Processo nº 1001634-80.2024.8.11.0037
ID: 336492560
Tribunal: TJMT
Órgão: Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo
Classe: EMBARGOS DE DECLARAçãO CíVEL
Nº Processo: 1001634-80.2024.8.11.0037
Data de Disponibilização:
28/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
ALEX ROECE ONASSIS
OAB/MT XXXXXX
Desbloquear
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA GABINETE - DESA. HELENA MARIA BEZERRA RAMOS Centro Político Administrativo - Rua C, S/N - CEP 78049-926 - Cuiabá-MT - (65) 3617-3000 - E-mai…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA GABINETE - DESA. HELENA MARIA BEZERRA RAMOS Centro Político Administrativo - Rua C, S/N - CEP 78049-926 - Cuiabá-MT - (65) 3617-3000 - E-mail: gab.helenaramos@tjmt.jus.br EMBARGOS DE DECLARAÇÃO CÍVEL (1689) 1001634-80.2024.8.11.0037 EMBARGANTE: MUNICIPIO DE PRIMAVERA DO LESTE EMBARGADO: ARIOVALDO VIDAL DA SILVA DECISÃO MONOCRÁTICA Vistos etc. Trata-se de Embargos de Declaração opostos pelo MUNICÍPIO DE PRIMAVERA DO LESTE, contra decisão monocrática proferida por esta relatora (ID 294887389), que na Apelação nº 1001634-80.2024.8.11.0037, interposta por ele contra ARIOVALDO VIDAL DA SILVA, negou provimento ao apelo que visava reformar a sentença que julgou procedente os pedidos formulados na inicial, determinando a retirada de restrição RENAJUD sobre o veículo S-10 TORNADO D 4X4, Placa EGO9I87, com fundamento na boa-fé do adquirente, que teria adquirido o bem antes da constrição judicial. Em suas razões recursais, o Embargante alega que a decisão impugnada, incorreu em omissão, pois não considerou o disposto no artigo 185 do Código Tributário Nacional (CTN) nem o entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ) no REsp 1.141.990/PR, que trata da presunção de fraude à execução fiscal. O embargante argumenta que, conforme o art. 185 do CTN, a alienação de bens realizada após a inscrição do crédito tributário em dívida ativa configura presunção absoluta de fraude, independentemente da boa-fé do terceiro adquirente. Alega ainda que a omissão do acórdão ao desconsiderar esses dispositivos e a jurisprudência do STJ levou ao julgamento contrário ao entendimento consolidado, o que justifica a necessidade de correção do erro. Em seus pedidos, o Município requer que os embargos sejam acolhidos para que seja reconhecida a fraude à execução fiscal, com base na presunção do artigo 185 do CTN, e que o acórdão seja alterado em conformidade com a jurisprudência do STJ. Por fim, requer o acolhimento dos embargos de declaração com efeitos infringentes, para sanar a omissão apontada, a fim de que seja reconhecida a fraude à execução fiscal. Decorreu o prazo para apresentação das contrarrazões, conforme certidão inserida no ID 300920394 - Pág. 1. É o relatório. DECIDO. Presentes os pressupostos de admissibilidade recursal, conheço dos Embargos de Declaração. Conforme relatado alhures, os embargos de declaração opostos pelo MUNICÍPIO DE PRIMAVERA DO LESTE, visam sanar suposta omissão existente na decisão monocrática de ID 294887389, proferida por esta Relatora, que negou provimento ao apelo. Ab initio, destaco que o artigo 1.022 do Código de Processo Civil elenca expressamente as hipóteses de cabimento dos Embargos de Declaração. Confira-se: Art. 1.022. Cabem embargos de declaração contra qualquer decisão judicial para: I – Esclarecer obscuridade ou eliminar contradição; II – Suprir omissão de ponto ou questão sobre o qual devia se pronunciar o juiz de ofício ou a requerimento; III – corrigir erro material. Assim, na forma do artigo mencionado, os embargos de declaração são viáveis quando presentes as hipóteses restritas de omissão, obscuridade, contradição ou erro material na decisão. Presentes os pressupostos de admissibilidade recursal, conheço dos Embargos de Declaração. Eis o teor da decisão impugnada. Confira-se: [...] Inicialmente, registro que a apreciação do recurso de forma monocrática pelo Relator é possível sempre que houver entendimento dominante acerca do tema versado, consoante o verbete sumular nº 568 do Superior Tribunal de Justiça, prevendo que “o relator, monocraticamente e no Superior Tribunal de Justiça, poderá dar ou negar provimento ao recurso quando houver entendimento dominante acerca do tema”. Dito isso, passo ao julgamento monocrático do presente recurso. Conforme relatado, cuida-se de Apelação Cível interposta pelo Município de Primavera do Leste contra sentença que, nos Embargos de Terceiro nº 1001634-80.2024.8.11.0037, julgou procedente o pedido de ARIOVALDO VIDAL DA SILVA, determinando a retirada da restrição RENAJUD sobre o veículo S-10 TORNADO D 4X4, Placa EGO9I87, com fundamento na boa-fé do adquirente. Pois bem. Ab initio, cumpre destacar de que o Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de que “O reconhecimento da fraude à execução depende do registro da penhora do bem alienado ou da prova de má-fé do terceiro adquirente” (Súmula n. 375/STJ). E mais, nos termos da tese firmada pela Corte Especial do STJ, em sede de julgamento de recurso especial repetitivo, "inexistindo registro da penhora na matrícula do imóvel, é do credor o ônus da prova de que o terceiro adquirente tinha conhecimento de demanda capaz de levar o alienante à insolvência" (REsp 956.943/PR , Rel. p/ acórdão Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, CORTE ESPECIAL, DJe de 1º.12.2014). Além disso, deve-se ressaltar que o ordenamento jurídico prestigia a tutela da boa-fé de terceiros adquirentes, cuja presunção milita em seu favor, só podendo ser ilidida nos seguintes casos: a) quando houver o registro da penhora (ou da própria execução, como no caso do art. 828, do CPC); e b) em havendo a prova de má-fé do terceiro adquirente. Portanto, no caso em análise para o reconhecimento de fraude à execução, faz-se necessária a comprovação de que o bem alienado já havia sido penhorado, com o devido registro da constrição junto ao DETRAN ou de que houve a má-fé do adquirente do veículo. Nesse sentido, analisando as provas carreadas aos autos, o d. juízo a quo concluiu pela procedência do pedido inicial formulado pela parte embargante/apelado para desconstituir a penhora registrada. Desse modo, os documentos acostados nos autos ratificam as razões da parte embargante de que o veículo foi adquirido em período anterior à penhora realizada nos autos da execução fiscal. Conforme se vê, o documento acostado no ID 288197364 - Pág. 3, ratifica o argumento de que o veículo foi adquirido pela parte embargante em 21-10-2021 (ID 288197369 - Pág. 1), ou seja, antes da penhora realizada nos autos da ação de execução fiscal n. 100118623120198110037, concretizada em 12-01-2023 (ID 288197373 - Pág. 1). Assim, conclui-se que, no momento da sua venda, não havia qualquer restrição no respectivo registro junto ao DETRAN. O registro da penhora junto ao DETRAN é requisito para a configuração da má-fé do novo adquirente do bem penhorado, porquanto presume o conhecimento da constrição em relação a terceiros por meio da sua publicidade, conforme artigo 844, do CPC. Assim, somente com a alienação posterior ao registro da penhora é que se pode presumir a má-fé do terceiro adquirente na fraude à execução. Com efeito, não é preciso um aprofundamento na matéria para se perceber que os requisitos essenciais da autorização para transferência de veículos são a assinatura do proprietário vendedor, demonstrando que consente com o negócio e o reconhecimento da firma em cartório, com a finalidade de fixar a data da transferência e prevenção contra terceiro. Quanto à ausência de registro no DETRAN, configura-se somente como irregularidade administrativa, não viciando o negócio realizado entre as partes. Nesse sentido, eis os seguintes julgados: AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. PENHORA. VEÍCULO AUTOMOTOR. EMBARGOS DE TERCEIRO. ALIENAÇÃO. TRADIÇÃO. FRAUDE. INOCORRÊNCIA. REEXAME. SÚMULA N. 7-STJ. ACÓRDÃO RECORRIDO. CONTRADIÇÃO QUE NÃO ALTERA O JULGADO. NÃO PROVIMENTO. 1. 'O fato de não ter sido realizada a transferência de propriedade do automóvel autuado junto ao DETRAN não obsta que a prova da alienação se faça por outros meios' (REsp n. 599.620/RS, 1ª T., Min. Luiz Fux, DJ de 17.5.2004). 2. Concluído pelas instâncias ordinárias que o executado não era mais proprietário do veículo sobre o qual recaiu a penhora e que sua alienação não importou em fraude, o reexame da questão encontra o óbice de que trata o enunciado n. 7, da Súmula. 3. Agravo regimental a que se nega provimento.” (AgRg no Ag n. 658.606/MG, Relatora Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 14.8.2012, DJe 28.8.2012.) [Destaquei]. REMESSA NECESSÁRIA E APELAÇÃO – MANDADO DE SEGURANÇA - INFRAÇÃO DE TRÂNSITO - ALIENAÇÃO DE VEÍCULO – TRADIÇÃO - AUSÊNCIA DE REGISTRO DE TRANSFERÊNCIA JUNTO AO DETRAN - INFRAÇÕES COMETIDAS APÓS A VENDA DO VEÍCULO – RESPONSABILIDADE DO ADQUIRENTE – ART. 123, § 1º, DO CÓDIGO DE TRÂNSITO BRASILEIRO – EXCLUSÃO DEFINITIVA DA MULTA E DOS PONTOS ATRIBUÍDOS À IMPETRANTE – POSSIBILIDADE – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO VOLUNTÁRIO E REMESSA NECESSÁRIA CONHECIDOS E DESPROVIDOS O fato de não ter sido realizada a transferência de propriedade do automóvel autuado junto ao Detran não obsta que a prova da alienação se faça por outros meios. Em sendo incontroverso que as infrações foram cometidas em data posterior à alienação do veículo, revela-se evidente que, a tradição do veículo ao adquirente é suficiente para eximir o alienante de quaisquer responsabilidades advindas da ulterior utilização do bem pelo novo proprietário. O Superior Tribunal de Justiça vem mitigando a interpretação do art . 134 do Código de Trânsito Brasileiro, no sentido de afastar a responsabilidade do antigo proprietário pelas infrações e débitos verificados após a alienação, independentemente da ausência de comunicação da transferência ao órgão de trânsito. Na espécie, ainda que a alienante do veículo não tenha realizado a comunicação de venda do automóvel junto ao DETRAN-MS, não pode ser responsabilizada pelas infrações cometidas após a data da sua tradição. (TJ-MS - APL: 08037993920228120001 Campo Grande, Relator.: Des. Marcos José de Brito Rodrigues, Data de Julgamento: 30/03/2023, 1ª Câmara Cível, Data de Publicação: 03/04/2023). [Destaquei] E M E N T A RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – EMBARGOS À EXECUÇÃO – RENAJUD – RESTRIÇÃO JUDICIAL SOBRE VEÍCULO – ALIENAÇÃO À TERCEIRO – AQUISIÇÃO ANTERIOR À INCLUSÃO DA PENHORA DO BEM MÓVEL – AUSÊNCIA DE REGISTRO NO DETRAN – MERA FORMALIDADE ADMINISTRATIVA – TRANSFERÊNCIA DA PROPRIEDADE PELA TRADIÇÃO ANTES DA MEDIDA CONSTRITIVA – COMPROVAÇÃO – PENHORA AFASTADA – RECURSO NÃO PROVIDO. 1. Há de ser afastada a restrição via RENAJUD de veículo quando comprovado que a alienação do bem se deu antes da inclusão do gravame, sendo irrelevante a ausência de registro da transferência no DETRAN, na medida em que a aquisição da propriedade de bens móveis se opera, efetivamente, mediante a sua tradição. 2 . Recurso não provido. (TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 10361733120228110041, Relator.: RODRIGO ROBERTO CURVO, Data de Julgamento: 17/06/2024, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, Data de Publicação: 25/06/2024). [Destaquei] Assim, restou demonstrado nos autos que quando o veículo foi vendido ao embargante não havia qualquer ônus sobre ele, já que a penhora se concretizou apenas em momento posterior. Por outro lado, o Município de Primavera do Leste também não logrou êxito em demonstrar a má-fé do adquirente do veículo, não restando presentes as hipóteses de configuração da fraude à execução. Diante disso, em razão da ausência de prova de má-fé na transação feita entre o embargante e o executado, tendo em vista que não tinha conhecimento da demanda ou de nenhum vício, bem como que o auto de penhora, ou seja, sua oficialização, só aconteceu depois de anotada a venda, não há que se falar na hipótese de fraude à execução. Assim, consoante a Súmula n. 375 do STJ, o reconhecimento de fraude à execução depende do registro da penhora do bem alienado ou da prova de má-fé do terceiro adquirente. Como neste caso nenhuma dessas situações existiu, não há falar em fraude à execução e, portanto, o não provimento do apelo se impõe. Neste sentido é entendimento do c. Superior Tribunal de Justiça. Vejamos: PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE TERCEIRO. BLOQUEIO DE VEÍCULO. ALIENAÇÃO EM DATA ANTERIOR À RESTRIÇÃO. 1. Os presentes Embargos de Terceiro foram opostos por Helder Ferreira Pedro em relação à Execução Fiscal 2003.61.09.004461-9, ajuizada pela União Federal em face de Sônia Maria Pereira de Carvalho e em cujo feito foi determinada, em 28.09.2009, restrição do veículo Fiat Tempra IE, ano 1996, placas CHZ 4399, medida efetivada em 02.10.2009, conforme consignado em sentença. 2. Ainda que não tenha sido efetivada a transferência do veículo, restou devidamente comprovada a alienação do bem - diga-se de passagem, quase três anos antes da existência de restrição junto ao órgão competente por meio do RENAJUD. 3. A falta de registro da transferência junto ao DETRAN, por si só, não justifica a manutenção da penhora, tendo em vista que a alienação pode ser provada por outros meios. Precedentes. 4. Apelo improvido”. (APELAÇÃO CÍVEL - 1788483 / SP 0007311-14.2009.4.03.6109 Relator(a) DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO SARAIVA Órgão Julgador QUARTA TURMA e-DJF3:17/.4.2018) [sem destaque no original] No mesmo sentido é o entendimento desta Corte. Confira-se: RECURSO DE APELAÇÃO – TRIBUTÁRIO- EMBARGOS DE TERCEIRO – ALIENAÇÃO DE VEÍCULO – PENHORA – REGISTRO DA CONSTRIÇÃO NO SISTEMA RENAJUD APÓS A TRANSFERÊNCIA DO DOMÍNIO – AQUISIÇÃO DA PROPRIEDADE PELA SIMPLES TRADIÇÃO – BOA-FÉ DO ADQUIRENTE – AUSÊNCIA DE TRANSFERÊNCIA NO DETRAN IRRELEVANCIA- SÚMULA 375 DO STJ – NÃO COMPROVAÇÃO DA MÁ-FÉ DO TERCEIRO ADQUIRENTE – RECURSO DESPROVIDO. 1. Nos termos do artigo 674 do CC, os embargos de terceiros cabem a quem, não sendo parte do processo, sofrer constrição ou ameaça de constrição sobre bens que possua ou sobre os quais tenha direito incompatível com o ato constritivo. 2. O Superior Tribunal de Justiça possui entendimento de que não há fraude a execução pelo simples fato da existência de ação judicial em curso, se no momento da alienação do bem não havia penhora ou registro de constrição. (Súmula 375)”. (N.U 1010387-27.2021.8.11.0006, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, Rel. DESA. MARIA APARECIDA FERREIRA FAGO, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 19.3.2024, publicado no DJE 27.3.2024). [Destaquei]. DIREITO TRIBUTÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. EXECUÇÃO FISCAL. EMBARGOS DE TERCEIRO . FRAUDE À EXECUÇÃO. ALIENAÇÃO DE VEÍCULO. BOA-FÉ DO ADQUIRENTE. RECURSO NÃO PROVIDO . I. Caso em exame 1. Apelação cível interposta contra sentença que julgou procedentes os Embargos de Terceiro, afastando a constrição judicial sobre o veículo, determinando seu desbloqueio no sistema RENAJUD. II . Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em saber se: (i) a alienação do bem posterior à inscrição em dívida ativa configura fraude à execução; e (ii) se é necessária a comprovação de má-fé do adquirente para tal reconhecimento. III. Razões de decidir 3 . O reconhecimento de fraude à execução depende do registro da penhora ou da prova de má-fé do adquirente. 4. Inexistindo registro da penhora na alienação do bem, a presunção de boa-fé milita em favor do adquirente, conforme a Súmula n. 375 do STJ . 5. No caso concreto, a alienação do veículo ocorreu antes do bloqueio judicial, e não há evidência de má-fé do adquirente. IV. Dispositivo e tese 6 . Recurso não provido. Tese de julgamento: "A configuração de fraude à execução exige o registro da penhora ou a comprovação de má-fé do adquirente, não presentes no caso em análise." Dispositivos relevantes citados: Código Tributário Nacional, art. 185; CPC, art . 844. Jurisprudência relevante citada: STJ, Súmula n. 375; REsp 1.141 .990/PR, Rel. Min. João Otávio de Noronha. (TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 10092443620238110037, Relator.: RODRIGO ROBERTO CURVO, Data de Julgamento: 23/10/2024, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, Data de Publicação: 28/10/2024). [Destaquei] Desse modo, impõe-se o não provimento da presente apelação. Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao Recurso de Apelação Cível interposto pelo Município de Primavera do Leste, mantendo inalterada a decisão impugnada. [destaquei] Em suas razões recursais, o Embargante alega que há omissão na decisão impugnada ao não considerar o artigo 185 do CTN e o entendimento do STJ no REsp 1.141.990/PR, que trata da presunção de fraude à execução fiscal. Argumenta que, conforme o referido artigo, a alienação de bens após a inscrição do crédito tributário em dívida ativa configura presunção absoluta de fraude, independentemente da boa-fé do terceiro. Requer o acolhimento dos embargos para que a fraude à execução fiscal seja reconhecida, alterando o acórdão em conformidade com a jurisprudência do STJ. Solicita ainda o acolhimento dos embargos com efeitos infringentes para sanar a omissão. A irresignação merece prosperar, conforme será demonstrado. Isso porque, revendo os autos, observa-se que a inscrição em dívida ativa ocorreu em 03-01-2019; 03-01-2019; 05-01-2015 (ID 19160395 – autos originários); conforme CDA nºs: 115/2019; 129/2019; 20976/2018, por outro lado, o automóvel foi adquirido em 21-10-2021 (ID 288197369 - Pág. 1), conforme documentos anexos a exordial do Embargos de Terceiro. Logo, verifica-se que a parte apelada, ora embargada, adquiriu o automóvel depois da Certidão de Dívida Ativa, razão pela qual, revogo a decisão proferida no ID 294887389), e faço a reanálise da apelação. Impende destacar que o Superior Tribunal de Justiça no julgamento do REsp 1.141.990/PR, sob a sistemática de recursos repetitivos (Tema n. 290), há muito consolidou o entendimento de que “se o ato translativo foi praticado a partir de 09.06.2005, data de início da vigência da Lei Complementar n.º 118/2005, basta a efetivação da inscrição em dívida ativa para a configuração da figura da fraude”. Segundo as anotações do Núcleo de Gerenciamento de Precedentes e de Ações Coletivas – NUGEPNAC lançadas no respectivo julgado, “a simples alienação ou oneração de bens ou rendas, ou seu começo por quantia inscrita em dívida ativa pelo sujeito passivo, sem reserva de meios para quitação do débito, gera presunção absoluta de fraude à execução, mesmo diante da boa-fé do terceiro adquirente e ainda que não haja registro de penhora do bem alienado”. Ainda, no Recurso Especial, restou expressamente consignado que, em se tratando de execução fiscal, não é aplicável a Súmula 375 do STJ, a qual dispõe, in verbis, que “O reconhecimento da fraude à execução depende do registro da penhora do bem alienado ou da prova de má-fé do terceiro adquirente”. Por oportuno, reproduz-se a ementa do precedente mencionado: PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C, DO CPC. DIREITO TRIBUTÁRIO. EMBARGOS DE TERCEIRO. FRAUDE À EXECUÇÃO FISCAL. ALIENAÇÃO DE BEM POSTERIOR À CITAÇÃO DO DEVEDOR. INEXISTÊNCIA DE REGISTRO NO DEPARTAMENTO DE TRÂNSITO - DETRAN. INEFICÁCIA DO NEGÓCIO JURÍDICO. INSCRIÇÃO EM DÍVIDA ATIVA. ARTIGO 185 DO CTN, COM A REDAÇÃO DADA PELA LC N.º 118/2005. SÚMULA 375/STJ. INAPLICABILIDADE. 1. A lei especial prevalece sobre a lei geral (lex specialis derrogat lex generalis), por isso que a Súmula n.º 375 do Egrégio STJ não se aplica às execuções fiscais. (...) 3. A Lei Complementar n.º 118, de 9 de fevereiro de 2005, alterou o artigo 185, do CTN, que passou a ostentar o seguinte teor: "Art. 185. Presume-se fraudulenta a alienação ou oneração de bens ou rendas, ou seu começo, por sujeito passivo em débito para com a Fazenda Pública, por crédito tributário regularmente inscrito como dívida ativa. Parágrafo único. O disposto neste artigo não se aplica na hipótese de terem sido reservados, pelo devedor, bens ou rendas suficientes ao total pagamento da dívida inscrita." 4. Consectariamente, a alienação efetivada antes da entrada em vigor da LC n.º 118/2005 (09.06.2005) presumia-se em fraude à execução se o negócio jurídico sucedesse a citação válida do devedor; posteriormente à 09.06.2005, consideram-se fraudulentas as alienações efetuadas pelo devedor fiscal após a inscrição do crédito tributário na dívida ativa. 5. A diferença de tratamento entre a fraude civil e a fraude fiscal justifica-se pelo fato de que, na primeira hipótese, afronta-se interesse privado, ao passo que, na segunda, interesse público, porquanto o recolhimento dos tributos serve à satisfação das necessidades coletivas. 6. É que, consoante a doutrina do tema, a fraude de execução, diversamente da fraude contra credores, opera-se in re ipsa, vale dizer, tem caráter absoluto, objetivo, dispensando o concilium fraudis. (FUX, Luiz. O novo processo de execução: o cumprimento da sentença e a execução extrajudicial. 1. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008, p. 95-96 / DINAMARCO, Cândido Rangel. Execução civil. 7. ed. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 278-282 / MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 22. ed. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 210-211 / AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 472-473 / BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário Brasileiro. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1996, p. 604). (...) 8. A inaplicação do art. 185 do CTN implica violação da Cláusula de Reserva de Plenário e enseja reclamação por infringência da Súmula Vinculante n.º 10, verbis: "Viola a cláusula de reserva de plenário (cf, artigo 97) a decisão de órgão fracionário de tribunal que, embora não declare expressamente a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do poder público, afasta sua incidência, no todo ou em parte." 9. Conclusivamente: (a) a natureza jurídica tributária do crédito conduz a que a simples alienação ou oneração de bens ou rendas, ou seu começo, pelo sujeito passivo por quantia inscrita em dívida ativa, sem a reserva de meios para quitação do débito, gera presunção absoluta (jure et de jure) de fraude à execução (lei especial que se sobrepõe ao regime do direito processual civil); (b) a alienação engendrada até 08.06.2005 exige que tenha havido prévia citação no processo judicial para caracterizar a fraude de execução; se o ato translativo foi praticado a partir de 09.06.2005, data de início da vigência da Lei Complementar n.º 118/2005, basta a efetivação da inscrição em dívida ativa para a configuração da figura da fraude; (c) a fraude de execução prevista no artigo 185 do CTN encerra presunção jure et de jure, conquanto componente do elenco das "garantias do crédito tributário"; (d) a inaplicação do artigo 185 do CTN, dispositivo que não condiciona a ocorrência de fraude a qualquer registro público, importa violação da Cláusula Reserva de Plenário e afronta à Súmula Vinculante n.º 10, do STF. 10. In casu, o negócio jurídico em tela aperfeiçoou-se em 27.10.2005, data posterior à entrada em vigor da LC 118/2005, sendo certo que a inscrição em dívida ativa deu-se anteriormente à revenda do veículo ao recorrido, porquanto, consoante dessume-se dos autos, a citação foi efetuada em data anterior à alienação, restando inequívoca a prova dos autos quanto à ocorrência de fraude à execução fiscal. 11. Recurso especial conhecido e provido. Acórdão submetido ao regime do artigo 543-C do CPC e da Resolução STJ n.º 08/2008. (REsp 1141990/PR, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 10/11/2010, DJe 19/11/2010) (Destaquei). Ademais, o Superior Tribunal de Justiça tem reafirmado de maneira contundente a mesma compreensão acerca da matéria, no sentido de que a presunção de fraude é absoluta nas hipóteses de alienação de bem em momento posterior à inscrição da dívida ativa. Vejamos: PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. EMBARGOS DE TERCEIRO. PENHORA DE VEÍCULO. FRAUDE. CONFIGURAÇÃO. MATÉRIA DE DIREITO. NÃO INCIDÊNCIA DO ENUNCIADO N. 7 DA SÚMULA DO STJ. I - Na origem, trata-se de embargos de terceiro objetivando livrar da penhora o veículo objeto de restrição à transferência determinada nos autos de Execução Fiscal movida pela Fazenda Nacional contra a Shanghai Veículos Ltda. e outro. Na sentença, julgou-se procedente o pedido para cancelar o impedimento judicial (restrição à transferência) que recai sobre o veículo. No Tribunal a quo, a sentença foi mantida. Nesta Corte, deu-se provimento ao recurso especial para reconhecer a ocorrência de fraude à execução fiscal e, como consequência, julgar improcedente o pedido formulado nos embargos de terceiros. II - A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firme no sentido de que a matéria encimada à apreciação desta Corte Superior é eminentemente jurídica, qual seja, definir se a alienação de bem inscrito em dívida ativa caracteriza, de forma inequívoca, fraude à execução fiscal. Assim, fica evidente a inaplicabilidade da Súmula n. 7 do Superior Tribunal de Justiça ao caso concreto. III - O Superior Tribunal de Justiça, após julgamento do Recurso Especial Repetitivo n. 1.141.990/PR (Tema n. 290/STJ), firmou entendimento de que a alienação de bem em momento posterior à inscrição do débito em dívida ativa, na vigência da Lei Complementar n. 118/2005, caracteriza presunção absoluta de fraude (iure et de iure), sendo irrelevante a apuração da boa-fé do terceiro adquirente. Nesse sentido: (AgInt nos EDcl no REsp n. 1.696.705/PR, relatora Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, julgado em 4/2/2020, DJe 11/2/2020 e EDcl no AgRg no AREsp n. 639.842/SC, relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, julgado em 19/5/2020, DJe 25/5/2020). IV - Agravo interno improvido. (AgInt no REsp 1882240/PR, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA, julgado em 08/02/2021, DJe 12/02/2021). (Destaquei) PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS DE TERCEIRO. BEM IMÓVEL. PENHORA EM EXECUÇÃO FISCAL. ALIENAÇÃO POSTERIOR À CITAÇÃO DA DEVEDORA. FRAUDE À EXECUÇÃO. PRESUNÇÃO ABSOLUTA. BOA-FÉ. IRRELEVÂNCIA. MATÉRIA PACÍFICA. 1. Conforme tese definida pela Primeira Seção no julgamento do REsp 1.141.990/PR, repetitivo, a simples alienação ou oneração de bens ou rendas, ou seu começo, pelo sujeito passivo por quantia inscrita em dívida ativa, sem a reserva de meios para quitação do débito, gera presunção absoluta de fraude à execução. 2. No caso dos autos, o recurso do Estado do Paraná foi provido para julgar improcedente os embargos de terceiros, tendo em vista situação caracterizadora de fraude à execução e porque é irrelevante eventual boa-fé da parte compradora do bem imóvel. 3. Agravo interno não provido. (AgInt no REsp 1895302/PR, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 10/05/2021, DJe 13/05/2021). (Destaquei) Igualmente, tal entendimento vem sendo observado nesta Egrégia Câmara, conforme pode ser observado nos seguintes julgados: TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL – EMBARGOS DE TERCEIRO – FRAUDE À EXECUÇÃO FISCAL – ALIENAÇÃO ANTERIOR À ALTERAÇÃO DO ART. 185 DO CTN REALIZADA PELA LC 118/2005 – VÍCIO CONFIGURADO – PRESUNÇÃO ABSOLUTA DE NULIDADE – NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO APENAS DA CITAÇÃO VÁLIDA DO DEVEDOR – TESE FIRMADA NO TEMA 290 DO STJ – AVERBAÇÃO DA PENHORA EM DATA ULTERIOR À COMPRA DO BEM IMÓVEL – IRRELEVÂNCIA – INAPLICABILIDADE DA SÚMULA 375 DO STJ – INVERSÃO DO ÔNUS DE SUCUMBÊNCIA – HONORÁRIOS MAJORADOS – SENTENÇA REFORMADA – RECURSO PROVIDO. No julgamento do REsp 1.141.990/PR, submetido ao rito dos recursos repetitivos (art. 543-C do CPC/1973), o STJ além de declarar a inaplicabilidade da Súmula 375, firmou entendimento de que: “b) a alienação engendrada até 08.06.2005 exige que tenha havido prévia citação no processo judicial para caracterizar a fraude de execução; se o ato translativo foi praticado a partir de 09.06.2005, data de início da vigência da Lei Complementar n.º 118/2005, basta a efetivação da inscrição em dívida ativa para a configuração da figura da fraude"; (REsp Nº 1876311/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, DECISÃO MONOCRÁTICA – DJe de 31/08/2020). Segundo o Tema nº 290, há presunção absoluta de fraude à execução quando a alienação de bens é efetivada após a devida citação do devedor - art. 185 do CTN (redação anterior a 2005), sendo desnecessária, portanto, a discussão acerca da boa-fé ou não do adquirente. Assim, não se aplica ao caso o enunciado da Súmula nº 375 do STJ. Da mesma forma, em respeito ao princípio da especialidade, não há como aproveitar o disposto no art. 792, II, do CPC. Como a alienação do bem imóvel se deu quase 02 (dois) anos após a citação válida do devedor, é de se reconhecer a fraude à execução em detrimento da Fazenda Pública Estadual. Sentença Reformada. Recurso Provido. (ApCiv 0005660-15.2016.8.11.0007, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Relator Dr. Marcio Aparecido Guedes, Julgado em 15.10.2020). (Destaquei) APELAÇÃO — EMBARGOS DE TERCEIRO — ALIENAÇÃO DE VEÍCULO AUTOMOTOR PENHORADO NOS AUTOS DA EXECUÇÃO FISCAL — BOA-FÉ DO ADQUIRENTE — IRRELEVÂNCIA — ATO TRANSLATIVO DO AUTOMÓVEL QUE SUCEDE À INSCRIÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO EM DÍVIDA ATIVA — FRAUDE À EXECUÇÃO PRESUMIDA — ARTIGO 185 DO CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL — OBSERVÂNCIA. Presume-se a fraude à execução fiscal quando o ato translativo do veículo automotor alienado sucede a inscrição do crédito tributário, nos termos do artigo 185 do Código Tributário Nacional. Recurso não provido. (ApCiv 0003685-93.2018.8.11.0004, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Relator Des. Luiz Carlos da Costa, Julgado em 22.06.2021) (Destaquei). Desse modo, considerando que, no caso dos autos, a venda do veículo ocorreu anos após a inscrição do débito em dívida ativa, ou seja, 03-01-2019; 03-01-2019; 05-01-2015 (ID 19160395 – autos originários); é aplicável o entendimento firmado, uma vez que a alienação do veículo ocorreu no ano de 2021. Logo, resta caracterizada a presunção absoluta de fraude à execução, nos termos do art. 185 do CTN, sendo irrelevante o fato de que o lançamento da restrição sobre o veículo somente tenha se aperfeiçoado após a alienação pelo executado. Assim, conclui-se que a boa-fé do terceiro, ora apelante, revela-se irrelevante em razão da tese firmada no Tema 290 do STJ, a preconizar a inaplicabilidade da Súmula 375 do STJ às execuções fiscais, a presunção absoluta de fraude à execução na hipótese e a aplicação do art. 185 do CTN em detrimento de outros dispositivos legais em razão do princípio da especialidade, de sorte que se impõe a reforma da sentença ora combatida. Ante o exposto, ACOLHO os embargos de declaração opostos pelo Embargante, com efeitos infringentes, e revogo a decisão proferida no ID 294887389, por conseguinte, DOU PROVIMENTO ao apelo interposto pelo Município de Primavera do Leste, para julgar improcedente os pedidos formulados na inicial dos autos dos Embargos de Terceiro n. 1001634-80.2024.8.11.0037. Decorrido o prazo recursal, certifique-se o trânsito em julgado, procedendo-se às baixas e ao arquivamento. Intimem-se. Cumpra-se. Cuiabá-MT, data da assinatura eletrônica. Desa. Helena Maria Bezerra Ramos Relatora
Conteúdo completo bloqueado
Desbloquear