir da citação;
iv) determinar que a parte autora proceda ao depósito judicial da quantia atinente aos créditos efetuados pela instituição financeira ré em virtude dos negócios jurídicos cuja nulidade restou declarada nesta oportunidade e que remanescem na conta bancária da demandante, no importe de R$ 21.687,73 (vinte e um mil seiscentos e oitenta e sete reais e setenta e quatro centavos), os quais deverão ser devolvidos ao banco réu, após o trânsito em julgado, por meio de alvará/transferência eletrônica, cuja expedição fica, desde já, autorizada.
Por conseguinte, EXTINGO o processo, com resolução de mérito, com fundamento no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil.
Atenta ao princípio da causalidade, condeno unicamente a parte requerida, sucumbente, ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, os quais fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação total, nos termos do artigo 85, § 2º, do Código de Processo Civil.
Proceda-se à apuração das custas finais. Após, encaminhe-se ao setor competente.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Transcorrido o prazo recursal, certifique-se o trânsito em julgado e arquivem-se os autos, com as cautelas devidas e baixas de praxe.
No caso de oposição de embargos de declaração, havendo possibilidade de serem aplicados efeitos infringentes, deverá a parte contrária ser intimada para manifestação no prazo legal.
Interposto recurso de apelação, intime-se a parte recorrida para apresentar contrarrazões, no prazo legal de 15 (quinze) dias, conforme preconiza o artigo 1.010, § 1º, do Código de Processo Civil.
Se apresentada apelação adesiva pela parte recorrida, na forma do artigo 997, do Código de Processo Civil, intime-se a parte contrária para contrarrazões no prazo de 15 (quinze) dias, de acordo com o artigo 1.010, § 2º, do Código de Processo Civil.
Caso as contrarrazões do recurso principal ou do adesivo ventilem matérias elencadas no artigo 1.009, § 1º, do Código de Processo Civil, intime-se a parte recorrente para se manifestar, no prazo de 15 (quinze) dias, conforme o artigo 1.009, § 2º, do Código de Processo Civil.
Após, encaminhem-se os autos ao Egrégio Tribunal de Justiça de Goiás, com as homenagens de estilo, ressaltando-se que o juízo de admissibilidade do recurso será efetuado direta e integralmente pela Corte, segundo o teor do artigo 932 do Código de Processo Civil.
Cumpra-se.
Goiânia/GO, data da assinatura eletrônica.
(assinado digitalmente)
Tatianne Marcella Mendes Rosa Borges Mustafa
Juíza de Direito
03
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