Processo nº 5161140-68.2021.8.09.0042
ID: 283546916
Tribunal: TJGO
Órgão: 2ª Câmara Cível
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Nº Processo: 5161140-68.2021.8.09.0042
Data de Disponibilização:
29/05/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
JONATANS TEODORO PEREIRA
OAB/GO XXXXXX
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FREDERICO SILVA AVELAR
OAB/GO XXXXXX
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LEIDYANE GLEYCE DA ROCHA ALVES
OAB/GO XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE GOIÁS
Gabinete do Juiz Substituto em Segundo Grau
Ricardo Silveira Dourado
Apelação Cível nº 5161140-68.20…
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE GOIÁS
Gabinete do Juiz Substituto em Segundo Grau
Ricardo Silveira Dourado
Apelação Cível nº 5161140-68.2021.8.09.0042
Comarca de Fazenda Nova
2ª Câmara Cível
Apelante: Estado de Goiás
Apelados: Ana Flávia Malheiros do Nascimento Rocha e outros
Relator: Ricardo Silveira Dourado – Juiz de Direito Substituto em Segundo Grau
V O T O
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.
Trata-se de apelação (evento 191), interposta pelo Estado de Goiás, contra sentença (evento 186), proferida pelo Juiz de Direito da Vara da Fazendas Públicas da comarca de Fazenda Nova, Drª Laura Amaro de Marco Fonseca, nos autos da ação indenizatória por danos materiais e morais com pedido de averbação premonitória, ajuizada por Carlos Gomes da Rocha e Ana Flávia Malheiros do Nascimento Rocha em desfavor de José Alves de Castro e do Estado de Goiás.
Ação: os autores propuseram ação de indenização por danos materiais e morais, em razão da nulidade da escritura de compra e venda do imóvel adquirido, resultante do reconhecimento judicial de nulidade na procuração pública fraudulenta utilizada no negócio (assinatura falsa), lavrada pelo notário José Alves de Castro. Alegam que houve falha na prestação do serviço notarial, decorrente da ausência de cautela na verificação da autenticidade dos documentos apresentados, razão pela qual atribuem ao Estado de Goiás responsabilidade objetiva, nos termos do art. 37, § 6º, da Constituição Federal. Requerem a condenação ao pagamento de R$ 66.394,97 a título de danos materiais e R$ 16.500,00 por danos morais, bem como a concessão dos benefícios da justiça gratuita, expedição de certidão para averbação premonitória, custas e honorários advocatícios de 20%. A causa foi avaliada em R$ 82.894,97.
Sentenciado o processo (evento 186), a juíza singular, julgou o juízo reconheceu a ilegitimidade passiva do notário José Alves de Castro, extinguindo o processo em relação a ele, com fundamento no art. 485, VI, do CPC. No mérito, afastou a alegação de prescrição e julgou parcialmente procedentes os pedidos para condenar o Estado de Goiás, com base na responsabilidade civil objetiva, ao pagamento de R$ 66.394,97 por danos materiais e R$ 3.000,00 por danos morais, em razão de falha na lavratura de procuração pública com assinaturas falsas que culminou na perda do imóvel adquirido pelos autores. Fixou-se ainda honorários advocatícios em 10% sobre o valor da condenação. A parte dispositiva do ato recorrido restou assim exarada:
Diante do exposto, EXTINGO O PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO em relação ao réu JOSÉ ALVES DE CASTRO, na forma do art. 485, VI, do Código de Processo Civil.
Custas e honorários advocatícios pelo autor, fixados em 10% sobre o valor da causa, com a exigibilidade suspensa em razão da gratuidade de justiça concedida.
Ainda, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos iniciais para condenar o ESTADO DE GOIÁS a ressarcir aos autores a quantia de R$66.394,97 (sessenta e seis mil, trezentos e noventa e quatro reais e noventa e sete centavos), a título de danos materiais, valor este a ser corrigido monetariamente pelo IPCA-E a partir do desembolso e acrescido de juros de mora conforme os índices da caderneta de poupança, desde a citação, em conformidade com a decisão do STF no RE 870947/SE, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 20/9/2017 (repercussão geral) (Info 878). Condeno também o réu ao pagamento de danos morais no importe de R$3.000,00 (três mil reais), com correção monetária desde a presente sentença (súmula 362 do STJ) e juros de mora desde o evento danoso (23 de julho de 2019).
Isento de custas, condeno o Estado em honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da condenação.
Cinge-se o deslinde do recurso ao reexame da sentença, nos seguintes pontos: a) ocorrência de prescrição quinquenal; b) ilegitimidade passiva do Estado e responsabilidade direta do notário; c) ausência de nexo causal; d) desproporcionalidade das indenizações arbitradas; e) aplicação da taxa SELIC como índice unificado de atualização monetária e juros, a partir da EC nº 113/2021.
Adianto que o recurso deve ser parcialmente provido, para reformar parcialmente a sentença apenas para reconhecer a legitimidade passiva do notário José Alves de Castro, imputando-lhe responsabilidade solidária pelos danos causados, mantendo-se, no mais, a condenação do Estado de Goiás em caráter subsidiário.
Conforme disposto no art. 236 da Constituição Federal, os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público, estando os notários sujeitos à fiscalização do Poder Judiciário. Tal modelo estabelece um regime jurídico híbrido, no qual coexistem a responsabilidade pessoal do delegatário e a responsabilidade subsidiária do Estado pelos danos decorrentes da atividade delegada. Veja-se:
Art. 236. Os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público.
§ 1º Lei regulará as atividades, disciplinará a responsabilidade civil e criminal dos notários, dos oficiais de registro e de seus prepostos, e definirá a fiscalização de seus atos pelo Poder Judiciário.
§ 2º Lei federal estabelecerá normas gerais para fixação de emolumentos relativos aos atos praticados pelos serviços notariais e de registro.
§ 3º O ingresso na atividade notarial e de registro depende de concurso público de provas e títulos, não se permitindo que qualquer serventia fique vaga, sem abertura de concurso de provimento ou de remoção, por mais de seis meses.
Cumpre salientar que, à época da lavratura da procuração posteriormente invalidada (16/11/2011), encontrava-se em vigor a redação original do art. 22 da Lei nº 8.935/94, a qual estabelecia a responsabilidade objetiva dos notários e registradores, prescindindo de comprovação de culpa ou dolo. A alteração do regime jurídico para responsabilidade subjetiva somente foi introduzida com o advento da Lei nº 13.286/2016. Veja-se:
Art. 22. Os notários e oficiais de registro são civilmente responsáveis por todos os prejuízos que causarem a terceiros, por culpa ou dolo, pessoalmente, pelos substitutos que designarem ou escreventes que autorizarem, assegurado o direito de regresso. (Redação dada pela Lei nº 13.286, de 2016).
Art. 22. Os notários e oficiais de registro responderão pelos danos que eles e seus prepostos causem a terceiros, na prática de atos próprios da serventia, assegurado aos primeiros direito de regresso no caso de culpa ou dolo de seus prepostos. (redação original)
Por esta razão, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e desta Corte pacificou o entendimento de que, antes das mudanças introduzidas pela Lei 13.286/2016, à Lei dos Cartórios, nos casos de danos resultantes de atividade estatal delegada pelo Poder Público, a responsabilidade do notário e do registrador era pessoal e objetiva. A propósito:
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. ESCRITURA EMITIDA POR FALSO PROPRIETÁRIO. LEGITIMIDADE PASSIVA DO DELEGATÁRIO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DOS TABELIÃES PELOS ATOS PRATICADOS ANTES DA LEI N. 13.286/2016. DEFICIÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO DO RECURSO. SÚMULA N. 284 DO STF. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO DOS FUNDAMENTOS DO ACÓRDÃO RECORRIDO. SÚMULA N. 283/STF. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame. 1. Agravo interno interposto contra decisão que negou provimento a recurso. II. Questão em discussão 2. Controvérsia acerca da legitimidade passiva do tabelionato para responder pelas consequências dos serviços notariais, bem como da possibilidade de alteração do polo passivo da demanda de ofício pelo juízo. III. Razões de decidir 3. A deficiência na fundamentação do recurso, de modo a impedir a compreensão da suposta ofensa ao dispositivo legal invocado, obsta o conhecimento do recurso especial (Súmula n. 284/STF). 4. O recurso especial que não impugna fundamento do acórdão recorrido suficiente para mantê-lo não deve ser admitido, a teor da Súmula n. 283/STF. 5. O tabelionato é ente despersonalizado, e a responsabilidade pelos atos notariais recai sobre o tabelião, nos termos da Lei nº 8.935/94, não havendo ilegalidade na interpretação da petição inicial para identificar corretamente o sujeito passivo. 6. A determinação de quem deve figurar no polo passivo decorreu da própria redação da inicial e das razões apresentadas, não configurando decisão surpresa ou cerceamento de defesa. 7. O reconhecimento da nulidade de atos processuais exige efetiva demonstração de prejuízo suportado pela parte interessada, em respeito ao princípio da instrumentalidade das formas pas de nullité sans grief.8. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça consolidou o entendimento de que a responsabilidade civil dos tabeliães e registradores por atos praticados sob a vigência do art. 22 da Lei nº 8.935/94, em sua redação original, é direta e objetiva, dispensando a demonstração de culpa ou dolo, passando a ser subjetiva apenas com o advento da Lei nº 13.286/2016.9. No caso concreto, restou demonstrado que a parte autora foi vítima de fraude na aquisição de imóvel residencial, em razão da confirmação de idoneidade documental pelo tabelião, configurando-se a responsabilidade objetiva.IV. Dispositivo e tese 10. Recurso especial desprovido. Tese de julgamento: O tabelião é pessoalmente responsável pelos atos notariais praticados antes da vigência da Lei nº 13.286/2016, nos termos da responsabilidade objetiva prevista no art. 22 da Lei nº 8.935/94, em sua redação original.Dispositivos relevantes citados: Art. 22 da Lei n. 8.935/94; Lei n. 13.286/2016; Arts. 108, 329, II, 17, 70, 75, 108, 139, I, 238, 239, §1º, 276 e 492 do CPC/2015.Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no REsp n. 1.829.793/SE, Rel. Min. Marco Buzzi, Quarta Turma, j. 21/10/2019;STJ, AgInt no AREsp n. 202.180/DF, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, j. 29/8/2017; STJ, AgInt nos EDcl no REsp n. 1.596.025/SC, Rel. Min. Moura Ribeiro, Terceira Turma, j. 14/8/2018;STJ, AgInt no AgInt no REsp n. 1.600.098/DF, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, j. 4/12/2023; STJ, AgInt no REsp n. 2.054.274/SP, Rel. Min. Regina Helena Costa, Primeira Turma, j.15/5/2023; STJ, AgInt no AREsp n. 1.924.855/MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, j. 15/12/2022; STF, RE n. 842.846, Rel. Min. Luiz Fux, Tribunal Pleno, j. 27/2/2019; STJ, REsp n. 1.849.994/DF, Rel. Min. Moura Ribeiro, Terceira Turma, j. 21/3/2023.(REsp n. 2.186.036/GO, relator Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, julgado em 17/3/2025, DJEN de 25/3/2025.)
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. RESPONSABILIDADE CIVIL DE TABELIÃES E REGISTRADORES. COMPRA E VENDA DE IMÓVEL ULTIMADA COM BASE EM PROCURAÇÃO PÚBLICA CONTENDO ASSINATURA FALSA. EFICÁCIA VINCULANTE DO RE nº 842.846/SC NÃO VERIFICADA NO CASO CONCRETO. PRETENSÃO INDENIZATÓRIA SUBMETIDA A PRAZO PRESCRICIONAL TRIENAL. PRAZO QUE SE INICIOU COM O TRÂNSITO EM JULGADO DA SENTENÇA QUE ANULOU O ATO NOTARIAL. FATOS OCORRIDOS ANTES DA LEI Nº 13.286/2016, QUE MODIFICOU O ART. 22 DA LEI Nº 8.935/94. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. RECURSO ESPECIAL NÃO PROVIDO.1. A eficácia vinculante da tese fixada no julgamento do RE nº 842.846/SC, Relator o Ministro LUIZ FUX, não tem aplicação na hipótese dos autos.1.1. Naquela oportunidade, o STF examinou, apenas, a responsabilidade civil do Estado por atos comissivos ou omissivos praticados pelos tabeliães e registradores oficiais, esclarecendo que ele responde de forma objetiva, assentado, no entanto, o dever de regresso, nos casos de dolo ou culpa. 1.2. Na hipótese dos autos, não se discute a responsabilidade do Estado, mas sim, a responsabilidade direta do próprio Tabelião em decorrência da má prestação do serviço delegado. 2. Além disso, referida discussão é travada à luz de dispositivos legais não examinados pelo STF no julgamento do mencionado RE nº 842.846/SC (art. 22 da Lei nº 8.935/94 na redação que possuía antes do advento da Lei nº 13.286/2016). 1.3. Ação de indenização por danos materiais e morais por falha na prestação de serviço notarial está submetida a prazo prescricional de três anos que, no caso, somente começou a fluir após o trânsito em julgado da decisão judicial que certificou a nulidade da escritura pública e do respectivo registro. 2. A responsabilidade civil dos Tabeliães e Registradores por atos da serventia ocorridos sob a égide do art. 22 da Lei nº 8.935/94, em sua redação original, é direta e objetiva, dispensando, portanto, demonstração de culpa ou dolo. 3. Apenas com o advento da Lei nº 13.286/2016 é que esses agentes públicos passaram a responder de forma subjetiva.4. Recurso especial não provido.(REsp n. 1.849.994/DF, relator Ministro Moura Ribeiro, Terceira Turma, julgado em 21/3/2023, DJe de 24/3/2023, sublinhei)
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DOS NOTÁRIOS, ANTES DA VIGÊNCIA DA LEI N. 13.286/2016. JULGADOS DO STJ. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO.1. Conforme se extrai do acórdão recorrido, cuida-se de ação de indenização por danos materiais e morais, proposta em face do Estado de Minas Gerais e do ora agravante, tabelião responsável pelo 1º Serviço Notarial de São Sebastião do Paraíso, ao argumento de que houve atuação negligente do notário quando da lavratura de procuração falsa que causou ulterior anulação judicial de escritura pública de compra e venda de imóvel. 2. No caso em apreço, a lavratura da procuração ocorreu em 2012, antes, portanto, da alteração promovida pela Lei n. 13.286/2016 na redação do artigo 22 da Lei 8.935/94 que passou a prever a responsabilidade subjetiva dos notários e registradores por danos causados a terceiros.3. A teor da jurisprudência desta Corte Superior, antes da nova redação implementada pela Lei n. 13.286/2016, era objetiva a responsabilidade dos notários e oficiais de registro por danos causados a terceiros, conforme disposto na redação original do art. 22 da Lei 8.935/1994. No mesmo sentido: AgInt no REsp n. 1.590.117/SC, relator Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe de 9/10/2018; e AgInt no AREsp n. 2.023.744/SP, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, DJe de 8/6/2022.4. Agravo interno não provido.(AgInt no AREsp n. 1.924.855/MG, relator Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 15/12/2022, DJe de 19/12/2022, sublinhei)
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE ESCRITURA PÚBLICA DE COMPRA E VENDA C/C CANCELAMENTO DE REGISTRO IMOBILIÁRIO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA. PRELIMINARES DE NULIDADE. AFASTADAS. FALSIDADE RECONHECIDA. FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS NOTARIAIS E REGISTRAIS. FATOS OCORRIDOS ANTES DA VIGÊNCIA DA LEI 13.268/2016. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO TABELIÃO. REDAÇÃO ORIGINAL DO ART. 22 DA LEI 8.935/94. LITISDENUNCIANTES. DESCONHECIMENTO SOBRE A FRAUDE. INDENIZAÇÃO DEVIDA. HONORÁRIOS NA LIDE SECUNDÁRIA. BASE DE CÁLCULO. VALOR DA CONDENAÇÃO. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. 1. Proposta a ação no prazo fixado para o seu exercício, o equívoco que ocasionou a demora na citação, por motivos inerentes ao mecanismo da Justiça, não configura inércia dos autores e, tampouco, justifica o acolhimento da arguição de prescrição. Inteligência da Súmula n.º 106 do STJ. De mais a mais, extrai-se do histórico dos autos que o apelante havia sido regularmente incluído anteriormente no polo passivo pelos autores. Logo, imerece reparo a sentença que afastou a prescrição. 2. Não deve prosperar a alegação de nulidade na instrução processual, quando, da mera leitura do álbum processual, extrai-se que o Recorrente participou e manifestou, exercendo o devido contraditório, acerca de todos os atos processuais praticados desde o início do trâmite processual, em especial a prova pericial grafotécnica produzida, não restando comprovado nenhum prejuízo. 3. Na mesma esteira, não merece guarida a alegação de nulidade no agravo de instrumento interposto pelos litisdenunciantes em face do Apelante e de julgamento extra petita, eis que no referido recurso cuidou este Sodalício de apreciar a pretensão relativa a admissão da denunciação à lide, permitindo, quando do julgamento, a inclusão do Recorrente na condição de litisdenunciado, razão pela qual não cabe rediscutir tal matéria em razão da preclusão (CPC, art. 507). 4. Os oficiais de registro possuem responsabilidade pelos danos causados a terceiros, segundo a Lei 8.935/94, sendo que o desenvolvimento desta atividade estatal deve se dar por conta e risco do delegatário, conforme o art. 236, §1°, da CF. Com efeito, tratando-se de ato notarial praticado antes das alterações trazidas pela Lei 13.286/2016, como no caso dos autos (2015), a responsabilidade civil do tabelião responsável é objetiva, consoante o teor contido na redação original do artigo 22 da Lei 8.935/94. Logo, a comprovação de culpa torna-se prescindível, independente da modalidade. 5. Demonstrado o nexo de causalidade entre o ato praticado no Tabelionato de Notas cujo titular é o recorrente e os prejuízos suportados pelos recorridos, considerando que a lavratura da escritura pública de compra e venda foi imprescindível para a ocorrência dos danos ocasionados aos autores e aos requeridos/litisdenunciantes, resultando na alienação do imóvel pelos terceiros falsários, não se pode deixar de atribuir ao tabelião, ora requerido/litisdenunciado, os ônus pela fraude perpetrada em seu estabelecimento, de modo que impositiva a manutenção da sentença fustigada. 6. De outro turno, no caso em voga, ao contrário do que faz crer o Recorrente, não há falar em aplicação da tese fixada pelo STF no RE n.º 842.846/SC (Tema 777). Isso porque o aludido pronunciamento se materializou com base na nova redação do artigo 22 da Lei 8.935/94, originada pela Lei 13.286/16, ao passo que, no caso em voga, a escritura pública objeto da declaração de nulidade é anterior a aludida modificação legislativa. Ademais, o Estado sequer figura como parte no processo. 7. Para a fixação da verba honorária sucumbencial, deve-se observar os critérios objetivos e a ordem estabelecida pelo Estatuto Processual Civil. Assim, no caso, mister o provimento parcial do recurso para alterar a base de cálculo dos honorários advocatícios fixados na lide secundária, de modo a incidir sobre o valor da condenação e não sobre o valor atualizado da causa, com fulcro no artigo 85, § 2º, do CPC. APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDA E PARCIALMENTE PROVIDA.(TJGO, PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO -> Recursos -> Apelação Cível 0327409-11.2016.8.09.0091, Rel. Des(a). ÁTILA NAVES AMARAL, 1ª Câmara Cível, julgado em 03/05/2024, DJe de 03/05/2024)
Dessa forma, não há como reconhecer a ilegitimidade do notário, pois a legislação, vigente à época da lavratura da procuração declarada falsa, atribuía-lhe responsabilidade direta pelos atos praticados no âmbito da serventia. O afastamento de sua legitimidade pela sentença contraria frontalmente o disposto no art. 22 da Lei nº 8.935/94, bem como o entendimento consolidado no STJ.
É importante destacar que a aplicação do Tema 777 da Repercussão Geral (RE 842.846/SC) não obsta o reconhecimento da legitimidade passiva do notário, tampouco afasta sua responsabilização direta na presente demanda, conforme reiteradamente reconhecido pela jurisprudência dos tribunais.
Oportuno rememorar que o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 842.846/SC (Tema 777), fixou a tese de que "o Estado responde, objetivamente, pelos atos dos tabeliães e registradores oficiais que, no exercício de suas funções, causem dano a terceiros, assentado o dever de regresso contra o responsável, nos casos de dolo ou culpa, sob pena de improbidade administrativa". Já no Tema 940 (RE 1027633/SP), foi estabelecido que “a ação por danos causados por agente público deve ser ajuizada contra o Estado ou a pessoa jurídica prestadora de serviço público”. Cumpre observar, todavia, que nenhum dos referidos julgados afastou a possibilidade de responsabilização direta de notários e registradores, tampouco declararam a inconstitucionalidade do art. 22 da Lei nº 8.935/94, razão pela qual permanece íntegra a sua aplicabilidade nos casos de responsabilidade pessoal e objetiva atribuída aos delegatários por atos praticados antes da vigência da Lei nº 13.286/2016.
Ademais, a jurisprudência consolidada do STJ e do TJGO distingue com clareza a responsabilidade objetiva dos notários e a responsabilidade subsidiária do Estado nos atos praticados antes da referida alteração legislativa, especialmente nos casos de falhas cartorárias como a verificada nos autos. A tese da dupla garantia não se aplica automaticamente aos notários, cuja atuação, embora pública por delegação, permanece de natureza privada. Destarte, ambos respondem pelos danos causados, nos termos do art. 236, §1º, da CF, e art. 22 da Lei 8.935/94 (redação original).
Quanto à responsabilidade do Estado de Goiás, é inequívoca sua condição de delegante da atividade notarial, respondendo de forma subsidiária pelos danos causados por seus delegatários, nos moldes do art. 37, §6º, da CF/88. A jurisprudência do STJ é pacífica ao afirmar que, na hipótese de atividade notarial exercida por delegatário, a responsabilidade estatal é subsidiária. Veja-se:
PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. OMISSÃO. EXISTÊNCIA. PREQUESTIONAMENTO REALIZADO EM VOTO VENCIDO. REGISTRO DE IMÓVEL. ERRO. DANO RECONHECIDO. ILEGITIMIDADE PASSIVA DO ESTADO. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. AÇÃO PROPOSTA APENAS CONTRA O ENTE ESTATAL. IMPOSSIBILIDADE.1. Na hipótese dos autos, a irresignação merece prosperar no que diz respeito à omissão. In casu, o voto vencido no acórdão objurgado fez menção expressa ao disposto no art. 22 da Lei 8.935/94, razão pela qual a matéria se encontra devidamente prequestionada. 2. Vencida a preliminar, no mérito verifica-se que a tese recursal é procedente.Com efeito, de acordo com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, nos casos de danos resultantes de atividade estatal delegada pelo Poder Público, há responsabilidade objetiva do notário, nos termos do art. 22 da Lei 8.935/1994, e apenas subsidiária do ente estatal. Precedentes: AgRg no AREsp 474.524/PE, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 18/06/2014; AgRg no AgRg no AREsp 273.876/SP, Rel. Min. Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 24/5/2013; REsp 1.163.652/PE, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 1º/7/2010. 3. In casu, a ação foi proposta exclusivamente contra o Estado, sem participação do Cartório de Registro de Imóveis diretamente responsável pelo dano, o que não é possível em razão de a responsabilidade do ente estatal ser subsidiária e não solidária.4. Embargos de Declaração acolhidos, com efeitos infringentes.(EDcl no REsp n. 1.655.852/MG, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 5/12/2017, DJe de 19/12/2017.)
DUPLA APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. INOVAÇÃO RECURSAL. INOCORRÊNCIA. ESCRITURA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL LAVRADA COM BASE EM PROCURAÇÃO PÚBLICA FALSA. FRAUDE PERPETRADA POR TERCEIRO. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DE TABELIÃES E REGISTRADORES E SUBSIDIÁRIA DO ESTADO. FATOS OCORRIDOS ANTES DA VIGÊNCIA DA LEI 13.286/2016. INAPLICABILIDADE DOS TEMAS 777 E 940 DE RG. PRETENSÃO INDENIZATÓRIA. PRAZO PRESCRICIONAL TRIENAL. DEVER DE INDENIZAR. REQUISITOS LEGAIS CONFIGURADOS. SENTENÇA MANTIDA. 1. Impõe-se rechaçar a preliminar de inovação recursal arguida pelo recorrido, relativa à prescrição trienal, porquanto debatida e decidida a controvérsia na origem. 2. A responsabilidade civil dos tabeliães e registradores por atos da serventia ocorridos sob a égide do art. 22 da lei 8.935/94, em sua redação original, ou seja, antes da lei 13.282/2016, é direta e objetiva, cabendo ao Estado a responsabilização subsidiária. Precedentes do STJ e TJGO. 3. A não incidência do tema 940 de RG, in casu, dá-se pelo fato de que a controvérsia analisada pelo Pretório Excelso versou, exclusivamente, sobre a responsabilidade estatal nas situações em que os ?agentes públicos? causem danos a terceiros, categoria da qual não faz parte o notário/tabelião e o registrador, os quais exercem o serviço de modo privado, por delegação. 4. O tema 777 de RG, que tratou da responsabilidade exclusiva do ente estadual nos casos de danos causados a terceiros por notários e registradores, cujo embrião foi a nova redação do artigo 22 da lei 8.935/1994, dada pela lei 13.286/16, não se aplica à espécie, porquanto posterior aos fatos ora analisados. 5. O art. 22 da lei 8.935/1994 (Lei dos Cartórios), em sua redação original, positivou a responsabilidade pessoal e objetiva dos notários e dos oficiais de registro por atos próprios ou praticados por seus prepostos, sem estabelecer qualquer ressalva quanto aos agentes interinos, os quais possuem os mesmos deveres e obrigações do titular, devendo responder pelos danos causados a terceiros. 6. A ação de indenização por danos materiais e morais, por falha na prestação de serviço notarial, submete-se ao prazo prescricional de três anos (art. 206, § 3º, V, CC/02), cujo termo inicial é contado a partir do trânsito em julgado da decisão judicial que certificou a nulidade da escritura pública e do respectivo registro. 7. Na espécie, tem-se que o tabelião incorreu em manifesta ilegalidade ao reconhecer a validade de procuração que, subsequentemente, foi utilizada na lavratura da escritura pública de compra e venda, sem a devida verificação de seus pressupostos formais, defluindo daí o nexo entre seus atos e os danos suportados pela parte autora, razão pela qual, deve ser mantida incólume a sentença que condenou, solidariamente, os demandados ao pagamento dos danos materiais e morais. 8. Considerando que a verba indenizatória arbitrada na origem (R$ 10.000,00), relativa aos danos morais suportados, atende às finalidades compensatória, punitiva, preventiva e/ou pedagógica e aos princípios gerais da prudência, bom senso, proporcionalidade, razoabilidade e adequação, não há falar em sua exclusão e/ou redução. 9. Corolário do insucesso recursal, impõe-se a majoração da verba honorária arbitrada na origem, à luz do art. 85, §11, do CPC/15. APELAÇÕES CÍVEIS CONHECIDAS E DESPROVIDAS.(TJGO, PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO -> Recursos -> Apelação Cível 5136537-09.2017.8.09.0029, Rel. Des(a). DESEMBARGADOR FERNANDO DE CASTRO MESQUITA, 9ª Câmara Cível, julgado em 07/06/2024, DJe de 07/06/2024)
Destarte, à luz da legislação vigente à época dos fatos e da jurisprudência consolidada, conclui-se que tanto o notário, na qualidade de responsável direto pela prática do ato notarial quanto o Estado de Goiás, na qualidade de delegante do serviço, estão obrigados a reparar os danos causados antes da vigência da Lei nº 13.286/2016. Nesses casos, a responsabilização prescinde da demonstração de culpa ou dolo, sendo suficiente a comprovação do nexo de causalidade entre a conduta lesiva e o prejuízo experimentado pelos autores.
Ressalte-se que a responsabilidade do Estado, nesse contexto, é de natureza subsidiária, o que significa que sua obrigação de indenizar somente se configura caso o responsável direto — o delegatário — não satisfaça a reparação devida, nos termos do art. 37, § 6º, da Constituição Federal. Trata-se, portanto, de uma garantia complementar à vítima, assegurando-lhe o ressarcimento integral dos danos decorrentes da atividade pública delegada.
Reconheço, portanto, a legitimidade passiva do notário, a quem se atribui responsabilidade direta pelos danos causados, fixando-se a responsabilidade do Estado de Goiás em caráter subsidiário.
No tocante à alegação de prescrição da pretensão autoral, não assiste razão ao apelante, porquanto não restaram preenchidos os requisitos legais para o reconhecimento da perda do direito de ação.
Nos termos da consolidada teoria da actio nata, o prazo prescricional somente se inicia a partir do momento em que o titular do direito tem ciência inequívoca da lesão sofrida e de sua real extensão — ou seja, quando surge, de fato, a pretensão indenizatória. Esse entendimento é reforçado pelo art. 189 do Código Civil, segundo o qual “violado o direito, nasce para o titular a pretensão”.
Embora o Estado sustente que os autores já teriam ciência do vício desde o registro do boletim de ocorrência em 2014, tal evento, por si só, não caracteriza marco temporal juridicamente apto para deflagrar o curso do prazo prescricional, uma vez que a lesão jurídica apenas se consolidou com o trânsito em julgado da sentença que reconheceu a nulidade da procuração e da cadeia dominial do imóvel, ocorrido em 23 de julho de 2019 (evento 1, arq.15). Somente a partir desse momento tornou-se possível aferir a extensão do prejuízo patrimonial sofrido pelos autores, caracterizando-se, assim, o nascimento da pretensão indenizatória."
Portanto, considerando que a ação em apreço foi ajuizada em abril de 2021, não houve consumação do prazo quinquenal previsto no art. 1º do Decreto nº 20.910/1932, razão pela qual deve ser integralmente afastada a alegação de prescrição, em consonância com precedente desta Corte. Veja-se:
JUIZADO ESPECIAL DA FAZENDA PÚBLICA. RECURSO INOMINADO. DIREITO ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. PROCURAÇÃO PÚBLICA FRAUDADA. OUTORGANTES FALECIDOS HÁ MAIS DE 10 ANOS. ATO PRATICADO POR TABELIÃO. TEMA 777 EM REPERCUSSÃO GERAL. DEVER DE INDENIZAR. VALOR INDICADO NA ESCRITURA DE COMPRA E VENDA. DANO MORAL. OCORRÊNCIA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. 1- Cuida-se, na origem, de ação indenizatória por meio da qual os reclamantes acima identificados pleiteiam a reparação por negócio jurídico anulado em decorrência de fraude reconhecida judicialmente na lavratura de procuração pública perante o 3º Tabelionato de Notas de Anápolis-GO. Na inicial, narram que adquiriram o imóvel registrado sob a matrícula de nº 1375 perante o C.R.I de Caldas Novas, no entanto, tal negócio jurídico fora posteriormente anulado pela via judicial, uma vez que a procuração pública do responsável por negociar com eles o imóvel (Sr. Pompílio de Souza Diniz) fora reconhecida como nula no processo 0243313-80.2010.8.09.0024, por ter sido assinada mais de dez anos após a morte dos outorgantes. 2. O Juízo de 1º grau reconheceu a responsabilidade estatal objetiva, aplicando ao caso a teoria do risco administrativo e entendendo que o ente público responde objetivamente pelos atos dos notários ou registradores que, no exercício de sua função, tenham realizado ação que gerou dano a terceiros de boa-fé. Assim, o estado de Goiás fora condenado ao pagamento de indenização por danos materiais no valor de R$ 44.273,34 e dano moral no montante de R$ 5.000,00 para cada um dos autores, visando reparar os prejuízos decorrentes da anulação da avença em questão. 3. Irresignado, o reclamado interpôs Recurso Inominado em face da sentença, pleiteando a sua reforma e suscitando hipótese de prescrição; ilegitimidade passiva do ente público; ausência da caracterização de responsabilidade estatal no caso concreto ou do dever de indenizar. 4. De início, verifica-se que não prospera a alegação de prescrição aventada pelo recorrente, vez que, conforme comprovado com a inicial (ev. 1, doc. 15) a sentença que declarou a nulidade do negócio jurídico apenas transitou em julgado em 03/07/2019, momento no qual surgiu, de fato, o prejuízo aos reclamantes. É aplicável ao caso o prazo prescricional de 05 anos, nos termos do artigo 1º do Decreto 20.910/32, não tendo sido alcançada tal limitação temporal, tendo em vista que a demanda fora ajuizada em abril de 2021. (...)(TJGO, PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO -> Recursos -> Recurso Inominado Cível 5164793-35.2021.8.09.0024, Rel. Élcio Vicente da Silva, 4ª Turma Recursal dos Juizados Especiais, julgado em 16/04/2024, DJe de 16/04/2024)
Diante disso, não há que se falar em prescrição da pretensão autoral. Passo à análise dos requisitos da responsabilidade civil, proporcionalidade da indenização e consectários legais.
No caso em análise, restou cabalmente demonstrada a falha na prestação do serviço notarial, consubstanciada na lavratura de procuração com assinaturas falsas, cuja invalidade foi reconhecida judicialmente. A responsabilidade civil, portanto, decorre da omissão quanto ao dever de cautela, diligência e verificação da autenticidade da manifestação de vontade no ato notarial. Estando presente a conduta lesiva, o dano e o nexo causal, impõe-se a condenação do notário e Estado de Goiás, este último de forma subsidiária.
Também não se verifica, no caso concreto, a existência de culpa exclusiva de terceiros ou das vítimas, de modo a afastar a responsabilidade objetiva, nos termos do art. 927 do CC/02.
Por fim, com relação ao montante fixado a título de danos materiais, no valor de R$ 66.394,97, não se evidencia qualquer desproporcionalidade, porquanto plenamente compatível com os elementos probatórios constantes dos autos, refletindo com precisão os prejuízos efetivamente suportados pelos autores. Tal quantia abrange o valor despendido na aquisição do imóvel, além de despesas acessórias imprescindíveis à formalização do negócio — como registros, tributos e honorários advocatícios —, todos diretamente decorrentes do vício que maculou a avença.
No que tange à reparação por danos morais, a quantia arbitrada em R$ 3.000,00 mostra-se adequada ao caso concreto, não comportando qualquer redução. A frustração do direito de propriedade — bem jurídico de alta relevância constitucional —, somada aos transtornos emocionais e à insegurança jurídica experimentada pelos autores, traduz violação clara aos direitos da personalidade, nos termos dos arts. 5º, incisos V e X, da Constituição Federal, e do art. 186 do Código Civil. O valor fixado observa os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, servindo tanto ao caráter compensatório quanto ao pedagógico da indenização, sem configurar enriquecimento indevido ou quantia meramente simbólica.
Além disso, a Súmula nº 32, do Tribunal de Justiça, dispõe que “a verba indenizatória do dano moral somente será modificada se não atendidos pela sentença os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade na fixação do valor da condenação”, não sendo essa a circunstância dos autos.
Por fim, quanto à necessidade de adequação do índice de atualização monetária, também merece reforma a sentença, pois a partir de 08/12/2021, nos termos da Emenda Constitucional nº 113/2021, deve ser adotada a taxa SELIC como índice unificado para fins de correção monetária e juros de mora, vedada a cumulação com outros índices.
Assim, a atualização dos valores devidos deverá observar IPCA-E e juros de mora segundo a caderneta de poupança até 07/12/2021, conforme RE 870.947/SE (Tema 810/STF) e a Taxa SELIC, a partir de 08/12/2021, nos termos da EC nº 113/2021.
Firme nessas premissas, o recurso merece parcial provimento, para reconhecer a legitimidade do notário, que possui responsabilidade direta e objetiva, e a responsabilidade subsidiária do Estado, bem como a aplicação da taxa SELIC a partir de 08/12/2021, nos termos da EC 113/2021.
Ante ao exposto, CONHEÇO do recurso e DOU-LHE PARCIAL PROVIMENTO, para reformar a sentença, a fim de reconhecer a legitimidade passiva do notário José Alves de Castro, com responsabilidade direta e objetiva pelos danos causados, mantendo-se a condenação do Estado de Goiás em caráter subsidiário, nos termos do art. 37, §6º, da CF/88 e do art. 22 da Lei nº 8.935/1994 (redação original). Outrossim, determino que a atualização dos valores devidos deverá observar IPCA-E e juros de mora segundo a caderneta de poupança até 07/12/2021, conforme RE 870.947/SE (Tema 810/STF) e a Taxa SELIC, a partir de 08/12/2021, nos termos da EC nº 113/2021. Condeno ambos os requeridos ao pagamento das custas e dos honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da condenação.
É como voto.
Por fim, tem-se por prequestionada toda a matéria discutida no processo para viabilizar eventual acesso aos Tribunais Superiores.
Alerto que a oposição de embargos de declaração ou outro recurso, com o objetivo de prequestionamento ou rediscussão da matéria, poderá ensejar a aplicação da multa prevista no art. 1.026, § 2º, do CPC e/ou nas penas por litigância de má fé do art. 80, incisos VI e VII e art. 81, ambos do CPC
É o meu voto.
Certificado o trânsito em julgado, determino o arquivamento dos autos, após baixa da minha relatoria no Sistema de Processo Digital.
Goiânia, data da assinatura digital.
RICARDO SILVEIRA DOURADO
RELATOR
Juiz de Direito Substituto em Segundo Grau
/n5
Apelação Cível nº 5161140-68.2021.8.09.0042
Comarca de Fazenda Nova
2ª Câmara Cível
Apelante: Estado de Goiás
Apelados: Ana Flávia Malheiros do Nascimento Rocha e outros
Relator: Ricardo Silveira Dourado – Juiz de Direito Substituto em Segundo Grau
EMENTA: DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL DECORRENTE DE PROCURAÇÃO FALSA EM COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. LEGITIMIDADE PASSIVA DO NOTÁRIO. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DO ESTADO. DISTINGUISHING ENTRE O TEMA 777/STF E FATOS OCORRIDOS ANTERIORMENTE À LEI FEDERAL N. 13.286/2016. PRESCRIÇÃO AFASTADA. INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS PROPORCIONAL. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
I. CASO EM EXAME
Trata-se de Apelação cível interposta contra sentença que julgou parcialmente procedente ação indenizatória por danos materiais e morais decorrentes de compra e venda de imóvel com base em procuração lavrada com assinatura falsa. A sentença afastou a responsabilidade do notário e impôs ao Estado, de forma exclusiva, o dever de indenizar, determinando a aplicação do IPCA como índice de atualização monetária.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
2. Há cinco questões em discussão: (i) saber se o notário possui legitimidade passiva e se a sua responsabilidade é direta; (ii) saber se está prescrita a pretensão de indenização; (iii) saber se há nexo causal entre a conduta notarial e o dano experimentado; (iv) saber se os valores fixados a título de danos materiais e morais observam o princípio da proporcionalidade; e (v) saber qual índice de atualização monetária e juros deve ser aplicado.
III. RAZÕES DE DECIDIR
3. A prescrição é afastada, com fundamento na teoria da actio nata, considerando como termo inicial o trânsito em julgado da decisão na ação anulatória.
4. A responsabilidade do notário, à época dos fatos, é direta e objetiva, nos termos do art. 22 da Lei nº 8.935/1994, na redação anterior à Lei nº 13.286/2016.
5. O Estado é responsável de forma subsidiária pelos atos de seus delegatários, conforme art. 37, § 6º, da CF/1988.
6. O nexo causal entre a falha notarial e os danos experimentados está configurado, não havendo comprovação de culpa exclusiva das partes.
7. Os valores arbitrados a título de danos materiais e morais observam os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.
8. A atualização monetária deve observar o IPCA-E e os juros de mora segundo o índice da caderneta de poupança até 07/12/2021, aplicando-se a partir de 08/12/2021 a taxa SELIC como índice unificado, conforme EC nº 113/2021.
IV. DISPOSITIVO E TESE
9. Apelação cível conhecida e parcialmente provida para reconhecer a legitimidade passiva do notário e atribuir-lhe responsabilidade direta e objetiva, mantendo-se a condenação do Estado de forma subsidiária. Determina-se a atualização dos valores devidos pelo IPCA-E e juros da caderneta de poupança até 07/12/2021, e aplicação da Taxa SELIC a partir de 08/12/2021.
Tese de julgamento: "1. A responsabilidade do notário, antes da vigência da Lei nº 13.286/2016, é direta e objetiva, nos termos do art. 22 da Lei nº 8.935/1994. 2. O Estado responde subsidiariamente pelos atos praticados por delegatários do serviço notarial. 3. A taxa SELIC deve ser aplicada como índice único de correção monetária e juros, conforme EC nº 113/2021, a partir de 08/12/2021. 4. A proporcionalidade entre o valor do dano e o quantum indenizatório é aferida à luz das circunstâncias do caso concreto, não se confundindo com tabelamento judicial. 5. O prazo prescricional da pretensão indenizatória por ato ilícito inicia-se com o trânsito em julgado da decisão que reconhece a nulidade do negócio jurídico, nos termos da teoria da actio nata."
Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 37, § 6º; CC, arts. 186 e 927; CPC, arts. 489, § 1º, e 927; EC nº 113/2021; Lei nº 8.935/1994, art. 22.
A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 5161140-68.2021.8.09.0042, acordam os componentes da Segunda Turma Julgadora da Segunda Câmara Cível do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, por unanimidade de votos, em conhecer da apelação e dar-lhe parcial provimento, nos termos do voto do Relator.
Votaram, acompanhado o relator, o Desembargador Carlos Alberto França, que também presidiu a sessão, e a Desembargadora Sirlei Martins da Costa.
Presente a Procuradoria-Geral de Justiça representada nos termos da lei e registrado no extrato da ata.
Goiânia, 26 de maio de 2025.
RICARDO SILVEIRA DOURADO
R E L A T O R
Juiz Substituto em Segundo Grau
EMENTA: DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL DECORRENTE DE PROCURAÇÃO FALSA EM COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. LEGITIMIDADE PASSIVA DO NOTÁRIO. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DO ESTADO. DISTINGUISHING ENTRE O TEMA 777/STF E FATOS OCORRIDOS ANTERIORMENTE À LEI FEDERAL N. 13.286/2016. PRESCRIÇÃO AFASTADA. INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS PROPORCIONAL. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
I. CASO EM EXAME
Trata-se de Apelação cível interposta contra sentença que julgou parcialmente procedente ação indenizatória por danos materiais e morais decorrentes de compra e venda de imóvel com base em procuração lavrada com assinatura falsa. A sentença afastou a responsabilidade do notário e impôs ao Estado, de forma exclusiva, o dever de indenizar, determinando a aplicação do IPCA como índice de atualização monetária.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
2. Há cinco questões em discussão: (i) saber se o notário possui legitimidade passiva e se a sua responsabilidade é direta; (ii) saber se está prescrita a pretensão de indenização; (iii) saber se há nexo causal entre a conduta notarial e o dano experimentado; (iv) saber se os valores fixados a título de danos materiais e morais observam o princípio da proporcionalidade; e (v) saber qual índice de atualização monetária e juros deve ser aplicado.
III. RAZÕES DE DECIDIR
3. A prescrição é afastada, com fundamento na teoria da actio nata, considerando como termo inicial o trânsito em julgado da decisão na ação anulatória.
4. A responsabilidade do notário, à época dos fatos, é direta e objetiva, nos termos do art. 22 da Lei nº 8.935/1994, na redação anterior à Lei nº 13.286/2016.
5. O Estado é responsável de forma subsidiária pelos atos de seus delegatários, conforme art. 37, § 6º, da CF/1988.
6. O nexo causal entre a falha notarial e os danos experimentados está configurado, não havendo comprovação de culpa exclusiva das partes.
7. Os valores arbitrados a título de danos materiais e morais observam os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.
8. A atualização monetária deve observar o IPCA-E e os juros de mora segundo o índice da caderneta de poupança até 07/12/2021, aplicando-se a partir de 08/12/2021 a taxa SELIC como índice unificado, conforme EC nº 113/2021.
IV. DISPOSITIVO E TESE
9. Apelação cível conhecida e parcialmente provida para reconhecer a legitimidade passiva do notário e atribuir-lhe responsabilidade direta e objetiva, mantendo-se a condenação do Estado de forma subsidiária. Determina-se a atualização dos valores devidos pelo IPCA-E e juros da caderneta de poupança até 07/12/2021, e aplicação da Taxa SELIC a partir de 08/12/2021.
Tese de julgamento: "1. A responsabilidade do notário, antes da vigência da Lei nº 13.286/2016, é direta e objetiva, nos termos do art. 22 da Lei nº 8.935/1994. 2. O Estado responde subsidiariamente pelos atos praticados por delegatários do serviço notarial. 3. A taxa SELIC deve ser aplicada como índice único de correção monetária e juros, conforme EC nº 113/2021, a partir de 08/12/2021. 4. A proporcionalidade entre o valor do dano e o quantum indenizatório é aferida à luz das circunstâncias do caso concreto, não se confundindo com tabelamento judicial. 5. O prazo prescricional da pretensão indenizatória por ato ilícito inicia-se com o trânsito em julgado da decisão que reconhece a nulidade do negócio jurídico, nos termos da teoria da actio nata."
Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 37, § 6º; CC, arts. 186 e 927; CPC, arts. 489, § 1º, e 927; EC nº 113/2021; Lei nº 8.935/1994, art. 22.
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