Processo nº 5087398-97.2025.8.09.0000
ID: 311760397
Tribunal: TJGO
Órgão: Órgão Especial
Classe: DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE
Nº Processo: 5087398-97.2025.8.09.0000
Data de Disponibilização:
01/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
REGINALDO TORRES DE OLIVEIRA
OAB/DF XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO
Tribunal de Justiça do Estado de Goiás
Gabinete Desembargador Carlos França
Ação Direta de Inconstitucionalidade de Lei nº 5087398-97.2025.8.09.0000
Órgão Especial
Comarca …
PODER JUDICIÁRIO
Tribunal de Justiça do Estado de Goiás
Gabinete Desembargador Carlos França
Ação Direta de Inconstitucionalidade de Lei nº 5087398-97.2025.8.09.0000
Órgão Especial
Comarca de Novo Gama
Requerente: Procurador-Geral de Justiça do Estado de Goiás
Ente Federado de Origem: Município de Novo Gama
Relator: Desembargador Carlos França
V O T O
Conforme relatado, trata-se de Ação Direta de Inconstitucionalidade de Lei ajuizada pelo Procurador-Geral de Justiça do Estado de Goiás em relação Lei Complementar nº 1.461, de 07 de julho de 2014, do Município de Novo Gama, sob o fundamento de confronto com o disciplinado nos artigos 85, § 2°, 92, caput, e 132, § 3°, da Constituição do Estado de Goiás.
A inicial sustenta que a Lei Complementar nº 1.461/2014, do Município de Novo Gama, versou sobre matéria relativa ao Plano Diretor sem a realização prévia dos estudos técnicos exigidos e sem a observância da participação popular, mediante audiências públicas, o que configuraria afronta aos artigos 85, § 2º, 92, caput, e 132, § 3º, da Constituição do Estado de Goiás. Diante disso, postulou-se a declaração de inconstitucionalidade formal da norma.
Em atenção ao artigo 6º da Lei n. 9.868/1999, foi determinada a solicitação de informações à Câmara Municipal e ao Prefeito, com posterior intimação da Procuradoria-Geral do Estado e da Procuradoria-Geral de Justiça.
No curso da tramitação desta ADI foram juntadas aos autos cópias do processo legislativo e da certidão referente ao Processo Administrativo nº 3378/2014 (evento nº 9).
A Câmara Municipal, ao se manifestar, pleiteou o sobrestamento do feito em razão da Ação Civil Pública n. 5530990-73.2021.8.09.0160, ou, alternativamente, o reconhecimento da litispendência. No mérito, defendeu a regularidade da norma impugnada, sustentando que esta foi elaborada em conformidade com os princípios constitucionais aplicáveis, respeitando o devido processo legislativo e não infringindo preceitos de ordem orçamentária, jurídica ou administrativa.
O Prefeito de Novo Gama, embora devidamente intimado, manteve-se inerte. Por sua vez, a Procuradoria-Geral do Estado manifestou-se no sentido de que a Lei Complementar nº 1.461/2014 trata inequivocamente de matéria própria do Plano Diretor, ressaltando a ausência de estudos técnicos e de audiências públicas durante sua elaboração. Diante da violação aos dispositivos constitucionais estaduais que asseguram a participação popular e o planejamento técnico das políticas urbanas, a PGE concluiu pela inexistência de presunção de constitucionalidade da norma, deixando, por consequência, de apresentar defesa quanto à sua validade.
A Procuradoria-Geral de Justiça, por sua vez, reiterou seu posicionamento inicial, postulando a declaração de inconstitucionalidade da norma.
Pois bem, como sabido, o controle abstrato de constitucionalidade é exercido, em regra, com relação a normativos dotados de generalidade e abstração, ou seja, àqueles que, por sua natureza, possuem capacidade de incidir sobre situações jurídicas futuras e indeterminadas, disciplinando condutas tanto de particulares quanto do próprio Poder Público.
É dizer, o controle concentrado de constitucionalidade tem como objeto exclusivo os atos normativos que detenham densidade jurídica suficiente para interferir no ordenamento jurídico de maneira geral e abstrata. Para que uma norma possa ser submetida a esse tipo de fiscalização, exige-se que ela seja dotada de autonomia jurídica, abstração, generalidade e impessoalidade — requisitos que lhe conferem a aptidão necessária para funcionar como comando normativo com eficácia vinculante, capaz de orientar condutas estatais e individuais no âmbito do direito positivo.
Colhe-se a jurisprudência do Supremo Tribunal sobre a matéria:
“Esta Corte fixou que "a determinabilidade dos destinatários da norma não se confunde com a sua individualização, que, esta sim, poderia convertê-lo em ato de efeitos concretos, embora plúrimos" (ADI 2.137 MC, rel. min. Sepúlveda Pertence, DJ de 12-5-2000). A lei estadual impugnada consubstancia lei-norma. Possui generalidade e abstração suficientes. Seus destinatários são determináveis, e não determinados, sendo possível a análise desse texto normativo pela via da ação direta. A lei não contém, necessariamente, uma norma; a norma não é necessariamente emanada mediante uma lei; assim temos três combinações possíveis: a lei-norma, a lei não norma e a norma não lei. Às normas que não são lei correspondem leis-medida (Massnahmegesetze), que configuram ato administrativo apenas completável por agente da Administração, portando em si mesmas o resultado específico ao qual se dirigem. São leis apenas em sentido formal, não o sendo, contudo, em sentido material.” (Caderno de Publicações Temáticas – Controle de Constitucionalidade - ADI 820, rel. min. Eros Grau, j. 15-3-2007, P, DJE de 29-2-2008.)
“Atos normativos têm como características essenciais a abstração, a generalidade e a impessoalidade dos comandos neles contidos. São, portanto, expedidos sem destinatários determinados e com finalidade normativa, alcançando todos os sujeitos que se encontram na mesma situação de fato abrangida por seus preceitos. O decreto legislativo que estabelece a suspensão do andamento de uma certa ação penal movida contra determinado deputado estadual não possui qualquer predicado de ato normativo. O que se tem é ato individual e concreto, com todas as características de ato administrativo de efeitos subjetivos limitados a um destinatário determinado. Atos dessa natureza não se submetem, em princípio, à norma do art. 97 da CF/1988, nem estão, portanto, subordinados à orientação da Súmula Vinculante 10.” (Caderno de Publicações Temáticas – Controle de Constitucionalidade - Rcl 18.165 AgR, rel. min. Teori Zavascki, j. 18-10-2016, P,DJEde 10-5-2017.)
Dito isso, percebe-se que a Lei Complementar nº 1.461/2014, do Município de Novo Gama, revela-se plenamente passível de apreciação no âmbito do controle abstrato de constitucionalidade, na medida em que se qualifica como ato legislativo dotado de inequívoca densidade normativa e sem destinatário determinado.
Outrossim, a pretensão de sobrestamento dos autos ou de reconhecimento de litispendência, formulada pela Câmara Municipal de Novo Gama com fundamento na existência da Ação Civil Pública nº 5530990-73.2021.8.09.0160, não merece guarida, não apenas em razão da ausência da tríplice identidade exigida pelo artigo 337, inciso VI, c/c § 1º, do Código de Processo Civil, mas também pela própria natureza e finalidade distintas dos instrumentos processuais manejados.
Cumpre esclarecer que, enquanto a ação civil pública visa à tutela de interesses difusos ou coletivos e admite o controle de constitucionalidade apenas de forma reflexa ou incidental, a ação direta de inconstitucionalidade possui natureza objetiva e tem como escopo exclusivo a aferição da compatibilidade da norma impugnada com o texto constitucional estadual.
Ademais, no controle concentrado de constitucionalidade, não há cognição vinculada a situações concretas e o julgamento proferido possui eficácia erga omnes e efeito vinculante, conforme previsto no artigo 102, § 2º, da Constituição Federal, o que atesta sua independência em relação a ações que pretendem o controle difuso, que geram efeitos inter partes. Não se trata, pois, de litispendência, mas de procedimentos distintos quanto à causa de pedir mediata, à estrutura processual e ao regime de efeitos da decisão, inexistindo, portanto, risco de julgamento conflitante que justifique a suspensão pretendida.
A propósito:
Ação direta de inconstitucionalidade. Litispendência. Extinção do processo. 1 - A litispendência ocorre quando se reproduz ação anteriormente ajuizada que está em curso, em que sejam idênticas as partes, causa de pedir e pedido. 2 - Por se tratar de processo objetivo, cujo efeito de eventual declaração de inconstitucionalidade é erga omnes, o exame da litispendência dispensa a identidade de partes, cabendo o exame somente quanto ao pedido e a causa de pedir. 3 - As ações visam ao mesmo resultado prático: a declaração de inconstitucionalidade da L. Distrital n. 7 .440/24. A litispendência impõe a extinção do processo, sem resolução do mérito, quanto à ação ajuizada por último. 4 - Processo extinto sem resolução do mérito. (TJ-DF 07189138020248070000 1943317, Relator.: JAIR SOARES, Data de Julgamento: 19/11/2024, Conselho Especial, Data de Publicação: 28/11/2024)
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. MUNICÍPIO DE FORMOSA. LEI MUNICIPAL Nº 250/2004 E LEI MUNICIPAL Nº 251/2004. DISCIPLINA DO PLANO DIRETOR E DO USO E OCUPAÇÃO DO SOLO. ATOS NORMATIVOS SUSCETÍVEIS DE CONTROLE ABSTRATO. LITISPENDÊNCIA. NÃO CONFIGURADA. AUSÊNCIA DE PARTICIPAÇÃO POPULAR E DE ESTUDO DE IMPACTO AMBIENTAL . VÍCIO FORMAL. INOBSERVÂNCIA DO DEVIDO PROCESSO CONSTITUCIONAL LEGISLATIVO. 1. Ocorre a litispendência quando se reproduz ação idêntica a outra que já está em curso. As ações são idênticas quanto têm os mesmos elementos, ou seja, quando têm as mesmas partes, a mesma causa de pedir (próxima e remota) e o mesmo pedido (mediato e imediato). Faltante um dos elementos de identidade, não se sustenta o argumento de litispendência, uma vez que se trata, em verdade, de conexão, fato processual que enseja a reunião das causas, para julgamento conjunto. 2. O controle concentrado de constitucionalidade incide, em regra, sobre atos do Poder Público revestidos de suficiente densidade normativa, assim entendidos os que ostentam um coeficiente de generalidade e abstração, que lhes confere a aptidão de reger as condutas estatais e individuais que venham se situar sob a sua incidência, em função dos pressupostos que eles enunciam . 3. No controle constitucional abstrato, compete a esta Corte de Justiça utilizar como parâmetro exclusivo a Constituição Estadual, segundo dispõe o art. 125, § 2º, da Constituição Federal. Precedentes do STF e deste egrégio Sodalício. 4. São inconstitucionais a Lei municipal nº 250, de 20 de dezembro de 2004, que disciplinou o uso e a ocupação do solo no Município de Formosa/GO, e a Lei municipal nº 251/2004, também de 20 de dezembro de 2004, que instituiu o Plano Diretor naquela municipalidade, por vício formal na formação, concernente à ausência de obrigatória participação popular e de estudo de impacto ambiental, pressupostos objetivos que integram o devido processo legislativo constitucional, de conformidade com § 2º do art. 85 combinado com o § 3º do art. 132, todos da Constituição Estadual. Precedentes do TJGO. 5. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE COM PEDIDO JULGADO PROCEDENTE. (TJ-GO - ADI: 00675710620168090000 FORMOSA, Relator.: DES . ELIZABETH MARIA DA SILVA, CORTE ESPECIAL, Data de Publicação: 11/08/2016)
Ademais, conforme bem ressaltou a Procuradoria-Geral de Justiça “se prejudicialidade há entre as ações, por certo é do controle difuso na ação civil pública. Isso porque a decisão proferida na ação direta de inconstitucionalidade operará efeito vinculante em relação ao julgamento da ação civil pública.”.
Afastada essa matéria preliminar, tem-se que a controvérsia central da presente ação cinge-se em examinar a existência de inconstitucionalidade formal da Lei Complementar Municipal nº 1.461/2014, em razão da inobservância dos pressupostos indispensáveis à sua elaboração, especialmente a ausência de estudo técnico prévio elaborado por órgão competente e a omissão quanto à realização de audiências públicas.
Sobre a temática, dispõe a Constituição do Estado de Goiás:
Art. 85. O Plano Diretor, aprovado pela Câmara Municipal, obrigatório para as cidades com mais de vinte mil habitantes, é o instrumento básico da política de desenvolvimento e expansão urbana.
§ 1º A propriedade urbana cumpre a sua função social quando atende às exigências do Plano Diretor, sua utilização respeita a legislação urbanística e não provoca danos ao patrimônio cultural e ambiental.
§ 2º O Plano Diretor, elaborado por órgão técnico municipal, com a participação de entidades representativas da comunidade, abrangerá a totalidade do território do Município e deverá conter diretrizes de uso e ocupação do solo, zoneamento, índices urbanísticos, áreas de interesse especial e social, diretrizes econômico-financeiras, administrativas, de preservação da natureza e controle ambiental.
§ 3º Na elaboração do Plano Diretor, devem ser consideradas as condições de riscos geológicos, bem como a localização das jazidas supridoras de materiais de construção e a distribuição, volume e qualidade de águas superficiais e subterrâneas na área urbana e sua respectiva área de influência.
§ 4º As áreas urbanas com população inferior a vinte mil habitantes deverão elaborar diretrizes gerais de ocupação do território que garantam as funções sociais da cidade e da propriedade, definindo áreas preferenciais para urbanização, regras de uso e ocupação do solo, estrutura e perímetro urbanos.
(…)
Art. 92. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes do Estado e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, eficiência, razoabilidade, proporcionalidade e motivação e, também, ao seguinte:(...)
Artigo 132. O Estado criará organismo, com nível de Secretaria de Estado, para formulação, avaliação periódica e execução da política ambiental, cabendo-lhe apreciar: (...)
§ 3° Todo projeto, programa ou obra, público ou privado, bem como a urbanização de qualquer área, de cuja implantação decorrer significativa alteração do ambiente, está sujeito à aprovação prévia do Relatório de Impacto Ambiental, pelo órgão competente, que lhe dará publicidade e o submeterá à audiência pública, nos termos definidos em lei.
É inequívoco, à luz das normas constitucionais apontadas como parâmetro nesta ação direta, que a elaboração do Plano Diretor exige, como pressupostos indispensáveis, a prévia realização de estudos técnicos por órgão competente e a garantia da participação popular por meio de mecanismos efetivos de audiência pública.
Pode-se afirmar que a inobservância desses pressupostos compromete não apenas a legalidade do procedimento legislativo, mas também a legitimidade democrática do ato normativo, uma vez que suprime a participação social e o devido estudo técnico ambiental.
Ainda sobre a matéria, dispõe o Estatuto da Cidade (Lei n° 10.257/01), cuja observância no processo legislativo municipal é também impositiva:
Art. 40. O plano diretor, aprovado por lei municipal, é o instrumento básico da política de desenvolvimento e expansão urbana.
(...)
§ 4° No processo de elaboração do plano diretor e na fiscalização de sua implementação, os Poderes Legislativo e Executivo municipais garantirão:
I – a promoção de audiências públicas e debates com a participação da população e de associações representativas dos vários segmentos da comunidade;
II – a publicidade quanto aos documentos e informações produzidos;
III – o acesso de qualquer interessado aos documentos e informações produzidos.
Nesse cenário, transcrevo as normas da Lei Complementar Municipal nº 1.461/2014, ora questionada:
“Transforma em área de expansão urbana a área rural que especifica. (...)
Art. 1º. O perímetro urbano do Município de Novo Gama -GO passa a contar com o acréscimno de 147,346 hectares de área rural, situado na Fazenda São Sebastião, confrontado com o Loteamento Sana Clara e demais descrições perimétricas constantes do Memorial Descritivo de fls. 99/102 do processo administrativo nº 003378/2014 e Certidões de Matrículas nº 3342 e nº 3343 do Cartório de Registro de Imóveis de Novo Gama/GO.
Art. 2º A área de que trata o artigo anterior será considerada de expansão urbana e deverá ser utilizada como ZONA DE USO MISTO 1 – ZUM1, nos termos do artigo 13 da Lei Complementar nº 633, de 07 de dezembro de 2006.
Art. 3º A implantação de projetos técnicos de construções civis, paisagismos e outros de natureza assemelhados deverão observar a legislação específica aplicável a cada caso.
Art. 4º. Esta Lei Complementar entra em vigor na data de sua publicação.
Extrai-se que a legislação supratranscrita transformou determinada área rural em zona de expansão urbana e, com isso, promoveu alterações no regramento aplicável ao uso e à ocupação do solo.
Nesse contexto, conforme já exposto, a Constituição do Estado de Goiás, em seu artigo 85, § 2º, estabelece que o Plano Diretor deve ser elaborado por órgão técnico vinculado à estrutura municipal, assegurando-se, nesse processo, a participação de entidades representativas da sociedade. O referido dispositivo exige, ainda, que o plano contenha diretrizes sobre uso e ocupação do solo, zoneamento, parâmetros urbanísticos, áreas de interesse social e ambiental, bem como orientações de ordem econômica, administrativa e ambiental.
Dessa forma, era imprescindível que o processo legislativo correspondente observasse as disposições constitucionais sobre política urbana, previstas nos artigos 84 a 89 da Constituição Estadual, especialmente aquelas que exigem a elaboração prévia de estudos técnicos e a efetiva participação da população.
Contudo, os elementos constantes dos autos demonstram que esses requisitos não foram observados. O Chefe do Poder Executivo limitou-se a mencionar, no art. 2º da norma impugnada, a existência de estudos técnicos vinculados ao Processo Administrativo nº 003378/2014. Todavia, confere-se da documentação juntada nesses autos que os estudos não foram apresentados, o que foi certificado nos autos extrajudiciais, colacionados Procuradoria-Geral de Justiça (evento nº 9).
Diante disso, resta evidente que não houve atuação técnica adequada nem a condução de procedimento administrativo transparente, o que inviabilizou a tomada de decisão fulcrada em elementos especializados, derivados de estudos pertinentes sobre a temática ambiental e também não houve a participação social exigida pela Constituição Estadual.
Assim, tendo sido exercida a competência legislativa em afronta aos pressupostos formais estabelecidos nos artigos 85, § 2º, 92, caput, e 132, § 3º, da Constituição do Estado de Goiás, impõe-se o reconhecimento da inconstitucionalidade formal da norma municipal em questão.
A corroborar, a jurisprudência:
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI MUNICIPAL DE IPORÁ. CRIAÇÃO DE ZONAS DE CHÁCARAS DE RECREIO. MATÉRIA TÍPICA DE PLANO DIRETOR . NECESSIDADE DE PRÉVIO ESTUDO TÉCNICO E CONSULTA POPULAR. Tendo o município de Iporá mais de 20 mil habitantes e tendo sua Lei municipal 1.743/19 tratado de matéria típica de Plano Diretor, eram imprescindíveis os prévios estudos técnicos e a efetiva participação popular para dar legitimidade e validade constitucional formal ao processo legislativo, o que não ocorreu, ferindo, assim, a determinação contida no art. 85, § 2º e 132, § 3º, da Constituição do Estado de Goiás (precedentes desta Corte) . AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE JULGADA PROCEDENTE. (TJ-GO 5614660-67.2022.8.09.0000, Relator Des. Carlos Hipolito Escher, Órgão Especial, Data de Publicação: 23/03/2023)
ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI Nº 400/2016. MUNICÍPIO DE GAMELEIRA DE GOIÁS. CRIAÇÃO DE ZONA DE ESPECIAL INTERESSE . PROCESSO LEGISLATIVO. PARTICIPAÇÃO POPULAR. AUSÊNCIA. Padece de inconstitutucionalidade formal a Lei Municipal nº 400, de 21 de novembro de 2016, de Gameleira de Goiás, que instituiu o ZREITA - Zona Rural de Especial Interesse Turístico e Ambiental, visando a instalação de "condomínios urbanísticos com gestão autônoma" (Chácaras de Recreio/Sítios de Lazer), conquanto, tratou de matéria tipicamente de Plano Diretor, sem assegurar a participação popular em seu processo legislativo, como exige § 2º do art . 85, cumulado com § 3º do artigo 132, todos da Constituição Goiana. Precedentes deste Órgão Colegiado. ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE JULGADA PROCEDENTE. (TJ-GO - ARG: 01541768320178090144, Relator. Des. Leobino Valente Chaves, Data de Julgamento: 01/03/2019, 2ª Câmara Cível, Data de Publicação: DJ de 01/03/2019)
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE – LEI Nº 2.839, DE 19 DE ABRIL DE 2022, DO MUNICÍPIO DE CACONDE, QUE DISPÕE SOBRE A DESAFETAÇÃO DOS SISTEMAS DE LAZER: 1 E 2 DO LOTEAMENTO "JARDIM SANTA LÚCIA"; 1 DO LOTEAMENTO "JARDIM ALVORADA"; 2 DO LOTEAMENTO "JARDIM BELA ESTÂNCIA"; 3 DO LOTEAMENTO "NOVA ESTÂNCIA" E DÁ OUTRAS PROVIDÊNCIAS – NORMA QUE TRATA DO USO E PARCELAMENTO DO SOLO – NECESSIDADE DE REALIZAÇÃO DE ESTUDOS PRÉVIOS – GARANTIA DE PARTICIPAÇÃO POPULAR – MANIFESTA OFENSA AOS ART. 180, II, E 181, § 1º, DA CONSTITUIÇÃO ESTADUAL. 1. No estabelecimento de diretrizes e normas relativas ao desenvolvimento urbano, o Estado e os Municípios assegurarão a participação das respectivas entidades comunitárias no estudo, encaminhamento e solução dos problemas, plano, programas e projetos que lhes sejam concernentes (art. 180, II, CE). 2. Entendimento pacificado do E. Órgão Especial no sentido de que as leis que versam sobre uso e parcelamento do solo urbano devem ser precedidas de estudos técnicos e audiências públicas, garantida a participação da população e de entidades comunitárias. 3. Lei Complementar nº 01, de 16 de dezembro de 2021, que institui o Plano Diretor e a Lei de Uso e Ocupação do Solo do Município de Caconde. Projeto de lei apresentado, votado e aprovado sem planejamento e sem consulta efetiva à população. Inadmissibilidade. Manifesta violação aos artigos 180, II, e 181, § 1º, 191 da Constituição Estadual. Inconstitucionalidade formal. Ação direta procedente. (TJ-SP - Direta de Inconstitucionalidade: 2226757-13.2023.8.26.0000 São José dos Campos, Relator: Décio Notarangeli, Data de Julgamento: 28/02/2024, Órgão Especial, Data de Publicação: 01/03/2024)
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI MUNICIPAL COMPLEMENTAR Nº 904, DE 12 DE ABRIL DE 2023, DO MUNICÍPIO DE SANTA CRUZ DO SUL. INOBSERVÂNCIA DO DEVIDO PROCESSO LEGISLATIVO. ALTERAÇÃO DO PLANO DIRETOR MUNICIPAL . AUSÊNCIA DE PARTICIPAÇÃO POPULAR. VÍCIO FORMAL CARACTERIZADO. 1. Configurada a hipótese de inconstitucionalidade formal, uma vez que a edição da Lei Complementar, versando sobre alterações no diploma que institui o Plano Diretor de Santa Cruz do Sul, não observou o devido processo legislativo, no ponto em que estabelece a necessária participação popular, sendo promulgada em regime de urgência, violando o disposto no artigo 177, § 5º, da Constituição Estadual e, por conseguinte, o artigo 29, XII, da Constituição Federal . 2. Diploma legal em apreço que introduz modificações no regramento concernente ao “núcleo essencial” do Plano Diretor municipal, promovendo alterações quanto ao uso e à ocupação das áreas urbanas, sem ter franqueado à sociedade a possibilidade de analisá-lo e discuti-lo. Precedentes desta Corte. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE JULGADA PROCEDENTE . UNÂNIME.(Direta de Inconstitucionalidade, Nº 70085764793, Tribunal Pleno, Tribunal de Justiça do RS, Relator.: Ricardo Torres Hermann, Julgado em: 18-09-2023). Assunto: Direito Público. Processo legislativo . Ação direta de inconstitucionalidade. Município de Santa Cruz do Sul. Plano Diretor. Núcleo essencial . Modificação. Participação popular. Ausência. CF de 1988, art- 29, inc- XII . CE de 1989, art-177, par-5º. Ofensa. LMC- 904 de 2023, do Município de Santa Cruz do Sul. Inconstitucionalidade formal . Declaração. Pedido. Procedência. (TJ-RS - Direta de Inconstitucionalidade: 70085764793 Porto Alegre, Relator: Ricardo Torres Hermann, Data de Julgamento: 18/09/2023, Tribunal Pleno, Data de Publicação: 28/09/2023)
Pelas razões expostas, julgo procedente o pedido para declarar a inconstitucionalidade formal da Lei Complementar Municipal nº 1.461/2014, do Município de Novo Gama/GO, com efeitos ex tunc.
É como voto.
Goiânia, documento assinado digitalmente nesta data.
Desembargador CARLOS FRANÇA
R E L A T O R
/C15
Ação Direta de Inconstitucionalidade de Lei nº 5087398-97.2025.8.09.0000
Órgão Especial
Comarca de Novo Gama
Requerente: Procurador-Geral de Justiça do Estado de Goiás
Ente Federado de Origem: Município de Novo Gama
Relator: Desembargador Carlos França
A C Ó R D Ã O
Visto, relatada e discutida a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 5087398-97.2025.8.09.0000, acorda o Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, em sessão do Órgão Especial, à unanimidade, em julgar procedente a ação direta de inconstitucionalidade, nos termos do voto do Relator, proferido na assentada do julgamento e que a este se incorpora.
Presidiu o julgamento o Desembargador Leandro Crispim.
Esteve presente à sessão a Doutora Fabiana Lemes Zamalloa do Prado, representando a Procuradoria-Geral de Justiça.
Goiânia, 25 de junho de 2025.
Desembargador CARLOS FRANÇA
R E L A T O R
PODER JUDICIÁRIO
Tribunal de Justiça do Estado de Goiás
Gabinete Desembargador Carlos França
Ação Direta de Inconstitucionalidade de Lei nº 5087398-97.2025.8.09.0000
Órgão Especial
Comarca de Novo Gama
Requerente: Procurador-Geral de Justiça do Estado de Goiás
Ente Federado de Origem: Município de Novo Gama
Relator: Desembargador Carlos França
Ementa: DIREITO CONSTITUCIONAL E URBANÍSTICO. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. AUSÊNCIA DE ESTUDOS TÉCNICOS E DE PARTICIPAÇÃO POPULAR NA ALTERAÇÃO DO PLANO DIRETOR. INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL DA NORMA MUNICIPAL.
I. CASO EM EXAME
1. Ação direta de inconstitucionalidade ajuizada pelo Procurador-Geral de Justiça do Estado de Goiás contra a Lei Complementar nº 1.461/2014, do Município de Novo Gama, por suposta afronta aos artigos 85, § 2º, 92, caput, e 132, § 3º, da Constituição do Estado de Goiás. A norma impugnada transformou área rural em zona de expansão urbana sem a realização de estudos técnicos e sem a garantia da participação popular por meio de audiências públicas. No curso do processo, a Câmara Municipal defendeu a validade da norma e alegou litispendência diante de ação civil pública em trâmite, ao passo que o Prefeito se manteve inerte. A Procuradoria-Geral do Estado e a Procuradoria-Geral de Justiça manifestaram-se pela procedência do pedido.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
2. Há duas questões em discussão:
(i) saber se a existência de ação civil pública com objeto semelhante configura litispendência ou prejudicialidade apta a justificar o sobrestamento da ação direta de inconstitucionalidade ou a sua extinção; e
(ii) saber se a Lei Complementar Municipal nº 1.461/2014 preenche os requisitos formais exigidos pela Constituição do Estado de Goiás para a alteração do Plano Diretor, especialmente no tocante à elaboração de estudos ambientais anteriores por órgão técnico e à efetiva participação popular
III. RAZÕES DE DECIDIR
3. A Lei Complementar nº 1.461/2014, ao alterar o perímetro urbano municipal e dispor sobre zona de uso misto, versa sobre matéria típica de Plano Diretor, cujo trâmite é submetido a exigências constitucionais específicas.
4. As normas constitucionais estaduais estabelecem que qualquer alteração em lei cuja natureza jurídica interfira no Plano Diretor deve ser precedida de estudo técnico e contar com efetiva participação da sociedade civil, mediante a realização de audiências públicas.
5. Não houve comprovação de que os requisitos foram observados. Os autos indicam ausência de estudos técnicos e de participação popular, tornando o processo legislativo viciado quanto à sua formalidade.
6. A alegação de litispendência ou de necessidade de suspensão da ADI não prospera, dada a distinta natureza entre a ação civil pública, que realiza controle incidental de constitucionalidade com efeitos inter partes, e a ação direta de inconstitucionalidade, de natureza objetiva, com efeitos erga omnes.
IV. DISPOSITIVO E TESE
7. Pedido julgado procedente.
Tese de julgamento:
“1. A edição de lei que interfere no Plano Diretor municipal exige a observância dos pressupostos formais previstos na Constituição Estadual, sobretudo a precedência de estudo técnico e a realização de audiências públicas com participação popular efetiva. 2. A ausência desses requisitos acarreta a inconstitucionalidade formal da norma municipal. 3. A existência de ação civil pública com objeto semelhante não configura litispendência nem justifica o sobrestamento da ação direta de inconstitucionalidade, por se tratar de ações distintas quanto à causa de pedir, natureza e efeitos.”
Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 102, § 2º; CE/GO, arts. 85, § 2º, 92, caput, e 132, § 3º; CPC, art. 337, VI e § 1º; Lei nº 10.257/2001, art. 40.
Jurisprudência relevante citada: TJGO, ADI nº 0067571-06.2016.8.09.0000, Rel. Des. Elizabeth Maria da Silva, j. 11.08.2016; TJGO, ADI nº 5614660-67.2022.8.09.0000, Rel. Des. Carlos Hipolito Escher, j. 23.03.2023; TJ-SP, Direta de Inconstitucionalidade nº 2226757-13.2023.8.26.0000, Rel. Décio Notarangeli, j. 28.02.2024; TJ-RS, Direta de Inconstitucionalidade nº 70085764793, Rel. Ricardo Torres Hermann, j. 18.09.2023.
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