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Processo nº 1002866-10.2025.8.11.0000

ID: 301222087

Tribunal: TJMT Órgão: Segunda Câmara Criminal Classe: AGRAVO DE EXECUçãO PENAL Nº Processo: 1002866-10.2025.8.11.0000

Data de Disponibilização: 17/06/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

JESEMIEL HIDALGO DA SILVA

Acórdão

Advogados:

GABRIELE BARROSO RAZERA

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1002866-10.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE EXECUÇÃO PENAL (413) Assunto: [Pena Privativa de Liberdade] Relator: Des(a). J… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1002866-10.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE EXECUÇÃO PENAL (413) Assunto: [Pena Privativa de Liberdade] Relator: Des(a). JORGE LUIZ TADEU RODRIGUES Turma Julgadora: [DES(A). JORGE LUIZ TADEU RODRIGUES, DES(A). JUVENAL PEREIRA DA SILVA, DES(A). RUI RAMOS RIBEIRO] Parte(s): [MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (AGRAVANTE), JESEMIEL HIDALGO DA SILVA - CPF: 094.795.564-05 (AGRAVADO), GABRIELE BARROSO RAZERA - CPF: 036.118.821-86 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). Não encontrado, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. EXECUÇÃO PENAL. REGIME SEMIABERTO. MONITORAÇÃO ELETRÔNICA. FIXAÇÃO DE PRAZO DE 01 ANO. COMPATIBILIDADE COM LAPSO NECESSÁRIO À PROGRESSÃO. APLICAÇÃO DA LEI ANTERIOR AO PACOTE ANTICRIME. CONDICIONAMENTO DA RETIRADA À AVALIAÇÃO JUDICIAL. DECISÃO MANTIDA. AGRAVO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME Agravo em execução penal interposto pelo Ministério Público contra decisão do Juízo da Vara Única da Comarca de Lucas do Rio Verde/MT que concedeu o regime semiaberto ao apenado com imposição de monitoramento eletrônico por 01 (um) ano, condicionando a retirada do equipamento à prévia solicitação do reeducando e à análise judicial. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO A questão em discussão consiste em definir se é válida a imposição do monitoramento eletrônico pelo prazo de 01 (um) ano, no âmbito do regime semiaberto, quando esse período corresponde ao lapso necessário para a progressão de regime, com previsão de reavaliação judicial para eventual retirada do dispositivo. III. RAZÕES DE DECIDIR A imposição do monitoramento eletrônico como condição ao cumprimento do regime semiaberto é medida legítima e prevista em norma administrativa (art. 1.701 da CNGC/MT), sendo compatível com a finalidade fiscalizatória da execução penal. O prazo de 01 (um) ano estabelecido para o uso da tornozeleira eletrônica coincide com o lapso temporal necessário à progressão de regime do apenado, conforme fração de 1/6 aplicável à época dos fatos (anterior à Lei n. 13.964/2019), inexistindo ilegalidade. A decisão recorrida não revoga automaticamente a medida ao final do prazo, mas condiciona sua retirada à provocação da defesa e à análise judicial, o que garante o controle da execução penal e afasta qualquer ofensa ao princípio da legalidade. A ausência de falta grave é requisito para manutenção no regime, não sendo, por si só, causa para suspensão imediata da monitoração eletrônica, cabendo ao juízo da execução a avaliação concreta da conveniência e da necessidade da medida. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso desprovido. Tese de julgamento: É válida a fixação de monitoramento eletrônico por prazo correspondente ao lapso necessário à progressão de regime, desde que eventual retirada da medida esteja condicionada à solicitação do apenado e à reavaliação judicial. A decisão que impõe a monitoração eletrônica por 01 (um) ano no regime semiaberto, sem previsão de retirada automática, não viola os princípios da legalidade, da individualização da pena ou da execução penal progressiva. O controle da execução penal demanda avaliação periódica pelo juízo competente, sendo legítimo submeter a retirada da tornozeleira à análise posterior quanto ao preenchimento dos requisitos objetivos e subjetivos de progressão de regime de pena. Dispositivos relevantes citados: LEP, art. 112; Lei n. 13.964/2019; CNGC/MT, art. 1.701. RELATÓRIO EXMO. SR. DES. JORGE LUIZ TADEU RODRIGUES (RELATOR) Egrégia Câmara: Cuida-se de recurso de Agravo em Execução Penal, interposto por Ministério Público, em face da decisão proferida pelo Juízo da 1ª Vara da Comarca de Lucas do Rio Verde/MT, nos autos da execução penal epigrafada, que deferiu o regime semiaberto com uso de monitoramento eletrônico pelo prazo e 01 (um) ano. Em suas razões recursais, o Parquet pleiteia a reforma da decisão para que o monitoramento eletrônico seja estabelecido como condição integral a ser cumprida pelo agravado durante todo o período em que estiver submetido ao regime semiaberto, e não apenas pelo prazo de 01 (um) ano. Em contrarrazões, a Defesa do agravado requereu o desprovimento do recurso, a fim de que seja mantida a decisão objurgada. Ao exercer o juízo de retratação, o magistrado singular suspendeu a análise da decisum objurgado. A Procuradoria-Geral de Justiça opinou pelo desprovimento do recurso. É o relatório. VOTO Exsurge das anotações constantes no Sistema Eletrônico de Execução Unificado – SEEU, que o agravado JESEMIEL HIDALGO DA SILVA ostenta uma única guia de execução penal, cuja pena total é de 06 (seis) anos de reclusão, pela prática do delito de roubo, reprimenda esta que é cumprida em regime semiaberto. Em 18 de setembro de 2024, o Juízo da 2ª Vara Regional de Execução Penal de Recife/PE autorizou a transferência do local de execução da pena para a Comarca de Lucas do Rio Verde/MT. No dia 7 de outubro de 2024, o juízo a quo admoestou o agravado, impondo-lhe as condições do regime semiaberto, sendo uma delas o uso de monitoração eletrônica pelo prazo de 01 (um) ano, com fundamento nos seguintes elementos: “(...) 8. Monitoramento eletrônico por meio de tornozeleira eletrônica, com perímetro definido na Comarca de Lucas do Rio Verde/MT e respeitando as normas acerca da sua utilização, constantes no artigo 1.701 da CNGC/MT: I - receber visitas do servidor responsável pela monitoração eletrônica, responder aos seus contatos e cumprir suas orientações; II - abster-se de remover, de violar, de modificar, de danificar de qualquer forma, o dispositivo de monitoração eletrônica ou de permitir que outrem o faça; III - informar, de imediato, as falhas no equipamento ao órgão ou entidade responsável pela monitoração eletrônica. Deverá o(a) recuperando (a) agendar na unidade prisional local o(a) instalação/atualização do equipamento no prazo de 05 (cinco) dias, juntando comprovante da instalação/atualização nos autos. Comunique-se o diretor da unidade prisional local, o qual deverá informar este Juízo acerca da instalação da tornozeleira eletrônica no prazo assinalado. Passado 01 (um) ano de monitoramento eletrônico sem falta grave, deverá o(a) recuperando(a) solicitar em juízo a retirada do monitoramento eletrônico. (...) (sic) (id. 266411299 - pág. 93/35)” Irresignado, o Ministério Público interpôs o presente recurso, sustentando que não é pertinente nem adequada a fixação de prazo determinado para o uso da monitoração eletrônica. Defende que a medida deve permanecer vigente enquanto não for alcançado o requisito objetivo necessário à progressão de regime ou ao livramento condicional, não competindo ao juízo estabelecer prazo inferior. Argumenta, ainda, que a simples ausência de falta grave não constitui fundamento para flexibilizar as condições do regime semiaberto, representando, na verdade, um pressuposto para a permanência do apenado nesse regime, sendo o monitoramento eletrônico indispensável para a fiscalização do cumprimento das condições impostas. Diante de tal exposição fáctica, passo à análise do mérito do presente agravo. Verifica-se, ainda, que o apenado foi condenado por fato ocorrido em 19/07/2013, com sentença proferida em 11/03/2019 e trânsito em julgado em 12/06/2023. Assim, nos termos da legislação vigente à época do fato, e por se tratar de réu primário, aplica-se a regra da fração de 1/6 (um sexto) da pena para a progressão de regime, prevista antes das alterações introduzidas pela Lei n. 13.964/2019 (Pacote Anticrime). Nesse contexto, conforme demonstrado nos autos e consignado no parecer da Procuradoria-Geral de Justiça, o lapso temporal necessário ao cumprimento da fração de 1/6 da pena, requisito objetivo para progressão ao regime aberto é de 01 (um) ano, exatamente o mesmo prazo estipulado pelo Juízo da execução para o uso da tornozeleira eletrônica. Importante destacar que a decisão agravada não determinou a retirada automática do dispositivo eletrônico ao final do prazo, mas que, ao completar o referido período, o agravado deveria solicitar ao juízo a retirada, ficando está sujeita à avaliação judicial dos requisitos subjetivo e objetivo para a progressão de regime. Assim, não se constata ofensa ao princípio da legalidade nem ilegalidade na fixação do uso da monitoração eletrônica por período correspondente ao tempo necessário à obtenção da progressão de regime, sobretudo, quando a manutenção da medida está subordinada à reavaliação judicial. Contudo, ressalta-se que o juízo da execução penal não pode, de antemão, fixar um prazo exato para a retirada da monitoração eletrônica sem condicioná-lo à devida reavaliação do caso concreto ao final do período estipulado, sendo imprescindível que a manutenção ou a revogação da medida seja analisada judicialmente, conforme a situação processual e comportamental do apenado. Diante disso, considerando que a decisão recorrida está alinhada com o tempo necessário para a progressão de regime, e que eventual retirada da monitoração está condicionada à provocação e nova apreciação judicial, não se vislumbra ilegalidade a ser sanada nesta instância. Diante do que foi exposto, em consonância com parecer da Procuradoria-Geral de Justiça, NEGO PROVIMENTO ao presente agravo de execução interposto pelo MINISTÉRIO PÚBLICO, mantendo intacta a decisão recorrida. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 10/06/2025

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Processo nº 0000972-06.2014.8.11.0031

ID: 304861436

Tribunal: TJMT Órgão: Quarta Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 0000972-06.2014.8.11.0031

Data de Disponibilização: 23/06/2025

Polo Ativo:

BANCO BMG SA

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

RENATO CHAGAS CORREA DA SILVA

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LEONARDO FIALHO PINTO

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 0000972-06.2014.8.11.0031 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Contratos Bancários] Relator: Des(a). SERLY MARC… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 0000972-06.2014.8.11.0031 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Contratos Bancários] Relator: Des(a). SERLY MARCONDES ALVES Turma Julgadora: [DES(A). SERLY MARCONDES ALVES, DES(A). ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA, DES(A). RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO] Parte(s): [BANCO BMG SA - CNPJ: 61.186.680/0001-74 (APELANTE), MARCELO TOSTES DE CASTRO MAIA - CPF: 911.766.386-53 (ADVOGADO), FLAVIA ALMEIDA MOURA DI LATELLA - CPF: 068.847.366-07 (ADVOGADO), MARCOS ADRIANO BOCALAN - CPF: 615.324.361-49 (ADVOGADO), RENATO CHAGAS CORREA DA SILVA - CPF: 444.850.181-72 (ADVOGADO), JUSCELINO DA SILVA QUINTEIRO - CPF: 277.420.831-91 (APELADO), SANDRO LEITE DOS SANTOS - CPF: 593.865.501-30 (ADVOGADO), MIL CRED - CNPJ: 03.088.358/0001-06 (TERCEIRO INTERESSADO), LEONARDO FIALHO PINTO - CPF: 059.220.376-09 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). Não encontrado, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: PARCIALMENTE PROVIDO, UNANIME E M E N T A DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO NÃO CONTRATADO. DESCONTO INDEVIDO EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. DEVOLUÇÃO SIMPLES DOS VALORES DESCONTADOS. DANO MORAL CONFIGURADO. “QUANTUM” ADEQUADO. MULTA COMINATÓRIA MANTIDA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I. CASO EM EXAME Recurso de apelação cível interposto contra sentença da Vara Única de Nortelândia/MT, que julgou procedentes os pedidos formulados na ação declaratória de anulação de ato ilícito c/c indenização por danos morais e materiais e obrigação de fazer. O juízo de origem determinou: (i) devolução em dobro dos valores descontados indevidamente dos proventos do autor, deduzido o que já foi restituído; (ii) pagamento de R$ 5.000,00 a título de indenização por danos morais; (iii) concessão de tutela de urgência para suspensão imediata dos descontos, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00, limitada a R$ 10.000,00. O banco apelante sustenta a validade da contratação, a inexistência de ilicitude e pede, subsidiariamente, a redução da indenização e da multa. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Há três questões em discussão: (i) definir se houve contratação válida do empréstimo consignado objeto da demanda; (ii) estabelecer se é devida a indenização por danos morais decorrente do desconto indevido em benefício previdenciário; (iii) determinar a forma correta de repetição do indébito e a adequação da multa cominatória fixada. III. RAZÕES DE DECIDIR A ausência de assinatura e a precariedade dos documentos apresentados pelo banco apelante impedem o reconhecimento da regularidade da contratação, sendo insuficiente a prova documental juntada. A inversão do ônus da prova, com base no art. 6º, VIII, do CDC, exige da instituição financeira a demonstração inequívoca da contratação, encargo que não foi cumprido. A confissão extrajudicial do próprio banco, que reconhece o erro na disponibilização dos valores na conta do autor e atribui a responsabilidade à correspondente MIL CRED, reforça a inexistência de contratação válida. A instituição financeira responde objetivamente pelos atos de seus prepostos, inclusive correspondentes bancários, conforme art. 14 do CDC e jurisprudência consolidada do STJ. O desconto indevido em benefício previdenciário configura falha na prestação do serviço e dano moral in re ipsa, sendo desnecessária a comprovação de prejuízo concreto. O valor de R$ 5.000,00 fixado a título de indenização por danos morais é proporcional e razoável diante das circunstâncias do caso. A restituição em dobro dos valores descontados indevidamente exige a demonstração de má-fé do credor, o que não se evidenciou nos autos, sendo adequada a devolução simples. A multa cominatória de R$ 1.000,00 por dia, limitada a R$ 10.000,00, é compatível com a finalidade coercitiva e com a capacidade econômica da parte ré. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso parcialmente provido. Tese de julgamento: A instituição financeira responde objetivamente pelos danos decorrentes de contratação fraudulenta realizada por intermédio de correspondente bancário. A ausência de documento contratual válido e assinado impede o reconhecimento da contratação e legitima a declaração de inexistência de débito. A devolução em dobro dos valores descontados indevidamente exige prova de má-fé da instituição financeira; na ausência dessa prova, a restituição deve ser simples. O desconto indevido em benefício previdenciário configura dano moral in re ipsa e enseja indenização, independentemente de prova do prejuízo. Dispositivos relevantes citados: CDC, arts. 6º, VIII; 14, caput e § 3º; 42, parágrafo único; CPC/2015, art. 373, II. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 1199782/PR, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, j. 24.08.2011, DJe 12.09.2011. TJMT, N.U 1002585-49.2024.8.11.0013, Rel. Des. Maria Helena Gargaglione Póvoas, Segunda Câmara de Direito Privado, j. 28.05.2025, DJE 31.05.2025. TJMT, Ap. Cível 10000425320248110052, Rel. Des. Dirceu dos Santos, Terceira Câmara de Direito Privado, j. 12.02.2025, DJE 17.02.2025. TJMT, Ap. Cível 1002866-09.2023.8.11.0023, Quarta Câmara de Direito Privado, j. 11.09.2024, DJE 16.09.2024. R E L A T Ó R I O RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL N. 0000972-06.2014.8.11.0031 BANCO BMG S/A X JUSCELINO DA SILVA QUINTEIRO RELATÓRIO Eminentes pares: Trata-se de recurso de apelação cível, interposto pelo BANCO BMG S/A, com o fito de reformar a sentença, proferida pelo Juízo da Vara Única de Nortelândia, que julgou procedentes os pedidos formulados na ação declaratória de anulação de ato ilícito c/c indenização e obrigação de fazer, ajuizada por JUSCELINO DA SILVA QUINTEIRO, para: i) determinar a devolução dos valores descontados indevidamente nos proventos do requerente, de forma dobrada (art. 42 do CDC), deduzido o montante já pago; ii) condenar os réus ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais); iii) conceder tutela de urgência para determinar a imediata suspensão dos descontos, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00, limitada a R$ 10.000,00. Por conseguinte, condenou o banco ao pagamento das custas e demais despesas processuais, bem como ao pagamento de honorários advocatícios, arbitrados esses em 10% sobre o valor da condenação (art. 85 §2º CPC). Em suas razões recursais, o banco apelante sustenta, em síntese, que o empréstimo foi regularmente contratado pelo autor. Aduz que o contrato apresentado nos autos é válido e comprova a contratação. Diz que os valores foram devidamente disponibilizados e não foram devolvidos diretamente à instituição bancária. Afirmam que a instituição financeira é terceiro de boa-fé, não tendo participado da negociação posterior entre o autor e a MIL CRED. Defende que inexiste ato ilícito ou má-fé a justificar a devolução em dobro dos valores ou indenização por danos morais. E, subsidiariamente, requer a redução do quantum indenizatório e do valor da multa cominatória. Contrarrazões pelo desprovimento, id 289342368. É o relatório. V O T O R E L A T O R Eminentes pares: Trata-se de recurso de apelação interposto pelo Banco BMG S/A, contra sentença proferida pelo Juízo da Vara Única de Nortelândia/MT, nos autos da ação declaratória de anulação de ato ilícito c/c indenização por danos materiais e morais com pedido de liminar - obrigação de fazer, que julgou procedentes os pedidos formulados por Juscelino da Silva Quinteiro em face do apelante e de Mil Cred. Na origem, o autor alegou que não contratou empréstimo consignado (contrato nº 233280973) com o banco réu, mas verificou descontos em sua pensão, além de ter recebido em sua conta bancária o valor de R$ 41.679,40. Afirmou que, contatado pela representante da MIL CRED, foi informado sobre erro no crédito e solicitado a devolver o valor, o que teria feito prontamente mediante transferência para a conta indicada. Contudo, no mês seguinte, identificou descontos de parcelas de empréstimo consignado em sua pensão, sem sua autorização. A sentença julgou procedentes os pedidos do autor. Pois bem. O cerne da controvérsia reside na verificação da regularidade da contratação de empréstimo consignado, cujas parcelas foram descontadas da pensão do autor, bem como na análise da responsabilidade civil daí decorrente e dos consectários jurídicos pertinentes. Inicialmente, constata-se que a sentença recorrida se encontra adequadamente fundamentada quanto à existência de falha na prestação do serviço por parte da instituição financeira. A análise dos elementos probatórios produzidos nos autos demonstra que o autor não contratou o empréstimo consignado objeto da demanda. O contrato apresentado pelo banco apelante, id 289342090 – pág. 16, não se revela suficiente para comprovar a regularidade da contratação, pois, como bem destacado pelo juízo a quo, trata-se de documento sem qualquer assinatura. Enquanto o documento trazido junto ao id 289342090 – pág. 54/56, tem-se que praticamente ilegível, sem qualquer assinatura, o que impossibilita a verificação das condições pactuadas e da autenticidade da assinatura nele constante. Ressalte-se que, embora inicialmente tenha requerido a produção de prova pericial grafotécnica, o banco apelante posteriormente solicitou sua dispensa, circunstância que, em conjunto com a precariedade do documento apresentado, milita em seu desfavor, sobretudo considerando a inversão do ônus probatório operada nos autos com fundamento no art. 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor. Ademais, consta dos autos documento emitido pelo próprio BANCO BMG reconhecendo o equívoco na disponibilização do valor na conta do autor e atribuindo a responsabilidade à correspondente bancária MIL CRED. Tal circunstância, aliada à ausência de impugnação específica deste documento, fortalece a conclusão pela inexistência de contratação válida. No que concerne à alegação do banco apelante de que seria terceiro de boa-fé, não prospera. A instituição financeira responde objetivamente pelos danos causados aos consumidores e, no caso em exame, há responsabilidade solidária pelos atos praticados por seus prepostos ou representantes autônomos, nos termos estabelecidos pela legislação consumerista. A correspondente bancária MIL CRED atuou como intermediária na relação entre o consumidor e a instituição financeira, sendo imperioso reconhecer o vínculo entre as empresas e a consequente responsabilidade solidária por eventuais danos decorrentes da atuação irregular, sobretudo porque o banco é o destinatário final das operações e quem efetivamente realiza os descontos no benefício previdenciário do consumidor. Assim, observa-se que o banco não apresentou documentos capazes de comprovar inequivocamente a contratação de empréstimo consignado, cartão de crédito, seguro ou previdência privada, tendo afirmado genericamente a legalidade dos descontos e a falta de provas por parte do autor/apelante. De acordo com o art. 373 do Código de Processo Civil, o ônus da prova incumbe ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito, e ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor. Essa regra, que distribui o ônus da prova entre o autor e o réu, funda-se na lógica de que o autor deve provar os fatos que constituem o direito por ele afirmado, mas não a não existência daqueles que impedem a sua constituição, determinam a sua modificação ou a sua extinção. No caso, o autor comprovou os descontos efetivados em sua conta bancária, a título de seguro prestamista, previdência privada, anuidade de cartão de crédito, débito em conta relativa à fatura de cartão de crédito e utilização do limite de cheque especial, que, por outro lado, não restaram efetiva e inequivocamente contratados, diante da ausência de comprovação por parte do banco da regularidade da contratação e descontos. Desta maneira, cumpria ao requerido comprovar a existência de fato extintivo do direito do autor (CPC, art. 373, II), no entanto, não o fez. Impende registrar que a lei consumerista é norma de ordem pública, portanto, de aplicação cogente. Assim, diante da não apresentação de documento capaz de provar a existência de autorização prévia e expressa para o débito automático dos referidos produtos, impõe-se reconhecer a irregularidade, bem como o nexo causal entre a conduta comissiva do requerido ao realizar o desconto e os danos experimentados, estando configuradas a falha na prestação do serviço e a responsabilidade da instituição financeira. Nesse contexto, considerando as características da responsabilidade civil de natureza objetiva, que, como dito, dispensa a análise do elemento volitivo, deve o banco responder independentemente de culpa pelos danos causados pelo serviço defeituoso, conforme artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor. Referida responsabilidade somente poderia ser afastada se demonstrado o serviço foi prestado sem vício e que a culpa seria exclusiva do consumidor ou de terceiro (§3º do art. 14) ou decorrente de caso fortuito ou força maior. Portanto, caracterizada a falha na prestação do serviço, impondo-se a manutenção da declaração de inexistência do débito e da determinação de suspensão imediata dos descontos, conforme decidido na origem. A propósito: RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. JULGAMENTO PELA SISTEMÁTICA DO ART. 543-C DO CPC. RESPONSABILIDADE CIVIL. INSTITUIÇÕES BANCÁRIAS. DANOS CAUSADOS POR FRAUDES E DELITOS PRATICADOS POR TERCEIROS. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. FORTUITO INTERNO. RISCO DO EMPREENDIMENTO. 1. Para efeitos do art. 543-C do CPC: As instituições bancárias respondem objetivamente pelos danos causados por fraudes ou delitos praticados por terceiros - como, por exemplo, abertura de conta corrente ou recebimento de empréstimos mediante fraude ou utilização de documentos falsos -, porquanto tal responsabilidade decorre do risco do empreendimento, caracterizando-se como fortuito interno. 2. Recurso especial provido. (STJ - REsp: 1199782 PR 2010/0119382-8, Relator.: MIN. LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Julgamento: 24/08/2011, S2 - SEGUNDA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 12/09/2011 RSSTJ vol. 43 p. 179 RSTJ vol. 224 p. 306) Quanto aos danos morais, tem-se que a situação ultrapassou o mero dissabor cotidiano. O autor, beneficiário de pensão previdenciária, teve valores indevidamente descontados de seus rendimentos por período considerável, sem que houvesse contratação legítima, comprometendo sua margem consignável e, consequentemente, sua capacidade financeira. A jurisprudência tem reconhecido que o desconto indevido em benefício previdenciário, por si só, é capaz de gerar dano moral in re ipsa, dispensando-se a comprovação do efetivo prejuízo. O quantum indenizatório fixado em R$ 5.000,00 (cinco mil reais) mostra-se adequado aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, levando em consideração as peculiaridades do caso concreto e a extensão do dano, não comportando redução ou majoração. A propósito, a jurisprudência do eg. STJ: “EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. DANOS MORAIS. VALOR DA INDENIZAÇÃO. COMPATIBILIDADE. SITUAÇÃO ECONÔMICA DO OFENSOR. (...) 1. Na fixação de indenização por danos morais, são levadas em consideração as peculiaridades da causa. Nessas circunstâncias, consideram-se a gravidade do ato, o potencial econômico do ofensor, o caráter pedagógico da indenização e os parâmetros adotados em casos semelhantes” (STJ – 4ª Turma – AgRg no AREsp 662.068/RJ – Rel. MinistroRAUL ARAÚJO– j. 19/05/2015, DJe 22/06/2015). Nesse sentido: DIREITO CIVIL E CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. CONTRATAÇÃO FRAUDULENTA DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. VIA MOBILE BANK (CELULAR). RECONHECIMENTO DA RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (...) III. Razões de decidir. 4. Aplica-se ao caso o Código de Defesa do Consumidor, nos termos das Súmulas nº 297 e nº 479 do STJ, impondo à instituição financeira a responsabilidade objetiva por falhas na segurança de seus sistemas que resultaram em fraude praticada por terceiros. 5. Inexistência nos autos de prova idônea da regularidade da contratação, tampouco da adoção de mecanismos robustos de segurança que garantissem a manifestação inequívoca de vontade do consumidor. 6. Comprovada a diligência e boa-fé do autor ao registrar boletim de ocorrência e formular reclamação junto ao Procon-MT em prazo razoável, afastando-se qualquer culpa concorrente ou má-fé. 7. Correta a condenação por danos morais no valor de R$ 5.000,00, considerando-se as circunstâncias pessoais do autor e o caráter compensatório e pedagógico da medida. 8. Contudo, ausente nos autos demonstração cabal de má-fé da instituição bancária, impõe-se a reforma parcial da sentença para que a restituição dos valores descontados ocorra de forma simples, afastando-se a determinação de devolução tripla. IV. Dispositivo e tese. 9. Recurso parcialmente provido, tão somente para determinar que a devolução dos valores descontados do benefício previdenciário do autor seja realizada de forma simples, mantida, no mais, a sentença por seus próprios fundamentos. Tese de julgamento: “1. A instituição financeira responde objetivamente por falhas de segurança em sistemas de contratação eletrônica que ensejem fraude contra o consumidor. 2. A devolução em triplo dos valores indevidamente descontados exige comprovação inequívoca de má-fé da instituição financeira, sob pena de devolução simples.” (...) (N.U 1002585-49.2024.8.11.0013, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARIA HELENA GARGAGLIONE POVOAS, Segunda Câmara de Direito Privado, Julgado em 28/05/2025, Publicado no DJE 31/05/2025) RECURSO DE APELAÇÕES CÍVEIS – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. EMPRÉSTIMO NÃO CONTRATADO - ASSINATURA A ROGO SEM TESTEMUNHAS - NULIDADE DO CONTRATO - DEVOLUÇÃO EM DOBRO - DANO MORAL CONFIGURADO - MANUTENÇÃO DA SENTENÇA - RECURSOS CONHECIDOS E DESPROVIDOS. (...) III. RAZÕES DE DECIDIR. Nos termos do art. 595 do CC, contratos firmados por analfabetos exigem assinatura a rogo e a presença de duas testemunhas. A ausência desses requisitos invalida o contrato. O banco não comprovou a regularidade da contratação, ônus que lhe competia (art. 373, II, CPC/2015). A devolução em dobro do indébito decorre da ilicitude dos descontos, sendo desnecessária a comprovação de má-fé (art. 42, parágrafo único, CDC). O desconto indevido em benefício previdenciário de natureza alimentar configura dano moral in re ipsa, sendo desnecessária prova de prejuízo adicional. IV. DISPOSITIVO E TESE. Recursos conhecidos e desprovidos. Tese de julgamento: “É nulo o contrato de empréstimo firmado por analfabeto sem assinatura a rogo acompanhada de duas testemunhas. O desconto indevido em benefício previdenciário enseja repetição do indébito em dobro e indenização por danos morais.” Dispositivos relevantes citados: CC, art . 595; CPC/2015, art. 373, II; CDC, art. 42, parágrafo único.Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 1 .578.526/SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, 3ª Turma, j . 14.02.2017; TJ-MT, AC 10000211913835001, Rel. Des . Shirley Fenzi Bertão, 11ª Câmara Cível, j. 02.02.2022. (TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 10000425320248110052, Relator.: DIRCEU DOS SANTOS, Data de Julgamento: 12/02/2025, Terceira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 17/02/2025) No tocante à repetição do indébito, único ponto em que merece parcial provimento o recurso, deve-se observar que a devolução em dobro, prevista no art. 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor, pressupõe a demonstração de má-fé do credor, entendida como a cobrança deliberada de valor sabidamente indevido. No caso em análise, embora tenha ficado caracterizada a falha na prestação do serviço, não restou suficientemente demonstrada a má-fé da instituição financeira a justificar a devolução em dobro dos valores descontados. Ao contrário, os elementos dos autos indicam a existência de relação comercial entre o banco e a correspondente bancária, havendo possibilidade de erro justificável no processamento da operação. Nesse contexto, a repetição do indébito deve ocorrer na forma simples, com a devolução dos valores descontados indevidamente, acrescidos de correção monetária pelo IPCA desde cada desconto e juros moratórios pela taxa Selic, deduzido o índice de atualização monetária desde a citação, descontando-se o montante já pago. Para ilustrar: “APELAÇÕES – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITOS (FRAUDE) C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS – TRANSAÇÕESBANCÁRIAS – FRAUDECONSTATADA–FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO – NÃO ADOÇÃO DE MECANISMOS DE SEGURANÇA – RESPONSABILIDADE OBJETIVA – SÚMULA N. 479 DO STJ – SITUAÇÃO QUE EXTRAPOLA O MERO ABORRECIMENTO – REPARAÇÃO DEVIDA –RECURSO DO RÉU NÃO PROVIDO E DO AUTOR PROVIDO. É evidente a falha na prestação do serviço decorrente defraudede terceiros quando o Banco não oferece a segurança necessária às operações realizadas pelo sistema de transações eletrônicas, portanto tem responsabilidade objetiva pelos prejuízos causados aos seus clientes. A indenização por dano moral deve ser fixada em valor que cumpra a função compensatória, punitiva e preventiva da medida”. (N.U 1002866-09.2023.8.11.0023, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 11/09/2024, Publicado no DJE 16/09/2024) Por fim, no que concerne à multa cominatória fixada para o caso de descumprimento da ordem de suspensão dos descontos, não vislumbro excesso em sua fixação. O valor arbitrado (R$ 1.000,00 por dia, limitado a R$ 10.000,00) mostra-se adequado à finalidade de assegurar o cumprimento da decisão judicial, considerando a capacidade econômica da instituição financeira e a natureza da obrigação imposta. Ante o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO ao recurso de apelação, tão somente para determinar que a repetição do indébito ocorra na forma simples, e não em dobro, mantendo-se, no mais, a sentença recorrida. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 18/06/2025

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Processo nº 0000972-06.2014.8.11.0031

ID: 304861439

Tribunal: TJMT Órgão: Quarta Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 0000972-06.2014.8.11.0031

Data de Disponibilização: 23/06/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

JUSCELINO DA SILVA QUINTEIRO

Acórdão

Advogados:

SANDRO LEITE DOS SANTOS

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 0000972-06.2014.8.11.0031 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Contratos Bancários] Relator: Des(a). SERLY MARC… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 0000972-06.2014.8.11.0031 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Contratos Bancários] Relator: Des(a). SERLY MARCONDES ALVES Turma Julgadora: [DES(A). SERLY MARCONDES ALVES, DES(A). ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA, DES(A). RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO] Parte(s): [BANCO BMG SA - CNPJ: 61.186.680/0001-74 (APELANTE), MARCELO TOSTES DE CASTRO MAIA - CPF: 911.766.386-53 (ADVOGADO), FLAVIA ALMEIDA MOURA DI LATELLA - CPF: 068.847.366-07 (ADVOGADO), MARCOS ADRIANO BOCALAN - CPF: 615.324.361-49 (ADVOGADO), RENATO CHAGAS CORREA DA SILVA - CPF: 444.850.181-72 (ADVOGADO), JUSCELINO DA SILVA QUINTEIRO - CPF: 277.420.831-91 (APELADO), SANDRO LEITE DOS SANTOS - CPF: 593.865.501-30 (ADVOGADO), MIL CRED - CNPJ: 03.088.358/0001-06 (TERCEIRO INTERESSADO), LEONARDO FIALHO PINTO - CPF: 059.220.376-09 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). Não encontrado, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: PARCIALMENTE PROVIDO, UNANIME E M E N T A DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO NÃO CONTRATADO. DESCONTO INDEVIDO EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. DEVOLUÇÃO SIMPLES DOS VALORES DESCONTADOS. DANO MORAL CONFIGURADO. “QUANTUM” ADEQUADO. MULTA COMINATÓRIA MANTIDA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I. CASO EM EXAME Recurso de apelação cível interposto contra sentença da Vara Única de Nortelândia/MT, que julgou procedentes os pedidos formulados na ação declaratória de anulação de ato ilícito c/c indenização por danos morais e materiais e obrigação de fazer. O juízo de origem determinou: (i) devolução em dobro dos valores descontados indevidamente dos proventos do autor, deduzido o que já foi restituído; (ii) pagamento de R$ 5.000,00 a título de indenização por danos morais; (iii) concessão de tutela de urgência para suspensão imediata dos descontos, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00, limitada a R$ 10.000,00. O banco apelante sustenta a validade da contratação, a inexistência de ilicitude e pede, subsidiariamente, a redução da indenização e da multa. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Há três questões em discussão: (i) definir se houve contratação válida do empréstimo consignado objeto da demanda; (ii) estabelecer se é devida a indenização por danos morais decorrente do desconto indevido em benefício previdenciário; (iii) determinar a forma correta de repetição do indébito e a adequação da multa cominatória fixada. III. RAZÕES DE DECIDIR A ausência de assinatura e a precariedade dos documentos apresentados pelo banco apelante impedem o reconhecimento da regularidade da contratação, sendo insuficiente a prova documental juntada. A inversão do ônus da prova, com base no art. 6º, VIII, do CDC, exige da instituição financeira a demonstração inequívoca da contratação, encargo que não foi cumprido. A confissão extrajudicial do próprio banco, que reconhece o erro na disponibilização dos valores na conta do autor e atribui a responsabilidade à correspondente MIL CRED, reforça a inexistência de contratação válida. A instituição financeira responde objetivamente pelos atos de seus prepostos, inclusive correspondentes bancários, conforme art. 14 do CDC e jurisprudência consolidada do STJ. O desconto indevido em benefício previdenciário configura falha na prestação do serviço e dano moral in re ipsa, sendo desnecessária a comprovação de prejuízo concreto. O valor de R$ 5.000,00 fixado a título de indenização por danos morais é proporcional e razoável diante das circunstâncias do caso. A restituição em dobro dos valores descontados indevidamente exige a demonstração de má-fé do credor, o que não se evidenciou nos autos, sendo adequada a devolução simples. A multa cominatória de R$ 1.000,00 por dia, limitada a R$ 10.000,00, é compatível com a finalidade coercitiva e com a capacidade econômica da parte ré. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso parcialmente provido. Tese de julgamento: A instituição financeira responde objetivamente pelos danos decorrentes de contratação fraudulenta realizada por intermédio de correspondente bancário. A ausência de documento contratual válido e assinado impede o reconhecimento da contratação e legitima a declaração de inexistência de débito. A devolução em dobro dos valores descontados indevidamente exige prova de má-fé da instituição financeira; na ausência dessa prova, a restituição deve ser simples. O desconto indevido em benefício previdenciário configura dano moral in re ipsa e enseja indenização, independentemente de prova do prejuízo. Dispositivos relevantes citados: CDC, arts. 6º, VIII; 14, caput e § 3º; 42, parágrafo único; CPC/2015, art. 373, II. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 1199782/PR, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, j. 24.08.2011, DJe 12.09.2011. TJMT, N.U 1002585-49.2024.8.11.0013, Rel. Des. Maria Helena Gargaglione Póvoas, Segunda Câmara de Direito Privado, j. 28.05.2025, DJE 31.05.2025. TJMT, Ap. Cível 10000425320248110052, Rel. Des. Dirceu dos Santos, Terceira Câmara de Direito Privado, j. 12.02.2025, DJE 17.02.2025. TJMT, Ap. Cível 1002866-09.2023.8.11.0023, Quarta Câmara de Direito Privado, j. 11.09.2024, DJE 16.09.2024. R E L A T Ó R I O RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL N. 0000972-06.2014.8.11.0031 BANCO BMG S/A X JUSCELINO DA SILVA QUINTEIRO RELATÓRIO Eminentes pares: Trata-se de recurso de apelação cível, interposto pelo BANCO BMG S/A, com o fito de reformar a sentença, proferida pelo Juízo da Vara Única de Nortelândia, que julgou procedentes os pedidos formulados na ação declaratória de anulação de ato ilícito c/c indenização e obrigação de fazer, ajuizada por JUSCELINO DA SILVA QUINTEIRO, para: i) determinar a devolução dos valores descontados indevidamente nos proventos do requerente, de forma dobrada (art. 42 do CDC), deduzido o montante já pago; ii) condenar os réus ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais); iii) conceder tutela de urgência para determinar a imediata suspensão dos descontos, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00, limitada a R$ 10.000,00. Por conseguinte, condenou o banco ao pagamento das custas e demais despesas processuais, bem como ao pagamento de honorários advocatícios, arbitrados esses em 10% sobre o valor da condenação (art. 85 §2º CPC). Em suas razões recursais, o banco apelante sustenta, em síntese, que o empréstimo foi regularmente contratado pelo autor. Aduz que o contrato apresentado nos autos é válido e comprova a contratação. Diz que os valores foram devidamente disponibilizados e não foram devolvidos diretamente à instituição bancária. Afirmam que a instituição financeira é terceiro de boa-fé, não tendo participado da negociação posterior entre o autor e a MIL CRED. Defende que inexiste ato ilícito ou má-fé a justificar a devolução em dobro dos valores ou indenização por danos morais. E, subsidiariamente, requer a redução do quantum indenizatório e do valor da multa cominatória. Contrarrazões pelo desprovimento, id 289342368. É o relatório. V O T O R E L A T O R Eminentes pares: Trata-se de recurso de apelação interposto pelo Banco BMG S/A, contra sentença proferida pelo Juízo da Vara Única de Nortelândia/MT, nos autos da ação declaratória de anulação de ato ilícito c/c indenização por danos materiais e morais com pedido de liminar - obrigação de fazer, que julgou procedentes os pedidos formulados por Juscelino da Silva Quinteiro em face do apelante e de Mil Cred. Na origem, o autor alegou que não contratou empréstimo consignado (contrato nº 233280973) com o banco réu, mas verificou descontos em sua pensão, além de ter recebido em sua conta bancária o valor de R$ 41.679,40. Afirmou que, contatado pela representante da MIL CRED, foi informado sobre erro no crédito e solicitado a devolver o valor, o que teria feito prontamente mediante transferência para a conta indicada. Contudo, no mês seguinte, identificou descontos de parcelas de empréstimo consignado em sua pensão, sem sua autorização. A sentença julgou procedentes os pedidos do autor. Pois bem. O cerne da controvérsia reside na verificação da regularidade da contratação de empréstimo consignado, cujas parcelas foram descontadas da pensão do autor, bem como na análise da responsabilidade civil daí decorrente e dos consectários jurídicos pertinentes. Inicialmente, constata-se que a sentença recorrida se encontra adequadamente fundamentada quanto à existência de falha na prestação do serviço por parte da instituição financeira. A análise dos elementos probatórios produzidos nos autos demonstra que o autor não contratou o empréstimo consignado objeto da demanda. O contrato apresentado pelo banco apelante, id 289342090 – pág. 16, não se revela suficiente para comprovar a regularidade da contratação, pois, como bem destacado pelo juízo a quo, trata-se de documento sem qualquer assinatura. Enquanto o documento trazido junto ao id 289342090 – pág. 54/56, tem-se que praticamente ilegível, sem qualquer assinatura, o que impossibilita a verificação das condições pactuadas e da autenticidade da assinatura nele constante. Ressalte-se que, embora inicialmente tenha requerido a produção de prova pericial grafotécnica, o banco apelante posteriormente solicitou sua dispensa, circunstância que, em conjunto com a precariedade do documento apresentado, milita em seu desfavor, sobretudo considerando a inversão do ônus probatório operada nos autos com fundamento no art. 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor. Ademais, consta dos autos documento emitido pelo próprio BANCO BMG reconhecendo o equívoco na disponibilização do valor na conta do autor e atribuindo a responsabilidade à correspondente bancária MIL CRED. Tal circunstância, aliada à ausência de impugnação específica deste documento, fortalece a conclusão pela inexistência de contratação válida. No que concerne à alegação do banco apelante de que seria terceiro de boa-fé, não prospera. A instituição financeira responde objetivamente pelos danos causados aos consumidores e, no caso em exame, há responsabilidade solidária pelos atos praticados por seus prepostos ou representantes autônomos, nos termos estabelecidos pela legislação consumerista. A correspondente bancária MIL CRED atuou como intermediária na relação entre o consumidor e a instituição financeira, sendo imperioso reconhecer o vínculo entre as empresas e a consequente responsabilidade solidária por eventuais danos decorrentes da atuação irregular, sobretudo porque o banco é o destinatário final das operações e quem efetivamente realiza os descontos no benefício previdenciário do consumidor. Assim, observa-se que o banco não apresentou documentos capazes de comprovar inequivocamente a contratação de empréstimo consignado, cartão de crédito, seguro ou previdência privada, tendo afirmado genericamente a legalidade dos descontos e a falta de provas por parte do autor/apelante. De acordo com o art. 373 do Código de Processo Civil, o ônus da prova incumbe ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito, e ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor. Essa regra, que distribui o ônus da prova entre o autor e o réu, funda-se na lógica de que o autor deve provar os fatos que constituem o direito por ele afirmado, mas não a não existência daqueles que impedem a sua constituição, determinam a sua modificação ou a sua extinção. No caso, o autor comprovou os descontos efetivados em sua conta bancária, a título de seguro prestamista, previdência privada, anuidade de cartão de crédito, débito em conta relativa à fatura de cartão de crédito e utilização do limite de cheque especial, que, por outro lado, não restaram efetiva e inequivocamente contratados, diante da ausência de comprovação por parte do banco da regularidade da contratação e descontos. Desta maneira, cumpria ao requerido comprovar a existência de fato extintivo do direito do autor (CPC, art. 373, II), no entanto, não o fez. Impende registrar que a lei consumerista é norma de ordem pública, portanto, de aplicação cogente. Assim, diante da não apresentação de documento capaz de provar a existência de autorização prévia e expressa para o débito automático dos referidos produtos, impõe-se reconhecer a irregularidade, bem como o nexo causal entre a conduta comissiva do requerido ao realizar o desconto e os danos experimentados, estando configuradas a falha na prestação do serviço e a responsabilidade da instituição financeira. Nesse contexto, considerando as características da responsabilidade civil de natureza objetiva, que, como dito, dispensa a análise do elemento volitivo, deve o banco responder independentemente de culpa pelos danos causados pelo serviço defeituoso, conforme artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor. Referida responsabilidade somente poderia ser afastada se demonstrado o serviço foi prestado sem vício e que a culpa seria exclusiva do consumidor ou de terceiro (§3º do art. 14) ou decorrente de caso fortuito ou força maior. Portanto, caracterizada a falha na prestação do serviço, impondo-se a manutenção da declaração de inexistência do débito e da determinação de suspensão imediata dos descontos, conforme decidido na origem. A propósito: RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. JULGAMENTO PELA SISTEMÁTICA DO ART. 543-C DO CPC. RESPONSABILIDADE CIVIL. INSTITUIÇÕES BANCÁRIAS. DANOS CAUSADOS POR FRAUDES E DELITOS PRATICADOS POR TERCEIROS. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. FORTUITO INTERNO. RISCO DO EMPREENDIMENTO. 1. Para efeitos do art. 543-C do CPC: As instituições bancárias respondem objetivamente pelos danos causados por fraudes ou delitos praticados por terceiros - como, por exemplo, abertura de conta corrente ou recebimento de empréstimos mediante fraude ou utilização de documentos falsos -, porquanto tal responsabilidade decorre do risco do empreendimento, caracterizando-se como fortuito interno. 2. Recurso especial provido. (STJ - REsp: 1199782 PR 2010/0119382-8, Relator.: MIN. LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Julgamento: 24/08/2011, S2 - SEGUNDA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 12/09/2011 RSSTJ vol. 43 p. 179 RSTJ vol. 224 p. 306) Quanto aos danos morais, tem-se que a situação ultrapassou o mero dissabor cotidiano. O autor, beneficiário de pensão previdenciária, teve valores indevidamente descontados de seus rendimentos por período considerável, sem que houvesse contratação legítima, comprometendo sua margem consignável e, consequentemente, sua capacidade financeira. A jurisprudência tem reconhecido que o desconto indevido em benefício previdenciário, por si só, é capaz de gerar dano moral in re ipsa, dispensando-se a comprovação do efetivo prejuízo. O quantum indenizatório fixado em R$ 5.000,00 (cinco mil reais) mostra-se adequado aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, levando em consideração as peculiaridades do caso concreto e a extensão do dano, não comportando redução ou majoração. A propósito, a jurisprudência do eg. STJ: “EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. DANOS MORAIS. VALOR DA INDENIZAÇÃO. COMPATIBILIDADE. SITUAÇÃO ECONÔMICA DO OFENSOR. (...) 1. Na fixação de indenização por danos morais, são levadas em consideração as peculiaridades da causa. Nessas circunstâncias, consideram-se a gravidade do ato, o potencial econômico do ofensor, o caráter pedagógico da indenização e os parâmetros adotados em casos semelhantes” (STJ – 4ª Turma – AgRg no AREsp 662.068/RJ – Rel. MinistroRAUL ARAÚJO– j. 19/05/2015, DJe 22/06/2015). Nesse sentido: DIREITO CIVIL E CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. CONTRATAÇÃO FRAUDULENTA DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. VIA MOBILE BANK (CELULAR). RECONHECIMENTO DA RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (...) III. Razões de decidir. 4. Aplica-se ao caso o Código de Defesa do Consumidor, nos termos das Súmulas nº 297 e nº 479 do STJ, impondo à instituição financeira a responsabilidade objetiva por falhas na segurança de seus sistemas que resultaram em fraude praticada por terceiros. 5. Inexistência nos autos de prova idônea da regularidade da contratação, tampouco da adoção de mecanismos robustos de segurança que garantissem a manifestação inequívoca de vontade do consumidor. 6. Comprovada a diligência e boa-fé do autor ao registrar boletim de ocorrência e formular reclamação junto ao Procon-MT em prazo razoável, afastando-se qualquer culpa concorrente ou má-fé. 7. Correta a condenação por danos morais no valor de R$ 5.000,00, considerando-se as circunstâncias pessoais do autor e o caráter compensatório e pedagógico da medida. 8. Contudo, ausente nos autos demonstração cabal de má-fé da instituição bancária, impõe-se a reforma parcial da sentença para que a restituição dos valores descontados ocorra de forma simples, afastando-se a determinação de devolução tripla. IV. Dispositivo e tese. 9. Recurso parcialmente provido, tão somente para determinar que a devolução dos valores descontados do benefício previdenciário do autor seja realizada de forma simples, mantida, no mais, a sentença por seus próprios fundamentos. Tese de julgamento: “1. A instituição financeira responde objetivamente por falhas de segurança em sistemas de contratação eletrônica que ensejem fraude contra o consumidor. 2. A devolução em triplo dos valores indevidamente descontados exige comprovação inequívoca de má-fé da instituição financeira, sob pena de devolução simples.” (...) (N.U 1002585-49.2024.8.11.0013, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARIA HELENA GARGAGLIONE POVOAS, Segunda Câmara de Direito Privado, Julgado em 28/05/2025, Publicado no DJE 31/05/2025) RECURSO DE APELAÇÕES CÍVEIS – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. EMPRÉSTIMO NÃO CONTRATADO - ASSINATURA A ROGO SEM TESTEMUNHAS - NULIDADE DO CONTRATO - DEVOLUÇÃO EM DOBRO - DANO MORAL CONFIGURADO - MANUTENÇÃO DA SENTENÇA - RECURSOS CONHECIDOS E DESPROVIDOS. (...) III. RAZÕES DE DECIDIR. Nos termos do art. 595 do CC, contratos firmados por analfabetos exigem assinatura a rogo e a presença de duas testemunhas. A ausência desses requisitos invalida o contrato. O banco não comprovou a regularidade da contratação, ônus que lhe competia (art. 373, II, CPC/2015). A devolução em dobro do indébito decorre da ilicitude dos descontos, sendo desnecessária a comprovação de má-fé (art. 42, parágrafo único, CDC). O desconto indevido em benefício previdenciário de natureza alimentar configura dano moral in re ipsa, sendo desnecessária prova de prejuízo adicional. IV. DISPOSITIVO E TESE. Recursos conhecidos e desprovidos. Tese de julgamento: “É nulo o contrato de empréstimo firmado por analfabeto sem assinatura a rogo acompanhada de duas testemunhas. O desconto indevido em benefício previdenciário enseja repetição do indébito em dobro e indenização por danos morais.” Dispositivos relevantes citados: CC, art . 595; CPC/2015, art. 373, II; CDC, art. 42, parágrafo único.Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 1 .578.526/SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, 3ª Turma, j . 14.02.2017; TJ-MT, AC 10000211913835001, Rel. Des . Shirley Fenzi Bertão, 11ª Câmara Cível, j. 02.02.2022. (TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 10000425320248110052, Relator.: DIRCEU DOS SANTOS, Data de Julgamento: 12/02/2025, Terceira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 17/02/2025) No tocante à repetição do indébito, único ponto em que merece parcial provimento o recurso, deve-se observar que a devolução em dobro, prevista no art. 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor, pressupõe a demonstração de má-fé do credor, entendida como a cobrança deliberada de valor sabidamente indevido. No caso em análise, embora tenha ficado caracterizada a falha na prestação do serviço, não restou suficientemente demonstrada a má-fé da instituição financeira a justificar a devolução em dobro dos valores descontados. Ao contrário, os elementos dos autos indicam a existência de relação comercial entre o banco e a correspondente bancária, havendo possibilidade de erro justificável no processamento da operação. Nesse contexto, a repetição do indébito deve ocorrer na forma simples, com a devolução dos valores descontados indevidamente, acrescidos de correção monetária pelo IPCA desde cada desconto e juros moratórios pela taxa Selic, deduzido o índice de atualização monetária desde a citação, descontando-se o montante já pago. Para ilustrar: “APELAÇÕES – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITOS (FRAUDE) C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS – TRANSAÇÕESBANCÁRIAS – FRAUDECONSTATADA–FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO – NÃO ADOÇÃO DE MECANISMOS DE SEGURANÇA – RESPONSABILIDADE OBJETIVA – SÚMULA N. 479 DO STJ – SITUAÇÃO QUE EXTRAPOLA O MERO ABORRECIMENTO – REPARAÇÃO DEVIDA –RECURSO DO RÉU NÃO PROVIDO E DO AUTOR PROVIDO. É evidente a falha na prestação do serviço decorrente defraudede terceiros quando o Banco não oferece a segurança necessária às operações realizadas pelo sistema de transações eletrônicas, portanto tem responsabilidade objetiva pelos prejuízos causados aos seus clientes. A indenização por dano moral deve ser fixada em valor que cumpra a função compensatória, punitiva e preventiva da medida”. (N.U 1002866-09.2023.8.11.0023, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 11/09/2024, Publicado no DJE 16/09/2024) Por fim, no que concerne à multa cominatória fixada para o caso de descumprimento da ordem de suspensão dos descontos, não vislumbro excesso em sua fixação. O valor arbitrado (R$ 1.000,00 por dia, limitado a R$ 10.000,00) mostra-se adequado à finalidade de assegurar o cumprimento da decisão judicial, considerando a capacidade econômica da instituição financeira e a natureza da obrigação imposta. Ante o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO ao recurso de apelação, tão somente para determinar que a repetição do indébito ocorra na forma simples, e não em dobro, mantendo-se, no mais, a sentença recorrida. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 18/06/2025

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Processo nº 1010896-34.2025.8.11.0000

ID: 299221774

Tribunal: TJMT Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº Processo: 1010896-34.2025.8.11.0000

Data de Disponibilização: 16/06/2025

Polo Ativo:

LETICIA DIAS CURIONI

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

TATIANI PINTO DE LARA VIEIRA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1010896-34.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Tratamento médico-hospitalar, Forneciment… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1010896-34.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Tratamento médico-hospitalar, Fornecimento de insumos, Planos de saúde] Relator: Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA Turma Julgadora: [DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES] Parte(s): [TATIANI PINTO DE LARA VIEIRA - CPF: 035.185.141-05 (ADVOGADO), LETICIA DIAS CURIONI - CPF: 014.097.311-70 (AGRAVANTE), UNIMED DE CIANORTE COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO (AGRAVADO), ALYSSON GOMES FERNANDES - CPF: 093.588.269-32 (ADVOGADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A AGRAVANTE(S): LETICIA DIAS CURIONI. AGRAVADO(S): UNIMED DE CIANORTE COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO. EMENTA: DIREITO DO CONSUMIDOR E DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. OBRIGAÇÃO DE FAZER. TUTELA DE URGÊNCIA. PLANO DE SAÚDE. NEGATIVA DE COBERTURA. PROCEDIMENTO COM TECNOLOGIA ROBÓTICA. IMPRESCINDIBILIDADE. NÃO COMPROVADO. MÉDICO NÃO CREDENCIADO. AUSÊNCIA DE URGÊNCIA. INEXISTÊNCIA DE EXCEPCIONALIDADE. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME Agravo de instrumento interposto por beneficiária de plano de saúde contra decisão que indeferiu tutela de urgência para compelir a operadora a custear procedimento cirúrgico de histerectomia robótica, a ser realizado por profissional não credenciado, sob fundamento de ausência de prova de urgência e de profissional habilitado na rede. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. A controvérsia cinge-se à possibilidade de compelir o plano de saúde a custear procedimento cirúrgico com técnica robótica por profissional não credenciado, diante da alegada gravidade do quadro clínico e da indicação médica particular, mesmo havendo profissionais habilitados na rede conveniada. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. O custeio de procedimentos realizados fora da rede credenciada somente é exigível em situações excepcionais, quando comprovada a urgência ou a inexistência de profissional apto na rede conveniada, o que não restou demonstrado nos autos. 4. A indicação de profissional específico ou de tecnologia mais avançada não impõe, por si só, obrigação contratual à operadora de saúde, sobretudo na ausência de risco iminente ou de exclusividade terapêutica. 5. A técnica robótica, embora recomendável, não é reconhecida como única via eficaz para o tratamento da patologia apresentada, inexistindo prescrição médica que comprove sua imprescindibilidade para evitar agravamento do estado clínico. IV. DISPOSITIVO E TESE 6. Recurso desprovido. Tese de julgamento: “1. A operadora de plano de saúde não está obrigada a custear procedimento com profissional não credenciado quando não demonstrada urgência ou inexistência de alternativa viável na rede. 2. A mera preferência por profissional específico ou por técnica mais avançada não impõe dever de cobertura fora das cláusulas contratuais.” Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 6º; L. 9.656/1998; CPC/2015, art. 300. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no AREsp 1.289.621/SP, Rel. Min. Marco Buzzi, DJe 28/5/2021; STJ, AgInt no AREsp 1.543.332/SP, Rel. Min. Raul Araújo, DJe 1/10/2021; STJ, AgInt no AREsp 1.602.582/SP, Rel. Min. Marco Buzzi, DJe 11/6/2021. R E L A T Ó R I O RELATÓRIO EXMO. SR. DES. SEBASTIÃO DE ARRUDA ALMEIDA. Egrégia Câmara: Trata-se de AGRAVO DE INSTRUMENTO COM PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA RECURSAL interposto por LETICIA DIAS CURIONI, contra decisão interlocutória proferida (ID. 187990554 – autos de origem PJE Nº 1002866-93.2025.8.11.0037) pelo Juízo da 2ª Vara Cível da Comarca de Primavera do Leste-MT, que indeferiu o pedido de tutela de urgência formulado com o objetivo de compelir o plano de saúde a realizar a cobertura do procedimento de histerectomia robótica, a ser executado por médico não credenciado, sob os seguintes fundamentos: “[...]Trata-se de Tutela Antecipada com Caráter Antecedente, proposta por Leticia Dias Curioni, em face de Unimed de Cianorte Cooperativa de Trabalho Médico , todos qualificados nos autos em epígrafe. A pretensão material fundamenta-se na relação jurídica estabelecida entre as partes para a prestação de serviços médicos e hospitalares. Segundo narrativa exordial, em uma cirurgia de emergência, em Cuiabá/MT, em 23/11/2023, foi necessário remover uma das trompas uterinas e, após biópsia do endométrio, em fevereiro/2024, identificou-se a presença de bactérias persistentes e inflamações. Afirma que os tratamentos complexos de saúde reprodutiva realizados na trompa remanescente não foram suficientes, uma vez que ainda apresentava aderências e inflamação, impossibilitando a concepção natural e reforçando a necessidade de intervenção cirúrgica. Apregoa que houve a recomendação da cirurgia de histerectomia assistida por robótica e a indicação da Dra. Carolina Delage, profissional renomada nacionalmente e especialista em cirurgias reprodutivas assistidas por robótica, sendo que a tecnologia é essencial ao caso da autora ao reduzir riscos de perda de funcionalidade do órgão comprometido e aumentar as chances de preservação da fertilidade. Nesse sentido, enfatiza que solicitou, à requerida, cobertura para a realização da cirurgia de histerectomia assistida por robótica, em 24/02/2025, incluindo o pagamento do pacote Kit Robô Histerectomia (Programa Robótica), a qual está agendada para 22/04/2025, no Hospital Beneficência Portuguesa (Paulista), a ser realizada com a Dra. Carolina Delage, médica não credenciada do plano de saúde, com o custo total de R$ 31.925,00, sem que obtivesse parecer favorável pelo plano de sáude. Em sede de tutela provisória de urgência, postula pela cobertura do valor total das despesas relacionadas ao procedimento cirúrgico a ser realizado no dia 22/04/2025, no valor total de R$ 31.925,00, pela requerida, sob pena de multa diária de R$ 5.000,00. A petição inicial foi instruída com documentos. Formalizados os autos, vieram conclusos para deliberação. É a síntese. Fundamento. Decido. A concessão da tutela provisória de urgência demanda a existência de elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo, a teor do disposto no artigo 300 do Código de Processo Civil. Sob tal conjuntura fático-jurídica, não há elementos probatórios suficientes que denotem a pertinência do direito material. A existência de relação jurídica entre as partes restou demonstrada pelos e-mails colacionados, em que a requerida informou a ausência de cobertura para procedimentos que envolvam o uso de tecnologia robótica, nos termos contratuais (Num. 187929795 – Pág. 1). Inobstante a negativa da requerida para o procedimento solicitado, a parte autora também postulou pela prestação de serviços com determinado profissional, que não é credenciado pelo plano de saúde, o que obsta a concessão da tutela provisória de urgência. Isso porque a obrigação de o plano de saúde custear ou reembolsar tratamentos e procedimentos médicos com profissionais não credenciados ocorre em relação a hipóteses taxativas relacionadas aos casos de urgência ou emergência, quando não for possível a utilização dos serviços próprios, contratados, credenciados ou referenciados pelas operadoras ou, ainda, diante da inexistência ou insuficiência de hospital ou profissional capacitado para a realização de procedimento na área de abrangência do plano de saúde. Em outros termos, a eventual obrigação de o plano de saúde custear tratamento ou procedimento médico indicado pelo médico assistente do paciente, a respeito de patologia acobertada por contrato de prestação de serviços médicos e hospitalares firmado entre as partes, não se confunde com a escolha do profissional não credenciado pela parte autora, a qual impõe a observância das excepcionais hipóteses admitidas no ordenamento jurídico. Nesse sentido, segundo a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, “o reembolso de despesas hospitalares efetuadas pelo beneficiário com tratamento/atendimento de saúde fora da rede credenciada pode ser admitido somente em hipóteses excepcionais, tais como a inexistência ou insuficiência de estabelecimento ou profissional credenciado no local e urgência ou emergência do procedimento" ( AgInt no AREsp n. 1.289.621/SP , relator Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, DJe de 28/5/2021). Desse modo, não se mostra adequado, em princípio, que a usuária do plano de saúde escolha o profissional a ser disponibilizado para a realização do tratamento, sem a observância das excepcionais hipóteses admitidas no ordenamento jurídico. Portanto, não há, neste momento processual, elemento probatório idôneo da pertinência do direito material. Isso posto, ausente o pressuposto legal, indefiro o pedido de tutela provisória de urgência. [...]” Em razões recursais, fundamenta o recurso nas seguintes teses fático-jurídicos, sendo: 1. Em suas razões recursais, argumenta que foi diagnosticada com endometriose severa e aderências pélvicas extensas, situação que compromete sua fertilidade e lhe causa intensas dores. Sustenta que há indicação médica para realização de histerectomia robótica, procedimento minimamente invasivo, que oferece maiores chances de sucesso, menor tempo de internação e recuperação mais rápida. Aduz que a negativa de cobertura fere seus direitos fundamentais à saúde e à dignidade humana, além de representar risco de dano irreparável à sua saúde reprodutiva. 2. Afirma que a escolha da profissional médica é essencial para sua segurança e confiança no tratamento, sendo abusiva a negativa do plano de saúde com base na ausência de credenciamento. Aduz ainda que a demora na concessão da tutela poderá comprometer de forma definitiva sua saúde e o êxito do tratamento. 3. Para fins de tutela recursal defende que a probabilidade do direito está materializada na verossimilhança das afirmações e o periculum in mora consubstanciado no fato de o procedimento já estar agendado (22/04/2025) e a sua não realização pode gerar dano irreparável. Nesse sentido, requereu o deferimento da antecipação da tutela recursal para determinar ao plano de saúde que realize o custeio da realização do procedimento de histerectomia robótica por médico não credenciado e, no mérito, seja confirmada a tutela em todos os seus termos, reformando a decisão agravada. Por sua vez, a parte Agravada apresenta contrarrazões em ID. 286454864 pugnando pelo desprovimento do recurso. O ilustre Representante Ministerial que oficia perante esta Câmara Recursal, em judicioso parecer (ID. 289651385), opina pelo desprovimento do recurso em referência. É o relatório. Sebastião de Arruda Almeida Desembargador Relator V O T O R E L A T O R AGRAVANTE(S): LETICIA DIAS CURIONI. AGRAVADO(S): UNIMED DE CIANORTE COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO. VOTO Egrégia Câmara: Inicialmente, verifico a presença dos requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade recursal. Conforme anteriormente relatado, trata-se de recurso de AGRAVO DE INSTRUMENTO COM PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA RECURSAL interposto por LETICIA DIAS CURIONI, contra decisão interlocutória proferida (ID. 187990554 – autos de origem PJE Nº 1002866-93.2025.8.11.0037) pelo Juízo da 2ª Vara Cível da Comarca de Primavera do Leste-MT, que indeferiu o pedido de tutela de urgência formulado com o objetivo de compelir o plano de saúde a realizar a cobertura do procedimento de histerectomia robótica, a ser executado por médico não credenciado. Pois bem. De início, ressalto que, o Agravo de Instrumento por ser um recurso secundum eventum litis, limita-se ao exame do acerto ou não da decisão impugnada, em vista que ao Tribunal incumbe aferir tão somente se o ato judicial vergastado está eivado de ilegalidade e abusividade, sendo defeso o exame de questões estranhas ao que ficou decidido na lide. O cerne do presente recurso reside na análise do acerto ou desacerto da decisão agravada, a qual indeferiu o pedido de tutela de urgência formulado com o objetivo de compelir o plano de saúde a realizar a cobertura do procedimento de histerectomia robótica, ressaltando-se a ausência, neste momento processual, de elemento probatório idôneo quanto à pertinência do direito material invocado. Saliento, que não se pode olvidar que em matéria de agravo de instrumento a análise é restrita ao acerto, ou desacerto, do ato recorrido, sob pena de caracterizar supressão de instância, isso sem descurar do caráter de cognição não exauriente que impera nesta fase processual. A decisão agravada indeferiu o pedido sob o seguinte fundamento: “[...] Em outros termos, a eventual obrigação de o plano de saúde custear tratamento ou procedimento médico indicado pelo médico assistente do paciente, a respeito de patologia acobertada por contrato de prestação de serviços médicos e hospitalares firmado entre as partes, não se confunde com a escolha do profissional não credenciado pela parte autora, a qual impõe a observância das excepcionais hipóteses admitidas no ordenamento jurídico. Nesse sentido, segundo a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, “o reembolso de despesas hospitalares efetuadas pelo beneficiário com tratamento/atendimento de saúde fora da rede credenciada pode ser admitido somente em hipóteses excepcionais, tais como a inexistência ou insuficiência de estabelecimento ou profissional credenciado no local e urgência ou emergência do procedimento" ( AgInt no AREsp n. 1.289.621/SP , relator Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, DJe de 28/5/2021). Desse modo, não se mostra adequado, em princípio, que a usuária do plano de saúde escolha o profissional a ser disponibilizado para a realização do tratamento, sem a observância das excepcionais hipóteses admitidas no ordenamento jurídico. Portanto, não há, neste momento processual, elemento probatório idôneo da pertinência do direito material. Isso posto, ausente o pressuposto legal, indefiro o pedido de tutela provisória de urgência.” (g.n.) 1. Do dever de cobertura do procedimento cirúrgico No caso em exame, a parte agravante busca compelir o plano de saúde a custear, em rede privada, a realização de procedimento cirúrgico com o uso de tecnologia robótica, por profissional não credenciado. Embora o procedimento em si — histerectomia — esteja incluído na cobertura contratual, a realização por meio de técnica robótica e por médico não integrante da rede credenciada não é contemplada pelo plano. Conforme pacificado pela jurisprudência, a cobertura de procedimentos realizados por médicos não credenciados, ou o seu reembolso, somente é admitida em hipóteses excepcionais, nas quais se demonstre a urgência ou emergência da situação, aliada à inexistência ou insuficiência de profissionais credenciados habilitados à realização do procedimento. Vejamos a jurisprudência: EMENTA DIREITO DO CONSUMIDOR.PLANODESAÚDE. DESCRREDENCIAMENTO DEMÉDICO. OBRIGAÇÃO DE CUSTEIO DE TRATAMENTO COM PROFISSIONAL NÃOCREDENCIADO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DE PROFISSIONAIS HABILITADOS NA REDE. RECURSO NÃO PROVIDO. I. CASO EM EXAME Recurso de Agravo de Instrumento interposto contra decisão que indeferiu pedido de tutela de urgência para bloqueio de valores, nos autos da ação de obrigação de fazer c/c indenização por danos morais. A agravante sustenta que osmédicosresponsáveis por seus procedimentos cirúrgicos foram descredenciados e pleiteia a continuidade do tratamento com esses profissionais, sem necessidade de aderir a outrosmédicosda redecredenciada. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO A questão em discussão consiste em definir se a operadora deplanodesaúdepode ser compelida a custear tratamento commédicoparticular nãocredenciadoem razão do descredenciamento do profissional anteriormente escolhido pela beneficiária. III. RAZÕES DE DECIDIR A relação contratual entre as partes é regida pela Lei nº 9.656/98 e pelo Código de Defesa do Consumidor, impondo à operadora doplanodesaúdea obrigação de garantir a cobertura dos procedimentos contratualmente previstos, desde que observadas as normas aplicáveis. A operadora disponibilizou à beneficiária uma rede demédicoscredenciadosaptos a realizar o procedimento, sendo a preferência por profissional específico que deixou de integrar o quadro decredenciadosinsuficiente para obrigar oplanoa custear tratamento fora da rede. A exigência de custeio de tratamento commédiconãocredenciadoviola a equação contratual e pode gerar oneração excessiva à operadora, extrapolando os limites da regulação setorial. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento de que o reembolso integral de despesas fora da redecredenciadasomente ocorre em situaçõesexcepcionais, quando não houver profissional habilitado na redecredenciada, o que não restou demonstrado no caso concreto. Não há urgência ou risco iminente àsaúdeda agravante que justifique o afastamento das disposições contratuais e a imposição do custeio de tratamento fora da redecredenciada. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso desprovido. Tese de julgamento: A operadora deplanodesaúdenão está obrigada a custear tratamento commédiconãocredenciadoquando há profissionais habilitados na redecredenciadapara realizar o procedimento necessário ao beneficiário. A mera preferência do paciente por determinado profissional, ainda que descredenciado após o início do tratamento, não configura direito automático ao custeio peloplanodesaúde. O reembolso integral de despesasmédicasfora da redecredenciadasomente é devido em hipótesesexcepcionais, quando não houver profissionais aptos na rede disponibilizada pela operadora. Dispositivos relevantes citados: Lei nº 9.656/98; Código de Defesa do Consumidor. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no REsp n. 1.959.248/SP, rel. Min. Humberto Martins, Terceira Turma, j. 09/09/2024, DJe 11/09/2024. (N.U 1034571-60.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SERLY MARCONDES ALVES, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 26/02/2025, Publicado no DJE 28/02/2025) – Grifei Entretanto, a documentação apresentada até o presente momento não demonstra a existência de situação de urgência ou emergência médica que exija a intervenção imediata, o que impede a aplicação da exceção à cláusula contratual. Mais do que isso, não há nos autos prescrição médica categórica e justificada que indique a técnica robótica como única opção viável, tampouco que o uso de método convencional ou laparoscópico comprometa sua saúde ou cause risco à fertilidade ou à recuperação pós-operatória. A indicação da técnica robótica, embora modernamente considerada um avanço em termos de precisão e recuperação, não possui status de exclusividade terapêutica no tratamento da enfermidade, sendo vista, pela comunidade médica e pelos órgãos reguladores, como opção preferencial ou recomendável, mas não como a única admissível. Como demonstrado pela jurisprudência já colacionada, a simples preferência do paciente por determinado método ou profissional não configura, por si só, situação de excepcionalidade capaz de impor a obrigatoriedade de cobertura pelo plano de saúde. Ademais, mesmo sob a ótica do reembolso, o Superior Tribunal de Justiça tem consolidado o entendimento de que este somente é admissível em hipóteses excepcionais, quando demonstradas a urgência ou emergência e a ausência de alternativas credenciadas adequadas. Nesse sentido: PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. PLANO DE SAÚDE. TRATAMENTO MULTIDISCIPLINAR PRESCRITO PARA BENEFICIÁRIO PORTADOR DE TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA. REEMBOLSO INTEGRAL. EXCEPCIONALIDADE. INTERESSE RECURSAL. AUSÊNCIA. 1. Ação de obrigação de fazer, visando a cobertura de sessões de terapias multidisciplinares para tratamento do transtorno do espectro autista (TEA). 2. A ausência do indispensável interesse recursal impede o conhecimento do recurso. 3. Segundo a jurisprudência do STJ, o reembolso das despesas médico-hospitalares efetuadas pelo beneficiário com tratamento/atendimento de saúde fora da rede credenciada pode ser admitido somente em hipóteses excepcionais, tais como a inexistência ou insuficiência de estabelecimento ou profissional credenciado no local e urgência ou emergência do procedimento, limitado ao valor da tabela do plano de saúde contratado. 4. Distinguem-se, da hipótese tratada na orientação jurisprudencial sobre o reembolso nos limites do contrato, as situações em que se caracteriza a inexecução do contrato pela operadora, causadora de danos materiais ao beneficiário, a ensejar o direito ao reembolso integral das despesas realizadas por este, a saber: inobservância de prestação assumida no contrato, descumprimento de ordem judicial que determina a cobertura do tratamento ou violação de atos normativos da ANS, o que não se verifica na presente hipótese. 5. Agravo interno não provido. (AgInt nos EDcl no REsp n. 2.015.809/SP, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 26/6/2023, DJe de 28/6/2023.) - Grifei AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. PLANO DE SAÚDE. TRATAMENTO QUIMIOTERÁPICO. HOSPITAL NÃO CREDENCIADO. DEVER DE INFORMAÇÃO. OBSERVÂNCIA. SÚMULAS 5 E 7/STJ. CUSTEIO DO TRATAMENTO EM HOSPITAL NÃO CREDENCIADO. IMPOSSIBILIDADE. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO. 1. Não configura ofensa aos arts.489e1.022doCPC/2015o fato de o Tribunal de origem, embora sem examinar individualmente cada um dos argumentos suscitados pelo recorrente, adotar fundamentação contrária à pretensão da parte, suficiente para decidir integralmente a controvérsia. 2. Na hipótese, o Tribunal de origem concluiu pela observância do direito de informação ao consumidor no tocante à ciência de que o hospital escolhido era credenciado apenas para internações de urgência e eletivas, inexistindo cobertura contratual para atendimento ambulatorial e tratamento quimioterápico. A modificação de tal entendimento demandaria a interpretação de cláusulas contratuais e o revolvimento do suporte fático-probatório dos autos, o que é inviável em sede de recurso especial, nos termos das Súmulas 5 e 7 do STJ. 3. Esta Corte tem entendimento de que somente é exigível que os planos de saúde custeiem tratamento médico realizado por profissional não credenciado nas hipóteses de emergência ou urgência, inexistência de estabelecimento credenciado no local ou recusa do hospital conveniado, o que não ocorreu no caso dos autos. Precedentes. 4. Agravo interno a que se nega provimento. (AgInt no AREsp n. 1.543.332/SP, relator MinistroRaul Araújo, Quarta Turma, julgado em 30/8/2021, DJe de 1/10/2021.) - Grifei AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL - AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER COM PEDIDO CONDENATÓRIO - DECISÃO MONOCRÁTICA QUE NEGOU PROVIMENTO AO RECLAMO. INSURGÊNCIA DA PARTE DEMANDANTE. 1. No que diz respeito à alegada violação ao art.1.022doCPC/15, observa-se que a parte recorrente alegou genericamente que o acórdão hostilizado o teria afrontado, sem, contudo, demonstrar de forma clara como o decisum teria incorrido em omissão, contradição ou obscuridade, o que atrai, por analogia, o óbice da Súmula 284/STF. 2. Esta Corte Superior firmou posicionamento no sentido de que somente é exigível que os planos de saúde custeiem tratamento médico realizado por profissional não credenciado nas hipóteses de emergência ou urgência, inexistência de estabelecimento credenciado no local ou recusa do hospital conveniado, o que não ocorreu no caso dos autos. Incidência da Súmula 83/STJ. 3. A ausência de enfrentamento da matéria objeto da controvérsia pelo Tribunal de origem, não obstante a oposição de embargos de declaração, impede o acesso à instância especial, porquanto não preenchido o requisito constitucional do prequestionamento. Incidência da Súmula 211/STJ. 4. A revisão do aresto impugnado no sentido pretendido pela parte recorrente exigiria derruir a convicção formada nas instâncias ordinárias sobre a legalidade da negativa de cobertura do procedimento médico na espécie. Incidência da Súmula 7/STJ. 5. Agravo interno desprovido. (AgInt no AREsp n. 1.602.582/SP, relator MinistroMarco Buzzi, Quarta Turma, julgado em 7/6/2021, DJe de 11/6/2021) - Grifei A controvérsia aqui apresentada demanda prova técnica robusta que comprove que a técnica robótica se mostra essencial e indispensável para o tratamento da agravante, e que as opções disponíveis na rede credenciada representam risco médico desproporcional ou inviabilidade clínica. Tais elementos não se encontram presentes neste momento processual. A alegação de preferência pessoal ou expectativa de menor tempo de recuperação, embora compreensível sob a ótica humana, não constitui fundamento jurídico idôneo para imposição judicial de obrigação não prevista contratualmente. Desta maneira, atento às especificidades da situação fática e aos documentos anexos aos autos principais, entendo que não restaram configurados motivos que justifiquem a reforma da decisão. Frisa-se, neste juízo de cognição sumária. CONCLUSÃO Com essas considerações, em consonância com o parecer ministerial, conheço do recurso e NEGO-LHE PROVIMENTO, mantendo inalterados os termos da decisão agravada. Por se tratar de recurso contra decisão interlocutória sem prévia fixação de honorários em primeira instância, deixo de condenar a parte agravante ao pagamento das verbas sucumbenciais. É como voto. Sebastião de Arruda Almeida Desembargador Relator V O T O S V O G A I S Data da sessão: Cuiabá-MT, 10/06/2025

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Processo nº 1010896-34.2025.8.11.0000

ID: 299221783

Tribunal: TJMT Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº Processo: 1010896-34.2025.8.11.0000

Data de Disponibilização: 16/06/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

UNIMED DE CIANORTE COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO

Acórdão

Advogados:

ALYSSON GOMES FERNANDES

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1010896-34.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Tratamento médico-hospitalar, Forneciment… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1010896-34.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Tratamento médico-hospitalar, Fornecimento de insumos, Planos de saúde] Relator: Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA Turma Julgadora: [DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES] Parte(s): [TATIANI PINTO DE LARA VIEIRA - CPF: 035.185.141-05 (ADVOGADO), LETICIA DIAS CURIONI - CPF: 014.097.311-70 (AGRAVANTE), UNIMED DE CIANORTE COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO (AGRAVADO), ALYSSON GOMES FERNANDES - CPF: 093.588.269-32 (ADVOGADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A AGRAVANTE(S): LETICIA DIAS CURIONI. AGRAVADO(S): UNIMED DE CIANORTE COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO. EMENTA: DIREITO DO CONSUMIDOR E DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. OBRIGAÇÃO DE FAZER. TUTELA DE URGÊNCIA. PLANO DE SAÚDE. NEGATIVA DE COBERTURA. PROCEDIMENTO COM TECNOLOGIA ROBÓTICA. IMPRESCINDIBILIDADE. NÃO COMPROVADO. MÉDICO NÃO CREDENCIADO. AUSÊNCIA DE URGÊNCIA. INEXISTÊNCIA DE EXCEPCIONALIDADE. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME Agravo de instrumento interposto por beneficiária de plano de saúde contra decisão que indeferiu tutela de urgência para compelir a operadora a custear procedimento cirúrgico de histerectomia robótica, a ser realizado por profissional não credenciado, sob fundamento de ausência de prova de urgência e de profissional habilitado na rede. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. A controvérsia cinge-se à possibilidade de compelir o plano de saúde a custear procedimento cirúrgico com técnica robótica por profissional não credenciado, diante da alegada gravidade do quadro clínico e da indicação médica particular, mesmo havendo profissionais habilitados na rede conveniada. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. O custeio de procedimentos realizados fora da rede credenciada somente é exigível em situações excepcionais, quando comprovada a urgência ou a inexistência de profissional apto na rede conveniada, o que não restou demonstrado nos autos. 4. A indicação de profissional específico ou de tecnologia mais avançada não impõe, por si só, obrigação contratual à operadora de saúde, sobretudo na ausência de risco iminente ou de exclusividade terapêutica. 5. A técnica robótica, embora recomendável, não é reconhecida como única via eficaz para o tratamento da patologia apresentada, inexistindo prescrição médica que comprove sua imprescindibilidade para evitar agravamento do estado clínico. IV. DISPOSITIVO E TESE 6. Recurso desprovido. Tese de julgamento: “1. A operadora de plano de saúde não está obrigada a custear procedimento com profissional não credenciado quando não demonstrada urgência ou inexistência de alternativa viável na rede. 2. A mera preferência por profissional específico ou por técnica mais avançada não impõe dever de cobertura fora das cláusulas contratuais.” Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 6º; L. 9.656/1998; CPC/2015, art. 300. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no AREsp 1.289.621/SP, Rel. Min. Marco Buzzi, DJe 28/5/2021; STJ, AgInt no AREsp 1.543.332/SP, Rel. Min. Raul Araújo, DJe 1/10/2021; STJ, AgInt no AREsp 1.602.582/SP, Rel. Min. Marco Buzzi, DJe 11/6/2021. R E L A T Ó R I O RELATÓRIO EXMO. SR. DES. SEBASTIÃO DE ARRUDA ALMEIDA. Egrégia Câmara: Trata-se de AGRAVO DE INSTRUMENTO COM PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA RECURSAL interposto por LETICIA DIAS CURIONI, contra decisão interlocutória proferida (ID. 187990554 – autos de origem PJE Nº 1002866-93.2025.8.11.0037) pelo Juízo da 2ª Vara Cível da Comarca de Primavera do Leste-MT, que indeferiu o pedido de tutela de urgência formulado com o objetivo de compelir o plano de saúde a realizar a cobertura do procedimento de histerectomia robótica, a ser executado por médico não credenciado, sob os seguintes fundamentos: “[...]Trata-se de Tutela Antecipada com Caráter Antecedente, proposta por Leticia Dias Curioni, em face de Unimed de Cianorte Cooperativa de Trabalho Médico , todos qualificados nos autos em epígrafe. A pretensão material fundamenta-se na relação jurídica estabelecida entre as partes para a prestação de serviços médicos e hospitalares. Segundo narrativa exordial, em uma cirurgia de emergência, em Cuiabá/MT, em 23/11/2023, foi necessário remover uma das trompas uterinas e, após biópsia do endométrio, em fevereiro/2024, identificou-se a presença de bactérias persistentes e inflamações. Afirma que os tratamentos complexos de saúde reprodutiva realizados na trompa remanescente não foram suficientes, uma vez que ainda apresentava aderências e inflamação, impossibilitando a concepção natural e reforçando a necessidade de intervenção cirúrgica. Apregoa que houve a recomendação da cirurgia de histerectomia assistida por robótica e a indicação da Dra. Carolina Delage, profissional renomada nacionalmente e especialista em cirurgias reprodutivas assistidas por robótica, sendo que a tecnologia é essencial ao caso da autora ao reduzir riscos de perda de funcionalidade do órgão comprometido e aumentar as chances de preservação da fertilidade. Nesse sentido, enfatiza que solicitou, à requerida, cobertura para a realização da cirurgia de histerectomia assistida por robótica, em 24/02/2025, incluindo o pagamento do pacote Kit Robô Histerectomia (Programa Robótica), a qual está agendada para 22/04/2025, no Hospital Beneficência Portuguesa (Paulista), a ser realizada com a Dra. Carolina Delage, médica não credenciada do plano de saúde, com o custo total de R$ 31.925,00, sem que obtivesse parecer favorável pelo plano de sáude. Em sede de tutela provisória de urgência, postula pela cobertura do valor total das despesas relacionadas ao procedimento cirúrgico a ser realizado no dia 22/04/2025, no valor total de R$ 31.925,00, pela requerida, sob pena de multa diária de R$ 5.000,00. A petição inicial foi instruída com documentos. Formalizados os autos, vieram conclusos para deliberação. É a síntese. Fundamento. Decido. A concessão da tutela provisória de urgência demanda a existência de elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo, a teor do disposto no artigo 300 do Código de Processo Civil. Sob tal conjuntura fático-jurídica, não há elementos probatórios suficientes que denotem a pertinência do direito material. A existência de relação jurídica entre as partes restou demonstrada pelos e-mails colacionados, em que a requerida informou a ausência de cobertura para procedimentos que envolvam o uso de tecnologia robótica, nos termos contratuais (Num. 187929795 – Pág. 1). Inobstante a negativa da requerida para o procedimento solicitado, a parte autora também postulou pela prestação de serviços com determinado profissional, que não é credenciado pelo plano de saúde, o que obsta a concessão da tutela provisória de urgência. Isso porque a obrigação de o plano de saúde custear ou reembolsar tratamentos e procedimentos médicos com profissionais não credenciados ocorre em relação a hipóteses taxativas relacionadas aos casos de urgência ou emergência, quando não for possível a utilização dos serviços próprios, contratados, credenciados ou referenciados pelas operadoras ou, ainda, diante da inexistência ou insuficiência de hospital ou profissional capacitado para a realização de procedimento na área de abrangência do plano de saúde. Em outros termos, a eventual obrigação de o plano de saúde custear tratamento ou procedimento médico indicado pelo médico assistente do paciente, a respeito de patologia acobertada por contrato de prestação de serviços médicos e hospitalares firmado entre as partes, não se confunde com a escolha do profissional não credenciado pela parte autora, a qual impõe a observância das excepcionais hipóteses admitidas no ordenamento jurídico. Nesse sentido, segundo a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, “o reembolso de despesas hospitalares efetuadas pelo beneficiário com tratamento/atendimento de saúde fora da rede credenciada pode ser admitido somente em hipóteses excepcionais, tais como a inexistência ou insuficiência de estabelecimento ou profissional credenciado no local e urgência ou emergência do procedimento" ( AgInt no AREsp n. 1.289.621/SP , relator Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, DJe de 28/5/2021). Desse modo, não se mostra adequado, em princípio, que a usuária do plano de saúde escolha o profissional a ser disponibilizado para a realização do tratamento, sem a observância das excepcionais hipóteses admitidas no ordenamento jurídico. Portanto, não há, neste momento processual, elemento probatório idôneo da pertinência do direito material. Isso posto, ausente o pressuposto legal, indefiro o pedido de tutela provisória de urgência. [...]” Em razões recursais, fundamenta o recurso nas seguintes teses fático-jurídicos, sendo: 1. Em suas razões recursais, argumenta que foi diagnosticada com endometriose severa e aderências pélvicas extensas, situação que compromete sua fertilidade e lhe causa intensas dores. Sustenta que há indicação médica para realização de histerectomia robótica, procedimento minimamente invasivo, que oferece maiores chances de sucesso, menor tempo de internação e recuperação mais rápida. Aduz que a negativa de cobertura fere seus direitos fundamentais à saúde e à dignidade humana, além de representar risco de dano irreparável à sua saúde reprodutiva. 2. Afirma que a escolha da profissional médica é essencial para sua segurança e confiança no tratamento, sendo abusiva a negativa do plano de saúde com base na ausência de credenciamento. Aduz ainda que a demora na concessão da tutela poderá comprometer de forma definitiva sua saúde e o êxito do tratamento. 3. Para fins de tutela recursal defende que a probabilidade do direito está materializada na verossimilhança das afirmações e o periculum in mora consubstanciado no fato de o procedimento já estar agendado (22/04/2025) e a sua não realização pode gerar dano irreparável. Nesse sentido, requereu o deferimento da antecipação da tutela recursal para determinar ao plano de saúde que realize o custeio da realização do procedimento de histerectomia robótica por médico não credenciado e, no mérito, seja confirmada a tutela em todos os seus termos, reformando a decisão agravada. Por sua vez, a parte Agravada apresenta contrarrazões em ID. 286454864 pugnando pelo desprovimento do recurso. O ilustre Representante Ministerial que oficia perante esta Câmara Recursal, em judicioso parecer (ID. 289651385), opina pelo desprovimento do recurso em referência. É o relatório. Sebastião de Arruda Almeida Desembargador Relator V O T O R E L A T O R AGRAVANTE(S): LETICIA DIAS CURIONI. AGRAVADO(S): UNIMED DE CIANORTE COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO. VOTO Egrégia Câmara: Inicialmente, verifico a presença dos requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade recursal. Conforme anteriormente relatado, trata-se de recurso de AGRAVO DE INSTRUMENTO COM PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA RECURSAL interposto por LETICIA DIAS CURIONI, contra decisão interlocutória proferida (ID. 187990554 – autos de origem PJE Nº 1002866-93.2025.8.11.0037) pelo Juízo da 2ª Vara Cível da Comarca de Primavera do Leste-MT, que indeferiu o pedido de tutela de urgência formulado com o objetivo de compelir o plano de saúde a realizar a cobertura do procedimento de histerectomia robótica, a ser executado por médico não credenciado. Pois bem. De início, ressalto que, o Agravo de Instrumento por ser um recurso secundum eventum litis, limita-se ao exame do acerto ou não da decisão impugnada, em vista que ao Tribunal incumbe aferir tão somente se o ato judicial vergastado está eivado de ilegalidade e abusividade, sendo defeso o exame de questões estranhas ao que ficou decidido na lide. O cerne do presente recurso reside na análise do acerto ou desacerto da decisão agravada, a qual indeferiu o pedido de tutela de urgência formulado com o objetivo de compelir o plano de saúde a realizar a cobertura do procedimento de histerectomia robótica, ressaltando-se a ausência, neste momento processual, de elemento probatório idôneo quanto à pertinência do direito material invocado. Saliento, que não se pode olvidar que em matéria de agravo de instrumento a análise é restrita ao acerto, ou desacerto, do ato recorrido, sob pena de caracterizar supressão de instância, isso sem descurar do caráter de cognição não exauriente que impera nesta fase processual. A decisão agravada indeferiu o pedido sob o seguinte fundamento: “[...] Em outros termos, a eventual obrigação de o plano de saúde custear tratamento ou procedimento médico indicado pelo médico assistente do paciente, a respeito de patologia acobertada por contrato de prestação de serviços médicos e hospitalares firmado entre as partes, não se confunde com a escolha do profissional não credenciado pela parte autora, a qual impõe a observância das excepcionais hipóteses admitidas no ordenamento jurídico. Nesse sentido, segundo a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, “o reembolso de despesas hospitalares efetuadas pelo beneficiário com tratamento/atendimento de saúde fora da rede credenciada pode ser admitido somente em hipóteses excepcionais, tais como a inexistência ou insuficiência de estabelecimento ou profissional credenciado no local e urgência ou emergência do procedimento" ( AgInt no AREsp n. 1.289.621/SP , relator Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, DJe de 28/5/2021). Desse modo, não se mostra adequado, em princípio, que a usuária do plano de saúde escolha o profissional a ser disponibilizado para a realização do tratamento, sem a observância das excepcionais hipóteses admitidas no ordenamento jurídico. Portanto, não há, neste momento processual, elemento probatório idôneo da pertinência do direito material. Isso posto, ausente o pressuposto legal, indefiro o pedido de tutela provisória de urgência.” (g.n.) 1. Do dever de cobertura do procedimento cirúrgico No caso em exame, a parte agravante busca compelir o plano de saúde a custear, em rede privada, a realização de procedimento cirúrgico com o uso de tecnologia robótica, por profissional não credenciado. Embora o procedimento em si — histerectomia — esteja incluído na cobertura contratual, a realização por meio de técnica robótica e por médico não integrante da rede credenciada não é contemplada pelo plano. Conforme pacificado pela jurisprudência, a cobertura de procedimentos realizados por médicos não credenciados, ou o seu reembolso, somente é admitida em hipóteses excepcionais, nas quais se demonstre a urgência ou emergência da situação, aliada à inexistência ou insuficiência de profissionais credenciados habilitados à realização do procedimento. Vejamos a jurisprudência: EMENTA DIREITO DO CONSUMIDOR.PLANODESAÚDE. DESCRREDENCIAMENTO DEMÉDICO. OBRIGAÇÃO DE CUSTEIO DE TRATAMENTO COM PROFISSIONAL NÃOCREDENCIADO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DE PROFISSIONAIS HABILITADOS NA REDE. RECURSO NÃO PROVIDO. I. CASO EM EXAME Recurso de Agravo de Instrumento interposto contra decisão que indeferiu pedido de tutela de urgência para bloqueio de valores, nos autos da ação de obrigação de fazer c/c indenização por danos morais. A agravante sustenta que osmédicosresponsáveis por seus procedimentos cirúrgicos foram descredenciados e pleiteia a continuidade do tratamento com esses profissionais, sem necessidade de aderir a outrosmédicosda redecredenciada. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO A questão em discussão consiste em definir se a operadora deplanodesaúdepode ser compelida a custear tratamento commédicoparticular nãocredenciadoem razão do descredenciamento do profissional anteriormente escolhido pela beneficiária. III. RAZÕES DE DECIDIR A relação contratual entre as partes é regida pela Lei nº 9.656/98 e pelo Código de Defesa do Consumidor, impondo à operadora doplanodesaúdea obrigação de garantir a cobertura dos procedimentos contratualmente previstos, desde que observadas as normas aplicáveis. A operadora disponibilizou à beneficiária uma rede demédicoscredenciadosaptos a realizar o procedimento, sendo a preferência por profissional específico que deixou de integrar o quadro decredenciadosinsuficiente para obrigar oplanoa custear tratamento fora da rede. A exigência de custeio de tratamento commédiconãocredenciadoviola a equação contratual e pode gerar oneração excessiva à operadora, extrapolando os limites da regulação setorial. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento de que o reembolso integral de despesas fora da redecredenciadasomente ocorre em situaçõesexcepcionais, quando não houver profissional habilitado na redecredenciada, o que não restou demonstrado no caso concreto. Não há urgência ou risco iminente àsaúdeda agravante que justifique o afastamento das disposições contratuais e a imposição do custeio de tratamento fora da redecredenciada. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso desprovido. Tese de julgamento: A operadora deplanodesaúdenão está obrigada a custear tratamento commédiconãocredenciadoquando há profissionais habilitados na redecredenciadapara realizar o procedimento necessário ao beneficiário. A mera preferência do paciente por determinado profissional, ainda que descredenciado após o início do tratamento, não configura direito automático ao custeio peloplanodesaúde. O reembolso integral de despesasmédicasfora da redecredenciadasomente é devido em hipótesesexcepcionais, quando não houver profissionais aptos na rede disponibilizada pela operadora. Dispositivos relevantes citados: Lei nº 9.656/98; Código de Defesa do Consumidor. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no REsp n. 1.959.248/SP, rel. Min. Humberto Martins, Terceira Turma, j. 09/09/2024, DJe 11/09/2024. (N.U 1034571-60.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SERLY MARCONDES ALVES, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 26/02/2025, Publicado no DJE 28/02/2025) – Grifei Entretanto, a documentação apresentada até o presente momento não demonstra a existência de situação de urgência ou emergência médica que exija a intervenção imediata, o que impede a aplicação da exceção à cláusula contratual. Mais do que isso, não há nos autos prescrição médica categórica e justificada que indique a técnica robótica como única opção viável, tampouco que o uso de método convencional ou laparoscópico comprometa sua saúde ou cause risco à fertilidade ou à recuperação pós-operatória. A indicação da técnica robótica, embora modernamente considerada um avanço em termos de precisão e recuperação, não possui status de exclusividade terapêutica no tratamento da enfermidade, sendo vista, pela comunidade médica e pelos órgãos reguladores, como opção preferencial ou recomendável, mas não como a única admissível. Como demonstrado pela jurisprudência já colacionada, a simples preferência do paciente por determinado método ou profissional não configura, por si só, situação de excepcionalidade capaz de impor a obrigatoriedade de cobertura pelo plano de saúde. Ademais, mesmo sob a ótica do reembolso, o Superior Tribunal de Justiça tem consolidado o entendimento de que este somente é admissível em hipóteses excepcionais, quando demonstradas a urgência ou emergência e a ausência de alternativas credenciadas adequadas. Nesse sentido: PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. PLANO DE SAÚDE. TRATAMENTO MULTIDISCIPLINAR PRESCRITO PARA BENEFICIÁRIO PORTADOR DE TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA. REEMBOLSO INTEGRAL. EXCEPCIONALIDADE. INTERESSE RECURSAL. AUSÊNCIA. 1. Ação de obrigação de fazer, visando a cobertura de sessões de terapias multidisciplinares para tratamento do transtorno do espectro autista (TEA). 2. A ausência do indispensável interesse recursal impede o conhecimento do recurso. 3. Segundo a jurisprudência do STJ, o reembolso das despesas médico-hospitalares efetuadas pelo beneficiário com tratamento/atendimento de saúde fora da rede credenciada pode ser admitido somente em hipóteses excepcionais, tais como a inexistência ou insuficiência de estabelecimento ou profissional credenciado no local e urgência ou emergência do procedimento, limitado ao valor da tabela do plano de saúde contratado. 4. Distinguem-se, da hipótese tratada na orientação jurisprudencial sobre o reembolso nos limites do contrato, as situações em que se caracteriza a inexecução do contrato pela operadora, causadora de danos materiais ao beneficiário, a ensejar o direito ao reembolso integral das despesas realizadas por este, a saber: inobservância de prestação assumida no contrato, descumprimento de ordem judicial que determina a cobertura do tratamento ou violação de atos normativos da ANS, o que não se verifica na presente hipótese. 5. Agravo interno não provido. (AgInt nos EDcl no REsp n. 2.015.809/SP, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 26/6/2023, DJe de 28/6/2023.) - Grifei AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. PLANO DE SAÚDE. TRATAMENTO QUIMIOTERÁPICO. HOSPITAL NÃO CREDENCIADO. DEVER DE INFORMAÇÃO. OBSERVÂNCIA. SÚMULAS 5 E 7/STJ. CUSTEIO DO TRATAMENTO EM HOSPITAL NÃO CREDENCIADO. IMPOSSIBILIDADE. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO. 1. Não configura ofensa aos arts.489e1.022doCPC/2015o fato de o Tribunal de origem, embora sem examinar individualmente cada um dos argumentos suscitados pelo recorrente, adotar fundamentação contrária à pretensão da parte, suficiente para decidir integralmente a controvérsia. 2. Na hipótese, o Tribunal de origem concluiu pela observância do direito de informação ao consumidor no tocante à ciência de que o hospital escolhido era credenciado apenas para internações de urgência e eletivas, inexistindo cobertura contratual para atendimento ambulatorial e tratamento quimioterápico. A modificação de tal entendimento demandaria a interpretação de cláusulas contratuais e o revolvimento do suporte fático-probatório dos autos, o que é inviável em sede de recurso especial, nos termos das Súmulas 5 e 7 do STJ. 3. Esta Corte tem entendimento de que somente é exigível que os planos de saúde custeiem tratamento médico realizado por profissional não credenciado nas hipóteses de emergência ou urgência, inexistência de estabelecimento credenciado no local ou recusa do hospital conveniado, o que não ocorreu no caso dos autos. Precedentes. 4. Agravo interno a que se nega provimento. (AgInt no AREsp n. 1.543.332/SP, relator MinistroRaul Araújo, Quarta Turma, julgado em 30/8/2021, DJe de 1/10/2021.) - Grifei AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL - AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER COM PEDIDO CONDENATÓRIO - DECISÃO MONOCRÁTICA QUE NEGOU PROVIMENTO AO RECLAMO. INSURGÊNCIA DA PARTE DEMANDANTE. 1. No que diz respeito à alegada violação ao art.1.022doCPC/15, observa-se que a parte recorrente alegou genericamente que o acórdão hostilizado o teria afrontado, sem, contudo, demonstrar de forma clara como o decisum teria incorrido em omissão, contradição ou obscuridade, o que atrai, por analogia, o óbice da Súmula 284/STF. 2. Esta Corte Superior firmou posicionamento no sentido de que somente é exigível que os planos de saúde custeiem tratamento médico realizado por profissional não credenciado nas hipóteses de emergência ou urgência, inexistência de estabelecimento credenciado no local ou recusa do hospital conveniado, o que não ocorreu no caso dos autos. Incidência da Súmula 83/STJ. 3. A ausência de enfrentamento da matéria objeto da controvérsia pelo Tribunal de origem, não obstante a oposição de embargos de declaração, impede o acesso à instância especial, porquanto não preenchido o requisito constitucional do prequestionamento. Incidência da Súmula 211/STJ. 4. A revisão do aresto impugnado no sentido pretendido pela parte recorrente exigiria derruir a convicção formada nas instâncias ordinárias sobre a legalidade da negativa de cobertura do procedimento médico na espécie. Incidência da Súmula 7/STJ. 5. Agravo interno desprovido. (AgInt no AREsp n. 1.602.582/SP, relator MinistroMarco Buzzi, Quarta Turma, julgado em 7/6/2021, DJe de 11/6/2021) - Grifei A controvérsia aqui apresentada demanda prova técnica robusta que comprove que a técnica robótica se mostra essencial e indispensável para o tratamento da agravante, e que as opções disponíveis na rede credenciada representam risco médico desproporcional ou inviabilidade clínica. Tais elementos não se encontram presentes neste momento processual. A alegação de preferência pessoal ou expectativa de menor tempo de recuperação, embora compreensível sob a ótica humana, não constitui fundamento jurídico idôneo para imposição judicial de obrigação não prevista contratualmente. Desta maneira, atento às especificidades da situação fática e aos documentos anexos aos autos principais, entendo que não restaram configurados motivos que justifiquem a reforma da decisão. Frisa-se, neste juízo de cognição sumária. CONCLUSÃO Com essas considerações, em consonância com o parecer ministerial, conheço do recurso e NEGO-LHE PROVIMENTO, mantendo inalterados os termos da decisão agravada. Por se tratar de recurso contra decisão interlocutória sem prévia fixação de honorários em primeira instância, deixo de condenar a parte agravante ao pagamento das verbas sucumbenciais. É como voto. Sebastião de Arruda Almeida Desembargador Relator V O T O S V O G A I S Data da sessão: Cuiabá-MT, 10/06/2025

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Processo nº 1002866-69.2025.8.11.0045

ID: 261289624

Tribunal: TJMT Órgão: 3ª VARA CÍVEL DE LUCAS DO RIO VERDE Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1002866-69.2025.8.11.0045

Data de Disponibilização: 28/04/2025

Polo Ativo:

AMARILDO VICENTE

Polo Passivo:

Decisão

Advogados:

WILLIAN AUGUSTO MENDES CAVALCANTE

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ANA PAULA ZINI CAVALCANTE

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 3ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE LUCAS DO RIO VERDE DECISÃO Processo n. 1002866-69.2025.8.11.0045 AUTOR: AMARILDO VICENTE REQUERIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOC… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 3ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE LUCAS DO RIO VERDE DECISÃO Processo n. 1002866-69.2025.8.11.0045 AUTOR: AMARILDO VICENTE REQUERIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS 1 - Estando presentes os requisitos legais do art. 319 do Código de Processo Civil, este juízo RECEBE a inicial. 2 - Ante as circunstâncias e provas documentais juntadas, com base no artigo 98 do CPC, DEFERE-SE o benefício da justiça gratuita em favor da parte autora. 3 - Com o objetivo de adotar procedimentos uniformes nas ações judiciais que envolvam a concessão de benefícios previdenciários, o Conselho Nacional de Justiça editou a Recomendação Conjunta nº 01 de 15/12/2015. Em seu artigo 1º, I a mencionada recomendação, referindo-se aos processos judiciais que visem à concessão de benefícios de aposentadoria por invalidez, auxílio-doença e auxílio-acidente, dispõe a determinação de prova pericial médica liminarmente e, a ordem de citação para contestar quando acompanhada do laudo pericial. Procedimento que se aplica pela anuência das razões da norma, assim como, pela principiologia da eficácia e economia jurisdicional tendo em vista o perecimento da prova; a especialidade concentrada das demandas deste Juízo; bem como a segurança na análise eventual dos pedidos de antecipação de tutela, beneficiando diretamente as partes. 3.1 - Portanto, diante da necessidade de se comprovar a incapacidade e respectivo grau de laboral da parte requerente, o nexo causal e a possibilidade de reabilitação, cuja constatação só é possível por meio de perícia médica especializada, DETERMINA-SE a produção de prova pericial, a qual deverá obedecer aos ditames dos artigos 464 e seguintes do CPC. Pelo exposto alhures, POSTERGA-SE a apreciação da tutela antecipada. 4 - NOMEIA-SE como perita a Dra. Karoline Aparecida Janones (CRM-MT 10769), portadora de endereço eletrônico hábil (dra.karolinejanones@outlook.com), devidamente selecionado pelo Juízo, o qual deverá ser contatado pela Secretaria, via e-mail, para ciência da nomeação e organização para a realização da perícia na Comarca de Lucas do Rio Verde. 4.1 - ATENTE-SE o profissional (i) que a data da designação deverá observar o intervalo mínimo de 5 dias para ciência das partes, (isto é, o perito considerará a data de sua resposta com a designação para contagem de 5 dias até a data a ser realizada a perícia), sendo que qualquer situação excepcional deve ser previamente comunicada a Secretaria da Vara; (ii) que a hora da designação deverá considerar o intervalo adequado à complexidade do caso e aos atos periciais presenciais próprios (recebimento de documentos médicos; anamnese; exame físico; entre outros); (iii) que o laudo pericial deverá ser concluído e disponibilizado para juntada no processo no prazo de até 20 (vinte) dias, a contar da realização da perícia, o qual poderá ser excepcionalmente prorrogado por metade do prazo original mediante justificativa (art. 476, CPC). 4.2 – Na hipótese do perito suscitar a necessidade de uso de sala no prédio do fórum para realização da perícia, deverá a Secretaria encaminhar a pauta das perícias para a Diretoria do Fórum, a fim de que disponibilize o espaço e avise a recepção. 4.3 - ATENTE-SE o profissional que o laudo pericial deverá ser concluído e disponibilizado para juntada no processo no prazo de até 20 (vinte) dias, a contar da realização da perícia, o qual poderá ser excepcionalmente prorrogado por metade do prazo original mediante justificativa (art. 476, CPC). 4.4 – DÊ-SE ciência a parte requerida e, especialmente, INTIME-SE a parte autora, por meio do advogado constituído, via DJe, para que compareça à perícia agendada, devendo levar documentos médicos históricos e contemporâneos, assim como de identificação pessoal. O médico assistente da parte poderá(ão) acompanhar a realização dos trabalhos periciais (art. 466 § 2° do CPC/2015), mediante expressa anuência/autorização do periciando (haja vista o direito à intimidade/privacidade do paciente), sendo vedada qualquer intervenção no ato pericial do médico-perito, ao passo que qualquer intempérie deverá, o perito, fazer constar no laudo. 4.5 - CONSIGNA-SE anexo o rol de quesitos do Juízo a ser respondido pelo perito, nos moldes da Recomendação do CNJ nº 01/2015. Pontua-se que o perito ficará desincumbido de responder a este rol, caso sejam apresentados quesitos por ambas as partes, hipótese em que poderá informar tais quesitos como “prejudicados”. 4.6 - FIXA-SE, desde já, o valor dos honorários periciais no importe de R$600,00 (seiscentos reais). Consoante § 4º do art. 2º da Resolução nº 232/2016 (alterada pela Resolução n. 326/2020) do CNJ, a presente fixação fundamenta-se considerando a base de honorários médicos (Item 3 do Anexo – Tabela Honorários Periciais) perante os parâmetros do art. 2º, incisos I a IV, da norma referenciada. Adequação da verba que se assevera pelo zelo e tempo exigidos nas diversas etapas para a atividade pericial em comento (leitura processual-documental; perícia presencial na Comarca; apreciação de documentação complementar; elaboração do laudo; resposta a um extenso rol de quesitos em face dos pedidos alternativos e da fungibilidade das demandas previdenciárias; comunicações com a Secretaria da Vara; disponibilidade para elaboração de laudo complementar e eventual comparecimento em audiência); pela peculiaridade regional (distância da Comarca da Capital, demandas concentradas na especialidade desta Vara, entre outros) ante a disponibilidade e justo interesse de profissionais capacitados de confiança do Juízo; pela legítima expectativa de atualização objetiva de valores, decorrente da previsão do § 4º do art. 2º da Resolução. Ressalta-se que o levantamento dos honorários periciais, por meio de ofício requisitório através do Sistema AJG, será autorizado assim que o laudo médico for juntado aos autos, na forma do art. 465, § 4º, CPC. 5 - INTIME-SE a parte requerente para, no prazo de 15 (quinze) dias, vide art. 465 § 1.° do CPC/2015, apresentar quesitos, indicar assistente técnico, arguir o impedimento/suspeição e, manifestar sobre o interesse na adoção do “Juízo 100% Digital”, permitindo o aumento da celeridade e da eficiência da prestação jurisdicional. Cientificando-se que o silêncio importará em aceitação tácita. 6 - INTIME-SE a parte requerida, para que, vide art. 465 § 1° do CPC/2015, no prazo de 15 (quinze) dias contado em dobro, indique quesitos e/ou assistente técnico, também facultando arguição de impedimento/suspeição. 7 – Decorridos os prazos, apresentados os quesitos e/ou apresentados documentos complementares, COMUNIQUE-SE o profissional pela via adequada. 8 - Juntado o laudo pericial, CITE-SE a parte requerida para, no prazo legal, contestar os presentes autos, no prazo de 15 (quinze) dias, contado em dobro na hipótese do art. 183, CPC. Na mesma oportunidade, deverá apresentar eventuais impugnações ao laudo ou esclarecimentos, cientificando-se que o silêncio culminará na concordância. 8.1 - Juntado o laudo, INTIME-SE a parte autora para que se manifeste no prazo de 15 (quinze) dias, valendo idem oportunidade para juntada de parecer de eventual assistente técnico (art. 477, § 1º, CPC). 9 - Caso certificada a apresentação de tempestiva contestação, na hipótese em que o réu alegar, em sua contestação, fato impeditivo, modificativo, extintivo do direito da parte autora ou quaisquer das matérias mencionadas no art. 337 do CPC, INTIME-SE o procurador constituído em favor da parte requerente, via DJE, para que se manifeste, no prazo de 15 (quinze) dias, conforme preceituam os artigos 350 e 351 do CPC. 10 - Exauridos os prazos, havendo ou não contestação e réplica, o que deverá ser certificado nos autos, CONCLUSOS para os fins do artigo 347 do CPC. 11 - CUMPRA-SE com urgência. Lucas do Rio Verde, data registrada no sistema. Evandro Juarez Rodrigues Juiz de Direito ANEXO - QUESITOS DO JUÍZO I – DADOS GERAIS DO PROCESSO a) Número do processo b) Juizado/Vara II – DADOS GERAIS DO (A) PERICIADO (A) a) Nome do(a) autor(a) b) CPF c) Sexo d) Data de nascimento e) Estado civil f) Escolaridade g) Formação técnico-profissional III – DADOS GERAIS DA PERÍCIA a) Data do Exame b) Perito Médico Judicial/Nome e CRM c) Assistente Técnico do INSS/Nome, Matrícula e CRM (caso tenha acompanhado o exame) d) Assistente Técnico do Autor/Nome e CRM (caso tenha acompanhado o exame) IV – HISTÓRICO LABORAL DO(A) PERICIADO(A) a) Profissão declarada b) Tempo de profissão c) Descrição da atividade declarada como exercida d) Tempo de atividade e) Data declarada de afastamento do trabalho, se tiver ocorrido f) Experiência laboral anterior g) Atividade que exerce na data da perícia ou nova formação V – EXAME CLÍNICO E CONSIDERAÇÕES MÉDICO-PERICIAIS SOBRE A PATOLOGIA a) Queixa que o(a) periciado(a) apresenta no ato da perícia. b) A parte pericianda é portadora de alguma enfermidade/patologia, lesão ou deficiência diagnosticada por ocasião da perícia? Se positiva resposta, indicar CID. c) O diagnóstico atual foi estabelecido clinicamente ou existe alguma comprovação por exame complementar? No caso de existência de exame complementar, indique o resultado. d) A patologia declinada encontra-se em fase evolutiva (descompensada) ou estabilizada (residual)? e) Qual a causa provável da(s) enfermidade/patologia? f) Há nexo causal/concausal entre as lesões advindas da enfermidade/patologia com o trabalho realizado pela parte requerente? Em caso positivo, indique os elementos considerados? g) É possível afirmar se a enfermidade ou lesão decorre de acidente? Se sim, qual a espécie de acidente (causas diversas ou acidente de trabalho)? Em caso positivo, circunstanciar o fato, com data e local, bem como se reclamou assistência médica e/ou hospitalar; indicando a base da resposta. h) Quais as lesões e/ou consequências do diagnóstico? i) A atividade declarada requer a realização de esforços físicos? Em caso afirmativo, diga o perito: se de forma leve, moderada ou intensa? j) A enfermidade/patologia ou lesão torna o(a) periciado(a) incapacitado(a) para o exercício do último trabalho ou atividade habitual? k) Caso seja positiva a resposta ao quesito anterior, a incapacidade do(a) periciado(a) é de natureza permanente ou temporária? Parcial ou total? m) Qual a data provável do início da(s) doença/lesão/moléstias(s) que acomete(m) o(a) periciado(a). l) A incapacidade remonta à data de início da(s) doença/moléstia(s) ou decorre de progressão ou agravamento dessa patologia? m) Qual a data provável de início da incapacidade identificada? n) É possível afirmar se havia incapacidade entre a data do requerimento/indeferimento ou da cessação do benefício administrativamente e a data da realização da perícia judicial? Se positivo, justificar apontando os elementos para esta conclusão. Se possível, indicar datas iniciais/finais e a referência. o) Se a incapacidade for considerada parcial e permanente, é possível afirmar se o(a) periciado(a) está apto para o exercício de outra atividade profissional ou, existe capacidade laborativa residual para cumprimento de programa de reabilitação profissional? Se possível, indicar se a incapacidade é uniprofissional, multiprofissional ou omniprofissional. p) Sendo a incapacidade for considerada total e permanente, o(a) periciado(a) necessita de assistência permanente de outra pessoa para as atividades diárias? A partir de quando? q) Se a incapacidade for considerada temporária, é possível estimar qual o tempo e o eventual tratamento necessários para que o(a) periciado(a) se recupere e tenha condições de voltar a exercer seu trabalho ou atividade habitual (data de cessação da incapacidade)? Se possível, aponte o prazo estimado/data aproximada da recuperação laborativa. r) Há sequelas ou lesões consolidadas decorrentes de acidente de qualquer natureza ou acidente de trabalho? Se sim, essas afetam/reduzem o desempenho laboral que habitualmente exercia? s) A enfermidade/lesão é passível de cura, total ou parcial? O(a) periciado(a) está realizando tratamento? Qual a previsão de duração do tratamento? Há previsão ou foi realizado tratamento cirúrgico? O tratamento é oferecido pelo SUS? t) Qual ou quais são os exames clínicos, laudos ou elementos considerados para o presente ato médico pericial? Além disso, preste, o perito, os demais esclarecimentos que entenda serem pertinentes para melhor elucidação do caso. u) Pode o perito afirmar se existe qualquer indício ou sinais de dissimulação ou de exacerbação de sintomas? Responda apenas em caso afirmativo.

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Processo nº 1002866-30.2020.8.11.0050

ID: 312571406

Tribunal: TJMT Órgão: Segunda Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1002866-30.2020.8.11.0050

Data de Disponibilização: 01/07/2025

Polo Ativo:

VITTA SEEDS COMERCIAL AGRICOLA LTDA

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

CARLOS EDUARDO SILVA E SOUZA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1002866-30.2020.8.11.0050 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Em comum / De fato] Relator: Des(a). TATIANE CO… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1002866-30.2020.8.11.0050 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Em comum / De fato] Relator: Des(a). TATIANE COLOMBO Turma Julgadora: [DES(A). TATIANE COLOMBO, DES(A). MARIA HELENA GARGAGLIONE POVOAS, DES(A). MARILSEN ANDRADE ADDARIO] Parte(s): [VITTA SEEDS COMERCIAL AGRICOLA LTDA - CNPJ: 33.484.035/0001-00 (APELANTE), HERMES BEZERRA DA SILVA NETO - CPF: 722.385.341-72 (ADVOGADO), CARLOS EDUARDO SILVA E SOUZA - CPF: 899.546.961-72 (ADVOGADO), T. C. DE PAULA CONSTANTINO - EPP - CNPJ: 13.817.300/0001-00 (APELADO), TELMA CORREA DE PAULA CONSTANTINO - CPF: 301.881.561-00 (APELADO), AFONSO SILVEIRA CONSTANTINO - CPF: 270.049.531-49 (APELADO), MIGUELANGELO DE BARROS BASSO - CPF: 119.876.248-90 (APELADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). MARIA HELENA GARGAGLIONE POVOAS, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. UNANIME. E M E N T A APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE EXISTÊNCIA DE SOCIEDADE DE FATO. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS PROBATÓRIOS APTOS À CONFIGURAÇÃO DE VÍNCULO SOCIETÁRIO. EXISTÊNCIA DE MANDATO COM PODERES AMPLOS. ÔNUS DA PROVA DO AUTOR. NÃO CUMPRIMENTO. IMPROCEDÊNCIA MANTIDA. MULTA EM EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. DESCABIMENTO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I. Caso em exame Apelação cível interposta contra sentença que julgou improcedente a Ação Declaratória de Existência de Sociedade de Fato, ajuizada com a finalidade de reconhecer relação societária entre os Apelados, imputando-lhes os efeitos jurídicos e econômicos correspondentes. A sentença concluiu pela inexistência de vínculo societário, reconhecendo, em relação ao Apelado Miguelangelo, a existência de mandato regularmente constituído, e, quanto ao Apelado Afonso, a ausência de qualquer prova apta a indicar sua atuação como sócio. Ainda, aplicou multa por embargos de declaração considerados protelatórios. II. Questão em discussão 2. A controvérsia cinge-se a duas questões centrais: (i) verificar se restou caracterizada sociedade de fato entre os Apelados, sobretudo diante da revelia dos Apelados; (ii) averiguar a legalidade da multa aplicada em sede de embargos de declaração. III. Razões de decidir 3. A revelia não induz presunção de veracidade das alegações iniciais, nos termos do art. 345, IV, do CPC, diante da existência de prova em sentido contrário. 4. Os documentos apresentados demonstram que o apelado Miguelangelo atuava como mandatário da empresa, munido de procuração pública com amplos poderes de representação, nos termos do art. 653 do CC. 5. Além disso, não há nos autos elementos que indiquem a constituição de sociedade de fato com o Apelado Afonso, tampouco a existência de vínculo societário entre os três demandados, inexistindo prova de comunhão de esforços, partilha de lucros ou contribuição para atividade empresarial conjunta, nos moldes do art. 981 do CC. 6. A documentação probatória se mostra insuficiente para infirmar a natureza de representação por mandato e comprovar a formação de sociedade de fato, atraindo a incidência do art. 373, I, do CPC. 7. Assim, inexistindo provas contundentes da existência de sociedade de fato, descabida a modificação da sentença de improcedência do pleito da inicial. 8. Por sua vez, a aplicação de multa em sede de embargos declaratórios não se sustenta, pois o recurso buscava suprir omissão sobre os efeitos da revelia, sendo inadequado qualificá-lo como protelatório. A penalidade configura afronta ao devido processo legal. IV. Dispositivo e tese 9. Recurso parcialmente provido, apenas para afastar a multa aplicada nos embargos de declaração. R E L A T Ó R I O Egrégia Câmara. Trata-se de Recurso de Apelação Cível interposto por VITTA SEEDS COMERCIAL AGRÍCOLA LTDA em face da sentença proferida pelo juízo da 1ª Vara da Comarca de Campo Novo do Parecis-MT, que julgou improcedente os pedidos da inicial da Ação Declaratória de Existência de Sociedade de Fato ajuizada pela ora Apelante em desfavor de T. C. DE PAULA CONSTANTINO – EPP, TELMA CORREA DE PAULA CONSTANTINO, AFONSO SILVEIRA CONSTANTINO e MIGUELANGELO DE BARROS BASSO. Em suas razões (ID 269249140), a Apelante sustenta que a sentença reconheceu a revelia dos Apelados, no entanto, não aplicou os efeitos previstos no artigo 344 do Código de Processo Civil. Ressalta que, em caso de revelia, presumem-se verdadeiros os fatos alegados na inicial e que o caso não se enquadra em nenhuma das exceções estabelecidas no artigo 345 do Código de Processo Civil. Argumenta que a não aplicação dos efeitos da revelia viola o princípio da confiança. Alega que a sentença ignorou documentos relevantes acostados ao processo, como a escritura pública em que o apelado Afonso assina como sócio da empresa apelada T. C. de Paula Constantivo e a testemunha ouvida na audiência instrutória, que confirmou que o apelado Miguelangelo não atuava como mero mandatário, mas exercia funções típicas de um sócio. Frisa que a relação estabelecida entre as partes transcende o mero mandato e que “a sociedade de fato se configura quando duas ou mais pessoas exercem conjuntamente atividade econômica com finalidade lucrativa, independentemente de formalização contratual” – sic. Sustenta que a multa aplicada pelo juízo a quo ao afastar os embargos declaratórios se mostra indevida, haja vista que o recurso não tinha condão protelatório, mas visava “objetivo legítimo de buscar o esclarecimento de pontos essenciais da decisão, indispensáveis à adequada prestação jurisdicional” - sic. Assim, requer o provimento do apelo para reformar a sentença, reconhecendo a sociedade de fato entre os Apelados, com a consequente procedência do pedido inicial. Requer, ainda, que seja afastada a multa aplicada pelo juízo de primeiro grau. Sem contrarrazões. É o relatório. V O T O R E L A T O R Egrégia Câmara. Cuida-se de Ação Declaratória de Existência de Sociedade de Fato em que a Apelante sustenta, na inicial, que firmou negócio jurídico de compra e venda de produtos agrícolas com a empresa apelada T. C. de Paula Constatino – EPP, através do apelado Miguelangelo, o qual age como se sócio fosse da referida pessoa jurídica, embora não conste no quadro social. Argumenta que o apelado Afonso também "assina como representante/sócio/proprietário" – sic - da empresa apelada e "que esta permanece inscrita perante a Junta Comercial do Estado de Mato Grosso como sendo empresária individual" – sic. Ressalta que está evidenciada verdadeira sociedade de fato entre os apelados Telma, Afonso e Miguelangelo, em flagrante abuso de direito, em virtude da ausência de alteração societária para que os sócios Afonso e Miguelangelo sofra "possíveis repercursões econômicas negativas em desfavor dos credores diversos" – sic. Os Apelados foram citados e não apresentaram contestação, razão pela qual houve a declaração de revelia. Após a instrução processual, o juízo a quo proferiu sentença, improcedendo o pleito inicial, nos seguintes termos: "(...) Dessa forma, tratando-se da mesma pessoa, não é possível a constituição de sociedade com terceiros, visto que se trata de empresa individual, todavia, caso venha a admitir sócios, o empresário individual poderá solicitar ao Registro Público de Empresas Mercantis a transformação de seu registro de empresário para registro de sociedade empresária, conforme determina o artigo 968, § 3º, do Código Civil. In casu, verifica-se que, malgrado o requerido MIGUELANGELO DE BARROS BASSO tenha realizado negócios jurídicos em nome da empresa individual T. C. DE PAULA CONSTANTINO, fato é que possui procuração reconhecida em cartório outorgando amplos poderes para que possa representá-la perante a sociedade, especialmente no ramo mercantil. O Código Civil permite a representação por procuração, conforme se extrai do artigo 653 e seguintes. Assim, ao que parece, a relação havida entre os requeridos não é de sociedade, mas, sim, de mandato, tendo a empresa individual T. C. DE PAULA CONSTANTINO, representada pela pessoa natural TELMA CORREA DE PAULA CONSTANTINO, como mandante, ao passo que o requerido MIGUELANGELO DE BARROS BASSO se caracteriza como mandatário, de modo que não constato nenhuma irregularidade praticada pelos demandados. Registra-se que, nos termos do artigo 662 do Código Civil, os atos praticados por quem não tenha mandato, ou o tenha sem poderes suficientes, são ineficazes em relação àquele em cujo nome foram praticados, salvo se este os ratificar, cabendo à parte que se sentir lesada, ajuizar a ação cabível. Além disso, o artigo 663 do Código Civil prevê que “sempre que o mandatário estipular negócios expressamente em nome do mandante, será este o único responsável; ficará, porém, o mandatário pessoalmente obrigado, se agir no seu próprio nome, ainda que o negócio seja de conta do mandante”. Dessa maneira, ainda que o requerido Miguelangelo atue como mandatário da empresa requerida, é esta quem responderá pelas obrigações inerentes aos eventuais negócios jurídicos firmados, não havendo, portanto, quaisquer prejuízos aos terceiros e, neste caso, ao requerente. Caso haja, conforme dito alhures, caberá àquele que se sentir prejudicado, ajuizar a ação competente para repará-los. Ademais, em relação ao requerido AFONSO SILVEIRA CONSTANTINO, denota-se dos autos que não há procuração outorgada pela requerida T. C. DE PAULA CONSTANTINO para representá-la, entretanto, não há, também, elementos probatórios suficientes a comprovar a existência de sociedade de fato entre os requeridos. A parca documentação apresentada demonstra que o requerido atuou como interveniente garantidor na escritura pública de contrato particular de abertura de crédito rotativo com garantias hipotecária e fidejussória colacionada ao ID 41470962. Além disso, a testemunha inquirida em juízo sequer mencionou o nome do requerido Afonso, apenas narrou fatos em relação ao requerido Miguelangelo. Diante disso, vislumbro que a relação negocial existente entre o requerido MIGUELANGELO DE BARROS BASSO e a empresa individual T. C. DE PAULA CONSTANTINO é de mandante e mandatário e não de sócios, bem como que não há elementos suficientes a comprovar a existência de sociedade com o requerido AFONSO SILVEIRA CONSTANTINO, razão pela qual a improcedência da presente ação é medida imperiosa. Ante o exposto, nos termos do artigo 487, inciso I, do CPC, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos iniciais e, por conseguinte, declaro EXTINTO o presente feito COM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. (...)" – sic ID 269249136 (ID de origem 174386364). Assim, diante das razões do apelo, cinge-se a controvérsia em averiguar se resta caracterizada a existência de sociedade de fato e se viável a aplicação da multa em sede de embargos declaratórios. As provas carreadas aos autos não permitem concluir pela existência de sociedade de fato entre os Apelados, em que pese a revelia destes. Isso porque, ao contrário do que argumenta a Apelante, no caso em exame a revelia não produz o efeito mencionado no artigo 344 do Código de Processo Civil, qual seja, de presunção de veracidade das alegações de fato formuladas na inicial, pois as provas constantes dos autos estão em contradição às referidas alegações (inciso IV, do artigo 345 do Código de Processo Civil). Conforme Instrumentos de Procuração Pública acostados em ID 269249268, o apelado Miguelangelo possuía amplos poderes para representar a empresa apelada T. C. de Paula Constatino, seja perante terceiros e até mesmo o Fisco, inclusive firmar contratos e assinar documentos. Nesse passo, como bem pontuado pelo juízo sentenciante, se verifica que o apelado Miguelangelo atuava na condição de mandatário, de modo que para caracterizar a suposta existência de sociedade entre os Apelados exige-se provas contundentes do vínculo societário, sobretudo quando a Apelante visa impor aos supostos sócios ocultos repercussões econômicas. Sobre a temática, a doutrina ensina que: "(...) Perante terceiros, os sócios somente podem provar a existência da sociedade por escrito, nos termos do art. 987 do Código Civil atual. Isso não significa, evidentemente, que os sócios possam opor eventuais cláusulas contratuais aos terceiros, se o contrato não estiver regularmente registrado, nos termos do art. 1.154 do mesmo diploma legal. Em compensação, os terceiros podem provar a sociedade de qualquer modo, como dispõe a parte final do aludido art. 987, inclusive por indícios que levem à presunção da existência daquela. Relembre-se, contudo, da advertência de Carvalho de Mendonça: a prova da sociedade irregular deve ser a mais completa possível e “formada com muita segurança, mormente quando se trata de arrastar á falência alguem que se tem como socio”. Advertia ele que sobre os indícios enumerados no art. 305 do Código Comercial deveria prevalecer sempre a verdade dos fatos. Vale dizer: para impelir alguém à falência, deverá ser provada, ainda que por qualquer meio, a contribuição com bens ou serviços para o exercício de atividade empresarial comum com outro ou outros sócios, bem como a partilha de resultados (lucros e perdas) entre eles – elementos estruturais do contrato de sociedade, em face do que dispõe o art. 981 do Código Civil." (Neto, 2023)” (NETO, Alfredo; FRANÇA, Erasmo. 1.1. Prova da Existência da Sociedade In: NETO, Alfredo; FRANÇA, Erasmo. Tratado de Direito Empresarial - Vol. II - Ed. 2023. São Paulo (SP): Editora Revista dos Tribunais. 2023). Ocorre que, embora o esforço argumentativo da Apelante, as provas coligidas ao feito se revelam frágeis à configuração do vínculo societário, circunstância que impede o reconhecimento almejado. Os documentos de ID 269249278, ID 269249279, ID 269249281 e ID 2692492982, que se referem a reportagens e informações da rede social Linkedin, não possuem qualquer passagem que permite concluir que o apelado Miguelangelo é sócio da empresa demandada, ou sequer faz presumir a suposta sociedade. Além disso, o depoimento da testemunha Antonio Batista Lodi Filho (gravação audiovisual de ID 269249134) menciona que o apelado Miguelangelo “sempre trabalhou em nome da T. C. de Paula” – sic - e intermediava preço de produtos. Tais informações, ao invés de indicar a existência de sociedade, apenas confirma a atuação como mandatário, em total acordo ao que prevê o instrumento procuratório supramencionado. Inclusive, este é exatamente o conceito do mandato, previsto no artigo 653 do Código Civil, in verbis: Art. 653. Opera-se o mandato quando alguém recebe de outrem poderes para, em seu nome, praticar atos ou administrar interesses. A procuração é o instrumento do mandato. Importa registrar que a oitiva da referida testemunha, em momento algum, menciona que os Apelados atuavam em conjunto, na consecução de objetivo comum, muito menos a forma de atuação de cada um dos sócios e eventual distribuição de lucros. Aliás, não há no conjunto probatório provas que atestem as questões atinentes ao direito societário, se limitando a Apelante em subsidiar a demanda ao instrumento procuratório acima destacado e à Escritura Pública de Contrato Particular de Abertura de Crédito Rotativo com Garantias Hipotecária e Fidejussória (ID 269249254). Sobreleva destacar que o único documento constante nos autos para comprovar o suposto vínculo societário do apelado Afonso é a Escritura Pública acima, a qual, desacompanhada de outros elementos, não tem o condão de comprovar a existência de sociedade empresarial. Frisa-se, como consignado na sentença, que a testemunha “inquirida em juízo sequer mencionou o nome do requerido Afonso, apenas narrou fatos em relação ao requerido Miguelangelo” – sic ID 269249135. Prescreve o artigo 987 do Código Civil que: Art. 987. Os sócios, nas relações entre si ou com terceiros, somente por escrito podem provar a existência da sociedade, mas os terceiros podem prová-la de qualquer modo. Embora haja possibilidade da Apelante provar a existência da sociedade por qualquer meio de prova, os elementos probatórios não se revelam suficientes, portanto, à toda evidência, a Apelante não se desincumbiu do seu ônus, a teor do artigo 373, inciso I, do Código de Processo Civil. O fato do apelado Miguelangelo atuar em nome da empresa, não conduz, por si só, ao reconhecimento de sociedade de fato. De igual modo, o fato do apelado Afonso ter se qualificado como sócio em um documento e se responsabilizado como garantidor não conduz à veracidade dos fatos. Nesse contexto, evidencia-se ser descabido o reconhecimento da existência de sociedade de fato no caso, pois não há provas da contribuição dos Apelados com bens ou serviços para o exercício de atividade empresarial comum com outro ou outros sócio, tampouco que os Apelados exerciam conjuntamente atividade econômica com finalidade lucrativa. Nesse sentido: APELAÇÕES CÍVEIS – AÇÃO DE RECONHECIMENO E DISSOLUÇÃO DE SOCIEDADE COMERCIAL DE FATO COM PARTILHA DE BENS – PRELIMINAR – NÃO CONHECIMENTO DE RECURSO – AUSÊNCIA DE RATIFICAÇÃO DE APELAÇÃO APÓS JULGAMENTO DE EMBARGOS DE DECLARAÇÃO – DESNECESSIDADE – REJEITADA – MÉRITO – SOCIEDADE COMERCIAL DE FATO – NÃO COMPROVAÇÃO - AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA CONSTITUIÇÃO DE SOCIEDADE EMPRESÁRIA E EFETIVA EXISTÊNCIA DA SOCIEDADE DE FATO - ÔNUS DA PROVA – AUTOR - NECESSÁRIA A COMUNHÃO DE ESFORÇOS ORGANIZADA PARA A CONSECUÇÃO DE OBJETIVO COMUM - PROVAS DOCUMENTAL E TESTEMUNHAL - NÃO COMPROVAÇÃO - IMPROCEDÊNCIA MANTIDA – SOCIEDADE RECONHECIDA ENTRE PESSOAS FÍSICAS RELATIVO A CAMINHÃO DE FRETE – RATEIO DE DESPESAS E CUSTOS E LUCROS OBTIDOS – COMPENSAÇÃO COM DÉBITOS E CRÉDITOS - IMPUGNAÇÃO GENÉRICA AOS DOCUMENTOS JUNTADOS - AUSÊNCIA DE QUALQUER INDÍCIO A MACULAR A VERACIDADE DOS DOCUMENTOS – LUCROS CESSANTES NÃO COMPROVADOS - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - VALOR IRRISÓRIO – IMPOSSIBILIDADE DE ARBITRAMENTO SOBRE O VALOR DA CONDENAÇÃO – VALOR ÍNFIMO – RECURSOS DESPROVIDOS. (...). Para a constituição de uma sociedade empresarial é necessária a convergência de interesses entre as partes com interesse comum. Tal intenção não está comprovada nos autos. Não há que se falar em reconhecimento de sociedade comercial, tampouco dissolução de tal sociedade, pois que as partes não convergiram para constituição de uma sociedade empresarial, já que nenhum ato teve a participação da empresa mencionada. Assim, para comprovação de tal alegação, necessário se mostraria a apresentação de documentos que atestem ou indiquem quem são os sócios, o objetivo social da empresa, a forma de atuação de cada um dos sócios e a distribuição dos lucros, questões estas atinentes ao direito societário. É ônus do autor, nos termos do art. 333, I do CPC, comprovar a existência da sociedade de fato havida entre as partes. (...) (TJMT - N.U 0018273-58.2011.8.11.0002, , NILZA MARIA PÔSSAS DE CARVALHO, PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO, Julgado em 16/05/2017, Publicado no DJE 23/05/2017) – destaquei. AÇÃO DE COBRANÇA - PARCERIA - SOCIEDADE DE FATO - ÔNUS DA PROVA. É do autor o ônus de fazer prova dos fatos constitutivos de seu direito. Não tendo o autor desincumbido de seu ônus probatório, deixando de demonstrar a existência da alegada sociedade de fato, mas somente a prestação de um serviço específico pelo qual recebeu, impõe-se a improcedência do pedido de cobrança. (TJMG - Apelação Cível 1.0118.12.002112-6/001, Relator (a): Des.(a) Estevão Lucchesi , 14ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 01/03/2018, publicação da sumula em 09/ 03/ 2018) – destaquei. AÇÃO DE RECONHECIMENTO, DISSOLUÇÃO E LIQUIDAÇÃO DE SOCIEDADE DE FATO CUMULADA COM APURAÇÃO DE HAVERES. AUSÊNCIA DE PROVA DA SOCIEDADE DE FATO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA MANTIDA. HONORÁRIOS RECURSAIS . I. Para a existência de uma sociedade empresarial é necessária a comunhão de esforços organizada para a consecução de objetivo comum, a fim de auferir lucro, nos termos do art. 981, do Código Civil. Entretanto, a ausência de um contrato social devidamente registrado na Junta Comercial não impede o reconhecimento da existência da chamada sociedade de fato (ou comum) . II. Entretanto, no caso concreto, não restou comprovada a existência da alegada sociedade de fato. Nessa linha, em que pese tenham sido juntados com a petição inicial os supostos recibos referentes a pró-labore auferidos pelo autor, o próprio, em seu depoimento pessoal, foi claro ao afirmar que nunca recebeu pró-labore, mas somente uma quantia em dinheiro diretamente do requerido. III . Dessa forma, não há nos autos qualquer documento que corrobore as alegações do demandante de que efetivamente tenha participado da sociedade como sócio ou que o réu teria dado a ele o veículo Voyage a título de entrada para a aquisição da sua quota parte. IV. Assim, não comprovada a alegada sociedade de fato mantida entre as partes, deve ser mantida a sentença de improcedência da ação. Ônus da prova que incumbia ao demandante, nos termos do art . 373, I, do CPC, do qual não se desincumbiu. V. De acordo com o art. 85, § 11, do CPC, ao julgar recurso, o Tribunal deve majorar os honorários fixados anteriormente ao advogado vencedor, observados os limites estabelecidos nos §§ 2º e 3º para a fase de conhecimento . APELAÇÃO DESPROVIDA. (TJ-RS - AC: 70083603803 RS, Relator.: Jorge André Pereira Gailhard, Data de Julgamento: 29/04/2020, Quinta Câmara Cível, Data de Publicação: 25/09/2020) – destaquei. Logo, não comprovada a suposta sociedade de fato mantida entre os Apelados, se revela inviável a modificação da sentença que improcedeu o pleito da exordial. A respeito da multa aplicada pelo juízo a quo ao rejeitar os embargos declaratórios (ID 269249139), com fulcro no artigo 1.026, §2º, do Código de Processo Civil, razão assiste à Apelante. Isso porque, os aclaratórios visavam, de fato, suprir omissão na sentença combatida, pois o juízo sentenciante não havia se manifestado sobre a aplicação dos efeitos da revelia. Portanto, sem dúvidas, a Apelante utilizou-se do meio processual adequado à hipótese, o que afasta a possibilidade de reconhecer o recurso como meramente protelatório, mormente quando o prosseguimento célere do processo é de interesse da própria recorrente, que é o caso dos autos, haja vista a revelia da parte contrária. Convém consignar que a simples interposição de recurso pela parte, ainda que, no mérito, possa não ter razão, não pode, por si só, fundamentar a aplicação de penalidade, como fez o juízo de primeiro grau, sob pena de desvirtuamento do devido processo legal. A propósito: APELAÇÃO - AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DO DÉBITO C/C DANOS MORAIS - CESSÃO DE CRÉDITO - FALTA DE NOTIFICAÇÃO AO DEVEDOR - ATO QUE NÃO O DESOBRIGA DO CUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO E NEM IMPEDE O CREDOR DE PROCEDR COM OS ATOS PRÓPRIOS À BUSCA DO SEU CRÉDITO - AFASTAMENTO DA MULTA E DO ALEGADO CARÁTER PROTELATÓRIO EM EMBARGOS DE DECLARAÇÃO, PORQUANTO FORAM OPOSTOS EM RAZÃO DA OMISSÃO REALMENTE VERIFICADA NA SENTENÇA - APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA - SENTENÇA REFORMADA EM PARTE. (...). A oposição de Embargos de Declaração contra a sentença, em razão da presença de um ou de todos os vícios descritos pelo art. 1.022, do novo CPC, afasta a conclusão de se tratar de Embargos de Declaração protelatórios. (TJ-MT, Apelação nº 0037011-06.2013.8.11.0041, Relator: DES. GUIOMAR TEODORO BORGES, QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO, Julgado em 22/08/2018, Publicado no DJE 27/08/2018) – destaquei. Dessa forma, a penalidade aplicada pelo juízo a quo deve ser decotada. Diante do exposto, conheço do Recurso de Apelação e dou-lhe parcial provimento tão somente para afastar a multa aplicada em sede de Embargos de Declaração (ID 269249139). Em razão do resultado do julgamento, e considerando que não houve arbitramento na origem, descabida a majoração de honorários sucumbenciais (art. 85, §11, do Código de Processo Civil). É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 25/06/2025

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Processo nº 1002866-30.2020.8.11.0050

ID: 312571413

Tribunal: TJMT Órgão: Segunda Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1002866-30.2020.8.11.0050

Data de Disponibilização: 01/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

AFONSO SILVEIRA CONSTANTINO MIGUELANGELO DE BARROS BASSO T. C. DE PAULA CONSTANTINO - EPP TELMA CORREA DE PAULA CONSTANTINO

Acórdão

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1002866-30.2020.8.11.0050 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Em comum / De fato] Relator: Des(a). TATIANE CO… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1002866-30.2020.8.11.0050 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Em comum / De fato] Relator: Des(a). TATIANE COLOMBO Turma Julgadora: [DES(A). TATIANE COLOMBO, DES(A). MARIA HELENA GARGAGLIONE POVOAS, DES(A). MARILSEN ANDRADE ADDARIO] Parte(s): [VITTA SEEDS COMERCIAL AGRICOLA LTDA - CNPJ: 33.484.035/0001-00 (APELANTE), HERMES BEZERRA DA SILVA NETO - CPF: 722.385.341-72 (ADVOGADO), CARLOS EDUARDO SILVA E SOUZA - CPF: 899.546.961-72 (ADVOGADO), T. C. DE PAULA CONSTANTINO - EPP - CNPJ: 13.817.300/0001-00 (APELADO), TELMA CORREA DE PAULA CONSTANTINO - CPF: 301.881.561-00 (APELADO), AFONSO SILVEIRA CONSTANTINO - CPF: 270.049.531-49 (APELADO), MIGUELANGELO DE BARROS BASSO - CPF: 119.876.248-90 (APELADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). MARIA HELENA GARGAGLIONE POVOAS, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. UNANIME. E M E N T A APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE EXISTÊNCIA DE SOCIEDADE DE FATO. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS PROBATÓRIOS APTOS À CONFIGURAÇÃO DE VÍNCULO SOCIETÁRIO. EXISTÊNCIA DE MANDATO COM PODERES AMPLOS. ÔNUS DA PROVA DO AUTOR. NÃO CUMPRIMENTO. IMPROCEDÊNCIA MANTIDA. MULTA EM EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. DESCABIMENTO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I. Caso em exame Apelação cível interposta contra sentença que julgou improcedente a Ação Declaratória de Existência de Sociedade de Fato, ajuizada com a finalidade de reconhecer relação societária entre os Apelados, imputando-lhes os efeitos jurídicos e econômicos correspondentes. A sentença concluiu pela inexistência de vínculo societário, reconhecendo, em relação ao Apelado Miguelangelo, a existência de mandato regularmente constituído, e, quanto ao Apelado Afonso, a ausência de qualquer prova apta a indicar sua atuação como sócio. Ainda, aplicou multa por embargos de declaração considerados protelatórios. II. Questão em discussão 2. A controvérsia cinge-se a duas questões centrais: (i) verificar se restou caracterizada sociedade de fato entre os Apelados, sobretudo diante da revelia dos Apelados; (ii) averiguar a legalidade da multa aplicada em sede de embargos de declaração. III. Razões de decidir 3. A revelia não induz presunção de veracidade das alegações iniciais, nos termos do art. 345, IV, do CPC, diante da existência de prova em sentido contrário. 4. Os documentos apresentados demonstram que o apelado Miguelangelo atuava como mandatário da empresa, munido de procuração pública com amplos poderes de representação, nos termos do art. 653 do CC. 5. Além disso, não há nos autos elementos que indiquem a constituição de sociedade de fato com o Apelado Afonso, tampouco a existência de vínculo societário entre os três demandados, inexistindo prova de comunhão de esforços, partilha de lucros ou contribuição para atividade empresarial conjunta, nos moldes do art. 981 do CC. 6. A documentação probatória se mostra insuficiente para infirmar a natureza de representação por mandato e comprovar a formação de sociedade de fato, atraindo a incidência do art. 373, I, do CPC. 7. Assim, inexistindo provas contundentes da existência de sociedade de fato, descabida a modificação da sentença de improcedência do pleito da inicial. 8. Por sua vez, a aplicação de multa em sede de embargos declaratórios não se sustenta, pois o recurso buscava suprir omissão sobre os efeitos da revelia, sendo inadequado qualificá-lo como protelatório. A penalidade configura afronta ao devido processo legal. IV. Dispositivo e tese 9. Recurso parcialmente provido, apenas para afastar a multa aplicada nos embargos de declaração. R E L A T Ó R I O Egrégia Câmara. Trata-se de Recurso de Apelação Cível interposto por VITTA SEEDS COMERCIAL AGRÍCOLA LTDA em face da sentença proferida pelo juízo da 1ª Vara da Comarca de Campo Novo do Parecis-MT, que julgou improcedente os pedidos da inicial da Ação Declaratória de Existência de Sociedade de Fato ajuizada pela ora Apelante em desfavor de T. C. DE PAULA CONSTANTINO – EPP, TELMA CORREA DE PAULA CONSTANTINO, AFONSO SILVEIRA CONSTANTINO e MIGUELANGELO DE BARROS BASSO. Em suas razões (ID 269249140), a Apelante sustenta que a sentença reconheceu a revelia dos Apelados, no entanto, não aplicou os efeitos previstos no artigo 344 do Código de Processo Civil. Ressalta que, em caso de revelia, presumem-se verdadeiros os fatos alegados na inicial e que o caso não se enquadra em nenhuma das exceções estabelecidas no artigo 345 do Código de Processo Civil. Argumenta que a não aplicação dos efeitos da revelia viola o princípio da confiança. Alega que a sentença ignorou documentos relevantes acostados ao processo, como a escritura pública em que o apelado Afonso assina como sócio da empresa apelada T. C. de Paula Constantivo e a testemunha ouvida na audiência instrutória, que confirmou que o apelado Miguelangelo não atuava como mero mandatário, mas exercia funções típicas de um sócio. Frisa que a relação estabelecida entre as partes transcende o mero mandato e que “a sociedade de fato se configura quando duas ou mais pessoas exercem conjuntamente atividade econômica com finalidade lucrativa, independentemente de formalização contratual” – sic. Sustenta que a multa aplicada pelo juízo a quo ao afastar os embargos declaratórios se mostra indevida, haja vista que o recurso não tinha condão protelatório, mas visava “objetivo legítimo de buscar o esclarecimento de pontos essenciais da decisão, indispensáveis à adequada prestação jurisdicional” - sic. Assim, requer o provimento do apelo para reformar a sentença, reconhecendo a sociedade de fato entre os Apelados, com a consequente procedência do pedido inicial. Requer, ainda, que seja afastada a multa aplicada pelo juízo de primeiro grau. Sem contrarrazões. É o relatório. V O T O R E L A T O R Egrégia Câmara. Cuida-se de Ação Declaratória de Existência de Sociedade de Fato em que a Apelante sustenta, na inicial, que firmou negócio jurídico de compra e venda de produtos agrícolas com a empresa apelada T. C. de Paula Constatino – EPP, através do apelado Miguelangelo, o qual age como se sócio fosse da referida pessoa jurídica, embora não conste no quadro social. Argumenta que o apelado Afonso também "assina como representante/sócio/proprietário" – sic - da empresa apelada e "que esta permanece inscrita perante a Junta Comercial do Estado de Mato Grosso como sendo empresária individual" – sic. Ressalta que está evidenciada verdadeira sociedade de fato entre os apelados Telma, Afonso e Miguelangelo, em flagrante abuso de direito, em virtude da ausência de alteração societária para que os sócios Afonso e Miguelangelo sofra "possíveis repercursões econômicas negativas em desfavor dos credores diversos" – sic. Os Apelados foram citados e não apresentaram contestação, razão pela qual houve a declaração de revelia. Após a instrução processual, o juízo a quo proferiu sentença, improcedendo o pleito inicial, nos seguintes termos: "(...) Dessa forma, tratando-se da mesma pessoa, não é possível a constituição de sociedade com terceiros, visto que se trata de empresa individual, todavia, caso venha a admitir sócios, o empresário individual poderá solicitar ao Registro Público de Empresas Mercantis a transformação de seu registro de empresário para registro de sociedade empresária, conforme determina o artigo 968, § 3º, do Código Civil. In casu, verifica-se que, malgrado o requerido MIGUELANGELO DE BARROS BASSO tenha realizado negócios jurídicos em nome da empresa individual T. C. DE PAULA CONSTANTINO, fato é que possui procuração reconhecida em cartório outorgando amplos poderes para que possa representá-la perante a sociedade, especialmente no ramo mercantil. O Código Civil permite a representação por procuração, conforme se extrai do artigo 653 e seguintes. Assim, ao que parece, a relação havida entre os requeridos não é de sociedade, mas, sim, de mandato, tendo a empresa individual T. C. DE PAULA CONSTANTINO, representada pela pessoa natural TELMA CORREA DE PAULA CONSTANTINO, como mandante, ao passo que o requerido MIGUELANGELO DE BARROS BASSO se caracteriza como mandatário, de modo que não constato nenhuma irregularidade praticada pelos demandados. Registra-se que, nos termos do artigo 662 do Código Civil, os atos praticados por quem não tenha mandato, ou o tenha sem poderes suficientes, são ineficazes em relação àquele em cujo nome foram praticados, salvo se este os ratificar, cabendo à parte que se sentir lesada, ajuizar a ação cabível. Além disso, o artigo 663 do Código Civil prevê que “sempre que o mandatário estipular negócios expressamente em nome do mandante, será este o único responsável; ficará, porém, o mandatário pessoalmente obrigado, se agir no seu próprio nome, ainda que o negócio seja de conta do mandante”. Dessa maneira, ainda que o requerido Miguelangelo atue como mandatário da empresa requerida, é esta quem responderá pelas obrigações inerentes aos eventuais negócios jurídicos firmados, não havendo, portanto, quaisquer prejuízos aos terceiros e, neste caso, ao requerente. Caso haja, conforme dito alhures, caberá àquele que se sentir prejudicado, ajuizar a ação competente para repará-los. Ademais, em relação ao requerido AFONSO SILVEIRA CONSTANTINO, denota-se dos autos que não há procuração outorgada pela requerida T. C. DE PAULA CONSTANTINO para representá-la, entretanto, não há, também, elementos probatórios suficientes a comprovar a existência de sociedade de fato entre os requeridos. A parca documentação apresentada demonstra que o requerido atuou como interveniente garantidor na escritura pública de contrato particular de abertura de crédito rotativo com garantias hipotecária e fidejussória colacionada ao ID 41470962. Além disso, a testemunha inquirida em juízo sequer mencionou o nome do requerido Afonso, apenas narrou fatos em relação ao requerido Miguelangelo. Diante disso, vislumbro que a relação negocial existente entre o requerido MIGUELANGELO DE BARROS BASSO e a empresa individual T. C. DE PAULA CONSTANTINO é de mandante e mandatário e não de sócios, bem como que não há elementos suficientes a comprovar a existência de sociedade com o requerido AFONSO SILVEIRA CONSTANTINO, razão pela qual a improcedência da presente ação é medida imperiosa. Ante o exposto, nos termos do artigo 487, inciso I, do CPC, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos iniciais e, por conseguinte, declaro EXTINTO o presente feito COM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. (...)" – sic ID 269249136 (ID de origem 174386364). Assim, diante das razões do apelo, cinge-se a controvérsia em averiguar se resta caracterizada a existência de sociedade de fato e se viável a aplicação da multa em sede de embargos declaratórios. As provas carreadas aos autos não permitem concluir pela existência de sociedade de fato entre os Apelados, em que pese a revelia destes. Isso porque, ao contrário do que argumenta a Apelante, no caso em exame a revelia não produz o efeito mencionado no artigo 344 do Código de Processo Civil, qual seja, de presunção de veracidade das alegações de fato formuladas na inicial, pois as provas constantes dos autos estão em contradição às referidas alegações (inciso IV, do artigo 345 do Código de Processo Civil). Conforme Instrumentos de Procuração Pública acostados em ID 269249268, o apelado Miguelangelo possuía amplos poderes para representar a empresa apelada T. C. de Paula Constatino, seja perante terceiros e até mesmo o Fisco, inclusive firmar contratos e assinar documentos. Nesse passo, como bem pontuado pelo juízo sentenciante, se verifica que o apelado Miguelangelo atuava na condição de mandatário, de modo que para caracterizar a suposta existência de sociedade entre os Apelados exige-se provas contundentes do vínculo societário, sobretudo quando a Apelante visa impor aos supostos sócios ocultos repercussões econômicas. Sobre a temática, a doutrina ensina que: "(...) Perante terceiros, os sócios somente podem provar a existência da sociedade por escrito, nos termos do art. 987 do Código Civil atual. Isso não significa, evidentemente, que os sócios possam opor eventuais cláusulas contratuais aos terceiros, se o contrato não estiver regularmente registrado, nos termos do art. 1.154 do mesmo diploma legal. Em compensação, os terceiros podem provar a sociedade de qualquer modo, como dispõe a parte final do aludido art. 987, inclusive por indícios que levem à presunção da existência daquela. Relembre-se, contudo, da advertência de Carvalho de Mendonça: a prova da sociedade irregular deve ser a mais completa possível e “formada com muita segurança, mormente quando se trata de arrastar á falência alguem que se tem como socio”. Advertia ele que sobre os indícios enumerados no art. 305 do Código Comercial deveria prevalecer sempre a verdade dos fatos. Vale dizer: para impelir alguém à falência, deverá ser provada, ainda que por qualquer meio, a contribuição com bens ou serviços para o exercício de atividade empresarial comum com outro ou outros sócios, bem como a partilha de resultados (lucros e perdas) entre eles – elementos estruturais do contrato de sociedade, em face do que dispõe o art. 981 do Código Civil." (Neto, 2023)” (NETO, Alfredo; FRANÇA, Erasmo. 1.1. Prova da Existência da Sociedade In: NETO, Alfredo; FRANÇA, Erasmo. Tratado de Direito Empresarial - Vol. II - Ed. 2023. São Paulo (SP): Editora Revista dos Tribunais. 2023). Ocorre que, embora o esforço argumentativo da Apelante, as provas coligidas ao feito se revelam frágeis à configuração do vínculo societário, circunstância que impede o reconhecimento almejado. Os documentos de ID 269249278, ID 269249279, ID 269249281 e ID 2692492982, que se referem a reportagens e informações da rede social Linkedin, não possuem qualquer passagem que permite concluir que o apelado Miguelangelo é sócio da empresa demandada, ou sequer faz presumir a suposta sociedade. Além disso, o depoimento da testemunha Antonio Batista Lodi Filho (gravação audiovisual de ID 269249134) menciona que o apelado Miguelangelo “sempre trabalhou em nome da T. C. de Paula” – sic - e intermediava preço de produtos. Tais informações, ao invés de indicar a existência de sociedade, apenas confirma a atuação como mandatário, em total acordo ao que prevê o instrumento procuratório supramencionado. Inclusive, este é exatamente o conceito do mandato, previsto no artigo 653 do Código Civil, in verbis: Art. 653. Opera-se o mandato quando alguém recebe de outrem poderes para, em seu nome, praticar atos ou administrar interesses. A procuração é o instrumento do mandato. Importa registrar que a oitiva da referida testemunha, em momento algum, menciona que os Apelados atuavam em conjunto, na consecução de objetivo comum, muito menos a forma de atuação de cada um dos sócios e eventual distribuição de lucros. Aliás, não há no conjunto probatório provas que atestem as questões atinentes ao direito societário, se limitando a Apelante em subsidiar a demanda ao instrumento procuratório acima destacado e à Escritura Pública de Contrato Particular de Abertura de Crédito Rotativo com Garantias Hipotecária e Fidejussória (ID 269249254). Sobreleva destacar que o único documento constante nos autos para comprovar o suposto vínculo societário do apelado Afonso é a Escritura Pública acima, a qual, desacompanhada de outros elementos, não tem o condão de comprovar a existência de sociedade empresarial. Frisa-se, como consignado na sentença, que a testemunha “inquirida em juízo sequer mencionou o nome do requerido Afonso, apenas narrou fatos em relação ao requerido Miguelangelo” – sic ID 269249135. Prescreve o artigo 987 do Código Civil que: Art. 987. Os sócios, nas relações entre si ou com terceiros, somente por escrito podem provar a existência da sociedade, mas os terceiros podem prová-la de qualquer modo. Embora haja possibilidade da Apelante provar a existência da sociedade por qualquer meio de prova, os elementos probatórios não se revelam suficientes, portanto, à toda evidência, a Apelante não se desincumbiu do seu ônus, a teor do artigo 373, inciso I, do Código de Processo Civil. O fato do apelado Miguelangelo atuar em nome da empresa, não conduz, por si só, ao reconhecimento de sociedade de fato. De igual modo, o fato do apelado Afonso ter se qualificado como sócio em um documento e se responsabilizado como garantidor não conduz à veracidade dos fatos. Nesse contexto, evidencia-se ser descabido o reconhecimento da existência de sociedade de fato no caso, pois não há provas da contribuição dos Apelados com bens ou serviços para o exercício de atividade empresarial comum com outro ou outros sócio, tampouco que os Apelados exerciam conjuntamente atividade econômica com finalidade lucrativa. Nesse sentido: APELAÇÕES CÍVEIS – AÇÃO DE RECONHECIMENO E DISSOLUÇÃO DE SOCIEDADE COMERCIAL DE FATO COM PARTILHA DE BENS – PRELIMINAR – NÃO CONHECIMENTO DE RECURSO – AUSÊNCIA DE RATIFICAÇÃO DE APELAÇÃO APÓS JULGAMENTO DE EMBARGOS DE DECLARAÇÃO – DESNECESSIDADE – REJEITADA – MÉRITO – SOCIEDADE COMERCIAL DE FATO – NÃO COMPROVAÇÃO - AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA CONSTITUIÇÃO DE SOCIEDADE EMPRESÁRIA E EFETIVA EXISTÊNCIA DA SOCIEDADE DE FATO - ÔNUS DA PROVA – AUTOR - NECESSÁRIA A COMUNHÃO DE ESFORÇOS ORGANIZADA PARA A CONSECUÇÃO DE OBJETIVO COMUM - PROVAS DOCUMENTAL E TESTEMUNHAL - NÃO COMPROVAÇÃO - IMPROCEDÊNCIA MANTIDA – SOCIEDADE RECONHECIDA ENTRE PESSOAS FÍSICAS RELATIVO A CAMINHÃO DE FRETE – RATEIO DE DESPESAS E CUSTOS E LUCROS OBTIDOS – COMPENSAÇÃO COM DÉBITOS E CRÉDITOS - IMPUGNAÇÃO GENÉRICA AOS DOCUMENTOS JUNTADOS - AUSÊNCIA DE QUALQUER INDÍCIO A MACULAR A VERACIDADE DOS DOCUMENTOS – LUCROS CESSANTES NÃO COMPROVADOS - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - VALOR IRRISÓRIO – IMPOSSIBILIDADE DE ARBITRAMENTO SOBRE O VALOR DA CONDENAÇÃO – VALOR ÍNFIMO – RECURSOS DESPROVIDOS. (...). Para a constituição de uma sociedade empresarial é necessária a convergência de interesses entre as partes com interesse comum. Tal intenção não está comprovada nos autos. Não há que se falar em reconhecimento de sociedade comercial, tampouco dissolução de tal sociedade, pois que as partes não convergiram para constituição de uma sociedade empresarial, já que nenhum ato teve a participação da empresa mencionada. Assim, para comprovação de tal alegação, necessário se mostraria a apresentação de documentos que atestem ou indiquem quem são os sócios, o objetivo social da empresa, a forma de atuação de cada um dos sócios e a distribuição dos lucros, questões estas atinentes ao direito societário. É ônus do autor, nos termos do art. 333, I do CPC, comprovar a existência da sociedade de fato havida entre as partes. (...) (TJMT - N.U 0018273-58.2011.8.11.0002, , NILZA MARIA PÔSSAS DE CARVALHO, PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO, Julgado em 16/05/2017, Publicado no DJE 23/05/2017) – destaquei. AÇÃO DE COBRANÇA - PARCERIA - SOCIEDADE DE FATO - ÔNUS DA PROVA. É do autor o ônus de fazer prova dos fatos constitutivos de seu direito. Não tendo o autor desincumbido de seu ônus probatório, deixando de demonstrar a existência da alegada sociedade de fato, mas somente a prestação de um serviço específico pelo qual recebeu, impõe-se a improcedência do pedido de cobrança. (TJMG - Apelação Cível 1.0118.12.002112-6/001, Relator (a): Des.(a) Estevão Lucchesi , 14ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 01/03/2018, publicação da sumula em 09/ 03/ 2018) – destaquei. AÇÃO DE RECONHECIMENTO, DISSOLUÇÃO E LIQUIDAÇÃO DE SOCIEDADE DE FATO CUMULADA COM APURAÇÃO DE HAVERES. AUSÊNCIA DE PROVA DA SOCIEDADE DE FATO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA MANTIDA. HONORÁRIOS RECURSAIS . I. Para a existência de uma sociedade empresarial é necessária a comunhão de esforços organizada para a consecução de objetivo comum, a fim de auferir lucro, nos termos do art. 981, do Código Civil. Entretanto, a ausência de um contrato social devidamente registrado na Junta Comercial não impede o reconhecimento da existência da chamada sociedade de fato (ou comum) . II. Entretanto, no caso concreto, não restou comprovada a existência da alegada sociedade de fato. Nessa linha, em que pese tenham sido juntados com a petição inicial os supostos recibos referentes a pró-labore auferidos pelo autor, o próprio, em seu depoimento pessoal, foi claro ao afirmar que nunca recebeu pró-labore, mas somente uma quantia em dinheiro diretamente do requerido. III . Dessa forma, não há nos autos qualquer documento que corrobore as alegações do demandante de que efetivamente tenha participado da sociedade como sócio ou que o réu teria dado a ele o veículo Voyage a título de entrada para a aquisição da sua quota parte. IV. Assim, não comprovada a alegada sociedade de fato mantida entre as partes, deve ser mantida a sentença de improcedência da ação. Ônus da prova que incumbia ao demandante, nos termos do art . 373, I, do CPC, do qual não se desincumbiu. V. De acordo com o art. 85, § 11, do CPC, ao julgar recurso, o Tribunal deve majorar os honorários fixados anteriormente ao advogado vencedor, observados os limites estabelecidos nos §§ 2º e 3º para a fase de conhecimento . APELAÇÃO DESPROVIDA. (TJ-RS - AC: 70083603803 RS, Relator.: Jorge André Pereira Gailhard, Data de Julgamento: 29/04/2020, Quinta Câmara Cível, Data de Publicação: 25/09/2020) – destaquei. Logo, não comprovada a suposta sociedade de fato mantida entre os Apelados, se revela inviável a modificação da sentença que improcedeu o pleito da exordial. A respeito da multa aplicada pelo juízo a quo ao rejeitar os embargos declaratórios (ID 269249139), com fulcro no artigo 1.026, §2º, do Código de Processo Civil, razão assiste à Apelante. Isso porque, os aclaratórios visavam, de fato, suprir omissão na sentença combatida, pois o juízo sentenciante não havia se manifestado sobre a aplicação dos efeitos da revelia. Portanto, sem dúvidas, a Apelante utilizou-se do meio processual adequado à hipótese, o que afasta a possibilidade de reconhecer o recurso como meramente protelatório, mormente quando o prosseguimento célere do processo é de interesse da própria recorrente, que é o caso dos autos, haja vista a revelia da parte contrária. Convém consignar que a simples interposição de recurso pela parte, ainda que, no mérito, possa não ter razão, não pode, por si só, fundamentar a aplicação de penalidade, como fez o juízo de primeiro grau, sob pena de desvirtuamento do devido processo legal. A propósito: APELAÇÃO - AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DO DÉBITO C/C DANOS MORAIS - CESSÃO DE CRÉDITO - FALTA DE NOTIFICAÇÃO AO DEVEDOR - ATO QUE NÃO O DESOBRIGA DO CUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO E NEM IMPEDE O CREDOR DE PROCEDR COM OS ATOS PRÓPRIOS À BUSCA DO SEU CRÉDITO - AFASTAMENTO DA MULTA E DO ALEGADO CARÁTER PROTELATÓRIO EM EMBARGOS DE DECLARAÇÃO, PORQUANTO FORAM OPOSTOS EM RAZÃO DA OMISSÃO REALMENTE VERIFICADA NA SENTENÇA - APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA - SENTENÇA REFORMADA EM PARTE. (...). A oposição de Embargos de Declaração contra a sentença, em razão da presença de um ou de todos os vícios descritos pelo art. 1.022, do novo CPC, afasta a conclusão de se tratar de Embargos de Declaração protelatórios. (TJ-MT, Apelação nº 0037011-06.2013.8.11.0041, Relator: DES. GUIOMAR TEODORO BORGES, QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO, Julgado em 22/08/2018, Publicado no DJE 27/08/2018) – destaquei. Dessa forma, a penalidade aplicada pelo juízo a quo deve ser decotada. Diante do exposto, conheço do Recurso de Apelação e dou-lhe parcial provimento tão somente para afastar a multa aplicada em sede de Embargos de Declaração (ID 269249139). Em razão do resultado do julgamento, e considerando que não houve arbitramento na origem, descabida a majoração de honorários sucumbenciais (art. 85, §11, do Código de Processo Civil). É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 25/06/2025

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Processo nº 1002474-44.2024.8.11.0020

ID: 336490558

Tribunal: TJMT Órgão: Quarta Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1002474-44.2024.8.11.0020

Data de Disponibilização: 28/07/2025

Polo Ativo:

BANCO DO BRASIL SA

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

EDUARDO JANZON AVALLONE NOGUEIRA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1002474-44.2024.8.11.0020 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Contratos Bancários] Relator: Des(a). SERLY MARC… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1002474-44.2024.8.11.0020 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Contratos Bancários] Relator: Des(a). SERLY MARCONDES ALVES Turma Julgadora: [DES(A). SERLY MARCONDES ALVES, DES(A). ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA, DES(A). RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO] Parte(s): [BELTSON DA COSTA ROCHA - CPF: 582.040.161-15 (APELADO), ANTONIO DE LIMA FERNANDES NETO - CPF: 972.058.771-72 (ADVOGADO), GENNARO REIS DA SILVA - CPF: 692.347.521-04 (ADVOGADO), BANCO DO BRASIL SA - CNPJ: 00.000.000/0001-91 (APELANTE), EDUARDO JANZON AVALLONE NOGUEIRA - CPF: 135.207.888-02 (ADVOGADO), BEVICRED INFORMACOES CADASTRAIS LTDA - ME - CNPJ: 07.452.085/0001-98 (APELANTE), EDUARDO DOS SANTOS BERG - CPF: 431.946.578-44 (ADVOGADO), RODRIGO APARECIDO SENO - CPF: 359.672.298-50 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: NAO PROVIDO, UNANIME E M E N T A DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. CONTRATOS BANCÁRIOS. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO CELEBRADO POR MEIO ELETRÔNICO. FRAUDE E VÍCIO DE CONSENTIMENTO CONSTATADOS. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO. CONFIGURADA. FORTUITO INTERNO. NULIDADE DOS CONTRATOS E RESTITUIÇÃO DOS VALORES DESCONTADOS. FORMA SIMPLES. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME Apelação cível interposta contra sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos em ação anulatória de débito cumulada com indenização por danos materiais e morais. A sentença declarou a inexistência/nulidade de seis contratos bancários firmados eletronicamente, reconheceu a ilegalidade e inexigibilidade dos respectivos descontos em proventos do autor e determinou a devolução simples dos valores indevidamente descontados, mantendo apenas os descontos relativos ao contrato não impugnado nº 157133757. O banco sustenta a validade dos contratos, a ausência de falha na prestação de serviço, a culpa exclusiva da vítima e a inexistência de nexo causal. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Há três questões em discussão: (i) definir se os contratos impugnados foram celebrados com vício de consentimento decorrente de fraude; (ii) estabelecer se houve falha na prestação de serviço por parte da instituição financeira, apta a gerar sua responsabilidade objetiva; (iii) determinar a validade da restituição simples dos valores descontados, com exclusão da repetição em dobro. III. RAZÕES DE DECIDIR A relação jurídica entre as partes é de consumo, submetida ao Código de Defesa do Consumidor, que prevê a responsabilidade objetiva do fornecedor por falha na prestação de serviços. A contratação eletrônica, ainda que formalmente válida por uso de senha e autenticação, exige consentimento livre e informado, cuja ausência compromete a validade do negócio jurídico. A análise do caso revela que o consumidor foi induzido a erro por terceiros que detinham informações bancárias sigilosas, evidenciando vício de consentimento nos contratos impugnados. A instituição financeira não comprovou a efetiva liberação dos valores contratados ao consumidor, elemento essencial para validar os contratos. As contratações sucessivas, em curto intervalo de tempo, sem contrapartida real e com aumento indevido dos descontos, configuram falha no dever de segurança e controle do banco. A fraude praticada constitui fortuito interno, risco inerente à atividade bancária, não sendo causa excludente de responsabilidade da instituição financeira. A restituição simples dos valores descontados indevidamente é devida, pois não há prova de má-fé ou conduta dolosa do banco que justifique a repetição em dobro. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso desprovido. Tese de julgamento: Configura vício de consentimento o contrato bancário eletrônico celebrado por consumidor induzido a erro por fraude baseada em informações sigilosas previamente vazadas. A instituição financeira responde objetivamente pelos danos decorrentes de falha na segurança do sistema, nos termos do art. 14 do CDC. A ausência de comprovação da efetiva liberação dos valores contratados invalida o negócio jurídico e impõe a restituição dos valores descontados. A devolução dos valores descontados de forma simples é adequada quando ausente prova de má-fé do credor. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, X; CDC, arts. 6º, III, IV e VIII, 14, §1º, e 42, parágrafo único; CC, arts. 104, 138 a 147. Jurisprudência relevante citada: STJ, Súmula 479. TJMT, Ap 1029504-30.2020.8.11.0041, Quarta Câmara de Direito Privado, Rel. Desa. Guiomar Teodoro Borges, j. 04/10/2023. TJMT, Ap 1002863-73.2022.8.11.0028, Quarta Câmara de Direito Privado, j. 24/08/2023. TJMT, Ap 1010195-43.2020.8.11.0002, Terceira Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Antônia Siqueira Gonçalves, j. 14/12/2022. TJMT, Ap 1002866-09.2023.8.11.0023, Quarta Câmara de Direito Privado, j. 11/09/2024. R E L A T Ó R I O RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL N. 1002474-44.2024.8.11.0020 BANCO DO BRASIL S/A X BELTSON DA COSTA ROCHA Eminentes pares: Trata-se de recurso de apelação cível, interposto por BANCO DO BRASIL S.A., com o fito de reformar a sentença, proferida pelo Juízo da 1ª Vara Cível de Alto Araguaia/MT, que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na ação anulatória de débito c/c indenização por danos materiais e morais com pedido de tutela de urgência, ajuizada por BELTSON DA COSTA ROCHA, declarando a inexistência/nulidade dos negócios jurídicos objeto da lide (contratos de nº 163407224, nº 165046464, nº 165728215, nº 166080404, nº 167186328 e nº 167636581), bem como a ilegalidade e inexigibilidade dos descontos efetuados diretamente em proventos da parte autora e decorrentes dos referidos contratos, condenando a parte requerida a devolver de forma simples os valores indevidamente descontados, com correção monetária e juros de mora a partir de cada desconto efetuado, observada a manutenção dos descontos referentes ao contrato não impugnado n° 157133757, no valor de R$ 1.555,27. Por conseguinte, condenou o banco ao pagamento das custas/despesas processuais e honorários advocatícios, estes arbitrados em 10% sobre o valor atualizado da condenação (art. 85, § 2º do CPC) em virtude da sucumbência mínima do autor. Irresignado, o apelante pretende a reforma da sentença para que seja julgada improcedente a demanda, afastando-se a declaração de inexistência/nulidade dos contratos impugnados, bem como a condenação à devolução dos valores descontados. Sustenta que os contratos celebrados foram realizados por meio do sistema mobile, o qual exige a imposição de senha pessoal e intransferível, com telefone e celular devidamente habilitado pela parte no caixa/TAA, com a imposição de biometria e liberação do aparelho. Afirma que o próprio autor liberou o acesso da sua conta para os fraudadores, realizou a contratação de empréstimos, sendo a única responsável por toda a fraude que sofreu, não podendo responsabilizar o banco requerido por sua desídia. Argumenta que a operação sob nº 165046464 renovou outras operações, inclusive a operação que o autor reconhece, tendo o autor recebido valores a título de troco que foi disponibilizado em conta. Inclusive, o contrato sob nº 167636581 também se trata de uma renovação, com liberação de remanescente em conta. Pondera que, que caso se tratasse de uma questão pontual de fraude, esta ocorreria no mesmo dia com utilização imediata de todos os valores, mas os contratos possuem datas distintas, com disponibilização e utilização de valores em momentos diferentes. Aduz que não houve falha do banco, pois ao aderir à Proposta/Contrato de Abertura, o Cliente autoriza o Banco a efetivar quaisquer operações mediante utilização de senha pessoal. Argui a validade dos contratos celebrados, destacando a observância dos requisitos de validade, autonomia da vontade e pacta sunt servanda. Defende a inexistência de prova de ato ilícito do banco e a ausência de nexo causal, caracterizando a situação como fortuito externo. Invoca a culpa exclusiva da vítima como causa de afastamento da responsabilidade civil, citando precedentes jurisprudenciais. Alternativamente, argumenta que o fato de terceiro constitui causa excludente do nexo de causalidade. Por fim, contesta a condenação em danos materiais, alegando que o banco sequer foi beneficiário dos valores em questão. Em suas contrarrazões (id 296010986), o apelado pugna pela manutenção integral da sentença, argumentando que não houve manifestação de sua vontade na contratação dos empréstimos impugnados, tendo sido induzido a erro por pessoas que detinham previamente informações de seus dados pessoais e bancários sigilosos. Sustenta que a falha na prestação de serviço do banco é incontestável, configurando fortuito interno, nos termos da Súmula 479 do STJ, e que os contratos apresentam vício de consentimento. Rebate as alegações de culpa exclusiva da vítima e de fato de terceiro, reafirmando a responsabilidade objetiva da instituição financeira pelos danos decorrentes de fraudes bancárias. É o relatório. V O T O R E L A T O R Eminentes pares: O cerne da controvérsia recursal reside na análise da validade dos negócios jurídicos impugnados, na verificação da existência de falha na prestação de serviço bancário e na aferição da responsabilidade civil da instituição financeira pelos supostos danos decorrentes da alegada fraude, consideradas as hipóteses de exclusão do nexo causal invocadas pelo recorrente. In casu, trata-se inequivocamente de relação de consumo, subsumindo-se perfeitamente aos conceitos normativos de consumidor e fornecedor. O autor/apelado figura como destinatário final dos serviços bancários prestados pelo réu/apelante, consubstanciados na concessão de crédito mediante empréstimo consignado em folha de pagamento. Enquanto a instituição financeira enquadra-se como fornecedora de serviços bancários. Incide, portanto, o regramento consumerista, incluindo-se a responsabilidade civil objetiva do fornecedor e a possibilidade de inversão do ônus probatório em favor do consumidor, quando verificada sua hipossuficiência técnica ou a verossimilhança das alegações. Da detida análise da documentação acostada, depreende-se que em abril/2024, o autor possuía quatro empréstimos junto ao banco, com parcelas mensais nos valores de R$ 315,00, R$ 317,66, R$ 332,97 e R$ 499,02 (holerites de id 296010907 e seguintes). Em maio/2024, o autor recebeu ligação de pessoa que se identificou como Daiana, representante da empresa BEVICRED (correspondente bancário do Banco do Brasil), propondo a reunião dos quatro empréstimos em um único contrato, com menos parcelas e prestação mensal de R$ 1.555,27, o que resultou no contrato nº 157133757, assinado eletronicamente em 15/05/2024, não impugnado pelo autor. Em agosto/2024, o autor recebeu nova ligação da mesma pessoa, propondo outra renegociação para reduzir o número de parcelas de 48 para 36, com pequeno aumento no valor mensal (de R$ 1.555,27 para R$ 1.572,00), resultando no contrato nº 163407224, assinado eletronicamente em 15/08/2024. Posteriormente, verificou-se o desconto mensal de R$ 3.072,48, diverso do valor acordado, seguindo-se novas renegociações e contratações, gerando os contratos de números: 165046464 (11/09/2024), 165728215 (20/09/2024), 166080404 (25/09/2024), 167186328 (15/10/2024) e 167636581 (21/10/2024), todos impugnados pelo autor. O apelante sustenta, em síntese, a validade dos negócios jurídicos impugnados, argumentando que todas as transações foram realizadas mediante uso de senha pessoal e intransferível, em sistema mobile com imposição de biometria e liberação de aparelho, configurando-se culpa exclusiva do consumidor ou, subsidiariamente, fato de terceiro como excludente de responsabilidade. O apelado, por sua vez, aduz ter sido induzido a erro por pessoas que detinham previamente informações sobre seus dados pessoais e bancários, caracterizando vício de consentimento, fraude e falha na prestação do serviço bancário. Após minudente análise dos elementos probatórios carreados aos autos, constata-se a existência de controvérsia quanto à manifestação de vontade do consumidor na celebração dos contratos impugnados, bem como quanto à efetiva liberação dos valores supostamente contratados em favor do apelado. A contratação eletrônica, embora prescinda da tradicional formalização em suporte físico com assinatura manuscrita, não dispensa os elementos essenciais à validade do negócio jurídico, notadamente a manifestação de vontade livre e consciente, a capacidade dos agentes, o objeto lícito e a forma prescrita ou não defesa em lei. O consentimento eletrônico, manifestado mediante mecanismos de autenticação como senhas, tokens, biometria e outros dispositivos tecnológicos, exige especial atenção quanto à sua integridade e autenticidade, sobretudo em razão da vulnerabilidade técnica do consumidor e da complexidade dos sistemas eletrônicos, que podem ser alvo de manipulação fraudulenta por terceiros mal-intencionados. Em que pese a tese do apelante, a análise da validade dos negócios jurídicos eletrônicos demanda investigação aprofundada, que transcende a mera verificação formal da utilização de mecanismos de autenticação, alcançando o exame substancial do consentimento e da finalidade perseguida pelas partes contratantes. No caso em exame, emerge dos autos evidência robusta de que o apelado foi induzido a erro por pessoas que detinham previamente informações detalhadas sobre seus dados pessoais e bancários, inclusive quanto aos empréstimos anteriormente contratados, valores e condições de pagamento. Tal circunstância configura forte indício de falha na segurança do sistema bancário, permitindo o vazamento de informações sigilosas do consumidor, em flagrante violação ao dever de sigilo bancário e de proteção de dados pessoais, constitucionalmente assegurados. Convém destacar que o primeiro contrato (nº 157133757), não impugnado pelo apelado, correspondeu efetivamente à sua manifestação de vontade, reunindo os quatro empréstimos anteriores em um único contrato com parcela mensal de R$ 1.555,27. Contudo, as contratações subsequentes, embora formalmente realizadas com a utilização da senha pessoal do consumidor, não refletiram sua real intenção negocial, configurando inequívoco vício de consentimento. O segundo contrato (nº 163407224), inicialmente apresentado como mera alteração do prazo de pagamento do contrato anterior (de 48 para 36 parcelas), resultou, na verdade, em nova contratação que gerou a cobrança duplicada, conforme demonstra o desconto de R$ 3.072,48 realizado em outubro de 2024, diverso do valor prometido de R$ 1.572,00. As demais contratações, realizadas em curto intervalo de tempo (entre setembro e outubro de 2024), evidenciam prática reiterada de indução do consumidor a erro, com informações inverídicas e promessas enganosas de renegociação, resultando na multiplicação da dívida original sem a correspondente contrapartida financeira em favor do apelado. A propósito, merece especial destaque a ausência de comprovação, por parte da instituição financeira, da efetiva liberação dos valores supostamente contratados em favor do consumidor, circunstância que reforça a tese de fraude e vício de consentimento. Com efeito, incumbia ao apelante, à luz da distribuição dinâmica do ônus probatório, demonstrar não apenas a formalização dos contratos mediante uso de senha pessoal, mas também a regular disponibilização dos valores correspondentes, elemento essencial à comprovação da efetiva prestação do serviço e da higidez do negócio jurídico celebrado. A responsabilidade civil das instituições financeiras por falhas na prestação de serviços bancários, marcada pela massificação das relações de consumo e pela crescente virtualização das operações bancárias, emerge com especial relevância o dever de segurança imposto às instituições financeiras, as quais devem adotar medidas técnicas e administrativas eficazes para garantir a integridade, a confidencialidade e a autenticidade das transações realizadas em seus sistemas eletrônicos. Tal dever de segurança decorre não apenas dos princípios gerais da boa-fé objetiva e da função social do contrato, mas também do princípio constitucional da defesa do consumidor e das normas específicas do microssistema consumerista, que impõem ao fornecedor o dever de prestar serviços seguros e adequados às legítimas expectativas do consumidor. No caso em tela, a instituição financeira apelante busca eximir-se de responsabilidade invocando duas excludentes principais: a) culpa exclusiva do consumidor, que teria fornecido voluntariamente seus dados e senha a terceiros; e b) fato exclusivo de terceiro, caracterizado pela atuação fraudulenta de estelionatários. Todavia, nenhuma das excludentes invocadas encontra respaldo nos elementos probatórios constantes dos autos. Não há evidência concreta de que o apelado tenha deliberadamente fornecido sua senha a terceiros ou agido com culpa grave na proteção de seus dados. Ao contrário, o que emerge da narrativa processual é a atuação engenhosa de fraudadores que, valendo-se de informações privilegiadas sobre os contratos anteriores do consumidor, induziram-no a erro mediante falsas promessas de renegociação vantajosa. Quanto ao alegado fato de terceiro, cumpre destacar que a fraude perpetrada no âmbito de operações bancárias eletrônicas constitui risco inerente à atividade desenvolvida pela instituição financeira, configurando fortuito interno que não elide sua responsabilidade. Com efeito, a possibilidade de fraudes e golpes em transações eletrônicas é circunstância previsível e evitável mediante a adoção de adequados protocolos de segurança, os quais integram o núcleo essencial da atividade bancária moderna. O entendimento jurisprudencial consolidado orienta-se no sentido de reconhecer a responsabilidade objetiva das instituições financeiras pelos danos decorrentes de fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias, considerando que tais eventos constituem fortuito interno, relacionado aos riscos da própria atividade econômica desenvolvida pelos bancos. Na hipótese vertente, a falha na prestação do serviço bancário manifesta-se em múltiplas dimensões: a) no vazamento de informações sigilosas do consumidor, que permitiu aos fraudadores conhecerem detalhes de seus contratos anteriores; b) na ausência de mecanismos eficazes de verificação da autenticidade da vontade do consumidor na celebração de contratos eletrônicos sucessivos em curto intervalo de tempo; c) na falta de monitoramento adequado de operações atípicas que resultaram na multiplicação expressiva da dívida original sem correspondente contrapartida financeira; e d) na não comprovação da efetiva liberação dos valores supostamente contratados em favor do consumidor. Tais circunstâncias evidenciam deficiência no dever de segurança imposto à instituição financeira, caracterizando serviço defeituoso, nos termos da legislação consumerista, por não fornecer a segurança que o consumidor dele poderia legitimamente esperar. Diante disso, estabelecida a falha na prestação do serviço bancário e a responsabilidade civil da instituição financeira apelante, cumpre examinar as consequências jurídicas quanto à validade dos negócios jurídicos impugnados. A doutrina civilista contemporânea, ao tratar dos vícios do consentimento, destaca o erro como falsa representação da realidade que influencia de modo determinante a manifestação de vontade do agente. No contexto das relações de consumo, o erro assume especial relevância em razão da vulnerabilidade técnica e informacional do consumidor, que frequentemente não dispõe de conhecimentos específicos sobre os produtos e serviços contratados, dependendo das informações prestadas pelo fornecedor para formar sua convicção. No caso em apreço, o apelado foi induzido a crer que estava apenas renegociando sua dívida anterior em condições mais vantajosas, quando, na realidade, estava celebrando novos contratos que resultaram na duplicidade de cobranças e no aumento significativo de seu endividamento, sem a correspondente contrapartida financeira. Tal circunstância, associada à ausência de comprovação da efetiva liberação dos valores supostamente contratados em favor do consumidor, evidencia não apenas vício de consentimento, mas também possível ausência de causa do negócio jurídico, comprometendo irremediavelmente sua validade. Destarte, impõe-se a manutenção da sentença que declarou a nulidade dos contratos impugnados e a consequente ilegalidade e inexigibilidade dos descontos deles decorrentes, preservando-se apenas o contrato nº 157133757, que efetivamente correspondeu à manifestação de vontade do apelado. Em diversas oportunidades, esta Câmara assim teve a oportunidade de decidir: “APELAÇÃO - AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA C/C REPETIÇÃO DO INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - REFINANCIAMENTO – FRAUDE NA CONTRATAÇÃO - AUTORA QUE CONTESTOU A ASSINATURA DOS CONTRATOS - ÔNUS DA PROVA DA AUTENTICIDADE DA ASSINATURA – PARTE QUE PRODUZIU O DOCUMENTO – ART. 429, II DO CPC - AUSÊNCIA DE PROVAS DA LEGALIDADE DA CONTRATAÇÃO - DANO MORAL CONFIGURADO - VALOR ADEQUADO - SENTENÇA MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO. Conforme dispõe o art. 429, Inc. II, do CPC, o ônus de provar a autenticidade de assinatura incumbe à parte que produziu o documento. Não comprovada pela instituição financeira a legalidade da cobrança, torna-se inexistente o débito efetivado no benefício previdenciário da parte. Demonstrados os requisitos da reparação civil, cabível a indenização a título de dano moral, máxime porque o desconto indevido se deu sobre verba de natureza alimentar. O valor arbitrado a título de danos morais deve levar em conta as circunstâncias do caso concreto, as condições das partes, o grau de culpa e, principalmente, a finalidade da reparação do dano moral, que é a de compensar o dano ocorrido, bem como inibir a conduta abusiva”. (N.U 1029504-30.2020.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, GUIOMAR TEODORO BORGES, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 04/10/2023, Publicado no DJE 07/10/2023). “APELAÇÃO – AÇÃO DE CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO C/C DESCONSTITUIÇÃO DE EMPRÉSTIMO C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO C/C DANOS MORAIS C/C ANTECIPAÇÃO DA TUTELA–VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE– ARGUIÇÃO IMPROCEDENTE–IMPUGNAÇÃO AOS FUNDAMENTOS DA SENTENÇA –PRELIMINAR REJEITADA-EMPRÉSTIMO CONSIGNADO – ASSINATURA POR BIOMETRIA FACIAL – ALEGAÇÃO DE FRAUDE – AUSÊNCIA DE PROVAS DA LEGALIDADE DA CONTRATAÇÃO – MONTANTE CREDITADO NA CONTA DA AUTORA DEVOLVIDO– DESCONTOS IMOTIVADOS – INDENIZAÇÃO DEVIDA – RESTITUIÇÃO NA FORMA SIMPLES – INVERSÃO DO ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA -VERBA HONORÁRIA –ARBITRAMENTO SOBRE O VALOR DA CONDENAÇÃO (ART. 85, § 2º, DO CPC)–RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. Não ocorre violação ao princípio da dialeticidade se as razões recursais combatem os fundamentos da sentença, como determina o art. 1.010, II, do CPC. É ônus do réu comprovar fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor, o que nas ações declaratórias de inexistência de débito refere-se à prova da dívida (art. 373, II, do CPC). Não demonstrada a contratação, os descontos efetivados imotivadamente configuram ato ilícito gerador de dano moral. A indenização tem de ser fixada em quantia que cumpra a função compensatória, punitiva e preventiva da medida. Os descontos indevidos são restituídos na forma simples quando não evidenciada a má-fé da instituição financeira (art. 42, parágrafo único, do CDC). Provida a Apelação para reformar a sentença, impõe-se a inversão do ônus sucumbencial. Os honorários advocatícios comportam adequação quando ocorre a modificação do parâmetro de incidência do valor do proveito econômico para o da condenação (art. 85, §2º, do CPC).” (TJMT, Quarta Câmara de Direito Privado, AP 1002863-73.2022.8.11.0028, julgamento em 24-8-2023). Nesse sentido: APELAÇÕES CÍVEIS – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS – PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA DA BEVICRED REJEITADA – MÉRITO – OFERTA DE PORTABILIDADE DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO VIA CORRESPONDENTE BANCÁRIO – DIVERGÊNCIA ENTRE A CONTRATAÇÃO EFETIVA E A INTENÇÃO DA CONSUMIDORA – REALIZAÇÃO DE NOVO EMPRÉSTIMO – VIOLAÇÃO DO DEVER DE INFORMAÇÃO CLARA E ADEQUADA - RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA E OBJETIVA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA POR DANOS CAUSADOS POR FRAUDES E DELITOS PRATICADOS POR TERCEIROS – SÚMULA 479 DO STJ – NULIDADE DECRETADA – DÉBITO INEXISTENTE – RESTITUIÇÃO NA FORMA SIMPLES – DANO MORAL IN RE IPSA – DEVER DE INDENIZAR CONFIGURADO – QUANTUM INDENIZATÓRIO RAZOÁVEL E PROPORCIONAL – SENTENÇA MANTIDA – RECURSOS DESPROVIDOS. A empresa que permite a utilização da sua logomarca, fazendo crer através da publicidade que era responsável pela operação, incide na situação da teoria da aparência descrita no artigo 30 do Código de Defesa do Consumidor, motivo pelo qual é responsável solidariamente. É direito básico do consumidor obter informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentem (art. 6º, III, CDC). Da mesma forma, tem-se como nula a cláusula contratual que se mostra excessivamente onerosa para o consumidor, considerando-se a natureza e conteúdo do contrato, o interesse das partes e outras circunstâncias peculiares ao caso (art. 51, § 1º, III, CDC). As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias, nos termos da Súmula 479 do STJ. Ademais, todos os que participam da cadeia de consumo tem responsabilidade por eventuais danos decorrentes da relação jurídica em tela, em razão do princípio da solidariedade e do próprio sistema de proteção, fundado no risco-proveito do negócio, consagrado no artigo 7º, parágrafo único, do CDC. Comprovada a falha na prestação do serviço bancário, notadamente quanto ao dever de informação adequada ao consumidor, e celebrado novo contrato de empréstimo consignado quando a intenção verdadeira da consumidora era a portabilidade de empréstimos consignados, é caso de declarar-se nulo o contrato na parte que extrapola a vontade manifestada da parte autora. (TJ-MT 10101954320208110002 MT, Relator.: ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Data de Julgamento: 14/12/2022, Terceira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 21/12/2022) Declarada a nulidade dos contratos impugnados, impõe-se a restituição dos valores indevidamente descontados, como corolário lógico do princípio da vedação ao enriquecimento sem causa, que permeia todo o ordenamento jurídico pátrio e encontra expressa positivação na legislação civil. Defende o apelante que devida a restituição dos valores descontados na forma simples, uma vez que não comprovada a má-fé. Deve-se observar que a sentença determinou a restituição simples, razão pela qual deixo de analisar esse ponto do apelo. Portanto, conclui-se que a sentença recorrida não merece qualquer reparo. Posto isso, NEGO PROVIMENTO ao recurso de apelação, mantendo integralmente a sentença recorrida. Em razão da sucumbência recursal, majoro os honorários advocatícios devidos pelo apelante aos patronos do apelado em 2% (dois por cento) sobre o valor atualizado da condenação, totalizando o percentual de 12% (doze por cento), nos termos do dispositivo legal pertinente, considerando o trabalho adicional realizado em grau recursal. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 23/07/2025

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Processo nº 1002474-44.2024.8.11.0020

ID: 336490560

Tribunal: TJMT Órgão: Quarta Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1002474-44.2024.8.11.0020

Data de Disponibilização: 28/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

BELTSON DA COSTA ROCHA

Acórdão

Advogados:

GENNARO REIS DA SILVA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ANTONIO DE LIMA FERNANDES NETO

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1002474-44.2024.8.11.0020 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Contratos Bancários] Relator: Des(a). SERLY MARC… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1002474-44.2024.8.11.0020 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Contratos Bancários] Relator: Des(a). SERLY MARCONDES ALVES Turma Julgadora: [DES(A). SERLY MARCONDES ALVES, DES(A). ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA, DES(A). RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO] Parte(s): [BELTSON DA COSTA ROCHA - CPF: 582.040.161-15 (APELADO), ANTONIO DE LIMA FERNANDES NETO - CPF: 972.058.771-72 (ADVOGADO), GENNARO REIS DA SILVA - CPF: 692.347.521-04 (ADVOGADO), BANCO DO BRASIL SA - CNPJ: 00.000.000/0001-91 (APELANTE), EDUARDO JANZON AVALLONE NOGUEIRA - CPF: 135.207.888-02 (ADVOGADO), BEVICRED INFORMACOES CADASTRAIS LTDA - ME - CNPJ: 07.452.085/0001-98 (APELANTE), EDUARDO DOS SANTOS BERG - CPF: 431.946.578-44 (ADVOGADO), RODRIGO APARECIDO SENO - CPF: 359.672.298-50 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: NAO PROVIDO, UNANIME E M E N T A DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. CONTRATOS BANCÁRIOS. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO CELEBRADO POR MEIO ELETRÔNICO. FRAUDE E VÍCIO DE CONSENTIMENTO CONSTATADOS. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO. CONFIGURADA. FORTUITO INTERNO. NULIDADE DOS CONTRATOS E RESTITUIÇÃO DOS VALORES DESCONTADOS. FORMA SIMPLES. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME Apelação cível interposta contra sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos em ação anulatória de débito cumulada com indenização por danos materiais e morais. A sentença declarou a inexistência/nulidade de seis contratos bancários firmados eletronicamente, reconheceu a ilegalidade e inexigibilidade dos respectivos descontos em proventos do autor e determinou a devolução simples dos valores indevidamente descontados, mantendo apenas os descontos relativos ao contrato não impugnado nº 157133757. O banco sustenta a validade dos contratos, a ausência de falha na prestação de serviço, a culpa exclusiva da vítima e a inexistência de nexo causal. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Há três questões em discussão: (i) definir se os contratos impugnados foram celebrados com vício de consentimento decorrente de fraude; (ii) estabelecer se houve falha na prestação de serviço por parte da instituição financeira, apta a gerar sua responsabilidade objetiva; (iii) determinar a validade da restituição simples dos valores descontados, com exclusão da repetição em dobro. III. RAZÕES DE DECIDIR A relação jurídica entre as partes é de consumo, submetida ao Código de Defesa do Consumidor, que prevê a responsabilidade objetiva do fornecedor por falha na prestação de serviços. A contratação eletrônica, ainda que formalmente válida por uso de senha e autenticação, exige consentimento livre e informado, cuja ausência compromete a validade do negócio jurídico. A análise do caso revela que o consumidor foi induzido a erro por terceiros que detinham informações bancárias sigilosas, evidenciando vício de consentimento nos contratos impugnados. A instituição financeira não comprovou a efetiva liberação dos valores contratados ao consumidor, elemento essencial para validar os contratos. As contratações sucessivas, em curto intervalo de tempo, sem contrapartida real e com aumento indevido dos descontos, configuram falha no dever de segurança e controle do banco. A fraude praticada constitui fortuito interno, risco inerente à atividade bancária, não sendo causa excludente de responsabilidade da instituição financeira. A restituição simples dos valores descontados indevidamente é devida, pois não há prova de má-fé ou conduta dolosa do banco que justifique a repetição em dobro. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso desprovido. Tese de julgamento: Configura vício de consentimento o contrato bancário eletrônico celebrado por consumidor induzido a erro por fraude baseada em informações sigilosas previamente vazadas. A instituição financeira responde objetivamente pelos danos decorrentes de falha na segurança do sistema, nos termos do art. 14 do CDC. A ausência de comprovação da efetiva liberação dos valores contratados invalida o negócio jurídico e impõe a restituição dos valores descontados. A devolução dos valores descontados de forma simples é adequada quando ausente prova de má-fé do credor. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, X; CDC, arts. 6º, III, IV e VIII, 14, §1º, e 42, parágrafo único; CC, arts. 104, 138 a 147. Jurisprudência relevante citada: STJ, Súmula 479. TJMT, Ap 1029504-30.2020.8.11.0041, Quarta Câmara de Direito Privado, Rel. Desa. Guiomar Teodoro Borges, j. 04/10/2023. TJMT, Ap 1002863-73.2022.8.11.0028, Quarta Câmara de Direito Privado, j. 24/08/2023. TJMT, Ap 1010195-43.2020.8.11.0002, Terceira Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Antônia Siqueira Gonçalves, j. 14/12/2022. TJMT, Ap 1002866-09.2023.8.11.0023, Quarta Câmara de Direito Privado, j. 11/09/2024. R E L A T Ó R I O RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL N. 1002474-44.2024.8.11.0020 BANCO DO BRASIL S/A X BELTSON DA COSTA ROCHA Eminentes pares: Trata-se de recurso de apelação cível, interposto por BANCO DO BRASIL S.A., com o fito de reformar a sentença, proferida pelo Juízo da 1ª Vara Cível de Alto Araguaia/MT, que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na ação anulatória de débito c/c indenização por danos materiais e morais com pedido de tutela de urgência, ajuizada por BELTSON DA COSTA ROCHA, declarando a inexistência/nulidade dos negócios jurídicos objeto da lide (contratos de nº 163407224, nº 165046464, nº 165728215, nº 166080404, nº 167186328 e nº 167636581), bem como a ilegalidade e inexigibilidade dos descontos efetuados diretamente em proventos da parte autora e decorrentes dos referidos contratos, condenando a parte requerida a devolver de forma simples os valores indevidamente descontados, com correção monetária e juros de mora a partir de cada desconto efetuado, observada a manutenção dos descontos referentes ao contrato não impugnado n° 157133757, no valor de R$ 1.555,27. Por conseguinte, condenou o banco ao pagamento das custas/despesas processuais e honorários advocatícios, estes arbitrados em 10% sobre o valor atualizado da condenação (art. 85, § 2º do CPC) em virtude da sucumbência mínima do autor. Irresignado, o apelante pretende a reforma da sentença para que seja julgada improcedente a demanda, afastando-se a declaração de inexistência/nulidade dos contratos impugnados, bem como a condenação à devolução dos valores descontados. Sustenta que os contratos celebrados foram realizados por meio do sistema mobile, o qual exige a imposição de senha pessoal e intransferível, com telefone e celular devidamente habilitado pela parte no caixa/TAA, com a imposição de biometria e liberação do aparelho. Afirma que o próprio autor liberou o acesso da sua conta para os fraudadores, realizou a contratação de empréstimos, sendo a única responsável por toda a fraude que sofreu, não podendo responsabilizar o banco requerido por sua desídia. Argumenta que a operação sob nº 165046464 renovou outras operações, inclusive a operação que o autor reconhece, tendo o autor recebido valores a título de troco que foi disponibilizado em conta. Inclusive, o contrato sob nº 167636581 também se trata de uma renovação, com liberação de remanescente em conta. Pondera que, que caso se tratasse de uma questão pontual de fraude, esta ocorreria no mesmo dia com utilização imediata de todos os valores, mas os contratos possuem datas distintas, com disponibilização e utilização de valores em momentos diferentes. Aduz que não houve falha do banco, pois ao aderir à Proposta/Contrato de Abertura, o Cliente autoriza o Banco a efetivar quaisquer operações mediante utilização de senha pessoal. Argui a validade dos contratos celebrados, destacando a observância dos requisitos de validade, autonomia da vontade e pacta sunt servanda. Defende a inexistência de prova de ato ilícito do banco e a ausência de nexo causal, caracterizando a situação como fortuito externo. Invoca a culpa exclusiva da vítima como causa de afastamento da responsabilidade civil, citando precedentes jurisprudenciais. Alternativamente, argumenta que o fato de terceiro constitui causa excludente do nexo de causalidade. Por fim, contesta a condenação em danos materiais, alegando que o banco sequer foi beneficiário dos valores em questão. Em suas contrarrazões (id 296010986), o apelado pugna pela manutenção integral da sentença, argumentando que não houve manifestação de sua vontade na contratação dos empréstimos impugnados, tendo sido induzido a erro por pessoas que detinham previamente informações de seus dados pessoais e bancários sigilosos. Sustenta que a falha na prestação de serviço do banco é incontestável, configurando fortuito interno, nos termos da Súmula 479 do STJ, e que os contratos apresentam vício de consentimento. Rebate as alegações de culpa exclusiva da vítima e de fato de terceiro, reafirmando a responsabilidade objetiva da instituição financeira pelos danos decorrentes de fraudes bancárias. É o relatório. V O T O R E L A T O R Eminentes pares: O cerne da controvérsia recursal reside na análise da validade dos negócios jurídicos impugnados, na verificação da existência de falha na prestação de serviço bancário e na aferição da responsabilidade civil da instituição financeira pelos supostos danos decorrentes da alegada fraude, consideradas as hipóteses de exclusão do nexo causal invocadas pelo recorrente. In casu, trata-se inequivocamente de relação de consumo, subsumindo-se perfeitamente aos conceitos normativos de consumidor e fornecedor. O autor/apelado figura como destinatário final dos serviços bancários prestados pelo réu/apelante, consubstanciados na concessão de crédito mediante empréstimo consignado em folha de pagamento. Enquanto a instituição financeira enquadra-se como fornecedora de serviços bancários. Incide, portanto, o regramento consumerista, incluindo-se a responsabilidade civil objetiva do fornecedor e a possibilidade de inversão do ônus probatório em favor do consumidor, quando verificada sua hipossuficiência técnica ou a verossimilhança das alegações. Da detida análise da documentação acostada, depreende-se que em abril/2024, o autor possuía quatro empréstimos junto ao banco, com parcelas mensais nos valores de R$ 315,00, R$ 317,66, R$ 332,97 e R$ 499,02 (holerites de id 296010907 e seguintes). Em maio/2024, o autor recebeu ligação de pessoa que se identificou como Daiana, representante da empresa BEVICRED (correspondente bancário do Banco do Brasil), propondo a reunião dos quatro empréstimos em um único contrato, com menos parcelas e prestação mensal de R$ 1.555,27, o que resultou no contrato nº 157133757, assinado eletronicamente em 15/05/2024, não impugnado pelo autor. Em agosto/2024, o autor recebeu nova ligação da mesma pessoa, propondo outra renegociação para reduzir o número de parcelas de 48 para 36, com pequeno aumento no valor mensal (de R$ 1.555,27 para R$ 1.572,00), resultando no contrato nº 163407224, assinado eletronicamente em 15/08/2024. Posteriormente, verificou-se o desconto mensal de R$ 3.072,48, diverso do valor acordado, seguindo-se novas renegociações e contratações, gerando os contratos de números: 165046464 (11/09/2024), 165728215 (20/09/2024), 166080404 (25/09/2024), 167186328 (15/10/2024) e 167636581 (21/10/2024), todos impugnados pelo autor. O apelante sustenta, em síntese, a validade dos negócios jurídicos impugnados, argumentando que todas as transações foram realizadas mediante uso de senha pessoal e intransferível, em sistema mobile com imposição de biometria e liberação de aparelho, configurando-se culpa exclusiva do consumidor ou, subsidiariamente, fato de terceiro como excludente de responsabilidade. O apelado, por sua vez, aduz ter sido induzido a erro por pessoas que detinham previamente informações sobre seus dados pessoais e bancários, caracterizando vício de consentimento, fraude e falha na prestação do serviço bancário. Após minudente análise dos elementos probatórios carreados aos autos, constata-se a existência de controvérsia quanto à manifestação de vontade do consumidor na celebração dos contratos impugnados, bem como quanto à efetiva liberação dos valores supostamente contratados em favor do apelado. A contratação eletrônica, embora prescinda da tradicional formalização em suporte físico com assinatura manuscrita, não dispensa os elementos essenciais à validade do negócio jurídico, notadamente a manifestação de vontade livre e consciente, a capacidade dos agentes, o objeto lícito e a forma prescrita ou não defesa em lei. O consentimento eletrônico, manifestado mediante mecanismos de autenticação como senhas, tokens, biometria e outros dispositivos tecnológicos, exige especial atenção quanto à sua integridade e autenticidade, sobretudo em razão da vulnerabilidade técnica do consumidor e da complexidade dos sistemas eletrônicos, que podem ser alvo de manipulação fraudulenta por terceiros mal-intencionados. Em que pese a tese do apelante, a análise da validade dos negócios jurídicos eletrônicos demanda investigação aprofundada, que transcende a mera verificação formal da utilização de mecanismos de autenticação, alcançando o exame substancial do consentimento e da finalidade perseguida pelas partes contratantes. No caso em exame, emerge dos autos evidência robusta de que o apelado foi induzido a erro por pessoas que detinham previamente informações detalhadas sobre seus dados pessoais e bancários, inclusive quanto aos empréstimos anteriormente contratados, valores e condições de pagamento. Tal circunstância configura forte indício de falha na segurança do sistema bancário, permitindo o vazamento de informações sigilosas do consumidor, em flagrante violação ao dever de sigilo bancário e de proteção de dados pessoais, constitucionalmente assegurados. Convém destacar que o primeiro contrato (nº 157133757), não impugnado pelo apelado, correspondeu efetivamente à sua manifestação de vontade, reunindo os quatro empréstimos anteriores em um único contrato com parcela mensal de R$ 1.555,27. Contudo, as contratações subsequentes, embora formalmente realizadas com a utilização da senha pessoal do consumidor, não refletiram sua real intenção negocial, configurando inequívoco vício de consentimento. O segundo contrato (nº 163407224), inicialmente apresentado como mera alteração do prazo de pagamento do contrato anterior (de 48 para 36 parcelas), resultou, na verdade, em nova contratação que gerou a cobrança duplicada, conforme demonstra o desconto de R$ 3.072,48 realizado em outubro de 2024, diverso do valor prometido de R$ 1.572,00. As demais contratações, realizadas em curto intervalo de tempo (entre setembro e outubro de 2024), evidenciam prática reiterada de indução do consumidor a erro, com informações inverídicas e promessas enganosas de renegociação, resultando na multiplicação da dívida original sem a correspondente contrapartida financeira em favor do apelado. A propósito, merece especial destaque a ausência de comprovação, por parte da instituição financeira, da efetiva liberação dos valores supostamente contratados em favor do consumidor, circunstância que reforça a tese de fraude e vício de consentimento. Com efeito, incumbia ao apelante, à luz da distribuição dinâmica do ônus probatório, demonstrar não apenas a formalização dos contratos mediante uso de senha pessoal, mas também a regular disponibilização dos valores correspondentes, elemento essencial à comprovação da efetiva prestação do serviço e da higidez do negócio jurídico celebrado. A responsabilidade civil das instituições financeiras por falhas na prestação de serviços bancários, marcada pela massificação das relações de consumo e pela crescente virtualização das operações bancárias, emerge com especial relevância o dever de segurança imposto às instituições financeiras, as quais devem adotar medidas técnicas e administrativas eficazes para garantir a integridade, a confidencialidade e a autenticidade das transações realizadas em seus sistemas eletrônicos. Tal dever de segurança decorre não apenas dos princípios gerais da boa-fé objetiva e da função social do contrato, mas também do princípio constitucional da defesa do consumidor e das normas específicas do microssistema consumerista, que impõem ao fornecedor o dever de prestar serviços seguros e adequados às legítimas expectativas do consumidor. No caso em tela, a instituição financeira apelante busca eximir-se de responsabilidade invocando duas excludentes principais: a) culpa exclusiva do consumidor, que teria fornecido voluntariamente seus dados e senha a terceiros; e b) fato exclusivo de terceiro, caracterizado pela atuação fraudulenta de estelionatários. Todavia, nenhuma das excludentes invocadas encontra respaldo nos elementos probatórios constantes dos autos. Não há evidência concreta de que o apelado tenha deliberadamente fornecido sua senha a terceiros ou agido com culpa grave na proteção de seus dados. Ao contrário, o que emerge da narrativa processual é a atuação engenhosa de fraudadores que, valendo-se de informações privilegiadas sobre os contratos anteriores do consumidor, induziram-no a erro mediante falsas promessas de renegociação vantajosa. Quanto ao alegado fato de terceiro, cumpre destacar que a fraude perpetrada no âmbito de operações bancárias eletrônicas constitui risco inerente à atividade desenvolvida pela instituição financeira, configurando fortuito interno que não elide sua responsabilidade. Com efeito, a possibilidade de fraudes e golpes em transações eletrônicas é circunstância previsível e evitável mediante a adoção de adequados protocolos de segurança, os quais integram o núcleo essencial da atividade bancária moderna. O entendimento jurisprudencial consolidado orienta-se no sentido de reconhecer a responsabilidade objetiva das instituições financeiras pelos danos decorrentes de fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias, considerando que tais eventos constituem fortuito interno, relacionado aos riscos da própria atividade econômica desenvolvida pelos bancos. Na hipótese vertente, a falha na prestação do serviço bancário manifesta-se em múltiplas dimensões: a) no vazamento de informações sigilosas do consumidor, que permitiu aos fraudadores conhecerem detalhes de seus contratos anteriores; b) na ausência de mecanismos eficazes de verificação da autenticidade da vontade do consumidor na celebração de contratos eletrônicos sucessivos em curto intervalo de tempo; c) na falta de monitoramento adequado de operações atípicas que resultaram na multiplicação expressiva da dívida original sem correspondente contrapartida financeira; e d) na não comprovação da efetiva liberação dos valores supostamente contratados em favor do consumidor. Tais circunstâncias evidenciam deficiência no dever de segurança imposto à instituição financeira, caracterizando serviço defeituoso, nos termos da legislação consumerista, por não fornecer a segurança que o consumidor dele poderia legitimamente esperar. Diante disso, estabelecida a falha na prestação do serviço bancário e a responsabilidade civil da instituição financeira apelante, cumpre examinar as consequências jurídicas quanto à validade dos negócios jurídicos impugnados. A doutrina civilista contemporânea, ao tratar dos vícios do consentimento, destaca o erro como falsa representação da realidade que influencia de modo determinante a manifestação de vontade do agente. No contexto das relações de consumo, o erro assume especial relevância em razão da vulnerabilidade técnica e informacional do consumidor, que frequentemente não dispõe de conhecimentos específicos sobre os produtos e serviços contratados, dependendo das informações prestadas pelo fornecedor para formar sua convicção. No caso em apreço, o apelado foi induzido a crer que estava apenas renegociando sua dívida anterior em condições mais vantajosas, quando, na realidade, estava celebrando novos contratos que resultaram na duplicidade de cobranças e no aumento significativo de seu endividamento, sem a correspondente contrapartida financeira. Tal circunstância, associada à ausência de comprovação da efetiva liberação dos valores supostamente contratados em favor do consumidor, evidencia não apenas vício de consentimento, mas também possível ausência de causa do negócio jurídico, comprometendo irremediavelmente sua validade. Destarte, impõe-se a manutenção da sentença que declarou a nulidade dos contratos impugnados e a consequente ilegalidade e inexigibilidade dos descontos deles decorrentes, preservando-se apenas o contrato nº 157133757, que efetivamente correspondeu à manifestação de vontade do apelado. Em diversas oportunidades, esta Câmara assim teve a oportunidade de decidir: “APELAÇÃO - AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA C/C REPETIÇÃO DO INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - REFINANCIAMENTO – FRAUDE NA CONTRATAÇÃO - AUTORA QUE CONTESTOU A ASSINATURA DOS CONTRATOS - ÔNUS DA PROVA DA AUTENTICIDADE DA ASSINATURA – PARTE QUE PRODUZIU O DOCUMENTO – ART. 429, II DO CPC - AUSÊNCIA DE PROVAS DA LEGALIDADE DA CONTRATAÇÃO - DANO MORAL CONFIGURADO - VALOR ADEQUADO - SENTENÇA MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO. Conforme dispõe o art. 429, Inc. II, do CPC, o ônus de provar a autenticidade de assinatura incumbe à parte que produziu o documento. Não comprovada pela instituição financeira a legalidade da cobrança, torna-se inexistente o débito efetivado no benefício previdenciário da parte. Demonstrados os requisitos da reparação civil, cabível a indenização a título de dano moral, máxime porque o desconto indevido se deu sobre verba de natureza alimentar. O valor arbitrado a título de danos morais deve levar em conta as circunstâncias do caso concreto, as condições das partes, o grau de culpa e, principalmente, a finalidade da reparação do dano moral, que é a de compensar o dano ocorrido, bem como inibir a conduta abusiva”. (N.U 1029504-30.2020.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, GUIOMAR TEODORO BORGES, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 04/10/2023, Publicado no DJE 07/10/2023). “APELAÇÃO – AÇÃO DE CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO C/C DESCONSTITUIÇÃO DE EMPRÉSTIMO C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO C/C DANOS MORAIS C/C ANTECIPAÇÃO DA TUTELA–VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE– ARGUIÇÃO IMPROCEDENTE–IMPUGNAÇÃO AOS FUNDAMENTOS DA SENTENÇA –PRELIMINAR REJEITADA-EMPRÉSTIMO CONSIGNADO – ASSINATURA POR BIOMETRIA FACIAL – ALEGAÇÃO DE FRAUDE – AUSÊNCIA DE PROVAS DA LEGALIDADE DA CONTRATAÇÃO – MONTANTE CREDITADO NA CONTA DA AUTORA DEVOLVIDO– DESCONTOS IMOTIVADOS – INDENIZAÇÃO DEVIDA – RESTITUIÇÃO NA FORMA SIMPLES – INVERSÃO DO ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA -VERBA HONORÁRIA –ARBITRAMENTO SOBRE O VALOR DA CONDENAÇÃO (ART. 85, § 2º, DO CPC)–RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. Não ocorre violação ao princípio da dialeticidade se as razões recursais combatem os fundamentos da sentença, como determina o art. 1.010, II, do CPC. É ônus do réu comprovar fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor, o que nas ações declaratórias de inexistência de débito refere-se à prova da dívida (art. 373, II, do CPC). Não demonstrada a contratação, os descontos efetivados imotivadamente configuram ato ilícito gerador de dano moral. A indenização tem de ser fixada em quantia que cumpra a função compensatória, punitiva e preventiva da medida. Os descontos indevidos são restituídos na forma simples quando não evidenciada a má-fé da instituição financeira (art. 42, parágrafo único, do CDC). Provida a Apelação para reformar a sentença, impõe-se a inversão do ônus sucumbencial. Os honorários advocatícios comportam adequação quando ocorre a modificação do parâmetro de incidência do valor do proveito econômico para o da condenação (art. 85, §2º, do CPC).” (TJMT, Quarta Câmara de Direito Privado, AP 1002863-73.2022.8.11.0028, julgamento em 24-8-2023). Nesse sentido: APELAÇÕES CÍVEIS – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS – PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA DA BEVICRED REJEITADA – MÉRITO – OFERTA DE PORTABILIDADE DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO VIA CORRESPONDENTE BANCÁRIO – DIVERGÊNCIA ENTRE A CONTRATAÇÃO EFETIVA E A INTENÇÃO DA CONSUMIDORA – REALIZAÇÃO DE NOVO EMPRÉSTIMO – VIOLAÇÃO DO DEVER DE INFORMAÇÃO CLARA E ADEQUADA - RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA E OBJETIVA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA POR DANOS CAUSADOS POR FRAUDES E DELITOS PRATICADOS POR TERCEIROS – SÚMULA 479 DO STJ – NULIDADE DECRETADA – DÉBITO INEXISTENTE – RESTITUIÇÃO NA FORMA SIMPLES – DANO MORAL IN RE IPSA – DEVER DE INDENIZAR CONFIGURADO – QUANTUM INDENIZATÓRIO RAZOÁVEL E PROPORCIONAL – SENTENÇA MANTIDA – RECURSOS DESPROVIDOS. A empresa que permite a utilização da sua logomarca, fazendo crer através da publicidade que era responsável pela operação, incide na situação da teoria da aparência descrita no artigo 30 do Código de Defesa do Consumidor, motivo pelo qual é responsável solidariamente. É direito básico do consumidor obter informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentem (art. 6º, III, CDC). Da mesma forma, tem-se como nula a cláusula contratual que se mostra excessivamente onerosa para o consumidor, considerando-se a natureza e conteúdo do contrato, o interesse das partes e outras circunstâncias peculiares ao caso (art. 51, § 1º, III, CDC). As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias, nos termos da Súmula 479 do STJ. Ademais, todos os que participam da cadeia de consumo tem responsabilidade por eventuais danos decorrentes da relação jurídica em tela, em razão do princípio da solidariedade e do próprio sistema de proteção, fundado no risco-proveito do negócio, consagrado no artigo 7º, parágrafo único, do CDC. Comprovada a falha na prestação do serviço bancário, notadamente quanto ao dever de informação adequada ao consumidor, e celebrado novo contrato de empréstimo consignado quando a intenção verdadeira da consumidora era a portabilidade de empréstimos consignados, é caso de declarar-se nulo o contrato na parte que extrapola a vontade manifestada da parte autora. (TJ-MT 10101954320208110002 MT, Relator.: ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Data de Julgamento: 14/12/2022, Terceira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 21/12/2022) Declarada a nulidade dos contratos impugnados, impõe-se a restituição dos valores indevidamente descontados, como corolário lógico do princípio da vedação ao enriquecimento sem causa, que permeia todo o ordenamento jurídico pátrio e encontra expressa positivação na legislação civil. Defende o apelante que devida a restituição dos valores descontados na forma simples, uma vez que não comprovada a má-fé. Deve-se observar que a sentença determinou a restituição simples, razão pela qual deixo de analisar esse ponto do apelo. Portanto, conclui-se que a sentença recorrida não merece qualquer reparo. Posto isso, NEGO PROVIMENTO ao recurso de apelação, mantendo integralmente a sentença recorrida. Em razão da sucumbência recursal, majoro os honorários advocatícios devidos pelo apelante aos patronos do apelado em 2% (dois por cento) sobre o valor atualizado da condenação, totalizando o percentual de 12% (doze por cento), nos termos do dispositivo legal pertinente, considerando o trabalho adicional realizado em grau recursal. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 23/07/2025

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