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Processo nº 0891563-49.2024.8.10.0001

ID: 308607735

Tribunal: TJMA Órgão: 4ª Vara Cível de São Luís Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 0891563-49.2024.8.10.0001

Data de Disponibilização: 26/06/2025

Polo Ativo:

CLAUDSON GOMES SANTOS

Polo Passivo:

Intimação

Advogados:

THIAGO PESSOA ROCHA

OAB/PE XXXXXX Desbloquear

CLAUDSON GOMES SANTOS

OAB/MA XXXXXX Desbloquear

ALINE SHARLON MACIEL BATISTA RAMOS

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Juízo de Direito da 4ª Vara Cível do Termo de São Luís Secretaria Judicial Única Digital das Varas Cíveis do Termo de São Luís Processo: 0891563-49.2024.8.10.0001 Ação: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) A… Juízo de Direito da 4ª Vara Cível do Termo de São Luís Secretaria Judicial Única Digital das Varas Cíveis do Termo de São Luís Processo: 0891563-49.2024.8.10.0001 Ação: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) AUTOR: L. P. B. Advogados do(a) AUTOR: ALINE SHARLON MACIEL BATISTA RAMOS - MA21038, CLAUDSON GOMES SANTOS - MA23606 REU: S. A. S. D. S. S. Advogado do(a) REU: THIAGO PESSOA ROCHA - PE29650-A SENTENÇA Trata-se de AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA, proposta por L. P. B. em face de SULAMÉRICA SAÚDE S.A., ambas as partes devidamente qualificadas nos autos. A autora informa ser beneficiária do plano de saúde fornecido pela requerida, tendo contratado o serviço com o objetivo de garantir acesso a atendimentos médicos e hospitalares, e vem cumprindo pontualmente com o pagamento das mensalidades. No entanto, há cerca de dois anos, foi diagnosticada com artrite reumatoide soronegativa (CID M06), poliartrite inflamatória crônica e simétrica das articulações interfalangianas proximais e metacarpofalangeanas, sendo submetida, desde então, a diversos tratamentos para a referida enfermidade. Com o avanço da doença, que se manifesta com dor intensa, inflamação poliarticular significativa, limitação funcional e prejuízos à realização de suas atividades básicas e profissionais, além do risco de danos permanentes, deformidades e sequelas articulares irreversíveis, a médica responsável prescreveu o uso do medicamento MabThera (Rituximabe). Trata-se de fármaco incluído no rol da ANS, com recomendação de aplicação endovenosa de dois frascos (500 mg cada), no dia 1º e no dia 15, a cada seis meses. Informa-se que a requerida vinha, até então, fornecendo os medicamentos anteriormente prescritos para tratamento da autora. Contudo, ao ser solicitada a disponibilização do medicamento Rituximabe – MabThera, a requerida, de forma abusiva, negou o fornecimento do tratamento essencial à preservação da saúde da requerente. Alegou, para tanto, que a segmentação assistencial do plano contratado é exclusivamente hospitalar, inexistindo cobertura para procedimentos realizados em regime ambulatorial. A autora destaca, ainda, que a própria bula do medicamento é clara ao determinar que sua administração deve ocorrer em ambiente que disponha de recursos para ressuscitação, sob rigorosa supervisão de um médico experiente. Isso evidencia a necessidade de que o procedimento seja realizado exclusivamente em ambiente hospitalar, dotado da infraestrutura adequada para atendimento emergencial imediato, em caso de eventuais intercorrências. Dessa forma, não se pode classificar tal procedimento como ambulatorial, uma vez que esses ambientes, em regra, não oferecem o suporte necessário para situações de urgência, sendo destinados, via de regra, a intervenções mais simples e de baixo risco. Ao contrário, o uso do Rituximabe, por se tratar de terapia imunobiológica, requer um ambiente hospitalar apto a garantir a segurança e a eficácia do tratamento, conforme expressamente previsto na bula. Portanto, a negativa da requerida mostra-se não apenas desarrazoada frente à inclusão do medicamento no Rol da ANS, mas também totalmente incompatível com a natureza hospitalar do procedimento, que sequer pode ser realizado em regime ambulatorial, dada a ausência dos suportes técnicos e médicos imprescindíveis à sua adequada execução. Considerando a necessidade do tratamento, a recusa indevida do plano de saúde e a ausência de qualquer impedimento clínico para a sua realização, a autora foi compelida a acionar o Poder Judiciário para assegurar o acesso ao tratamento necessário. Diante dos argumentos apresentados, a autora requer a concessão da gratuidade da justiça, o integral acolhimento da presente ação e o deferimento da tutela provisória de urgência, para que a empresa ré seja compelida a fornecer o medicamento Rituximabe – Mabthera, conforme prescrição médica especializada, no prazo máximo de 24 (vinte e quatro) horas, sob pena de multa diária a ser arbitrada por este Juízo, bem como eventual bloqueio de valores. Ao final, requer a confirmação da tutela de urgência anteriormente concedida, além da condenação dos requeridos ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais). A petição inicial foi instruída com toda a documentação pertinente. Na decisão ID nº 135622546, foi concedida assistência judiciária gratuita e deferida a tutela de urgência, determinando que e SULAMERICA SAÚDE S.A, em 5 (cinco) dias, disponibilize o medicamento MABTHERA, na forma solicitada em ID 135443317 e ID 135443311. Em caso de descumprimento, estabeleço multa diária de R$ 2.000,00 (dois mil reais), limitada a R$ 20.000,00 (vinte mil reais). Foi designada audiência de conciliação, a qual restou infrutífera em razão da ausência da parte autora. O requerido foi devidamente citado e apresentou contestação sob o ID nº 138041502. Preliminarmente, impugnou a concessão da gratuidade da justiça deferida à autora. No mérito, defendeu a legalidade da negativa, fundamentando-se na ausência de previsão contratual, nas diretrizes da ANS e no fato de que o uso do medicamento é off label, ou seja, trata-se de aplicação experimental ainda sem validação científica. A autora apresentou réplica no petitório identificado pelo ID nº 141664778, ocasião em que rebateu integralmente as alegações do requerido e reafirmou os termos da petição inicial. Ressalte-se que nenhuma das partes requereu a produção de novas provas. É a síntese do necessário. Passo a decisão. 2. FUNDAMENTAÇÃO Inicialmente, verifica-se que o processo preenche todos os pressupostos de constituição e desenvolvimento válido e regular, encontrando-se pronto para julgamento, uma vez que não há necessidade de produção de prova pericial. A jurisprudência consolidada já estabeleceu que, quando há expressa indicação médica, a prova pericial só se faz imprescindível caso existam indícios de fraude ou dúvidas substanciais sobre a credibilidade da prescrição. Na ausência de tais circunstâncias, a recomendação do médico assistente deve prevalecer. É importante destacar que a administração das provas é uma prerrogativa do magistrado, que possui autonomia para decidir sobre os elementos probatórios relevantes ao caso. Nos termos do artigo 371 do Código de Processo Civil, o juiz tem liberdade para avaliar as provas com base no princípio da persuasão racional. Nesse contexto, o magistrado pode se restringir às provas mais adequadas, ágeis e compatíveis com o princípio da razoável duração do processo, conforme disposto no artigo 5º, inciso LXXVIII, da Constituição Federal, e no artigo 139, inciso II, do Código de Processo Civil. Dessa forma, o relatório médico de ID nº 135443311 se mostra suficiente para elucidar a controvérsia, dispensando a necessidade de outras provas. Cabe ao médico assistente determinar o tratamento mais adequado ao paciente, não cabendo à operadora de saúde interferir nessa decisão. 2.1. DAS PRELIMINARES 2.1.1. DA GRATUIDADE DA JUSTIÇA Quanto à impugnação à justiça gratuita, levantada pela requerida, entendo que o pedido de assistência judiciária gratuita já deferido deve ser mantido. O Código de Processo Civil (CPC) expressamente autoriza o juiz a conceder a gratuidade, desde que não haja elementos nos autos que evidenciem a ausência dos pressupostos legais para sua concessão, capazes de afastar a presunção relativa de insuficiência de recursos (art. 99, §§ 2º e 3º, CPC). A regra para a revogação do benefício exige a comprovação de que os requisitos essenciais deixaram de existir ou nunca estiveram presentes, e tal prova cabe ao impugnante, o que não ocorreu no caso concreto, uma vez que a requerida limitou-se a alegações genéricas, sem apresentar qualquer comprovação documental. Dessa forma, a presunção de hipossuficiência da parte autora não foi afastada pelo réu, a quem competia o ônus da prova. Portanto, não há necessidade de maiores digressões sobre o tema, uma vez que este já se encontra pacificado, no sentido de que não é exigida a comprovação formal do estado de miserabilidade para a concessão do benefício da assistência judiciária gratuita, sendo suficiente a declaração pessoal da parte, a qual pode ser realizada inclusive por seu advogado. Ante o exposto, rejeito a preliminar e mantenho a gratuidade deferida nos autos. 2.2. MÉRITO. 2.2.1. DA APLICABILIDADE DO CDC De início, é importante destacar que a relação jurídica entre as partes nos presentes autos configura uma relação de consumo, pois o autor é destinatário final dos serviços fornecidos pela parte requerida, conforme estabelecido nos artigos 2º e 3º do Código de Defesa do Consumidor (CDC). A operadora do plano de saúde fornece um serviço de natureza contínua e essencial, que é o tratamento médico, ao autor, enquanto consumidor, que busca a cobertura do plano para a manutenção de sua saúde. Nesse contexto, é importante destacar que, conforme a Súmula 608 do Superior Tribunal de Justiça (STJ), "aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de planos de saúde, salvo os administrados por entidades de autogestão." Dessa forma, o Código de Defesa do Consumidor (CDC) deve ser integralmente aplicado à relação jurídica estabelecida entre a autora e a operadora do plano de saúde, não havendo qualquer alegação de que a requerida seja uma entidade de autogestão. Além disso, o art. 47 do CDC prevê que, quando se tratar de relações de consumo, as normas contratuais devem ser interpretadas em favor do consumidor, ou seja, em favor da parte mais vulnerável, que, no caso, é o autor, o qual depende do plano de saúde para a continuidade do tratamento médico. No mesmo sentido, artigo 54, §§ 3º e 4º do Código de Defesa do Consumidor (CDC) estabelece que as cláusulas que limitam direitos (como aquelas que excluem tratamentos ou procedimentos da cobertura de planos de saúde) devem ser expressamente previstas no contrato e devidamente destacadas. Caso contrário, a operadora do plano de saúde terá que cobrir os procedimentos necessários para a adequada recuperação da saúde do beneficiário, não sendo permitida a restrição com base em cláusulas que não estejam claramente informadas. 2.2.2. DA OBRIGAÇÃO DE FAZER. A controvérsia no presente caso gira em torno da obrigação do plano de saúde em custear o tratamento prescrito a autora, especificamente o fornecimento do medicamento Mabthera – Rituximabe, bem como a possível indenização decorrente dos fatos narrados na inicial. A partir da análise dos documentos acostados aos autos, é incontroverso que a autora é beneficiária do plano de saúde administrado pela operadora requerida. Conforme relatório médico constante no ID nº 135443311, foi-lhe prescrito o tratamento com o medicamento Mabthera – Rituximabe. A indicação se deu em razão do quadro clínico agressivo e grave apresentado pela autora, que persiste com dor intensa e inflamação poliarticular significativa, acarretando limitação funcional e comprometendo a realização de atividades básicas da vida diária e laborais. Ressalta-se que, mesmo após o uso de diversos fármacos com mecanismos de ação distintos, não houve melhora clínica satisfatória, havendo risco concreto de evolução para danos irreversíveis, deformidades e sequelas articulares permanentes. Diante desse contexto, é evidente a obrigação da operadora do plano de saúde em custear o fornecimento do referido medicamento. No entanto, a negativa de fornecimento da medicação pela operadora do plano de saúde se revela abusiva, pois fere os direitos do consumidor e descumpre a obrigação contratual de oferecer os tratamentos necessários à saúde do autor. Embora a operadora possa se basear nas Diretrizes de Utilização da ANS para avaliar a cobertura de tratamentos, essas diretrizes não podem ser usadas como justificativa para negar um tratamento claramente indicado pelo profissional de saúde responsável, sobretudo quando a doença do autor está contemplada no Rol da ANS. Dessa forma, considerando que o médico responsável pelo acompanhamento da parte autora indicou expressamente o referido tratamento, impõe-se à requerida a obrigação de custeá-lo. Tal entendimento é amplamente consolidado na jurisprudência, conforme se extrai do seguinte julgado: “Não cabe à ré, administradora do plano de saúde, questionar ou impugnar o procedimento médico solicitado pelo especialista que acompanha o paciente.(TJSP – Apelação nº 0003178-07.2012.8.26.0011.” Ademais, eventual ausência de previsão no rol da ANS ou mesmo a inexistência de cobertura contratual para o procedimento prescrito não constituem fundamentos válidos para justificar a negativa, uma vez que a relação entre as partes é regida pelas normas do Código de Defesa do Consumidor. Nesse sentido, aplica-se a Súmula 102 do Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo, que dispõe: Súmula 102: “Havendo expressa indicação médica, é abusiva a negativa de cobertura de custeio de tratamento sob o argumento da sua natureza experimental ou por não estar previsto no rol de procedimentos da ANS”. A aplicação dessas diretrizes não pode interferir na relação médico-paciente nem violar a função social do contrato de assistência à saúde, cujo objetivo primordial é garantir o acesso dos beneficiários aos tratamentos essenciais para sua saúde e bem-estar. Demais disso, é de rigor a autorização da medicação prescrita, sobretudo porque, tratando-se de medicamento que não é de uso oral ou domiciliar, sua cobertura deve ser garantida pelo plano de saúde, uma vez que a enfermidade diagnosticada está incluída no rol de procedimentos cobertos. Ressalta-se ainda que não se pode acolher a alegação de tratar-se de tratamento experimental, pois cabe ao médico, e não ao segurado, a escolha da terapêutica mais adequada, sendo esta expressamente indicada pelo profissional responsável. Casos semelhantes já foram analisados, conforme as jurisprudências a seguir: "APELAÇÃO - Ação de obrigação de fazer c.c pedido de indenização por danos morais. Autora portadora de miastenia gravis, (CID 10- G70) e lúpus eritematoso sistêmico (CID 10- M32). Indicação para utilização do medicamento mabthera (rituximab 100 mg). Recusa do fornecimento. Medicamento aprovado pela ANVISA. Rol da ANS" via de regra "taxativo. Evidências de eficácia no tratamento decorrentes da própria prescrição médica em tratamento da específica comorbidade. Recusa indevida. Limitação que ofende a boa-fé objetiva e o objeto da contratação entre as partes. Precedentes. Dano moral, contudo, não evidenciado. Recurso parcialmente provido." (TJSP - 6a Câmara de Direito Privado, Apelação Cível nº 1007112-50.2021.8.26.0007, Relator Desembargador Costa Netto, data do julgamento: 29.07.22). AGRAVO DE INSTRUMENTO. Ação de Obrigação de Fazer c/c pedido de Tutela de Urgência. plano de saúde. neuromielite óptica. CONCESSÃO DE TUTELA DE URGÊNCIA. DETERMINAÇÃO DE FORNECIMENTO DO MEDICAMENTO rituximabe. INSURGÊNCIA DA OPERADORA DO PLANO DE SAÚDE. ALEGAÇÃO DE QUE SE TRATA DE MEDICAMENTO DE USO EXPERIMENTAL/OFFLABEL. ABUSIVIDADE NA NEGATIVA. PRECEDENTES DO STJ. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS ESTABELECIDOS PELO ART. 300 DO NCPC. PROBABILIDADE DO DIREITO E PERICULUM IN MORA EVIDENCIADOS. INDICAÇÃO MÉDICA PARA O TRATAMENTO. RISCO DE SEQUELAS PERMANENTES. FÁRMACO INJETÁVEL QUE DEPENDE DA INTERVENÇÃO DE PROFISSIONAL HABILITADO PARA SUA ADMINISTRAÇÃO. AUSÊNCIA DE CARÁTER DOMICILIAR DO MEDICAMENTO. SUPERAÇÃO DA TAXATIVIDADE DO ROL DA ANS COM A ENTRADA EM VIGOR DA LEI Nº 14.454/2022 . PREVISÃO DE DOIS REQUISITOS ALTERNATIVOS PARA COBERTURA DE TRATAMENTOS OU PROCEDIMENTOS NÃO PREVISTOS NO ROL DA ANS. HIPÓTESES AFERÍVEIS SOMENTE APÓS A INSTRUÇÃO PROCESSUAL. PRETENSÃO DE EXCLUSÃO DA MULTA ARBITRADA. DESCABIMENTO. INVIABILIDADE DE REDUÇÃO DA QUANTIA PREVISTA PARA A PENALIDADE. VALOR PROPORCIONAL E ADEQUADO À FINALIDADE DA ASTREINTE. DECISÃO MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJPR - 10a Câmara Cível – 0013275-92.2023.8.16.0000 - Ponta Grossa - Rel.: DESEMBARGADOR MARCO ANTONIO ANTONIASSI - J. 04.09.2023). Dessa forma, a análise do caso evidencia que a doença que acomete a autora está expressamente coberta pelo contrato do plano de saúde, tornando indevida a recusa da operadora em custear o tratamento prescrito pelo médico responsável, principalmente quando essa negativa se fundamenta exclusivamente na alegação de que o uso do medicamento não estaria em conformidade com normas contratuais. Além disso, o entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ) se baseia no princípio de que, uma vez que a operadora de plano de saúde se compromete a cobrir determinada doença, não pode interferir na escolha do tratamento indicado pelo médico responsável. A jurisprudência tem reforçado que a negativa de cobertura com base em critérios administrativos ou contratuais não pode se sobrepor à prescrição médica, especialmente quando se trata de tratamentos essenciais à saúde, à qualidade de vida e à sobrevida do paciente. Além disso, o STJ tem decidido reiteradamente que cláusulas contratuais que restrinjam tratamentos necessários podem ser consideradas abusivas, conforme o Código de Defesa do Consumidor (CDC). Assim, o médico, como profissional qualificado para avaliar as necessidades de saúde do paciente, tem autonomia para prescrever o tratamento mais adequado, levando em conta as circunstâncias específicas do caso, sem que as operadoras de saúde possam impor limitações arbitrárias ou contrárias à recomendação médica. Vejamos: "RECURSOS DE APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C DANOS MORAIS - PLANO DE SAÚDE - PROCEDÊNCIA - APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR- RECURSO DA PARTE AUTORA NÃO CONHECIDO EM RAZÃO DE DESERÇÃO - NEOPLASIA DE PULMÃO -INDICAÇÃO MÉDICA DE TRATAMENTO COM MEDICAMENTO TAGRISSO 80 MG (OSIMERTINIBE) - NEGATIVA DE CUSTEIO - TRATAMENTO INDICADO POR PROFISISONAL MÉDICO RESPONSÁVEL- MEDICAMENTO REGISTRADO NA ANVISA - COBERTURA DEVIDA -DANO MORAL - MANUTENÇÃO - RECURSO DO AUTOR NÃO CONHECIDO E APELO DA REQUERIDA DESPROVIDO. 1. Os contratos de planos de saúde estão submetidos ao Código de Defesa do Consumidor, nos termos do artigo 35 da Lei 9.656/98, pois envolvem típica relação de consumo. Assim, na espécie, incide o artigo 47 do CDC, que determina a interpretação das cláusulas contratuais de maneira mais favorável ao consumidor. 2. Constitui entendimento pacífico no Superior Tribunal de Justiça de que é o médico responsável pelo beneficiário quem apresenta melhor condição técnica para a escolha do tratamento adequado ao combate da patologia diagnosticada, sendo indevida a negativa por parte da operadora do plano de saúde em autorizar procedimento indicado pelo profissional para melhor tratamento da enfermidade coberta pelo plano. 3. Prescrito pelo médico responsável o tratamento com Tagrisso-80mg para tratamento de neoplasia do pulmão e não obstante a negativa do medicamento sob a alegação de não se encontrar inserido no rol da ANS, nota-se que o rol é utilizado como referência e apresenta os eventos de saúde mínimos e básicos que devem ser obrigatoriamente cobertos, portanto, o fato do tratamento não constar do plano referência, não configura óbice para que a requerida preste o serviço."(TJMT, N.U 1046154-89.2019.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARILSEN ANDRADE ADDARIO, Segunda Câmara de Direito Privado, Julgado em 07/06/2023, Publicado no DJE 11/06/2023) [Destaquei]. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL - AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C PEDIDO CONDENATÓRIO - PLANO DE SAÚDE - RECUSA DE COBERTURA DE TRATAMENTO MÉDICO - USO OFF LABEL- DECISÃO MONOCRÁTICA QUE NEGOU PROVIMENTO RECLAMO - INSURGÊNCIA DA AGRAVANTE. 1. A jurisprudência desta Corte é no sentido de que os planos de saúde podem, por expressa disposição contratual, restringir as enfermidades cobertas, sendo-lhes vedado, no entanto, limitar os tratamentos a serem realizados. Considera-se abusiva a negativa de cobertura de plano de saúde quando a doença do paciente não constar na bula do medicamento prescrito pelo médico que ministra o tratamento (off label). 2. De acordo com a jurisprudência desta Corte Superior, o descumprimento contratual por parte da operadora de saúde, que culmina em negativa de cobertura para procedimento de saúde, enseja reparação a título de danos morais quando houver agravamento da condição de dor, abalo psicológico ou prejuízos à saúde já debilitada do paciente, o que foi constatado pela Corte de origem no caso concreto. 3. Agravo interno desprovido. (STJ, AgInt no REsp 1940157/DF, Rel. Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, julgado em 14/02/2022, DJe 21/02/2022). Grifei. A lei 9.656/98, que dispõe sobre os planos e seguros privados de assistência à saúde, determina em seu art. 12, I, 'b' que: Art. 12. São facultadas a oferta, a contratação e a vigência dos produtos de que tratam o inciso I e o § 1º do art. 1º desta Lei, nas segmentações previstas nos incisos I a IV deste artigo, respeitadas as respectivas amplitudes de cobertura definidas no plano-referência de que trata o art. 10, segundo as seguintes exigências mínimas: I - quando incluir atendimento ambulatorial: (...). b) cobertura de serviços de apoio diagnóstico, tratamentos e demais procedimentos ambulatoriais, solicitados pelo médico assistente Nessa seara, quando uma doença está coberta pelo contrato de plano de saúde, todos os procedimentos necessários ao seu tratamento também devem ser abrangidos pela cobertura, conforme o princípio da integralidade do cuidado à saúde. Isso inclui, além do tratamento clínico, medicamentos, exames, cirurgias e qualquer outro procedimento prescrito pelo médico responsável, desde que relacionados diretamente à doença coberta. Dessa forma, a negativa da operadora se revela abusiva, violando o direito do autor ao tratamento adequado e contrariando a finalidade essencial do contrato de assistência à saúde. Portanto, impõe-se o deferimento do pedido, com a consequente determinação de cobertura do procedimento indicado pelo médico responsável. 2.2.3. DO DANO MORAL No tocante ao dano moral, verifica-se configurado na hipótese. O dano moral, diferentemente do dano material, prescinde de comprovação em juízo, posto que sua ocorrência é presumida diretamente do ato que apresente potencial de dano, sendo hábil a gerar perturbações na esfera psicológica da vítima, bastando que se configure a potencialidade lesiva do ato para que gere o deve de indenizar. É fato, o Direito Positivo brasileiro autoriza a imposição para reparação de dano moral sempre que restar configurado a violação a algum dos direitos relativos à personalidade do indivíduo, ou seja, quando sofre prejuízo aos sentimentos afetivos de um sujeito de direito (art. 5º, V da CF e art. 183 do CC). No presente caso, ficam evidenciados os danos morais alegados, uma vez que a necessidade do fornecimento da medicação Mabthera – Rituximabe é inequívoca e devidamente justificada pelos problemas decorrentes da artrite reumatoide soronegativa (CID M06) – poliartrite inflamatória crônica e simétrica de interfalageanas proximais, metacarpofalangeanas que acomete a autora. Ao privar a autora de um tratamento mais seguro e eficaz, a operadora não apenas comprometeu sua recuperação, mas também lhe impôs aflição e sofrimento desnecessários. Diante disso, deve ser responsabilizada pelos danos extrapatrimoniais causados. Diante do contexto dos autos, reconheço a configuração de danos morais, uma vez que a negativa impôs a autora um sofrimento que ultrapassa o mero inadimplemento contratual, atingindo sua dignidade e bem-estar. Nesse sentido, os seguintes precedentes: RECURSO INOMINADO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PLANO DE SAÚDE. NEGATIVA DE COBERTURA DE MEDICAMENTO. BENEFICIÁRIO DIAGNOSTICADO COM ANEMIA HEMOLÍTICA AUTOIMUNE (AHAI.. PRESCRIÇÃO DO MEDICAMENTO RITUXIMABE. TRATAMENTO OFF-LABEL. INGERÊNCIA DA OPERADORA NA ATIVIDADE MÉDICA. CONDUTA ABUSIVA. PRECEDENTE DO STJ. DANO MORAL CONFIGURADO. VALOR ARBITRADO REDUZIDO NO CASO CONCRETO . SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. (TJPR - 1a Turma Recursal – 0000861-31.2022.8.16.0151 - Santa Izabel do Ivaí - Rel.: JUÍZA DE DIREITO DA TURMA RECURSAL DOS JUÍZAADOS ESPECIAIS VANESSA BASSANI - J. 19.10.2023). APELAÇÃO. Plano de saúde. Ação de obrigação de fazer C/C Danos morais. Negativa de cobertura. Beneficiária portadora de doença neurológica rara e gravíssima (NEUROMIELITE ÓPTICA RECORRENTE COM AQUAPORINA) Medicamento MABTHERA (RITUXIMABE). Negativa de fornecimento ABUSIVA, a potencialmente implicar em SEQUELAS IRREVERSÍVEIS E RISCO DE MORTE. Ausência de previsão no rol da ANS. Irrelevância. Recusa injustificada da operadora. Previsão de cobertura para a patologia. Existência de expressa indicação médica quanto ao procedimento mais adequado a ser utilizado. Inteligência da súmula 102, deste E.TJSP. Dever de cobertura que se impõe. Aplicabilidade do CDC. Súmula 608 do STJ. Abusividade reconhecida. Dever de reparação. Dano moral in re ipsa. Quantum indenizatório mantido em R$ 5.500,00. Minoração/cassação descabidas. Sentença mantida. Adoção do art. 252 do RITJ. RECURSO DESPROVIDO. (TJSP; Apelação Cível 1001081-59.2020.8.26.0650; Relator (a): Jair de Souza; Órgão Julgador: 10a Câmara de Direito Privado; Foro de Valinhos - 2a Vara; Data do Julgamento: 29/11/2021; Data de Registro: 29/11/2021). Diante da análise dos autos e considerando que a parte autora sofreu prejuízos decorrentes da negativa indevida do plano de saúde quanto à cobertura do tratamento prescrito, é evidente a presença dos requisitos necessários para a responsabilização da operadora, bem como para a consequente indenização por danos morais. No que se refere ao valor indenizatório, a jurisprudência é pacífica ao afirmar que, em casos de dano moral, a condenação deve estipular um montante suficiente para proporcionar alívio e compensação ao ofendido, sem, contudo, configurar enriquecimento sem causa. Além disso, a quantia fixada deve possuir caráter pedagógico, de modo a inibir condutas semelhantes por parte da parte ré. No presente caso, levando em consideração as circunstâncias específicas das partes envolvidas e a natureza da infração cometida, entende-se que o valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) é adequado. Trata-se de quantia equilibrada: não excessiva a ponto de penalizar desproporcionalmente a operadora do plano de saúde, mas suficiente para reparar o sofrimento experimentado pela parte autora, diante do cenário de negligência vivenciado. Assim, resta evidente o abalo moral sofrido pela parte autora, o qual transcende meros aborrecimentos cotidianos, tornando imperiosa a procedência do pedido de indenização por danos morais. 3. DISPOSITIVO. Ante o exposto, com base no art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO PROCEDENTES os pedidos formulados na inicial, para: a) Confirmar e tornar definitivos os efeitos da tutela de urgência concedida no ID nº 135622546, em todos os seus termos. b) Condenar o réu ao pagamento, à parte autora, da quantia de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), a título de danos morais. Tal valor deverá ser acrescido, até 29/08/2024, de correção monetária com base no IPCA, a contar da data da prolação desta sentença (nos termos da Súmula 362 do STJ), bem como de juros de mora de 1% ao mês, contados desde a data da citação. A partir de 30/08/2024, incidirá exclusivamente a Taxa SELIC, a qual engloba tanto os juros de mora quanto a atualização monetária pelo IPCA, conforme disposto no artigo 406, § 1º, do Código Civil, em sua redação atualizada pela Lei nº 14.905/2024, de aplicação imediata. Condeno, ainda, a parte ré ao pagamento das custas processuais, bem como dos honorários advocatícios, os quais fixo em 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do art. 85, § 2º, do Código de Processo Civil. Tal percentual abrange tanto a obrigação de pagar quantia certa quanto a obrigação de fazer, cujo montante deverá ser apurado oportunamente em sede de liquidação de sentença. Nos termos do entendimento firmado pela 2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do EAREsp 198.124/RS, de relatoria do Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, ocorrido em 27/04/2022, restou estabelecida a tese de que, em ações envolvendo o custeio de tratamentos médicos, a condenação em obrigação de fazer possui proveito econômico mensurável a partir do valor da cobertura negada indevidamente, devendo, portanto, integrar a base de cálculo dos honorários advocatícios sucumbenciais. Com o trânsito em julgado e não havendo requerimentos pendentes, determino o arquivamento dos autos, com a devida baixa. Publique-se. Registre-se. Intime-se. São Luís/MA, data do sistema. JOSÉ AFONSO BEZERRA DE LIMA Juiz de Direito Titular da 4ª Vara Cível e São Luís/MA.

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