Processo nº 0819377-08.2024.8.10.0040
ID: 325123410
Tribunal: TJMA
Órgão: 2ª VARA CRIMINAL DE IMPERATRIZ
Classe: PROCEDIMENTO ESPECIAL DA LEI ANTITóXICOS
Nº Processo: 0819377-08.2024.8.10.0040
Data de Disponibilização:
15/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
THIAGO BARROS AGENOR
OAB/MA XXXXXX
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FABRICIO COSTA DE ANDRADE
OAB/MA XXXXXX
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2ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA CRIMINAL Av. Perimetral José Felipe do Nascimento, Qd. 21, s/n, Loteamento Residencial Kubitschek, CEP: 65914-300 AO JUÍZO DA 2ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE IMPERATRIZ/MA Açã…
2ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA CRIMINAL Av. Perimetral José Felipe do Nascimento, Qd. 21, s/n, Loteamento Residencial Kubitschek, CEP: 65914-300 AO JUÍZO DA 2ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE IMPERATRIZ/MA Ação Penal nº 0819377-08.2024.8.10.0040 Réu(s): Dorivan da Costa Souza, Deusina Lusia da Costa Souza, Ducileia da Costa Souza, Lucas Rodrigues Sousa, Robson dos Santos Sousa e Clodomir da Silva Farias Incidência Penal: arts. 33 e 35 da Lei nº 11.343/06 O MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL, por seu Promotor de Justiça signatário, vem à presença de Vossa Excelência, nos autos do processo em epígrafe, oferecer suas ALEGAÇÕES FINAIS em forma de memoriais, nos termos seguintes: I – DO RELATÓRIO Trata-se de Ação Penal movida pelo Ministério Público em desfavor dos acusados acima nominados, pela prática dos crimes em epígrafe. Consta na denúncia que, no dia 05 de setembro de 2024, durante cumprimento de mandado de busca e apreensão na "Chácara Manelão" (Rua Santo Antônio, 1445, Nova Imperatriz), policiais da Delegacia de Repressão ao Narcotráfico prenderam em flagrante Dorivan da Costa Souza, Deusina Lusia da Costa Souza, Ducileia da Costa Souza, Lucas Rodrigues Sousa e Robson dos Santos Souza por depósito e guarda de drogas. No local, foram encontrados 14 invólucros de crack e 10 de maconha (próximos a um sofá, assumidos por Robson); 1 pedaço de crack e 6 trouxas da mesma substância em uma mochila atribuída a Dorivan, que foi encontrado escondido em uma árvore; 13 porções de maconha, 3 de crack e uma porção maior embalada no bolso de Lucas, que confessou a posse. Além disso, análises preliminares do celular de Dorivan revelaram transações via PIX com Clodomir da Silva Farias (fornecedor), incluindo mensagens como "vou pega 5" e comprovantes de pagamento (R$ 240,00 e R$ 80,00). A denúncia foi recebida aos 16 de outubro de 2024 (ID 132192155). Os acusados foram devidamente notificados, pelo que Ducileia, Lucas, Robson e Deusina apresentaram defesa preliminar por intermédio de Advogado Constituído (ID 139700409). Dorivan e Clodomir apresentaram defesa prévia por meio da defensoria pública (ID 143576337 e 144970980, respectivamente). Certidão de antecedentes criminais de Dorivan (ID 147905433). Certidão de antecedentes criminais de Deusina (ID 147912125). Certidão de antecedentes criminais de Ducileia (ID 147916841). Certidão de antecedentes criminais de Lucas (ID 147916865). Certidão de antecedentes criminais de Robson (ID 147918941). Certidão de antecedentes criminais de Clodomir (ID 147920146). Laudo de Exame em Material Amarelo Sólido e Substância Vegetal n° 2024. 653 /PO (ID 148036055). Realizada Audiência de Instrução e Julgamento em 05 de junho de 2025, com oitiva das testemunhas arroladas pelo Ministério Público, findando-se o ato com o interrogatório dos acusados. Finda a instrução criminal, os autos vieram com vista ao Ministério Público para oferecimento das alegações finais em forma de memoriais. II – PRELIMINARMENTE De início, calha ressaltar a presença dos pressupostos processuais e das condições da ação penal. Verifica-se, através do compulsar dos autos, que o feito percorreu regularmente os trâmites legais, inexistindo vícios a serem sanados. III – DO MÉRITO Sabe-se que para o decreto condenatório faz-se necessário ter certeza e segurança jurídica no que tange à materialidade e à autoria delitiva. Da análise dos autos, portanto, verifica-se que todos os elementos carreados durante a instrução probatória sinalizam, de forma clara e evidente, para a prática das condutas ilícitas que ora são atribuídas aos acusados. Após a instrução processual, restou demonstrado que DORIVAN DA COSTA SOUZA, DEUSINA LUSIA DA COSTA SOUZA, DUCILEIA DA COSTA SOUZA, LUCAS RODRIGUES SOUSA e ROBSON DOS SANTOS SOUZA atuavam na venda de substâncias psicoativas de uso proscrito, bem como uniram esforços à prática da traficância. A materialidade dos crimes restou comprovada pelo Auto de Apresentação e Apreensão (ID 130996363 - Pág. 13) que descreve as substâncias entorpecentes e os demais objetos apreendidos: 24 (vinte e quatro) invólucros de maconha e 24 (vinte e quatro) invólucros de crack, totalizando 520,8g de massa líquida de entorpecentes; 02 (dois) rolos de papel alumínio; 01 (uma) tesoura; 02 (duas) linhas de costura; a quantia de 214,00 (duzentos e catorze reais) em cédulas de cem, vinte, dez, cinco e dois reais; e 03 (três) aparelhos celulares. Ainda, corrobora à materialidade o BOPC n° 230552/2024 (ID 130996363 - Pág. 16) que descreve sucintamente a ocorrência policial e o Relatório de Análise Preliminar de Aparelho Celular (ID 130996363 - Pág. 46) realizado no dispositivo de DORIVAN, constatando conversas relativas à aquisição de drogas com o fornecedor CLODOMIR. Ratifica a materialidade o Laudo Pericial de Exame em Materiais Amarelo Sólido e Substância Vegetal n° 2024.653/PO (ID 148036055) que atestou, em caráter DEFINITIVO, a presença de THC (Delta-9-Tetrahidrocanabinol), principal componente psicoativo da Cannabis sativa L. (MACONHA) em 88,900g (massa líquida) de material vegetal, além da presença do alcalóide CRACK na forma de BASE (contido nas formas de apresentação “pasta base”, “merla” e “crack” e etc.), extraído da planta cientificamente denominada Erythroxylum coca Lam, em 431g (massa líquida) de material amarelo sólido (CRACK). Analisando, por sua vez, a pertinência quanto à autoria, compreende-se como provada integralmente a conduta de tráfico de drogas e respectiva associação, na pessoa dos acusados, à vista dos documentos colacionados e depoimentos colhidos em Juízo, em cotejo com os indícios apurados na investigação preliminar. Durante a instrução criminal, os policiais responsáveis pela investigação e prisão dos acusados e pela apreensão dos objetos ilícitos, narraram o desenvolvimento da ação a partir dos primeiros indícios do crime de tráfico de drogas e associação criminosa até a verificação material ex-post de sua ocorrência. A delegada da DENARC Jéssica Ingrid presidiu a investigação sobre a "Chácara Manelão", um conhecido ponto de venda de drogas em Imperatriz/MA. Relatou que a investigação iniciou-se com base em denúncias anônimas e requisição do Ministério Público. Ao longo de mais de um ano de diligências, foram feitas vigilâncias que confirmaram a atuação contínua da família “Costa Souza” no tráfico de drogas, com estrutura organizada, olheiros, venda através de grades, e forte presença de usuários no entorno. A delegada destacou que a movimentação de entorpecentes era constante e evidente, com usuários consumindo drogas no local, sendo este um cenário conhecido pela população. Durante a operação realizada em setembro de 2024, foram encontradas drogas em diversos cômodos da chácara, inclusive dentro de um sofá (atribuída a Robson), numa mochila (de Dorivan, que foi encontrado escondido numa árvore) e no bolso de uma bermuda (relacionada a Lucas). A delegada relatou que Clodomir era fornecedor de drogas para o grupo, e que os celulares apreendidos revelaram conversas com tratativas diretas de compra e venda de entorpecentes, inclusive com registros de pagamentos via PIX. Apontou que a idosa, Deuzina, era quem permanecia no local e, embora não usasse celular, tinha papel importante na guarda das drogas. A delegada reforçou a configuração de associação para o tráfico, especialmente entre membros da família “Costa Souza” e agregados, como Clodomir. Segundo ela, o Manelão operava como uma espécie de "empresa familiar do tráfico". Esclareceu que Robson e Lucas não foram investigados previamente, mas foram flagrados no local com drogas em circunstâncias que demonstram envolvimento. Ao ser questionada sobre vínculos pessoais entre os acusados e a droga apreendida, confirmou que todos tinham algum papel – desde a guarda, até a venda e o fornecimento. O investigador da DENARC Jucelino Sobreiro apontou que o local já era há décadas conhecido como um dos maiores pontos de tráfico e consumo de crack da cidade, com histórico de procedimentos policiais que remontam a pelo menos 2010. Durante a operação, com o auxílio de cães farejadores, foram localizadas porções de drogas em locais de difícil acesso – dentro de sofá, no bolso de bermuda em meio a roupas e em mochilas. Ressaltou que sem o uso dos cães seria quase impossível localizar tais entorpecentes. O investigador narrou que Dorivan foi encontrado escondido na copa de uma árvore, e que familiares apontaram a mochila contendo drogas como sendo de sua propriedade. Relatou que o Clodomir (vulgo "Didi") foi identificado como fornecedor do grupo, sendo também preso com grande quantidade de drogas e apetrechos para preparação e venda. A análise do celular de Dorivan confirmou o vínculo com Clodomir, com mensagens solicitando droga e pagamentos identificados via PIX. O policial enfatizou que a operação foi resultado direto de investigação iniciada em 2022, na qual já havia evidência do envolvimento de Dorivan em diversos TCOs e inquéritos antigos. Sobre a configuração da associação para o tráfico, Jucelino afirmou que o fato de diversas pessoas estarem no imóvel, cada uma relacionada a porções de droga, indica associação estável e consciente. O investigador relatou que Deuzina, conhecida como a matriarca da família, residia de forma permanente na Chácara do Manelão, enquanto os demais membros – filhos, netos e agregados – apenas frequentavam o local ocasionalmente. Destacou que a residência era há décadas um conhecido ponto de tráfico, sendo inconcebível que ela desconhecesse ou não consentisse com a continuidade dessa prática ilícita sob seu teto. O investigador afirmou que a percepção da polícia sempre foi de que, apesar de raramente responsabilizada judicialmente, Deuzina permitia e facilitava o tráfico de drogas ao longo dos anos, o que se agravou com a descoberta, na análise do celular de Dorivan, de mensagem que sugeria o envio de drogas à “coroa”, referência clara à própria Deuzina. Tal elemento reforçou, segundo ele, a conclusão de que ela exercia papel ativo, especialmente na guarda das drogas. A respeito de Ducileia, mencionou que, em levantamento anterior, esta havia sido autuada por tráfico em 2017, embora esse fato diga respeito a outro processo, ressalta que a presença desta no local e o histórico da família vinculam a acusada ao cenário de tráfico e associação. A investigadora da DENARC Karla Viana Logrado ratificou que, na operação realizada em 2024, com o auxílio de cães farejadores, foram encontradas drogas em diversos pontos da casa: no sofá (atribuída a Robson, que assumiu a propriedade), no guarda-roupa do quarto utilizado por Lucas (em um short seu), na despensa, e dentro de uma mochila apontada como sendo de Dorivan – que se encontrava escondido em cima de uma árvore no momento da abordagem. Disse que Deuzina e Ducileia, ambas presentes no local, confirmaram que a mochila com droga era de Dorivan, e que todos os acusados estavam presentes no momento da diligência. Reforçou ainda que todos os membros da família “Costa Souza” possuem envolvimento anterior com o tráfico, respondendo a diversos processos, inclusive com reincidência. No tocante à análise de dados extraídos de celulares, Karla apontou que as conversas entre Dorivan e Clodomir (vulgo Didi) revelaram negociações de drogas nos dias 2 e 4 de setembro de 2024, com tratativas de entrega e pagamentos via PIX. Em uma das conversas, Dorivan menciona que a droga seria “para a coroa”, o que a investigadora interpretou como sendo uma referência à própria mãe, Deuzina, reforçando a suspeita de seu envolvimento direto ou, no mínimo, consentido com o tráfico. Ressaltou que, apesar da idade avançada de Deuzina e da ausência de apreensão direta com ela, todos os eventos criminosos ocorriam dentro da casa de sua propriedade, com seu conhecimento. Sobre Duciléia, a investigadora indicou que a acusada estava presente na casa no momento da operação, apesar de ter declarado que reside em outro endereço. Observou, no entanto, que ela amanheceu dormindo no local, o que é recorrente entre os membros da família, devido à frequência com que dormem e circulam na residência para manter as atividades traficantes. Em que pese a ausência de flagrante com drogas ou diálogo incriminador, a testemunha expressou a convicção de que Ducileia está associada ao tráfico, devido à frequente permanência no local, ao vínculo familiar e ao conhecimento pleno da atividade criminosa recorrente no imóvel, confirmado em razão de, no momento do flagrante, a acusada ter apontado a propriedade da mochila com droga à Dorivan. A testemunha afirmou que o tráfico no Manelão era contínuo, diuturno e estruturado, com movimentação intensa de usuários nas imediações e presença constante de pessoas dormindo na casa. Frise-se, que o simples fato das testemunhas de acusação serem agentes de polícia não desabonam suas declarações prestadas na fase judicial, sendo tais depoimentos válidos e aptos a fundamentar os decretos condenatórios. Conforme segue: “Ressalta-se, por oportuno, que ‘a palavra dos policiais, na condição de representantes do Estado, goza de presunção relativa de veracidade, mormente quando corroborada com outros elementos de prova coligidos aos autos, reclamando, desta forma, prova robusta em contrário para ser considerada inidônea.’ (TJSC, Apelação Criminal n. 0000589- 35.2018.8.24.0125, de Itapema, rel. Hildemar Meneguzzi de Carvalho, Primeira Câmara Criminal, j. 27-08-2020). Em outras palavras, perfilha-se do entendimento de que o testemunho apresentado por agente policial, quando isoladamente considerado, não tem o condão de enfraquecer a autenticidade da narrativa e seu respectivo valor probante, até porque é costume chamar para depor em juízo os específicos policiais que realizaram a abordagem e a autuação do flagrante delito, os quais, justo por isso, possuem um conhecimento direto e imediato dos fatos ‘e corroboram as demais provas dos autos, além disso, gozam de presunção da veracidade quando estão no exercício de suas funções.’ (TJSC, Apelação Criminal n. 0001974-22.2017.8.24.0038, de Joinville, rel. Des. Carlos Alberto Civinski, Primeira Câmara Criminal, j. 13-07-2017)”. (STF - ARE: 1406375 SC, Relator: ANDRÉ MENDONÇA, Data de Julgamento: 12/03/2023, Data de Publicação: PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 10/03/2023 PUBLIC 13/03/2023)(grifos nossos). Ainda, dos elementos da instrução, destaca-se que as acusadas DEUZINA e DUCILEIA negaram qualquer envolvimento com o tráfico de drogas. Todavia, no tocante à acusada DEUZINA LUSIA DA COSTA SOUZA os elementos probatórios demonstram sua participação ativa no tráfico de drogas e na associação criminosa, ainda que não tenha sido flagrada diretamente com entorpecentes. Embora a droga não tenha sido encontrada diretamente com Deuzina Lusia da Costa Souza, é incontroverso que o tráfico ocorria de forma permanente dentro de sua residência, com seu conhecimento e consentimento. Trata-se de ponto já conhecido da polícia há anos, onde entorpecentes foram apreendidos em diferentes cômodos e pessoas foram flagradas pernoitando com droga. Deuzina era a única moradora fixa, não apresentou qualquer reação diante da rotina criminosa dentro do seu lar e foi mencionada em conversa de Dorivan com fornecedor como destinatária (“a coroa”) de droga, o que reforça sua participação. Quanto à associação para o tráfico, está demonstrado que a chácara operava como núcleo estável e familiar de comercialização de drogas, com divisão de funções e permanência dos envolvidos. Todos os seus filhos e netos já foram presos ou investigados por tráfico, e a dinâmica verificada nas diligências confirma vínculo duradouro entre os agentes. A omissão deliberada de Deuzina e sua tolerância contínua à prática criminosa no interior da casa comprovam sua adesão ao grupo, preenchendo os requisitos típicos do crime previsto no art. 35 da Lei de Drogas. Em relação à acusada DUCILEIA DA COSTA SOUZA, embora não tenha sido apreendida droga em sua posse direta ou conteúdo incriminador em seu celular, sua presença no interior da residência no momento da operação, é circunstância que corrobora sua vinculação ao tráfico de drogas que ali ocorria. Além disso, foi ela quem apontou a mochila com drogas encontrada na despensa como sendo de Dorivan, o que demonstra conhecimento sobre o armazenamento e a destinação do entorpecente no imóvel. Quanto à associação para o tráfico, sua conduta se insere no contexto de atuação coletiva e contínua da família Costa Souza, que utilizava a chácara como base para o comércio ilícito. Mesmo alegando morar em outro endereço, a frequência com que dormia no local, o vínculo direto com os demais envolvidos e sua omissão diante da prática criminosa recorrente indicam participação estável e consciente na estrutura associativa voltada ao tráfico. Os acusados ROBSON, LUCAS e DORIVAN, em interrogatório judicial, alegaram serem apenas usuários de drogas e negaram o tráfico. No entanto, suas versões se dissociam dos elementos probatórios. ROBSON DOS SANTOS SOUSA foi flagrado dentro da chácara no momento da operação policial e assumiu a propriedade da droga encontrada no interior do sofá, especificamente porções de maconha e crack. A droga estava embalada, em quantidade e forma indicativas de fracionamento para venda, incompatíveis com uso pessoal. Ele alegou que era usuário e que as drogas seriam para uso conjunto com Dorivan, mas não apresentou qualquer comprovação dessa versão. No tocante à associação para o tráfico, sua presença na casa, a posse de droga com características comerciais e o vínculo com demais envolvidos indicam sua integração à estrutura criminosa. Ainda que não residisse no local, as condições da abordagem e as informações das testemunhas policiais, bem como a apreensão da substância em sua posse, demonstram adesão ao funcionamento do grupo e participação consciente na atividade ilícita. Além disso, pesam em seu desfavor os antecedentes criminais de ID 147918941, que mostram seu envolvimento contínuo com atividades criminosas. Já LUCAS RODRIGUES SOUSA, foi encontrado dormindo no quarto da chácara onde, com auxílio de cão farejador, foi localizada droga dentro do bolso de um short em seu guarda-roupa. Ele admitiu ser usuário, assim como sua esposa, e negou envolvimento com o tráfico, mas não soube explicar a origem da droga nem apresentou indícios de que se tratava de uso exclusivo. Também não foi apreendido com ele dinheiro, balança ou apetrechos de comercialização. Entretanto, sua ligação familiar com os principais investigados (neto de Deuzina), a posse da droga em ambiente privado de seu uso e sua presença no local conhecido por tráfico estruturado indicam sua participação e a associação, sendo integrante consciente do funcionamento coletivo do tráfico no Manelão. Constam, também, em seus antecedentes ID 147916865, inquéritos em curso. Por sua vez, DORIVAN DA COSTA SOUZA foi identificado como proprietário da mochila com drogas escondida na despensa, conforme apontado por Deuzina e Ducileia. Quando a polícia chegou, foi encontrado escondido no alto de uma árvore, conduta que revela tentativa de fuga. No interrogatório, alegou ser apenas usuário, já internado diversas vezes, e negou envolvimento com o tráfico, mas não justificou a posse da droga ou sua conduta evasiva. O Relatório de Análise Preliminar de Aparelho Celular (ID 130996363 - Pág. 46) revela conversas no celular de Dorivan com Clodomir, fornecedor, tratando da compra de drogas com pagamentos via PIX e mencionando que a entrega seria para Deuzina. Esses elementos demonstram que Dorivan atuava ativamente na aquisição e redistribuição de drogas, não apenas como usuário, mas como elo operacional da associação criminosa. Ademais, no caso de Dorivan, constata-se um histórico criminal extenso e reiterado. O réu responde a várias ações penais e inquéritos, entre elas os processos nº 0001032-71.2017 e 0800553-81.2022.8.10.0036, bem como ao inquérito nº 0817498-63.2024. Ainda pesa contra ele a condenação no processo nº 0800712-54.2021, onde foi sentenciado a 11 anos, 9 meses e 22 dias de reclusão, com recurso pendente de julgamento. Também consta outra condenação penal no processo nº 0000382-24.2017, com pena de 2 anos de reclusão, igualmente objeto de apelação. Por fim, tramita contra ele execução penal (proc. nº 5000012-47.2023), o que evidencia envolvimento habitual com a criminalidade, circunstância que reforça sua culpabilidade (ID 147905433). Por fim, no que tange a CLODOMIR DA SILVA FARIAS, este foi identificado como fornecedor de drogas para o grupo da chácara, especialmente para Dorivan, com quem mantinha tratativas comerciais, conforme revelado na análise do celular apreendido. As mensagens indicavam negociação de quantidades fracionadas, com referência a valores e transferências bancárias, o que confirma sua atuação no fornecimento dos entorpecentes vendidos no Manelão. Apesar de negar vínculo com os demais acusados (à exceção de Dorivan, que conhecia “de vista”), o Relatório de Análise o vincula diretamente à estrutura criminosa. Sua atuação, ainda que fora da chácara, era essencial para a manutenção do ponto de tráfico, caracterizando não apenas o tráfico, como também sua participação na associação estável e colaborativa com os demais. Outrossim, Clodomir já figura em diversos procedimentos criminais em curso, dois inquéritos policiais em trâmite na Central de Custódia e Inquéritos (proc. nºs 0822337-34.2024.8.10.0040 e 0810678-28.2024.8.10.0040), além de responder a execução penal (proc. nº 5000278-68.2022.8.10.0040), o que revela habitualidade delitiva e envolvimento usual com o tráfico de entorpecentes, pesando negativamente em sua culpabilidade (ID 147920146). Para além dos argumentos expostos, convém mencionar que o Auto de Apresentação e Apreensão (130996363 - Pág. 13) atesta a apreensão em posse dos acusados, de petrechos característicos do tráfico, entre estes: 24 (vinte e quatro) invólucros de maconha e 24 (vinte e quatro) invólucros de crack, totalizando 520,8g de massa líquida de entorpecentes; R$ 214,00 (duzentos e catorze reais) em cédulas de cem, vinte, dez, cinco e dois reais; 02 (dois) rolos de papel alumínio; 01 (uma) tesoura; 02 (duas) linhas de costura, materiais típicos para embalo de drogas, apontando a finalidade comercial da substância confiscada. Dessa forma, a instrução processual comprovou a materialidade e a autoria do crime de tráfico de drogas (art. 33 da Lei nº 11.343/2006), destacando-se que sua configuração independe de dolo específico, diferentemente do uso de drogas (art. 28) que, por sua vez, exige prova de destinação exclusiva ao consumo pessoal. Nesse sentido, segue entendimento jurisprudencial. APELAÇÃO CRIME – TRÁFICO DE ENTORPECENTES (LEI Nº 11.343/06, ART. 33)– CONDENAÇÃO – RECURSO DA DEFESA. PRETENSÃO DE ABSOLVIÇÃO OU DE DESCLASSIFICAÇÃO DA CONDUTA PARA USO DE DROGAS – IMPROCEDÊNCIA – SUFICIENTE COMPROVAÇÃO DA MATERIALIDADE E DA AUTORIA DO TRÁFICO – VALIDADE DOS DEPOIMENTOS DOS POLICIAIS – ALEGADA CONDIÇÃO DE USUÁRIO QUE, POR SI SÓ, NÃO AFASTA A TRAFICÂNCIA – CONDENAÇÃO MANTIDA. RECURSO NÃO PROVIDO. (TJ-PR - APL: 00091927120188160044 PR 0009192-71.2018.8.16.0044 (Acórdão), Relator: Desembargador Rui Bacellar Filho, Data de Julgamento: 12/12/2019, 4ª Câmara Criminal, Data de Publicação: 13/12/2019) Noutro prisma, não há elementos probatórios suficientes que comprovem a alegação de que a substância entorpecente apreendida possuía finalidade exclusiva de uso pessoal. Ademais, a eventual condição de usuário de drogas por parte dos agentes não afasta, por si só, a configuração do crime de tráfico, uma vez que não há incompatibilidade entre as figuras de usuário e traficante, podendo coexistir tais circunstâncias. Ressalte-se que o crime em debate, caracteriza-se como ação de conteúdo plurissubsistente, consumando-se com qualquer conduta descrita no tipo penal, desde que a substância não seja destinada exclusivamente ao consumo pessoal. No caso em questão, a conduta do acusado enquadra-se no núcleo "vender", “guardar”, “ter em depósito”, conforme demonstrado. No que diz respeito ao crime de associação para o tráfico, previsto no artigo 35 da Lei nº 11.343/06, ficou claro que os réus se associaram com a finalidade de praticar tráfico de drogas de forma contínua e com divisão de tarefas, o que é suficiente para caracterizar a associação criminosa. Ademais, para a caracterização do delito, não é imprescindível a repetição dos atos ilícitos, bastando a prática de um único ato. No tocante a tal delito, o STJ exige a presença de um vínculo estável e permanente entre os agentes (REsp n. 2.052.196/MG, relatora Ministra Daniela Teixeira, Quinta Turma, julgado em 17/12/2024, DJEN de 6/1/2025). Na espécie, os elementos coletados no inquérito e confirmados na instrução evidenciam que DORIVAN DA COSTA SOUZA, DEUSINA LUSIA DA COSTA SOUZA, DUCILEIA DA COSTA SOUZA, LUCAS RODRIGUES SOUSA e ROBSON DOS SANTOS SOUZA. Pelo exposto, a instrução processual comprovou a materialidade e autoria do tráfico de drogas e da associação criminosa por DORIVAN DA COSTA SOUZA, DEUSINA LUSIA DA COSTA SOUZA, DUCILEIA DA COSTA SOUZA, LUCAS RODRIGUES SOUSA e ROBSON DOS SANTOS SOUZA, evidenciados pelo histórico do local, amplamente conhecido, não apenas pelos agentes de segurança, mas também pela população em geral, como principal ponto de tráfico de entorpecentes do município de Imperatriz/MA; pelas mensagens e transações descritas no Relatório de Análise Preliminar em Aparelho Celular (ID 130996363 - Pág. 46); pelos petrechos característicos apreendidos (tesoura, linhas, embalagens, dinheiro) e cerca de 500g (de massa líquida) de droga periciada no Laudo Pericial de Exame em Materiais Amarelo Sólido e Substância Vegetal n° 2024.653/PO (ID 148036055). Impende destacar aqui, inclusive, a importância da Teoria Racionalista da Prova, segundo a qual o juízo sobre os fatos deve ser pautado por critérios de lógica e racionalidade, bem como pelo pressuposto de “reconstrução dos fatos” passados, consubstanciando-se, pois, em ponto fundamental do processo penal e a partir do qual se pode verificar se a acusação imputada possui lastro probatório nos autos. Com base, pois, no acima alinhado, tem-se que o “standard probatório” se apresenta devidamente demonstrado, refletindo elevado nível de convencimento e certeza para a condenação dos acusados na forma requerida na exordial acusatória. - Da Não Incidência do Tráfico Privilegiado A aplicação da causa de diminuição de pena prevista no tráfico privilegiado encontra óbice diante da incidência do artigo 35 da Lei de Drogas, bem como em razão do vasto histórico de infrações penais em relação aos acusados Robson, Dorivan e Clodomir, que denota personalidade afeta a criminalidade. Tais circunstâncias afastam a possibilidade de reconhecimento de tal benefício legal: PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. CAUSA DE DIMINUIÇÃO DA PENA . INCOMPATIBILIDADE COM O CRIME DO ART. 35 DA LEI 11.343/2006. AGRAVO DESPROVIDO. 1. A configuração do crime de associação para o tráfico, previsto no art. 35 da Lei 11.343/2006, é suficiente para afastar a aplicação da minorante do tráfico privilegiado, porquanto evidencia a dedicação do agente à atividade criminosa . 2. Agravo regimental desprovido (STJ - AgRg no HC: 787004 SP 2022/0376338-1, Relator.: Ministro RIBEIRO DANTAS, Data de Julgamento: 24/04/2023, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 27/04/2023). PENAL. PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. TRÁFICO DE DROGAS. REITERAÇÃO DO MÉRITO. APREENSÃO DE PETRECHOS. NATUREZA E VARIEDADE DE DROGAS. INCABÍVEL A APLICAÇÃO DA MINORANTE DO ART. 33, § 4º, DA LEI N. 11.343/06. SÚMULA N. 7, STJ. PRECEDENTES. I - O agravo regimental deve trazer novos argumentos capazes de alterar o entendimento firmado anteriormente, sob pena de ser mantida a decisão agravada por seus próprios fundamentos. II - A jurisprudência desta Corte orienta-se no sentido de que a apreensão de petrechos para o tráfico e entorpecentes em circunstâncias que indiquem a dedicação a atividades criminosas é apta a afastar a minorante do tráfico privilegiado. Precedentes. III - Não tendo apresentado argumentos aptos a alterar a compreensão anteriormente firmada, a manutenção da decisão agravada é medida que se impõe.Agravo regimental desprovido (STJ - AgRg no AREsp: 2337688 ES 2023/0109598-3, Relator: Ministro MESSOD AZULAY NETO, Data de Julgamento: 10/09/2024, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 17/09/2024) - DOSIMETRIA a) Clodomir da Silva Farias Verifica-se da Certidão de Antecedentes Criminais (ID 147920146) que Clodomir da Silva Farias possui execução penal em andamento (5000278-68.2022.8.10.0040), decorrente do Processo n° 0001766-22.2017.8.10.0040 da 2ª Vara Criminal da Comarca de Imperatriz, pelo crime de tráfico, com trânsito em julgado em 15/09/2020, razão pela qual requer que seja reconhecida a reincidência na segunda fase de cálculo da pena. b) Robson dos Santos Sousa Verifica-se da Certidão de Antecedentes Criminais (ID 147918941) que Robson possui 04 (quatro) condenações pretéritas, conforme extrai-se da execução 00056405520118100224, razão pela qual requer que seja reconhecida a multirreincidência na segunda fase de cálculo da pena. Por se tratar de réu multirreincidente, autoriza a Jurisprudência do STJ a exasperação da pena intermediária em ½, conforme estabelecido no julgamento do HC 382395, o qual esclareceu que inexiste correlação matemática entre os índices de exasperação e a quantidade de condenações passadas em julgado, devendo o julgador fixar o índice de aumento de pena de acordo com as peculiaridades do caso. Vejamos o Trecho do voto da Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA: “Assim, ao contrário do que sustenta o recorrente, o Togado não está vinculado ao aumento de 1/6 (um sexto), 1/5 (um quinto), 1/4 (um quarto), 1/3 (um terço), 1/2 (um meio), e assim sucessivamente, conforme o número de condenações transitadas em julgado. Apesar da existência de posicionamento contrário, filio-me ao entendimento de que a dosimetria, a fim de que se garanta a individualização da reprimenda imposta ao réu, não se deve pautar em percentuais fixos e critérios meramente matemáticos, mas da análise das peculiaridades do caso concreto.” No mesmo sentido: PENAL. AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. LESÃO CORPORAL E AMEAÇA. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. DOSIMETRIA. PENA-BASE. MAJORAÇÃO ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. VETOR DAS FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME. MAIOR REPROVABILIDADE DA CONDUTA QUE EXTRAPOLA O TIPO PENAL. PRECEDENTES. SEGUNDA FASE. QUANTUM DE AUMENTO SUPERIOR A 1/6. POSSIBILIDADE. EXISTÊNCIA PRECEDENTES. DE DUAS CONDENAÇÕES. 1. Na hipótese dos autos, não se infere ilegalidade na primeira fase do processo dosimétrico, pois o decreto condenatório demonstrou que o modus operandi empregado na execução do delito revela gravidade concreta superior à ínsita ao tipo penal violado, devendo ser mantido o desvalor da vetorial das circunstâncias do crime, tal como operado pelas instâncias de origem. 2. Consoante entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça, a aplicação de fração superior à 1/6, pelo reconhecimento das agravantes e das atenuantes genéricas, exige motivação concreta e idônea. Na hipótese, a instância ordinária fez expressa menção a duas condenações anteriores, inexistindo, com isso, ilegalidade na escolha da exasperação da reprimenda, em montante superior à usual fração de 1/6, ante a multirreincidência do réu. 3. Agravo regimental improvido. (AgRg no AREsp 1885704/MS, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 19/10/2021, DJe 22/10/2021) AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. ROUBO MAJORADO. CONFISSÃO ESPONTÂNEA. RECONHECIMENTO. IMPOSSIBILIDADE. DEPOIMENTO NÃO UTILIZADO PARA CORROBORAR A CONDENAÇÃO. REINCIDÊNCIA. AUMENTO SUPERIOR A 1/6 (UM SEXTO). PROPORCIONALIDADE. DUPLA REINCIDÊNCIA DO RÉU. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. Na esteira da orientação jurisprudencial desta Corte, se a confissão espontânea não foi reconhecida pelas instâncias ordinárias, a desconstituição do que ficou estabelecido ensejaria o reexame aprofundado de todo conjunto fático-probatório produzido ao longo da marcha processual, providência incompatível com os estreitos limites do remédio constitucional, marcado pela celeridade e sumariedade na cognição. Precedentes. 2. O Código Penal não estabelece limites mínimo e máximo de aumento ou redução de pena em razão da incidência das agravantes e atenuantes genéricas. Diante disso, a doutrina e a jurisprudência pátrias anunciam que cabe ao magistrado sentenciante, nos termos do princípio do livre convencimento motivado, aplicar a fração adequada ao caso concreto, em obediência aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. 3. No caso, o Tribunal de Justiça, na segunda etapa da dosimetria, manteve a exasperação da reprimenda em 1/3 (um terço) de forma proporcional, uma vez que o aumento superior foi justificado em face da dupla reincidência do paciente, não havendo constrangimento ilegal evidente a ser reparado nesta oportunidade. 4. Agravo regimental desprovido. (AgRg no HC 629.642/PR, Rel. Ministro ANTONIO SALDANHA PALHEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 23/03/2021, DJe 30/03/2021) Portanto, o reconhecimento da multirreincidência é medida que se impõe, uma vez que, conforme exposto, a Jurisprudência do STJ autoriza a exasperação da pena intermediária em ½ quando se tratar de múltiplas condenações. c) Dorivan da Costa Souza Verifica-se da Certidão de Antecedentes Criminais (ID 147905433) que Dorivan da Costa Souza possui execução penal em andamento (5000012-47.2023.8.10.0040), decorrente do Processo n° 0003573-43.2018.8.10.0040 da 1ª Vara Criminal da Comarca de Imperatriz, pelo crime de tráfico, com trânsito em julgado em 14/11/2022, razão pela qual requer que seja reconhecida a reincidência na segunda fase de cálculo da pena. IV – DA APREENSÃO, INDISPONIBILIDADE E EXPROPRIAÇÃO DE IMÓVEL - OBJETO DA REPRESENTAÇÃO AUTOS N° 0811245-25.2025.8.10.0040 - Da Apreensão de Bens Imóveis Conforme preconizado no ordenamento jurídico brasileiro, a ação penal deve ser eficaz, assegurando que a persecução penal produza efeitos concretos, não apenas em relação às medidas penais de punibilidade, mas também no tocante aos bens jurídicos afetados. A efetividade da ação penal, portanto, requer que as medidas adotadas no curso da investigação e da instrução não se limitem ao mero formalismo, mas que tenham capacidade de interromper a continuidade das práticas criminosas e de garantir a aplicação da justiça. Em síntese, a eficácia da ação penal não se restringe à simples imposição de sanções, mas abrange a proteção dos bens jurídicos violados e a prevenção de novos delitos. A atuação do Estado, por meio do processo penal, deve ser dinâmica e voltada para resultados concretos, sendo imprescindível que as medidas cautelares, como o sequestro de bens, sejam utilizadas de forma estratégica para garantir a aplicação do direito penal de maneira efetiva, interrompendo a continuidade das práticas criminosas e promovendo a restauração da ordem jurídica. Dessa forma, a ação penal deve ser um instrumento capaz de assegurar a efetividade da justiça, não apenas como resposta à infração, mas também como mecanismo de prevenção e proteção social. Nesse sentido, a Lei nº 11.343/2006 (Lei de Drogas) estabelece, em seu artigo 60, a possibilidade de o juiz, quando provocado, decretar a apreensão e outras medidas assecuratórias de bens, direitos e valores relacionados com as infrações penais previstas na referida legislação: Art. 60. O juiz, a requerimento do Ministério Público ou do assistente de acusação, ou mediante representação da autoridade de polícia judiciária, poderá decretar, no curso do inquérito ou da ação penal, a apreensão e outras medidas assecuratórias nos casos em que haja suspeita de que os bens, direitos ou valores sejam produto do crime ou constituam proveito dos crimes previstos nesta Lei (grifo nosso). A propósito, resta claro que, na espécie, o fumus boni iuris está demonstrado, uma vez que há inexoráveis indícios da ocorrência de crimes e de seus autores. O periculum in mora, no presente caso, evidencia-se com o risco de que o bem venha a ser vendido ou ainda que siga sendo utilizado em favor da prática de mais outros delitos, o que gera a maléfica retroalimentação criminógena. Complementa-se, outrossim, que o artigo 5º, XXIII, da Constituição Federal de 1988, estabelece que a propriedade deve atender à sua função social. Esse princípio é essencial para justificar a intervenção estatal em bens privados quando estes são desviados de sua finalidade legítima e passam a ser utilizados para a prática de crimes. Ressalta-se que a função social da propriedade é um limite ao direito de propriedade, condicionando seu exercício ao atendimento de interesses coletivos. Nesse sentido, um imóvel utilizado para o tráfico de drogas, como no caso em tela, deixa de cumprir sua função social, transformando-se em um instrumento de dano à sociedade. Conforme destacado pelo ex-ministro do STF Eros Roberto Grau, a propriedade que não cumpre sua função social não merece proteção jurídica. Segue: […] a propriedade dotada de função social, que não esteja a cumpri-la, já não será mais objeto de proteção jurídica. Ou seja, já não haverá mais fundamento jurídico a atribuir direito de propriedade ao titular do bem (propriedade) que não está a cumprir sua função social. Em outros termos, já não há mais, no caso, bem que possa, juridicamente, ser objeto de direito de propriedade (GRAU, 1990, p. 316)[1]. À vista disso, o Supremo Tribunal Federal já se manifestou sobre o tema, estabelecendo “que o tráfico de drogas é reprimido pelo Estado brasileiro, por meio de modelo jurídico-político, em consonância com os diplomas internacionais firmados. Os preceitos constitucionais sobre o tráfico de drogas e o respectivo confisco de bens constituem parte dos mandados de criminalização previstos pelo poder constituinte originário a exigir uma atuação enérgica do Estado sobre o tema, sob pena de o ordenamento jurídico brasileiro incorrer em proteção deficiente dos direitos fundamentais” (RE 638.491/PR). Nesse aspecto, destaca-se, também, que a legislação brasileira segue a Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção. A Convenção foi ratificada no Brasil pelo Decreto Legislativo n° 348, de 18 de maio de 2005, e promulgada pelo Decreto Presidencial n° 5.687, de janeiro de 2006, e no seu art. 31, trata de embargo preventivo, apreensão e confisco, sendo pertinente mencionar no presente o que segue: 1 - Cada parte adotará as medidas necessárias para autorizar o confisco: a) do produto derivado de delitos estabelecidos no parágrafo 1 do Artigo 3, ou de bens cujo valor seja equivalente ao desse produto; b) de entorpecentes e de substâncias psicotrópicas, das matérias e instrumentos utilizados ou destinados à utilização, em qualquer forma, na prática dos delitos estabelecidos no parágrafo 1 do Artigo 3 (BRASIL, 1991). Diante do exposto, é incontestável que a decretação da apreensão do imóvel em questão se impõe como medida necessária para garantir a efetividade da persecução penal e coibir a continuidade da prática criminosa. A utilização do bem para fins ilícitos descaracteriza sua função social, tornando imprescindível a intervenção estatal para evitar sua alienação ou permanência em atividade criminosa. - Da Possibilidade de Expropriação Com o propósito de combater especificamente o tráfico de drogas, a legislação brasileira autorizou a expropriação de bens e valores adquiridos em decorrência do tráfico de drogas, conforme se pode ver no artigo 243, parágrafo único, da Constituição Federal: Art. 243. As propriedades rurais e urbanas de qualquer região do País onde forem localizadas culturas ilegais de plantas psicotrópicas ou a exploração de trabalho escravo na forma da lei serão expropriadas e destinadas à reforma agrária e a programas de habitação popular, sem qualquer indenização ao proprietário e sem prejuízo de outras sanções previstas em lei, observado, no que couber, o disposto no art. 5º. Parágrafo único. Todo e qualquer bem de valor econômico apreendido em decorrência do tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e da exploração de trabalho escravo será confiscado e reverterá a fundo especial com destinação específica, na forma da lei. Conforme demonstrado nos autos, o imóvel objeto do presente pedido, é fruto advindo diretamente do comércio ilícito de drogas, nesse caso, a expropriação do bem é medida que se impõe, consoante previsto no artigo 60 da Lei 11.343/06 e artigo 243, parágrafo único, da Constituição. Trata-se de medida certa, eis que comprovado que o bem decorre de tráfico ilícito. Importante mencionar que o STF fixou tese nos seguintes termos: “É possível o confisco de todo e qualquer bem de valor econômico apreendido em decorrência do tráfico de drogas, sem a necessidade de se perquirir a habitualidade, reiteração do uso do bem para tal finalidade, a sua modificação para dificultar a descoberta do local do acondicionamento da droga ou qualquer outro requisito além daqueles previstos expressamente no art. 243, parágrafo único, da Constituição Federal” (STF - RECURSO EXTRAORDINÁRIO 638.491 - RELATOR : MIN. LUIZ FUX) Ainda sobre o tema, o STF entende que o confisco no direito comparado é instituto de grande aplicabilidade nos delitos de repercussão econômica, sob o viés de que “o crime não deve compensar”, perspectiva adotada não só pelo constituinte brasileiro, mas também pela República Federativa do Brasil que internalizou diversos diplomas internacionais que visam reprimir severamente o tráfico de drogas. Nesse diapasão, ensina Rogério Sanches, em Nova Lei de Drogas comentada, página 60, que "é legitima a expropriação de bem considerado de família pertencente ao traficante, compatível com as exceções previstas no artigo 3º da Lei 8.009/90, não ferindo o princípio do direito à moradia consagrado no art. 6º da CF. Aliás, merece ser lembrado que nenhuma liberdade pública é absoluta, jamais podendo servir de manto protetor para a prática de infrações." Assim, diante da sólida previsão legal e do entendimento consolidado nos tribunais superiores, revela-se a adoção da medida de expropriação como resposta estatal necessária à gravidade da conduta. A retirada definitiva do bem de atividades pertinentes ao comércio ilícito de entorpecentes representa não apenas uma sanção proporcional, mas também uma ação concreta de desarticulação das estruturas financeiras do tráfico na região. V – DOS PEDIDOS Diante de todo o exposto, restando demonstradas a materialidade e a autoria delitivas quanto aos crimes narrados na denúncia, e não havendo causas excludentes de ilicitude ou de culpabilidade que afastem a responsabilização penal dos acusados, o MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL requer: 1. A CONDENAÇÃO dos réus DORIVAN DA COSTA SOUZA, DEUSINA LUSIA DA COSTA SOUZA, DUCILEIA DA COSTA SOUZA, LUCAS RODRIGUES SOUSA e ROBSON DOS SANTOS SOUZA nas penas previstas nos artigos 33 e 35 da Lei nº 11.343/06; 2. A decretação da apreensão do imóvel situado na Rua Santo Antônio, nº 1445, Bairro Nova Imperatriz, conhecido como “Chácara do Manelão”, conforme requerido em autos apartardos; 3. A indisponibilidade do bem, oficiando-se ao Cartório do 6º Ofício Extrajudicial de Imperatriz para averbação à margem da matrícula nº 25.702, Livro 2 – EX, fls. 116, impedindo sua livre disposição; 4. A autorização para uso do imóvel e a respectiva imissão na posse em favor da Secretaria de Segurança Pública do Estado do Maranhão, após perícia e avaliação, conforme previsto no Ofício nº 7473/2025 – DGA/PCMA, dos autos de origem; 5. Caso deferido o item anterior, a adoção de medidas para a expropriação cautelar do imóvel, com concessão de prazo razoável para a desocupação, diante do descumprimento da função social do bem; 6. Após o trânsito em julgado, a decretação da PERDA DEFINITIVA DO IMÓVEL em favor do Estado do Maranhão, com a respectiva incorporação ao patrimônio público estadual, vinculado à Secretaria de Segurança Pública ou a outro órgão público que este Juízo entender adequado. Imperatriz/MA, data da assinatura eletrônica. Ossian Bezerra Pinho Filho Promotor de Justiça titular da 2ª PJ Criminal [1] Obra: A Ordem Econômica na Constituição de 1988 (Interpretação e Crítica)
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