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Nilvania Aparecida Souza Fernandes x Banco Bmg S.A.

ID: 261331264

Tribunal: TJMT Órgão: 1ª VARA CÍVEL DE BARRA DO GARÇAS Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1002080-51.2025.8.11.0004

Data de Disponibilização: 28/04/2025

Polo Ativo:

NILVANIA APARECIDA SOUZA FERNANDES

Polo Passivo:

BANCO BMG S.A.

Sentença

Advogados:

LETHICIA CARVALHO PENHA

OAB/DF XXXXXX Desbloquear

ITALO DA SILVA FRAGA

OAB/GO XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 1ª VARA CÍVEL DE BARRA DO GARÇAS SENTENÇA Processo: 1002080-51.2025.8.11.0004. REQUERENTE: NILVANIA APARECIDA SOUZA FERNANDES REQUERIDO: BANCO BMG S.A. Vistos. … ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 1ª VARA CÍVEL DE BARRA DO GARÇAS SENTENÇA Processo: 1002080-51.2025.8.11.0004. REQUERENTE: NILVANIA APARECIDA SOUZA FERNANDES REQUERIDO: BANCO BMG S.A. Vistos. 1. Trata-se de AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO, ajuizada por NILVANIA APARECIDA SOUZA FERNANDES contra BANCO BMG S.A., na qual a autora pretende a declaração de inexistência de débito, a devolução em dobro dos valores descontados indevidamente, a conversão do contrato para mútuo simples e a condenação da parte ré ao pagamento de indenização por danos morais. 2. Narra a autora que é beneficiária de pensão por morte previdenciária e que, a partir de setembro de 2022, passou a sofrer descontos mensais no valor de R$ 75,90, referentes a um suposto contrato de cartão de crédito consignado n. 17815512, do qual alega não ter tido conhecimento ou autorizado a contratação. Afirma que nunca solicitou tal cartão e que os valores descontados não amortizam a dívida, configurando-se um débito impagável. Alega que o banco réu reteve 5% da margem consignável do benefício sem o seu consentimento, causando-lhe prejuízo financeiro e impossibilitando a contratação de novos empréstimos em outras instituições. 3. Requer a concessão da gratuidade da justiça, bem como a inversão do ônus da prova. Também pleiteia a declaração de inexistência do débito, bem como a cessação dos descontos. Alternativamente, postula pela revisão do contrato para mútuo simples, com aplicação de juros limitados a 2% ao mês de forma simples, a devolução em dobro dos valores descontados indevidamente, e a condenação da parte ré ao pagamento de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) a título de danos morais. Subsidiariamente, requer a restituição dos valores na forma simples e, caso a dívida não tenha sido quitada, que os descontos sejam realizados de forma parcelada, respeitando a margem consignável. 4. A inicial está acompanhada de documentos pessoais da autora, comprovante de endereço, procuração e extratos do INSS demonstrando parte dos descontos questionados. 5. Foi proferida decisão determinando a emenda à inicial para que, diante dos indícios de litigância predatória, a autora apresentasse procuração com firma reconhecida, cópia atualizada do contrato objeto da lide, bem como cópia das faturas que demonstrem a não utilização do cartão, além de documento que comprove a necessidade da gratuidade da justiça. Também foi determinado que a autora apresente cópia do histórico de créditos do INSS desde o início dos descontos e que apresentasse substabelecimento assinado em favor da advogada Lethicia Carvalho Penha, bem como regularizasse sua qualificação. Em resposta, anexou aos autos apenas documentos relativos a sua necessidade da gratuidade da justiça. Em resposta, se limitou a postular pela inversão do ônus da prova e anexou aos autos substabelecimento assinado digitalmente pelo advogado Ítalo da Silva Fraga. 6. É O RELATÓRIO. FUNDAMENTO E DECIDO. 7. Conforme recente orientação do Tema 91, IRDR - Cv Nº 1.0000.22.157099-7/002, julgado pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais: [..] “O modelo de justiça multiportas põe ao lado da jurisdição estatal um cabedal de alternativas, na linha da proposta da solução adequada dos conflitos. O atual desenho do modelo no Código de Processo Civil não se aproxima da cláusula escalonada. É dizer: a autocomposição não é pressuposto da demanda, mas uma de suas etapas. A resposta do ordenamento para a compatibilização entre a inafastabilidade da jurisdição e o crescente prestígio dos meios autocompositivos é a mescla e não o escalonamento.” 8. No mesmo julgamento, foi definido que “Não basta, nos casos de registros realizados perante o Serviços de Atendimento do Cliente (SAC) mantido pelo fornecedor, a mera indicação pelo consumidor de número de protocolo.”. 9. O “interesse de agir” ou “interesse processual” tem previsão legal expressa (CPC/2015, arts. 17, 19, 330, 337 e 485) e subdivide-se em interesse-utilidade e interesse-necessidade”. Para FREDIE DIDIER JR[1], existe utilidade na jurisdição “toda vez que o processo puder propiciar ao demandante o resultado favorável pretendido”. Já o interesse-necessidade parte do pressuposto de que “a jurisdição deve ser encarada como última forma de solução de conflito”. 10. É certo que a parte autora deve fornecer as provas mínimas dos fatos constitutivos de seu direito, bem como buscar a solução administrativa do conflito não caracteriza encargo demasiado, mas sim demonstra a boa-fé e cooperação do autor para resolução da controvérsia. Não se está aqui de forma alguma pretendendo suplantar a garantia da Inafastabilidade da Jurisdição (art.5º, XXXV, CF), nem tampouco que o jurisdicionado esgote todas as vias inimagináveis no sentido de resolver o conflito sem interferência do Estado. O que se exige da parte é a simples demonstração da necessidade de intervenção do Poder Judiciário para a resolução da celeuma, que pode se consubstanciar, por exemplo, com o envio de e-mail ou ligação na ouvidoria da instituição. 11. É a partir dessa realidade que o CPC vigente investiu muito nos métodos consensuais de solução de conflitos (conciliação e mediação), nos quais há a importante figura do facilitador para que as próprias partes cheguem à solução do conflito e à pacificação mais completa. Os parágrafos do art. 3º estabelecem a sua promoção como dever do Estado-Juiz, cuja postura deve ser incentivada por todas as instituições ligadas à justiça, inclusive antes da judicialização do conflito. (TJ-MT - AC: 10008391220208110006 MT, Relator: CLARICE CLAUDINO DA SILVA, Data de Julgamento: 24/06/2020, Segunda Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 03/07/2020). 12. Por fim, destaca-se que não se trata de prova diabólica, pois basta que a autora demonstre que tentou requisitar solucionar o conflito, mesmo não obtendo êxito. 13. Outro não é o entendimento do Tribunal de Justiça do Mato Grosso: “RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS - INDEFERIMENTO DA INICIAL - EXTINÇÃO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO - AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR - INEXISTÊNCIA DE LIDE - NÃO DEMONSTRAÇÃO PELA AUTORA DE PRETENSÃO RESISTIDA PELA PARTE ADVERSA - SENTENÇA MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO. Não se reconhece a existência de lide, se ausentes dos autos indícios de que tenha a parte adversa oferecido resistência à pretensão veiculada pela autora, mormente se não demonstra minimamente tenha buscado as vias administrativas previamente ao ajuizamento da demanda. Ademais, em consulta ao site desta E. Corte, constata-se que o patrono destes autos ajuizou em nome da autora, 13 (treze) ações distintas em face das mais diversas instituições financeiras e de associações, insistindo na inexistência de relação jurídica, circunstância que, a princípio, revela abuso do direito de petição, com indícios de demandismo, situação que não pode ser avalizada pelo Judiciário .- (TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 10081626320238110006, Relator.: MARILSEN ANDRADE ADDARIO, Data de Julgamento: 24/01/2024, Segunda Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 28/01/2024)” 14. Ressalte-se que a intimação da parte para a apresentação de documentos que comprovem a tentativa de solução administrativa prévia, com o objetivo de caracterizar a pretensão resistida, é, inclusive, uma das medidas previstas pela Recomendação nº 159 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para coibir a prática de advocacia predatória. E, em pesquisa realizada no sistema PJE, observa-se que os mesmos advogados que subscrevem a petição inicial já propuseram variadas demandas, representando parte distinta, com circunstâncias similares, diferindo apenas o objeto dos autos. 15. Desse modo, percebe-se que a parte autora não cumpriu o disposto no artigo 321, do CPC, tendo em vista que não comprovou o interesse de agir e a existência de pretensão resistida, por meio da tentativa de solução extrajudicial do conflito. O autor também não apresentou procuração com firma reconhecida, cópia do contrato e das faturas, além de extrato do INSS. DISPOSITIVO: 16. Frente ao exposto, não tendo a autora cumprido o comando judicial, JULGO EXTINTO O PROCESSO, sem resolução do mérito, com fulcro no art. 485, I, do CPC. 17. Sem condenação em honorários, uma vez que sequer houve a formação de relação processual. 18. CONDENO a parte autora no pagamento das custas processuais. No entanto, DEFIRO o benefício da gratuidade da justiça ao autor, nos termos do art. 98 do CPC, razão pela qual a referida verba deverá ficar sob a condição SUSPENSIVA de exigibilidade, conforme preceitua o art. 98, §3º, CPC/2015, uma vez que é beneficiária da Justiça Gratuita. 19. Após o trânsito em julgado, ARQUIVEM-SE os autos com as baixas e anotações necessárias. 20. Expeça-se o necessário. Cumpra-se. Barra do Garças/MT. MICHELL LOTFI ROCHA DA SILVA JUIZ DE DIREITO [1] Curso de Direito Processual Civil v. 1. Teoria Geral do Processo e do Processo de Conhecimento. 9ª edição, p.188.

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Processo nº 1002088-22.2025.8.11.0006

ID: 318339513

Tribunal: TJMT Órgão: Quarta Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1002088-22.2025.8.11.0006

Data de Disponibilização: 07/07/2025

Polo Ativo:

ELIZABETE EMILIA VALEJO

Polo Passivo:

Decisão

Advogados:

ITALO DA SILVA FRAGA

OAB/GO XXXXXX Desbloquear

LETHICIA CARVALHO PENHA

OAB/DF XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO DE MATO GROSSO TRIBUNAL DE JUSTIÇA 1002088-22.2025.8.11.0006 APELANTE: ELIZABETE EMILIA VALEJO APELADO: MERCANTIL DO BRASIL FINANCEIRA SA CREDITO FIN E INVEST Des. RUBENS DE OLIVEIRA… PODER JUDICIÁRIO DE MATO GROSSO TRIBUNAL DE JUSTIÇA 1002088-22.2025.8.11.0006 APELANTE: ELIZABETE EMILIA VALEJO APELADO: MERCANTIL DO BRASIL FINANCEIRA SA CREDITO FIN E INVEST Des. RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO DECISÃO MONOCRÁTICA APELAÇÃO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO. JUSTIÇA GRATUITA REQUERIDA EM PRIMEIRO GRAU. AUSÊNCIA DE APRECIAÇÃO. CONCESSÃO TÁCITA. INDEFERIMENTO DA INICIAL POR FALTA DE PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. DESNECESSIDADE. PRINCÍPIO DA INAFASTABILIDADE DA JURISDIÇÃO (ART. 5º, XXXV, CF). SENTENÇA DESCONSTITUÍDA. RECURSO PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Apelação interposta contra sentença que extinguiu, sem resolução do mérito, ação de obrigação de fazer cumulada com indenização por danos morais e repetição de indébito, com fundamento nos arts. 321, parágrafo único, e 485, I, do CPC, em razão do não atendimento à determinação de emenda da inicial para comprovação de pretensão resistida. A autora alegou que não contratou empréstimo consignado, mas sim operação de saque por meio de cartão de crédito, sem sua anuência. Pleiteou ainda o deferimento do benefício da gratuidade da justiça. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (i) definir se é exigível o prévio requerimento administrativo como condição para o exercício do direito de ação em demanda de revisão contratual bancária; e (ii) estabelecer se o pedido de gratuidade da justiça formulado na inicial foi tacitamente deferido. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. O acesso à Justiça é garantido constitucionalmente e não pode ser condicionado à demonstração de prévio esgotamento da via administrativa, conforme o art. 5º, XXXV, da Constituição Federal. 4. A ausência de manifestação administrativa da parte ré não configura falta de interesse de agir quando presentes indícios da relação jurídica e da lesão alegada, como no caso dos autos, em que foram apresentados documentos que demonstram os descontos questionados. 5. O pedido de gratuidade da justiça, embora não tenha sido expressamente analisado na sentença, deve ser considerado tacitamente deferido quando não houver indeferimento expresso, conforme entendimento pacificado nos julgados do STJ. IV. DISPOSITIVO E TESE 6. Recurso provido. Tese de julgamento: 1. O ajuizamento de ação para revisão contratual ou declaração de inexistência de débito não exige prévio requerimento administrativo, em respeito ao princípio da inafastabilidade da jurisdição. 2. O pedido de gratuidade de justiça não apreciado expressamente pelo juízo é considerado tacitamente deferido, na ausência de indeferimento. Apelação em Ação de Obrigação de Fazer c/c Indenização por Danos Morais c/c Repetição de Indébito extinta com amparo nos arts. 321, § único e 485, inciso I, ambos do CPC. A apelante pede o benefício da gratuidade da justiça. Alega que ajuizou ação judicial em razão de empréstimo supostamente contratado, que, na verdade, não se tratava de um empréstimo consignado comum, mas de uma operação de saque mediante cartão de crédito, sem sua anuência. Relata que a sentença indeferiu a inicial entendendo que não havia comprovação da existência de pretensão resistida, já que ela não teria demonstrado a negativa da instituição financeira no âmbito administrativo. Argumenta que a ausência de requerimento administrativo não constitui óbice ao ajuizamento da ação judicial. Menciona que tal exigência viola o princípio da inafastabilidade da jurisdição, previsto no art. 5º, XXXV da Constituição Federal. Cita precedentes do Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso, nos quais se reconhece a desnecessidade de exaurimento da via administrativa em casos similares. Sustenta ainda que a autora apresentou documentos suficientes que demonstram a plausibilidade da ação e a existência de relação jurídica com a instituição financeira, justificando o interesse de agir. Por fim, requer a reforma da sentença, possibilitando o regular processamento do feito, sem a exigência de requerimento administrativo prévio, e que a inicial seja recebida para análise de mérito. Contrarrazões no Id 296387884. É o relatório. Justiça Gratuita Nesta lide, embora a gratuidade tenha sido pleiteada na inicial, o pedido não foi apreciado, o que leva à conclusão de que foi tacitamente deferida. Nesse sentido: AgInt no RMS 60388/TO; AgInt no REsp 1744453/MG; AgInt no AREsp 1213743/SP; AgInt nos EDcl no AREsp 1319316/MS. Mérito A apelante ajuizou a presente ação com o objetivo de obter a declaração de inexistência de débito, a restituição em dobro dos valores indevidamente descontados, a conversão do contrato, bem como a condenação da parte ré ao pagamento de indenização por danos morais. O juízo de origem mandou emendar a inicial com o comprovante do prévio pedido formulado diretamente ao apelado para demonstrar a pretensão resistida, sob pena de indeferimento da inicial. Ante o não cumprimento dessa ordem, a lide foi extinta sem julgamento do mérito. Contudo, nos casos como o destes autos a lei não exige que a parte busque previamente a solução pela via administrativa. Dessa forma, não há impedimento para que a autora busque a revisão contratual, independentemente do pedido administrativo, em observância ao princípio constitucional de acesso à Justiça (art. 5º, XXXV, da CF). Nesse sentido: “AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. PRESTAÇÃO DE CONTAS. FUNDO 157. ESGOTAMENTO DA VIA ADMINISTRATIVA. DESNECESSIDADE. DECISÃO MANTIDA. 1. Não constitui requisito para a aferição do interesse processual a comprovação do encaminhamento de requerimento administrativo daquilo que se postula judicialmente. 2. Agravo interno a que se nega provimento”. (STJ - AgInt no REsp: 1954342 RS 2021/0248738-0, Relator: Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, Data de Julgamento: 21/02/2022, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 25/02/2022). Deste Tribunal: “APELAÇÃO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO. INDEFERIMENTO DA INICIAL. EXTINÇÃO DA LIDE SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. AUSÊNCIA DE JUNTADA DO PRÉVIO REQUERIMENTO NA VIA ADMINISTRATIVA. FINALIDADE DE COMPROVAR O INTERESSE DE AGIR. INVIABILIDADE. PRINCÍPIO DA INAFASTABILIDADE DA JURISDIÇÃO. ART. 5º, XXXV, DA CF. SENTENÇA DESCONSTITUÍDA. RECURSO PROVIDO. I. CASO EM EXAME Apelação interposta em face de sentença que extinguiu, sem resolução do mérito, ação de obrigação de fazer cumulada com pedido de indenização por danos morais e repetição de indébito, com fundamento no art. 485, I, do CPC, diante da ausência de demonstração de pretensão resistida. A autora alegou não ter contratado cartão de crédito, mas sim empréstimo consignado, tendo sido surpreendida por descontos mensais oriundos de reserva de margem consignável (RMC), sem seu consentimento. Sustentou a inaplicabilidade da exigência de requerimento administrativo prévio à propositura da demanda judicial. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO A questão em discussão consiste em definir se é exigível, como condição para propositura da ação, o prévio requerimento administrativo à instituição financeira para caracterização da pretensão resistida, em demandas que envolvem descontos indevidos oriundos de contrato bancário não reconhecido. III. RAZÕES DE DECIDIR O acesso à jurisdição independe do esgotamento da via administrativa, conforme estabelece o art. 5º, XXXV, da Constituição Federal, sendo vedada a exigência de requerimento administrativo como condição para o exercício do direito de ação. A exigência de demonstração da pretensão resistida como requisito à propositura da ação não encontra respaldo legal nas hipóteses em que se discute relação contratual bancária e descontos em folha de pagamento decorrentes de operação não reconhecida. O descumprimento da determinação judicial de emenda da inicial, para juntar documento de prévio requerimento administrativo, não justifica a extinção do feito sem resolução do mérito, quando ausente previsão legal para tal exigência. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso provido. Tese de julgamento: O ajuizamento de ação para discutir descontos indevidos decorrentes de contratação bancária supostamente não reconhecida independe de requerimento administrativo prévio. A ausência de demonstração da pretensão resistida não justifica a extinção do feito, quando não há exigência legal para tentativa prévia de solução administrativa da controvérsia. O princípio da inafastabilidade do Poder Judiciário (art. 5º, XXXV, da CF) assegura o direito de acesso à jurisdição independentemente de esgotamento da via administrativa”. (N.U 1002080-51.2025.8.11.0004, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 30/06/2025, Publicado no DJE 30/06/2025) “PROCESSO CIVIL – RECURSO DE APELAÇÃO - AÇÃO REVISIONAL C/C CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO - INDEFERIMENTO DA INICIAL POR AUSÊNCIA DE PRETENSÃO RESISTIDA – DESNECESSIDADE – INTERESSE DE AGIR DEMONSTRADO – DESNECESSIDADE DE PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO – PRINCÍPIO DA INAFASTABILIDADE DA JURISDIÇÃO – SENTENÇA CASSADA – RECURSO PROVIDO. A ausência de prévio requerimento administrativo não é óbice para a propositora da ação revisional de contrato bancário, na qual o autor pretende a revisão dos juros do contrato, sob a alegação de serem abusivos. O interesse de agir deve ser analisado à luz do princípio da inafastabilidade da jurisdição, previsto no art. 5º, XXXV, da Constituição Federal, que assim dispõe: “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”. (N.U 1006012-85.2018.8.11.0006, Carlos Alberto Alves da Rocha, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 13/10/2024, Publicado no DJE 13/10/2024) “RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO REVISIONAL CONTRATUAL BANCÁRIA C/C INDENIZATÓRIA DE DANOS – EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO – AUSÊNCIA DE PRESSUPOSTO DE DESENVOLVIMENTO VÁLIDO E REGULAR DO PROCESSO – ART. 485, INCISO IV, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL – COMPROVADA A HIPOSSUFICIÊNCIA – CONCESSÃO DA JUSTIÇA GRATUITA – AUSÊNCIA DE COMPROVANTE DE PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO – DESNECESSIDADE – INTERESSE PROCESSUAL EVIDENCIADO – SENTENÇA ANULADA – RECURSO PROVIDO. 1. O decurso de prazo para comprovação da situação de hipossuficiência econômica não se trata de requisito da inicial, logo a ação não pode ser extinta por esse motivo. No entanto, comprovada a situação de insuficiência de recursos, deve ser concedida os benefícios da justiça gratuita a parte. 2. Não constitui requisito para a aferição do interesse processual a comprovação do encaminhamento de requerimento administrativo daquilo que se postula judicialmente. (STJ. AgInt no REsp n. 1.954.342/RS, relator Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, julgado em 21/2/2022, DJe de 25/2/2022)”. (N.U 1012373-45.2023.8.11.0006, Marcos Regenold Fernandes, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 11/07/2024, Publicado no DJE 11/07/2024) Pelo exposto, dou provimento ao Recurso para desconstituir a sentença e determinar o retorno dos autos ao juízo de origem para normal prosseguimento. Cuiabá, 04 de julho de 2025. Des. Rubens de Oliveira Santos Filho Relator

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Processo nº 1002088-22.2025.8.11.0006

ID: 318339516

Tribunal: TJMT Órgão: Quarta Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1002088-22.2025.8.11.0006

Data de Disponibilização: 07/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

MERCANTIL DO BRASIL FINANCEIRA SA CREDITO FIN E INVEST

Decisão

PODER JUDICIÁRIO DE MATO GROSSO TRIBUNAL DE JUSTIÇA 1002088-22.2025.8.11.0006 APELANTE: ELIZABETE EMILIA VALEJO APELADO: MERCANTIL DO BRASIL FINANCEIRA SA CREDITO FIN E INVEST Des. RUBENS DE OLIVEIRA… PODER JUDICIÁRIO DE MATO GROSSO TRIBUNAL DE JUSTIÇA 1002088-22.2025.8.11.0006 APELANTE: ELIZABETE EMILIA VALEJO APELADO: MERCANTIL DO BRASIL FINANCEIRA SA CREDITO FIN E INVEST Des. RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO DECISÃO MONOCRÁTICA APELAÇÃO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO. JUSTIÇA GRATUITA REQUERIDA EM PRIMEIRO GRAU. AUSÊNCIA DE APRECIAÇÃO. CONCESSÃO TÁCITA. INDEFERIMENTO DA INICIAL POR FALTA DE PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. DESNECESSIDADE. PRINCÍPIO DA INAFASTABILIDADE DA JURISDIÇÃO (ART. 5º, XXXV, CF). SENTENÇA DESCONSTITUÍDA. RECURSO PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Apelação interposta contra sentença que extinguiu, sem resolução do mérito, ação de obrigação de fazer cumulada com indenização por danos morais e repetição de indébito, com fundamento nos arts. 321, parágrafo único, e 485, I, do CPC, em razão do não atendimento à determinação de emenda da inicial para comprovação de pretensão resistida. A autora alegou que não contratou empréstimo consignado, mas sim operação de saque por meio de cartão de crédito, sem sua anuência. Pleiteou ainda o deferimento do benefício da gratuidade da justiça. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (i) definir se é exigível o prévio requerimento administrativo como condição para o exercício do direito de ação em demanda de revisão contratual bancária; e (ii) estabelecer se o pedido de gratuidade da justiça formulado na inicial foi tacitamente deferido. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. O acesso à Justiça é garantido constitucionalmente e não pode ser condicionado à demonstração de prévio esgotamento da via administrativa, conforme o art. 5º, XXXV, da Constituição Federal. 4. A ausência de manifestação administrativa da parte ré não configura falta de interesse de agir quando presentes indícios da relação jurídica e da lesão alegada, como no caso dos autos, em que foram apresentados documentos que demonstram os descontos questionados. 5. O pedido de gratuidade da justiça, embora não tenha sido expressamente analisado na sentença, deve ser considerado tacitamente deferido quando não houver indeferimento expresso, conforme entendimento pacificado nos julgados do STJ. IV. DISPOSITIVO E TESE 6. Recurso provido. Tese de julgamento: 1. O ajuizamento de ação para revisão contratual ou declaração de inexistência de débito não exige prévio requerimento administrativo, em respeito ao princípio da inafastabilidade da jurisdição. 2. O pedido de gratuidade de justiça não apreciado expressamente pelo juízo é considerado tacitamente deferido, na ausência de indeferimento. Apelação em Ação de Obrigação de Fazer c/c Indenização por Danos Morais c/c Repetição de Indébito extinta com amparo nos arts. 321, § único e 485, inciso I, ambos do CPC. A apelante pede o benefício da gratuidade da justiça. Alega que ajuizou ação judicial em razão de empréstimo supostamente contratado, que, na verdade, não se tratava de um empréstimo consignado comum, mas de uma operação de saque mediante cartão de crédito, sem sua anuência. Relata que a sentença indeferiu a inicial entendendo que não havia comprovação da existência de pretensão resistida, já que ela não teria demonstrado a negativa da instituição financeira no âmbito administrativo. Argumenta que a ausência de requerimento administrativo não constitui óbice ao ajuizamento da ação judicial. Menciona que tal exigência viola o princípio da inafastabilidade da jurisdição, previsto no art. 5º, XXXV da Constituição Federal. Cita precedentes do Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso, nos quais se reconhece a desnecessidade de exaurimento da via administrativa em casos similares. Sustenta ainda que a autora apresentou documentos suficientes que demonstram a plausibilidade da ação e a existência de relação jurídica com a instituição financeira, justificando o interesse de agir. Por fim, requer a reforma da sentença, possibilitando o regular processamento do feito, sem a exigência de requerimento administrativo prévio, e que a inicial seja recebida para análise de mérito. Contrarrazões no Id 296387884. É o relatório. Justiça Gratuita Nesta lide, embora a gratuidade tenha sido pleiteada na inicial, o pedido não foi apreciado, o que leva à conclusão de que foi tacitamente deferida. Nesse sentido: AgInt no RMS 60388/TO; AgInt no REsp 1744453/MG; AgInt no AREsp 1213743/SP; AgInt nos EDcl no AREsp 1319316/MS. Mérito A apelante ajuizou a presente ação com o objetivo de obter a declaração de inexistência de débito, a restituição em dobro dos valores indevidamente descontados, a conversão do contrato, bem como a condenação da parte ré ao pagamento de indenização por danos morais. O juízo de origem mandou emendar a inicial com o comprovante do prévio pedido formulado diretamente ao apelado para demonstrar a pretensão resistida, sob pena de indeferimento da inicial. Ante o não cumprimento dessa ordem, a lide foi extinta sem julgamento do mérito. Contudo, nos casos como o destes autos a lei não exige que a parte busque previamente a solução pela via administrativa. Dessa forma, não há impedimento para que a autora busque a revisão contratual, independentemente do pedido administrativo, em observância ao princípio constitucional de acesso à Justiça (art. 5º, XXXV, da CF). Nesse sentido: “AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. PRESTAÇÃO DE CONTAS. FUNDO 157. ESGOTAMENTO DA VIA ADMINISTRATIVA. DESNECESSIDADE. DECISÃO MANTIDA. 1. Não constitui requisito para a aferição do interesse processual a comprovação do encaminhamento de requerimento administrativo daquilo que se postula judicialmente. 2. Agravo interno a que se nega provimento”. (STJ - AgInt no REsp: 1954342 RS 2021/0248738-0, Relator: Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, Data de Julgamento: 21/02/2022, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 25/02/2022). Deste Tribunal: “APELAÇÃO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO. INDEFERIMENTO DA INICIAL. EXTINÇÃO DA LIDE SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. AUSÊNCIA DE JUNTADA DO PRÉVIO REQUERIMENTO NA VIA ADMINISTRATIVA. FINALIDADE DE COMPROVAR O INTERESSE DE AGIR. INVIABILIDADE. PRINCÍPIO DA INAFASTABILIDADE DA JURISDIÇÃO. ART. 5º, XXXV, DA CF. SENTENÇA DESCONSTITUÍDA. RECURSO PROVIDO. I. CASO EM EXAME Apelação interposta em face de sentença que extinguiu, sem resolução do mérito, ação de obrigação de fazer cumulada com pedido de indenização por danos morais e repetição de indébito, com fundamento no art. 485, I, do CPC, diante da ausência de demonstração de pretensão resistida. A autora alegou não ter contratado cartão de crédito, mas sim empréstimo consignado, tendo sido surpreendida por descontos mensais oriundos de reserva de margem consignável (RMC), sem seu consentimento. Sustentou a inaplicabilidade da exigência de requerimento administrativo prévio à propositura da demanda judicial. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO A questão em discussão consiste em definir se é exigível, como condição para propositura da ação, o prévio requerimento administrativo à instituição financeira para caracterização da pretensão resistida, em demandas que envolvem descontos indevidos oriundos de contrato bancário não reconhecido. III. RAZÕES DE DECIDIR O acesso à jurisdição independe do esgotamento da via administrativa, conforme estabelece o art. 5º, XXXV, da Constituição Federal, sendo vedada a exigência de requerimento administrativo como condição para o exercício do direito de ação. A exigência de demonstração da pretensão resistida como requisito à propositura da ação não encontra respaldo legal nas hipóteses em que se discute relação contratual bancária e descontos em folha de pagamento decorrentes de operação não reconhecida. O descumprimento da determinação judicial de emenda da inicial, para juntar documento de prévio requerimento administrativo, não justifica a extinção do feito sem resolução do mérito, quando ausente previsão legal para tal exigência. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso provido. Tese de julgamento: O ajuizamento de ação para discutir descontos indevidos decorrentes de contratação bancária supostamente não reconhecida independe de requerimento administrativo prévio. A ausência de demonstração da pretensão resistida não justifica a extinção do feito, quando não há exigência legal para tentativa prévia de solução administrativa da controvérsia. O princípio da inafastabilidade do Poder Judiciário (art. 5º, XXXV, da CF) assegura o direito de acesso à jurisdição independentemente de esgotamento da via administrativa”. (N.U 1002080-51.2025.8.11.0004, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 30/06/2025, Publicado no DJE 30/06/2025) “PROCESSO CIVIL – RECURSO DE APELAÇÃO - AÇÃO REVISIONAL C/C CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO - INDEFERIMENTO DA INICIAL POR AUSÊNCIA DE PRETENSÃO RESISTIDA – DESNECESSIDADE – INTERESSE DE AGIR DEMONSTRADO – DESNECESSIDADE DE PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO – PRINCÍPIO DA INAFASTABILIDADE DA JURISDIÇÃO – SENTENÇA CASSADA – RECURSO PROVIDO. A ausência de prévio requerimento administrativo não é óbice para a propositora da ação revisional de contrato bancário, na qual o autor pretende a revisão dos juros do contrato, sob a alegação de serem abusivos. O interesse de agir deve ser analisado à luz do princípio da inafastabilidade da jurisdição, previsto no art. 5º, XXXV, da Constituição Federal, que assim dispõe: “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”. (N.U 1006012-85.2018.8.11.0006, Carlos Alberto Alves da Rocha, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 13/10/2024, Publicado no DJE 13/10/2024) “RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO REVISIONAL CONTRATUAL BANCÁRIA C/C INDENIZATÓRIA DE DANOS – EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO – AUSÊNCIA DE PRESSUPOSTO DE DESENVOLVIMENTO VÁLIDO E REGULAR DO PROCESSO – ART. 485, INCISO IV, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL – COMPROVADA A HIPOSSUFICIÊNCIA – CONCESSÃO DA JUSTIÇA GRATUITA – AUSÊNCIA DE COMPROVANTE DE PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO – DESNECESSIDADE – INTERESSE PROCESSUAL EVIDENCIADO – SENTENÇA ANULADA – RECURSO PROVIDO. 1. O decurso de prazo para comprovação da situação de hipossuficiência econômica não se trata de requisito da inicial, logo a ação não pode ser extinta por esse motivo. No entanto, comprovada a situação de insuficiência de recursos, deve ser concedida os benefícios da justiça gratuita a parte. 2. Não constitui requisito para a aferição do interesse processual a comprovação do encaminhamento de requerimento administrativo daquilo que se postula judicialmente. (STJ. AgInt no REsp n. 1.954.342/RS, relator Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, julgado em 21/2/2022, DJe de 25/2/2022)”. (N.U 1012373-45.2023.8.11.0006, Marcos Regenold Fernandes, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 11/07/2024, Publicado no DJE 11/07/2024) Pelo exposto, dou provimento ao Recurso para desconstituir a sentença e determinar o retorno dos autos ao juízo de origem para normal prosseguimento. Cuiabá, 04 de julho de 2025. Des. Rubens de Oliveira Santos Filho Relator

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Processo nº 1000005-92.2023.8.11.0106

ID: 327530677

Tribunal: TJMT Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1000005-92.2023.8.11.0106

Data de Disponibilização: 17/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

ISAIAS GOMES DE OLIVEIRA JULIO RIBEIRO BISPO

Acórdão

Advogados:

WANDE ALVES DINIZ

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1000005-92.2023.8.11.0106 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Fornecimento de Ener… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1000005-92.2023.8.11.0106 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Fornecimento de Energia Elétrica] Relator: Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA Turma Julgadora: [DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES] Parte(s): [ENERGISA MATO GROSSO DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A - CNPJ: 03.467.321/0001-99 (APELANTE), EDUARDO QUEIROGA ESTRELA MAIA PAIVA - CPF: 078.165.854-38 (ADVOGADO), JALDEMIRO RODRIGUES DE ATAIDE JUNIOR - CPF: 008.037.384-47 (ADVOGADO), VINICIUS MEDEIROS MARQUES - CPF: 070.523.144-52 (ADVOGADO), GEORGE OTTAVIO BRASILINO OLEGARIO - CPF: 058.141.644-92 (ADVOGADO), GUILHERME ULYSSES DE OLIVEIRA - CPF: 700.096.344-10 (ADVOGADO), JULIO RIBEIRO BISPO - CPF: 010.452.741-27 (APELADO), WANDE ALVES DINIZ - CPF: 191.714.711-20 (ADVOGADO), VANESSA STEFANIE TEREBINTO DE ARAUJO - CPF: 003.135.041-05 (ADVOGADO), ISAIAS GOMES DE OLIVEIRA - CPF: 353.079.431-72 (APELADO), AGUINALDO ALVES DE SOUZA - CPF: 032.077.961-09 (ASSISTENTE), DANIEL SERVO DA SILVA - CPF: 328.930.601-10 (ASSISTENTE), DIONILA KELLE NUNES DA SILVA DAVID - CPF: 026.350.051-92 (ASSISTENTE), EURIPEDES SEVERANO AIER - CPF: 328.917.091-87 (ASSISTENTE), JEREMIAS GOMES DE OLIVEIRA - CPF: 328.930.001-34 (ASSISTENTE), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A APELANTE: ENERGISA MATO GROSSO - DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A. APELADOS: Isaias Gomes De Oliveira e Julio Ribeiro Bispo. EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. PEDIDO DE EFEITO SUSPENSIVO NA APELAÇÃO. REJEIÇÃO. NECESSIDADE DE REQUERIMENTO AUTÔNOMO. ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE JUNTADA DO PRÉVIO REQUERIMENTO NA VIA ADMINISTRATIVA. INVIABILIDADE. PRINCÍPIO DA INAFASTABILIDADE DA JURISDIÇÃO. FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA EM ÁREA RURAL. GLEBA SÃO SIMÃO. SERVIÇO PÚBLICO ESSENCIAL. REDE DE DISTRIBUIÇÃO. PROGRAMA “LUZ PARA TODOS”. OMISSÃO INJUSTIFICADA. UNIVERSALIZAÇÃO DO ACESSO. DIREITO À DIGNIDADE E À MORADIA. MULTA COMINATÓRIA. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME Apelação Cível interposta por Energisa Mato Grosso – Distribuidora de Energia S.A. contra sentença que julgou procedente Ação de Obrigação de Fazer, com pedido liminar, determinando a instalação de energia elétrica na Gleba São Simão, zona rural do Município de Novo São Joaquim/MT, no prazo de 90 dias, sob pena de multa diária. A concessionária sustentou, em síntese, impossibilidade técnica de cumprimento no prazo fixado, ausência de requerimento administrativo e ofensa à legalidade administrativa e à separação dos poderes. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Há duas questões em discussão: (i) definir se a ausência de prévio requerimento administrativo impede o ajuizamento da ação; e (ii) estabelecer se a concessionária pode se eximir de implantar rede elétrica em área rural sob a alegação de inviabilidade técnica e cronograma do Programa “Luz para Todos”. III. RAZÕES DE DECIDIR O pedido de atribuição de efeito suspensivo ao recurso de apelação deve ser formulado em petição incidental em apartado e não no bojo da própria peça recursal, consoante disposto no Código de Processo Civil. O prévio requerimento administrativo não constitui condição para o exercício do direito de ação, conforme o princípio da inafastabilidade da jurisdição (CF, art. 5º, XXXV), sendo vedado obstar o acesso ao Judiciário por ausência de provocação administrativa. A concessionária tem dever legal e contratual de garantir a universalização do serviço público de energia elétrica, nos termos do art. 175 da CF e da Lei nº 8.987/1995, devendo promover a construção e expansão da rede nas áreas sob sua concessão. A omissão na prestação do serviço essencial de energia elétrica a comunidades rurais viola os princípios da dignidade da pessoa humana, do mínimo existencial e da igualdade de tratamento entre consumidores urbanos e rurais. A alegação de que o cronograma do Programa “Luz para Todos” autoriza a postergação do fornecimento não se sustenta diante da urgência social e da responsabilidade da concessionária de atender as demandas concretas de sua área de atuação. O prazo de 90 dias fixado judicialmente atende à realidade fática do caso e não afronta normas técnicas da ANEEL, sendo admissível a fixação judicial de prazo específico diante da omissão administrativa. A empresa já havia cumprido a obrigação determinada na sentença, o que torna inócuas as alegações recursais quanto à impossibilidade técnica e ao prazo. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso conhecido e desprovido. Tese de julgamento: O acesso ao Judiciário independe de prévio requerimento administrativo, conforme o princípio da inafastabilidade da jurisdição. A concessionária de energia elétrica tem obrigação legal de implantar infraestrutura de distribuição nas áreas sob sua concessão, inclusive em zonas rurais. O fornecimento de energia elétrica é serviço essencial e sua omissão, ainda que sob alegação de cronograma administrativo, fere direitos fundamentais e impõe a responsabilização judicial da concessionária. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, arts. 5º, XXXV, e 175; CDC, art. 22; CPC, arts. 85, §11º, e 1.012; Lei nº 8.987/1995; Resolução Normativa ANEEL nº 1.000/2021, arts. 46 e 56. Jurisprudência relevante citada: TJMT, N.U 1002080-51.2025.8.11.0004, Quarta Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Rubens de Oliveira Santos Filho, j. 30/06/2025; TJSP, AC 1008725-91.2019.8.26.0099, Rel. Des. Itamar Gaino, j. 18/11/2020. R E L A T Ó R I O RELATÓRIO EXMO. SR. DES. SEBASTIÃO DE ARRUDA ALMEIDA. Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de Apelação Cível interposto por Energisa Mato Grosso - Distribuidora de Energia S.A. contra sentença proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Novo São Joaquim-MT, que julgou procedente o pedido formulado na Ação de Obrigação de Fazer, cumulada com pedido de liminar, determinando que a concessionária procedesse à instalação de energia elétrica na Gleba São Simão, no prazo de 90 dias, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00, limitada ao montante de R$ 100.000,00, nos seguintes termos: “(...) JULGO PROCEDENTE o pedido da parte demandante, razão pela qual DETERMINO que a demandada proceda com a instalação de energia elétrica na Gleba São Simão, localizada no Município de Novo São Joaquim/MT, no prazo de 90 (noventa) dias, sob pena de multa diária, que fixo no valor de R$ 1.000,00 (mil reais), limitada ao montante de R$ 100.000,00 (cem mil reais). Pelo princípio da causalidade, CONDENO a parte demandada ao pagamento das despesas, custas processuais e honorários advocatícios, arbitrados estes em 10% do valor da causa, nos termos do art. 85 do CPC. (...)” [grifo original] Em suas razões recursais, a parte recorrente invoca os seguintes questionamentos fático-jurídicos: Preliminar. Da necessidade de atribuição de efeito suspensivo à apelação, diante da impossibilidade técnica de cumprimento da obrigação no prazo fixado no decisum fustigado. Mérito Recursal. Da inexistência de requerimento administrativo regular por parte dos autores; Afirma, ainda, que a instalação de energia está vinculada ao cronograma do Programa “Luz para Todos”, com prazo legal até 31/12/2026; Alega que a sentença violaria os princípios da separação dos poderes e da legalidade administrativa. Recurso tempestivo e custas recolhidas. (ID nº 278673356). A parte apelada apresentou contrarrazões, rebatendo as alegações da parte apelante e defendendo o desprovimento do recurso (ID 284380879). O Representante do Ministério Público, por meio de parecer, absteve-se de se manifestar sobre o mérito da causa, por não vislumbrar hipótese de intervenção obrigatória nos termos do art. 178 do CPC, pugnando pelo prosseguimento do feito. (ID. 295296357) É o relatório. Sebastião de Arruda Almeida Desembargador V O T O R E L A T O R APELANTE: ENERGISA MATO GROSSO - DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A. APELADOS: ISAIAS GOMES DE OLIVEIRA e JULIO RIBEIRO BISPO. VOTO Egrégia Câmara: De proêmio, consigno que o presente recurso comporta juízo de admissibilidade positivo, tanto quanto aos requisitos extrínsecos quanto aos intrínsecos da espécie recursal. Conforme relatado anteriormente, trata-se de recurso de Apelação Cível interposto por Energisa Mato Grosso – Distribuidora de Energia S.A. contra sentença proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Novo São Joaquim-MT, que julgou procedente o pedido formulado na Ação de Obrigação de Fazer, cumulada com pedido de liminar, determinando que a concessionária procedesse à instalação de energia elétrica na Gleba São Simão, no prazo de 90 dias, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00 (mil reais), limitada ao montante de R$ 100.000,00 (cem mil reais). Inconformada com a decisão, a concessionária de serviços energéticos interpôs o presente recurso de apelação. Em suas razões recursais, a apelante argui preliminar sustentando, em síntese, que, no presente caso, é necessária a atribuição de efeito suspensivo ao recurso, tendo em vista a impossibilidade técnica de cumprir a determinação de instalação da rede elétrica na propriedade do autor no prazo de 90 (noventa) dias. No mérito, assevera que os recorridos não comprovaram ter realizado prévio requerimento administrativo antes da propositura da ação. Alega, ainda, que o prazo fixado é tecnicamente inviável, em razão da complexidade da obra, que inclui a construção de subestação e a aquisição de materiais. Sustenta que o cronograma do programa “Luz para Todos” prevê o atendimento até 31/12/2026. Por fim, aduz que a intervenção do Poder Judiciário na imposição de prazos para a realização dessas obras deve respeitar o princípio da separação dos poderes e a complexidade técnica envolvida. Por sua vez, os consumidores, ora recorridos, apresentaram contrarrazões ao recurso, rebatendo os argumentos da parte recorrente e pugnando pelo seu desprovimento, sob o fundamento de que a urgência no fornecimento de energia elétrica aos autores foi devidamente comprovada nos autos, evidenciando que a ausência desse serviço essencial compromete a dignidade da pessoa humana e o direito à moradia, ambos protegidos pela Constituição Federal. Pois bem. Superado o relatório, passo à análise da preliminar arguida pela parte recorrente. Preliminar. 1.1. Do pedido de atribuição de efeito suspensivo à apelação. Inicialmente, a parte ré/apelante pleiteia que o apelo seja recebido também com efeito suspensivo, em razão da presença do periculum in mora e do fumus boni iuris, elementos que, segundo alega, o ensejam. Entretanto, quanto ao efetivo pleito de atribuição do efeito suspensivo ao recurso interposto, não vislumbro como lhe conferir guarida, considerando o disposto no art. 1.012 do CPC, em seus §§ 1º, inciso III, e § 3º, incisos I e II, que preleciona o seguinte: “Art. 1.012. A apelação terá efeito suspensivo. § 1º Além de outras hipóteses previstas em lei, começa a produzir efeitos imediatamente após a sua publicação a sentença que: (...)§ 3ºO pedido de concessão de efeito suspensivo nas hipóteses do § 1º poderá ser formulado por requerimento dirigido ao: I - tribunal, no período compreendido entre a interposição da apelação e sua distribuição, ficando o relator designado para seu exame prevento para julgá-la; II - relator, se já distribuída a apelação.” Da leitura do supracitado dispositivo processual, evidencia-se que o pedido de atribuição de efeito suspensivo ao recurso de apelação deve ser formulado por petição autônoma, dirigida ao Tribunal ou, quando já distribuído o recurso, ao relator, também por petição própria — e não como preliminar recursal, como ocorreu no caso em tela —, o que obsta seu reconhecimento. Nesse sentido, é a jurisprudência hodierna: “RECURSO DE APELAÇÃO – AÇÃO DE REVISÃO DE CONTRATO - PEDIDO DE EFEITO SUSPENSIVO NA APELAÇÃO – NECESSIDADE DE REQUERIMENTO AUTÔNOMO -PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA - AFASTADA – MÉRITO - TAXA DE JUROS REMUNERATÓRIOS – LEGALIDADE EVIDENCIADA – CONSONÂNCIA COM A MÉDIA DE MERCADO PUBLICADO PELO BACEN - AMORTIZAÇÃO PELA TABELA PRICE – ABUSIVIDADE NÃO EVIDENCIADA – SENTENÇA MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO. O pedido de atribuição de efeito suspensivo ao recurso de apelação deve ser formulado em petição incidental em apartado e não no bojo da própria peça recursal, consoante disposto no Código de Processo Civil. (...) (N.U 1000579-85.2023.8.11.0019, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 02/10/2024, publicado no DJE 05/10/2024).” Portanto, rejeito a preliminar vindicada. É como voto. 2.Mérito Recursal. 2.1. Da ausência de prévio requerimento administrativo. Neste ponto, registro que, embora a parte recorrente tenha nominado a questão como preliminar, observa-se que a tese por ela defendida confunde-se com o mérito da demanda, razão pela qual será analisada conjuntamente com este, na medida em que não se trata de matéria processual autônoma capaz de obstar o exame do mérito recursal. Pois bem. No que tange à alegada ausência de provocação na via administrativa, impõe-se esclarecer que tal exigência não configura condição indispensável para a propositura da presente demanda, conforme sustenta a parte recorrente. Com efeito, a inexistência de requerimento prévio perante a Administração Pública não impede o acesso ao Poder Judiciário, porquanto o interesse processual manifesta-se na utilidade e na necessidade da tutela jurisdicional postulada — elementos estes que, no caso concreto, se mostram inequivocamente presentes. A propósito, colhe-se da jurisprudência, in verbis: “APELAÇÃO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO. INDEFERIMENTO DA INICIAL. EXTINÇÃO DA LIDE SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. AUSÊNCIA DE JUNTADA DO PRÉVIO REQUERIMENTO NA VIA ADMINISTRATIVA. FINALIDADE DE COMPROVAR O INTERESSE DE AGIR. INVIABILIDADE. PRINCÍPIO DA INAFASTABILIDADE DA JURISDIÇÃO. ART. 5º, XXXV, DA CF. SENTENÇA DESCONSTITUÍDA. RECURSO PROVIDO. (...)O acesso à jurisdição independe do esgotamento da via administrativa, conforme estabelece o art. 5º, XXXV, da Constituição Federal, sendo vedada a exigência de requerimento administrativo como condição para o exercício do direito de ação. (...) (N.U 1002080-51.2025.8.11.0004, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 30/06/2025, publicado no DJE 30/06/2025)” Portanto, neste ponto recursal, a tese oferecida pela concessionária de energia elétrica não comporta guarida. 2.2. Da impossibilidade técnica para cumprimento da obrigação de fazer. Neste ponto, a concessionária de energia elétrica recorrente aduz, em síntese, a impossibilidade técnica de cumprir a determinação de instalação da rede elétrica, visto que o prazo estabelecido é inferior ao tempo mínimo necessário. Segue afirmando que há perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão proferida, caso a empresa concessionária de energia elétrica permaneça condenada a executar a instalação da rede, especialmente em prazo tão exíguo, de 90 (noventa) dias. Entretanto, razão não lhe assiste. Explico. Extrai-se dos autos, que a concessionária de energia elétrica se limitou a executar a instalação da rede de distribuição exclusivamente na residência dos autores, em claro desprezo às demais famílias residentes na Gleba São Simão, igualmente carentes do serviço público essencial. Desta feita, tal atuação parcial evidencia conduta discriminatória por parte da concessionária e reforça a urgência da efetivação plena da ordem judicial proferida. A propósito, é pacífico que a distribuidora de energia elétrica possui obrigação legal e contratual de realizar os investimentos necessários à construção, manutenção, operação e expansão das redes de distribuição, especialmente aquelas voltadas ao atendimento de unidades consumidoras localizadas em sua área de concessão. Tal dever decorre diretamente do regime jurídico da concessão de serviço público, previsto no art.175 da Constituição Federal, o qual impõe ao Poder Público – e, por delegação, às concessionárias – a obrigação de manter serviço adequado, eficiente, contínuo e universal. Essa diretriz é regulamentada pela Lei nº8.987/1995, que fixa como dever da concessionária garantir a adequada prestação do serviço, mediante os investimentos necessários à sua continuidade e expansão. O serviço de distribuição de energia elétrica, por sua essencialidade, deve observar os princípios da continuidade, segurança, generalidade, modicidade tarifária e eficiência, que compõem o conteúdo do dever de adequação do serviço público. A inobservância desses princípios configura falha na prestação e atrai a responsabilidade objetiva da concessionária, nos termos da legislação aplicável. Tal obrigação é igualmente reforçada pelo art.22 do Código de Defesa do Consumidor, segundo o qual os órgãos públicos, por si ou por meio de concessionárias, devem fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos. A energia elétrica, como serviço público essencial, integra esse rol e sua ausência compromete a dignidade da pessoa humana e o mínimo existencial. Nesse cenário, cabe à ANEEL – Agência Nacional de Energia Elétrica – a normatização e fiscalização da prestação dos serviços pelas distribuidoras, fixando critérios técnicos e prazos para atendimento aos consumidores. Ainda que o art.46 da Resolução Normativa ANEEL nº1.000/2021 tenha sido, em algumas ocasiões, interpretado de forma equivocada como limitador da obrigação de expansão da rede, é imprescindível destacar que referido dispositivo trata exclusivamente da possibilidade de compartilhamento de subestação entre unidades consumidoras do grupo A, não se prestando como fundamento para afastar a obrigação de construção ou ampliação da infraestrutura de distribuição convencional (redes de média e baixa tensão). Portanto, não se pode admitir a tentativa da concessionária de eximir-se de sua responsabilidade, sob alegação de suposta inviabilidade técnica ou ausência de obrigação legal, notadamente quando se trata de comunidades regularmente ocupadas, áreas rurais ou assentamentos onde a população carece de infraestrutura básica. Os moradores dessas localidades têm o mesmo direito de acesso à energia elétrica que os residentes em centros urbanos, sendo inadmissível qualquer discriminação ou omissão da concessionária nesse aspecto. Ou seja, a persistência da ausência de fornecimento de energia elétrica, sem justificativa técnica plausível ou providências efetivas por parte da distribuidora, configura grave violação aos princípios da universalização do serviço público, da dignidade da pessoa humana e do desenvolvimento sustentável. Tal conduta enseja não apenas a responsabilização civil da concessionária, como também a imposição judicial de obrigação de fazer, com fixação de prazo e, se necessário, com aplicação de multa cominatória, a fim de assegurar o cumprimento de sua função pública, conforme determinado pelo juízo a quo. Nesse sentindo, trago a baila o julgado do Tribunal de Justiça de São Paulo – TJSP em caso análogo: "Fornecimento de energia elétrica – Extensão da rede – Recusa da concessionária – Obrigação de fazer – Custo da instalação.A concessionária de energia elétrica tem a obrigação de implementar as obras de infraestrutura necessárias ao fornecimento de energia elétrica aos consumidores residentes dentro da sua área de atuação, independentemente da situação registral dos imóveis, devendo ela arcar com os custos para implantação do sistema, dada a essencialidade do serviço. Ação procedente. Recurso não provido."(TJ-SP - AC: 10087259120198260099 SP 1008725-91.2019.8.26 .0099, Relator.: Itamar Gaino, Data de Julgamento: 18/11/2020, 21ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 18/11/2020) Outrossim, cumpre destacar que o art. 56 da Resolução Normativa ANEEL nº 1.000/2021 estabelece prazos mínimos para a formulação de projetos elétricos e execução de obras, no âmbito da atuação administrativa da distribuidora. Contudo, tal disposição não impede que o Poder Judiciário, diante de situações excepcionais e de urgência comprovada, fixe prazos específicos para o cumprimento da obrigação de fazer, especialmente quando demonstrada a omissão da concessionária frente ao direito fundamental à energia elétrica. No caso em apreço, a decisão judicial de primeiro grau, ao fixar o prazo de 90 dias para a efetiva instalação da rede de energia elétrica, não afrontou a normatização da ANEEL, mas apenas adaptou os parâmetros administrativos à realidade concreta apresentada nos autos, em que restou evidenciada a necessidade urgente de fornecimento do serviço público essencial, diante das condições de vulnerabilidade e da dignidade dos autores. Ressalte-se, ainda, que o Decreto nº 11.628/2023, ao prorrogar as metas do Programa “Luz para Todos” até o ano de 2026, estabelece um marco temporal de alcance programático, voltado à universalização do acesso à energia elétrica em todo o território nacional. No entanto, esse prazo não pode ser interpretado como autorização para a postergação indefinida do atendimento em situações concretas já maduras para execução, tampouco pode servir como escudo para a inércia da distribuidora em sua área de concessão. Assim, residindo os consumidores dentro da área de abrangência da concessão, como no caso em tela, impõe-se à concessionária a obrigação de implementar, com prioridade e diligência, as obras de infraestrutura elétrica necessárias ao atendimento da população local, sob pena de responsabilização jurídica e administrativa. O fornecimento de energia elétrica, por sua natureza essencial, não pode ser tratado como favor ou mera conveniência econômica, mas sim como um direito básico de cidadania, assegurado pela Constituição e pela legislação infraconstitucional. Por fim, é oportuno consignar que, não obstante a irresignação manifestada pela concessionária de energia elétrica, verifica-se que a própria recorrente, por meio dos documentos acostados aos autos sob os IDs nº 278075370 a 278073082, informou o cumprimento integral da obrigação de fazer, consistente na execução da obra de extensão da rede elétrica, nos exatos termos determinados pelo juízo de primeiro grau. Dessa forma, inexiste qualquer elemento nos autos capaz de infirmar a correção da sentença recorrida, não se justificando, portanto, o acolhimento das alegações recursais, que carecem de respaldo fático e jurídico. Por essas razões, conheço do recurso de apelação e NEGO-LHE PROVIMENTO, mantendo-se, na integralidade, a r. sentença fustigada. Ante o resultado do julgamento, majoro os honorários de sucumbência fixados pelo Juízo de 1º Grau, em desfavor da empresa recorrente, para o importe de 13% (treze por cento) sobre o valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, § 11º, do CPC. É como voto. Sebastião de Arruda Almeida Desembargador Data da sessão: Cuiabá-MT, 15/07/2025

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Processo nº 1000005-92.2023.8.11.0106

ID: 327530668

Tribunal: TJMT Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1000005-92.2023.8.11.0106

Data de Disponibilização: 17/07/2025

Polo Ativo:

ENERGISA MATO GROSSO DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

EDUARDO QUEIROGA ESTRELA MAIA PAIVA

OAB/PB XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1000005-92.2023.8.11.0106 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Fornecimento de Ener… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1000005-92.2023.8.11.0106 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Fornecimento de Energia Elétrica] Relator: Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA Turma Julgadora: [DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES] Parte(s): [ENERGISA MATO GROSSO DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A - CNPJ: 03.467.321/0001-99 (APELANTE), EDUARDO QUEIROGA ESTRELA MAIA PAIVA - CPF: 078.165.854-38 (ADVOGADO), JALDEMIRO RODRIGUES DE ATAIDE JUNIOR - CPF: 008.037.384-47 (ADVOGADO), VINICIUS MEDEIROS MARQUES - CPF: 070.523.144-52 (ADVOGADO), GEORGE OTTAVIO BRASILINO OLEGARIO - CPF: 058.141.644-92 (ADVOGADO), GUILHERME ULYSSES DE OLIVEIRA - CPF: 700.096.344-10 (ADVOGADO), JULIO RIBEIRO BISPO - CPF: 010.452.741-27 (APELADO), WANDE ALVES DINIZ - CPF: 191.714.711-20 (ADVOGADO), VANESSA STEFANIE TEREBINTO DE ARAUJO - CPF: 003.135.041-05 (ADVOGADO), ISAIAS GOMES DE OLIVEIRA - CPF: 353.079.431-72 (APELADO), AGUINALDO ALVES DE SOUZA - CPF: 032.077.961-09 (ASSISTENTE), DANIEL SERVO DA SILVA - CPF: 328.930.601-10 (ASSISTENTE), DIONILA KELLE NUNES DA SILVA DAVID - CPF: 026.350.051-92 (ASSISTENTE), EURIPEDES SEVERANO AIER - CPF: 328.917.091-87 (ASSISTENTE), JEREMIAS GOMES DE OLIVEIRA - CPF: 328.930.001-34 (ASSISTENTE), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A APELANTE: ENERGISA MATO GROSSO - DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A. APELADOS: Isaias Gomes De Oliveira e Julio Ribeiro Bispo. EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. PEDIDO DE EFEITO SUSPENSIVO NA APELAÇÃO. REJEIÇÃO. NECESSIDADE DE REQUERIMENTO AUTÔNOMO. ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE JUNTADA DO PRÉVIO REQUERIMENTO NA VIA ADMINISTRATIVA. INVIABILIDADE. PRINCÍPIO DA INAFASTABILIDADE DA JURISDIÇÃO. FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA EM ÁREA RURAL. GLEBA SÃO SIMÃO. SERVIÇO PÚBLICO ESSENCIAL. REDE DE DISTRIBUIÇÃO. PROGRAMA “LUZ PARA TODOS”. OMISSÃO INJUSTIFICADA. UNIVERSALIZAÇÃO DO ACESSO. DIREITO À DIGNIDADE E À MORADIA. MULTA COMINATÓRIA. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME Apelação Cível interposta por Energisa Mato Grosso – Distribuidora de Energia S.A. contra sentença que julgou procedente Ação de Obrigação de Fazer, com pedido liminar, determinando a instalação de energia elétrica na Gleba São Simão, zona rural do Município de Novo São Joaquim/MT, no prazo de 90 dias, sob pena de multa diária. A concessionária sustentou, em síntese, impossibilidade técnica de cumprimento no prazo fixado, ausência de requerimento administrativo e ofensa à legalidade administrativa e à separação dos poderes. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Há duas questões em discussão: (i) definir se a ausência de prévio requerimento administrativo impede o ajuizamento da ação; e (ii) estabelecer se a concessionária pode se eximir de implantar rede elétrica em área rural sob a alegação de inviabilidade técnica e cronograma do Programa “Luz para Todos”. III. RAZÕES DE DECIDIR O pedido de atribuição de efeito suspensivo ao recurso de apelação deve ser formulado em petição incidental em apartado e não no bojo da própria peça recursal, consoante disposto no Código de Processo Civil. O prévio requerimento administrativo não constitui condição para o exercício do direito de ação, conforme o princípio da inafastabilidade da jurisdição (CF, art. 5º, XXXV), sendo vedado obstar o acesso ao Judiciário por ausência de provocação administrativa. A concessionária tem dever legal e contratual de garantir a universalização do serviço público de energia elétrica, nos termos do art. 175 da CF e da Lei nº 8.987/1995, devendo promover a construção e expansão da rede nas áreas sob sua concessão. A omissão na prestação do serviço essencial de energia elétrica a comunidades rurais viola os princípios da dignidade da pessoa humana, do mínimo existencial e da igualdade de tratamento entre consumidores urbanos e rurais. A alegação de que o cronograma do Programa “Luz para Todos” autoriza a postergação do fornecimento não se sustenta diante da urgência social e da responsabilidade da concessionária de atender as demandas concretas de sua área de atuação. O prazo de 90 dias fixado judicialmente atende à realidade fática do caso e não afronta normas técnicas da ANEEL, sendo admissível a fixação judicial de prazo específico diante da omissão administrativa. A empresa já havia cumprido a obrigação determinada na sentença, o que torna inócuas as alegações recursais quanto à impossibilidade técnica e ao prazo. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso conhecido e desprovido. Tese de julgamento: O acesso ao Judiciário independe de prévio requerimento administrativo, conforme o princípio da inafastabilidade da jurisdição. A concessionária de energia elétrica tem obrigação legal de implantar infraestrutura de distribuição nas áreas sob sua concessão, inclusive em zonas rurais. O fornecimento de energia elétrica é serviço essencial e sua omissão, ainda que sob alegação de cronograma administrativo, fere direitos fundamentais e impõe a responsabilização judicial da concessionária. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, arts. 5º, XXXV, e 175; CDC, art. 22; CPC, arts. 85, §11º, e 1.012; Lei nº 8.987/1995; Resolução Normativa ANEEL nº 1.000/2021, arts. 46 e 56. Jurisprudência relevante citada: TJMT, N.U 1002080-51.2025.8.11.0004, Quarta Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Rubens de Oliveira Santos Filho, j. 30/06/2025; TJSP, AC 1008725-91.2019.8.26.0099, Rel. Des. Itamar Gaino, j. 18/11/2020. R E L A T Ó R I O RELATÓRIO EXMO. SR. DES. SEBASTIÃO DE ARRUDA ALMEIDA. Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de Apelação Cível interposto por Energisa Mato Grosso - Distribuidora de Energia S.A. contra sentença proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Novo São Joaquim-MT, que julgou procedente o pedido formulado na Ação de Obrigação de Fazer, cumulada com pedido de liminar, determinando que a concessionária procedesse à instalação de energia elétrica na Gleba São Simão, no prazo de 90 dias, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00, limitada ao montante de R$ 100.000,00, nos seguintes termos: “(...) JULGO PROCEDENTE o pedido da parte demandante, razão pela qual DETERMINO que a demandada proceda com a instalação de energia elétrica na Gleba São Simão, localizada no Município de Novo São Joaquim/MT, no prazo de 90 (noventa) dias, sob pena de multa diária, que fixo no valor de R$ 1.000,00 (mil reais), limitada ao montante de R$ 100.000,00 (cem mil reais). Pelo princípio da causalidade, CONDENO a parte demandada ao pagamento das despesas, custas processuais e honorários advocatícios, arbitrados estes em 10% do valor da causa, nos termos do art. 85 do CPC. (...)” [grifo original] Em suas razões recursais, a parte recorrente invoca os seguintes questionamentos fático-jurídicos: Preliminar. Da necessidade de atribuição de efeito suspensivo à apelação, diante da impossibilidade técnica de cumprimento da obrigação no prazo fixado no decisum fustigado. Mérito Recursal. Da inexistência de requerimento administrativo regular por parte dos autores; Afirma, ainda, que a instalação de energia está vinculada ao cronograma do Programa “Luz para Todos”, com prazo legal até 31/12/2026; Alega que a sentença violaria os princípios da separação dos poderes e da legalidade administrativa. Recurso tempestivo e custas recolhidas. (ID nº 278673356). A parte apelada apresentou contrarrazões, rebatendo as alegações da parte apelante e defendendo o desprovimento do recurso (ID 284380879). O Representante do Ministério Público, por meio de parecer, absteve-se de se manifestar sobre o mérito da causa, por não vislumbrar hipótese de intervenção obrigatória nos termos do art. 178 do CPC, pugnando pelo prosseguimento do feito. (ID. 295296357) É o relatório. Sebastião de Arruda Almeida Desembargador V O T O R E L A T O R APELANTE: ENERGISA MATO GROSSO - DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A. APELADOS: ISAIAS GOMES DE OLIVEIRA e JULIO RIBEIRO BISPO. VOTO Egrégia Câmara: De proêmio, consigno que o presente recurso comporta juízo de admissibilidade positivo, tanto quanto aos requisitos extrínsecos quanto aos intrínsecos da espécie recursal. Conforme relatado anteriormente, trata-se de recurso de Apelação Cível interposto por Energisa Mato Grosso – Distribuidora de Energia S.A. contra sentença proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Novo São Joaquim-MT, que julgou procedente o pedido formulado na Ação de Obrigação de Fazer, cumulada com pedido de liminar, determinando que a concessionária procedesse à instalação de energia elétrica na Gleba São Simão, no prazo de 90 dias, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00 (mil reais), limitada ao montante de R$ 100.000,00 (cem mil reais). Inconformada com a decisão, a concessionária de serviços energéticos interpôs o presente recurso de apelação. Em suas razões recursais, a apelante argui preliminar sustentando, em síntese, que, no presente caso, é necessária a atribuição de efeito suspensivo ao recurso, tendo em vista a impossibilidade técnica de cumprir a determinação de instalação da rede elétrica na propriedade do autor no prazo de 90 (noventa) dias. No mérito, assevera que os recorridos não comprovaram ter realizado prévio requerimento administrativo antes da propositura da ação. Alega, ainda, que o prazo fixado é tecnicamente inviável, em razão da complexidade da obra, que inclui a construção de subestação e a aquisição de materiais. Sustenta que o cronograma do programa “Luz para Todos” prevê o atendimento até 31/12/2026. Por fim, aduz que a intervenção do Poder Judiciário na imposição de prazos para a realização dessas obras deve respeitar o princípio da separação dos poderes e a complexidade técnica envolvida. Por sua vez, os consumidores, ora recorridos, apresentaram contrarrazões ao recurso, rebatendo os argumentos da parte recorrente e pugnando pelo seu desprovimento, sob o fundamento de que a urgência no fornecimento de energia elétrica aos autores foi devidamente comprovada nos autos, evidenciando que a ausência desse serviço essencial compromete a dignidade da pessoa humana e o direito à moradia, ambos protegidos pela Constituição Federal. Pois bem. Superado o relatório, passo à análise da preliminar arguida pela parte recorrente. Preliminar. 1.1. Do pedido de atribuição de efeito suspensivo à apelação. Inicialmente, a parte ré/apelante pleiteia que o apelo seja recebido também com efeito suspensivo, em razão da presença do periculum in mora e do fumus boni iuris, elementos que, segundo alega, o ensejam. Entretanto, quanto ao efetivo pleito de atribuição do efeito suspensivo ao recurso interposto, não vislumbro como lhe conferir guarida, considerando o disposto no art. 1.012 do CPC, em seus §§ 1º, inciso III, e § 3º, incisos I e II, que preleciona o seguinte: “Art. 1.012. A apelação terá efeito suspensivo. § 1º Além de outras hipóteses previstas em lei, começa a produzir efeitos imediatamente após a sua publicação a sentença que: (...)§ 3ºO pedido de concessão de efeito suspensivo nas hipóteses do § 1º poderá ser formulado por requerimento dirigido ao: I - tribunal, no período compreendido entre a interposição da apelação e sua distribuição, ficando o relator designado para seu exame prevento para julgá-la; II - relator, se já distribuída a apelação.” Da leitura do supracitado dispositivo processual, evidencia-se que o pedido de atribuição de efeito suspensivo ao recurso de apelação deve ser formulado por petição autônoma, dirigida ao Tribunal ou, quando já distribuído o recurso, ao relator, também por petição própria — e não como preliminar recursal, como ocorreu no caso em tela —, o que obsta seu reconhecimento. Nesse sentido, é a jurisprudência hodierna: “RECURSO DE APELAÇÃO – AÇÃO DE REVISÃO DE CONTRATO - PEDIDO DE EFEITO SUSPENSIVO NA APELAÇÃO – NECESSIDADE DE REQUERIMENTO AUTÔNOMO -PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA - AFASTADA – MÉRITO - TAXA DE JUROS REMUNERATÓRIOS – LEGALIDADE EVIDENCIADA – CONSONÂNCIA COM A MÉDIA DE MERCADO PUBLICADO PELO BACEN - AMORTIZAÇÃO PELA TABELA PRICE – ABUSIVIDADE NÃO EVIDENCIADA – SENTENÇA MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO. O pedido de atribuição de efeito suspensivo ao recurso de apelação deve ser formulado em petição incidental em apartado e não no bojo da própria peça recursal, consoante disposto no Código de Processo Civil. (...) (N.U 1000579-85.2023.8.11.0019, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 02/10/2024, publicado no DJE 05/10/2024).” Portanto, rejeito a preliminar vindicada. É como voto. 2.Mérito Recursal. 2.1. Da ausência de prévio requerimento administrativo. Neste ponto, registro que, embora a parte recorrente tenha nominado a questão como preliminar, observa-se que a tese por ela defendida confunde-se com o mérito da demanda, razão pela qual será analisada conjuntamente com este, na medida em que não se trata de matéria processual autônoma capaz de obstar o exame do mérito recursal. Pois bem. No que tange à alegada ausência de provocação na via administrativa, impõe-se esclarecer que tal exigência não configura condição indispensável para a propositura da presente demanda, conforme sustenta a parte recorrente. Com efeito, a inexistência de requerimento prévio perante a Administração Pública não impede o acesso ao Poder Judiciário, porquanto o interesse processual manifesta-se na utilidade e na necessidade da tutela jurisdicional postulada — elementos estes que, no caso concreto, se mostram inequivocamente presentes. A propósito, colhe-se da jurisprudência, in verbis: “APELAÇÃO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO. INDEFERIMENTO DA INICIAL. EXTINÇÃO DA LIDE SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. AUSÊNCIA DE JUNTADA DO PRÉVIO REQUERIMENTO NA VIA ADMINISTRATIVA. FINALIDADE DE COMPROVAR O INTERESSE DE AGIR. INVIABILIDADE. PRINCÍPIO DA INAFASTABILIDADE DA JURISDIÇÃO. ART. 5º, XXXV, DA CF. SENTENÇA DESCONSTITUÍDA. RECURSO PROVIDO. (...)O acesso à jurisdição independe do esgotamento da via administrativa, conforme estabelece o art. 5º, XXXV, da Constituição Federal, sendo vedada a exigência de requerimento administrativo como condição para o exercício do direito de ação. (...) (N.U 1002080-51.2025.8.11.0004, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 30/06/2025, publicado no DJE 30/06/2025)” Portanto, neste ponto recursal, a tese oferecida pela concessionária de energia elétrica não comporta guarida. 2.2. Da impossibilidade técnica para cumprimento da obrigação de fazer. Neste ponto, a concessionária de energia elétrica recorrente aduz, em síntese, a impossibilidade técnica de cumprir a determinação de instalação da rede elétrica, visto que o prazo estabelecido é inferior ao tempo mínimo necessário. Segue afirmando que há perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão proferida, caso a empresa concessionária de energia elétrica permaneça condenada a executar a instalação da rede, especialmente em prazo tão exíguo, de 90 (noventa) dias. Entretanto, razão não lhe assiste. Explico. Extrai-se dos autos, que a concessionária de energia elétrica se limitou a executar a instalação da rede de distribuição exclusivamente na residência dos autores, em claro desprezo às demais famílias residentes na Gleba São Simão, igualmente carentes do serviço público essencial. Desta feita, tal atuação parcial evidencia conduta discriminatória por parte da concessionária e reforça a urgência da efetivação plena da ordem judicial proferida. A propósito, é pacífico que a distribuidora de energia elétrica possui obrigação legal e contratual de realizar os investimentos necessários à construção, manutenção, operação e expansão das redes de distribuição, especialmente aquelas voltadas ao atendimento de unidades consumidoras localizadas em sua área de concessão. Tal dever decorre diretamente do regime jurídico da concessão de serviço público, previsto no art.175 da Constituição Federal, o qual impõe ao Poder Público – e, por delegação, às concessionárias – a obrigação de manter serviço adequado, eficiente, contínuo e universal. Essa diretriz é regulamentada pela Lei nº8.987/1995, que fixa como dever da concessionária garantir a adequada prestação do serviço, mediante os investimentos necessários à sua continuidade e expansão. O serviço de distribuição de energia elétrica, por sua essencialidade, deve observar os princípios da continuidade, segurança, generalidade, modicidade tarifária e eficiência, que compõem o conteúdo do dever de adequação do serviço público. A inobservância desses princípios configura falha na prestação e atrai a responsabilidade objetiva da concessionária, nos termos da legislação aplicável. Tal obrigação é igualmente reforçada pelo art.22 do Código de Defesa do Consumidor, segundo o qual os órgãos públicos, por si ou por meio de concessionárias, devem fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos. A energia elétrica, como serviço público essencial, integra esse rol e sua ausência compromete a dignidade da pessoa humana e o mínimo existencial. Nesse cenário, cabe à ANEEL – Agência Nacional de Energia Elétrica – a normatização e fiscalização da prestação dos serviços pelas distribuidoras, fixando critérios técnicos e prazos para atendimento aos consumidores. Ainda que o art.46 da Resolução Normativa ANEEL nº1.000/2021 tenha sido, em algumas ocasiões, interpretado de forma equivocada como limitador da obrigação de expansão da rede, é imprescindível destacar que referido dispositivo trata exclusivamente da possibilidade de compartilhamento de subestação entre unidades consumidoras do grupo A, não se prestando como fundamento para afastar a obrigação de construção ou ampliação da infraestrutura de distribuição convencional (redes de média e baixa tensão). Portanto, não se pode admitir a tentativa da concessionária de eximir-se de sua responsabilidade, sob alegação de suposta inviabilidade técnica ou ausência de obrigação legal, notadamente quando se trata de comunidades regularmente ocupadas, áreas rurais ou assentamentos onde a população carece de infraestrutura básica. Os moradores dessas localidades têm o mesmo direito de acesso à energia elétrica que os residentes em centros urbanos, sendo inadmissível qualquer discriminação ou omissão da concessionária nesse aspecto. Ou seja, a persistência da ausência de fornecimento de energia elétrica, sem justificativa técnica plausível ou providências efetivas por parte da distribuidora, configura grave violação aos princípios da universalização do serviço público, da dignidade da pessoa humana e do desenvolvimento sustentável. Tal conduta enseja não apenas a responsabilização civil da concessionária, como também a imposição judicial de obrigação de fazer, com fixação de prazo e, se necessário, com aplicação de multa cominatória, a fim de assegurar o cumprimento de sua função pública, conforme determinado pelo juízo a quo. Nesse sentindo, trago a baila o julgado do Tribunal de Justiça de São Paulo – TJSP em caso análogo: "Fornecimento de energia elétrica – Extensão da rede – Recusa da concessionária – Obrigação de fazer – Custo da instalação.A concessionária de energia elétrica tem a obrigação de implementar as obras de infraestrutura necessárias ao fornecimento de energia elétrica aos consumidores residentes dentro da sua área de atuação, independentemente da situação registral dos imóveis, devendo ela arcar com os custos para implantação do sistema, dada a essencialidade do serviço. Ação procedente. Recurso não provido."(TJ-SP - AC: 10087259120198260099 SP 1008725-91.2019.8.26 .0099, Relator.: Itamar Gaino, Data de Julgamento: 18/11/2020, 21ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 18/11/2020) Outrossim, cumpre destacar que o art. 56 da Resolução Normativa ANEEL nº 1.000/2021 estabelece prazos mínimos para a formulação de projetos elétricos e execução de obras, no âmbito da atuação administrativa da distribuidora. Contudo, tal disposição não impede que o Poder Judiciário, diante de situações excepcionais e de urgência comprovada, fixe prazos específicos para o cumprimento da obrigação de fazer, especialmente quando demonstrada a omissão da concessionária frente ao direito fundamental à energia elétrica. No caso em apreço, a decisão judicial de primeiro grau, ao fixar o prazo de 90 dias para a efetiva instalação da rede de energia elétrica, não afrontou a normatização da ANEEL, mas apenas adaptou os parâmetros administrativos à realidade concreta apresentada nos autos, em que restou evidenciada a necessidade urgente de fornecimento do serviço público essencial, diante das condições de vulnerabilidade e da dignidade dos autores. Ressalte-se, ainda, que o Decreto nº 11.628/2023, ao prorrogar as metas do Programa “Luz para Todos” até o ano de 2026, estabelece um marco temporal de alcance programático, voltado à universalização do acesso à energia elétrica em todo o território nacional. No entanto, esse prazo não pode ser interpretado como autorização para a postergação indefinida do atendimento em situações concretas já maduras para execução, tampouco pode servir como escudo para a inércia da distribuidora em sua área de concessão. Assim, residindo os consumidores dentro da área de abrangência da concessão, como no caso em tela, impõe-se à concessionária a obrigação de implementar, com prioridade e diligência, as obras de infraestrutura elétrica necessárias ao atendimento da população local, sob pena de responsabilização jurídica e administrativa. O fornecimento de energia elétrica, por sua natureza essencial, não pode ser tratado como favor ou mera conveniência econômica, mas sim como um direito básico de cidadania, assegurado pela Constituição e pela legislação infraconstitucional. Por fim, é oportuno consignar que, não obstante a irresignação manifestada pela concessionária de energia elétrica, verifica-se que a própria recorrente, por meio dos documentos acostados aos autos sob os IDs nº 278075370 a 278073082, informou o cumprimento integral da obrigação de fazer, consistente na execução da obra de extensão da rede elétrica, nos exatos termos determinados pelo juízo de primeiro grau. Dessa forma, inexiste qualquer elemento nos autos capaz de infirmar a correção da sentença recorrida, não se justificando, portanto, o acolhimento das alegações recursais, que carecem de respaldo fático e jurídico. Por essas razões, conheço do recurso de apelação e NEGO-LHE PROVIMENTO, mantendo-se, na integralidade, a r. sentença fustigada. Ante o resultado do julgamento, majoro os honorários de sucumbência fixados pelo Juízo de 1º Grau, em desfavor da empresa recorrente, para o importe de 13% (treze por cento) sobre o valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, § 11º, do CPC. É como voto. Sebastião de Arruda Almeida Desembargador Data da sessão: Cuiabá-MT, 15/07/2025

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Processo nº 1002080-93.2025.8.11.0087

ID: 324631152

Tribunal: TJMT Órgão: VARA ÚNICA DE GUARANTÃ DO NORTE Classe: AçãO CIVIL PúBLICA CíVEL Nº Processo: 1002080-93.2025.8.11.0087

Data de Disponibilização: 14/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

WELINTON MOISES POSSEBON

Decisão

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO VARA ÚNICA DE GUARANTÃ DO NORTE DECISÃO Processo: 1002080-93.2025.8.11.0087. AUTOR(A): MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO REQUERIDO: WELINTON MOISES PO… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO VARA ÚNICA DE GUARANTÃ DO NORTE DECISÃO Processo: 1002080-93.2025.8.11.0087. AUTOR(A): MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO REQUERIDO: WELINTON MOISES POSSEBON Vistos. Verifica-se que estão preenchidos os requisitos do artigo 319 do Código de Processo Civil, assim como foi observada a determinação posta no artigo 320 do mesmo diploma legal. Desta forma, não sendo o caso de aplicação do disposto no artigo 330 do Código de Processo Civil, com fundamento no disposto no artigo 334 do mesmo codex, RECEBO a petição inicial. Cuidando-se de pedido de tutela provisória de urgência, necessário o preenchimento dos requisitos exigidos pelo art. 300 do Código de Processo Civil, quais sejam a existência de elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo, vejamos: Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. A tutela de urgência prevista no art. 300 do CPC autoriza o deferimento de antecipação do verdadeiro pedido de mérito, antes mesmo de perfeita a necessária cognição, porém, as provas hão de vir nos autos estreme de dúvida, a passar ao julgador, prontamente, convicção da probabilidade da pretensão, não sendo, pois, uma liberalidade, ao contrário, é uma exceção que exige rígida demonstração da ocorrência dos requisitos legais para sua concessão. No mesmo sentido a lição de Fredie Didier Jr., Paula Sarno Braga e Rafael Alexandria de Oliveira: A probabilidade do direito a ser provisoriamente satisfeito/realizado ou acautelado é a plausibilidade de existência desse mesmo direito. O bem conhecido fumus boni iuris. O magistrado precisa avaliar se há ‘elementos que evidenciem’ a probabilidade de ter acontecido o que foi narrado e quais as chances de êxito do demandante. (Fredie Didier Jr., Paula Sarno Braga e Rafael Alexandria de Oliveira, Curso de direito processual civil: teoria da prova, direito probatório, decisão, precedentes, coisa julgada e antecipação dos efeitos da tutela, 10º ed., Salvador, Jus Podivm, 2015, p. 595). Na hipótese dos autos, através do exposto na inicial e da documentação a ela acostada, em juízo provisório, e nos estritos limites da cognição sumária permitida a esta fase processual, entendo que restaram configurados os pressupostos autorizativos de parte da medida excepcional. Isso porque, tocante à probabilidade do direito, considerando que a autoridade Ambiental lavrou o auto de infração n. 1087036924, termo de embargo n. 1087036924 e relatório técnico n. 0000009091 (ID 199794425), tais documentos gozam de presunção de legitimidade, uma vez que lavrados por agentes públicos, verifica-se que há respaldo jurídico e fático para a concessão de parte dos pedidos provisórios requestados pelo Ministério Público. Com efeito, a equipe de fiscalização constatou a existência de infração: “DESMATE A CORTE RASO EM ÁREA CONSIDERADA OBJETO DE ESPECIAL PRESERVAÇÃO (SEM AUTORIZAÇÃO OU EM DESACORDO) - ART. 50 DA LEI FEDERAL N. 9.605/1998 C/C ART. 50 DO DECRETO FEDERAL N. 6.514/2008. ART. 50. DESTRUIR OU DANIFICAR FLORESTAS OU QUALQUER TIPO DE VEGETAÇÃO NATIVA OU DE ESPÉCIES NATIVAS PLANTADAS, OBJETO DE ESPECIAL PRESERVAÇÃO, SEM AUTORIZAÇÃO OU LICENÇA DA AUTORIDADE AMBIENTAL COMPETENTE: MULTA DE R$ 5.000,00 (CINCO MIL REAIS) POR HECTARE OU FRAÇÃO. § 2° - PARA OS FINS DISPOSTOS NO ART. 49 E NO CAPUT DESTE ARTIGO, SÃO CONSIDERADAS DE ESPECIAL PRESERVAÇÃO AS FLORESTAS E DEMAIS FORMAS DE VEGETAÇÃO NATIVA QUE TENHAM REGIME JURÍDICO PRÓPRIO E ESPECIAL DE CONSERVAÇÃO OU PRESERVAÇÃO DEFINIDO PELA LEGISLAÇÃO.”. Assim sendo, há robustas comprovações do dano causado ao meio ambiente, da conduta do requerido e do nexo de causalidade, que, pela aplicação da teoria de responsabilidade objetiva, resulta em fortes indícios de que o requerido deverá responder pela recomposição do meio ambiente. Nesse passo, considerando que os danos são de expressiva monta, é pertinente a adoção de medida destinada à garantia da utilidade do processo, mormente pela necessidade de recomposição do meio ambiente. Quanto aos pedidos de abstenção de exploração da área sem autorização ou licença expedida pelo órgão ambiental ou em desacordo com suas normas regulamentares, há tanto probabilidade do direito quanto o perigo da demora. Isso porque, neste tocante, como ressaltado, a probabilidade do direito invocada demonstra-se presente, uma vez que, através dos autos de infração lavrados pelo órgão ambiental, que gozam de presunção de veracidade pela atuação de agentes públicos, delimitam com precisão a exploração ambiental sem autorização ou licença, demonstrando o dano ambiental. Acerca da referida presunção, transcrevo a seguinte ementa, a corroborar a fundamentação: AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – OBRIGAÇÃO DE FAZER E NÃO FAZER – DESMATE ILEGAL EM FLORESTA NATIVA DO BIOMA AMAZÔNICO – PROTEÇÃO AO MEIO AMBIENTE - CONCESSÃO DE TUTELA ANTECIPADA PARA FAZER CESSAR O DESMATAMENTO – POSSIBILIDADE - AUTO DE INFRAÇÃO – IBAMA – PRESUNÇÃO DE VERACIDADE – RECURSO DESPROVIDO. 1 - Não há que se falar em reforma da decisão liminar que, visando evitar o prolongamento do dano ambiental e dar início à recuperação da área degradada, impõe, de imediato, obrigações ao poluidor, perante o órgão ambiental. 2 - O auto de infração goza de presunção de veracidade, prevalecendo até prova robusta produzida em contrário. (N.U 1003729-10.2018.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, GILBERTO LOPES BUSSIKI, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 18/12/2019, Publicado no DJE 22/01/2020) O perigo de dano, por sua vez, decorre da necessidade de célere reparação do passivo ambiental, que não deve aguardar até o desfecho desta demanda para que seja concretizada. Por entender oportuno, trago à colação: AGRAVO DE INSTRUMENTO — AÇÃO CIVIL PÚBLICA — DESMATAMENTO DE FLORESTA NATIVA — AUTORIZAÇÃO DO ÓRGÃO AMBIENTAL — AUSÊNCIA — AUTUAÇÃO — RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA — DEVER DE REPARAR O DANO — APRESENTAÇÃO DE PROJETO DE RECUPERAÇÃO DE ÁREADE GRADADA (PRAD) — OBRIGATORIEDADE -AVERBAÇÃO DA DEMANDA NA MATRÍCULA DO IMÓVEL — APLICÁVEL. O perigo na demora da prestação jurisdicional milita a favor do meio ambiente, a possibilitar o deferimento da tutela de urgência, com o objetivo de obrigar o particular a se abster de desmatar e protocolar, no órgão ambiental competente, o Projeto de Recuperação de Área Degradada – PRAD, sob pena de multa diária, em atenção ao que estabelece o artigo 225 da Constituição da Republica Federativa do Brasil. A averbação da demanda na matrícula do imóvel, aplicável, na hipótese, “serve para tornar completa e adequada a informação sobre a real situação do empreendimento, o que se coaduna com a finalidade do sistema registral e com os direitos do consumidor”. Recurso provido, em parte. (TJ-MT - AI: 10007792820188110000 MT, Relator: MARCIO APARECIDO GUEDES, Data de Julgamento: 06/09/2019, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Data de Publicação: 20/09/2019) Logo, presentes os requisitos legais, DEFIRO PARCIALMENTE a tutela de urgência e determino ao requerido as seguintes medidas: a) a apresentação à SEMA/MT, no prazo de 90 (noventa) dias contados da intimação da decisão, de Plano de Recuperação de Área Degradada – PRAD, que atenda às diretrizes indicadas pelo órgão, com posterior execução do plano, observadas as adequações e determinações eventualmente indicadas. O projeto deverá ser executado no prazo de 30 (trinta) dias contados de sua aprovação, e observará o lapso temporal indicado pela SEMA/MT, sob pena de multa diária de R$ 10.000,00 (dez mil reais); b) a abstenção de praticar atividades lesivas ao meio ambiente, com suspensão de todas as atividades lesivas ao meio ambiente (pecuária, agricultura, piscicultura, edificações, etc), que estejam sendo realizadas sem autorização ou licença expedida pelo órgão ambiental ou em desacordo com suas normas regulamentares, no prazo razoável de 90 (noventa) dias, sob pena de multa diária de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), inclusive, com a retirada de todo rebanho existente no imóvel rural, ou a colheita dos grãos já plantados, no prazo razoável de 90 (noventa) dias, sob pena de multa diária de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) e apreensão dos animais/grãos, devendo informar nos autos o local de destino, no prazo de 05 (cinco) dias após a retirada da área. INTIME-SE a parte requerida para cumprimento das medidas liminares. No mais, indefiro os demais pedidos provisórios, nos termos da fundamentação esposada, sendo desnecessário o embargo judicial da área degradada, eis que já embargada pelo órgão ambiental. Deixo de oficiar o Banco Central para promover a suspensão da participação do requerido em linha de financiamentos em estabelecimentos oficiais de crédito, bem como em incentivos e benefícios fiscais concedidos pelo poder público, pois ausente qualquer comprovação de que o requerido tenha participação em linha de financiamentos. Deixo de oficiar o ao CRI, considerando que o Ministério Público tem a prerrogativa de requisitar documentos e informações, sendo desnecessária a intervenção do Poder Judiciário. DETERMINO a inversão do ônus da prova (Súmula 618 do STJ). Nos termos do art. 334 do CPC, DETERMINO à Secretaria o agendamento de audiência de mediação ou conciliação, conforme o caso, junto ao CEJUSC, que será realizada mediante videoconferência. CITE-SE a parte requerida para comparecimento. Fiquem as partes cientes de que o comparecimento é obrigatório (pessoalmente ou por representante com procuração específica, com outorga de poderes para negociar e transigir). As partes devem estar acompanhadas de seus advogados (art. 334, § 9º, CPC). Caso a parte ré faça uso da previsão do § 5º do art. 334 do CPC, o termo inicial do prazo para a contestação será a data do protocolo da manifestação do seu desinteresse na audiência de conciliação, ficando desde já determinado o cancelamento da solenidade. Caso infrutífera a conciliação ou verificada a ausência de qualquer parte, o prazo para a parte requerida contestar a ação terá início na data da audiência (art. 335, I, CPC). Decorrido o prazo para contestar o pedido, e no intento de facilitar a adoção das providências preliminares (art. 347 do CPC), INTIME-SE a parte autora para que, no prazo de 15 (quinze) dias, apresente manifestação, a teor do art. 348 e seguintes do CPC, nos seguintes termos: (a) Havendo revelia, informe se quer produzir outras provas ou se deseja o julgamento antecipado; (b) Havendo contestação, deverá se manifestar em réplica, inclusive com contrariedade e apresentação de provas relacionadas a eventuais questões incidentais; (c) Em sendo apresentada reconvenção com a contestação ou no seu prazo, deverá apresentar resposta à reconvenção. Após, INTIMEM-SE as partes para que, no prazo comum de 15 (quinze) dias, especifiquem as provas que pretendem produzir, justificando, objetiva e fundamentadamente, a sua relevância. Deixo consignado, desde já, que o rol de testemunha deverá ser apresentado juntamente com a manifestação das partes, caso pretendam pela designação de audiência de instrução e julgamento. CUMPRA-SE, expedindo o necessário. Guarantã do Norte/MT, data registrada no sistema. ÀS PROVIDÊNCIAS. GUILHERME CARLOS KOTOVICZ Juiz de Direito

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Processo nº 1015445-15.2024.8.11.0003

ID: 260823055

Tribunal: TJMT Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1015445-15.2024.8.11.0003

Data de Disponibilização: 25/04/2025

Polo Ativo:

ENERGISA MATO GROSSO DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

EDUARDO QUEIROGA ESTRELA MAIA PAIVA

OAB/PB XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1015445-15.2024.8.11.0003 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Protesto Indevido de… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1015445-15.2024.8.11.0003 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Protesto Indevido de Título] Relator: Des(a). MARCOS REGENOLD FERNANDES Turma Julgadora: [DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA] Parte(s): [ENERGISA MATO GROSSO DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A - CNPJ: 03.467.321/0001-99 (APELANTE), EDUARDO QUEIROGA ESTRELA MAIA PAIVA - CPF: 078.165.854-38 (ADVOGADO), LUCIVANIA BEZERRA LOIOLA - CPF: 468.880.631-00 (APELADO), SERGIO HENRIQUE GUARESCHI - CPF: 796.711.799-91 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU PARCIALMENTE O RECURSO. E M E N T A DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. PROTESTO INDEVIDO DE TÍTULOS. DANO MORAL IN RE IPSA. QUANTUM INDENIZATÓRIO MANTIDO. APLICAÇÃO RETROATIVA DOS ÍNDICES PREVISTOS NA LEI 14.905/2024. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Apelação Cível interposta por ENERGISA MATO GROSSO DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A. contra sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara Cível de Rondonópolis/MT, que julgou procedente Ação Declaratória de Inexistência de Débito c/c Indenização por Dano Moral ajuizada por LUCIVANIA BEZERRA LOIOLA. A sentença declarou a inexistência de quatro débitos indevidamente protestados em nome da autora e condenou a empresa ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 6.000,00, com atualização monetária pelo INPC a partir da data da decisão e juros de mora de 1% ao mês desde o evento danoso. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. As questões em discussão consistem em: i) definir se a conduta da concessionária gera direito à indenização por danos morais; (ii) estabelecer se o valor arbitrado a título de indenização é proporcional à gravidade do dano; (iii) determinar os índices aplicáveis à correção monetária e aos juros de mora após a vigência da Lei n. 14.905/2024. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A ausência de impugnação específica aos fatos narrados na inicial atrai a presunção de veracidade prevista no art. 341 do CPC, sendo incontroverso que a empresa vinculou indevidamente o CPF da autora a protestos relacionados a terceiros. 4. A negligência da concessionária ao realizar o protesto sem verificação adequada dos dados caracteriza ato ilícito nos termos do art. 186 do CC. 5. O protesto indevido de títulos enseja dano moral in re ipsa, prescindindo de prova do prejuízo, conforme jurisprudência consolidada do STJ e do TJ/MT. 6. O valor de R$ 6.000,00 fixado a título de danos morais observa os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, considerando a natureza do dano, a condição das partes e o caráter pedagógico da indenização. 7. Com a entrada em vigor da Lei n. 14.905/2024, impõe-se a readequação dos encargos da condenação, com aplicação do regime anterior (juros de 1% ao mês e correção pelo INPC) até 30/08/2024, e, a partir dessa data, adoção exclusiva da taxa SELIC, que engloba juros e correção. IV. DISPOSITIVO E TESE 9. Recurso parcialmente provido. Tese de julgamento: 1. O protesto de título vinculado indevidamente ao CPF do consumidor, mesmo quando relacionado a débito de terceiro, configura falha na prestação do serviço e gera dano moral presumido (in re ipsa). 2. O valor de R$ 6.000,00 é adequado a título de indenização por danos morais em caso de protesto indevido, quando observados os critérios de razoabilidade, proporcionalidade, gravidade do dano e função pedagógica da condenação. 3. A partir da vigência da Lei n. 14.905/2024, aplica-se exclusivamente a taxa SELIC como índice unificado de correção monetária e juros moratórios, vedada sua cumulação com outros índices; antes disso, aplicam-se os critérios anteriores: juros de mora de 1% ao mês desde o evento danoso e correção monetária pelo INPC a partir do arbitramento. Dispositivos relevantes citados: CF, art. 5º, V e X; CC, arts. 186 e 406 (com redação da Lei 14.905/2024); CPC, art. 341; EC 113/2021, art. 3º. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no AREsp 1801059/RJ, Rel. Min. João Otávio de Noronha, Quarta Turma, j. 24.06.2024, DJe 27.06.2024; STJ, AgInt no AREsp 1025364/SP, Rel. Min. Luís Felipe Salomão, Quarta Turma, j. 27.06.2017, DJe 01.08.2017; TJMT, RAC 1002080-07.2018.8.11.0001, Rel. Desa. Maria Aparecida Ferreira Fago, j. 28.05.2024, DJe 07.06.2024. R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de Apelação Cível interposto por ENERGISA MATO GROSSO DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A. contra a r. sentença proferida pelo d. Juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de Rondonópolis/MT, que julgou procedente a pretensão deduzida na Ação Declaratória de Inexistência de Débito c/c Indenização por Dano Moral ajuizada por LUCIVANIA BEZERRA LOIOLA (vide ID. 277135877). Em suas razões recursais de ID. 277135879, a Apelante alega, em síntese: a) inexistência de dano moral indenizável, sustentando se tratar de mero aborrecimento; b) subsidiariamente, a redução do quantum indenizatório; c) aplicação da taxa SELIC como índice único de atualização monetária e juros, nos termos do art. 406 do CC e do art. 3º da EC n. 113/2021. Com essas considerações, requer o provimento do recurso com a consequente reforma da sentença, para julgar improcedente ação. Em Contrarrazões de ID. 277135883, a Apelada defende a manutenção da sentença, argumentando que o recurso é protelatório, uma vez que a apelante não impugnou os fatos narrados na inicial, sendo confessa quanto ao equívoco na inclusão do CPF da Autora/Apelada nos protestos, além de afirmar que o valor arbitrado a título de danos morais é adequado diante do caso concreto. Recurso tempestivo e preparado (ID. 277849391). É o relatório. Inclua-se em pauta para julgamento. V O T O R E L A T O R EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR) Colenda Câmara: Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso. Da análise dos autos, verifica-se que a Autora, ora Apelada, LUCIVANIA BEZERRA LOIOLA ajuizou a presente demanda em face da empresa Apelante, alegando, em suma, que é titular da unidade consumidora n. 6/2790089-3 junto à concessionária de energia. Aduz que tomou conhecimento da existência de 04 (quatro) protestos junto ao 4º Tabelionato de Notas e Protesto de Títulos de Rondonópolis/MT, envolvendo o número de seu CPF, indicados pela Requerida. Afirma que, embora constasse o número de seu CPF, os protestos tinham como devedora a Sra. Sueli Mainardes dos Santos. Informa a Parte Autora que ao buscar informações junto à empresa Requerida, foi inicialmente informada de que se tratava de um equívoco interno e que seriam efetuadas as baixas dos protestos, tendo inclusive recebido cópia dos pedidos de cancelamento, porém, sem as devidas assinaturas. Posteriormente, após conversas internas dos representantes da Requerida, estes se negaram a entregar os pedidos de cancelamento dos protestos, sob a alegação de que a Requerente seria devedora. Corroborando, a Parte Autora comprovou que a unidade consumidora (UC n. 6/130461-7), que originou os protestos, está instalada na Rua Vinte e Quatro, nº 32, Bairro Marechal Rondon, em Rondonópolis/MT, endereço pertencente à Sra. Sueli Mainardes dos Santos, conforme documentos extraídos do processo n. 1011049-63.2022.8.11.0003, que tramitou perante o 1º Juizado Especial Cível de Rondonópolis. Citada, ENERGISA MATO GROSSO DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A. apresentou contestação genérica, limitando-se a sustentar a inexistência de danos morais passíveis de indenização, sem impugnar especificamente os fatos narrados na inicial. Após regular tramitação do feito, sobreveio sentença julgando procedente a demanda, nos seguintes termos: “(...) Quanto ao fato narrado na peça de ingresso, dúvida alguma persiste de que o mesmo ocorreu, pois, a empresa ré ao ofertar a sua peça de bloqueio não conseguiu minorar a situação incômoda em que se encontra, asseverando que a autora não faz jus à pretensão indenizatória. Inequívoco o protesto, conforme se pode constatar pelos documentos centrados no processo, constando como devedora a Srª Sueli Mainardes dos Santos, constando o CPC 468.880.631-00, o qual pertence à autora, conforme documento Id 160212330. Também, há que se pontuar que é de conhecimento geral os malefícios que o registro do CPF - protesto provoca, que, em curto espaço de tempo, tornam-se de conhecimento na esfera de convívio do prejudicado, afetando-lhe a honra, o caráter e a personalidade, além de destruir um conceito formado ao longo dos anos e influir negativamente em seu patrimônio, constituindo-se em motivo para o pleito indenizatório. A autora informa em sua inicial que, quando manteve contato com prepostas da ré, a fim de solucionar a questão, fora informada que se tratava de um equívoco interno e que seriam efetuadas as baixas do protesto, inclusive lhe dando cópia dos pedidos de cancelamento, porém, sem as devidas assinaturas. A empresa ré, ao apresentar sua peça de bloqueio não conseguiu derruir os argumentos levados a efeito pela autora. Assim, há informes seguros de que houve má prestação dos serviços. Portanto, faz jus à indenização por danos morais, uma vez que comprovado restou nos autos que a autora sofreu danos em seu patrimônio material e psíquico, devendo a empresa requerida, por consequência lógica, ombrear com a responsabilidade. Assim, provado nos autos que houve má prestação de serviço, fato esse de exclusiva culpa da parte ré, assim, havendo o dano moral, impõe-se o seu ressarcimento e, no que tange a fixação do dano, área em que, em situação como dos autos, arbitro em R$ 6.000,00 (seis mil reais), indenização esta que atende os princípios, pois não se deve levar em conta apenas o potencial econômico da empresa demandada, é preciso também a repercussão do ressarcimento sobre a situação social e patrimonial do ofendido, para que lhe seja proporcionada. Face ao exposto e princípios de direito aplicáveis à espécie JULGO PROCEDENTE a presente 'Ação Declaratória de Inexistência de Débito c /c Indenização por Danos Morais" promovida por LUCIVANIA BEZERRA LOIOLA, em desfavor de ENERGISA MATO GROSSO – DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S/A, com qualificação nos autos, para: declarar inexistente os débitos no montante de R$ 504,90 (quinhentos e quatro reais e noventa centavos); R$ 872,06 (oitocentos e setenta e dois reais e seis centavos); R$ 855,50 (oitocentos e cinquenta e cinco reais e cinquenta centavos) e R $902,07 (novecentos e dois reais e sete centavos); condenar a empresa requerida, no pagamento da importância de R$ 6.000,00 (seis mil reais), a título de danos morais, a qual deverá ser corrigida 1% (um por cento) de juros ao mês a partir do dano e correção monetária INPC a contar desta decisão; condenar a empresa ré no pagamento das custas processuais e honorários advocatícios que arbitro em 10% (dez por cento), sobre o valor da condenação, ratificando a decisão Id 164916830.” (vide ID. 277135877). Irresignada, a Requerida interpôs o presente Recurso de Apelação, alegando, em síntese: a) inexistência de dano moral indenizável, sustentando se tratar de mero aborrecimento; b) subsidiariamente, a redução do quantum indenizatório; c) aplicação da taxa SELIC como índice único de atualização monetária e juros, nos termos do art. 406 do CC e do art. 3º da EC n. 113/2021. Sem delongas, extrai-se do feito que o cerne da controvérsia recursal reside em três pontos principais: a) a ocorrência ou não de dano moral indenizável; b) a adequação do quantum indenizatório; e c) os índices aplicáveis para correção monetária e juros de mora. Pois bem. ENERGISA MATO GROSSO DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A. sustenta a inexistência de dano moral indenizável, argumentando que a situação vivenciada por LUCIVANIA BEZERRA LOIOLA configura mero aborrecimento, insuficiente para gerar reparação extrapatrimonial. Contudo, tal argumentação não merece prosperar. Da análise dos autos, constata-se que a Apelante, em sua contestação, não impugnou especificamente os fatos narrados na inicial, limitando-se a alegar genericamente a inexistência de dano moral, sendo que tal conduta atrai a incidência do disposto no art. 341 do Código de Processo Civil, que estabelece a presunção de veracidade dos fatos não impugnados especificamente, in verbis: “Art. 341. Incumbe também ao réu manifestar-se precisamente sobre as alegações de fato constantes da petição inicial, presumindo-se verdadeiras as não impugnadas, salvo se: I - não for admissível, a seu respeito, a confissão; II - a petição inicial não estiver acompanhada de instrumento que a lei considerar da substância do ato; III - estiverem em contradição com a defesa, considerada em seu conjunto. Parágrafo único. O ônus da impugnação especificada dos fatos não se aplica ao defensor público, ao advogado dativo e ao curador especial.” A par disso, denota-se estar incontroverso nos autos que a Apelante promoveu o protesto de títulos relacionados a terceira pessoa, a saber, Sueli Mainardes dos Santos, vinculando indevidamente o CPF da Apelada (Cf. IDs. 277135855 e 277135856). Ao ponto, a documentação acostada comprova que a Apelada é titular apenas da Unidade Consumidora n. 6/2790089-3 (ID. 277135853), não tendo qualquer relação com a Unidade Consumidora n. 6/130461-7, que gerou os protestos questionados. In casu, a conduta da concessionária Apelante evidencia negligência na verificação dos dados cadastrais antes da promoção dos protestos, o que configura inequívoco ato ilícito, nos termos do art. 186 do Código Civil: “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.” No que tange ao dano moral, é pacífico o entendimento jurisprudencial no sentido de que o protesto indevido de títulos gera dano moral in re ipsa, ou seja, presumido, dispensando-se a comprovação de efetivo prejuízo. Isso porque o protesto indevido, por si só, causa constrangimento e abalo à honra e imagem da pessoa, cerceando seu acesso ao crédito e causando transtornos que extrapolam o mero aborrecimento cotidiano. Nesse sentido, é a jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça: “AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RECONSIDERAÇÃO DA DECISÃO. INDENIZAÇÃO. DANOS MORAIS. PROTESTO INDEVIDO. PRESCRIÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. DANO MORAL IN RE IPSA. CONSONÂNCIA COM A JURISPRUDÊNCIA DO STJ. SÚMULA N. 83 DO STJ. INCIDÊNCIA. QUANTUM INDENIZATÓRIO. ALTERAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N. 7 DO STJ. INCIDÊNCIA. REVISÃO. EXAME DAS PROVAS DOS AUTOS. NÃO CABIMENTO. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. BASES FÁTICAS DISTINTAS. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. (...) 2. Nos casos de protesto indevido de título e de inscrição indevida em cadastro de proteção ao crédito, o dano moral é considerado in re ipsa. (...). 6. Agravo interno desprovido.” (STJ. AgInt no AREsp: 1801059 RJ 2020/0321514-3. Relator Min. João Otávio de Noronha, Quarta Turma. Julgamento: 24/06/2024, DJe: 27/06/2024; destaquei.). Nessa trilha, segue a jurisprudência deste Tribunal: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – INSCRIÇÃO E EFETIVAÇÃO DE PROTESTO – HOMÔNIMO – DEVER DE INDENIZAR – ATO ILÍCITO – DANO MORAL IN RE IPSA – QUANTUM INDENIZATÓRIO – OBSERVÂNCIA DOS CRITÉRIOS DE RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. 1. Como cediço, na hipótese de protesto indevido ou inscrição irregular em cadastros de inadimplentes, o dano moral se configura in re ipsa, modalidade em que não se exige a apresentação de provas que demonstrem a ofensa moral, o próprio fato já configura o dano. (...). 4 . Recurso conhecido e desprovido.” (TJ/MT. RAC 1002080-07.2018.8.11.0001. Relatora Desa. Maria Aparecida Ferreira Fago, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo. Julgamento: 28/05/2024, DJe: 07/06/2024; destaquei.). Logo, demonstrada a conduta negligente da Apelante, que promoveu indevidamente o protesto de títulos vinculados ao CPF da Apelada, resta configurado o dano moral passível de indenização. Prosseguindo, no que tange ao quantum indenizatório fixado na sentença (R$ 6.000,00), extrai-se que a Apelante requer sua redução, alegando ser desproporcional ao dano supostamente causado. É cediço que a fixação do valor da indenização por danos morais deve atender aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, considerando-se a gravidade do dano, a condição econômica do ofensor e do ofendido, o caráter pedagógico e compensatório da medida, bem como a extensão do prejuízo sofrido, evitando-se o enriquecimento sem causa. O Superior Tribunal de Justiça tem adotado a tese de que somente deve ser revisto o valor da indenização por danos morais quando exorbitante ou insignificante, em flagrante violação aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade: “AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROTESTO INDEVIDO. DANO MORAL. QUANTUM INDENIZATÓRIO IRRISÓRIO. MAJORAÇÃO. ADEQUAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO. 1. O entendimento deste Sodalício é pacífico no sentido de que o valor estabelecido pelas instâncias ordinárias a título de indenização por danos morais pode ser revisto tão somente nas hipóteses em que a condenação se revelar irrisória ou exorbitante, distanciando-se dos padrões de razoabilidade. 2. No caso em tela, verifica-se que o montante fixado pela Corte de origem, no patamar de R$ 1.920,00 (um mil, novecentos e vinte reais), em razão de protesto indevido, mostrou-se irrisório, razão pela qual é plenamente viável a sua majoração para o patamar de R$ 10.000,00 (dez mil reais), porquanto mais adequado aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, que devem orientar a fixação do quantum indenizatório. Precedentes. 3. Agravo interno a que se nega provimento.” (STJ. AgInt no AREsp: 1025364 SP 2016/0315704-0. Relator Min. Luís Felipe Salomão, Quarta Turma. Julgamento: 27/06/2017, DJe: 01/08/2017; g. n.). No caso em análise, considerando a natureza do dano (protesto indevido), o constrangimento causado à Apelada, que teve seu CPF vinculado a protestos de títulos de terceiros, a capacidade econômica da Apelante (concessionária de serviço público), bem como a necessidade de desestimular a reiteração de condutas semelhantes, entendo que o valor fixado na sentença (R$ 6.000,00) está adequado aos parâmetros de razoabilidade e proporcionalidade, não se mostrando excessivo ou desproporcional à situação concreta. Na esteira desse entendimento, já decidi: “DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ORDINÁRIA. DECLARAÇÃO DE NULIDADE DE DUPLICATA MERCANTIL. PROTESTO INDEVIDO. DANO MORAL. QUANTUM INDENIZATÓRIO ADEQUADO. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. (...). 3. O protesto indevido de título, embora configure dano moral in re ipsa, deve ter sua indenização fixada com observância dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, evitando tanto o enriquecimento sem causa quanto a fixação de valor meramente simbólico. 4. O valor arbitrado na sentença a título de danos morais, equivalente a R$ 5.000,00 (cinco mil reais), é compatível com os parâmetros jurisprudenciais consolidados para casos análogos e a efetiva extensão do dano, mostrando-se adequado ao cumprimento das funções compensatória e pedagógica. (...). 5. Recurso conhecido e desprovido. Tese de julgamento: ‘O valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) mostra-se razoável e proporcional para indenização por danos morais decorrentes de protesto indevido quando suficiente para compensar os transtornos experimentados e cumprir a função pedagógica da condenação.’ (...).” (TJ/MT. RAC 00011951020158110035. Minha relatoria, Quinta Câmara de Direito Privado. Julgamento: 21/01/2025, DJe: 27/01/2025; destaquei.). Destarte, não havendo justificativa para redução do montante indenizatório, deve ser mantido o valor de R$ 6.000,00 fixado na sentença. Por fim, quanto aos índices de correção monetária e juros de mora fixados na sentença, denota-se a necessidade de reforma parcial para adequação às disposições da Lei n. 14.905/2024, que alterou dispositivos do Código Civil relativos aos juros de mora e correção monetária. A citada lei – que entrou em vigor em 30/08/2024 (60 dias após sua publicação) – modificou a sistemática de atualização monetária e juros de mora, devendo ser aplicada aos processos em curso, por se tratar de norma de ordem pública. No caso concreto, a sentença fixou juros de mora de 1% ao mês a partir do evento danoso e correção monetária pelo INPC a contar da data do arbitramento, em consonância com as Súmulas n. 362 e n. 54, ambas do STJ, que ditam respectivamente: “A correção monetária do valor da indenização do dano moral incide desde a data do arbitramento.”; “Os juros moratórios fluem a partir do evento danoso, em caso de responsabilidade extracontratual.” Ocorre que, com a entrada em vigor da Lei n. 14.905/2024, impõe-se a readequação dos encargos incidentes sobre a condenação, de modo que: a) Até 30/08/2024 (data da entrada em vigor da Lei n. 14.905/2024), devem ser aplicados os índices fixados na sentença: juros de mora de 1% ao mês a partir do evento danoso e correção monetária pelo INPC a partir da data do arbitramento; b) A partir de 30/08/2024, deve incidir exclusivamente a taxa SELIC, que já engloba juros de mora e correção monetária, sem possibilidade de cumulação com outros índices, nos termos do art. 406 do Código Civil, com redação dada pela Lei n. 14.905/2024. Nesse ponto específico, portanto, merece parcial provimento o recurso, apenas para adequar os índices de atualização da condenação conforme a nova legislação, a partir de sua vigência. Por todo o exposto, conheço e DOU PARCIAL PROVIMENTO ao Recurso de Apelação interposto por ENERGISA MATO GROSSO DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A., apenas para reformar a sentença quanto aos índices de atualização monetária e juros de mora, estabelecendo que: a) até 30/08/2024 (data da entrada em vigor da Lei n. 14.905/2024), devem incidir juros de mora de 1% ao mês a partir do evento danoso e correção monetária pelo INPC a partir da data do arbitramento; b) a partir de 30/08/2024, deve incidir exclusivamente a taxa SELIC, sem cumulação com outros índices. Deixo de majorar os honorários recursais (art. 85, §11, do CPC), uma vez que condicionada esta ao improvimento ou não conhecimento do recurso da parte contrária, sendo, portanto, incabível quando for provida a apelação, ainda que parcialmente, como na espécie (STJ, Tema n. 1.059, REsp n. 1.864.633/RS, Rel. Min. Paulo Sérgio Domingues, Corte Especial, j. 09/11/2023, DJe 21/12/2023). É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 22/04/2025

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Processo nº 1015445-15.2024.8.11.0003

ID: 260823063

Tribunal: TJMT Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1015445-15.2024.8.11.0003

Data de Disponibilização: 25/04/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

LUCIVANIA BEZERRA LOIOLA

Acórdão

Advogados:

SERGIO HENRIQUE GUARESCHI

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1015445-15.2024.8.11.0003 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Protesto Indevido de… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1015445-15.2024.8.11.0003 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Protesto Indevido de Título] Relator: Des(a). MARCOS REGENOLD FERNANDES Turma Julgadora: [DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA] Parte(s): [ENERGISA MATO GROSSO DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A - CNPJ: 03.467.321/0001-99 (APELANTE), EDUARDO QUEIROGA ESTRELA MAIA PAIVA - CPF: 078.165.854-38 (ADVOGADO), LUCIVANIA BEZERRA LOIOLA - CPF: 468.880.631-00 (APELADO), SERGIO HENRIQUE GUARESCHI - CPF: 796.711.799-91 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU PARCIALMENTE O RECURSO. E M E N T A DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. PROTESTO INDEVIDO DE TÍTULOS. DANO MORAL IN RE IPSA. QUANTUM INDENIZATÓRIO MANTIDO. APLICAÇÃO RETROATIVA DOS ÍNDICES PREVISTOS NA LEI 14.905/2024. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Apelação Cível interposta por ENERGISA MATO GROSSO DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A. contra sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara Cível de Rondonópolis/MT, que julgou procedente Ação Declaratória de Inexistência de Débito c/c Indenização por Dano Moral ajuizada por LUCIVANIA BEZERRA LOIOLA. A sentença declarou a inexistência de quatro débitos indevidamente protestados em nome da autora e condenou a empresa ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 6.000,00, com atualização monetária pelo INPC a partir da data da decisão e juros de mora de 1% ao mês desde o evento danoso. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. As questões em discussão consistem em: i) definir se a conduta da concessionária gera direito à indenização por danos morais; (ii) estabelecer se o valor arbitrado a título de indenização é proporcional à gravidade do dano; (iii) determinar os índices aplicáveis à correção monetária e aos juros de mora após a vigência da Lei n. 14.905/2024. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A ausência de impugnação específica aos fatos narrados na inicial atrai a presunção de veracidade prevista no art. 341 do CPC, sendo incontroverso que a empresa vinculou indevidamente o CPF da autora a protestos relacionados a terceiros. 4. A negligência da concessionária ao realizar o protesto sem verificação adequada dos dados caracteriza ato ilícito nos termos do art. 186 do CC. 5. O protesto indevido de títulos enseja dano moral in re ipsa, prescindindo de prova do prejuízo, conforme jurisprudência consolidada do STJ e do TJ/MT. 6. O valor de R$ 6.000,00 fixado a título de danos morais observa os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, considerando a natureza do dano, a condição das partes e o caráter pedagógico da indenização. 7. Com a entrada em vigor da Lei n. 14.905/2024, impõe-se a readequação dos encargos da condenação, com aplicação do regime anterior (juros de 1% ao mês e correção pelo INPC) até 30/08/2024, e, a partir dessa data, adoção exclusiva da taxa SELIC, que engloba juros e correção. IV. DISPOSITIVO E TESE 9. Recurso parcialmente provido. Tese de julgamento: 1. O protesto de título vinculado indevidamente ao CPF do consumidor, mesmo quando relacionado a débito de terceiro, configura falha na prestação do serviço e gera dano moral presumido (in re ipsa). 2. O valor de R$ 6.000,00 é adequado a título de indenização por danos morais em caso de protesto indevido, quando observados os critérios de razoabilidade, proporcionalidade, gravidade do dano e função pedagógica da condenação. 3. A partir da vigência da Lei n. 14.905/2024, aplica-se exclusivamente a taxa SELIC como índice unificado de correção monetária e juros moratórios, vedada sua cumulação com outros índices; antes disso, aplicam-se os critérios anteriores: juros de mora de 1% ao mês desde o evento danoso e correção monetária pelo INPC a partir do arbitramento. Dispositivos relevantes citados: CF, art. 5º, V e X; CC, arts. 186 e 406 (com redação da Lei 14.905/2024); CPC, art. 341; EC 113/2021, art. 3º. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no AREsp 1801059/RJ, Rel. Min. João Otávio de Noronha, Quarta Turma, j. 24.06.2024, DJe 27.06.2024; STJ, AgInt no AREsp 1025364/SP, Rel. Min. Luís Felipe Salomão, Quarta Turma, j. 27.06.2017, DJe 01.08.2017; TJMT, RAC 1002080-07.2018.8.11.0001, Rel. Desa. Maria Aparecida Ferreira Fago, j. 28.05.2024, DJe 07.06.2024. R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de Apelação Cível interposto por ENERGISA MATO GROSSO DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A. contra a r. sentença proferida pelo d. Juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de Rondonópolis/MT, que julgou procedente a pretensão deduzida na Ação Declaratória de Inexistência de Débito c/c Indenização por Dano Moral ajuizada por LUCIVANIA BEZERRA LOIOLA (vide ID. 277135877). Em suas razões recursais de ID. 277135879, a Apelante alega, em síntese: a) inexistência de dano moral indenizável, sustentando se tratar de mero aborrecimento; b) subsidiariamente, a redução do quantum indenizatório; c) aplicação da taxa SELIC como índice único de atualização monetária e juros, nos termos do art. 406 do CC e do art. 3º da EC n. 113/2021. Com essas considerações, requer o provimento do recurso com a consequente reforma da sentença, para julgar improcedente ação. Em Contrarrazões de ID. 277135883, a Apelada defende a manutenção da sentença, argumentando que o recurso é protelatório, uma vez que a apelante não impugnou os fatos narrados na inicial, sendo confessa quanto ao equívoco na inclusão do CPF da Autora/Apelada nos protestos, além de afirmar que o valor arbitrado a título de danos morais é adequado diante do caso concreto. Recurso tempestivo e preparado (ID. 277849391). É o relatório. Inclua-se em pauta para julgamento. V O T O R E L A T O R EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR) Colenda Câmara: Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso. Da análise dos autos, verifica-se que a Autora, ora Apelada, LUCIVANIA BEZERRA LOIOLA ajuizou a presente demanda em face da empresa Apelante, alegando, em suma, que é titular da unidade consumidora n. 6/2790089-3 junto à concessionária de energia. Aduz que tomou conhecimento da existência de 04 (quatro) protestos junto ao 4º Tabelionato de Notas e Protesto de Títulos de Rondonópolis/MT, envolvendo o número de seu CPF, indicados pela Requerida. Afirma que, embora constasse o número de seu CPF, os protestos tinham como devedora a Sra. Sueli Mainardes dos Santos. Informa a Parte Autora que ao buscar informações junto à empresa Requerida, foi inicialmente informada de que se tratava de um equívoco interno e que seriam efetuadas as baixas dos protestos, tendo inclusive recebido cópia dos pedidos de cancelamento, porém, sem as devidas assinaturas. Posteriormente, após conversas internas dos representantes da Requerida, estes se negaram a entregar os pedidos de cancelamento dos protestos, sob a alegação de que a Requerente seria devedora. Corroborando, a Parte Autora comprovou que a unidade consumidora (UC n. 6/130461-7), que originou os protestos, está instalada na Rua Vinte e Quatro, nº 32, Bairro Marechal Rondon, em Rondonópolis/MT, endereço pertencente à Sra. Sueli Mainardes dos Santos, conforme documentos extraídos do processo n. 1011049-63.2022.8.11.0003, que tramitou perante o 1º Juizado Especial Cível de Rondonópolis. Citada, ENERGISA MATO GROSSO DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A. apresentou contestação genérica, limitando-se a sustentar a inexistência de danos morais passíveis de indenização, sem impugnar especificamente os fatos narrados na inicial. Após regular tramitação do feito, sobreveio sentença julgando procedente a demanda, nos seguintes termos: “(...) Quanto ao fato narrado na peça de ingresso, dúvida alguma persiste de que o mesmo ocorreu, pois, a empresa ré ao ofertar a sua peça de bloqueio não conseguiu minorar a situação incômoda em que se encontra, asseverando que a autora não faz jus à pretensão indenizatória. Inequívoco o protesto, conforme se pode constatar pelos documentos centrados no processo, constando como devedora a Srª Sueli Mainardes dos Santos, constando o CPC 468.880.631-00, o qual pertence à autora, conforme documento Id 160212330. Também, há que se pontuar que é de conhecimento geral os malefícios que o registro do CPF - protesto provoca, que, em curto espaço de tempo, tornam-se de conhecimento na esfera de convívio do prejudicado, afetando-lhe a honra, o caráter e a personalidade, além de destruir um conceito formado ao longo dos anos e influir negativamente em seu patrimônio, constituindo-se em motivo para o pleito indenizatório. A autora informa em sua inicial que, quando manteve contato com prepostas da ré, a fim de solucionar a questão, fora informada que se tratava de um equívoco interno e que seriam efetuadas as baixas do protesto, inclusive lhe dando cópia dos pedidos de cancelamento, porém, sem as devidas assinaturas. A empresa ré, ao apresentar sua peça de bloqueio não conseguiu derruir os argumentos levados a efeito pela autora. Assim, há informes seguros de que houve má prestação dos serviços. Portanto, faz jus à indenização por danos morais, uma vez que comprovado restou nos autos que a autora sofreu danos em seu patrimônio material e psíquico, devendo a empresa requerida, por consequência lógica, ombrear com a responsabilidade. Assim, provado nos autos que houve má prestação de serviço, fato esse de exclusiva culpa da parte ré, assim, havendo o dano moral, impõe-se o seu ressarcimento e, no que tange a fixação do dano, área em que, em situação como dos autos, arbitro em R$ 6.000,00 (seis mil reais), indenização esta que atende os princípios, pois não se deve levar em conta apenas o potencial econômico da empresa demandada, é preciso também a repercussão do ressarcimento sobre a situação social e patrimonial do ofendido, para que lhe seja proporcionada. Face ao exposto e princípios de direito aplicáveis à espécie JULGO PROCEDENTE a presente 'Ação Declaratória de Inexistência de Débito c /c Indenização por Danos Morais" promovida por LUCIVANIA BEZERRA LOIOLA, em desfavor de ENERGISA MATO GROSSO – DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S/A, com qualificação nos autos, para: declarar inexistente os débitos no montante de R$ 504,90 (quinhentos e quatro reais e noventa centavos); R$ 872,06 (oitocentos e setenta e dois reais e seis centavos); R$ 855,50 (oitocentos e cinquenta e cinco reais e cinquenta centavos) e R $902,07 (novecentos e dois reais e sete centavos); condenar a empresa requerida, no pagamento da importância de R$ 6.000,00 (seis mil reais), a título de danos morais, a qual deverá ser corrigida 1% (um por cento) de juros ao mês a partir do dano e correção monetária INPC a contar desta decisão; condenar a empresa ré no pagamento das custas processuais e honorários advocatícios que arbitro em 10% (dez por cento), sobre o valor da condenação, ratificando a decisão Id 164916830.” (vide ID. 277135877). Irresignada, a Requerida interpôs o presente Recurso de Apelação, alegando, em síntese: a) inexistência de dano moral indenizável, sustentando se tratar de mero aborrecimento; b) subsidiariamente, a redução do quantum indenizatório; c) aplicação da taxa SELIC como índice único de atualização monetária e juros, nos termos do art. 406 do CC e do art. 3º da EC n. 113/2021. Sem delongas, extrai-se do feito que o cerne da controvérsia recursal reside em três pontos principais: a) a ocorrência ou não de dano moral indenizável; b) a adequação do quantum indenizatório; e c) os índices aplicáveis para correção monetária e juros de mora. Pois bem. ENERGISA MATO GROSSO DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A. sustenta a inexistência de dano moral indenizável, argumentando que a situação vivenciada por LUCIVANIA BEZERRA LOIOLA configura mero aborrecimento, insuficiente para gerar reparação extrapatrimonial. Contudo, tal argumentação não merece prosperar. Da análise dos autos, constata-se que a Apelante, em sua contestação, não impugnou especificamente os fatos narrados na inicial, limitando-se a alegar genericamente a inexistência de dano moral, sendo que tal conduta atrai a incidência do disposto no art. 341 do Código de Processo Civil, que estabelece a presunção de veracidade dos fatos não impugnados especificamente, in verbis: “Art. 341. Incumbe também ao réu manifestar-se precisamente sobre as alegações de fato constantes da petição inicial, presumindo-se verdadeiras as não impugnadas, salvo se: I - não for admissível, a seu respeito, a confissão; II - a petição inicial não estiver acompanhada de instrumento que a lei considerar da substância do ato; III - estiverem em contradição com a defesa, considerada em seu conjunto. Parágrafo único. O ônus da impugnação especificada dos fatos não se aplica ao defensor público, ao advogado dativo e ao curador especial.” A par disso, denota-se estar incontroverso nos autos que a Apelante promoveu o protesto de títulos relacionados a terceira pessoa, a saber, Sueli Mainardes dos Santos, vinculando indevidamente o CPF da Apelada (Cf. IDs. 277135855 e 277135856). Ao ponto, a documentação acostada comprova que a Apelada é titular apenas da Unidade Consumidora n. 6/2790089-3 (ID. 277135853), não tendo qualquer relação com a Unidade Consumidora n. 6/130461-7, que gerou os protestos questionados. In casu, a conduta da concessionária Apelante evidencia negligência na verificação dos dados cadastrais antes da promoção dos protestos, o que configura inequívoco ato ilícito, nos termos do art. 186 do Código Civil: “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.” No que tange ao dano moral, é pacífico o entendimento jurisprudencial no sentido de que o protesto indevido de títulos gera dano moral in re ipsa, ou seja, presumido, dispensando-se a comprovação de efetivo prejuízo. Isso porque o protesto indevido, por si só, causa constrangimento e abalo à honra e imagem da pessoa, cerceando seu acesso ao crédito e causando transtornos que extrapolam o mero aborrecimento cotidiano. Nesse sentido, é a jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça: “AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RECONSIDERAÇÃO DA DECISÃO. INDENIZAÇÃO. DANOS MORAIS. PROTESTO INDEVIDO. PRESCRIÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. DANO MORAL IN RE IPSA. CONSONÂNCIA COM A JURISPRUDÊNCIA DO STJ. SÚMULA N. 83 DO STJ. INCIDÊNCIA. QUANTUM INDENIZATÓRIO. ALTERAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N. 7 DO STJ. INCIDÊNCIA. REVISÃO. EXAME DAS PROVAS DOS AUTOS. NÃO CABIMENTO. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. BASES FÁTICAS DISTINTAS. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. (...) 2. Nos casos de protesto indevido de título e de inscrição indevida em cadastro de proteção ao crédito, o dano moral é considerado in re ipsa. (...). 6. Agravo interno desprovido.” (STJ. AgInt no AREsp: 1801059 RJ 2020/0321514-3. Relator Min. João Otávio de Noronha, Quarta Turma. Julgamento: 24/06/2024, DJe: 27/06/2024; destaquei.). Nessa trilha, segue a jurisprudência deste Tribunal: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – INSCRIÇÃO E EFETIVAÇÃO DE PROTESTO – HOMÔNIMO – DEVER DE INDENIZAR – ATO ILÍCITO – DANO MORAL IN RE IPSA – QUANTUM INDENIZATÓRIO – OBSERVÂNCIA DOS CRITÉRIOS DE RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. 1. Como cediço, na hipótese de protesto indevido ou inscrição irregular em cadastros de inadimplentes, o dano moral se configura in re ipsa, modalidade em que não se exige a apresentação de provas que demonstrem a ofensa moral, o próprio fato já configura o dano. (...). 4 . Recurso conhecido e desprovido.” (TJ/MT. RAC 1002080-07.2018.8.11.0001. Relatora Desa. Maria Aparecida Ferreira Fago, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo. Julgamento: 28/05/2024, DJe: 07/06/2024; destaquei.). Logo, demonstrada a conduta negligente da Apelante, que promoveu indevidamente o protesto de títulos vinculados ao CPF da Apelada, resta configurado o dano moral passível de indenização. Prosseguindo, no que tange ao quantum indenizatório fixado na sentença (R$ 6.000,00), extrai-se que a Apelante requer sua redução, alegando ser desproporcional ao dano supostamente causado. É cediço que a fixação do valor da indenização por danos morais deve atender aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, considerando-se a gravidade do dano, a condição econômica do ofensor e do ofendido, o caráter pedagógico e compensatório da medida, bem como a extensão do prejuízo sofrido, evitando-se o enriquecimento sem causa. O Superior Tribunal de Justiça tem adotado a tese de que somente deve ser revisto o valor da indenização por danos morais quando exorbitante ou insignificante, em flagrante violação aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade: “AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROTESTO INDEVIDO. DANO MORAL. QUANTUM INDENIZATÓRIO IRRISÓRIO. MAJORAÇÃO. ADEQUAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO. 1. O entendimento deste Sodalício é pacífico no sentido de que o valor estabelecido pelas instâncias ordinárias a título de indenização por danos morais pode ser revisto tão somente nas hipóteses em que a condenação se revelar irrisória ou exorbitante, distanciando-se dos padrões de razoabilidade. 2. No caso em tela, verifica-se que o montante fixado pela Corte de origem, no patamar de R$ 1.920,00 (um mil, novecentos e vinte reais), em razão de protesto indevido, mostrou-se irrisório, razão pela qual é plenamente viável a sua majoração para o patamar de R$ 10.000,00 (dez mil reais), porquanto mais adequado aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, que devem orientar a fixação do quantum indenizatório. Precedentes. 3. Agravo interno a que se nega provimento.” (STJ. AgInt no AREsp: 1025364 SP 2016/0315704-0. Relator Min. Luís Felipe Salomão, Quarta Turma. Julgamento: 27/06/2017, DJe: 01/08/2017; g. n.). No caso em análise, considerando a natureza do dano (protesto indevido), o constrangimento causado à Apelada, que teve seu CPF vinculado a protestos de títulos de terceiros, a capacidade econômica da Apelante (concessionária de serviço público), bem como a necessidade de desestimular a reiteração de condutas semelhantes, entendo que o valor fixado na sentença (R$ 6.000,00) está adequado aos parâmetros de razoabilidade e proporcionalidade, não se mostrando excessivo ou desproporcional à situação concreta. Na esteira desse entendimento, já decidi: “DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ORDINÁRIA. DECLARAÇÃO DE NULIDADE DE DUPLICATA MERCANTIL. PROTESTO INDEVIDO. DANO MORAL. QUANTUM INDENIZATÓRIO ADEQUADO. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. (...). 3. O protesto indevido de título, embora configure dano moral in re ipsa, deve ter sua indenização fixada com observância dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, evitando tanto o enriquecimento sem causa quanto a fixação de valor meramente simbólico. 4. O valor arbitrado na sentença a título de danos morais, equivalente a R$ 5.000,00 (cinco mil reais), é compatível com os parâmetros jurisprudenciais consolidados para casos análogos e a efetiva extensão do dano, mostrando-se adequado ao cumprimento das funções compensatória e pedagógica. (...). 5. Recurso conhecido e desprovido. Tese de julgamento: ‘O valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) mostra-se razoável e proporcional para indenização por danos morais decorrentes de protesto indevido quando suficiente para compensar os transtornos experimentados e cumprir a função pedagógica da condenação.’ (...).” (TJ/MT. RAC 00011951020158110035. Minha relatoria, Quinta Câmara de Direito Privado. Julgamento: 21/01/2025, DJe: 27/01/2025; destaquei.). Destarte, não havendo justificativa para redução do montante indenizatório, deve ser mantido o valor de R$ 6.000,00 fixado na sentença. Por fim, quanto aos índices de correção monetária e juros de mora fixados na sentença, denota-se a necessidade de reforma parcial para adequação às disposições da Lei n. 14.905/2024, que alterou dispositivos do Código Civil relativos aos juros de mora e correção monetária. A citada lei – que entrou em vigor em 30/08/2024 (60 dias após sua publicação) – modificou a sistemática de atualização monetária e juros de mora, devendo ser aplicada aos processos em curso, por se tratar de norma de ordem pública. No caso concreto, a sentença fixou juros de mora de 1% ao mês a partir do evento danoso e correção monetária pelo INPC a contar da data do arbitramento, em consonância com as Súmulas n. 362 e n. 54, ambas do STJ, que ditam respectivamente: “A correção monetária do valor da indenização do dano moral incide desde a data do arbitramento.”; “Os juros moratórios fluem a partir do evento danoso, em caso de responsabilidade extracontratual.” Ocorre que, com a entrada em vigor da Lei n. 14.905/2024, impõe-se a readequação dos encargos incidentes sobre a condenação, de modo que: a) Até 30/08/2024 (data da entrada em vigor da Lei n. 14.905/2024), devem ser aplicados os índices fixados na sentença: juros de mora de 1% ao mês a partir do evento danoso e correção monetária pelo INPC a partir da data do arbitramento; b) A partir de 30/08/2024, deve incidir exclusivamente a taxa SELIC, que já engloba juros de mora e correção monetária, sem possibilidade de cumulação com outros índices, nos termos do art. 406 do Código Civil, com redação dada pela Lei n. 14.905/2024. Nesse ponto específico, portanto, merece parcial provimento o recurso, apenas para adequar os índices de atualização da condenação conforme a nova legislação, a partir de sua vigência. Por todo o exposto, conheço e DOU PARCIAL PROVIMENTO ao Recurso de Apelação interposto por ENERGISA MATO GROSSO DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A., apenas para reformar a sentença quanto aos índices de atualização monetária e juros de mora, estabelecendo que: a) até 30/08/2024 (data da entrada em vigor da Lei n. 14.905/2024), devem incidir juros de mora de 1% ao mês a partir do evento danoso e correção monetária pelo INPC a partir da data do arbitramento; b) a partir de 30/08/2024, deve incidir exclusivamente a taxa SELIC, sem cumulação com outros índices. Deixo de majorar os honorários recursais (art. 85, §11, do CPC), uma vez que condicionada esta ao improvimento ou não conhecimento do recurso da parte contrária, sendo, portanto, incabível quando for provida a apelação, ainda que parcialmente, como na espécie (STJ, Tema n. 1.059, REsp n. 1.864.633/RS, Rel. Min. Paulo Sérgio Domingues, Corte Especial, j. 09/11/2023, DJe 21/12/2023). É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 22/04/2025

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Processo nº 1001167-89.2024.8.11.0041

ID: 315128487

Tribunal: TJMT Órgão: 3ª VARA ESP. DA FAZENDA PÚBLICA DE CUIABÁ Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1001167-89.2024.8.11.0041

Data de Disponibilização: 03/07/2025

Polo Ativo:

CARLOS DE AMORIM EVANGELISTA

Polo Passivo:

Sentença

Advogados:

GUSTAVO JOSE FARIAS

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

BRAGA VINICIUS PEREIRA DO NASCIMENTO

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO NÚCLEO DE JUSTIÇA DIGITAL DE ATUAÇÃO ESTRATÉGICA - NAE PROCESSO: 1001167-89.2024.8.11.0041 CLASSE: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) POLO ATIVO: CARLOS DE AMORIM EVA… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO NÚCLEO DE JUSTIÇA DIGITAL DE ATUAÇÃO ESTRATÉGICA - NAE PROCESSO: 1001167-89.2024.8.11.0041 CLASSE: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) POLO ATIVO: CARLOS DE AMORIM EVANGELISTA REPRESENTANTES POLO ATIVO: BRAGA VINICIUS PEREIRA DO NASCIMENTO - MT19652-O e GUSTAVO JOSE FARIAS - MT30477/O POLO PASSIVO: MUNICÍPIO DE CUIABÁ SENTENÇA Vistos etc. Trata-se de ação declaratória de inexistência de débito c/c indenização por danos morais, proposta por CARLOS DE AMORIM EVANGELISTA em desfavor do MUNICÍPIO DE CUIABÁ, na qual a parte autora alega que teve seu nome indevidamente protestado em cartório, em razão de suposto débito tributário que não reconhece como seu, no valor de R$ 1.227.165,00 (um milhão, duzentos e vinte e sete mil, cento e sessenta e cinco reais). Afirma que, ao procurar crédito bancário, foi surpreendido pela informação de que havia um protesto em seu nome, conforme certidão extraída junto ao cartório competente e consulta ao aplicativo do Serasa. Após diligência junto à Procuradoria Municipal, foi informado de que se tratava de um equívoco, sendo o verdadeiro devedor uma pessoa distinta, de nome Carlos Daly Dalcol Trevisan. Postula, portanto, o reconhecimento judicial da inexistência do referido débito e a condenação do Município ao pagamento de indenização por danos morais. Tutela de urgência foi deferida para suspensão do protesto conforme decisão de Id. 141031035. O Município de Cuiabá apresentou contestação, sustentando, em síntese, que não houve ilegalidade na certidão de dívida ativa protestada e que os danos alegados não restaram configurados. Por sua vez, o autor apresentou impugnação à contestação conforme Id. 144611856, rechaçando as alegações do requerido, pugnando pela total procedência dos pedidos iniciais. Os autos vieram conclusos para sentença. EIS O RELATÓRIO. FUNDAMENTO E DECIDO. DO JULGAMENTO ANTECIPADO DO MÉRITO Nos termos do artigo 355, inciso I, do Código de Processo Civil, o julgamento antecipado do mérito é cabível quando a causa versar sobre questão unicamente de direito ou, sendo de direito e de fato, não houver necessidade de produção de outras provas. No presente caso, as partes foram devidamente intimadas para especificarem provas (ID 140888526), tendo ambas se manifestado no sentido de prosseguimento do feito com base nas provas já constantes nos autos. A controvérsia é essencialmente documental, havendo farto acervo probatório apto a ensejar julgamento imediato da lide, razão pela qual passo à análise do mérito. DA PRELIMINAR DE INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA O Município de Cuiabá, em sua contestação, suscitou a preliminar de incompetência absoluta deste juízo para o processamento da presente demanda, sob o argumento de que se trata de matéria de natureza tributária, a qual estaria afeta exclusivamente à Vara Especializada da Fazenda Pública, o que, tal preliminar não merece prosperar. A presente ação, embora envolva título oriundo de dívida ativa, não versa sobre a validade do crédito tributário em si, tampouco impugna sua exigibilidade, mas sim a ilegalidade de protesto promovido em nome de pessoa diversa do devedor, utilizando-se equivocadamente do CPF do autor, com pleito voltado à reparação civil por danos morais em decorrência do constrangimento indevidamente sofrido. Logo, a lide não possui natureza executiva ou tributária, mas sim cível indenizatória, o que atrai a competência da Vara Cível onde ajuizada, conforme a regra do art. 46 do CPC. Assim, afasto a preliminar de incompetência absoluta arguida pelo requerido. DO PEDIDO DECLARATÓRIO – FALTA DE INTERESSE PROCESSUAL O pedido de declaração de inexistência de débito tributário esbarra na ausência de interesse de agir da parte autora, na medida em que não há, no caso concreto, nenhuma inscrição ativa ou cobrança judicial ou extrajudicial promovida contra o autor em nome próprio. O documento de ID 138498310 – extrato da Procuradoria Municipal – demonstra, de forma inequívoca, que o débito protestado não possui como contribuinte o autor, embora conste o número de seu CPF, mas sim terceiro, homônimo, identificado como Carlos Daly Dalcol Trevisan. A confusão na emissão da Certidão de Dívida Ativa, posteriormente levada a protesto em nome da parte equivocada, foi reconhecida pela própria Administração, inclusive motivando o cancelamento da negativação por decisão liminar anterior ao ajuizamento da ação. Com o reconhecimento extrajudicial do equívoco e a consequente cessação dos efeitos da negativação por decisão liminar, o autor já obteve, no plano prático, a desconstituição dos efeitos do ato lesivo. A ação perdeu seu objeto quanto ao pedido declaratório. Assim, ausente a necessidade e a utilidade da providência jurisdicional postulada, impõe-se o reconhecimento da ausência de interesse processual quanto ao pedido de declaração de inexistência do débito, com extinção do feito, nesta parte, sem resolução do mérito, nos termos do art. 485, VI, do CPC. DO DANO MORAL – RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO MUNICÍPIO E QUANTUM INDENIZATÓRIO A configuração do dano moral, no caso concreto, é inquestionável. Ainda que o nome do autor não constasse nominalmente na certidão de protesto lavrada pelo cartório, constava o número de seu CPF, identificador único e inequívoco da pessoa natural nos registros públicos e privados. A utilização indevida do CPF do autor ensejou a negativação de seu nome perante instituições de proteção ao crédito, o que ficou comprovado pela certidão de protesto de ID. 138498308, pela consulta ao Serasa e pelos extratos bancários. O equívoco atingiu frontalmente sua imagem e reputação perante o mercado de crédito, sendo suficiente para gerar o abalo moral indenizável. A jurisprudência firmou entendimento de que a indevida negativação em cadastros restritivos, ainda que por erro de terceiros, configura dano moral puro, de ocorrência presumida (in re ipsa), conforme se vê: “Ementa: APELAÇÃO CÍVEL. PRELIMINARAES. ILEGITIMIDADE PASSIVA E COISA JULGADA. REJEITADAS . AÇÃO INDENIZATÓRIA. CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. AUSÊNCIA DE TRANSFERÊNCIA DA TITULARIDADE. DÉBITOS POSTERIORES DE IPTU/TLP. PROTESTO INDEVIDO. DANO MORAL IN RE IPSA. QUANTUM INDENIZATÓRIO. REDUÇÃO . POSSIBILIDADE. 1. A Teoria da Asserção, adotada por grande parte da doutrina e da jurisprudência brasileiras, difunde que a verificação das condições da ação, sendo a legitimidade das partes uma delas, será feita com base na afirmação simples do autor, em sua petição inicial, de ser o réu responsável pelo dano alegado. 2 . Verificando que a causa de pedir da presente ação é diversa de outra anteriormente ajuizada, ainda que envolva o mesmo contrato objeto da lide, não há que se falar em ofensa à coisa julgada. 3. Em se tratando de realização de protesto indevido por culpa exclusiva da parte ré que deixou de transferir a titularidade de imóvel objeto de contrato de compra e venda e de adimplir os tributos vinculado ao bem após a sua aquisição, o dano moral revela-se presumido, em caráter in re ipsa, por decorrer da própria ofensa, sendo, portanto, desnecessária a prova do prejuízo efetivamente experimentado a macular a honra objetiva da pessoa jurídica. 4 . A quantificação dos danos morais deve obedecer a critérios de razoabilidade, levando em conta duas funções principais: a reparadora dos danos sofridos e a preventiva de comportamentos futuros semelhantes, de modo que a indenização fixada não pode ser fonte de obtenção de vantagem indevida, bem como não pode ser irrisória, apta a fomentar comportamentos descompromissados. 5. Recurso conhecido e parcialmente provido. (TJ-DF 0738749-41 .2021.8.07.0001 1810758, Relator.: ANA CANTARINO, Data de Julgamento: 01/02/2024, 5ª Turma Cível, Data de Publicação: 16/02/2024) APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE RESPONSABILIDADE CIVIL – INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – Houve inscrição indevida em dívida ativa por débito de IPTU inexistente, bem como propositura de execução fiscal pelo Município de São José do Rio Preto – Dano moral – Cabimento – No que diz respeito ao valor indenizatório, compreende-se que foi arbitrado com razoabilidade pelo juízo a quo, observando-se o bem jurídico tutelado, a gravidade da conduta, a extensão do dano e as condições financeiras da ofendida e do ofensor, a fim de não gerar o enriquecimento ou o empobrecimento indevido de ninguém – Pedido inicial julgado procedente – Confirmação da sentença – Recurso não provido. (TJ-SP - AC: 00269921720038260576 SP 0026992-17.2003.8 .26.0576, Relator.: Osvaldo de Oliveira, Data de Julgamento: 13/05/2019, 12ª Câmara de Direito Público, Data de Publicação: 13/05/2019).” Acrescente-se que o valor do protesto – R$ 1.227.165,00 – por si só, já é indicativo da gravidade do abalo sofrido, considerando a desproporção frente à realidade socioeconômica do autor, que atua como trabalhador autônomo, prestador de serviços de manutenção de piscinas, conforme comprovado nos autos. Nessas circunstâncias, é plenamente justificável a fixação da indenização por danos morais no montante de R$ 15.000,00 (quinze mil reais), valor que atende aos critérios da proporcionalidade e razoabilidade, possui efeito reparador e pedagógico e evita enriquecimento sem causa da vítima. No caso em análise, o montante pleiteado pelo autor (R$ 20.000,00) revela-se um tanto excessivo, mas, por outro lado, o valor do protesto indevido, o abalo enfrentado e o tempo de exposição do nome do autor nos cadastros de inadimplentes justificam a fixação da indenização em R$ 15.000,00 (quinze mil reais), valor esse que já tem sido aceito pela jurisprudência em casos análogos. Esse valor está em consonância com o arbitramento médio em casos semelhantes julgados pelo TJMT, inclusive quando a negativação decorre de uso incorreto de dados pessoais: “EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – INSCRIÇÃO E EFETIVAÇÃO DE PROTESTO – HOMÔNIMO – DEVER DE INDENIZAR – ATO ILÍCITO – DANO MORAL IN RE IPSA – QUANTUM INDENIZATÓRIO – OBSERVÂNCIA DOS CRITÉRIOS DE RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. 1. Como cediço, na hipótese de protesto indevido ou inscrição irregular em cadastros de inadimplentes, o dano moral se configura in re ipsa, modalidade em que não se exige a apresentação de provas que demonstrem a ofensa moral, o próprio fato já configura o dano. 2 . Ademais, o apontamento de dívida a protesto e o ajuizamento de execuções fiscais, em decorrência de cobrança de dívida de homônimo configura hipótese de danos morais, passível de indenização. 3. O quantum indenizatório deve levar em consideração os critérios da razoabilidade, proporcionalidade e equidade, sem olvidar o grau de culpa dos envolvidos, a gravidade do dano, suas repercussões, bem como a função pedagógica do dever de reparar. 4 . Recurso conhecido e desprovido. (TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 1002080-07.2018.8 .11.0001, Relator.: MARIA APARECIDA FERREIRA FAGO, Data de Julgamento: 28/05/2024, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Data de Publicação: 07/06/2024).” Por outro lado, restou incontroverso que a parte autora teve seu nome protestado indevidamente em cartório, por débito de elevado valor, a que não deu causa. Tal fato está demonstrado na certidão de protesto (ID 138498308), na consulta ao Serasa e, sobretudo, nas manifestações e documentos emitidos pela própria Procuradoria Geral do Município, que reconheceu a existência do erro material. A responsabilidade civil do Estado decorre da teoria do risco administrativo, consagrada no art. 37, § 6º, da Constituição Federal, segundo a qual as pessoas jurídicas de direito público respondem objetivamente pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, independentemente de dolo ou culpa. O protesto indevido é conduta manifestamente ilícita e capaz de gerar abalo moral ao atingido, sobretudo quando se trata de quantia vultosa, como no caso presente. O valor protestado – superior a R$ 1,2 milhão – é absolutamente incompatível com a realidade socioeconômica do autor, que comprovadamente atua como trabalhador autônomo e não detém patrimônio dessa magnitude. É notório o impacto de um protesto de dívida sobre a reputação e a vida financeira do cidadão, atingindo-lhe a honra objetiva e subjetiva, com consequências que extrapolam o mero aborrecimento. O dano moral, nestes casos, é presumido (in re ipsa), sendo desnecessária a comprovação de prejuízo concreto. Assim, estando demonstrada a conduta administrativa indevida, o dano e o nexo causal, impõe-se a condenação do Município de Cuiabá à reparação dos danos morais suportados pelo autor. Ante o exposto, JULGO EXTINTO, sem resolução do mérito, nos termos do art. 485, VI, do CPC, o pedido de declaração de inexistência de débito formulado por Carlos de Amorim Evangelista, e, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE, com fulcro no art. 487, I, do CPC, o pedido de indenização por danos morais, condenando o Município de Cuiabá ao pagamento da quantia de R$ 15.000,00 (quinze mil reais), a título de compensação por danos morais, corrigida monetariamente pelo IPCA-E a partir desta sentença e acrescida de juros de mora de 1% ao mês desde a citação. Condeno o autor ao pagamento de custas e honorários advocatícios em relação ao pedido declaratório, os quais fixo em 10% sobre o valor atribuído a esse pedido. Contudo, fica suspensa a exigibilidade de tais verbas, nos termos do art. 98, § 3º, do CPC, por força da gratuidade da justiça concedida. Condeno o Município de Cuiabá ao pagamento das custas e de honorários advocatícios em favor do patrono do autor, no valor correspondente a 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do art. 85, §§ 3º, I, e 5º, do CPC. Transitada em julgado, e adotadas as providências necessárias, arquive-se, com as cautelas necessárias. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Cumpra-se, expedindo o necessário. Às providências. Pedra Preta-MT, data da assinatura eletrônica. Márcio Rogério Martins Juiz de Direito em Regime de Cooperação Autorizado pela Portaria nº 866/2025

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Processo nº 1025004-91.2023.8.11.0015

ID: 260073293

Tribunal: TJMT Órgão: 6ª VARA CÍVEL DE SINOP Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1025004-91.2023.8.11.0015

Data de Disponibilização: 24/04/2025

Polo Ativo:

JURACI APARECIDO DAMASCENO

Polo Passivo:

Sentença

Advogados:

LARISSA CRISTINA DA SILVA

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ATALIAS DE LACORTE MOLINARI

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EVAIR FIABANE

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO COMARCA DE SINOP VARA ESPECIALIZADA DA FAZENDA PÚBLICA #1025004-91.2023.8.11.0015 AUTOR(A): JURACI APARECIDO DAMASCENO REQUERIDO: ESTADO DE MATO GROSSO Vistos e… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO COMARCA DE SINOP VARA ESPECIALIZADA DA FAZENDA PÚBLICA #1025004-91.2023.8.11.0015 AUTOR(A): JURACI APARECIDO DAMASCENO REQUERIDO: ESTADO DE MATO GROSSO Vistos etc. Trata-se de AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE PROCESSO ADMINISTRATIVO proposta por JURACI APARECIDO DAMASCENO em desfavor do ESTADO DE MATO GROSSO. Narra a inicial que o Requerente foi autuado pela Secretaria de Meio Ambiente do Estado de Mato Grosso (SEMA/MT), que lavrou o Auto de Infração nº 153311, originando o Processo Administrativo nº 111430/2018, por transportar 36m³ de madeira serrada em desacordo com licença outorgada pela autoridade competente, com divergência de essência florestal atestada pelo INDEA-MT. Alega que o Auto de Infração indicou o endereço como sendo "Rua Cristóvão de Jesus, nº 1099 – Pátio conveniado PRF – Auto Socorro TREVO", no Município de Barra do Garças/MT, endereço este que nunca foi de sua residência, posto que é morador da cidade de Sinop/MT. Sustenta que, apesar de constar no Auto de Infração a informação "Via AR", não há no processo qualquer notificação, envelope ou carta registrada, presumindo que a Administração Pública sequer encaminhou a correspondência a qualquer endereço. Afirma que a SEMA-MT procedeu à notificação via edital, violando as normas do devido processo legal, e que o Requerente só tomou conhecimento do processo administrativo após consulta aos órgãos de proteção ao crédito, verificando o protesto extrajudicial da CDA nº 2023169616 no Cartório da Comarca de Marcelândia/MT. Argumenta que, na condição de motorista, possuía endereço fixo em Sinop/MT, especificamente na Rua das Papoulas nº 20, Jardim Paraíso II, CEP 78.556-182, conforme demonstrado por fatura de água do período. Sustenta que seu endereço poderia ser facilmente encontrado em sistemas da Administração Pública, especialmente junto ao DETRAN-MT, dada sua profissão de motorista, e que a notificação via edital só é permitida quando o autuado estiver em local incerto e não sabido, nos termos do art. 121, § 1º, IV, da Lei Complementar Estadual nº 38/1995. Aduz ainda que não houve publicação em jornal de circulação local, conforme exigido pelo art. 121, § 4º, da Lei Complementar nº 38/1995, vigente à época dos fatos. Requer, liminarmente, a suspensão dos efeitos jurídicos do processo administrativo nº 111430/2018, incluindo a multa simples prevista no Auto de Infração nº 153311, e que o Requerido se abstenha de inscrever em dívida ativa o débito oriundo do processo administrativo ou, caso já inscrito, suspenda sua exigibilidade. No mérito, pugnou pela declaração de nulidade do processo administrativo nº 111430/2018 e de toda e qualquer sanção administrativa dele decorrente, em especial a multa simples prevista no Auto de Infração nº 153311, bem como pela condenação do Requerido ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 70.000,00 (setenta mil reais). Discorreu sobre as deduções pretendidas neste Juízo, colacionando textos de leis, além de entendimentos jurisprudenciais. CARREOU DOCUMENTOS à INICIAL. DECISÃO em ID. 131528553 DEFERINDO o PEDIDO LIMINAR. Pelo Requerido foi oferecida CONTESTAÇÃO em ID. 133901536, arguindo, preliminarmente, a incompetência absoluta da 6ª Vara Cível da Comarca de Sinop, ao argumento de que a matéria efetivamente debatida nos autos envolve o meio ambiente e deve ser apreciada pelo Juízo Especializado nessa matéria, nos termos da Resolução TJ-MT/OE nº 02 de 28 de março de 2019. No mérito, pugna pela improcedência dos pedidos autorais. IMPUGNAÇÃO em ID. 139536511. DESPACHO de ESPECIFICAÇÃO de PROVAS em ID. 141684424, tendo ambas as partes postulado pelo julgamento antecipado da lide (ID. 141900296 e ID. 144229620). Após, os autos vieram-me em conclusão. É o Relatório. Decido. Diante dos fatos e fundamentos jurídicos discutidos nestes autos, como também analisando a DOCUMENTAÇÃO que instrui o feito, DESNECESSÁRIA se faz a DILAÇÃO PROBATÓRIA, eis que impende lembrar que o Juiz, como se sabe, é o destinatário das provas, podendo, em busca da verdade real e da elucidação dos fatos, determinar a realização daquelas necessárias à instrução do processo, bem como indeferir as que considerar impertinentes ou protelatórias. Sabe-se que com relação ao deferimento das provas, estatui o art. 370 do Código de Processo Civil que “caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias ao julgamento do mérito”. Sobre o tema, lecionam Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery: “É ao juiz que compete à direção do processo (CPC 125) e o dever de determinar a realização de atos que possam dar sequência regular ao processo, proporcionando à parte o direito de fazer as provas que entende necessárias à demonstração de seu direito, determinando de ofício aquelas que reputam necessárias à formação de seu convencimento e indeferindo as que reputarem inúteis ou meramente protelatórias (CPC 130). A parte se submete ao poder diretor do magistrado, nos limites da lei (CF 5º, II, CPC 363)” (Código de Processo Civil Comentado e Legislação Extravagante - 12ª ed. - São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2012, p. 737). E ainda Theotônio Negrão: “Sendo o juiz o destinatário da prova, somente a ele cumpre aferir sobre a necessidade ou não de sua realização (TRF-5ª Turma, Ag. 51.774-MG rel. Min. Geraldo Sobral, j. 27.2.89, negaram provimento ao agravo)” (CPC, 27ª ed., p. 156). Com efeito, este Magistrado está convencido da desnecessidade da instrução requerida para a formação de seu convencimento, estando à matéria suficientemente provada pelos documentos. A necessidade de produção de prova se fundamenta para o esclarecimento da verdade substancial investigada nos autos. Uma vez demonstrado, que a instrução do feito, dada as especificidades do caso, bem como os documentos acostados, em nada influiriam no resultado do feito, desnecessária a produção de outras provas. Dessa forma, PROMOVO o JULGAMENTO ANTECIPADO da LIDE, nos termos do art. 355, inc. I, do CPC/2015. DA PRELIMINAR DE INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA DO JUÍZO O Estado de Mato Grosso sustenta, em sede preliminar, a incompetência absoluta deste Juízo para processar e julgar a presente demanda, argumentando que a matéria tratada nos autos é de natureza ambiental, devendo o feito ser remetido à Vara Especializada do Meio Ambiente da Comarca de Cuiabá, nos termos da Resolução TJ-MT/OE nº 02/2019. Conforme estabelecido pela Resolução nº 03/2016/TP do Tribunal de Justiça de Mato Grosso, a competência da Vara Especializada do Meio Ambiente está limitada territorialmente às Comarcas de Cuiabá, Várzea Grande e Santo Antônio de Leverger: "Art. 1º - A Vara Especializada do Meio Ambiente e o Juizado Volante Ambiental com sede em Cuiabá têm competência territorial nas Comarcas de Cuiabá, Várzea Grande e Santo Antônio de Leverger". O fato de a demanda versar sobre questão ambiental não é suficiente, por si só, para deslocar a competência para a Vara Especializada do Meio Ambiente da Capital, pois esta não possui competência territorial sobre todo o Estado de Mato Grosso. Ademais, o artigo 52, parágrafo único, do Código de Processo Civil, dispõe que: "Art. 52. É competente o foro de domicílio do réu para as causas em que seja autor Estado ou o Distrito Federal. Parágrafo único. Se Estado ou o Distrito Federal for o demandado, a ação poderá ser proposta no foro de domicílio do autor, no de ocorrência do ato ou fato que originou a demanda, no de situação da coisa ou na capital do respectivo ente federado". No caso em tela, sendo o Autor domiciliado na Comarca de Sinop, conforme documentação acostada aos autos, esta Vara Especializada da Fazenda Pública é competente para processar e julgar o feito, nos termos da legislação processual civil vigente. Portanto, REJEITO a PRELIMINAR de incompetência absoluta do Juízo. DO MÉRITO Trata-se de AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE PROCESSO ADMINISTRATIVO proposta por JURACI APARECIDO DAMASCENO em desfavor do ESTADO DE MATO GROSSO, objetivando a declaração de nulidade do Processo Administrativo nº 111430/2018 e do Auto de Infração nº 153311, sob o fundamento de cerceamento de defesa, em razão da notificação ter sido realizada por edital, quando possuía endereço certo e conhecido. A CONTROVÉRSIA cinge-se, portanto, a verificar se houve violação ao devido processo legal administrativo, em especial aos princípios do contraditório e da ampla defesa, pela notificação editalícia efetivada pela SEMA-MT. A Constituição Federal, em seu art. 5º, inciso LV, consagra como garantia fundamental o contraditório e a ampla defesa nos processos administrativos: “Art. 5º (...) LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”. No âmbito do Estado de Mato Grosso, a Lei Complementar nº 38/1995 estabelece, em seu art. 98, que: "Art. 98 As infrações ambientais são apuradas em processo administrativo próprio, assegurado o direito de ampla defesa e o contraditório, observadas as disposições desta lei complementar". Quanto à notificação do autuado, a mesma Lei Complementar, em seu art. 121, dispõe: “Art. 121 A primeira via do Auto de Infração será entregue ao autuado, pessoa física ou jurídica, oportunidade em que será, também, cientificado do prazo de 20 (vinte) dias úteis para apresentação de defesa e procedimento para conciliação, na forma do regulamento. (Nova redação dada pela LC 706/2021). § 1º A intimação a que se refere este artigo dar-se-á, sucessivamente, da seguinte forma: (Acrescentado pela LC 232/05) I - pessoalmente; II - por seu representante legal; III - por carta registrada com aviso de recebimento; IV - por edital, se estiver o infrator autuado em lugar incerto ou não sabido”. Nota-se que a notificação por edital é a última modalidade prevista, somente admissível quando o autuado estiver em lugar incerto ou não sabido, depois de esgotadas as tentativas de notificação pessoal, por seu representante legal e por correspondência com aviso de recebimento. No caso em análise, verifica-se que a SEMA-MT utilizou a notificação por edital, mencionando em despacho (ID. 131379790 - Pág. 36) que "o autuado não foi notificado tendo em vista a falta de endereço no auto de infração, bem como não foi possível em pesquisas encontrar cadastrado no Sistema Integrado de Gestão Ambiental – SIGA". Contudo, o próprio Auto de Infração nº 153311 (ID. 131379790 - Pág. 08) indica um endereço para o Requerente ("Rua Cristóvão de Jesus, nº 1099 – Pátio conveniado PRF – Auto Socorro TREVO, no Município de Barra do Garças/MT"). Nota-se ainda que no campo "Data e Assinatura" consta a informação "Via 'AR'" (ID 131379790 - Pág. 27), demonstrando a intenção inicial de notificação via correio com aviso de recebimento. Em que pese a indicação desse endereço, não há nos autos qualquer comprovação de que houve tentativa de notificação pessoal ou via carta registrada no endereço constante do Auto de Infração. Também não há comprovação de diligências realizadas para localização do autuado em outros cadastros da Administração Pública que não o SIGA. O Requerente comprovou, por meio de fatura de água de 2021 (ID. 131381493), que residia na Rua das Papoulas nº 20, Jardim Paraíso II, em Sinop/MT, CEP 78.556-182 durante a tramitação do processo administrativo. Considerando sua profissão de motorista, seria razoável supor que seu endereço poderia ser facilmente consultado junto ao DETRAN-MT. Destaca-se que, conforme JURISPRUDÊNCIA do TJMT, a notificação por edital no processo administrativo é medida excepcional, somente admissível quando esgotadas as tentativas de localização do autuado: AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO FISCAL. EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. INFRAÇÃO AMBIENTAL . NULIDADE DE NOTIFICAÇÃO. AR NÃO DEVOLVIDO. NOTIFICAÇÃO POR EDITAL ANTES DA ESGOTABILIDADE DAS TENTATIVAS DE LOCALIZAÇÃO. CERCEAMENTO DE DEFESA . RECURSO PROVIDO. I. Caso em exame Trata-se de agravo de instrumento interposto por Antonio Marcos Laerson contra decisão que rejeitou exceção de pré-executividade oposta em execução fiscal proposta pelo Estado de Mato Grosso. Alega-se a nulidade da notificação no processo administrativo de infração ambiental por ausência de devolução do aviso de recebimento (AR), com posterior notificação por edital sem a prévia tentativa exauriente de localização do agravante . II. Questão em discussão 2. A questão controvertida consiste em verificar se houve cerceamento de defesa na condução do processo administrativo ambiental, pela notificação por edital realizada antes da devolução do AR ou da exaustão das tentativas de localização do agravante. III . Razões de decidir 3. Constatou-se que o processo administrativo de infração ambiental não observou a necessária devolução do AR de notificação, ou eventual informação sobre a recusa ou não recebimento. Além disso, foram expedidos dois ARs sem que constassem informações de envio ou não localização do agravante, culminando em notificação por edital. 4 . A Lei Estadual n. 7.692/2002 e o Decreto Estadual n. 1 .986/2013 preveem que a intimação por edital é medida excepcional, cabível apenas quando esgotadas as tentativas de localização do autuado. No caso, a ausência de tentativa exauriente caracteriza cerceamento de defesa, invalidando a multa administrativa imposta. 5. Diante do vício de notificação e da impossibilidade de exercício pleno do contraditório e da ampla defesa, impõe-se a nulidade do processo administrativo e, por conseguinte, a extinção do crédito objeto da execução fiscal . IV. Dispositivo e tese 6. Recurso de Agravo de Instrumento provido. Tese de julgamento: "É nula a notificação por edital no processo administrativo ambiental quando não esgotadas as tentativas de localização do autuado por meio de aviso de recebimento (AR), configurando cerceamento de defesa ." (TJ-MT - AGRAVO DE INSTRUMENTO: 10223074520238110000, Relator.: EDSON DIAS REIS, Data de Julgamento: 01/10/2024, Vice-Presidência, Data de Publicação: 23/10/2024 – grifo nosso). RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – EXECUÇÃO FISCAL – EXTINÇÃO DO PROCESSO – ART. 316 E 487, I, AMBOS DO CPC – EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE ACOLHIDA – NOTIFICAÇÃO ACERCA DA LAVRATURA DO AUTO DE INFRAÇÃO E INSTAURAÇÃO DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO – NOTIFICAÇÃO POR EDITAL – TENTATIVAS DE LOCALIZAÇÃO DO ENDEREÇO – NÃO COMPROVADA – OFENSA AOS PRINCÍPIOS DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA – NULIDADE DO AUTO DE INFRAÇÃO – CONFIGURADA – CDA CANCELADA –MAJORAÇÃO DOS HONORÁRIOS RECURSAIS – ART. 85, § 11º, do CPC – DECISÃO MANTIDA – RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. 1 . No curso processo administrativo ambiental, a intimação dos atos por edital é medida excecional, devendo ser realizada apenas quando restarem infrutíferas as tentativas de ciência de forma pessoal, sob pena de cerceamento de defesa. 2. Decisão mantida. Recurso conhecido e não provido. (TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 1044937-40.2021.8.11 .0041, Relator.: NÃO INFORMADO, Data de Julgamento: 19/03/2024, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Data de Publicação: 27/03/2024 – grifo nosso). No caso em tela, não há nos autos elementos que demonstrem que a Administração Pública esgotou as possibilidades razoáveis de localização do Requerente antes de recorrer à notificação por edital. Não há comprovação de tentativas de notificação no endereço constante no Auto de Infração, nem consultas a outros cadastros públicos além do SIGA. Convém ressaltar ainda que o §4º do art. 121 da Lei Complementar nº 38/1995, vigente à época, determinava que "nos municípios do interior, o edital será publicado também em jornal de circulação local", requisito que não foi comprovado nos autos. Assim, verifica-se que houve violação ao devido processo legal administrativo, especialmente aos princípios do contraditório e da ampla defesa, eis que a notificação por edital foi utilizada sem o esgotamento das tentativas de localização do autuado e sem a publicação em jornal de circulação local, prejudicando o exercício do direito de defesa pelo Requerente. O Autor pleiteia, ainda, a condenação do Estado de Mato Grosso ao pagamento de indenização por danos morais, no valor de R$ 70.000,00 (setenta mil reais), em razão do protesto indevido da CDA nº 2023169616, decorrente do Processo Administrativo nº 111430/2018. Como é sabido, a configuração do dano moral exige a presença de quatro requisitos: i) ação ou omissão do agente; ii) culpa ou dolo; iii) nexo causal; e iv) dano. No caso em tela, evidenciou-se a ação irregular da Administração Pública ao notificar o Requerente por edital sem esgotar as possibilidades de sua localização, caracterizando o cerceamento de defesa no processo administrativo. Reconhecida a nulidade do processo administrativo, a inscrição em dívida ativa e o posterior protesto da CDA dele decorrente também se mostram indevidos, caracterizando conduta ilícita do Estado. De acordo com a JURISPRUDÊNCIA do SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, o protesto indevido de título gera dano moral presumido (in re ipsa): PROCESSUAL CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL POR PROTESTO INDEVIDO. DANOS MORAIS. CABIMENTO . DANO IN RE IPSA. FUNDAMENTO NÃO IMPUGNADO NAS RAZÕES RECURSAIS. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 284/STF. PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE NA FIXAÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO . REEXAME DO CONTEXTO FÁTICO-PROBATÓRIO. SÚMULA 7/STJ. 1. Na espécie, o acórdão recorrido entendeu que os motivos que levaram a Municipalidade a protestar as CDAs são irrelevantes, pois dizem respeito à sua culpa na produção do resultado lesivo, o que não é levado em conta no caso de responsabilidade objetiva da administração . Todavia, analisando as razões recursais, percebe-se que esse fundamento não foi impugnado pela recorrente, pelo que não há como afastar o óbice da Súmula 284/STF quanto ao ponto. 2. A jurisprudência desta Corte entende que em se tratando de protesto indevido de título, o dano moral configura-se in re ipsa, ou seja, não depende de prova. 3 . Somente em casos excepcionais é possível a revisão do valor arbitrado a título de danos morais, o que não é o caso dos autos, tendo em vista que a sua fixação em R$ 5.000,00 não se revela exorbitante. Logo, incide o óbice da Súmula 7/STJ para analisar os critérios de proporcionalidade e razoabilidade utilizados pela Corte de origem. 4 . Agravo interno não provido. (STJ - AgInt no AREsp: 1867219 SP 2021/0095919-6, Data de Julgamento: 03/10/2022, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 05/10/2022 – grifo nosso). No mesmo sentido, o Tribunal de Justiça de Mato Grosso: RECURSO INOMINADO. DIREITO DO CONSUMIDOR. DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO. ENERGIA ELÉTRICA . SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. PROTESTO INDEVIDO. FATURA ADIMPLIDA. DANO MORAL IN RE IPSA . QUANTUM ARBITRADO. DISSOCIAÇÃO. EXCESSO. CRITÉRIO DA RAZOABILIDADE . RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. 1. A jurisprudência é firme no sentido que o protesto indevido configura dano moral in re ipsa. 2. O débito sub judice com vencimento em 25/10/2022, foi quitado em 09/12/2022, consoante comprovante de pagamento juntado pelo consumidor, enquanto o protesto ocorreu em 23/12/2022, ou seja, 14 (quatorze) dias após o pagamento, de modo que configurada a responsabilidade objetiva da empresa concessionária e o dever em indenizar. 3. Adequação do quantum indenizatório a título de dano moral por dissociação ao critério da razoabilidade. 4 . Recurso conhecido e parcialmente provido. (TJ-MT - RECURSO INOMINADO: 1023668-94.2023.8 .11.0001, Relator.: NÃO INFORMADO, Data de Julgamento: 04/04/2024, Segunda Turma Recursal, Data de Publicação: 05/04/2024 – grifo nosso). Assim, caracterizada a conduta ilícita do Estado e o dano moral presumido decorrente do protesto indevido, cabe analisar o quantum indenizatório. Na fixação do valor da indenização por danos morais, devem ser considerados os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, a gravidade do dano, suas consequências, a condição econômica da vítima e do ofensor, bem como o caráter pedagógico e compensatório da medida. O Requerente pleiteia a fixação dos danos morais em R$ 70.000,00 (setenta mil reais). Todavia, tal valor mostra-se excessivo diante das circunstâncias do caso concreto e dos parâmetros usualmente adotado pelo Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso em casos semelhantes, senão vejamos: “(...) A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firme e consolidada no sentido de que o dano moral, oriundo de inscrição ou manutenção indevida em cadastro de inadimplentes ou protesto indevido, prescinde de prova, configurando-se in re ipsa, visto que é presumido e decorre da própria ilicitude do fato. Cabe ao Julgador dosar a indenização de maneira que, suportada pelo patrimônio do devedor, consiga no propósito educativo da pena, inibi-lo de novos atos lesivos, por sentir a gravidade e o peso da condenação; de outro lado a vítima, pelo grau de participação no círculo social e pela extensão do dano suportado, deve sentir-se razoável e proporcionalmente ressarcida (TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 00075269220158110007, Relator.: ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Data de Julgamento: 17/07/2024, Terceira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 20/07/2024 – grifo nosso). Do Inteiro Teor da DECISÃO alhures, extrai-se que “analisadas as circunstâncias fáticas descritas nos autos, bem como levando-se em conta os últimos julgados desta e. Câmara Julgadora em casos análogos, tenho que a quantia fixada em R$ 10.000,00 (dez mil reais), se mostra razoável, proporcional e dentro dos parâmetros deste Sodalício”. “As cc. Câmaras de Direito Público e Coletivo deste e. Tribunal de Justiça, em julgamento de casos de protesto indevido de certidão de dívida ativa, têm arbitrado o valor da indenização por danos morais, no patamar mínimo de R$ 3.000,00 (três mil reais) e máximo de R$ 15.000,00 (quinze mil reais), conforme informações retiradas dos autos n. 0002944-27.2018.8.11.0045, n. 1002080-07.2018.8.11.0001 e n. 1016657-64.2018.8.11.0041 (Rela. Desa. Maria Aparecida Ferreira Fago); autos n. 1007199-50.2023.8.11.0040, n. 1046589-29.2020.8.11.0041 e n. 1040784-27.2022.8.11.0041 (Rel. Des. Mário Roberto Kono de Oliveira); autos n. 1001681-75.2018.8.11.0001 (de minha relatoria); autos n. 1011249-58.2019.8.11.0041 (Rel. Des. Luiz Octávio O. Saboia Ribeiro); autos n. 0002876-09.2018.8.11.0100, n. 1031396-94.2020.8.11.0001 e n. 0002631-76.2015.8.11.0011 (Rel. Des. Márcio Vidal); autos n. 1016823-17.2021.8.11.0001 e n. 1000585-88.2019.8.11.0001 (Rela. Desa. Maria Erotides Kneip); autos n. 0001654-45.2016.8.11.0045 (Rela. Desa. Helena Maria Bezerra Ramos); autos n. 1003302-44.2017.8.11.0001 (Rel. Des. Luiz Carlos da Costa); autos n. 1001207-70.2019.8.11.0001 (Rela. Desa. Graciema Ribeiro de Caravellas); e autos n. 1002021-52.2019.8.11.0011, n. 1001175-65.2019.8.11.0001 e n. 1004437-51.2018.8.11.0003 (Rela. Desa. Maria Aparecida Ribeiro). Assim, ao se levar em consideração os princípios da proporcionalidade e razoabilidade, fixo como valor base a quantia de R$ 10.000,00 (dez mil reais), que torno definitivo, ante a ausência de outros elementos que pudessem aumentar o valor base aqui fixado” (TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 00011903220188110051, Relator.: RODRIGO ROBERTO CURVO, Data de Julgamento: 17/07/2024, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, Data de Publicação: 25/07/2024 – grifo nosso). Considerando, pois, o ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL, entendo que o valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais) mostra-se adequado para compensar os danos morais sofridos pelo Requerente, sem caracterizar enriquecimento sem causa, cumprindo também a função pedagógica da indenização. Dessa forma, PROCEDENTE em PARTE a PRETENSÃO AUTORAL. “Ex positis”, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os PEDIDOS formulados na inicial para DECLARAR a NULIDADE do processo administrativo nº 111430/2018 e de toda e qualquer sanção administrativa dele decorrente, em especial a multa simples prevista no Auto de Infração nº 153311, bem como CONDENAR o Requerido ao PAGAMENTO de INDENIZAÇÃO por DANOS MORAIS no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), devendo incidir a taxa SELIC (EC nº 113/2021, art. 3º) a partir desta sentença até o efetivo pagamento (Súmula nº 362/STJ). Via de consequência CONFIRMO a DECISÃO LIMINAR de ID. 131528553. Por conseguinte, DECLARO EXTINTO o PROCESSO COM RESOLUÇÃO de MÉRITO, nos termos do art. 487, I, do Código de Processo Civil. DEIXO de CONDENAR o Requerido nas CUSTAS PROCESSUAIS, conforme disposição do artigo 460 da CNGC/MT que “Ficam isentos de Custas Judiciais e emolumentos a União, o Estado, o Município e suas respectivas autarquias e fundações, nos termos do artigo 4º, parágrafo único, do Provimento 27/04-CM”. Contudo, CONDENO-O ao PAGAMENTO, dos HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS, os quais fixo, desde já, em 10% (dez por cento) sobre o VALOR do PROVEITO ECONÔMICO obtido, qual seja, o valor da multa imposta no Auto de Infração nº 153311 somado ao valor do dano moral aqui fixado, nos termos do art. 85, § 2º, incisos I, III e IV, e, § 3º, inciso II, do CPC/2015. SENTENÇA NÃO SUJEITA ao REEXAME NECESSÁRIO (art. 496, § 3º, inciso II, do CPC). Após o TRÂNSITO EM JULGADO, não havendo requerimentos, ARQUIVEM-SE os autos com as BAIXAS NECESSÁRIAS. Às providências. Intimem-se. Cumpra-se. Sinop/MT, data registrada no sistema. Mirko Vincenzo Giannotte Juiz de Direito

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