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Processo nº 1000379-06.2025.8.11.0085

ID: 282281275

Tribunal: TJMT Órgão: VARA ÚNICA DE TERRA NOVA DO NORTE Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL Nº Processo: 1000379-06.2025.8.11.0085

Data de Disponibilização: 28/05/2025

Polo Ativo:

SALETE BORBA BIANCHINI

Polo Passivo:

Decisão

Advogados:

PAULO FERREIRA DOS SANTOS

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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE MATO GROSSO COMARCA DE TERRA NOVA DO NORTE | VARA ÚNICA - Autos nº 1000379-06.2025.8.11.0085 - Autor: SALETE BORBA BIANCHINI - Réu: MAPFRE SEGUROS GERAIS S.A. Vistos. 1.… PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE MATO GROSSO COMARCA DE TERRA NOVA DO NORTE | VARA ÚNICA - Autos nº 1000379-06.2025.8.11.0085 - Autor: SALETE BORBA BIANCHINI - Réu: MAPFRE SEGUROS GERAIS S.A. Vistos. 1. Cuida-se de AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS, com pedido de tutela de urgência, ajuizada por SALETE BORBA BIANCHINI em face de MAPFRE SEGUROS GERAIS S.A., ambos devidamente qualificados nos autos. Aduz a parte autora ter celebrado com a parte ré contrato de seguro automotivo, sob a apólice nº 3897889421231, referente ao veículo marca Renault, modelo Sandero Expression Hi-Flex 1.0, ano de fabricação/modelo 2014/2014, placa QBD-7386. Relata que, em 16 de novembro de 2024, o referido veículo foi envolvido em acidente de trânsito, do tipo capotamento, ocorrido na Estrada Oitava Agrovila, no município de Terra Nova do Norte/MT, conforme registrado no Boletim de Ocorrência nº 2024.349495. Informa que, na apólice, consta como condutora principal a própria autora. Contudo, destaca que, no momento do acidente, o veículo era conduzido, de forma esporádica, por sua filha, Juliane Bianchini, com 38 (trinta e oito) anos de idade à época dos fatos, a qual não reside com a autora. Após o ocorrido, a autora comunicou imediatamente o sinistro à ré, apresentando todas as informações e documentos necessários para a análise da cobertura securitária. Todavia, para sua surpresa e inconformismo, em 17 de dezembro de 2024, a ré comunicou a negativa de cobertura do sinistro, sob o argumento de que, no momento do acidente, o condutor do veículo não era aquele indicado como principal na apólice. Defende, entretanto, que a justificativa apresentada pela ré é manifestamente abusiva e desprovida de respaldo legal, uma vez que a condutora — filha da segurada — fazia uso do veículo de forma ocasional e preenchia todos os requisitos legais e contratuais para conduzi-lo, não havendo qualquer agravamento do risco que pudesse justificar a recusa da cobertura. Requereu a inversão do ônus da prova, bem como a concessão de tutela de urgência, a fim de que a parte ré seja compelida a proceder à imediata cobertura do sinistro, mediante autorização para realização dos reparos em oficina de sua confiança ou, alternativamente, mediante o pagamento da indenização correspondente aos danos, conforme orçamento a ser apresentado, sob pena de aplicação de multa diária. Ao final, pugnou pela condenação da parte ré ao cumprimento da obrigação de fazer, consistente na cobertura integral dos danos decorrentes do sinistro mencionado, seja por meio da realização dos reparos necessários no veículo, seja mediante o pagamento da respectiva indenização, além da condenação ao pagamento de indenização por danos morais, no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais). 2. As custas processuais foram devidamente recolhidas, conforme comprovantes constantes no ID 193542525 e seguintes. 3. Recebo a petição inicial, eis que preenchidos os requisitos dos artigos 319 e 321 do Código de Processo Civil. 4. No que se refere ao pedido de inversão do ônus da prova, é cediço que o instituto, previsto no artigo 6º, inciso VIII, do Código de Defesa do Consumidor, exige a demonstração de dois requisitos legais: a verossimilhança das alegações e a hipossuficiência da parte. Ressalte-se que a teoria da distribuição dinâmica do ônus da prova confere ao julgador a faculdade de redistribuí-lo, de forma diversa da regra geral, conforme seu convencimento motivado. Nesse contexto, a antiga concepção estática, segundo a qual caberia exclusivamente ao autor a prova dos fatos constitutivos de seu direito, e ao réu a dos fatos impeditivos, modificativos ou extintivos da pretensão deduzida, sem consideração das condições probatórias de cada parte, revela-se incompatível com os princípios que norteiam o atual Código de Processo Civil. Este busca assegurar maior proteção à parte hipossuficiente na relação processual, ou seja, àquela que não dispõe de condições técnicas, econômicas ou informacionais para produzir a melhor prova apta à demonstração do direito que invoca. No caso dos autos, verifica-se a existência de relação de consumo, tendo em vista que as partes se enquadram nos conceitos de consumidor e fornecedor, nos termos dos artigos 2º e 3º, caput, do CDC. Além disso, evidencia-se a hipossuficiência da parte autora na produção de determinadas provas. Todavia, ressalta-se que, ainda que se trate de relação de consumo e que a inversão do ônus da prova tenha sido determinada, permanece vigente o princípio de que incumbe à parte autora a produção de prova mínima dos fatos constitutivos de seu direito, conforme dispõe o art. 373, inciso I, do Código de Processo Civil. Assim, a autora, na qualidade de consumidora, não está completamente desonerada do ônus probatório, devendo apresentar os elementos mínimos que sustentem sua pretensão. 4.1. Diante do exposto, defiro o pedido de inversão do ônus da prova, com ressalvas acima expostas. 5. Quanto à tutela de urgência, passo a decidir: Como se sabe, a tutela de urgência está disciplina no artigo 300 Código de Processo Civil. A sua concessão é admissível desde que haja elementos que demonstrem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo, conforme redação do caput do aludido artigo: “Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo”. À luz dos entendimentos dos ilustres doutrinadores Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery (In Comentários ao Código de Processo Civil. Novo CPC – Lei 13.105/2015, ed. Revista dos Tribunais, 1.ª ed., 2015, p. 857/858): “(...) Duas situações, distintas e não cumulativas entre si, ensejam a tutela a tutela de urgência. A primeira hipótese autorizadora dessa antecipação é o periculum in mora, segundo expressa disposição do CPC 300. Esse perigo, como requisito para a concessão da tutela de urgência, é o mesmo elemento de risco que era exigido, no sistema do CPC, para a concessão de qualquer medida cautelar ou em alguns casos de antecipação de tutela”. “(...) Também é preciso que a parte comprove a existência de plausibilidade do direito por ela afirmado (fumus boni iuris). Assim, a tutela de urgência visa assegurar a eficácia do processo de conhecimento ou do processo de execução”. Com efeito, a parte autora almeja a concessão de tutela antecipada de seu pedido, para que a ré seja compelida a proceder à imediata cobertura do sinistro, mediante autorização para realização dos reparos em oficina de sua confiança ou, alternativamente, mediante o pagamento da indenização correspondente aos danos, conforme orçamento a ser apresentado, sob pena de aplicação de multa diária. Contudo, razão não assiste à demandante. Quanto ao perigo na demora, verifica-se que, diante dos argumentos apresentados, não restou demonstrado, ao menos por ora, risco relevante em se aguardar o exercício do contraditório pela parte ré, mormente tendo em vista que o acidente ocorreu em 16 de novembro de 2024, ou seja, há mais de 6 meses. No que se refere à probabilidade do direito, entendo que ainda subsistem dúvidas, em juízo de cognição sumária, quanto à (in)existência do agravamento do risco contratado. Desta forma, apesar do acervo documental juntado pela autora, observa-se que não existe, ao menos por ora, probabilidade do direito para agasalhar a pretensão antecipatória, de modo que se deve aguardar a realização do exercício do contraditório e da ampla defesa. 5.1. Ante do exposto, e por tudo mais que dos autos consta, não verificada a probabilidade do direito, INDEFIRO o requerimento de tutela antecipada pleiteada pela autora, o que faço com fundamento no art. 300,caput, do CPC. 6. Com fundamento no artigo 334 do CPC, determino a realização de audiência de conciliação, a ser designada conforme pauta da conciliadora do juízo. A audiência será realizada na modalidade VIRTUAL, por meio do aplicativo Microsoft Teams, conforme autorização dada pela Portaria-Conjunta 9/2022 do Tribunal de Justiça deste Estado. 7. Ato contínuo, CITE-SE e INTIME-SE o réu para comparecer à audiência de conciliação, na data e horário definidos. Deverá constar do mandado que o réu poderá oferecer contestação, no prazo de 15 dias, sob pena de, não o fazendo, ser considerado revel (art. 344, CPC), cujo termo inicial será a data da audiência de conciliação, ou da última sessão de conciliação, quando qualquer parte não comparecer ou, comparecendo, não houver autocomposição; do protocolo do pedido de cancelamento da audiência de conciliação apresentado pelo réu, quanto ocorrer a hipótese do art. 334, § 4º, inciso I; prevista no art. 231, de acordo com o modo como foi feita a cotação, nos demais casos (art. 335, CPC). 8. Intime-se a parte autora para acessar a sala de audiência ou comparecer à sala de audiências do Fórum da Comarca de Terra Nova do Norte/MT, na data e horário definidos. Fica autorizado o uso de celular tiposmartphone para realização do ato, devendo as partes observarem as seguintes orientações: a) as partes deverão ter consigo documento de identidade com foto, a ser apresentado na audiência; b) tratando-se de representação da parte por prepostos, a carta de preposição e demais documentos de representação deverão ser juntados no processo antes da abertura da audiência; c) Consigna-se, ainda, que: (i) participação à audiência virtual pode ser realizada de diversas formas, não necessita a instalação da ferramenta para uso pelo computador ou laptop. Também é possível participar da audiência virtual a partir de um celular, utilizando o aplicativo “Microsoft Teams”, que se encontra disponível gratuitamente no Play Store/App Store, sendo desnecessário a criação/abertura de uma “conta Microsoft”; (ii) Após clicar sobre o link, será aberta uma nova janela. Clique em: “Em vez disso, ingressar na Web”; (iii) Ao acessar a audiência virtual no dia e horário agendados, com internet de boa qualidade, de preferência fixa, em local seguro e silencioso, permaneça no lobby, aguardando o seu momento de ingresso. Assim que chegar o seu momento de participar, um servidor do Tribunal de Justiça irá autorizar a sua entrada. d) Informo às partes que eventual necessidade de contato com a Secretaria deste juízo, deverá ser feito pelo telefone: (66)99208.1798 e/ou email: tnn.unica@tjmt.jus.br. e) Caso a parte/testemunha não possua os recursos tecnológicos necessários para participação da solenidade (computador ou smartphone, software e acesso à internet), ou não disponha de local silencioso, deverá comparecer à sala de audiências do Fórum desta Comarca de Terra Nova do Norte/MT a fim de participar do ato. f) Se residir em Comarca diversa, deve informar a necessidade de se utilizar a sala passiva da Comarca onde residem. 9. Não havendo acordo e apresentada a contestação, intime-se a autora para impugná-la, em 15 dias. 10. A seguir, oportunamente, intimem-se as partes para informar, em 5 dias, se há outras provas a produzir, especificando-as, justificadamente, sob pena de serem indeferidas. 11. Ao final, tornem conclusos para julgamento antecipado da lide ou saneamento. 12. Diligências necessárias. Int. Terra Nova do Norte, 27 de maio de 2025. Fernando Akio Maeda Juiz Substituto

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Laudiane Salvaterra x Instituto Nacional Do Seguro Social - Inss

ID: 328572587

Tribunal: TJMT Órgão: VARA ÚNICA DE VILA BELA DA SANTÍSSIMA TRINDADE Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1000379-64.2024.8.11.0077

Data de Disponibilização: 18/07/2025

Polo Ativo:

LAUDIANE SALVATERRA

Polo Passivo:

INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

Sentença

Advogados:

EDUARDO SCHNELL NOTHEN JUNIOR

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO VARA ÚNICA DE VILA BELA DA SANTÍSSIMA TRINDADE SENTENÇA Processo: 1000379-64.2024.8.11.0077. AUTOR(A): LAUDIANE SALVATERRA REU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOC… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO VARA ÚNICA DE VILA BELA DA SANTÍSSIMA TRINDADE SENTENÇA Processo: 1000379-64.2024.8.11.0077. AUTOR(A): LAUDIANE SALVATERRA REU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS Vistos. Trata-se de ação previdenciária ajuizada por LAUDIANE SALVATERRA em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS, objetivando a concessão do benefício de auxílio-doença. Narra a parte autora, em síntese, que é trabalhadora rural em regime de economia familiar, exercendo suas atividades no Sítio São José, Zona Rural de Vila Bela da Santíssima Trindade/MT. Aduz que, em setembro de 2023, precisou realizar cirurgia em decorrência de problemas de saúde (CID 10 - N832 - Outros cistos ovarianos e os não especificados), necessitando de 60 dias de afastamento de suas atividades laborais, conforme atestados médicos. Relata que teve o pedido de benefício de auxílio-doença (NB 6410403554) indeferido administrativamente em 24/09/2023, sob a alegação de "não comparecimento na perícia", embora afirme que já havia passado pela perícia de análise documental e que o benefício havia sido aprovado, pendente apenas de questões administrativas. Com a inicial vieram documentos, dentre eles: documentos pessoais, atestados médicos, notas fiscais de aquisição de produtos agropecuários e bovinos, certidão de nascimento da filha e comunicação de decisão do INSS. Decisão inicial (ID 155142331) recebendo a petição inicial, deferindo a gratuidade da justiça, determinando a citação da parte requerida e a realização de perícia médica. O INSS apresentou petição (ID 157283072) requerendo a observância do art. 129-A da Lei nº 8.213/91 e apresentando quesitos para a perícia médica. Realizada perícia médica (ID 177379082), o perito judicial concluiu que a autora foi acometida por doença com CID N83.2 (Outros cistos ovarianos e os não especificados), tendo realizado cirurgia de ooforectomia bilateral em 14/09/2023, o que gerou incapacidade total e temporária para o trabalho pelo período de 59 dias, conforme atestados médicos apresentados. Foi designada audiência de instrução e julgamento (ID 188369023), a qual foi realizada em 08/07/2025 (ID 200328426), ocasião em que foram ouvidas a parte autora e as testemunhas Leidiane Clara de Souza e Lucia Helena das Neves. É o relatório. DECIDO. Trata-se de ação previdenciária em que a parte autora busca a concessão do benefício de auxílio-doença, alegando incapacidade temporária para o trabalho em razão de procedimento cirúrgico realizado em setembro de 2023. O auxílio-doença está previsto no art. 59 da Lei nº 8.213/91, que assim dispõe: "Art. 59. O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos." Para a concessão do benefício, portanto, é necessário o preenchimento dos seguintes requisitos: a) qualidade de segurado; b) cumprimento da carência, quando exigida; e c) incapacidade temporária para o trabalho ou atividade habitual por mais de 15 dias consecutivos. Passo à análise de cada um desses requisitos. DA QUALIDADE DE SEGURADA ESPECIAL A parte autora alega ser trabalhadora rural em regime de economia familiar, exercendo suas atividades no Sítio São José, Zona Rural de Vila Bela da Santíssima Trindade/MT. Para a comprovação da qualidade de segurado especial, a jurisprudência tem admitido início de prova material complementada por prova testemunhal idônea, conforme entendimento consolidado na Súmula 149 do STJ: "A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário." No caso em análise, a parte autora apresentou como início de prova material: notas fiscais de aquisição de bovinos (NF 2198362, de 06/04/2022), aquisição de produtos agropecuários (NF 73643, de 13/05/2022 e NF 215677, de 21/09/2023), além da certidão de nascimento da filha, que comprova o vínculo familiar com o proprietário do sítio. Sobre a possibilidade de utilização de documentos em nome de terceiros para comprovação da atividade rural em regime de economia familiar, é pacífico o entendimento de que são admissíveis documentos em nome do cônjuge, convivente ou de outros membros do grupo familiar, considerando as peculiaridades do trabalho rural familiar. Nesse sentido: E M E N T A PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. EXTINÇÃO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO PELO TEMA 629 DA TNU. HÁ NOS AUTOS INÍCIO DE PROVA MATERIAL EM NOME DO CÔNJUGE . POSSIBILIDADE DE EXTENSÃO DOS DOCUMENTOS EM NOME DO CÔNJUGE À MULHER, AINDA QUE SE TRATE DE EMPREGADO RURAL. APLICAÇÃO DO NOVO ENTENDIMENTO DA TNU. NECESSIDADE DE PRODUÇÃO DE PROVA ORAL. RECONHECER A ALEGAÇÃO DE CERCEAMENTO DE DEFESA . 1. Trata-se de recurso interposto pela parte autora em face da sentença que julgou extinto o feito sem resolução do mérito, diante da ausência de início de prova material. 2. No caso em concreto, a parte autora juntou aos autos a sua certidão de casamento, na qual consta a qualificação do marido como lavrador (1980), a certidão de nascimentos dos filhos, na qual consta a qualificação do genitor como lavrador (1993 e 2004), bem como, a CTPS do marido que consta somente anotações como trabalhador rural (1982 a 1988 e de 2005 a 2019) . 3. O Colegiado Nacional da TNU, no PEDILEF 0000329-14.2015.4 .01.3818 (Rel. Juiz Federal ATANAIR NASSER RIBEIRO LOPES, julgado em 13/12/2019), encampou entendimento pela possibilidade de considerar como início de prova material os documentos em nome cônjuge empregado rural, especialmente nos casos em que há inserção da mulher na situação fática do labor campesino do cônjuge, demonstrando a condição rurícola da entidade familiar. 4 . Reconhecer o cerceamento de defesa, devendo ser anulado o feito para oportunizar a produção de prova oral. 5. Recurso da parte autora que se dá provimento.(TRF-3 - RECURSO INOMINADO CÍVEL: 50048422420224036344 SP, Relator.: Juiz Federal FERNANDA SOUZA HUTZLER, Data de Julgamento: 10/06/2024, 14ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo, Data de Publicação: DJEN DATA: 14/06/2024) Além da prova documental, foi realizada audiência de instrução e julgamento, na qual foram ouvidas a parte autora e as testemunhas Leidiane Clara de Souza e Lucia Helena das Neves. As testemunhas foram uníssonas em afirmar que a autora residia e trabalhava no sítio na data dos fatos, exercendo atividades rurais em regime de economia familiar. Assim, considerando o conjunto probatório formado pelo início de prova material e pela prova testemunhal consistente, tenho por comprovada a qualidade de segurada especial da parte autora na data do requerimento administrativo. DA CARÊNCIA Nos termos do art. 25, I, da Lei nº 8.213/91, o período de carência para a concessão do auxílio-doença é de 12 (doze) contribuições mensais. No caso dos segurados especiais, o art. 39, I, da mesma lei, dispensa o cumprimento de carência para a concessão de auxílio-doença, desde que comprovado o exercício de atividade rural nos 12 (doze) meses imediatamente anteriores ao requerimento do benefício. Conforme já analisado no tópico anterior, restou comprovado que a parte autora exercia atividade rural em regime de economia familiar no período anterior ao requerimento administrativo, preenchendo, portanto, o requisito da carência. DA INCAPACIDADE TEMPORÁRIA PARA O TRABALHO O terceiro requisito para a concessão do auxílio-doença é a incapacidade temporária para o trabalho ou atividade habitual por mais de 15 dias consecutivos. No caso em análise, a perícia médica judicial (ID 177379082) foi conclusiva ao atestar que a parte autora foi acometida por doença com CID N83.2 (Outros cistos ovarianos e os não especificados), tendo realizado cirurgia de ooforectomia bilateral em 14/09/2023, o que gerou incapacidade total e temporária para o trabalho pelo período de 59 dias, conforme atestados médicos apresentados. O perito judicial afirmou categoricamente que "a incapacidade da periciada foi total durante o período de recuperação pós-cirúrgica" e que "a incapacidade da periciada foi temporária, conforme atestado médico e o estado de recuperação observado". Quanto ao período de incapacidade, o expert consignou que "a recuperação foi inicialmente estimada para o término do atestado de 45 dias, prorrogado por mais 14 dias, totalizando 59 dias de incapacidade temporária", com início em 14/09/2023, data da cirurgia. Ressalte-se que o laudo pericial foi elaborado com base em exame físico da parte autora e análise da documentação médica apresentada, tendo o perito respondido de forma clara e objetiva a todos os quesitos formulados pelas partes. Ademais, o perito judicial é profissional de confiança do juízo, equidistante dos interesses das partes, não havendo nos autos elementos que desabonem suas conclusões técnicas. Assim, tenho por comprovada a incapacidade total e temporária da parte autora para o trabalho pelo período de 59 dias, a contar de 14/09/2023. Diante do exposto, verifico que a parte autora preencheu todos os requisitos necessários para a concessão do benefício de auxílio-doença: qualidade de segurada especial, cumprimento da carência e incapacidade temporária para o trabalho. Quanto à data de início do benefício (DIB), deve ser fixada na data do requerimento administrativo (24/09/2023), conforme disposto no art. 60 da Lei nº 8.213/91. Quanto à data de cessação do benefício (DCB), considerando que o perito judicial atestou incapacidade pelo período de 59 dias a contar de 14/09/2023, o benefício deve ser mantido até 12/11/2023 (14/09/2023 + 59 dias). DISPOSITIVO Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido formulado na inicial, com resolução de mérito, nos termos do art. 487, I, do Código de Processo Civil, para CONDENAR o INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS a: a) CONCEDER à parte autora LAUDIANE SALVATERRA o benefício de auxílio-doença (NB 6410403554), na qualidade de segurada especial, com data de início do benefício (DIB) em 24/09/2023 (data do requerimento administrativo) e data de cessação do benefício (DCB) em 12/11/2023 (59 dias após o início da incapacidade); b) PAGAR as parcelas vencidas, acrescidas de correção monetária desde a data em que cada parcela se tornou devida (Súmula 148 do STJ) e de juros de mora desde a citação, na forma do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009, observada a decisão proferida pelo STF no RE 870.947 (Tema 810 da Repercussão Geral). Considerando a natureza alimentar do benefício previdenciário e presentes os requisitos do art. 300 do CPC (probabilidade do direito e perigo de dano), CONCEDO A TUTELA DE URGÊNCIA para determinar ao INSS que implante o benefício no prazo de 30 (trinta) dias, a contar da intimação desta sentença, sob pena de multa diária de R$ 100,00 (cem reais), limitada a R$ 5.000,00 (cinco mil reais). Condeno o INSS ao pagamento de honorários advocatícios, que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas vencidas até a data desta sentença, conforme Súmula 111 do STJ, bem como ao reembolso das custas processuais adiantadas pela parte autora, se houver. Sentença não sujeita ao reexame necessário, nos termos do art. 496, § 3º, I, do CPC. Transitada em julgado, intime-se a parte autora para, no prazo de 30 (trinta) dias, apresentar cálculos de liquidação, caso ainda não tenha sido implantado o benefício ou pagos os valores atrasados. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. CUMPRA-SE, providenciando e expedindo o necessário. PIERRO DE FARIA MENDES Juiz de Direito designado para o NAE PORTARIA N. 133/2025- GAB-CGJ, de 27 de junho de 2025

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Carlos Alberto Markus Silva e outros x Conselho Comunitario De Seguranca Publica De Comodoro Mt e outros

ID: 259426219

Tribunal: TJMT Órgão: 1ª VARA DE COMODORO Classe: MANDADO DE SEGURANçA CíVEL Nº Processo: 1000379-26.2025.8.11.0046

Data de Disponibilização: 23/04/2025

Polo Ativo:

CARLOS ALBERTO MARKUS SILVA EDILAMAR APARECIDA RAMPANELLI ELISANGELA AZEREDO DA SILVA GABRIELA LEITE HEINSCH MARINEUSA DE OLIVEIRA OTTO MARQUES DE SOUZA WEDSLEY LUZ DO AMARAL REGISTRADO(A) CIVILMENTE COMO WEDSLEY LUZ DO AMARAL

Polo Passivo:

CONSELHO COMUNITARIO DE SEGURANCA PUBLICA DE COMODORO MT DIVAN CARLOS DE SOUZA PRESIDENTE DO CONSG DIVAN CARLOS DE SOUZA

Sentença

Advogados:

ELISANGELA AZEREDO DA SILVA

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LUIS ANDRADE JUNQUEIRA DE BRITO ARANTES

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO COMARCA DE COMODORO PRIMEIRA VARA Processo n. 1000379-26.2025.8.11.0046 IMPETRANTE: ELISANGELA AZEREDO DA SILVA, MARINEUSA DE OLIVEIRA, OTTO MARQUES DE SOUZA, C… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO COMARCA DE COMODORO PRIMEIRA VARA Processo n. 1000379-26.2025.8.11.0046 IMPETRANTE: ELISANGELA AZEREDO DA SILVA, MARINEUSA DE OLIVEIRA, OTTO MARQUES DE SOUZA, CARLOS ALBERTO MARKUS SILVA, GABRIELA LEITE HEINSCH, WEDSLEY LUZ DO AMARAL, EDILAMAR APARECIDA RAMPANELLI IMPETRADO: CONSELHO COMUNITARIO DE SEGURANCA PUBLICA DE COMODORO MT, DIVAN CARLOS DE SOUZA, PRESIDENTE DO CONSG DIVAN CARLOS DE SOUZA SENTENÇA Vistos, etc. I – RELATÓRIO ELISÂNGELA AZEREDO DA SILVA ALVES, MARINEUSA DE OLIVEIRA, EDILAMAR APARECIDA RAMPANELLI, OTTO MARQUES DE SOUZA, GABRIELA LEITE HEINSCH, CARLOS ALBERTO MARKUS SILVA e WEDSLEY LUZ DO AMARAL impetraram mandado de segurança com pedido liminar em face de Divan Carlos de Souza, na qualidade de presidente do Conselho Comunitário de Segurança Pública de Comodoro – MT (CONSEG), e contra o próprio CONSEG, objetivando a anulação da eleição da diretoria executiva realizada no dia 24/01/2025, com a consequente realização de novo processo eleitoral. Alegam, em síntese, que o pleito ocorreu em desacordo com os princípios constitucionais da publicidade, moralidade e eficiência, e em afronta à Portaria n. 63/2017/SESP, pelos seguintes fundamentos: a) o edital de convocação foi publicado exclusivamente no Diário Oficial do Estado, em 13/01/2025, para eleição a se realizar apenas 11 dias após, em 24/01/2025, sem a necessária divulgação nos meios locais de comunicação; b) não houve constituição prévia de Comissão Eleitoral com a antecedência mínima de 30 dias; c) o pleito não ocorreu no mês de março, conforme legalmente previsto; d) ausência de transparência quanto às chapas inscritas e à apuração dos votos; e) a eleição foi conduzida pela própria diretoria então em exercício, que acabou reconduzida ao cargo. Juntaram documentos comprobatórios, incluindo o edital de convocação, extratos normativos e registros que evidenciam a ausência de publicidade adequada e de constituição da comissão eleitoral. Recebida a inicial, foram notificadas as autoridades apontadas como coatoras para prestarem informações, o que foi devidamente cumprido mediante contestação (id 186012446) e manifestação complementar, nas quais sustentaram a legalidade do pleito e a inaplicabilidade da Portaria 63/2017/SESP, em razão da superveniência da Lei Estadual n. 10.931/2019. O Ministério Público, na condição de custos legis, manifestou-se pela concessão da segurança (ID 186012446). É o relatório. Decido. II – FUNDAMENTAÇÃO Preliminarmente, observo que o mandado de segurança é a via adequada para a discussão da controvérsia, uma vez que, conforme estabelece o art. 5º, LXIX, da Constituição Federal, e o art. 1º da Lei nº 12.016/2009, o writ constitui remédio constitucional para proteção de direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público. No caso em tela, o CONSEG, por sua natureza jurídica de entidade paraestatal que atua em colaboração com o Poder Público na promoção da segurança pública, submete-se aos princípios que regem a Administração Pública, nos termos do art. 37, caput, da Constituição Federal. Trata-se de órgão colegiado, consultivo e de assessoramento às autoridades policiais, que exerce função de relevante interesse público. Tratando-se de matéria unicamente de direito, cuja prova é documental e está juntada aos autos, não há necessidade de dilação probatória, motivo pelo qual passo a julgar o mérito nos exatos termos do art. 12, parágrafo único, da Lei nº 12.016/2009. II.1 – Do regime jurídico aplicável aos Conselhos Comunitários de Segurança Pública (CONSEG) A eleição para os CONSEGs foi regulamenta pela Portaria nº 63/2017/SESP, prevendo, entre outros requisitos: a) constituição prévia de Comissão Eleitoral, com antecedência mínima de 30 dias; b) ampla divulgação do processo eleitoral pelos meios de comunicação local; c) realização das eleições no mês de março. Em sua defesa, as autoridades impetradas alegam a superveniência da Lei Estadual nº 10.931/2019, que teria revogado tacitamente a Portaria nº 63/2017/SESP. Entretanto, da análise da referida lei, verifica-se que esta apenas estabeleceu diretrizes gerais para o funcionamento dos Conselhos, não regulamentando especificamente o processo eleitoral. Nesse sentido, a Portaria nº 63/2017/SESP continua válida naquilo que não contrariar expressamente a lei superveniente, em observância ao princípio da especialidade. Ademais, ainda que se considerasse inaplicável a Portaria nº 63/2017/SESP, é incontestável que todo processo eleitoral de interesse coletivo, especialmente quando envolva entidade parceira do Poder Público, deve observar os princípios constitucionais da publicidade, moralidade, legalidade, impessoalidade e eficiência, que constituem a base axiológica do regime jurídico administrativo brasileiro (art. 37, caput, da CF). II.2 – Da violação aos princípios constitucionais no processo eleitoral contestado Da análise dos autos, verifica-se que o processo eleitoral para a diretoria do CONSEG de Comodoro/MT, realizado em 24/01/2025, apresentou vícios insanáveis que comprometem sua validade jurídica, por ofensa direta aos princípios constitucionais que regem a Administração Pública. II.2.1 – Da violação ao princípio da publicidade O princípio da publicidade não é um simples elemento formal do ato administrativo, mas sim uma condição de eficácia e moralidade. Sua observância garante a transparência da gestão pública e possibilita o controle social dos atos administrativos. No caso em análise, o edital de convocação das eleições foi publicado exclusivamente no Diário Oficial do Estado, em 13/01/2025, sem comprovação de divulgação por outros meios de comunicação acessíveis à comunidade local. Tal procedimento contraria não apenas o art. 2º, §1º, da Portaria nº 63/2017/SESP, mas também o próprio núcleo essencial do princípio constitucional da publicidade. A publicidade dos atos administrativos constitui verdadeiro princípio constitucional implícito, pois decorre da própria concepção de Estado Democrático de Direito, impondo a ampla divulgação dos atos praticados pela Administração Pública. A mera publicação no Diário Oficial, embora formalmente atenda ao requisito de publicidade oficial, não satisfaz materialmente o imperativo de ampla divulgação em processos de interesse coletivo e comunitário. Isso porque o Diário Oficial possui alcance limitado, não sendo meio de comunicação habitualmente acessado pela população em geral, especialmente em municípios do interior. Assim, a ausência de divulgação por meios acessíveis à comunidade local compromete substancialmente o conhecimento efetivo do processo eleitoral pelos interessados, prejudicando a legitimidade do pleito e a participação cidadã. Como consequência, houve substancial redução na possibilidade de apresentação de chapas concorrentes e de participação dos interessados na eleição. II.2.2 – Da violação ao princípio da moralidade administrativa O princípio da moralidade administrativa impõe ao administrador público não apenas a observância da legalidade formal, mas também a ética, a boa-fé e a lealdade no exercício da função pública. No caso concreto, o curto intervalo entre a publicação do edital (13/01/2025) e a realização da eleição (24/01/2025) – apenas 11 dias – demonstra violação ao princípio da moralidade administrativa. Tal exiguidade temporal prejudica a formação de chapas concorrentes, a divulgação de propostas e a mobilização dos interessados, favorecendo indevidamente os atuais detentores dos cargos diretivos. A jurisprudência pátria é firme no sentido de que a observância de prazo razoável entre a convocação e a realização do pleito constitui elemento essencial à validade de processos eleitorais dessa natureza, sendo certo que a exiguidade de prazo entre a convocação e a realização de eleição em órgão colegiado viola o princípio da moralidade administrativa e compromete a legitimidade do resultado. Não se pode olvidar que a ausência de constituição prévia de Comissão Eleitoral independente, com a condução do processo pela própria diretoria que acabou sendo reconduzida, configura situação de evidente conflito de interesses, incompatível com a impessoalidade e a moralidade que devem nortear atos dessa natureza. II.2.3 – Da violação ao princípio da eficiência O princípio da eficiência, introduzido expressamente no caput do art. 37 da Constituição Federal pela Emenda Constitucional nº 19/1998, impõe à Administração Pública o dever de buscar o melhor resultado possível na prestação do serviço público, com a maximização dos recursos disponíveis. No caso em análise, a ausência de transparência no processo eleitoral, com a falta de divulgação prévia das chapas inscritas e dos critérios de apuração, bem como a não constituição de Comissão Eleitoral independente, comprometeu a eficiência do pleito. Isso porque tais irregularidades dificultaram a fiscalização pelos órgãos de controle e pela própria comunidade, reduzindo a qualidade da representação comunitária. O princípio da eficiência impõe à Administração Pública a persecução do bem comum, por meio do exercício de suas competências de forma imparcial, transparente, participativa, eficaz e sempre em busca da qualidade. II.3 – Da configuração do direito líquido e certo O conceito de direito líquido e certo, para fins de concessão de mandado de segurança, não se refere à complexidade jurídica da matéria, mas sim à demonstração, de plano, da existência do direito alegado, mediante prova pré-constituída dos fatos. No caso em tela, os documentos juntados pelos impetrantes comprovam, de forma inequívoca, a existência das irregularidades apontadas no processo eleitoral do CONSEG de Comodoro/MT. A publicação do edital exclusivamente no Diário Oficial, o curto prazo entre a convocação e a eleição, a ausência de constituição prévia de Comissão Eleitoral independente e a falta de transparência no pleito são fatos documentalmente demonstrados, que evidenciam violação aos princípios constitucionais da publicidade, moralidade e eficiência. Tais irregularidades, por comprometerem substancialmente a legitimidade democrática do processo eleitoral, configuram lesão a direito líquido e certo dos impetrantes, na qualidade de cidadãos interessados na lisura do procedimento e na adequada representação comunitária no CONSEG. No presente caso, verifico que o direito invocado decorre diretamente dos princípios constitucionais da Administração Pública (art. 37, caput, da CF) e das normas específicas aplicáveis aos Conselhos Comunitários de Segurança Pública no Estado de Mato Grosso, sendo demonstrado de plano pelas provas documentais apresentadas, configurando, assim, o direito líquido e certo exigido para a concessão da segurança. III – DISPOSITIVO Ante o exposto, com fundamento no art. 487, I, do Código de Processo Civil, CONCEDO A SEGURANÇA pleiteada, para: a) declarar a nulidade da eleição realizada em 24/01/2025 para a diretoria do Conselho Comunitário de Segurança Pública de Comodoro/MT (CONSEG); b) determinar a realização de novo processo eleitoral, no prazo de 60 (sessenta) dias, com observância aos princípios constitucionais da publicidade, moralidade, legalidade, impessoalidade e eficiência, mediante: i. constituição prévia de Comissão Eleitoral independente, composta por membros que não integrem a atual diretoria nem sejam candidatos ao pleito; ii. divulgação ampla do edital de convocação nos meios de comunicação locais, incluindo rádios, jornais, mídias sociais e afixação em locais públicos de grande circulação; iii. observância do prazo mínimo de 30 (trinta) dias entre a publicação do edital e a realização da eleição; iv. transparência quanto às chapas inscritas, requisitos de candidatura, sistemática de votação e critérios de apuração dos votos; v. fiscalização pelo Ministério Público, se assim entender necessário. Sem custas, nos termos do art. 25 da Lei n. 12.016/2009. Sem honorários advocatícios, conforme Súmula 512 do STF e Súmula 105 do STJ. Sentença sujeita ao reexame necessário, nos termos do art. 14, §1º, da Lei nº 12.016/2009. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. CUMPRA-SE, expedindo o necessário. Comodoro/MT, data da assinatura digital. VINICIUS PAIVA GALHARDO Juiz de Direito Substituto

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Processo nº 1004468-52.2024.8.11.0006

ID: 292037326

Tribunal: TJMT Órgão: 1ª VARA CÍVEL DE CÁCERES - FAMÍLIA E SUCESSÕES Classe: ALIMENTOS - LEI ESPECIAL Nº 5.478/68 Nº Processo: 1004468-52.2024.8.11.0006

Data de Disponibilização: 09/06/2025

Polo Ativo:

DEBORA TEIXEIRA GALONI

Polo Passivo:

Sentença

Advogados:

EVELY BOCARDI DE MIRANDA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 1ª VARA CÍVEL DE CÁCERES - FAMÍLIA E SUCESSÕES SENTENÇA AÇÃO DE ALIMENTOS Autos nº: 1004468-52.2024.8.11.0006 Requerente: JOSÉ PEDRO TEIXEIRA AMORIM (menor) Rep… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 1ª VARA CÍVEL DE CÁCERES - FAMÍLIA E SUCESSÕES SENTENÇA AÇÃO DE ALIMENTOS Autos nº: 1004468-52.2024.8.11.0006 Requerente: JOSÉ PEDRO TEIXEIRA AMORIM (menor) Representante legal: DEBORA TEIXEIRA GALONI Requerido: LUIZ FERANANDO TAYLER DE AMORIM Vistos, etc. JOSÉ PEDRO TEIXEIRA AMORIM, menor impúbere, representado por sua genitora DEBORA TEIXEIRA GALONI, ingressou com a presente AÇÃO DE ALIMENTOS COM PEDIDO DE ALIMENTOS PROVISÓRIOS em desfavor de LUIZ FERNANDO TAYLER DE AMORIM objetivando "a fixação dos alimentos em 1 salário-mínimo mensal, com incidência sobre 13º salário e férias, desde que não seja inferior a 50% do salário-mínimo". Alega o autor que, nos autos do processo nº 1000379-83.2024.8.11.0006, as partes não chegaram a um acordo quanto aos alimentos, ficando o pagamento a critério do requerido no valor de R$ 500,00 (quinhentos reais). Informa que, com o passar do tempo, as despesas do menor aumentaram junto com a idade, e, hoje, com 9 meses incompletos, o valor pago pelo requerido já não é suficiente para custear suas necessidades básicas, haja vista que as despesas adicionais associadas ao cuidado da criança aumentam à medida que ela cresce e suas necessidades mudam gradativamente. Ressalta que o requerido possui boas condições financeiras, estando empregado em uma escola estadual, com o cargo de docente de Educação Física. Afirma que o requerido é plenamente capaz de suportar o pagamento dos alimentos de forma justa e proporcional. Menciona que o valor de R$ 500,00 nunca foi ajustado e é o valor que o requerido sempre pagou desde o nascimento do menor, quando ainda se encontrava desempregado. Argumenta que, após os seis meses de vida, é recomendada a introdução de alimentos complementares à amamentação, o que gera despesas adicionais e crescentes. Pondera os impactos das inflações no valor da moeda e o aumento de despesas com produtos de higiene, produtos alimentícios, contas de água e luz. Assevera que a genitora buscou, amigavelmente, ajustar a quantia acordada, mas não obteve êxito, sendo obrigada a recorrer às vias judiciais. Com a petição inicial, foram juntados os seguintes documentos: declaração de hipossuficiência (ID 156912213), procuração (ID 156912210), CNH da genitora (ID 156912223) e certidão de nascimento do menor (ID 156912224). Não houve emenda à petição inicial. Atribuiu-se à causa o valor de R$ 16.944,00 (dezesseis mil novecentos e quarenta e quatro reais). O pedido de justiça gratuita foi deferido conforme decisão de ID 156956147. Não houve recurso contra esta decisão. A decisão inicial (ID 156956147) recebeu a petição inicial, determinou a tramitação em segredo de justiça e deferiu o pedido de justiça gratuita. Deferiu o pedido de alimentos provisórios em favor do infante, fixando-os “em 35% (trinta e cinco por cento) do salário mínimo nacional vigente, bem como 50% das despesas médicas, hospitalares e farmacológicas, que deverá ser pago mensalmente a partir da citação e depositado em conta poupança ou corrente indicada pela representante legal da prole”. Remeteu os autos ao Centro de Mediação e Resolução de Conflitos e Cidadania para a realização de sessão de conciliação. Não houve recurso contra a decisão de tutela de urgência. Houve audiência de conciliação por videoconferência em 28 de junho de 2024, que não restou exitosa, conforme termo de sessão de mediação (ID 160654313). O réu Luiz Fernando Tayler de Amorim foi citado por telefone e WhatsApp em 14 de junho de 2024. Apresentou contestação (ID 163892899) por intermédio da Defensoria Pública. Como preliminares, arguiu pedido de gratuidade da justiça e invocou as prerrogativas institucionais da Defensoria Pública, como intimação pessoal e prazo em dobro. Em relação ao mérito, alegou não ter condições de arcar com o valor de 01 (um) salário mínimo, pois é professor contratado temporariamente pelo estado de Mato Grosso, com contrato que se encerraria em 13/12/2024, e que a fixação dos alimentos em 01 (um) salário mínimo é temerária diante de sua instabilidade econômica. Afirmou que a pretensão alimentar é desarrazoada, devendo ser observados os pressupostos da necessidade x possibilidade x proporcionalidade. Argumentou que a genitora deixou de juntar comprovantes aptos a justificar a necessidade em aumentar a pensão alimentícia em mais de 100% do valor fixado, e que alegações de gasto não podem justificar um quantum alimentício excessivo. Informou que o filho é uma criança saudável e que o requerido jamais se opôs a prestar auxílio em casos de moléstias e necessidades de tratamentos médicos e medicamentos. Ofereceu o patamar de 35% (trinta e cinco por cento) do salário mínimo vigente, acrescido de 50% (cinquenta por cento) das despesas extraordinárias. Em sede de reconvenção, pugnou pela guarda compartilhada do infante, com base de residência junto à genitora e regulamentação do direito a visita em finais de semanas alternados, dia das mães com a genitora, dia dos pais com o genitor, e demais datas comemorativas (Páscoa, Natal, Ano-novo) alternadas e previamente combinadas. A parte autora apresentou impugnação à contestação (ID 168462194), afirmando que não houve alegação de preliminares na contestação. No mérito, ratificou que os alimentos devem abranger todas as necessidades do menor e ser fixados em consonância com a necessidade do alimentando e a real possibilidade do alimentante. Concordou que a obrigação de prestar alimentos é de ambos os genitores, que devem somar esforços para cumprir as responsabilidades. Sustentou que a condição de professor contratado do genitor não afeta seu dever de suprir as necessidades do filho, nem o exime dos deveres da paternidade, não devendo onerar excessivamente a genitora. Asseverou que a genitora vem arcando com as custas advindas do seu dever familiar. Em relação à reconvenção, a genitora alegou que nunca fez objeção às visitas, desde que avisado com antecedência mínima, mas que o requerido não visita a criança há aproximadamente 5 meses, causando uma ruptura no convívio entre pai e filho, e, por isso, não concorda com a guarda compartilhada, mantendo-se unilateral. O Ministério Público manifestou-se (ID 169241370) no sentido de que a reconvenção e a discussão sobre a guarda e visitas não merecem apreciação por não serem objeto da ação principal, devendo ser tratadas em autos independentes. Quanto aos alimentos, reiterou que é cabível a fixação da pensão alimentícia no valor correspondente a 50% do salário mínimo, além de 50% das despesas extraordinárias, considerando que a genitora, além de arcar com a maior parte das despesas, cuida do filho praticamente sozinha, já que o genitor é ausente e não tem contato com o filho há cerca de cinco meses. O Parquet reiterou essa manifestação em outras duas oportunidades (IDs 175830527 e 179186717). Em relação às provas, a parte requerida (Defensoria Pública) requereu a produção de prova testemunhal, documental e o depoimento pessoal da requerente, para demonstrar as necessidades do requerente, a capacidade financeira do requerido e que a fixação de alimentos em valor superior a 35% do salário mínimo inviabilizará a sobrevivência do alimentante, bem como que a guarda e a regulamentação das visitas na forma requerida na reconvenção atendem ao melhor interesse do menor (ID 169690838). A parte requerente, por sua vez, requereu a produção de prova testemunhal e o depoimento pessoal do requerido, para demonstrar a falta de comprometimento na criação do filho e no auxílio material (ID 172731623). A decisão de saneamento e organização do processo (ID 179091188) indeferiu o pedido de alteração da causa de pedir da reconvenção e, consequentemente, julgou extinta a lide secundária (reconvenção) sem resolução do mérito, com fulcro no art. 485, inciso V, do Código de Processo Civil, devido à coisa julgada sobre a regularização da guarda e direito de convivência do menor em reclamação pré-processual anterior, e diante da discordância da parte requerente/reconvinda ao aditamento (ID 178452331). A decisão também indeferiu a produção de prova documental da parte requerida por preclusão, e a produção de prova oral de ambas as partes, por entender que não justificaram a insuficiência da prova documental para o deslinde da causa. Declarou o feito saneado e determinou o julgamento antecipado do pedido nos termos do artigo 355, inciso I, do CPC. Não houve recurso dessa decisão. Não foi elaborado relatório social, psicológico ou psicossocial. Em alegações finais, o requerido, por meio da Defensoria Pública (ID 192159267 e ID 192159285), reiterou o pedido de fixação dos alimentos no patamar de 35% (trinta e cinco por cento) do salário mínimo, argumentando que a fixação de valor superior inviabilizaria sua sobrevivência, considerando sua renda mensal de R$ 1.718,24. Reafirmou que o binômio necessidade/possibilidade e o princípio da solidariedade familiar devem ser observados. A parte autora não apresentou alegações finais (ID 187748216). É o relatório. DECIDO. Não havendo preliminares, passo à análise do mérito. É cediço que aos genitores cabe promover a subsistência da prole de maneira a lhes garantir vida digna. Trata-se de obrigação decorrente do poder familiar, na forma do art. 1.634 do Código Civil: “compete a ambos os pais, qualquer que seja a sua situação conjugal, o pleno exercício do poder familiar, que consiste em, quanto aos filhos: (...) I - dirigir-lhes a criação e a educação”. Assim, o requerido obriga-se no dever de proporcionar ao menor valor a título de alimentos. Acerca do valor dos alimentos, o art. 1.694 do Código Civil dispõe que “podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social, inclusive para atender às necessidades de sua educação” e o § 1º prevê que “os alimentos devem ser fixados na proporção das necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa obrigada”. Desse modo, a fixação do valor dos alimentos deve atender ao binômio possibilidade-necessidade, buscando não somente se atentar para as necessidades de quem pede, mas também para a possibilidade de quem deve pagar, a fim de preservar o equilíbrio da relação, evitando onerar em demasia o alimentante. Nesse sentido, cabe mencionar a decisão do Eg. Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso acerca do tema: RECURSO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO DE ALIMENTOS - LIMINAR - FIXAÇÃO DE ALIMENTOS PROVISÓRIOS - POSSIBILIDADE - ADEQUAÇÃO AO BINÔMIO NECESSIDADE/ POSSIBILIDADE – DECISÃO CONFIRMADA - RECURSO DESPROVIDO. A rigor do artigo 1.694, § 1º do Código Civil, o valor arbitrado a título de alimentos deverá ser fixado com base no binômio necessidade/possibilidade, de modo a atender tanto às necessidades do alimentado, quanto respeitar as condições financeiras do alimentante, sob pena de se tornar gravame insuportável para o mesmo. (AI 182303/2015, DESA. SERLY MARCONDES ALVES, QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO, Julgado em 11/05/2016, Publicado no DJE: 13/05/2016) No caso dos autos, o réu demonstrou ser professor contratado temporário da educação básica da rede pública, com salário líquido mensal inferior a dois mil reais mensais. Dessa forma, a capacidade financeira do réu deve ser tida como mínima. Deve ser sopesado, ainda, o tamanho da prole. Por outro lado, a necessidade do menor é premente, presumida pelos gastos ordinários. Logo, os alimentos devem ser fixados equitativamente em 50% (cinquenta por cento) do salário-mínimo vigente no país, além de 50% (cinquenta por cento) das despesas extras com saúde, educação e vestuário. Fixar valor maior violaria a capacidade do réu; fixar valor menor violaria a necessidade da criança. Os alimentos devem ser fixados até que o menor complete a idade de 18 (dezoito) anos, quando se presume que esteja apto à entrada no mercado de trabalho e de possibilitar seu sustento próprio; devendo se estender até os 24 (vinte e quatro) anos caso, o alimentando ainda esteja em fase de formação educacional ou profissional e não exerça atividade remunerada. Em qualquer hipótese, a exoneração não é automática, devendo ser requerida em juízo pelo alimentante a cessação do dever de prestar alimentos. Ante o exposto, julgo extinto o processo, com resolução de mérito, com fundamento no art. 487, I, do Código de Processo Civil, e JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES O PEDIDO formulados por JOSÉ PEDRO TEIXEIRA AMORIM, menor, representado por DEBORA TEIXEIRA GALONI, em desfavor de LUIZ FERNANDO TAYLER DE AMORIM para condenar o réu a pagar ao autor alimentos no valor mensal de 50% (cinquenta por cento) do salário-mínimo vigente no país, além de 50% (cinquenta por cento) das despesas extras com saúde, educação e vestuário, até que o menor complete 18 (dezoito) anos, devendo se estender até os 24 (vinte e quatro) anos caso, o alimentando ainda esteja em fase de formação educacional ou profissional e não exerça atividade remunerada, sendo os alimentos devidos até o dia 10 (dez) de cada mês seguinte, retroativos à data da citação. Condeno o réu ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios que arbitro em 10% sobre o valor da causa, suspensa a exigibilidade em razão da justiça gratuita. P.R.I. Intime-se o Ministério Público. Determino que a Secretaria retifique o cadastro de partes para incluir o menor no polo ativo no PJE, junto com a mãe. Após o trânsito em julgado, arquive-se, com baixa. Cáceres/MT, 06 de junho de 2025. Elmo Lamoia de Moraes Juiz de Direito

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Lucilene Gomes Da Mota x Veraluce Silva De Lemos

ID: 297538063

Tribunal: TJMT Órgão: 1ª VARA DE JACIARA Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1000379-71.2024.8.11.0010

Data de Disponibilização: 13/06/2025

Polo Ativo:

LUCILENE GOMES DA MOTA

Polo Passivo:

VERALUCE SILVA DE LEMOS

Sentença

Advogados:

ROBSON CAITANO RAFAGNIN

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DERCIO LUPIANO DE ASSIS FILHO

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ALEXANDER PARMIGIANI

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GIOVANI BIANCHI

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 1ª VARA DE JACIARA Autos n. 1000379-71.2024.8.11.0010 Vistos e examinados. Trata-se de ação previdenciária de concessão de pensão por morte proposta por Lucilen… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 1ª VARA DE JACIARA Autos n. 1000379-71.2024.8.11.0010 Vistos e examinados. Trata-se de ação previdenciária de concessão de pensão por morte proposta por Lucilene Gomes da Mota contra Instituto Nacional do Seguro Social – INSS e Veraluce Silva de Lemos, partes qualificadas nos autos em epígrafe. A ação foi proposta inicialmente apenas contra a autarquia federal, porém, acolhida preliminar arguida pelo INSS, entendeu-se ser o caso de litisconsorte passivo necessário e determinou-se a inclusão de Veraluce, sucessora que recebe o benefício pretendido pela autora, no polo passivo da ação (id. 158476305). A autora conta que convivia em união estável com o extinto Wilson Juvino da Silva, falecido em 28/09/2021, fazendo jus à concessão do benefício de pensão por morte, porém a autarquia ré lhe indeferiu a concessão administrativamente. O recebimento da petição inicial e a concessão de assistência jurídica gratuita à autora se deram no pronunciamento de id. 142201210. O INSS, citado pelo sistema, ofereceu contestação ao id. 152048182 arguindo a preliminar de litisconsórcio passivo necessário acolhida pelo juízo e, no mérito, se contrapondo à pretensão autoral ao defender a ausência de comprovação da condição de convivente da requerente no momento do óbito de Wilson. A autora impugnou a peça defensiva ao id. 153754710 rebatendo as teses apresentadas e ratificando os termos de sua pretensão. A ré Veraluce, citada por oficial de justiça (id. 177862239), ofereceu contestação ao id. 180523297 se contrapondo à pretensão autoral ao defender a ausência de comprovação da suposta união estável nos 24 meses que antecederam o óbito de Wilson; ainda requereu a concessão de assistência jurídica gratuita para si. A autora impugnou a peça defensiva ao id. 181410706 rebatendo as teses apresentadas e ratificando os termos de sua pretensão. Saneado e organizado o processo, determinou-se a produção de prova oral, designando-se audiência instrutória para tanto (id. 184259031). A solenidade foi realizada conforme termo de audiência de id. 186817702 ouvindo-se as testemunhas arroladas, colhendo-se o depoimento pessoal da autora e convertendo-se as alegações finais orais em razões finais escritas. Somente a ré Veraluce apresentou os memoriais (id. 188868458). Os autos vieram conclusos. É o relatório. Fundamento e decido. A concessão do benefício de pensão por morte exige o preenchimento dos seguintes requisitos (conforme artigo 74 da Lei nº 8.213/91): a) morte de segurado que mantenha a qualidade ao tempo do óbito; b) qualidade de dependente em face do segurado. Assim, é imprescindível que a parte autora comprove a qualidade de segurado do extinto e a relação de dependência para fazer jus ao benefício vindicado. A fim de comprovar o preenchimento dos requisitos, a requerente instruiu a petição inicial com comprovantes de endereço em que indicados seu nome e o nome do extinto e, depois, produziu prova testemunhal. O óbito de Wilson se deu em setembro de 2021, assim, quando já vigente a Lei n. 13.846/2019 que alterou o § 5º do artigo 16 da Lei n. 8.213/1991. Após a alteração da norma, passou a ser exigido o início de prova material para comprovação da união estável e de dependência econômica contemporânea dos fatos, produzida em período não superior a 24 meses e anterior à data do óbito, não admitida prova exclusivamente testemunhal. Nesse viés, em um primeiro momento se faz necessário examinar se há início de prova material. Averiguando, então, os documentos que instruem a inicial, noto inexistir início de prova material a demonstrar a união estável supostamente havida com o falecido. Os comprovantes de endereço apresentados para tanto, conta de consumo de água, indicam a requerente como contribuinte e o extinto como compromissário e a indicação normalmente ocorre quando há relação de locador e locatário, pois o proprietário, locador, figura como contribuinte na conta, enquanto o locatário, que será responsável pelo pagamento, se cadastra como compromissário. Não se trata de procedimento comum entre companheiros em união estável, de sorte que a indicação se torna insuficiente para indicar a existência de união estável, caso contrário, locador ou locatário que tenha assim procedido poderia utilizar do documento para aduzir a existência de união estável que, na realidade, nunca existiu. Além do mais, a certidão de óbito de Wilson labuta contra a alegação da autora, pois consta das observações averbadas que o falecido não deixou viúva ou companheira (id. 142168663). Por sua vez, a declaração de união estável inserida ao id. 142168682 é anterior ao período de 24 meses imediatamente anterior ao óbito, pois produzida em fevereiro de 2018 quando o óbito se deu em setembro de 2021; assim, o documento não se presta a constituir início de prova material contemporânea aos fatos. Já as fotografias apresentadas não contêm qualquer data em que registradas, razão pela qual também não podem ser consideradas como início de prova material contemporânea aos fatos. Nesse sentido: PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. TRABALHADOR URBANO. UNIÃO ESTÁVEL. AUSÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL CONTEMPORÂNEA DOS FATOS. LEI Nº 13.846/2019. CARÊNCIA DE PRESSUPOSTO DE CONSTITUIÇÃO E DESENVOLVIMENTO VÁLIDO E REGULAR DO PROCESSO. EXTINÇÃO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO. TESE FIRMADA EM SEDE DE JULGAMENTO DE RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. TEMA 629. APELO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. Trata-se de apelação interposta pelo INSS contra r. sentença proferida nos autos da presente ação ordinária que julgou procedente o pedido de concessão de pensão por morte contido na inicial, em razão do falecimento de Irineia Santos dos Santos, em favor de seu suposto companheiro. 2. Para que os dependentes do segurado tenham direito à percepção do benefício de pensão por morte, perfaz-se necessária a presença de alguns requisitos à sua concessão, quais sejam: a) o óbito do segurado; b) a qualidade de dependente; e c) a dependência econômica, que pode ser presumida ou comprovada (art. 16, § 4º, da Lei 8.213/91). 3. Segundo a orientação jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça e desta Corte, deve-se aplicar, para a concessão de benefício de pensão por morte, a legislação vigente ao tempo do óbito do instituidor (AgRg no REsp 778.012/MG, Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, julgado em 20/10/2009, DJe 09/11/2009 e AC 2006.38.00.027290-4/MG, Rel. Desembargador Federal Francisco De Assis Betti, Segunda Turma,e-DJF1 p.225 de 29/10/2009). 4. Na hipótese, houve a apresentação da certidão de óbito, indicando o falecimento em 24/07/2023 (ID 429832607 fl.13). A qualidade de segurada da finada restou devidamente comprovada conforme espelho de seu Infben juntado aos autos (ID 429832607 fl. 12). 5. Com o advento da Lei nº 13.846, de 2019, adicionou-se o §5º ao art. 16 da Lei 8.213/91, passando-se a exigir como requisito de comprovação de união estável início de prova material contemporânea dos fatos, produzida em período não superior a 24 (vinte e quatro) meses anterior à data do óbito, não admitida a prova exclusivamente testemunhal, exceto na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no regulamento. 6. O início de prova material apresentada não é suficientemente razoável para demonstrar a união pretendida. O "cartão da família" utilizado para identificação do núcleo familiar em programa de saúde da família no qual constam os nomes do autor e do de cujus como componentes não possui nenhum timbre ou firma que dê veracidade de um documento público. O contrato de serviços funerários juntado fora firmado em 2002, fora do prazo legal de 24 meses retromencionado. 7. O Superior Tribunal de Justiça, sob a sistemática dos recursos repetitivos (tema 629), firmou a seguinte tese jurídica, que se aplica ao caso: "A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários a tal iniciativa" (REsp 1352721/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, CORTE ESPECIAL, julgado em 16/12/2015, DJe 28/04/2016). 8. Os honorários advocatícios devem ser fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, a serem pagos pela parte autora ao INSS, ficando suspensa a execução desse comando por força da assistência judiciária gratuita, nos termos do art. 98, § 3º do CPC. 9. Apelação do INSS parcialmente provida para reformar a sentença e julgar extinto o processo sem julgamento do mérito, nos termos do item 7. (TRF-1 - AC 1025800-81.2024.4.01.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL JOAO LUIZ DE SOUSA, TRF1 - SEGUNDA TURMA, PJe 19/03/2025 PAG.). A requerente então não produziu provas que pudessem representar início de prova material, como, por exemplo, fotografias com o extinto com registro de dada, comprovação de residência em conjunto à época da suposta união, dívidas ou obrigações constituídas em comum ou que fizessem referência à companheira e contemporâneas à suposta união etc. Sendo assim, ainda que tenha produzido prova exclusivamente testemunhal, esbarraria na vedação do § 5º do artigo 16 da Lei n. 8.213/1991, sem que tenha alegado, tampouco provado, a ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito para tanto. Sem prejuízo, vejo que nem mesmo a prova testemunhal produzida teria força probante suficiente para demonstrar a relação, pois noto que não são unânimes, antes apresentam muitas divergências. Começando pela informante Vivian, filha do extinto, esta até relatou que o falecido e a autora mantiveram relacionamento em alguns períodos, mas contou que o autor se relacionou com ela por certo período e o relacionamento se encerrou e que ele se relacionou com outra pessoa e, quando este também se encerrou, voltou a se relacionar com ela, bem como contou que não tornaram público o relacionamento em redes sociais e que não utilizavam qualquer anel de compromisso, relata que ele chegou a morar com ela e também com a Sra. Luzia, com quem teve o outro relacionamento, porém sempre preservou um imóvel de sua propriedade como residência. Assim, narrou mais um relacionamento de namoro do que de união estável, inclusive sem precisão do tempo em que teria durado o relacionamento, até porque, para o reconhecimento da união estável, a lei exige a convivência pública, contínua e duradoura estabelecida com o objetivo de constituição de família (artigo 1.723, caput, do CC), atributos que não se revelam presentes pelos relatos apresentados. O informante Marcelo, irmão do extinto, também relatou que o extinto e a autora tiveram um relacionamento, disse que chegaram a morar juntos, mas não soube precisar quando se iniciou e disse que a considerava a “esposa” do extinto quando faleceu, porém, relatou que a última vez que ele o foi visitar com ela foi no ano de 2019, ou seja, dois anos antes do óbito e, diferente dos relatos de Vivian, disse que, “até onde sabia”, o extinto e a autora moravam no imóvel de propriedade do extinto. A testemunha Claudicélia, por sua vez, narrou que o extinto, depois de se separar da ré Veraluce, foi morar com Luzia e, quando este relacionamento também se findou, iniciou um relacionamento com a autora, mas não foi um relacionamento de “morar junto”; também relatou que o falecido sofreu um acidente um ano antes do óbito e que nessa época ele estava “sozinho”, mas a Sra. Luzia foi cuidar dele e eles reataram o relacionamento, somente após se recuperar, tendo novamente encerrado o relacionamento com Luzia, que Wilson “ficou um pouco” com a autora, mas era “tipo namoro”, nada sério como na época de Luzia, inclusive, ele adquiriu um imóvel onde morava sozinho, até mesmo durante o relacionamento com a requerente. A testemunha Celso já narrou que a autora e o extinto foram viver juntos na mesma residência em 2016 e para as pessoas do trabalho do falecido eram tidos como “casados” e que ainda estavam juntos quando Wilson faleceu, contou que o falecido teve um envolvimento com a Sra. Luzia, porém bem antes do relacionamento com a autora. Vê-se, portanto, que há grandes divergências entre as declarações dos informantes e entre as declarações das testemunhas. Além disso, a requerente prestou depoimento pessoal na ocasião e narrou que conviveu com o falecido por três anos e meio, morando na mesma casa, relatou que o extinto chegou a comprar um imóvel, mas manteve fechado, apenas com algumas ferramentas lá dentro, contou que o falecido sofreu um acidente antes do óbito e que, na época estavam separados e, quando voltaram, moraram juntos mais “um mês e pouco” e ele faleceu; relatou, ainda, que nunca mudou o status de “solteira” nas redes sociais e que não usavam aliança ou anel de compromisso; contou que ele conviveu com a Sra. Luzia e estava com ela na época do acidente, tendo ficado juntos um “ano e pouco”. Assim, os relatos da própria autora apresentam divergências quanto ao tempo de convivência e demonstram um caráter descontínuo, já que haveria um hiato de “um ano e pouco” em que o extinto se relacionou com a Sra. Luzia e, quando reataram o relacionamento, conviveram por “um mês e pouco” até o óbito. De qualquer forma, relembro que inexiste início da prova material da união nos últimos 24 meses anteriores ao óbito, que não se admite prova exclusivamente testemunhal para demonstrar a união e que, ainda assim, a prova testemunhal produzida seria insuficiente para a comprovação por ser muito divergente e, inclusive, o depoimento pessoal da autora, além de divergente, indica que seu relacionamento não possuía todos os atributos para reconhecimento da união estável nos termos do artigo 1.723, caput, do CPC. Ante ao exposto, com fundamento no § 5º do artigo 16 da Lei n. 8.213/1991 e no caput do artigo 1.723 do CC, julgo improcedente a pretensão autoral e declaro extinto o feito com resolução de mérito nos termos do artigo 487, inciso I, do CPC. Assim, condeno a autora ao pagamento das custas, taxas e despesas processuais e de honorários sucumbenciais que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, porém, a exigibilidade da condenação ficará suspensa, pois a parte é beneficiária da justiça gratuita (§§ 2º e 3º do artigo 98 do CPC). Ainda, defiro o pedido da ré Veraluce de concessão de assistência jurídica gratuita com fulcro no artigo 5º, inciso LXXIV, da CF e artigo 98 do CPC. Havendo o trânsito em julgado, arquivem-se. Cumpra-se, expedindo-se o necessário e com as cautelas de estilo. (datado e assinado digitalmente) Laura Dorilêo Cândido Juíza de Direito

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Processo nº 1000379-68.2019.8.11.0003

ID: 321710013

Tribunal: TJMT Órgão: Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1000379-68.2019.8.11.0003

Data de Disponibilização: 10/07/2025

Polo Ativo:

SOCIEDADE BENEFICENTE SAO CAMILO

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

STALYN PANIAGO PEREIRA

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PRISCILA SANTOS RAIMUNDI CARLOS PEREIRA

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MARIA NUBIA PANIAGO PEREIRA

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO Número Único: 1000379-68.2019.8.11.0003 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Assistência Judiciária Gratuita, Ser… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO Número Único: 1000379-68.2019.8.11.0003 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Assistência Judiciária Gratuita, Serviços de Saúde] Relator: Des(a). MARIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA Turma Julgadora: [DES(A). MARIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA, DES(A). DEOSDETE CRUZ JUNIOR, DES(A). MARIA APARECIDA FERREIRA FAGO] Parte(s): [WEMERSON ALVES DA SILVA - CPF: 025.826.641-46 (APELADO), DAVID ALVES DOS SANTOS - CPF: 008.819.551-16 (ADVOGADO), MATO GROSSO GOVERNO DO ESTADO - CNPJ: 03.507.415/0032-40 (APELANTE), SOCIEDADE BENEFICENTE SAO CAMILO - CNPJ: 60.975.737/0002-32 (APELANTE), PRISCILA SANTOS RAIMUNDI CARLOS PEREIRA - CPF: 011.373.221-01 (ADVOGADO), MARIA NUBIA PANIAGO PEREIRA - CPF: 592.711.161-00 (ADVOGADO), PAULO ROBERTO STURM - CPF: 000.872.289-71 (TERCEIRO INTERESSADO), STALYN PANIAGO PEREIRA - CPF: 790.659.531-91 (ADVOGADO), ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0020-07 (APELANTE), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). MARIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE PROVERAM OS RECURSOS DA SOCIEDADE BENEFICENTE SAO CAMILO E DO ESTADO DE MATO GROSSO. PARTICIPARAM DO JULGAMENTO O EXCELENTÍSSIMO SR. DES. RELATOR MÁRIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA,1ª VOGAL EXMA. SRA. DESA. MARIA APARECIDA FERREIRA FAGO E 2º VOGAL EXMO. SR. DES. DEOSDETE CRUZ JÚNIOR. E M E N T A Ementa: DIREITO ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. ALEGADO ERRO MÉDICO EM PROCEDIMENTO ORTOPÉDICO. FRATURA DE TÍBIA E FÍBULA DECORRENTE DE ACIDENTE DE TRÂNSITO. AUSÊNCIA DE NEXO CAUSAL. RECURSOS PROVIDOS. I. CASO EM EXAME Recursos de apelação contra sentença que condenou solidariamente hospital público e Estado ao pagamento de indenização por danos morais e obrigação de fazer (retirar parafuso da perna do paciente), em decorrência de alegado erro médico em cirurgias ortopédicas realizadas após acidente de trânsito que causou fratura de tíbia e fíbula. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO A questão em discussão consiste em definir se houve erro médico nos procedimentos cirúrgicos realizados para tratamento da fratura sofrida pelo autor, capaz de configurar a responsabilidade civil dos réus e justificar a condenação por danos morais e obrigação de fazer. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. Inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor ao caso, pois os serviços médicos foram prestados gratuitamente pelo Sistema Único de Saúde (SUS), conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça. 4. A prova pericial atesta categoricamente que não houve negligência, imperícia ou imprudência no tratamento médico realizado, estando os procedimentos adotados de acordo com a literatura médica e adequados à gravidade das fraturas sofridas pelo paciente. 5. O perito médico concluiu expressamente que "o dano residual incapacitante foi devido à gravidade da fratura e o atendimento médico minimizou o dano" (quesito 15), evidenciando que as sequelas sofridas pelo autor decorrem exclusivamente da gravidade do acidente e não de falha no atendimento. 6. A quebra do parafuso e sua permanência no corpo do paciente após a segunda cirurgia constituem conduta técnica médica deliberada e justificada, tendo o relatório médico esclarecido que "não foi realizada sua retirada pois os malefícios causados para retirada deste parafuso superam os benefícios devido sua localização. E este tipo de conduta é habitual nesses tipos de casos, segundo a literatura ortopédica". 7. A responsabilidade civil do Estado, ainda que objetiva (CF, art. 37, §6º), exige a comprovação do nexo de causalidade entre a ação ou omissão estatal e o dano suportado pela vítima, requisito ausente no caso em tela. 8. A medicina caracteriza-se como atividade de meio, não de resultado, não se podendo exigir dos profissionais de saúde a cura ou ausência de sequelas, especialmente em casos de trauma grave como o sofrido pelo autor. 9. A sentença contraria frontalmente a prova técnica produzida nos autos, único elemento capaz de demonstrar, com segurança, a existência ou inexistência de falha no atendimento médico prestado. IV. DISPOSITIVO E TESE Recursos providos. 1. Ausente o nexo de causalidade entre as sequelas sofridas pelo paciente e o atendimento médico prestado, não há responsabilidade civil do Estado ou do hospital por danos decorrentes exclusivamente da gravidade da fratura sofrida em acidente de trânsito. 2. A não retirada de parafuso quebrado em procedimento cirúrgico ortopédico, quando tecnicamente justificada pela literatura médica devido aos riscos superarem os benefícios, constitui decisão médica legítima, não caracterizando erro médico passível de imposição judicial para sua remoção. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 37, §6º; CC, art. 944; CPC, art. 373, I. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 1.187.456, Rel. Min. Castro Meira, 2ª T. DJ 01/12/10. R E L A T Ó R I O Egrégia Câmara; Trata-se de recursos de apelação interpostos pela SOCIEDADE BENEFICENTE SÃO CAMILO – SBSC e pelo ESTADO DE MATO GROSSO contra sentença proferida pelo Juízo da 2ª Vara Especializada da Fazenda Pública da Comarca de Rondonópolis-MT, que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na ação de indenização por danos morais e estéticos decorrente de erro médico ajuizada por WEMERSON ALVES DA SILVA em desfavor dos apelantes. O magistrado a quo condenou solidariamente os requeridos ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais), bem como na obrigação de fazer consistente na retirada do parafuso da perna do autor. Irresignada, em suas razões recursais, a Sociedade Beneficente São Camilo alega, em síntese: a) Inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor e da inversão do ônus da prova, por se tratar de hospital público; b) Ausência de ato ilícito, uma vez que o laudo pericial concluiu categoricamente que não houve negligência, imperícia ou imprudência nos procedimentos realizados; c) Que o laudo pericial demonstrou que o tratamento foi realizado de forma adequada e que os danos residuais decorreram exclusivamente da gravidade da fratura causada pelo acidente; d) Que a decisão contrariou a prova técnica produzida nos autos, especialmente quanto à obrigação de retirar o parafuso quebrado, pois segundo o perito, "não foi realizada sua retirada pois os malefícios causados para retirada deste parafuso superam os benefícios devido sua localização. E este tipo de conduta é habitual nesses tipos de casos, segundo a literatura ortopédica"; e) Cerceamento de defesa pelo indeferimento da produção de prova oral, mesmo tendo o juiz julgado de forma contrária à prova pericial; f) Alternativamente, requereu a anulação da sentença para que seja oportunizada a produção de prova oral. Pugna pelo provimento recursal. Por sua vez, o Estado de Mato Grosso, em suas razões recursais, argumenta: a) Ausência de nexo de causalidade entre as cirurgias realizadas e os danos suportados pelo autor, pois segundo o laudo pericial, as sequelas decorreram da gravidade da fratura causada pelo acidente; b) Que o rompimento do implante metálico (haste) é evento que pode acontecer independentemente da conduta da equipe médica, tendo ocorrido meses após a cirurgia; c) Que a medicina é uma atividade de meio, que busca melhorar a saúde do paciente, mas não garante a cura ou resultados específicos; d) Que os médicos, diante de uma fratura grave, conseguiram evitar uma amputação, o que seria possível pela extensão da fratura; e) Que se aplicaria a responsabilidade subjetiva, por se tratar de conduta omissiva, sendo necessária a comprovação de culpa; f) Subsidiariamente, caso mantida a condenação, requer a redução do valor da indenização com observância do art. 944 do Código Civil. Requer o provimento recursal. O apelado apresentou contrarrazões, oportunidade em que, alega que a sentença não merece reparos e requer inclusive, a majoração dos danos morais arbitrados. (id. 280412446 e 280412448) É o relatório. V O T O R E L A T O R Egrégia Câmara; De início, verifico que ambos os recursos são tempestivos e preenchem os demais requisitos de admissibilidade, razão pela qual deles conheço. Conforme relatado, trata-se de recursos de apelação interpostos pela SOCIEDADE BENEFICENTE SÃO CAMILO – SBSC e pelo ESTADO DE MATO GROSSO contra sentença proferida pelo Juízo da 2ª Vara Especializada da Fazenda Pública da Comarca de Rondonópolis-MT, que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na ação de indenização por danos morais e estéticos decorrente de erro médico ajuizada por WEMERSON ALVES DA SILVA. O magistrado a quo condenou solidariamente os requeridos ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais), bem como na obrigação de fazer consistente na retirada do parafuso da perna do autor. Conforme se extrai dos autos, o autor sofreu um acidente de trânsito em 08/09/2015, fraturando a tíbia e a fíbula da perna direita, sendo socorrido pelo SAMU e encaminhado ao Hospital Regional de Rondonópolis-MT, administrado pelo Estado de Mato Grosso e gerido pela Sociedade Beneficente São Camilo. Em sua petição inicial, o autor alegou que durante os procedimentos cirúrgicos realizados desde a data do acidente ocorreram erros médicos decorrentes de negligência e imprudência, que lhe deixaram com sequelas permanentes e incapacidade laborativa definitiva. Narrou que na primeira cirurgia, realizada em 09/09/2015, foi inserida em sua perna uma Haste Metálica da Extremidade IntraArticular que apresentava tamanho irregular, impossibilitando-o de esticar a perna e causando dores extremas. Alegou ainda que o parafuso que firmava a haste quebrou devido à falha em sua colocação. Relatou que na segunda cirurgia, realizada em 12/12/2016, para retirada da haste e inserção de um Fixador Metálico Externo, o parafuso que havia se quebrado anteriormente permaneceu em sua perna, conforme evidenciado em exames de raio-x de 2017. Em razão desses fatos, requereu a condenação dos requeridos na obrigação de retirar o parafuso quebrado de sua perna e no pagamento de indenização por danos morais e estéticos no valor de R$ 100.000,00. Durante a instrução processual, foi realizada perícia médica, cujo laudo concluiu que os procedimentos médicos realizados, minimizaram os danos decorrentes da gravidade da fratura, que o tratamento realizado estava de acordo com a literatura médica e que não houve negligência, imperícia ou imprudência no atendimento. O perito afirmou expressamente que "o dano residual incapacitante foi devido à gravidade da fratura, o atendimento médico minimizou o dano" (quesito 15).(id. 280412414) O magistrado, contudo, entendeu que ficou demonstrado o nexo de causalidade entre a conduta negligente dos requeridos e o resultado danoso, acolhendo parcialmente os pedidos do autor. Pois bem. No caso em análise, observo que todos os serviços e tratamentos oferecidos ao apelado foram integralmente prestados pelo Sistema Único de Saúde – SUS, portanto, de forma gratuita. Nesse contexto, não se aplica o Código de Defesa do Consumidor, conforme entendimento consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. HOSPITAL DA POLÍCIA MILITAR. ERRO MÉDICO. MORTE DE PACIENTE. INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. DENUNCIAÇÃO DA LIDE. FACULTATIVA. 1. Os recorridos ajuizaram ação de ressarcimento por danos materiais e morais contra o Estado do Rio de Janeiro, em razão de suposto erro médico cometido no Hospital da Polícia Militar. 2. Quando o serviço público é prestado diretamente pelo Estado e custeado por meio de receitas tributárias não se caracteriza uma relação de consumo nem se aplicam as regras do Código de Defesa do Consumidor. Precedentes. 3. Nos feitos em que se examina a responsabilidade civil do Estado, a denunciação da lide ao agente causador do suposto dano não é obrigatória. Caberá ao magistrado avaliar se o ingresso do terceiro ocasionará prejuízo à celeridade ou à economia processuais. Precedentes. 4. Considerando que o Tribunal a quo limitou-se a indeferir a denunciação da lide com base no art. 88, do CDC, devem os autos retornar à origem para que seja avaliado, de acordo com as circunstâncias fáticas da demanda, se a intervenção de terceiros prejudicará ou não a regular tramitação do processo. 5. Recurso especial provido em parte. (REsp n. 1.187.456/RJ, relator Ministro Castro Meira, Segunda Turma, julgado em 16/11/2010, DJe de 1/12/2010.) Portanto, equivocada a aplicação do CDC e a inversão do ônus da prova determinadas pelo Juízo a quo. A questão central dos presentes recursos reside na existência ou não de ato ilícito imputável aos apelantes que tenha resultado em dano ao apelado. Da análise minuciosa do laudo pericial acostado aos autos (Id 280412414), é possível constatar que os procedimentos médicos realizados estavam em conformidade com a literatura médica e foram adequados à gravidade das fraturas sofridas pelo apelado. O perito médico, de forma categórica, respondeu negativamente ao quesito sobre a existência de negligência, imperícia ou imprudência no tratamento realizado, esclarecendo que o "ortopedista procurou sempre o melhor para o paciente" e que "há necessidade de expertise para a colocação do fixador, conforme realizado no caso concreto". Ademais, ao ser questionado sobre a existência de dano funcional incapacitante e permanente para as atividades habituais do autor decorrentes do atendimento médico, o perito foi taxativo ao afirmar que "o dano residual incapacitante foi devido à gravidade da fratura e o atendimento médico minimizou o dano" (quesito 15). Quanto à quebra do parafuso e à sua permanência no corpo do apelado após a segunda cirurgia, o relatório médico acostado aos autos esclarece que "não foi realizada sua retirada pois os malefícios causados para retirada deste parafuso superam os benefícios devido sua localização. E este tipo de conduta é habitual nesses tipos de casos, segundo a literatura ortopédica". (id. 280411899) Da análise pericial, evidenciou-se que as sequelas e limitações funcionais experimentadas pelo apelado decorrem da própria gravidade da fratura sofrida no acidente, e não de qualquer falha no atendimento médico prestado. Pelo contrário, os procedimentos realizados minimizaram os danos e evitaram consequências ainda mais graves, como a possibilidade de amputação do membro. Portanto, não se verifica o nexo de causalidade entre a atuação dos prepostos dos apelantes e os danos alegados pelo apelado, requisito essencial para a configuração da responsabilidade civil, seja ela objetiva ou subjetiva. Convém ressaltar que a medicina é uma atividade de meio, e não de resultado, que busca melhorar a condição de saúde do paciente sem, contudo, garantir a cura ou a ausência de sequelas. No caso em tela, diante da gravidade da fratura sofrida pelo apelado, era previsível a ocorrência de sequelas, como atestado pelo perito judicial. A sentença, ao condenar os apelantes, contraria frontalmente a prova técnica produzida nos autos, único elemento capaz de demonstrar, com segurança, a existência ou não de falha no atendimento médico prestado. Quanto à determinação de retirada do parafuso que permaneceu na perna do apelado, verifica-se que tal obrigação também contraria o entendimento médico. Conforme atestado pela perícia e pelo relatório do médico assistente, a não retirada do parafuso foi uma decisão técnica tomada para resguardar a saúde do paciente, pois "os malefícios causados para retirada deste parafuso superam os benefícios devido sua localização". Impor judicialmente a retirada do parafuso representa indevida interferência na autonomia médica e pode, inclusive, colocar em risco a saúde do apelado. Tal decisão, embora bem-intencionada, desconsidera o conhecimento técnico-científico necessário para avaliar os riscos e benefícios de procedimentos médicos invasivos. Não havendo ato ilícito imputável aos apelantes, tampouco nexo de causalidade entre sua conduta e os danos alegados pelo apelado, não há que se falar em dever de indenizar. Os danos experimentados pelo apelado decorrem exclusivamente da gravidade do acidente sofrido, sendo que os procedimentos médicos realizados, ao contrário do alegado na inicial, buscaram minimizar suas consequências. Diante do exposto, DOU PROVIMENTO aos recursos de apelação interpostos pela SOCIEDADE BENEFICENTE SÃO CAMILO – SBSC e pelo ESTADO DE MATO GROSSO para reformar integralmente a sentença e julgar improcedentes os pedidos formulados na petição inicial. Condeno o apelado ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, §§ 2º e 3º, do CPC, ficando suspensa a exigibilidade em razão da gratuidade da justiça que lhe foi concedida. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 08/07/2025

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Processo nº 1000379-68.2019.8.11.0003

ID: 321710036

Tribunal: TJMT Órgão: Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1000379-68.2019.8.11.0003

Data de Disponibilização: 10/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

WEMERSON ALVES DA SILVA

Acórdão

Advogados:

DAVID ALVES DOS SANTOS

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO Número Único: 1000379-68.2019.8.11.0003 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Assistência Judiciária Gratuita, Ser… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO Número Único: 1000379-68.2019.8.11.0003 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Assistência Judiciária Gratuita, Serviços de Saúde] Relator: Des(a). MARIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA Turma Julgadora: [DES(A). MARIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA, DES(A). DEOSDETE CRUZ JUNIOR, DES(A). MARIA APARECIDA FERREIRA FAGO] Parte(s): [WEMERSON ALVES DA SILVA - CPF: 025.826.641-46 (APELADO), DAVID ALVES DOS SANTOS - CPF: 008.819.551-16 (ADVOGADO), MATO GROSSO GOVERNO DO ESTADO - CNPJ: 03.507.415/0032-40 (APELANTE), SOCIEDADE BENEFICENTE SAO CAMILO - CNPJ: 60.975.737/0002-32 (APELANTE), PRISCILA SANTOS RAIMUNDI CARLOS PEREIRA - CPF: 011.373.221-01 (ADVOGADO), MARIA NUBIA PANIAGO PEREIRA - CPF: 592.711.161-00 (ADVOGADO), PAULO ROBERTO STURM - CPF: 000.872.289-71 (TERCEIRO INTERESSADO), STALYN PANIAGO PEREIRA - CPF: 790.659.531-91 (ADVOGADO), ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0020-07 (APELANTE), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). MARIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE PROVERAM OS RECURSOS DA SOCIEDADE BENEFICENTE SAO CAMILO E DO ESTADO DE MATO GROSSO. PARTICIPARAM DO JULGAMENTO O EXCELENTÍSSIMO SR. DES. RELATOR MÁRIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA,1ª VOGAL EXMA. SRA. DESA. MARIA APARECIDA FERREIRA FAGO E 2º VOGAL EXMO. SR. DES. DEOSDETE CRUZ JÚNIOR. E M E N T A Ementa: DIREITO ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. ALEGADO ERRO MÉDICO EM PROCEDIMENTO ORTOPÉDICO. FRATURA DE TÍBIA E FÍBULA DECORRENTE DE ACIDENTE DE TRÂNSITO. AUSÊNCIA DE NEXO CAUSAL. RECURSOS PROVIDOS. I. CASO EM EXAME Recursos de apelação contra sentença que condenou solidariamente hospital público e Estado ao pagamento de indenização por danos morais e obrigação de fazer (retirar parafuso da perna do paciente), em decorrência de alegado erro médico em cirurgias ortopédicas realizadas após acidente de trânsito que causou fratura de tíbia e fíbula. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO A questão em discussão consiste em definir se houve erro médico nos procedimentos cirúrgicos realizados para tratamento da fratura sofrida pelo autor, capaz de configurar a responsabilidade civil dos réus e justificar a condenação por danos morais e obrigação de fazer. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. Inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor ao caso, pois os serviços médicos foram prestados gratuitamente pelo Sistema Único de Saúde (SUS), conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça. 4. A prova pericial atesta categoricamente que não houve negligência, imperícia ou imprudência no tratamento médico realizado, estando os procedimentos adotados de acordo com a literatura médica e adequados à gravidade das fraturas sofridas pelo paciente. 5. O perito médico concluiu expressamente que "o dano residual incapacitante foi devido à gravidade da fratura e o atendimento médico minimizou o dano" (quesito 15), evidenciando que as sequelas sofridas pelo autor decorrem exclusivamente da gravidade do acidente e não de falha no atendimento. 6. A quebra do parafuso e sua permanência no corpo do paciente após a segunda cirurgia constituem conduta técnica médica deliberada e justificada, tendo o relatório médico esclarecido que "não foi realizada sua retirada pois os malefícios causados para retirada deste parafuso superam os benefícios devido sua localização. E este tipo de conduta é habitual nesses tipos de casos, segundo a literatura ortopédica". 7. A responsabilidade civil do Estado, ainda que objetiva (CF, art. 37, §6º), exige a comprovação do nexo de causalidade entre a ação ou omissão estatal e o dano suportado pela vítima, requisito ausente no caso em tela. 8. A medicina caracteriza-se como atividade de meio, não de resultado, não se podendo exigir dos profissionais de saúde a cura ou ausência de sequelas, especialmente em casos de trauma grave como o sofrido pelo autor. 9. A sentença contraria frontalmente a prova técnica produzida nos autos, único elemento capaz de demonstrar, com segurança, a existência ou inexistência de falha no atendimento médico prestado. IV. DISPOSITIVO E TESE Recursos providos. 1. Ausente o nexo de causalidade entre as sequelas sofridas pelo paciente e o atendimento médico prestado, não há responsabilidade civil do Estado ou do hospital por danos decorrentes exclusivamente da gravidade da fratura sofrida em acidente de trânsito. 2. A não retirada de parafuso quebrado em procedimento cirúrgico ortopédico, quando tecnicamente justificada pela literatura médica devido aos riscos superarem os benefícios, constitui decisão médica legítima, não caracterizando erro médico passível de imposição judicial para sua remoção. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 37, §6º; CC, art. 944; CPC, art. 373, I. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 1.187.456, Rel. Min. Castro Meira, 2ª T. DJ 01/12/10. R E L A T Ó R I O Egrégia Câmara; Trata-se de recursos de apelação interpostos pela SOCIEDADE BENEFICENTE SÃO CAMILO – SBSC e pelo ESTADO DE MATO GROSSO contra sentença proferida pelo Juízo da 2ª Vara Especializada da Fazenda Pública da Comarca de Rondonópolis-MT, que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na ação de indenização por danos morais e estéticos decorrente de erro médico ajuizada por WEMERSON ALVES DA SILVA em desfavor dos apelantes. O magistrado a quo condenou solidariamente os requeridos ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais), bem como na obrigação de fazer consistente na retirada do parafuso da perna do autor. Irresignada, em suas razões recursais, a Sociedade Beneficente São Camilo alega, em síntese: a) Inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor e da inversão do ônus da prova, por se tratar de hospital público; b) Ausência de ato ilícito, uma vez que o laudo pericial concluiu categoricamente que não houve negligência, imperícia ou imprudência nos procedimentos realizados; c) Que o laudo pericial demonstrou que o tratamento foi realizado de forma adequada e que os danos residuais decorreram exclusivamente da gravidade da fratura causada pelo acidente; d) Que a decisão contrariou a prova técnica produzida nos autos, especialmente quanto à obrigação de retirar o parafuso quebrado, pois segundo o perito, "não foi realizada sua retirada pois os malefícios causados para retirada deste parafuso superam os benefícios devido sua localização. E este tipo de conduta é habitual nesses tipos de casos, segundo a literatura ortopédica"; e) Cerceamento de defesa pelo indeferimento da produção de prova oral, mesmo tendo o juiz julgado de forma contrária à prova pericial; f) Alternativamente, requereu a anulação da sentença para que seja oportunizada a produção de prova oral. Pugna pelo provimento recursal. Por sua vez, o Estado de Mato Grosso, em suas razões recursais, argumenta: a) Ausência de nexo de causalidade entre as cirurgias realizadas e os danos suportados pelo autor, pois segundo o laudo pericial, as sequelas decorreram da gravidade da fratura causada pelo acidente; b) Que o rompimento do implante metálico (haste) é evento que pode acontecer independentemente da conduta da equipe médica, tendo ocorrido meses após a cirurgia; c) Que a medicina é uma atividade de meio, que busca melhorar a saúde do paciente, mas não garante a cura ou resultados específicos; d) Que os médicos, diante de uma fratura grave, conseguiram evitar uma amputação, o que seria possível pela extensão da fratura; e) Que se aplicaria a responsabilidade subjetiva, por se tratar de conduta omissiva, sendo necessária a comprovação de culpa; f) Subsidiariamente, caso mantida a condenação, requer a redução do valor da indenização com observância do art. 944 do Código Civil. Requer o provimento recursal. O apelado apresentou contrarrazões, oportunidade em que, alega que a sentença não merece reparos e requer inclusive, a majoração dos danos morais arbitrados. (id. 280412446 e 280412448) É o relatório. V O T O R E L A T O R Egrégia Câmara; De início, verifico que ambos os recursos são tempestivos e preenchem os demais requisitos de admissibilidade, razão pela qual deles conheço. Conforme relatado, trata-se de recursos de apelação interpostos pela SOCIEDADE BENEFICENTE SÃO CAMILO – SBSC e pelo ESTADO DE MATO GROSSO contra sentença proferida pelo Juízo da 2ª Vara Especializada da Fazenda Pública da Comarca de Rondonópolis-MT, que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na ação de indenização por danos morais e estéticos decorrente de erro médico ajuizada por WEMERSON ALVES DA SILVA. O magistrado a quo condenou solidariamente os requeridos ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais), bem como na obrigação de fazer consistente na retirada do parafuso da perna do autor. Conforme se extrai dos autos, o autor sofreu um acidente de trânsito em 08/09/2015, fraturando a tíbia e a fíbula da perna direita, sendo socorrido pelo SAMU e encaminhado ao Hospital Regional de Rondonópolis-MT, administrado pelo Estado de Mato Grosso e gerido pela Sociedade Beneficente São Camilo. Em sua petição inicial, o autor alegou que durante os procedimentos cirúrgicos realizados desde a data do acidente ocorreram erros médicos decorrentes de negligência e imprudência, que lhe deixaram com sequelas permanentes e incapacidade laborativa definitiva. Narrou que na primeira cirurgia, realizada em 09/09/2015, foi inserida em sua perna uma Haste Metálica da Extremidade IntraArticular que apresentava tamanho irregular, impossibilitando-o de esticar a perna e causando dores extremas. Alegou ainda que o parafuso que firmava a haste quebrou devido à falha em sua colocação. Relatou que na segunda cirurgia, realizada em 12/12/2016, para retirada da haste e inserção de um Fixador Metálico Externo, o parafuso que havia se quebrado anteriormente permaneceu em sua perna, conforme evidenciado em exames de raio-x de 2017. Em razão desses fatos, requereu a condenação dos requeridos na obrigação de retirar o parafuso quebrado de sua perna e no pagamento de indenização por danos morais e estéticos no valor de R$ 100.000,00. Durante a instrução processual, foi realizada perícia médica, cujo laudo concluiu que os procedimentos médicos realizados, minimizaram os danos decorrentes da gravidade da fratura, que o tratamento realizado estava de acordo com a literatura médica e que não houve negligência, imperícia ou imprudência no atendimento. O perito afirmou expressamente que "o dano residual incapacitante foi devido à gravidade da fratura, o atendimento médico minimizou o dano" (quesito 15).(id. 280412414) O magistrado, contudo, entendeu que ficou demonstrado o nexo de causalidade entre a conduta negligente dos requeridos e o resultado danoso, acolhendo parcialmente os pedidos do autor. Pois bem. No caso em análise, observo que todos os serviços e tratamentos oferecidos ao apelado foram integralmente prestados pelo Sistema Único de Saúde – SUS, portanto, de forma gratuita. Nesse contexto, não se aplica o Código de Defesa do Consumidor, conforme entendimento consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. HOSPITAL DA POLÍCIA MILITAR. ERRO MÉDICO. MORTE DE PACIENTE. INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. DENUNCIAÇÃO DA LIDE. FACULTATIVA. 1. Os recorridos ajuizaram ação de ressarcimento por danos materiais e morais contra o Estado do Rio de Janeiro, em razão de suposto erro médico cometido no Hospital da Polícia Militar. 2. Quando o serviço público é prestado diretamente pelo Estado e custeado por meio de receitas tributárias não se caracteriza uma relação de consumo nem se aplicam as regras do Código de Defesa do Consumidor. Precedentes. 3. Nos feitos em que se examina a responsabilidade civil do Estado, a denunciação da lide ao agente causador do suposto dano não é obrigatória. Caberá ao magistrado avaliar se o ingresso do terceiro ocasionará prejuízo à celeridade ou à economia processuais. Precedentes. 4. Considerando que o Tribunal a quo limitou-se a indeferir a denunciação da lide com base no art. 88, do CDC, devem os autos retornar à origem para que seja avaliado, de acordo com as circunstâncias fáticas da demanda, se a intervenção de terceiros prejudicará ou não a regular tramitação do processo. 5. Recurso especial provido em parte. (REsp n. 1.187.456/RJ, relator Ministro Castro Meira, Segunda Turma, julgado em 16/11/2010, DJe de 1/12/2010.) Portanto, equivocada a aplicação do CDC e a inversão do ônus da prova determinadas pelo Juízo a quo. A questão central dos presentes recursos reside na existência ou não de ato ilícito imputável aos apelantes que tenha resultado em dano ao apelado. Da análise minuciosa do laudo pericial acostado aos autos (Id 280412414), é possível constatar que os procedimentos médicos realizados estavam em conformidade com a literatura médica e foram adequados à gravidade das fraturas sofridas pelo apelado. O perito médico, de forma categórica, respondeu negativamente ao quesito sobre a existência de negligência, imperícia ou imprudência no tratamento realizado, esclarecendo que o "ortopedista procurou sempre o melhor para o paciente" e que "há necessidade de expertise para a colocação do fixador, conforme realizado no caso concreto". Ademais, ao ser questionado sobre a existência de dano funcional incapacitante e permanente para as atividades habituais do autor decorrentes do atendimento médico, o perito foi taxativo ao afirmar que "o dano residual incapacitante foi devido à gravidade da fratura e o atendimento médico minimizou o dano" (quesito 15). Quanto à quebra do parafuso e à sua permanência no corpo do apelado após a segunda cirurgia, o relatório médico acostado aos autos esclarece que "não foi realizada sua retirada pois os malefícios causados para retirada deste parafuso superam os benefícios devido sua localização. E este tipo de conduta é habitual nesses tipos de casos, segundo a literatura ortopédica". (id. 280411899) Da análise pericial, evidenciou-se que as sequelas e limitações funcionais experimentadas pelo apelado decorrem da própria gravidade da fratura sofrida no acidente, e não de qualquer falha no atendimento médico prestado. Pelo contrário, os procedimentos realizados minimizaram os danos e evitaram consequências ainda mais graves, como a possibilidade de amputação do membro. Portanto, não se verifica o nexo de causalidade entre a atuação dos prepostos dos apelantes e os danos alegados pelo apelado, requisito essencial para a configuração da responsabilidade civil, seja ela objetiva ou subjetiva. Convém ressaltar que a medicina é uma atividade de meio, e não de resultado, que busca melhorar a condição de saúde do paciente sem, contudo, garantir a cura ou a ausência de sequelas. No caso em tela, diante da gravidade da fratura sofrida pelo apelado, era previsível a ocorrência de sequelas, como atestado pelo perito judicial. A sentença, ao condenar os apelantes, contraria frontalmente a prova técnica produzida nos autos, único elemento capaz de demonstrar, com segurança, a existência ou não de falha no atendimento médico prestado. Quanto à determinação de retirada do parafuso que permaneceu na perna do apelado, verifica-se que tal obrigação também contraria o entendimento médico. Conforme atestado pela perícia e pelo relatório do médico assistente, a não retirada do parafuso foi uma decisão técnica tomada para resguardar a saúde do paciente, pois "os malefícios causados para retirada deste parafuso superam os benefícios devido sua localização". Impor judicialmente a retirada do parafuso representa indevida interferência na autonomia médica e pode, inclusive, colocar em risco a saúde do apelado. Tal decisão, embora bem-intencionada, desconsidera o conhecimento técnico-científico necessário para avaliar os riscos e benefícios de procedimentos médicos invasivos. Não havendo ato ilícito imputável aos apelantes, tampouco nexo de causalidade entre sua conduta e os danos alegados pelo apelado, não há que se falar em dever de indenizar. Os danos experimentados pelo apelado decorrem exclusivamente da gravidade do acidente sofrido, sendo que os procedimentos médicos realizados, ao contrário do alegado na inicial, buscaram minimizar suas consequências. Diante do exposto, DOU PROVIMENTO aos recursos de apelação interpostos pela SOCIEDADE BENEFICENTE SÃO CAMILO – SBSC e pelo ESTADO DE MATO GROSSO para reformar integralmente a sentença e julgar improcedentes os pedidos formulados na petição inicial. Condeno o apelado ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, §§ 2º e 3º, do CPC, ficando suspensa a exigibilidade em razão da gratuidade da justiça que lhe foi concedida. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 08/07/2025

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Processo nº 1000379-46.2025.8.11.0007

ID: 299827431

Tribunal: TJMT Órgão: Quarta Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1000379-46.2025.8.11.0007

Data de Disponibilização: 16/06/2025

Polo Ativo:

WALDINEI BENTO DA SILVA

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

MARYKELLER DE MELLO

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1000379-46.2025.8.11.0007 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Alienação Fiduciária, Contratos Bancários, Inter… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1000379-46.2025.8.11.0007 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Alienação Fiduciária, Contratos Bancários, Interpretação / Revisão de Contrato] Relator: Des(a). ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA Turma Julgadora: [DES(A). ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA, DES(A). RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, DES(A). SERLY MARCONDES ALVES] Parte(s): [WALDINEI BENTO DA SILVA - CPF: 891.997.231-15 (APELANTE), DIEGO GOMES DIAS - CPF: 323.505.598-31 (ADVOGADO), AYMORE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. - CNPJ: 07.707.650/0001-10 (APELADO), REGINA MARIA FACCA - CPF: 732.227.048-72 (ADVOGADO), MARYKELLER DE MELLO - CPF: 269.997.838-88 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: PARCIALMENTE PROVIDO, UNÂNIME E M E N T A DIREITO CIVIL E DIREITO DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO. JUROS REMUNERATÓRIOS DENTRO DA MÉDIA DE MERCADO. VALIDADE DAS TARIFAS DE CADASTRO, REGISTRO E AVALIAÇÃO. ABUSIVIDADE CONFIGURADA NA CONTRATAÇÃO COMPULSÓRIA DE SEGURO PRESTAMISTA. VENDA CASADA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I. Caso em exame 1. Apelação cível interposta contra sentença que julgou improcedentes os pedidos na Ação revisional de contrato bancário, que objetivava a revisão de cláusulas contratuais, a restituição de valores e reconhecimento de prática abusiva. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em saber: (i) se há abusividade nos juros remuneratórios pactuados; (ii) se são válidas as tarifas de cadastro, avaliação do bem e registro do contrato; e (iii) se a contratação do seguro prestamista configura prática abusiva de venda casada. III. Razões de decidir 3.Não há abusividade nos juros remuneratórios, que estão inferiores à taxa média de mercado divulgada pelo Banco Central do Brasil à época da contratação. 4. As tarifas de cadastro, avaliação do bem e registro do contrato são válidas, pois foram expressamente pactuadas, tiveram sua efetiva prestação comprovada e não configuram onerosidade excessiva. 5.Configura prática abusiva a contratação compulsória do seguro prestamista, sem que tenha sido assegurada ao consumidor a liberdade de escolha da seguradora, o que caracteriza venda casada, vedada pelo art. 39, I, do CDC e pela tese firmada no Tema 972 do STJ. IV. Dispositivo e tese 6. Recurso de apelação parcialmente provido. Tese de julgamento: 1. É válida a pactuação de juros remuneratórios inferiores ou equivalentes à média de mercado divulgada pelo Banco Central do Brasil. 2. São legítimas as cobranças de tarifas de cadastro, avaliação do bem e registro do contrato, desde que contratadas de forma expressa e com efetiva prestação dos serviços. 3. É nula a cláusula que impõe a contratação de seguro prestamista sem assegurar ao consumidor a liberdade de escolha da seguradora, configurando venda casada. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, XXXII; CDC, arts. 6º, III, e 39, I; CPC, arts. 85, §14, e 98, §3º. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp nº 1.061.530/RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, Segunda Seção, j. 22.10.2008; STJ, Tema 972; TJMT, ApCiv nº 1002674-51.2025.8.11.0041, Rel. Des. Serly Marcondes Alves, Quarta Câmara de Direito Privado, j. 02.04.2025; TJMT, AC nº 1000943-52.2021.8.11.0108, Rel. Des. Rubens de Oliveira Santos Filho, j. 27.03.2024. R E L A T Ó R I O EXMA. SRA. DESEMBARGADORA ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA Egrégia Câmara: Trata-se de Apelação Cível interposta por Waldinei Bento da Silva em face de sentença proferida pelo Juízo da 5ª Vara da Comarca de Alta Floresta que, na Ação revisional de contrato bancário ajuizada em desfavor de Aymoré Crédito, Financiamento e Investimento S.A., julgou improcedentes os pedidos formulados na inicial. O apelante sustenta violação aos princípios da boa-fé e transparência, alegando abusividade dos juros remuneratórios, da tarifa de cadastro e da tarifa de avaliação, além da ilegalidade da tarifa de registro e da venda casada de seguro prestamista, por ausência de informações claras e prestação efetiva dos serviços. Pleiteia a revisão das cláusulas, a devolução em dobro dos valores pagos e que não haja majoração dos honorários recursais. Requer o provimento do recurso e a reforma da sentença (id. 285821866). O apelado Aymoré Crédito, Financiamento e Investimento S.A apresentou contrarrazões, pugnando pela manutenção da sentença (id. 285821869). É o relatório. V O T O R E L A T O R EXMA. SRA. DESEMBARGADORA ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA Egrégia Câmara: A controvérsia recursal cinge-se à análise da suposta abusividade dos juros remuneratórios e de encargos contratuais, notadamente das tarifas de cadastro, registro de contrato e avaliação do bem, bem como da validade da contratação do seguro prestamista, que o apelante alega configurar venda casada. 1.Dos juros remuneratórios. O contrato foi celebrado em 1º de julho de 2023, tendo por objeto o financiamento para aquisição de veículo, com garantia de alienação fiduciária, no qual foi pactuada taxa de juros remuneratórios de 1,78 % ao mês. (id. 285821855) Nos termos do entendimento consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça, a taxa de juros pactuada em contratos bancários pode ser revista judicialmente em situações excepcionais, quando comprovada, de forma inequívoca, a abusividade, em razão de desproporcionalidade evidente e injustificada em relação à média de mercado. É o que se extrai do julgamento do REsp 1.061.530/RS, sob o rito dos recursos repetitivos. Segundo dados do Banco Central do Brasil, a taxa média de mercado para operações da mesma natureza, em julho de 2023, era de 1,98% ao mês. No que se refere aos juros remuneratórios, não há abusividade, pois a taxa contratada de 1,78% ao mês está inferior à taxa média de mercado, que era de 1,98% ao mês na data da contratação, conforme dados do Banco Central do Brasil. Nesse sentido, o Tribunal de Justiça de Mato Grosso já decidiu: “Não há que se falar em abusividade dos juros remuneratórios pactuados, quando apresentam inferiores à taxa média de mercado prevista pelo BACEN, à época da contratação. Só se considera abusiva a taxa de juros remuneratórios se fixada no mínimo uma vez e meia (50%) acima da taxa média de mercado, posicionamento externado pelo STJ no julgamento do REsp. 1.061.530/RS. A circunstância de a taxa de juros remuneratórios praticada pela instituição financeira exceder a taxa média do mercado não induz, por si só, a conclusão de cobrança abusiva, consistindo a referida taxa em um referencial a ser considerado, e não em um limite que deva ser necessariamente observado pelas instituições financeiras.” (TJMT - AC 1007092-54.2022.8.11.0003, Rel. Desª NILZA MARIA POSSAS DE CARVALHO, Primeira Câmara de Direito Privado, j. 06/06/2023, pub. 13/06/2023). “DIREITO BANCÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO.JUROSREMUNERATÓRIOS. DENTRO DATAXAMÉDIA DE MERCADO.ABUSIVIDADENÃO CONFIGURADA. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. [...] A mera divergência entre ataxacontratada e ataxamédia de mercado não configura, por si só, vantagem exagerada ou ilegalidade, sendo necessário demonstrar que osjurosextrapolam significativamente o patamar médio, o que não ocorreu no caso. [...] Ataxadejurospactuada somente pode ser considerada abusiva se superar significativamente ataxamédia de mercado, caracterizando onerosidade excessiva ao consumidor. [...]” (TJMT, ApCiv 1002674-51.2025.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SERLY MARCONDES ALVES, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 02/04/2025, Publicado no DJE 05/04/2025) Nesse contexto, destaca-se o seguinte julgado do STJ: AGRAVO INTERNO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO. TAXA DE JUROS REMUNERATÓRIOS CONTRATADA. ABUSIVIDADE. AUSÊNCIA. ORIENTAÇÃO FIRMADA NO RESP N. 1.061.530/RS. 1. De acordo com a orientação adotada no julgamento do REsp. 1.061.530/RS, sob o rito do art. 543-C do CPC/73, ‘é admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada – art. 51, § 1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante as peculiaridades do julgamento em concreto.’ 2. Prevaleceu o entendimento de que a taxa média de mercado apurada pelo Banco Central para cada segmento de crédito é referencial útil para o controle da abusividade, mas o simples fato de a taxa efetiva cobrada no contrato estar acima da taxa média de mercado não significa, por si só, abuso. Ao contrário, a média de mercado não pode ser considerada o limite, justamente porque é média; incorpora as menores e maiores taxas praticadas pelo mercado, em operações de diferentes níveis de risco. Foi expressamente rejeitada a possibilidade de o Poder Judiciário estabelecer aprioristicamente um teto para taxa de juros, adotando como parâmetro máximo o dobro ou qualquer outro percentual em relação à taxa média. 3. O caráter abusivo da taxa de juros contratada haverá de ser demonstrado de acordo com as peculiaridades de cada caso concreto, levando-se em consideração circunstâncias como o custo da captação dos recursos no local e época do contrato, a análise do perfil de risco de crédito do tomador e o spread da operação. (...)” (STJ - AgInt no AREsp: 1493171 RS, Rel. Min. Raul Araújo, j. 17/11/2020, DJe 10/03/2021). (destaquei). No caso em análise, observo que as cláusulas contratuais foram redigidas de forma clara e objetiva, sem prejuízo à compreensão do consumidor médio. Os termos pactuados respeitam os princípios da boa-fé objetiva e do equilíbrio contratual, não havendo nos autos qualquer elemento que indique a existência de abusividades. 2.Tarifa de cadastro A apelante alega a abusividade da tarifa de cadastro, ao argumento de que o valor cobrado é excessivo e desproporcional. Como se sabe, a tarifa de cadastro é considerada válida quando cobrada no início da relação contratual, desde que esteja expressamente prevista no contrato e não haja cobrança cumulativa com outras tarifas da mesma natureza. A referida tarifa visa remunerar o serviço de análise de crédito e coleta de dados do contratante para habilitação da operação de financiamento. A tarifa de cadastro está individualizada no contrato e o valor foi previamente informado ao consumidor, não se evidenciando qualquer cobrança em duplicidade ou vício de consentimento, sendo legítima sua incidência.(id. 285821855): Nesse sentido: DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO EM AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO DE VEÍCULO. NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL. ERRO NA INDICAÇÃO DO NÚMERO DO CONTRATO. IRRELEVÂNCIA. COMPROVAÇÃO DA MORA. PRESTAÇÃO DE CONTAS. NECESSIDADE DE AÇÃO AUTÔNOMA. TARIFA DE CADASTRO. COBRANÇA VÁLIDA. TARIFA DE AVALIAÇÃO DO BEM. AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL. RECURSO CONHECIDO EM PARTE E NESSE PONTO NÃO PROVIDO. (...). A tarifa de cadastro é válida e pode ser cobrada no início do relacionamento entre o consumidor e a instituição financeira, conforme o REsp 1255573/RS e a Súmula 566 do STJ. (...) (N.U 1014293-90.2024.8.11.0015, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 12/03/2025, Publicado no DJE 14/03/2025) (destaquei). 3. Da tarifa de avaliação e registro de contrato O STJ, ao julgar o Tema 958, reconheceu a validade da tarifa de avaliação do bem e da tarifa de registro, desde que observados os seguintes critérios: 2.1. Abusividade da cláusula que prevê a cobrança de ressarcimento de serviços prestados por terceiros, sem a especificação do serviço a ser efetivamente prestado; 2.2. Abusividade da cláusula que prevê o ressarcimento pelo consumidor da comissão do correspondente bancário, em contratos celebrados a partir de 25/02/2011, data de entrada em vigor da Res.-CMN 3.954/2011, sendo válida a cláusula no período anterior a essa resolução, ressalvado o controle da onerosidade excessiva; 2.3. Validade da tarifa de avaliação do bem dado em garantia, bem como da cláusula que prevê o ressarcimento de despesa com o registro do contrato, ressalvadas a: 2.3.1. abusividade da cobrança por serviço não efetivamente prestado; e a 2.3.2. possibilidade de controle da onerosidade excessiva, em cada caso concreto” (Tema n. 958/STJ). Nas negociações envolvendo veículos usados intermediadas por revendedoras, é comum que a própria empresa se responsabilize pelos trâmites administrativos necessários, inclusive pela avaliação do bem, etapa que, geralmente, integra o processo de análise para aprovação do financiamento. Contudo, a validade da cobrança por esse serviço depende da efetiva demonstração de que ele foi prestado em benefício do consumidor. Na hipótese, a tarifa de registro no valor de R$. 316,00 foi regularmente contratada e teve sua efetiva prestação comprovada, conforme demonstram os documentos anexados pela instituição financeira, extraídos do Sistema Nacional de Gravames (id. 285821855). Confirmada, portanto, a realização do registro junto ao órgão competente (id. 285821859), o que afasta a alegação de cobrança indevida ou por serviço não prestado. Ademais, o valor cobrado mostra-se compatível com a média praticada no mercado, inexistindo indício de onerosidade excessiva ou desequilíbrio contratual. No que se refere à tarifa de avaliação do bem, verifica-se que sua cobrança está expressamente prevista no contrato, no valor de R$. 599,00, devidamente financiada. Ademais, consta nos autos o documento de id. 269252817, que comprova a realização da vistoria do veículo, demonstrando a efetiva prestação do serviço. Além disso, o valor pactuado não se revela desproporcional frente ao montante financiado, não havendo nos autos elementos que evidenciem onerosidade excessiva ou ausência de contraprestação capaz de justificar sua invalidação. Dessa forma, não se vislumbra abusividade na cobrança da tarifa de registro e nem na cobrança da tarifa de cadastro, não há como excluir as verbas do valor financiado nem em recálculo das parcelas, conforme registrado na sentença. 3.Do seguro prestamista No que se refere à contratação do seguro, verifica-se que, embora haja proposta de adesão assinada (id. 285821860), o contrato não apresenta cláusula destacada que informe, de maneira clara e objetiva, que sua contratação seria facultativa. Tampouco há qualquer demonstração de que o apelante teve liberdade para escolher a seguradora de sua preferência. A contratação foi vinculada à Zurich Santander Brasil Seguros e Previdência S.A., indicada pela própria financeira, sem qualquer menção à possibilidade de contratação externa ou de escolha livre pelo consumidor. Ademais, o valor do seguro, correspondente a R$ 1.987,90, não foi previamente informado na proposta principal de financiamento, sendo financiado juntamente com o contrato, o que compromete o dever de informação previsto no artigo 6º, inciso III, do Código de Defesa do Consumidor. O Superior Tribunal de Justiça fixou a tese no Tema 972 de que “nos contratos bancários em geral, o consumidor não pode ser compelido a contratar seguro com a instituição financeira ou com seguradora por ela indicada”. Nessas circunstâncias, resta evidente a prática abusiva de venda casada, vedada pelo ordenamento jurídico. A jurisprudência deste Câmara tem reconhecido que, nessas hipóteses, configura-se a prática de venda casada: "Além de configurar a famigerada venda casada, vedada pelo art. 39, I, do CDC, a contratação compulsória do seguro retira do consumidor o direito de barganha pelo menor preço ofertado entre as seguradoras existentes no mercado. [...] O que não se admite é que se retire do consumidor o direito de escolha de qual seguradora deseja contratar." (TJMT – AC 1000943-52.2021.8.11.0108, Rel. Des. Rubens de Oliveira Santos Filho, j. 27/03/2024) DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO. CERCEAMENTO DE DEFESA. PROVA PERICIAL. PERÍCIA CONTÁBIL. INOCORRÊNCIA. MÉRITO. ABUSIVIDADES. EMPRÉSTIMO. CAPITAL DE GIRO. JUROS REMUNERATÓRIOS. DENTRO DA NORMALIDADE. CAPITALIZAÇÃO MENSAL. CONTRATADA. ENCARGOS MORATÓRIOS. JUROS REMUNERATÓRIOS FAZENDO VEZES DE COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. CUMULAÇÃO INDEVIDA. TARIFAS ADMINISTRATIVAS. ALEGAÇÃO GENÉRICA. AUSÊNCIA DE ESPECIFICAÇÃO. SEGURO PRESTAMISTA. RETIRADO O DIREITO DE ESCOLHA. RESTITUIÇÃO SIMPLES. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (...). A contratação compulsória de seguro prestamista sem a possibilidade de escolha da seguradora caracteriza venda casada, prática vedada pelo artigo 39, I, do CDC e consolidada pelo Tema 972 do STJ, impondo-se a devolução dos valores pagos. (...). A imposição de seguro prestamista sem a possibilidade de escolha da seguradora caracteriza venda casada e impõe a restituição dos valores pagos. Dispositivos relevantes citados: CPC/2015, arts. 355, I, e 370, parágrafo único; Lei nº 10.931/2004, art. 28, §1º; CDC, art. 39, I. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no AREsp nº 2.124.524/PA, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, j. 26.09.2022; STJ, REsp nº 1.061.530/RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, Segunda Seção, j. 22.10.2008; STJ, REsp nº 1.639.320/SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Segunda Seção, j. 12.12.2018; Súmulas 30, 294, 296, 382, 472, 539, 541 e 566 do STJ. (N.U 1004785-45.2024.8.11.0040, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SERLY MARCONDES ALVES, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 02/04/2025, Publicado no DJE 06/04/2025) (destaquei) Portanto, reconheço a nulidade da cláusula que impôs a contratação do seguro, no valor total de R$. 1.987,90, devendo ser devolvido, na proporção do pagamento efetuado, porquanto sua cobrança vem diluída no valor das parcelas. Quanto à restituição, ausente prova de má-fé por parte da apelada, esta deve ocorrer de forma simples, limitada ao valor efetivamente pago (R$ 1.987,90), devidamente corrigido pelo INPC desde cada desembolso e acrescido de juros de mora de 1% ao mês a partir da citação, nos termos do art. 42, parágrafo único, do CDC. 4.Da distribuição do ônus sucumbencial Considerando o parcial provimento do recurso de Apelação, com a procedência de um dos pedidos, impõe-se a adequação da distribuição das verbas sucumbenciais. Assim, diante da sucumbência recíproca, fixo as verbas sucumbenciais as partes, devendo o autor arcar com o percentual de 60% e o réu de 40%, cujos honorários advocatícios devem ser mantidos no percentual de 10% sobre o valor atualizado da causa, vedada, contudo, a compensação, nos termos do art. 85, § 14, do Código de Processo Civil. Ressalto, ainda, a suspensão da exigibilidade da obrigação imposta à parte autora, beneficiária da gratuidade da justiça, na forma do art. 98, § 3º, do mesmo diploma legal. Por fim, deixo de proceder à majoração dos honorários recursais, em atenção ao entendimento consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Tema Repetitivo nº 1.059 (REsp 1.864.633/RS), segundo o qual, em caso de provimento, ainda que parcial, do recurso, não se impõe o acréscimo previsto no art. 85, § 11, do CPC. 5.Do dispositivo Diante do exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO ao recurso de Apelação para reformar a sentença e reconhecer a nulidade da contratação do seguro prestamista, determinando a restituição simples dos valores eventualmente pagos. Redimensiono as verbas sucumbenciais, devendo o autor arcar com o percentual de 60% e o réu de 40%, observada a suspensão da exigibilidade, nos termos do art. 98, §3º, do CPC, por ser o autor beneficiário da gratuidade da justiça. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 11/06/2025

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Processo nº 1000379-46.2025.8.11.0007

ID: 299827432

Tribunal: TJMT Órgão: Quarta Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1000379-46.2025.8.11.0007

Data de Disponibilização: 16/06/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

AYMORE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A.

Acórdão

Advogados:

REGINA MARIA FACCA

OAB/SC XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1000379-46.2025.8.11.0007 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Alienação Fiduciária, Contratos Bancários, Inter… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1000379-46.2025.8.11.0007 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Alienação Fiduciária, Contratos Bancários, Interpretação / Revisão de Contrato] Relator: Des(a). ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA Turma Julgadora: [DES(A). ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA, DES(A). RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, DES(A). SERLY MARCONDES ALVES] Parte(s): [WALDINEI BENTO DA SILVA - CPF: 891.997.231-15 (APELANTE), DIEGO GOMES DIAS - CPF: 323.505.598-31 (ADVOGADO), AYMORE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. - CNPJ: 07.707.650/0001-10 (APELADO), REGINA MARIA FACCA - CPF: 732.227.048-72 (ADVOGADO), MARYKELLER DE MELLO - CPF: 269.997.838-88 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: PARCIALMENTE PROVIDO, UNÂNIME E M E N T A DIREITO CIVIL E DIREITO DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO. JUROS REMUNERATÓRIOS DENTRO DA MÉDIA DE MERCADO. VALIDADE DAS TARIFAS DE CADASTRO, REGISTRO E AVALIAÇÃO. ABUSIVIDADE CONFIGURADA NA CONTRATAÇÃO COMPULSÓRIA DE SEGURO PRESTAMISTA. VENDA CASADA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I. Caso em exame 1. Apelação cível interposta contra sentença que julgou improcedentes os pedidos na Ação revisional de contrato bancário, que objetivava a revisão de cláusulas contratuais, a restituição de valores e reconhecimento de prática abusiva. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em saber: (i) se há abusividade nos juros remuneratórios pactuados; (ii) se são válidas as tarifas de cadastro, avaliação do bem e registro do contrato; e (iii) se a contratação do seguro prestamista configura prática abusiva de venda casada. III. Razões de decidir 3.Não há abusividade nos juros remuneratórios, que estão inferiores à taxa média de mercado divulgada pelo Banco Central do Brasil à época da contratação. 4. As tarifas de cadastro, avaliação do bem e registro do contrato são válidas, pois foram expressamente pactuadas, tiveram sua efetiva prestação comprovada e não configuram onerosidade excessiva. 5.Configura prática abusiva a contratação compulsória do seguro prestamista, sem que tenha sido assegurada ao consumidor a liberdade de escolha da seguradora, o que caracteriza venda casada, vedada pelo art. 39, I, do CDC e pela tese firmada no Tema 972 do STJ. IV. Dispositivo e tese 6. Recurso de apelação parcialmente provido. Tese de julgamento: 1. É válida a pactuação de juros remuneratórios inferiores ou equivalentes à média de mercado divulgada pelo Banco Central do Brasil. 2. São legítimas as cobranças de tarifas de cadastro, avaliação do bem e registro do contrato, desde que contratadas de forma expressa e com efetiva prestação dos serviços. 3. É nula a cláusula que impõe a contratação de seguro prestamista sem assegurar ao consumidor a liberdade de escolha da seguradora, configurando venda casada. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, XXXII; CDC, arts. 6º, III, e 39, I; CPC, arts. 85, §14, e 98, §3º. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp nº 1.061.530/RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, Segunda Seção, j. 22.10.2008; STJ, Tema 972; TJMT, ApCiv nº 1002674-51.2025.8.11.0041, Rel. Des. Serly Marcondes Alves, Quarta Câmara de Direito Privado, j. 02.04.2025; TJMT, AC nº 1000943-52.2021.8.11.0108, Rel. Des. Rubens de Oliveira Santos Filho, j. 27.03.2024. R E L A T Ó R I O EXMA. SRA. DESEMBARGADORA ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA Egrégia Câmara: Trata-se de Apelação Cível interposta por Waldinei Bento da Silva em face de sentença proferida pelo Juízo da 5ª Vara da Comarca de Alta Floresta que, na Ação revisional de contrato bancário ajuizada em desfavor de Aymoré Crédito, Financiamento e Investimento S.A., julgou improcedentes os pedidos formulados na inicial. O apelante sustenta violação aos princípios da boa-fé e transparência, alegando abusividade dos juros remuneratórios, da tarifa de cadastro e da tarifa de avaliação, além da ilegalidade da tarifa de registro e da venda casada de seguro prestamista, por ausência de informações claras e prestação efetiva dos serviços. Pleiteia a revisão das cláusulas, a devolução em dobro dos valores pagos e que não haja majoração dos honorários recursais. Requer o provimento do recurso e a reforma da sentença (id. 285821866). O apelado Aymoré Crédito, Financiamento e Investimento S.A apresentou contrarrazões, pugnando pela manutenção da sentença (id. 285821869). É o relatório. V O T O R E L A T O R EXMA. SRA. DESEMBARGADORA ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA Egrégia Câmara: A controvérsia recursal cinge-se à análise da suposta abusividade dos juros remuneratórios e de encargos contratuais, notadamente das tarifas de cadastro, registro de contrato e avaliação do bem, bem como da validade da contratação do seguro prestamista, que o apelante alega configurar venda casada. 1.Dos juros remuneratórios. O contrato foi celebrado em 1º de julho de 2023, tendo por objeto o financiamento para aquisição de veículo, com garantia de alienação fiduciária, no qual foi pactuada taxa de juros remuneratórios de 1,78 % ao mês. (id. 285821855) Nos termos do entendimento consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça, a taxa de juros pactuada em contratos bancários pode ser revista judicialmente em situações excepcionais, quando comprovada, de forma inequívoca, a abusividade, em razão de desproporcionalidade evidente e injustificada em relação à média de mercado. É o que se extrai do julgamento do REsp 1.061.530/RS, sob o rito dos recursos repetitivos. Segundo dados do Banco Central do Brasil, a taxa média de mercado para operações da mesma natureza, em julho de 2023, era de 1,98% ao mês. No que se refere aos juros remuneratórios, não há abusividade, pois a taxa contratada de 1,78% ao mês está inferior à taxa média de mercado, que era de 1,98% ao mês na data da contratação, conforme dados do Banco Central do Brasil. Nesse sentido, o Tribunal de Justiça de Mato Grosso já decidiu: “Não há que se falar em abusividade dos juros remuneratórios pactuados, quando apresentam inferiores à taxa média de mercado prevista pelo BACEN, à época da contratação. Só se considera abusiva a taxa de juros remuneratórios se fixada no mínimo uma vez e meia (50%) acima da taxa média de mercado, posicionamento externado pelo STJ no julgamento do REsp. 1.061.530/RS. A circunstância de a taxa de juros remuneratórios praticada pela instituição financeira exceder a taxa média do mercado não induz, por si só, a conclusão de cobrança abusiva, consistindo a referida taxa em um referencial a ser considerado, e não em um limite que deva ser necessariamente observado pelas instituições financeiras.” (TJMT - AC 1007092-54.2022.8.11.0003, Rel. Desª NILZA MARIA POSSAS DE CARVALHO, Primeira Câmara de Direito Privado, j. 06/06/2023, pub. 13/06/2023). “DIREITO BANCÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO.JUROSREMUNERATÓRIOS. DENTRO DATAXAMÉDIA DE MERCADO.ABUSIVIDADENÃO CONFIGURADA. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. [...] A mera divergência entre ataxacontratada e ataxamédia de mercado não configura, por si só, vantagem exagerada ou ilegalidade, sendo necessário demonstrar que osjurosextrapolam significativamente o patamar médio, o que não ocorreu no caso. [...] Ataxadejurospactuada somente pode ser considerada abusiva se superar significativamente ataxamédia de mercado, caracterizando onerosidade excessiva ao consumidor. [...]” (TJMT, ApCiv 1002674-51.2025.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SERLY MARCONDES ALVES, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 02/04/2025, Publicado no DJE 05/04/2025) Nesse contexto, destaca-se o seguinte julgado do STJ: AGRAVO INTERNO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO. TAXA DE JUROS REMUNERATÓRIOS CONTRATADA. ABUSIVIDADE. AUSÊNCIA. ORIENTAÇÃO FIRMADA NO RESP N. 1.061.530/RS. 1. De acordo com a orientação adotada no julgamento do REsp. 1.061.530/RS, sob o rito do art. 543-C do CPC/73, ‘é admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada – art. 51, § 1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante as peculiaridades do julgamento em concreto.’ 2. Prevaleceu o entendimento de que a taxa média de mercado apurada pelo Banco Central para cada segmento de crédito é referencial útil para o controle da abusividade, mas o simples fato de a taxa efetiva cobrada no contrato estar acima da taxa média de mercado não significa, por si só, abuso. Ao contrário, a média de mercado não pode ser considerada o limite, justamente porque é média; incorpora as menores e maiores taxas praticadas pelo mercado, em operações de diferentes níveis de risco. Foi expressamente rejeitada a possibilidade de o Poder Judiciário estabelecer aprioristicamente um teto para taxa de juros, adotando como parâmetro máximo o dobro ou qualquer outro percentual em relação à taxa média. 3. O caráter abusivo da taxa de juros contratada haverá de ser demonstrado de acordo com as peculiaridades de cada caso concreto, levando-se em consideração circunstâncias como o custo da captação dos recursos no local e época do contrato, a análise do perfil de risco de crédito do tomador e o spread da operação. (...)” (STJ - AgInt no AREsp: 1493171 RS, Rel. Min. Raul Araújo, j. 17/11/2020, DJe 10/03/2021). (destaquei). No caso em análise, observo que as cláusulas contratuais foram redigidas de forma clara e objetiva, sem prejuízo à compreensão do consumidor médio. Os termos pactuados respeitam os princípios da boa-fé objetiva e do equilíbrio contratual, não havendo nos autos qualquer elemento que indique a existência de abusividades. 2.Tarifa de cadastro A apelante alega a abusividade da tarifa de cadastro, ao argumento de que o valor cobrado é excessivo e desproporcional. Como se sabe, a tarifa de cadastro é considerada válida quando cobrada no início da relação contratual, desde que esteja expressamente prevista no contrato e não haja cobrança cumulativa com outras tarifas da mesma natureza. A referida tarifa visa remunerar o serviço de análise de crédito e coleta de dados do contratante para habilitação da operação de financiamento. A tarifa de cadastro está individualizada no contrato e o valor foi previamente informado ao consumidor, não se evidenciando qualquer cobrança em duplicidade ou vício de consentimento, sendo legítima sua incidência.(id. 285821855): Nesse sentido: DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO EM AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO DE VEÍCULO. NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL. ERRO NA INDICAÇÃO DO NÚMERO DO CONTRATO. IRRELEVÂNCIA. COMPROVAÇÃO DA MORA. PRESTAÇÃO DE CONTAS. NECESSIDADE DE AÇÃO AUTÔNOMA. TARIFA DE CADASTRO. COBRANÇA VÁLIDA. TARIFA DE AVALIAÇÃO DO BEM. AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL. RECURSO CONHECIDO EM PARTE E NESSE PONTO NÃO PROVIDO. (...). A tarifa de cadastro é válida e pode ser cobrada no início do relacionamento entre o consumidor e a instituição financeira, conforme o REsp 1255573/RS e a Súmula 566 do STJ. (...) (N.U 1014293-90.2024.8.11.0015, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 12/03/2025, Publicado no DJE 14/03/2025) (destaquei). 3. Da tarifa de avaliação e registro de contrato O STJ, ao julgar o Tema 958, reconheceu a validade da tarifa de avaliação do bem e da tarifa de registro, desde que observados os seguintes critérios: 2.1. Abusividade da cláusula que prevê a cobrança de ressarcimento de serviços prestados por terceiros, sem a especificação do serviço a ser efetivamente prestado; 2.2. Abusividade da cláusula que prevê o ressarcimento pelo consumidor da comissão do correspondente bancário, em contratos celebrados a partir de 25/02/2011, data de entrada em vigor da Res.-CMN 3.954/2011, sendo válida a cláusula no período anterior a essa resolução, ressalvado o controle da onerosidade excessiva; 2.3. Validade da tarifa de avaliação do bem dado em garantia, bem como da cláusula que prevê o ressarcimento de despesa com o registro do contrato, ressalvadas a: 2.3.1. abusividade da cobrança por serviço não efetivamente prestado; e a 2.3.2. possibilidade de controle da onerosidade excessiva, em cada caso concreto” (Tema n. 958/STJ). Nas negociações envolvendo veículos usados intermediadas por revendedoras, é comum que a própria empresa se responsabilize pelos trâmites administrativos necessários, inclusive pela avaliação do bem, etapa que, geralmente, integra o processo de análise para aprovação do financiamento. Contudo, a validade da cobrança por esse serviço depende da efetiva demonstração de que ele foi prestado em benefício do consumidor. Na hipótese, a tarifa de registro no valor de R$. 316,00 foi regularmente contratada e teve sua efetiva prestação comprovada, conforme demonstram os documentos anexados pela instituição financeira, extraídos do Sistema Nacional de Gravames (id. 285821855). Confirmada, portanto, a realização do registro junto ao órgão competente (id. 285821859), o que afasta a alegação de cobrança indevida ou por serviço não prestado. Ademais, o valor cobrado mostra-se compatível com a média praticada no mercado, inexistindo indício de onerosidade excessiva ou desequilíbrio contratual. No que se refere à tarifa de avaliação do bem, verifica-se que sua cobrança está expressamente prevista no contrato, no valor de R$. 599,00, devidamente financiada. Ademais, consta nos autos o documento de id. 269252817, que comprova a realização da vistoria do veículo, demonstrando a efetiva prestação do serviço. Além disso, o valor pactuado não se revela desproporcional frente ao montante financiado, não havendo nos autos elementos que evidenciem onerosidade excessiva ou ausência de contraprestação capaz de justificar sua invalidação. Dessa forma, não se vislumbra abusividade na cobrança da tarifa de registro e nem na cobrança da tarifa de cadastro, não há como excluir as verbas do valor financiado nem em recálculo das parcelas, conforme registrado na sentença. 3.Do seguro prestamista No que se refere à contratação do seguro, verifica-se que, embora haja proposta de adesão assinada (id. 285821860), o contrato não apresenta cláusula destacada que informe, de maneira clara e objetiva, que sua contratação seria facultativa. Tampouco há qualquer demonstração de que o apelante teve liberdade para escolher a seguradora de sua preferência. A contratação foi vinculada à Zurich Santander Brasil Seguros e Previdência S.A., indicada pela própria financeira, sem qualquer menção à possibilidade de contratação externa ou de escolha livre pelo consumidor. Ademais, o valor do seguro, correspondente a R$ 1.987,90, não foi previamente informado na proposta principal de financiamento, sendo financiado juntamente com o contrato, o que compromete o dever de informação previsto no artigo 6º, inciso III, do Código de Defesa do Consumidor. O Superior Tribunal de Justiça fixou a tese no Tema 972 de que “nos contratos bancários em geral, o consumidor não pode ser compelido a contratar seguro com a instituição financeira ou com seguradora por ela indicada”. Nessas circunstâncias, resta evidente a prática abusiva de venda casada, vedada pelo ordenamento jurídico. A jurisprudência deste Câmara tem reconhecido que, nessas hipóteses, configura-se a prática de venda casada: "Além de configurar a famigerada venda casada, vedada pelo art. 39, I, do CDC, a contratação compulsória do seguro retira do consumidor o direito de barganha pelo menor preço ofertado entre as seguradoras existentes no mercado. [...] O que não se admite é que se retire do consumidor o direito de escolha de qual seguradora deseja contratar." (TJMT – AC 1000943-52.2021.8.11.0108, Rel. Des. Rubens de Oliveira Santos Filho, j. 27/03/2024) DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO. CERCEAMENTO DE DEFESA. PROVA PERICIAL. PERÍCIA CONTÁBIL. INOCORRÊNCIA. MÉRITO. ABUSIVIDADES. EMPRÉSTIMO. CAPITAL DE GIRO. JUROS REMUNERATÓRIOS. DENTRO DA NORMALIDADE. CAPITALIZAÇÃO MENSAL. CONTRATADA. ENCARGOS MORATÓRIOS. JUROS REMUNERATÓRIOS FAZENDO VEZES DE COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. CUMULAÇÃO INDEVIDA. TARIFAS ADMINISTRATIVAS. ALEGAÇÃO GENÉRICA. AUSÊNCIA DE ESPECIFICAÇÃO. SEGURO PRESTAMISTA. RETIRADO O DIREITO DE ESCOLHA. RESTITUIÇÃO SIMPLES. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (...). A contratação compulsória de seguro prestamista sem a possibilidade de escolha da seguradora caracteriza venda casada, prática vedada pelo artigo 39, I, do CDC e consolidada pelo Tema 972 do STJ, impondo-se a devolução dos valores pagos. (...). A imposição de seguro prestamista sem a possibilidade de escolha da seguradora caracteriza venda casada e impõe a restituição dos valores pagos. Dispositivos relevantes citados: CPC/2015, arts. 355, I, e 370, parágrafo único; Lei nº 10.931/2004, art. 28, §1º; CDC, art. 39, I. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no AREsp nº 2.124.524/PA, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, j. 26.09.2022; STJ, REsp nº 1.061.530/RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, Segunda Seção, j. 22.10.2008; STJ, REsp nº 1.639.320/SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Segunda Seção, j. 12.12.2018; Súmulas 30, 294, 296, 382, 472, 539, 541 e 566 do STJ. (N.U 1004785-45.2024.8.11.0040, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SERLY MARCONDES ALVES, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 02/04/2025, Publicado no DJE 06/04/2025) (destaquei) Portanto, reconheço a nulidade da cláusula que impôs a contratação do seguro, no valor total de R$. 1.987,90, devendo ser devolvido, na proporção do pagamento efetuado, porquanto sua cobrança vem diluída no valor das parcelas. Quanto à restituição, ausente prova de má-fé por parte da apelada, esta deve ocorrer de forma simples, limitada ao valor efetivamente pago (R$ 1.987,90), devidamente corrigido pelo INPC desde cada desembolso e acrescido de juros de mora de 1% ao mês a partir da citação, nos termos do art. 42, parágrafo único, do CDC. 4.Da distribuição do ônus sucumbencial Considerando o parcial provimento do recurso de Apelação, com a procedência de um dos pedidos, impõe-se a adequação da distribuição das verbas sucumbenciais. Assim, diante da sucumbência recíproca, fixo as verbas sucumbenciais as partes, devendo o autor arcar com o percentual de 60% e o réu de 40%, cujos honorários advocatícios devem ser mantidos no percentual de 10% sobre o valor atualizado da causa, vedada, contudo, a compensação, nos termos do art. 85, § 14, do Código de Processo Civil. Ressalto, ainda, a suspensão da exigibilidade da obrigação imposta à parte autora, beneficiária da gratuidade da justiça, na forma do art. 98, § 3º, do mesmo diploma legal. Por fim, deixo de proceder à majoração dos honorários recursais, em atenção ao entendimento consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Tema Repetitivo nº 1.059 (REsp 1.864.633/RS), segundo o qual, em caso de provimento, ainda que parcial, do recurso, não se impõe o acréscimo previsto no art. 85, § 11, do CPC. 5.Do dispositivo Diante do exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO ao recurso de Apelação para reformar a sentença e reconhecer a nulidade da contratação do seguro prestamista, determinando a restituição simples dos valores eventualmente pagos. Redimensiono as verbas sucumbenciais, devendo o autor arcar com o percentual de 60% e o réu de 40%, observada a suspensão da exigibilidade, nos termos do art. 98, §3º, do CPC, por ser o autor beneficiário da gratuidade da justiça. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 11/06/2025

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Processo nº 1000379-60.2022.8.11.0004

ID: 319211956

Tribunal: TJMT Órgão: Segunda Câmara Criminal Classe: APELAçãO CRIMINAL Nº Processo: 1000379-60.2022.8.11.0004

Data de Disponibilização: 08/07/2025

Polo Ativo:

CLEOMAR ARAUJO MOTA

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

BLAINY DANILO MATOS BARBOSA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1000379-60.2022.8.11.0004 Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Assunto: [Uso de documento falso] Relator: Des(a). PAULO SERGIO … ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1000379-60.2022.8.11.0004 Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Assunto: [Uso de documento falso] Relator: Des(a). PAULO SERGIO CARREIRA DE SOUZA Turma Julgadora: [DES(A). PAULO SERGIO CARREIRA DE SOUZA, DES(A). RUI RAMOS RIBEIRO, DES(A). JORGE LUIZ TADEU RODRIGUES] Parte(s): [CLEOMAR ARAUJO MOTA - CPF: 240.273.671-20 (APELANTE), BLAINY DANILO MATOS BARBOSA - CPF: 903.117.791-15 (ADVOGADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (APELADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). RUI RAMOS RIBEIRO, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A Direito penal e processual penal. Apelação criminal. Uso de documento falso. Pleito de aplicação do princípio da consunção. Impossibilidade. Condutas autônomas. Uso de documento falso que não objetivava a prática exclusiva de estelionato. Readequação da pena de multa como medida de ofício. Multa que não guardou correlação com o quantum da pena privativa de liberdade. Ausência de fundamentação judicial. Desprovimento do recurso. Medida ex officio. I. Caso em exame 1. Apelação criminal interposta por Cleomar Araújo Mota contra sentença proferida pelo Juízo da Segunda Vara Criminal da Comarca de Barra do Garças, que o condenou pelo crime de uso de documento falso (art. 304 do CP). 2. O apelante pleiteia a desclassificação do delito para o crime de estelionato (art. 171 do CP), com aplicação da regra da consunção, e a consequente extinção da punibilidade pela decadência do direito de representação. II. Questões em discussão 3. A questão em discussão consiste em saber se é possível a aplicação da consunção entre o crime de uso de documento falso e o estelionato, considerando o contexto fático do caso, para fins de desclassificação da imputação e consequente extinção da punibilidade. III. Razões de decidir 4. A consunção entre o uso de documento falso e o estelionato exige que o uso do documento seja meio necessário ou fase normal de preparação para o estelionato, sem autonomia típica. 5. No caso, o uso reiterado de documentos falsos pelo apelante revela autonomia do crime de uso de documento falso em relação ao crime de estelionato, o que afasta a aplicação da consunção. 6. O apelante foi surpreendido na posse de documentos falsos antes da prática de qualquer ato consumativo do estelionato, demonstrando potencialidade lesiva independente à fé pública. 7. O Superior Tribunal de Justiça e o Tribunal de Justiça de Mato Grosso têm firme orientação no sentido de que o crime de uso de documento falso, quando não exaurido no estelionato e com potencialidade lesiva própria, deve ser punido de forma autônoma. 8. Pena de multa que deve ser readequada de ofício, por ausência de fundamentação da decisão que a fixou acima do mínimo legal. IV. Dispositivo 9. Recurso desprovido, com providência de ofício. Dispositivos relevantes citados: Código Penal, art. 171 e art. 304. Jurisprudência relevante citada: STJ, súmula n. 17, TJ-MT - Apelação Criminal: 10006386120228110002, Relator.: Helio Nishiyama. R E L A T Ó R I O Trata-se de apelação interposta em favor de Cleomar Araújo Mota, contra decisão proferida pelo Juízo da Segunda Vara Criminal da Comarca de Barra do Garças, que o condenou pelo delito descrito no art. 304, caput, do Código Penal, fixando-lhe a pena em 2 anos de reclusão (regime inicial aberto) e 30 dias-multa (sentença Id. n. 271742365). A Defesa almeja a desclassificação do delito descrito no art. 304 para o crime previsto no art. 171 do Código Penal, ao argumento de que o apelante utilizou documentos falsos com o único objetivo de praticar crime de estelionato, devendo ser aplicada a regra da consunção. Sendo acolhido o pleito antecedente, requer a declaração da extinção da punibilidade do agente, vez que o estelionato é crime que se processa mediante representação da vítima, a ser feita no prazo decadencial de 6 meses, que já se esvaiu (Id. n. 271742377). O Ministério Público, nas contrarrazões, pugnou pelo desprovimento do recurso (Id. n. 271742379). A Procuradoria-Geral de Justiça, de igual modo, opinou pelo não acolhimento das teses defensivas, em parecer assim sintetizado: “APELAÇÃO CRIMINAL – CONDENAÇÃO USO DE DOCUMENTO FALSO – RECURSO DEFENSIVO – PRETENDIDA A DESCLASSIFICAÇÃO PARA ESTELIONATO – APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO – IMPOSSIBILIDADE – CASO CONCRETO QUE NÃO PERMITE A ABSORÇÃO - POTENCIALIDADE LESIVA DO DOCUMENTO DO DOCUMENTO NÃO RESTRITA AO ESTELIONATO - PELO DESPROVIMENTO DO RECURSO.” (Id. n. 275290363). É o relatório. Remetam-se os autos à douta revisão. V O T O R E L A T O R Inicialmente, verifico que estão preenchidos os requisitos de admissibilidade recursal, daí por que conheço da apelação. Contudo, o pleito defensivo de aplicação da regra da consunção não comporta provimento. No caso em exame, o representante do Ministério Público ofereceu denúncia em desfavor do apelante pelo crime de uso de documento falso, tipificado no art. 304 do Código Penal, nestes termos: “Consta dos autos do inquérito policial incluso que, no dia 14 de fevereiro de 2018, por volta das 13:00hs, na ‘Cooperativa Sicredi’, situada na Av. Ministro João Alberto, Centro, nesta cidade, o denunciado fez uso de documento público falso. Segundo apurado, naquela ocasião fatídica, o denunciado, que estava na posse de carteiras de identidade falsas (Laudo de Exame Pericial às fls. 37/47-IP) e outros documentos em nome de Aroldo Gomes Siqueira, dirigiu-se à sede da ‘Cooperativa Sicredi’, oportunidade que fez uso daqueles documentos não autênticos, apresentando-os na mencionada agência, a fim de realizar movimentação financeira na condição de procurador da empresa ‘Rank Construtora LTDA’, na qual Aroldo Gomes figura como sócio proprietário. Com efeito, após a ciência do ocorrido, a equipe da Polícia Civil dirigiu-se ao referido local, momento que surpreendeu o denunciado na posse das carteiras de identidade falsificadas (Autos de Apreensão às fls. 28 e 29/30-IP). Por conseguinte, efetuou-se a prisão em flagrante. O denunciado, ao ser interrogado, admitiu não ter sido a primeira vez que fez uso dos documentos supracitados (fls. 10/12-IP).” (Id. n. 271741966). A materialidade delitiva é evidente, tendo em vista que o Laudo Pericial n. 300.2.09.2018.003103-01 atestou a falsidade de três documentos públicos encontrados em posse do acusado: “Assim, considerando o analisado e exposto acima, considerando as significativas divergências constatadas nos elementos de segurança das cédulas de identidade denominadas DOC01, DOC02 e DOC03, sob registro geral no 3175568, 3175568 e 317556812, respectivamente, todas em nome de Aroldo Gomes Siqueira, filiação: Joaquim Alves Siqueira e Hilda De Lima Gomes, data de Nascimento: 12/11/1983, com data de emissão em 08/03/2005, o signatário conclui que as peças questionadas DOC01, DOC02 e DOC03, apresentadas para exames são FALSAS.” (Id. n. 271741967 - Pág. 44). No que toca à alegação de absorção do crime de uso de documento falso pelo delito de estelionato, registro que, nos termos da jurisprudência consolidada, a consunção pressupõe que o uso do documento falso seja meio necessário ou fase normal de preparação do estelionato, de modo que não se possa atribuir ao uso do documento uma finalidade autônoma. Na hipótese dos autos, todavia, tal circunstância não se configura. Isso porque o conjunto probatório revela que o apelante Cleomar Araújo Mota foi preso em flagrante no interior da agência da Cooperativa Sicredi sem que tenha praticado o delito de estelionato, uma vez que o setor de prevenção da instituição financeira já monitorava sua atuação. Nesse sentido, o investigador Edsinomar Maciel Gonçalves, em sede policial, relatou que, em virtude de investigações pretéritas, já se sabia que a pessoa de Aroldo Gomes Siqueira, por quem o réu queria se passar, sequer possuía cadastro nos sistemas oficiais de identificação. Afirmou ainda que na ocasião do flagrante o próprio apelante lhe confidenciou que pretendia movimentar conta bancária da empresa “Rank Construtora Ltda.”, da qual Aroldo seria sócio, e para isso fazia uso da referida documentação: "Que é Investigador de Polícia Lotado na Delegacia de Roubos e furtos desta cidade; Que naquela unidade policial tramita investigação acerca de possível crime de uso de documento falso há cerca de quinze dias, figurando como investigado o suspeito Cleomar Araújo Mota; Que nesta data recebera informação de que o suspeito estava na posse de documentos de autenticidade duvidosa, e que ele estaria renovando um cadastro na Cooperativa Sicredi, para tanto, usando a documentação possivelmente falsa; Que juntamente com o Investigador Luciano, deslocou até o local dos fatos, onde surpreenderam o conduzido saindo da cooperativa, na posse dos seguintes documentos: 01 Cédula de Identidade; CPF; Título de Eleitor; Declaração de Imposto de Renda e duas cópias autenticadas de procuração pública, todos em nome de Aroldo Gomes Siqueira; Que em decorrências das investigações, já se tinha a informação de que tal pessoa é inexistente conforme oficio 059/2018 do Núcleo de Identificação Biométrica de Goiás, e ainda que Aroldo Gomes Siqueira não possui cadastro de identificação naquele órgão; Que ao abordarem o conduzido Cleomar, e questionar sobre tais documentos, ele disse que faz uns quatro ou cinco ano que não vê Aroldo; Cleomar ainda disse que possui negócios no ramo de construção com Aroldo, mas que tem cerca de cinco anos que não o vê; Que estava usando a documentação apresentada aos policiais para inserir o nome de Aroldo numa conta corrente na Cooperativa Sicredi onde faz movimentação bancária em nome da empresa ‘RANK CONSTRUTORA LTDA’, da qual Aroldo Gomes Siqueira é sócio proprietário e Cleomar pretendia movimentar a conta como procurador.” (Id. n. 271741967 - Pág. 6). Em juízo, Edsinomar Maciel Gonçalves reiterou a versão apresentada na fase policial: “(...) Então, com referência ao senhor Cleomar Araújo Mota, nós recebemos uma ligação pra comparecer na agência do Sicredi na ocasião dos fatos, faz tempo, eu não lembro detalhadamente como que foi, sei que ele estaria no interior da agência, para tanto usava os documentos do senhor Aroldo Gomes Siqueira para efetuar os saques de certos valores em nome da construtora Rank Construtora Limitada do qual o senhor Aroldo era sócio; eai o pessoal do banco desconfiaram que na verdade aquilo lá não tinha procedência e acionou a polícia civil. Nós chegamos no local, abordamos o senhor Cleomar, que é um senhor conhecido na cidade e acabou confessando que estava passando por um momento de aperto e para tanto tinha usado daquela artimanha para ver se conseguia sacar o dinheiro que estava na agência na cooperativa Sicredi no nome da empresa (...) Doutora, as demais investigações, porque a gente trabalha em regime de plantão, eu participei só da prisão dele, ai não sei se teve uma investigação mais aprofundada, eu sei que ele tinha conhecimento que essa empresa, não sei se ele trabalhava com essa empresa, não sei detalhar pra senhora, sei que ele tinha conhecimento que essa empresa tinha certo valor a ser sacado lá na cooperativa Sicredi (...) Doutora, tem muito tempo eu não me recordo assim, mas parece que ele portava documento de identidade e documentos da empresa, que ele tentava movimentar a conta no banco, tem muito tempo, eu não lembro detalhadamente como que foi (...) Eu conheço ele da cidade, ele é bastante conhecido na cidade, então quando a gente viu a documentação, a gente já viu que não se tratava dele, não se tratava da pessoa dele, alias (...) Não senhora, não tenho nada pra falar sobre a conduta dele, eu conheço ele da cidade, porque ele é também um construtor, trabalha no ramo de construtor, a verdade doutora é que pra mim no dia foi surpresa conhecendo ele, isso ai pra mim foi surpresa eu nunca vi nada que desabonasse a conduta dele, nunca teve passagem na polícia; na verdade assim, quando eu vi Aroldo Gomes Siqueira, ele se passando, no caso apresentando essa documentação lá, eu achei estranho porque eu conheço ele por Cleomar Araújo Mota, apelido Teté, eu até achei estranho, pois não é uma pessoa conhecida no meio policial, pelo contrário, se tratava de uma pessoa gente boa (...)”. (transcrição extraída do Id. n. 271742351 - Pág. 2) O investigador Luciano Dias Baptista, por sua vez, corroborou integralmente essa versão, reiterando que o apelante já era alvo de investigação anterior, por ter utilizado documentos falsos em outras ocasiões: "Que é Investigador de Polícia Lotado na Delegacia de Roubos e Furtos desta cidade; Que nesta data tivera conhecimento de que o suspeito estava no Banco Sicredi realizando procedimento para movimentação de conta corrente com documentação possivelmente falsa; Que deslocaram ao local juntamente com o Investigador Edsinomar, onde surpreenderam o conduzido saindo do banco Sicredi na posse da documentação apresentada, em nome de Aroldo Gomes Siqueira; Que questionado a respeito da documentação o mesmo alegou que há algum tempo trabalha com Aroldo e que ele lhe deu a procuração para movimentar a conta da empresa de Aroldo; Que já havia em andamento uma investigação acerca do suspeito com informação oficial do Estado de Goiás', de que a pessoa de Aroldo Gomes Siqueira não possui identificação biométrica naquele Estado; Que diante das evidências, o suspeito foi conduzido â presença da Autoridade Policial.” (Id. n. 271741967 - Pág. 9). Em juízo, a testemunha Airton Marcelo, funcionário da cooperativa Sicredi, confirmou que havia uma conta jurídica vinculada à empresa Rank Construtora Ltda., na qual o apelante supostamente figurava como procurador. Relatou, ainda, que o setor de prevenção da instituição identificou inconsistências entre a documentação apresentada e os dados previamente cadastrados, o que ensejou o acionamento da polícia: “Confirmou ter trabalhado na Cooperativa SICREDI e se recordar de um fato envolvendo o acusado. Que na cooperativa existia uma conta de pessoa física, em nome do acusado, bem como, uma conta de pessoa jurídica, em nome da empresa construtora: ‘RANK’, da qual o acusado era procurador. Que a área de prevenção notou divergência de dados na procuração apresentada e os que constavam na conta de pessoa jurídica. Que já havia visto o acusado na agência algumas vezes.” (mídia digital). Dessarte, não se pode afirmar que o uso do documento falso estava exclusivamente direcionado à prática de fraude contra o banco. Ao contrário, a posse daqueles documentos possibilitava ao apelante outras ações ilícitas, como movimentar contas, acessar informações bancárias privilegiadas, obter extratos financeiros da empresa ou ainda praticar diferentes fraudes patrimoniais. Em que pese a negativa do apelante durante o interrogatório judicial, verifica-se que, na fase extrajudicial, ele confessou que aquela não era a primeira ocasião em que utilizava documentos falsificados, embora não soubesse precisar quantas vezes o havia feito: "que não era a primeira vez que apresentava os documentos falsificados, já tendo feito uso em outras ocasiões, não sabendo precisar quantas vezes". (Id. n. 271741967 - Pág. 13). A propósito, a Solicitação de Prontuário Civil, acostada no Id. 271741967 (pág. 24), evidencia que o acusado já era alvo de investigação aproximadamente uma semana antes de ser preso em flagrante pelo delito ora em exame, circunstância que reforça a conclusão de que sua conduta não se restringia ao cometimento isolado de eventual estelionato. Com efeito, conclui-se que na hipótese o uso dos documentos falsos transcendeu ao mero meio de execução do crime de estelionato, assumindo relevância típica autônoma e expondo a perigo o bem jurídico protegido pelo art. 304 do Código Penal — a fé pública. Sob outra vertente, além de o uso dos documentos falsificados não se limitar à obtenção de vantagem ilícita específica, o réu atuava de forma reiterada, circunstância que extrapola o mero contexto de uma fraude pontual e compromete a fé pública de maneira ampla. A Defesa, aliás, não logrou demonstrar que a conduta imputada ao apelante — consistente na posse e apresentação reiterada de documentos inidôneos — estivesse estritamente voltada à consumação de um estelionato ou de outra fraude patrimonial específica. Nos casos em que a potencialidade lesiva sobressai à mera prática de estelionato, não se aplica a súmula n. 17, do STJ, mesmo porque, não fosse assim, o agente jamais responderia pelo delito de uso de documento falso, vez que, obviamente, a sua utilização sempre tem como finalidade a prática de outra infração, seja ela de cunho patrimonial ou não. Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça já decidiu que: "PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. ESTELIONATO E USO DE DOCUMENTO FALSOS. PRETENSÃO DE TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL POR AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. NULIDADE DA DECISÃO QUE RECEBEU A INCOATIVA. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. ALEGAÇÃO DE INÉPCIA DA DENÚNCIA. NÃO OCORRÊNCIA. ATENDIMENTO AOS REQUISITOS DO ART. 41 DO CPP. PRETENSÃO DE INCIDÊNCIA DA SÚMULA 17/STJ. IMPOSSIBILIDADE. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA DO ACÓRDÃO RECORRIDO. NECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. I - A Terceira Seção desta Corte, seguindo entendimento firmado pela Primeira Turma do col. Pretório Excelso, sedimentou orientação no sentido de não admitir habeas corpus em substituição ao recurso adequado, situação que implica o não conhecimento da impetração, ressalvados casos excepcionais em que, configurada flagrante ilegalidade apta a gerar constrangimento ilegal, seja possível a concessão da ordem de ofício. II - Inicialmente, cumpre destacar que o trancamento de investigações policiais, procedimentos investigatórios, ou mesmo da ação penal, constitui medida excepcional, justificada apenas quando comprovadas, de plano, sem necessidade de análise aprofundada de fatos e provas, a atipicidade da conduta, a existência de causas de extinção de punibilidade ou ausência de indícios mínimos de autoria ou de prova de materialidade. III - Cumpre asseverar a impossibilidade deste Sodalício analisar alegação não submetida previamente ao Tribunal a quo, sob pena de indevida supressão de instância. Dessarte, verifica-se da leitura do acórdão recorrido que a suposta nulidade da decisão que recebeu a denúncia não foi objeto de debate pela Corte de origem, o que obsta o conhecimento por este Tribunal. Precedentes. IV - Ademais, ao contrário do aventado pela defesa, não há que se falar em inépcia da denúncia, uma vez que atendeu de forma satisfatória os requisitos do art. 41 do CPP, narrando de forma a possibilitar a ampla defesa e contraditório os fatos criminosos, com todas as suas circunstâncias, a qualificação do paciente, a classificação dos crimes e rol de testemunhas. V - Lado outro, no que se refere à incidência da Súmula 17 deste Tribunal com escopo de trancar a ação penal com relação ao delito de falso previsto no art. 299 do CP, tem-se que melhor sorte não assiste ao paciente, porquanto restou suficientemente demonstrada a ausência de exaurimento deste crime em relação ao estelionato praticado em face de diversas vítimas, comportando deferência a afirmação constante do acórdão recorrido no sentido de que ‘Ou seja, exige-se que o crime de falsidade se esgote completamente, após ter sido empregado para a prática do estelionato, fato que não ocorreu nos presentes autos, como já mencionado alhures. Assim, entendo que o crime do artigo 299 do CP, no caso em epígrafe, foi praticado com desígnio autônomo, não podendo ser aplicado o princípio da consunção visto que o delito de falsidade de documento não se exauriu no crime de estelionato’ (fl. 26). VI - Quanto à suposta ausência de demonstração de não exaurimento do delito de falsidade com relação ao estelionato, a Corte de origem fez expressa referência aos termos da inicial acusatória, que teceu diversas considerações com escopo de demonstrar a impossibilidade de consunção em relação ao delito previsto no art. 299 do CP, não havendo que se falar em nulidade por excesso de linguagem, ou aos princípios da imparcialidade e acusatório, ao contrário do alegado pela defesa, somente porque não obteve a tutela jurisdicional de acordo com os seus interesses, o que foi feito de forma idônea pela Corte de origem, de acordo com os elementos constantes dos autos. VII - Por fim, importante esclarecer a impossibilidade de se percorrer todo o acervo fático-probatório nesta via estreita do writ, como forma de desconstituir as conclusões das instâncias ordinárias, soberanas na análise dos fatos e provas, providência inviável de ser realizada dentro dos estreitos limites do habeas corpus, que não admite dilação probatória e o aprofundado exame do acervo processual. Precedentes. Habeas corpus não conhecido. (STJ - HC: 748718 SE 2022/0179677-9, Data de Julgamento: 02/08/2022, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 09/08/2022).” Destaquei. No mesmo sentido, colho julgado deste Egrégio TJMT: “DIREITO PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO PÚBLICO E ESTELIONATO TENTADO. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE DO DELITO DE TENTATIVA DE ESTELIONATO, DE OFÍCIO. PRESCRIÇÃO. RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. CONDENAÇÃO POR UM SEGUNDO CRIME DE FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO PÚBLICO. PERTINÊNCIA. INAPLICABILIDADE DA SÚMULA 17 DO STJ. POTENCIALIDADE LESIVA DO FALSO QUE NÃO SE EXAURE COM A FRAUDE. PRESCRIÇÃO PELA PENA EM CONCRETO FIXADA. PUNIBILIDADE EXTINTA. RECURSO PROVIDO. (...) O princípio da consunção não se aplica quando a falsificação de documento público não se exaure na tentativa de estelionato e apresenta potencialidade lesiva para outras infrações penais. A possibilidade de utilização do documento falsificado em diferentes contextos demonstra sua independência como crime autônomo, afastando a incidência da Súmula 17 do Superior Tribunal de Justiça. Reconhecida a prática do crime de falsificação de documento público, impõe-se a condenação da ré nos termos do art. 297, caput, do Código Penal. Inobstante o provimento do pleito ministerial, considerando a pena aplicada e a menoridade relativa da ré à época dos fatos, é de se reconhecer, de forma diferida, condicionada ao trânsito em julgado deste acórdão, a prescrição retroativa da pretensão punitiva e, por conseguinte, a extinção da punibilidade pelo delito de falsificação de documento público. Recurso provido. (TJ-MT - APELAÇÃO CRIMINAL: 10006386120228110002, Relator.: HELIO NISHIYAMA, Data de Julgamento: 09/04/2025, Quarta Câmara Criminal, Data de Publicação: 11/04/2025).” Destaquei. Portanto, correta a sentença ao afastar a regra da consunção e manter a condenação pelo crime de uso de documento falso, em virtude da autonomia típica entre os delitos. Todavia, como medida ex officio, a pena de multa deve ser readequada. Verifica-se nos autos que, conquanto o Magistrado a quo tenha fixado a pena privativa de liberdade no mínimo legal (2 anos de reclusão), exasperou a pena pecuniária, fixando-a em 30 dias-multa: “O delito de uso de documento público, no caso concreto, possui pena de reclusão de 2 a 6 anos e multa. Na primeira fase da pena, atento ao artigo 59 do Código Penal, entendo que as circunstâncias judiciais são totalmente favoráveis ao réu, merecendo maior reprovabilidade do que a prevista pelo legislador. Dessa forma, fixo a pena-base em 2 anos de reclusão. Na segunda fase da pena, ausentes atenuantes e agravantes, mantenho a pena intermediária no patamar anteriormente fixado. Na terceira fase da pena, verifico que inexistem causas de aumento e diminuição. Assim, torno definitiva a pena do réu em 2 anos de reclusão e 30 dias-multa.” (Id. n. 271742365 - Pág. 6). Nos casos em que a privativa de liberdade é fixada no mínimo legal, a multa, salvo fundamentação concreta, também deve ser estabelecida no patamar mínimo (10 dias – art. 49 do CP). In casu, o Magistrado singular não justificou o recrudescimento da pena de multa acima do piso legal. A jurisprudência já consolidou a tese de que a sanção de multa deve ser proporcional à pena privativa de liberdade: “DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. ROUBO MAJORADO. ABSOLVIÇÃO. DESCLASSIFICAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. PALAVRA DA VÍTIMA. DEPOIMENTOS POLICIAIS. REDIMENSIONAMENTO DA PENA DE MULTA. NECESSIDADE DE PROPORCIONALIDADE COM A PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I. Caso em exame: Apelação criminal interposta contra sentença condenatória por roubo majorado, na qual a defesa pleiteia absolvição por insuficiência probatória ou desclassificação para furto, além do redimensionamento da pena de multa. II. Questão em discussão: A questão em discussão consiste em verificar: (i) se há provas suficientes para manter a condenação por roubo majorado; (ii) se é cabível a desclassificação para furto; e (iii) se a pena de multa aplicada é proporcional à pena privativa de liberdade. III. Razões de decidir 1. O conjunto probatório é suficiente para comprovar a prática do crime de roubo majorado, em razão da grave ameaça e do concurso de agentes, não sendo possível a desclassificação para o crime de furto simples ou furto de uso. 2. A grave ameaça foi devidamente comprovada pelos depoimentos das testemunhas e pela narrativa da vítima, que, apesar de não ouvida em juízo, teve seu depoimento corroborado pelos elementos colhidos durante a persecução penal. 3. A multa deve guardar proporcionalidade com a pena privativa de liberdade, conforme o art. 49, do Código Penal, sendo necessária sua redução para manter a coerência entre as duas sanções. IV. Dispositivo e tese: Recurso parcialmente provido para redimensionar a pena de multa, mantendo-se a condenação pela prática de roubo majorado. Tese de julgamento: ‘1. Em crimes patrimoniais, a palavra da vítima, quando corroborada por outros elementos probatórios, é suficiente para embasar a condenação. 2. Os depoimentos de policiais, quando coerentes e harmônicos com as demais provas dos autos, são válidos e possuem força probante. 3. A pena de multa deve ser proporcional à pena privativa de liberdade aplicada’. (...) (TJ-MT - APELAÇÃO CRIMINAL: 00004773420168110049, Relator.: LIDIO MODESTO DA SILVA FILHO, Data de Julgamento: 05/11/2024, Quarta Câmara Criminal, Data de Publicação: 08/11/2024).” Destaquei. Sendo assim reajusto a sanção patrimonial para 10 dias-multa, mantendo-se os demais termos da sentença. Diante do exposto, em consonância com o parecer da Procuradoria-Geral de Justiça, nego provimento ao recurso. Como providência ex officio, procedo à readequação da pena pecuniária, fixando-a em 10 (dez) dias-multa. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 01/07/2025

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