Processo nº 5029742-86.2024.8.09.0011
ID: 337335819
Tribunal: TJGO
Órgão: Aparecida de Goiânia - UPJ Varas Criminais: 1ª, 2ª, 3ª e 4ª
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Nº Processo: 5029742-86.2024.8.09.0011
Data de Disponibilização:
29/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
OSMAR FERREIRA RIBEIRO JUNIOR
OAB/GO XXXXXX
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JOSIANE ALVES DA COSTA
OAB/GO XXXXXX
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Comarca de Aparecida de Goiânia-Goiás Aparecida de Goiânia - UPJ Varas Criminais: 1ª, 2ª, 3ª e 4ª 3ª Vara Criminal E-mail: gabvarcri3aparecida@tjgo.jus.brGabinete Virtual: (62) 99335-5…
Comarca de Aparecida de Goiânia-Goiás Aparecida de Goiânia - UPJ Varas Criminais: 1ª, 2ª, 3ª e 4ª 3ª Vara Criminal E-mail: gabvarcri3aparecida@tjgo.jus.brGabinete Virtual: (62) 99335-5498 - Balcão Virtual UPJ: (62) 3238 – 5147Autos n.º: 5029742-86.2024.8.09.0011Natureza: PROCESSO CRIMINAL -> Procedimento Comum -> Ação Penal - Procedimento OrdinárioAcusado (a): LUCAS PEREIRA SOARESSENTENÇAO MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS, por intermédio de seu ilustre representante legal, em exercício neste juízo, no uso de suas atribuições legais, ofereceu denúncia em desfavor de LUCAS PEREIRA SOARES, devidamente qualificado na peça inicial acusatória, imputando-lhe a prática do delito descrito no artigo 304, c/c artigo 299, ambos do Código Penal.Devidamente descritos na peça vestibular acusatória nos seguintes termos:“No dia 17 de janeiro de 2024, na residência situada na Rua 204, quadra 14, lote 12, casa 02, Setor Aeroporto Sul, em Aparecida de Goiânia-GO, o denunciado Lucas Pereira Soares, agindo de forma livre e consciente, fez uso de documentos públicos falsificados, sendo eles carteira nacional de habilitação e identidade civil falsificadas, nos quais inseriu declarações falsas, com o fim de criar direito e alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante, conforme Registro de Atendimento Integrado n° 33853080 (fls. 146/150 - PDF), termo de exibição e apreensão (fls. 136/137 - PDF), Relatório Papiloscópico n° 72/2024 (fls. 204/211) e laudo documentoscópico (fls. 217/229 - PDF). 2. Descrição dos Atos Criminosos Infere-se dos autos que no dia 16 de janeiro de 2024, a equipe da Delegacia Estadual de Investigações Criminais - DEIC, recebeu a informação que um indivíduo foragido, de nome Lucas Pereira Santos, estaria residindo na cidade de Aparecida de Goiânia-GO e utilizava documentação falsa em nome de Fabiano Soares Santos. Ato contínuo, foi instaurado procedimento de investigação preliminar, sendo confirmado que havia dois mandados de prisão em aberto no nome de LUCAS. Nesta senda, ao verificarem o sistema do Detran-PA, foi possível perceber que a Carteira Nacional de Habilitação de Fabiano possuía a foto de LUCAS. Na sequência, os policiais civis realizaram diversas diligências, a fim de localizar LUCAS, sendo que no dia 17 de janeiro de 2024, decidiram fazer “campana” em frente à residência da suposta esposa de Lucas, situada na Rua 204, quadra 14, lote 02, Setor Aeroporto Sul, em Aparecida de Goiânia-GO. Depois de algum tempo, os policiais civis visualizaram Lucas ingressando na residência, oportunidade que decidiram abordá-lo. Durante a abordagem, o denunciado se identificou e apresentou Carteira Nacional de Habilitação em nome de Fabiano Soares Santos. Os policiais confrontaram o denunciado, que confessou que se chamava Lucas Pereira Soares, e que utilizava a CNH e a identidade falsas, a fim de ocultar seus mandados de prisão em aberto. Assim, constatada a situação de flagrância, o denunciado foi preso em flagrante e conduzido à Delegacia de Polícia competente para as providências cabíveis. Posteriormente, o Relatório Papiloscópico n° 72/2024 (fls. 204/211 PDF, ev. 56) e laudo documentoscópico (fls. 217/229 - PDF, ev. 59) demonstraram que os documentos foram expedidos pelos órgãos oficiais, o que comprovou que os documentos eram materialmente verdadeiros, mas o conteúdo era forjado/falso.”A denúncia foi recebida e determinada citação do acusado em 05 de março de 2024 (fls. 252/254 - PDF).Devidamente citado (fls. 285/286 - PDF), o acusado apresentou Resposta Escrita à Acusação (fls. 288 - PDF).Em audiência de instrução de julgamento no dia 01/04/2024, foram ouvidas duas testemunhas arroladas pela acusação, Marcelo Estevan Machado e Fábio Lacerda, duas testemunhas arroladas pela defesa, Sabrina e Mayara Cristina, e procedeu-se ao interrogatório do acusado (fls. 326/327 - PDF / mídia - ev. 107 e 108).Na fase subsequente, conforme o artigo 402 do Código de Processo Penal, a defesa solicitou que se fizesse constar nos autos a devolução dos documentos submetidos a perícia e que lhe fosse concedido um prazo para apresentar sua manifestação.Os documentos foram de fato devolvidos ao cartório judicial, e a defesa foi formalmente notificada sobre este fato (fls. 329/330 - PDF). Contudo, a defesa permaneceu omissa, não se manifestando no prazo concedido.Oferecidas as alegações finais sob a forma de memoriais escritos (evento 232), a ilustre representante do Ministério Público, após analisar o conjunto probatório, pugnou pela condenação do acusado no que tange ao crime do artigo 304 do Código Penal e pela absolvição quanto ao delito do artigo 299 do mesmo diploma legal, em razão da ausência de provas de que ele foi o autor da falsidade ideológica.Por sua vez, em alegações finais, também sob a forma de memoriais escritos (evento 271), a defesa requereu preliminarmente a nulidade da prova obtida por violação à cadeia de custódia e por ilegalidade do ingresso em domicílio, requerendo o desentranhamento das provas ilícitas e a consequente absolvição. Argumentou a ausência de prova material (o documento original não foi apresentado) e a falta de comprovação do uso do documento falso pelo acusado, bem como a falta de prova da autoria da falsidade ideológica, pugnando pela absolvição com base no artigo 386, VII do Código de Processo Penal e no princípio do in dubio pro reo. No mérito, subsidiariamente, requereu a fixação da pena no mínimo legal, a aplicação da detração e o direito de recorrer em liberdade.Certidão de antecedentes criminais em evento de n.º 247.Vieram-me os autos conclusos para sentença.É o suficiente relatório. Fundamento e decido.DAS PRELIMINARESDA QUEBRA DA CADEIA DE CUSTÓDIAA defesa sustenta a nulidade das provas documentais e periciais, alegando que apenas cópias dos documentos foram juntadas aos autos e que a cadeia de custódia foi violada, pois os policiais não souberam informar o paradeiro do documento original apreendido.Sem razão a defesa.A cadeia de custódia, regulamentada pelo artigo 158-A e seguintes do Código de Processo Penal, visa garantir a idoneidade e a confiabilidade da prova, documentando seu histórico desde a coleta até o descarte. Contudo, a sua inobservância não acarreta, por si só, a nulidade automática de todo o acervo probatório, devendo ser analisada no contexto das demais provas produzidas e se a alegada falha comprometeu a substância da prova ou gerou prejuízo concreto à defesa.No caso dos autos, a imputação principal refere-se ao crime de uso de documento falso (art. 304 CP). A materialidade e a autoria deste delito podem ser comprovadas por diversos meios de prova, não se restringindo unicamente à apreensão e perícia do documento original.Os policiais civis Marcelo Estevan Machado e Fábio Lacerda de Macedo, em seus depoimentos judiciais (mídia audiovisual - mov. 107), foram uníssonos ao afirmar que o acusado, ao ser abordado, identificou-se como Fabiano Soares Santos e apresentou documentos (CNH e RG) com sua foto, mas em nome de Fabiano. O policial Fábio Lacerda, inclusive, confirmou ter sido ele quem pegou a carteira apresentada pelo acusado. O policial Marcelo Estevan Machado confirmou ter retirado fotos dos documentos do sistema e verificado que se tratava de CNH e RG em nome de Fabiano.O crime de uso de documento falso consuma-se com a efetiva utilização do documento ideologicamente ou materialmente falso, com a finalidade de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante. A apresentação dos documentos aos policiais, com o intuito de ocultar sua verdadeira identidade e status de foragido, configura o ato de "uso" previsto no tipo penal do artigo 304 do Código Penal.A propósito, vejam-se os entendimentos do Superior Tribunal de Justiça:RECURSO ESPECIAL. USO DE DOCUMENTO FALSO. CRIME FORMAL. CARACTERIZAÇÃO . UTILIZAÇÃO. RECURSO PROVIDO. 1. "É pacífico o entendimento neste Superior Tribunal de Justiça de que, tratando-se de crime formal, o delito tipificado no artigo 304 do Código Penal consuma-se com a utilização ou apresentação do documento falso, não se exigindo a demonstração de efetivo prejuízo à fé pública nem a terceiros" ( AgInt no AREsp 1 .229.949/RN, Relatora Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 06/03/2018, DJe 14/03/2018). 2. Recurso provido . (STJ - REsp: 1722241 SP 2018/0025557-1, Relator.: Ministro JORGE MUSSI, Data de Julgamento: 05/06/2018, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 15/06/2018) - grifeiHABEAS CORPUS. PENAL. USO DE DOCUMENTO FALSO. CONDENAÇÃO . ALEGAÇÃO DE NULIDADE DA AÇÃO PENAL ANTE A FALTA DE LAUDO PERICIAL. DISPENSÁVEL. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS POR OUTROS MEIOS DE PROVA. CRIME INSTANTÂNEO QUE SE CONSUMA COM O USO DO DOCUMENTO FALSO . APLICAÇÃO DO ART. 182 DO CPP. ORDEM DENEGADA. 1 . No crime de uso de documento falso a prova pericial pode ser dispensada, quando o acervo probatório mostrar-se suficiente para revelar a existência do crime e sua autoria e firmar o convencimento do magistrado. 2. A ausência do laudo pericial não afasta o crime de uso de documento falso, que se consuma com a simples utilização de documentos comprovadamente falsos, data a sua natureza de delito formal. 3 . Ordem denegada. (STJ - HC: 112895 MG 2008/0173348-6, Relator.: Ministra LAURITA VAZ, Data de Julgamento: 16/11/2010, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 06/12/2010) - grifeiAinda,RECURSO DE APELAÇÃO - USO DE DOCUMENTO FALSO - APRESENTAÇÃO DE CARTEIRA DE IDENTIDADE FALSIFICADA NO MOMENTO DA ABORDAGEM - INTUITO DE EVITAR CUMPRIMENTO DE MANDADO DE PRISÃO EM ABERTO - PROVAS DA MATERIALIDADE E AUTORIA ROBUSTAS A COMPROVAR A PRÁTICA DO CRIME - DEPOIMENTO POLICIAL REPETIDO EM JUÍZO SOB O CRIVO DO CONTRADITÓRIO - ENUNCIADO 08 DA TCCR/TJMT - VALIDADE - CRIME FORMAL QUE SE CONSUMA COM A SIMPLES UTILIZAÇÃO DO DOCUMENTO FALSO - CONDENAÇÃO MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO. 1. Estando seguras, coerentes e em harmonia com as demais provas produzidas nos autos e, inexistindo qualquer suspeita sobre as declarações de policial civil, repetidas na fase judicial, sob o crivo do contraditório, merecem relevância os depoimentos de agentes públicos, podendo ser considerados para embasar o juízo de condenação contra o Apelante, conforme orienta o Enunciado n. 08 da TCCR/TJMT . 2. De acordo com a jurisprudência do STJ, o tipo penal do art , 304 do CP constitui crime formal, consumando-se, portanto, com a simples utilização do documento falso, não se exigindo a demonstração de efetivo prejuízo à fé pública ou a terceiros (AgInt no AREsp n. 1.229 .949/RN). 3. Na espécie, inviável a absolvição com base na tese da negativa do Apelante de que teria exibido o documento quando da abordagem policial, uma vez que inverossímil, inconsistente e isolada no contexto dos autos, não sendo suficiente para desconstituir todo o conjunto probatório apresentado, que demonstra de forma clara e consistente a prática do crime de uso de documento falso, no intuito de evitar o cumprimento de mandado de prisão em aberto que pesava contra si. 4 . Recurso desprovido, em consonância com o parecer ministerial. (TJ-MT - APELAÇÃO CRIMINAL: 00010448120198110042, Relator.: MARCOS REGENOLD FERNANDES, Data de Julgamento: 16/07/2024, Segunda Câmara Criminal, Data de Publicação: 19/07/2024) - grifeiAdemais, os autos contam com o Relatório Papiloscópico n° 72/2024 (mov. 56) e o Laudo de Exame Documentoscópico RG n° 3.556/2024 (mov. 59), que, embora possam ter sido baseados em cópias ou digitalizações dos documentos apreendidos, foram capazes de atestar a discrepância entre a identidade constante nos documentos (Fabiano Soares Santos) e a identidade do acusado (Lucas Pereira Soares), confirmada pelas impressões digitais e foto. O Laudo Documentoscópico, inclusive, atestou que a CNH era "materialmente autêntica", mas com conteúdo falso (ideologicamente falsa), e que a identidade civil tinha "espelho autêntico".Ainda que a manipulação posterior do documento original possa ser questionável sob a ótica da cadeia de custódia, a prova do uso e da falsidade do conteúdo (ideológica) foi produzida por outros meios, como a prova testemunhal (depoimento dos policiais sobre a apresentação dos documentos) e a prova pericial (análise das características e conteúdo dos documentos apresentados, comparados com dados oficiais). A ausência do documento original em juízo, ou a falha em documentar seu manuseio após a apreensão, não invalida a prova do fato de que o acusado usou um documento com conteúdo falso no momento da abordagem.O prejuízo à defesa não restou demonstrado de forma concreta. A defesa teve acesso às cópias dos documentos e aos laudos periciais, podendo contraditá-los. A alegação de que "cópia não é documento" para fins penais não se sustenta no contexto do crime de uso de documento falso, especialmente quando a falsidade é ideológica e o uso é comprovado por outros meios. O que importa é que o acusado fez uso de um documento que continha informações falsas sobre sua identidade, independentemente de a perícia ter sido feita sobre o original ou uma cópia fidedigna a ele.Portanto, rejeito as preliminares de quebra da cadeia de custódia e ausência de prova material por uso de cópias. INVASÃO DE DOMICÍLIO, BASEADA EM DENÚNCIA ANÔNIMA – NULIDADE DA PROVAA defesa alega que o ingresso dos policiais na residência do acusado foi ilegal, por ter sido baseado unicamente em denúncia anônima, sem prévia autorização judicial ou fundadas razões que justificassem o flagrante delito antes da entrada, violando o artigo 5º, inciso XI, da Constituição Federal e o artigo 157 do Código de Processo Penal.Também sem razão a defesa neste ponto.A inviolabilidade do domicílio, garantia fundamental prevista no artigo 5º, inciso XI, da CF, comporta exceções, entre elas o flagrante delito e o cumprimento de determinação judicial. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (Tema 280) e do Superior Tribunal de Justiça consolidou o entendimento de que o ingresso em domicílio sem mandado judicial de busca e apreensão é lícito em caso de flagrante delito ou para cumprimento de mandado de prisão, desde que existam fundadas razões que indiquem a ocorrência do crime ou a presença do procurado antes da entrada, e que a medida seja controlada judicialmente a posteriori, vejam-se recentes entendimentos jurisprudenciais:AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. BUSCA RESIDENCIAL. PRESENÇA DE FUNDADAS RAZÕES (JUSTA CAUSA) PARA A VISTORIA REALIZADA NA RESIDÊNCIA DO ACUSADO E NUM ENDEREÇO CONTÍGUO . CUMPRIMENTO DE MANDADO DE PRISÃO. APREENSÃO DE ARMAS E MUNIÇÕES. AGRAVO IMPROVIDO. I – É de considerar-se legítima a atuação dos policiais civis que executaram a prisão em flagrante do acusado . Isso porque os referidos agentes públicos, munidos do mandado de prisão contra ele expedido, obtiveram prévias informações sobre o seu endereço residencial, bem como sobre a existência de armas de fogo no local. Ao encontrá-lo, deram-lhe voz de prisão, mas ele resistiu à ordem dos policiais. Depois de contê-lo, os policias realizaram uma busca no imóvel, onde localizaram uma arma de fogo e munições. Em seguida, em outra residência ligada ao paciente, encontraram mais uma arma de fogo e munições . Todos esses artefatos são objeto da ação penal ora questionada. Essas circunstâncias, no meu entendimento, constituem elementos mínimos a caracterizar fundadas razões (justa causa) para legitimar a prisão em flagrante. II – Considerando que o art. 240 do Código de Processo Penal abarca tanto a busca domiciliar quanto a busca pessoal, nele elencando as hipóteses de sua incidência, é possível aplicar, na espécie, o mesmo entendimento sedimentado pelo Plenário deste Supremo Tribunal Federal no RE 603 .616/RO, de relatoria do Ministro Gilmar Mendes, julgado sob a sistemática da Repercussão Geral (Tema 280). III – Agravo regimental improvido. (STF - RHC: 234187 ES, Relator.: Min. CRISTIANO ZANIN, Data de Julgamento: 19/12/2023, Primeira Turma, Data de Publicação: PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 01-02-2024 PUBLIC 02-02-2024)AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. CONDENAÇÃO. TRÁFICO DE DROGAS. FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO PÚBLICO . TESE DE INVASÃO DOMICILIAR. MANDADO DE PRISÃO EM ABERTO. DESVIO DE FINALIDADE. INOCORRÊNCIA IN CASU . CONDIÇÃO DE FORAGIDO. INFORMAÇÕES DO PARADEIRO. ENTRADA FRANQUEADA. DROGAS SOBRE BANCADA VISÍVEL AOS POLICIAIS . NOVO FLAGRANTE. PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO PELA NULIDADE. IMPOSSIBILIDADE. NO MAIS, NECESSIDADE DE REVOLVIMENTO DO ACERVO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS . SÚMULA N. 182, STJ. AGRAVO DESPROVIDO. I - Nos termos da jurisprudência consolidada nesta Corte, cumpre ao agravante impugnar especificamente os fundamentos estabelecidos na decisão agravada . II - No caso concreto, a abordagem inicial foi realizada em nítida situação de cumprimento de mandado de prisão (em aberto) contra um foragido (o agravante), cujo paradeiro foi obtido pelo sistema de informações da polícia. Ademais, nesse cumprimento de mandado, os policiais obtiveram a entrada franqueada por moradora e, além disso, as drogas que ensejaram o novo flagrante estavam sobre uma bancada de fácil visualização pelos policiais, razão pela qual não há falar em desvio de finalidade no cumprimento da ordem de prisão ou mesmo em uma invasão de domicílio sem fundadas razões. Precedentes. III - No mais, assente nesta Corte Superior que o habeas corpus não se presta para a apreciação de alegações com a necessidade de revolvimento do conjunto fático-probatório, inviável na via eleita .Precedentes.Agravo regimental desprovido. (STJ - AgRg no HC: 891482 RN 2024/0047114-5, Relator.: Ministro MESSOD AZULAY NETO, Data de Julgamento: 16/09/2024, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 19/09/2024) - grifeiA análise da justa causa, conforme o entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal (RE 603.616/RO), deve ser feita com base na totalidade das circunstâncias do caso concreto. No caso em tela, os policiais receberam informação de que o acusado, foragido da justiça (portador de mandados de prisão em aberto), estaria residindo no local e utilizando documentos falsos. A existência de mandado de prisão em aberto contra o acusado, confirmada pelos policiais mediante consulta aos sistemas, configurava uma situação que autorizava a sua captura.Os policiais não agiram unicamente com base na denúncia anônima. Conforme seus depoimentos, eles realizaram diligências preliminares, verificando nos sistemas a existência de mandados de prisão em aberto contra Lucas Pereira Soares. Em seguida, dirigiram-se ao endereço indicado e realizaram "campana" (vigilância), momento em que visualizaram o acusado ingressando na residência. Somente após confirmarem visualmente a presença do foragido no local, procederam ao ingresso para executar o mandado de prisão.O ingresso no domicílio para cumprir mandado de prisão contra um foragido, quando há fundadas razões (como a visualização do procurado entrando na residência) para acreditar que ele se encontra no local, é uma exceção legítima à inviolabilidade do domicílio, amparada pela necessidade de dar efetividade às decisões judiciais. A denúncia anônima serviu como ponto de partida para a investigação, mas a decisão de ingressar foi tomada após a confirmação da condição de foragido e a visualização de sua presença no local, configurando fundadas razões para a ação policial de cumprimento do mandado de prisão.É fundamental destacar que o ingresso no domicílio, neste caso, foi motivado e limitado ao estrito cumprimento do mandado de prisão. A residência do acusado não foi violada ou vasculhada de forma exploratória com base na denúncia anônima ou em busca de outros elementos incriminadores. A ação policial se concentrou na localização e captura do indivíduo procurado pela justiça. A prova do uso do documento falso foi obtida no momento da abordagem ao acusado, quando ele tentou se identificar com nome falso e apresentou os documentos, e não em decorrência de uma busca ilegal no interior da residência.Portanto, o ingresso no domicílio foi lícito, justificado pela necessidade de cumprir mandado de prisão contra um foragido, e as provas obtidas em decorrência dessa ação são válidas. A preliminar de nulidade por invasão de domicílio é rejeitada. DO MÉRITOCuidam-se os presentes autos de Ação Penal Pública intentada pelo Ministério Público de Goiás, objetivando apurar no presente processado a responsabilidade criminal de Lucas Pereira Soares, devidamente qualificado na peça inicial acusatória, imputando-lhe a prática do delito descrito no artigo 304, c/c artigo 299, ambos do Código Penal. DO CRIME DE USO DE DOCUMENTO FALSO (ART. 304 DO CÓDIGO PENAL)O objeto jurídico do crime de uso de documento falso é a fé pública, lesada com o uso do documento falso.O crime em tela é formal, não exige resultado naturalístico para a consumação e efetiva-se com o ato de exibição de documento sabidamente falso. Independe da obtenção de proveito ou produção de dano ou do local em que utilizado. Para a caracterização do dolo dessa conduta, basta a voluntariedade na utilização, consistente na atuação livre e consciente do documento falso. Em nada influi se o agente entregou o documento, apresentando-o como se fosse verdadeiro, mediante prévia solicitação da autoridade ou dele fez uso espontâneo. No tocante ao dolo da conduta do réu, registro que a simples apresentação do documento falso configura o crime. O sujeito ativo do crime pode ser qualquer pessoa, inclusive o falsificador. A conduta típica é, fazer uso, é usar, utilizar o documento material ou ideologicamente falso, como se fosse autêntico ou verídico. Com efeito, exige-se para a consumação do crime o dolo, ou seja, vontade de usar o documento falso, sendo indispensável que o agente tenha ciência da falsidade. DA MATERIALIDADEA materialidade delitiva emerge certa e precisa através do Registro de Ocorrência n° 33853080 (mov. 30 - arq. 3); Termo de Exibição e Apreensão (mov. 30 - arq. 3); Relatório Papiloscópico n° 72/2024 (mov. 56 - arq. 1); Laudo de Exame Documentoscópio RG n° 3.556/2024 (mov. 59, arq. 4); Prontuário Civil de Fabiano Soares Santos (mov. 125); Laudo de Exame Documentoscópio Complementar - RG n° 3.556/2024 - complemento (mov. 137, arq. 2); além da prova testemunhal carreada ao bojo dos autos. DA AUTORIA A autoria é induvidosa e recai justamente sobre aquele que ocupa o polo passivo do feito.O policial civil Marcelo Estevan Machado, em seu depoimento (mov. 107, arq. 3), relatou pertencer ao grupo antissequestro. Informou que, em 16 de janeiro de 2024, a equipe policial recebeu a denúncia de que Lucas Pereira Soares estaria fazendo uso de documentos falsos para evitar ser capturado, em virtude da existência de mandados de prisão em aberto contra ele. Posteriormente, ao realizar uma consulta em sistemas, foi encontrada uma Carteira Nacional de Habilitação emitida no Estado do Pará, contendo a fotografia de Lucas, mas registrada em nome de outra pessoa. Em seguida, deslocaram-se até a residência da namorada do acusado, onde constataram que o réu de fato residia. Ao avistar os policiais, ele correu para o quintal e destruiu seu telefone celular.Na ocasião, forneceu um nome falso; no entanto, o policial civil José esclareceu que já havia realizado pesquisas prévias e sabia a verdadeira identidade do acusado. Ato contínuo, o réu confessou que utilizava o documento falso e alegou possuir filhos pequenos, o que o motivava a não querer ser preso.Em seu depoimento em juízo (mov. 107, arq. 1), a testemunha de acusação Fábio Lacerda afirmou que sua equipe policial foi destacada para cumprir um mandado de prisão. Ele mencionou que, inicialmente, havia a informação de que o indivíduo procurado estava utilizando documentação falsa. O depoente narrou que a equipe realizou vigilância em frente à residência identificada pelas investigações preliminares e presenciou a chegada de Lucas ao local.Ao ser abordado, Lucas declarou verbalmente que seu nome era Fabiano e apresentou uma Carteira Nacional de Habilitação em nome de Fabiano. Posteriormente, conforme relatou a testemunha, o acusado confessou aos policiais que estava de fato usando o documento falso, alegando que não queria ser preso.As testemunhas de defesa Sabrina e Mayara Cristina, ouvidas judicialmente (mov. 107, arq. 2 e mov. 108, arq. 2), atestaram não ter conhecimento de informações negativas sobre a conduta do acusado, ressaltando que o conheciam como Lucas.Já o acusado Lucas Pereira Soares negou a prática dos fatos, e declarou que somente falou o nome falso, mas não apresentou nenhum documento em nome de Fabiano.Embora em juízo tenha negado ter apresentado os documentos, afirmando ter apenas verbalizado o nome falso, sua confissão extrajudicial, corroborada pelos depoimentos firmes e coerentes dos policiais que realizaram a abordagem, demonstra a efetiva utilização dos documentos.Conforme os precedentes adotados pelos nossos Tribunais, especialmente pelo Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, os depoimentos de agentes da segurança pública que atuaram no flagrante, efetuando a prisão do acusado, tem valor probante, sendo provas idôneas para o substrato condenatório.A credibilidade da testemunha não decorre de sua condição social ou funcional e o fato de ser policial não a torna impedida e nem suspeita para prestar declarações, devendo seu depoimento ser valorado com as demais provas. Tal entendimento pode ser facilmente extraído do seguinte julgado:EMENTA: RECURSO DE APELAÇÃO. JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL. JOGO DE AZAR (ART. 50 DA LEI DAS CONTRAVENÇÕES PENAIS). TCO CORROBORADO PELA PROVA JUDICIALIZADA. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. DEPOIMENTO PRESTADO POR POLICIAL MILITAR. VALOR PROBANTE. ABSOLVIÇÃO REJEITADA. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.1. Trata-se de apelação interposta por José Luiz Pereira, pugnando pela reforma da sentença prolatada pelo Juiz de Direito, Dr. Mateus Milhomem de Sousa, que julgou procedente a pretensão deduzida na denúncia para condenar o acusado/apelante nas sanções previstas no art. 50 da Lei das Contravenções Penais.2. O Representante do Ministério Público em atuação junto a esta 1ª Turma Recursal, Dr. Eduardo Silva Prego, manifestou-se pelo desprovimento do recurso, conforme se verifica no evento de n. 64.3. Inicialmente, vislumbro que o Apelante pugna pela reforma da sentença prolatada, a fim de absolver o acusado, nos termos do artigo 386, II, V e VII, do Código de Processo Penal. (evento n. 43).4. Nas contrarrazões, o Representante do Ministério Público pondera que a autoria e materialidade foram corroborados por todo o arcabouço probatório, em consonância com as declarações colhidas na fase de investigação, como em juízo, além de que a pena aplicada respeitou o estabelecido no art. 59 do CP e no art. 387 do CPP, devendo ser mantida a sentença prolatada (evento de n. 54).5. Pois bem, no caso em apreço, a materialidade e autoria encontram-se consubstanciadas diante do conjunto de provas coligidas aos autos.6. Observo que, ao contrário do sustentado pelo Apelante, o conjunto probatório produzido nos autos não deixa margem à absolvição, mesmo porque, as provas e indícios colhidos conduzem à versão apresentada pela denúncia, de modo a afastar as considerações de que houvesse qualquer tipo de fragilidade a sustentar a condenação, sendo imperativa, portanto, a manutenção da sentença hostilizada.7. Com relação a infração ora imputada, dispõe o Decreto-Lei nº 3.388/1941 ser contravenção penal as condutas de: ?Art. 50 ? estabelecer ou explorar jogo de azar em lugar público ou acessível ao público, mediante o pagamento de entrada ou sem ele? (caput).8. Da análise do conjunto probatório, em especial os depoimentos testemunhais colhidos em audiência de instrução e julgamento, dúvidas não pairam a respeito da ocorrência do delito praticado pelo apelante, na medida em que foi comprovado que as máquinas caça-níquel apresentavam condições de funcionamento e estavam em local acessível ao público, o que, por si só, já caracteriza a contravenção penal do estabelecimento ou exploração de jogos de azar.9. A respeito da credibilidade das declarações apresentadas pelo policial militar que participou da diligência de apreensão das máquinas ilícitas, esclareço que há muito vem sendo pacificado o entendimento de que ?não há irregularidade no fato de o policial que participou das diligências ser ouvido como testemunha. Ademais, o só fato de a testemunha ser policial não revela suspeição ou impedimento? (STF, HC 76.557/RJ, 2ª Turma, Rel. Min. Carlos Veloso, DJ de 04/08/98) ? destaquei. 10. De acordo com os precedentes adotados pelos nossos Tribunais, especialmente pelo Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, o depoimento de policiais que atuaram no flagrante tem valor probante e são provas idôneas para o substrato condenatório, pois a credibilidade da testemunha não decorre de sua condição social ou funcional e o fato de ser policial não a torna impedida e nem suspeita para prestar declarações, devendo seu depoimento ser valorado com as demais provas. Precedentes: TJGO, 4ª Câmara Criminal. Apelação Criminal nº 5318890- 72.2022.8.09.0051, Rel. Des. Wild Afonso Ogawa, DJ de 25/09/2023; Apelação Criminal nº 5030135-85.2021.8.09.0085, 1ª Câmara Criminal, Rel. Des. Eudélcio Machado Fagundes, DJ de 31/08/2023)11. Desse modo, pelo conjunto probatório formado nos autos (TCO corroborado pela prova judicializada), não há dúvida quanto a materialidade e autoria da contravenção descrita no artigo 50 do Decreto-Lei nº 3.688/41, razão pela qual não há que se falar em absolvição. 12. Precedentes das Turmas: Apelação Criminal. Processo nº: 5109957-60.2023.8.09.0051, Relator: Wagner Gomes Pereira, 1ª Turma Recursal dos Juizados Especiais, julgado em 19/03/2024. Apelação Criminal nº 5617250-10.2019.8.09.0101, 4ª Turma Recursal Relator Élcio Vicente da Silva, DJ de 13/09/2023; Apelação Criminal nº 5623427- 87.2019.8.09.0101, 3ª Turma Recursal, Rel. Juiz Mônica Cezar Moreno Senhorelo, DJ de 11/08/2023.13. Ante o exposto, CONHEÇO da apelação e NEGO-LHE PROVIMENTO, mantendo incólume a sentença proferida, por estes e por seus próprios e jurídicos fundamentos.14. Isento de custas.15. Advirta-se que se opostos embargos de declaração com caráter protelatório, será aplicada multa com fulcro no art. 1.026, § 2º do Código de Processo Civil, se houver nítido propósito de rediscutir o mérito da controvérsia. (TJGO, PROCESSO CRIMINAL -> Recursos -> Apelação Criminal 5000848-23.2021.8.09.0006, Rel. LUIS FLAVIO CUNHA NAVARRO, 1ª Turma Recursal dos Juizados Especiais, julgado em 22/04/2024, DJe de 22/04/2024) – (grifei). O Laudo Papiloscópico confirmou que as impressões digitais nos prontuários civis em nome de Lucas Pereira Soares (RG SSP/GO) e Fabiano Soares Santos (RG SSP/PA) pertencem à mesma pessoa, o acusado Lucas Pereira Soares. O Laudo Documentoscópico, por sua vez, atestou que a CNH em nome de Fabiano Soares Santos era "materialmente autêntica", mas com conteúdo falso (ideologicamente falsa), e que a identidade civil tinha "espelho autêntico".Assim, o conjunto probatório, formado pelos depoimentos dos policiais, a confissão extrajudicial do acusado e os laudos periciais, demonstra de forma inequívoca que o acusado Lucas Pereira Soares fez uso de documentos públicos ideologicamente falsos (CNH e RG em nome de Fabiano Soares Santos, mas com sua foto e digitais), apresentando-os aos policiais com o fim de ocultar sua verdadeira identidade e evadir-se da aplicação da lei penal (possuía mandados de prisão em aberto).A propósito, veja-se o entendimento do Tribunal de Justiça de Goiás:EMENTA: APELAÇÃO CRIMINAL. USO DE DOCUMENTO PÚBLICO FALSO. CONDUTA TÍPICA. SUFICIÊNCIA PROBATÓRIA. CONDENAÇÃO MANTIDA. ALTERAÇÃO DO REGIME DE CUMPRIMENTO DA PENA E SUBSTITUIÇÃO DA SANÇÃO CORPÓREA POR RESTRITIVA DE DIREITOS. INVIABILIDADE. I Suficientemente demonstrado que o apelante apresentou carteira nacional de habilitação falsificada a policiais militares durante abordagem, pouco importando se a exibição foi espontânea ou mediante solicitação da autoridade policial, resta comprovada a materialidade e autoria do crime previsto no artigo 304 do Código Penal. II - Impossível a substituição da pena corporal por restritivas de direitos ou a alteração de regime de cumprimento de pena para o aberto, visto ser o réu reincidente. APELAÇÃO CONHECIDA E DESPROVIDA. (TJGO, PROCESSO CRIMINAL -> Recursos -> Apelação Criminal 5260538- 92.2020.8.09.0051, Rel. Des(a). Fernando de Mello Xavier, 3ª Câmara Criminal, julgado em 29/04/2024, DJe de 29/04/2024) – (grifei). Logo, as provas colhidas ao longo da instrução processual revelaram-se inequívocas quanto à necessidade de imputar ao acusado a responsabilidade pelo uso de documento público falso.Nesse contexto, dúvidas não pairam sobre a existência do crime e de sua autoria, inexistindo qualquer causa excludente de tipicidade, ilicitude ou culpabilidade.Portanto, a conduta do acusado se amolda perfeitamente ao tipo penal do artigo 304 do Código Penal. DO CRIME DE FALSIDADE IDEOLÓGICA (ART. 299 DO CÓDIGO PENAL)O crime de falsidade ideológica (art. 299 CP) consiste em omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante. Trata-se de crime formal, que se consuma com a omissão ou inserção da declaração falsa.No caso dos autos, embora os documentos utilizados pelo acusado fossem ideologicamente falsos (continham informações de Fabiano Soares Santos, mas se referiam a Lucas Pereira Soares), não há nos autos prova suficiente de que foi o próprio acusado Lucas Pereira Soares quem inseriu ou fez inserir as declarações falsas nos documentos. Os laudos periciais indicam que a CNH era "materialmente autêntica" e a identidade tinha "espelho autêntico", o que sugere que os documentos podem ter sido emitidos por órgãos oficiais, mas com base em informações falsas fornecidas por alguém, ou que foram falsificados de forma a imitar documentos autênticos.O Ministério Público, em seus memoriais, reconheceu a ausência de provas quanto à autoria da falsidade ideológica por parte do acusado nesta comarca, pugnando por sua absolvição quanto a este delito e sugerindo a remessa de cópias dos autos à comarca de Marabá-PA para apuração da origem da falsidade.Diante da ausência de prova cabal e inequívoca de que o acusado Lucas Pereira Soares foi o autor da falsidade ideológica (inserção ou omissão das declarações falsas nos documentos), impõe-se a sua absolvição quanto ao crime previsto no artigo 299 do Código Penal, em homenagem ao princípio do in dubio pro reo. DA EMENDATIO LIBELLI (ART. 383 DO CPP)A denúncia oferecida pelo Ministério Público imputou ao acusado a prática dos crimes previstos nos artigos 304 c/c 299 do Código Penal, sob a alegação de que ele teria feito uso de documentos públicos com conteúdo ideologicamente falso.Contudo, durante a instrução processual, não restou demonstrado que o acusado tenha sido o responsável pela inserção ou omissão de declarações falsas nos documentos apresentados, tampouco que tenha induzido funcionário público a confeccioná-los com falsidade ideológica. Os documentos apresentados — carteira nacional de habilitação e carteira de identidade — foram expedidos por órgão oficial, e sua falsidade consistia no uso por terceiro (o acusado), com dados de pessoa diversa.Restou comprovado, por outro lado, que o réu fez uso consciente de tais documentos públicos com dados falsos, conforme confessado no momento da abordagem policial e confirmado pela prova pericial (laudos documentoscópico e papiloscópico). A conduta amolda-se com exatidão ao tipo penal previsto no artigo 304 do Código Penal, que assim dispõe:"Fazer uso de qualquer dos papéis falsificados ou alterados, a que se referem os arts. 297 a 302:Pena - a cominada à falsificação ou à alteração."Trata-se de tipo penal acessório, que remete expressamente à pena do crime de falsificação correspondente. No caso concreto, o documento utilizado é documento público, razão pela qual se aplica, por expressa previsão legal, a pena cominada ao artigo 297, caput, do Código Penal, nos seguintes termos:"Art. 297 - Falsificar, no todo ou em parte, documento público, ou alterar documento público verdadeiro:Pena - reclusão, de dois a seis anos, e multa."Diante disso, impõe-se a emendatio libelli nos termos do artigo 383 do Código de Processo Penal, que autoriza o juiz a dar nova definição jurídica ao fato, sem alteração da imputação fática.A conduta descrita e comprovada nos autos permanece a mesma: o réu fez uso de documentos públicos contendo informações falsas, com o fim de ocultar sua identidade verdadeira e evitar a prisão, conduta esta típica do art. 304 do CP, com pena prevista no art. 297 do mesmo diploma legal.Portanto, ainda que a denúncia não tenha mencionado expressamente o art. 297 do CP como norma penal em branco integradora da sanção do art. 304, nada impede a adequação da capitulação jurídica por meio da emendatio libelli, sem qualquer prejuízo à defesa, pois o fato imputado foi integralmente mantido, garantindo-se o contraditório e a ampla defesa. DISPOSITIVOAnte o exposto, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTE a pretensão punitiva estatal para:a) ABSOLVER o acusado LUCAS PEREIRA SOARES da imputação referente ao crime previsto no artigo 299, caput, do Código Penal, com fundamento no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal;b) CONDENAR o acusado LUCAS PEREIRA SOARES como incurso nas penas do artigo 304 c/c artigo 297, ambos do Código Penal. DOSIMETRIA DA PENA1ª Fase:Culpabilidade: não excede àquele limite da norma penal incriminadora, pelo que deixo de valorá-la negativamente;Antecedentes: são desfavoráveis. Verifico que o acusado possui mais de uma condenação, motivo pelo qual uma será considerada para fins de maus antecedentes criminais (0359835-25.2016.8.09.0011 - com trânsito em julgado em 12/07/2024) e a outra será considerada na segunda fase da dosimetria da pena, como reincidência (0029991-98.2019.8.09.0011 - com trânsito em julgado em 01/07/2021).Conduta social: Trata-se da conduta do agente no trabalho, na sociedade, na família, na escola, na vizinhança, dentre outros. Portanto, esta não lhe é desfavorável, vez que não há provas nos autos que demonstrem o oposto. Personalidade: Trata-se do caráter, da índole do agente, seu perfil psicológico e moral, que é extraído da sua maneira habitual de ser; pode ser voltada ou não para a delinquência. A intensificação acentuada da violência, a brutalidade incomum, a ausência de sentimento humanitário, a frieza na execução do crime, a inexistência de arrependimento ou sensação de culpa são indicativos de má personalidade. Na presente hipótese, não restou configurada qualquer uma destas circunstâncias, o que deverá beneficiar o demandado.Motivos do crime: (considerado como antecedente psicológico que impulsiona a vontade e coloca em movimento a conduta): deixo de considerar esta circunstância como desfavorável ao sentenciado, tendo em vista o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, o qual preleciona que para valoração dos motivos não podem ser considerados desfavoráveis aqueles inseridos no próprio tipo penal;Circunstâncias: A apresentação dos documentos falsos ocorreu durante uma abordagem policial, em sua residência. Normais para o tipo.Consequências: Não há outra consequência que não a própria do tipo.Comportamento da vítima: Não se aplica.Considerando os antecedentes criminais e os motivos do crime, fixo a pena-base acima do mínimo legal. Fixo a pena-base em 02 (dois) anos e 03 (três) meses de reclusão e 11 (onze) dias-multa.No âmbito da segunda fase do procedimento dosimétrico, não milita a favor do réu nenhuma circunstância atenuante, revista no art. 65, do Código Penal. No entanto, se verifica a presença da agravante prevista no art. 61, inciso I, do Código Penal, motivo pelo qual elevo a pena base em 1/6 (um sexto), passando a dosá-la em 2 (dois) anos, 7 (sete) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e 13 (treze) dias-multa.Na terceira fase da pena, não há causas de diminuição e aumento de pena, razão pela qual TORNO DEFINITIVA a pena em 2 (dois) anos, 7 (sete) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e 13 (treze) dias-multa. DO VALOR DA PENA DE MULTAFixo o valor de cada dia-multa em 1/30 (um trigésimo), mínimo legal, do salário-mínimo vigente, corrigido na forma do disposto no artigo 49, § 2º, do Código Penal, e cuja cobrança será feita na forma do artigo 50 do mesmo diploma legal. DO REGIME INICIAL Na sequência, com amparo no art. 33, § 2°, “c” e § 3º, do Código Penal, observado o quantum de pena privativa de liberdade fixada e o fato do acusado ser reincidente, fixo o regime SEMIABERTO para o início do cumprimento da pena.Nesse sentido são os precedentes do Superior Tribunal de Justiça: HC 328.829/SP, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, Sexta Turma, julgado em 10/12/2015, DJe 11/12/2015; HC 330.267/ES, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, Quinta Turma, julgado em 10/12/2015, DJe 9/12/2015; HC 303.602/PR, Rel. Ministro FELIX FISCHER, Quinta Turma, julgado em 2/6/2015, DJe 11/6/2015; AgRg no REsp 1462967/SC, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, Sexta Turma, julgado em 5/2/2015, DJe 20/2/2015 REYNALDO SOARES DA FONSECA, 08/06/2016. DA DETRAÇÃO PENALO § 2º do artigo 387 do Código de Processo Penal, trazido pela Lei nº 12.736/12, estabelece: "§2º - O tempo de prisão provisória, de prisão administrativa ou de internação, no Brasil ou no estrangeiro, será computado para fins de determinação do regime inicial de pena privativa de liberdade". Com efeito, não existe tempo de prisão provisória a ser detraído, conforme determinado pelo artigo 387, § 2º, do CPP, em nada afetará o regime inicial de cumprimento da pena a ser fixado. DA SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE E DA SUSPENSÃO CONDICIONAL DA PENAIncabível, face ao que dispõem os arts. 44, II (reincidência), e 77, inciso I, do CP (reincidência). DO DIREITO DE RECORRER EM LIBERDADEConcedo o réu o direito de recorrer em liberdade, face ao regime inicial fixado para o cumprimento da pena. FIXAÇÃO DO VALOR MÍNIMO PARA A REPARAÇÃO DOS DANOS CAUSADOS PELA INFRAÇÃOInexistindo pedido expresso na denúncia e, portanto, ausente o devido contraditório e ampla defesa nos autos, deixo de fixar o valor mínimo a título de reparação de eventual dano a ser reclamado na esfera cível, sem olvidar que a vítima é a sociedade e o pedido, em tese, se firmaria em prol de indenização a coletividade, nos termos do art. 387, IV, do CP. DOS OBJETOSSe houver vestígios coletados ou objetos apreendidos, estejam ou não armazenados no depósito forense desta comarca, com a real comprovação de propriedade, autorizo de imediato a restituição a quem de direito, por termo nos autos, desde que não sejam instrumento, proveito ou objeto do crime e comprovada a propriedade.Se não for possível a restituição, proceda-se à destruição.Outrossim, havendo valores apreendidos, cuja restituição tenha sido autorizada, e não tenha ocorrido manifestação pelas partes interessadas no prazo de 30 (trinta) dias após a intimação, proceda-se ao depósito ou transferência para a conta do conselho da comunidade.Caso tenha sido autorizada a restituição, não será autorizada a transferência a terceiro sem a expressa outorga de poderes para receber o valor apreendido em nome do beneficiário, devendo constar na certidão elaborada pela Secretaria a devida qualificação do destinatário e original da procuração.Se porventura tais objetos/bens tratarem-se drogas, fica autorizada a incineração, nos termos da Lei 11.343/06 e/ou se forem armas/munições, determino a remessa para providências do Comando do Exército Brasileiro e, caso as Forças Armadas ou Órgãos da Segurança Pública não possuírem interesse nas doações, ficam autorizadas as destruições, bem como as expedições dos documentos pertinentes. DISPOSIÇÕES FINAISRemetam-se cópias da denúncia, das provas relevantes (termos de apreensão, laudos periciais, depoimentos dos policiais) e desta sentença ao Juízo da Comarca de Marabá-PA, conforme requerido pelo Ministério Público, a fim de que sejam apuradas as circunstâncias da falsidade ideológica e, se for o caso, promovida a anulação dos documentos materialmente autênticos emitidos naquele Estado. OPORTUNAMENTE, APÓS O TRÂNSITO EM JULGADO DA SENTENÇA: a) Oficie-se ao TRE-GO, para os fins do art. 15, III, da CF/88, artigo 71, § 2º, do Código Eleitoral e súmula n.º 09 do Colendo Tribunal Superior Eleitoral;b) Oficie-se ao Instituto de Identificação, bem como ao Cartório Distribuidor, para a comunicação e anotação de praxe;c) Expeça-se a competente guia de execução penal, remetendo-a a Vara de Execuções Penais de Goiânia, para a unificação de pena, promoção de eventuais detrações e deferimento de possíveis benefícios, dando vazão ao prescrito no verbete da Súmula no 716, do Supremo Tribunal Federal.d) REMETAM-SE os autos à Contadoria Judicial, para que se apure o valor da multa que se impôse) Intime-se a condenada para efetuar o pagamento da pena de multa, no prazo de 10 (dez) dias.DETERMINO à Serventia que providencie a inclusão da data da sentença e do posterior trânsito em julgado no campo próprio do sistema PJD.Após expedida a Guia de Execução Penal, ARQUIVEM-SE os presentes autos, com as baixas e cautelas de estilo.Publique-se. Registre-se. Intimem-se.Intime-se.Cumpra-se.Aparecida de Goiânia, data e hora do sistema. (ASSINADO ELETRONICAMENTE)Wilsianne Ferreira NovatoJuíza de Direito
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