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Processo nº 1000433-24.2025.8.11.0003

ID: 312183490

Tribunal: TJMT Órgão: Primeira Turma Recursal Classe: RECURSO INOMINADO CíVEL Nº Processo: 1000433-24.2025.8.11.0003

Data de Disponibilização: 01/07/2025

Polo Ativo:

HELENA MARIA CORREA GONZALES JAIR SARTORI GONZALES

Polo Passivo:

Intimação

Advogados:

DANIELLA CRISTINA CURY GONCALVES

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA GABINETE 3. PRIMEIRA TURMA GABINETE 3. PRIMEIRA TURMA RECURSO INOMINADO (460) 1000433-24.2025.8.11.0003 RECORRENTE: HELENA MARIA CORREA GONZ… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA GABINETE 3. PRIMEIRA TURMA GABINETE 3. PRIMEIRA TURMA RECURSO INOMINADO (460) 1000433-24.2025.8.11.0003 RECORRENTE: HELENA MARIA CORREA GONZALES, JAIR SARTORI GONZALES RECORRIDO: GOL LINHAS AÉREAS S.A. Ementa: DIREITO DO CONSUMIDOR. RECURSO INOMINADO CÍVEL. CANCELAMENTO DE VOO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA COMPANHIA AÉREA. AUSÊNCIA DE PROVA IDÔNEA DE FORÇA MAIOR. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. DANOS MORAIS E MATERIAIS CONFIGURADOS. RECURSO PROVIDO. DECISÃO MONOCRÁTICA Trata-se de Recurso Inominado interposto por HELENA MARIA CORREA GONZALES e JAIR SARTORI GONZALES, no bojo da Ação de Indenização por Danos Morais e Materiais que movem em desfavor de GOL LINHAS AÉREAS S.A., em face da respeitável sentença proferida pelo Juízo do 1º Juizado Especial Cível da Comarca de Rondonópolis (ID 295794882), que julgou improcedentes os pedidos formulados na exordial. Em sua petição inicial (ID 295794391), os autores, ora Recorrentes, narram que adquiriram passagens aéreas da companhia ré para o trecho Cuiabá/MT – Porto Seguro/BA, com conexão em Guarulhos/SP, para uma viagem de férias programada para o dia 25 de outubro de 2024. Alegam que, na data do embarque, o primeiro voo foi cancelado, o que os forçou a uma espera de aproximadamente sete horas no aeroporto, culminando em uma reacomodação que resultou na chegada ao destino final com um atraso de 24 horas. Sustentam a ausência de prestação de assistência material adequada pela companhia aérea, notadamente por se tratarem de pessoas idosas. Em razão desses fatos, postularam a condenação da ré ao pagamento de indenização por danos materiais, no valor de R$ 1.734,78 (mil setecentos e trinta e quatro reais e setenta e oito centavos), referente à perda de uma diária de hotel (ID 295794399), e por danos morais, no importe de R$ 10.000,00 (dez mil reais) para cada autor. A companhia aérea Recorrida, em sua contestação (ID 295794868), arguiu, em suma, a excludente de responsabilidade por força maior, atribuindo o cancelamento do voo a condições meteorológicas adversas, e defendeu ter prestado toda a assistência material necessária. Pugnou, assim, pela improcedência total dos pedidos. O juízo a quo, na sentença guerreada (ID 295794882), acolheu a tese defensiva e julgou improcedente a pretensão autoral, fundamentando sua decisão na ocorrência de força maior, a qual teria sido comprovada pelo documento juntado pela ré e, segundo o magistrado, não impugnado especificamente pelos autores. Irresignados, os Recorrentes interpuseram o presente Recurso Inominado (ID 295794884), sustentando o equívoco da sentença ao acolher como prova idônea um documento unilateralmente produzido pela companhia aérea, desprovido de chancela oficial. Argumentam, ademais, que, mesmo diante de eventual força maior, persistiria o dever da empresa de prestar assistência material, o que não foi comprovado nos autos, configurando, portanto, a falha na prestação do serviço. Requerem, por conseguinte, a reforma integral do julgado para que seus pedidos sejam julgados procedentes. A Recorrida apresentou contrarrazões (ID 295794892), reiterando os termos de sua defesa e pugnando pela manutenção da sentença. É o relatório. Decido. VOTO Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso interposto. A matéria em debate, por sua vez, permite o julgamento monocrático, conforme faculta o artigo 932 do Código de Processo Civil, aplicado subsidiariamente ao rito dos Juizados Especiais, por se tratar de matéria com entendimento consolidado no âmbito desta Turma Recursal. A controvérsia central reside em perquirir se o cancelamento do voo contratado pelos Recorrentes, que ensejou um atraso de 24 horas para a chegada ao destino final, configura falha na prestação do serviço passível de reparação civil ou se, ao contrário, a conduta da companhia aérea estaria amparada por excludente de responsabilidade. Analiso, pois, o mérito da questão e, desde logo, adianto que a respeitável sentença merece ser integralmente reformada. I. Da Relação de Consumo e da Insuficiência da Prova de Força Maior É incontroverso que a relação jurídica estabelecida entre as partes é de consumo, regida, portanto, pelos princípios e normas do Código de Defesa do Consumidor. Nesse diapasão, a responsabilidade do fornecedor de serviços de transporte aéreo é objetiva, nos termos do artigo 14 do referido diploma legal, o que significa que o dever de indenizar independe da comprovação de culpa, bastando a demonstração do ato ilícito, do dano e do nexo de causalidade. A responsabilidade do transportador somente pode ser afastada nas hipóteses de culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro, ou, ainda, pela ocorrência de caso fortuito ou força maior, cujo ônus probatório recai sobre o fornecedor, por força do artigo 373, inciso II, do Código de Processo Civil e do artigo 14, § 3º, do CDC. No caso em tela, a Recorrida fundamenta sua defesa e o juízo de primeiro grau alicerçou sua decisão na tese de força maior, decorrente de supostas condições meteorológicas adversas. Contudo, a prova coligida aos autos para sustentar tal alegação revela-se manifestamente frágil e insuficiente. O documento apresentado no ID 295794868 (pág. 7) consiste em uma mera captura de tela de um relatório interno da própria companhia aérea, um documento produzido de forma unilateral, sem qualquer chancela, autenticação ou validação por parte de um órgão oficial de meteorologia, como o Instituto Nacional de Meteorologia (INMET) ou o Departamento de Controle do Espaço Aéreo (DECEA). Adicionalmente, a sentença recorrida parte da premissa equivocada de que os Recorrentes não teriam impugnado especificamente a existência de tais condições climáticas. Em verdade, na peça de Impugnação à Contestação (ID 295794881), os autores questionaram a validade da prova, caracterizando-a como "telas sistemáticas" e argumentando que a ocorrência de fenômenos climáticos não exclui, por si só, a responsabilidade da companhia. A impugnação, embora não negue a possibilidade de mau tempo, ataca o cerne da prova apresentada – sua validade e força probatória – o que era suficiente para transferir à Recorrida o ônus de robustecer sua alegação com documentos oficiais e idôneos, o que não ocorreu. A mera alegação de mau tempo, desacompanhada de prova oficial e inequívoca que demonstre a impossibilidade absoluta de operação, não tem o condão de configurar a excludente de responsabilidade por força maior. Tal evento, quando não devidamente comprovado como extraordinário e inevitável, enquadra-se no conceito de fortuito interno, ou seja, um risco inerente à própria atividade empresarial de transporte aéreo, cujas consequências não podem ser transferidas ao consumidor. Nesse sentido, a jurisprudência deste sodalício é firme, conforme se extrai do seguinte precedente: “A empresa aérea responde objetivamente pelos danos causados ao consumidor em razão da falha na prestação do serviço de transporte aéreo, nos termos do artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor. O atraso significativo no transporte aéreo que cause prejuízos ao consumidor configura dano moral in re ipsa, independentemente de comprovação de prejuízo específico. A mera alegação de força maior, sem prova robusta da inevitabilidade do evento, não exime a empresa aérea de sua responsabilidade pelo atraso do voo.” (TJMT, Recurso Inominado nº 1068267-84.2024.8.11.0001, Primeira Turma Recursal, Rel. Juiz Gonçalo Antunes de Barros Neto, julgado em 24/02/2025, DJE 27/02/2025) Desse modo, não tendo a Recorrida se desincumbido do ônus de comprovar a excludente de responsabilidade por meio de prova idônea, resta caracterizada a falha na prestação do serviço. II. Da Omissão no Dever de Assistência Material Ainda que se admitisse, a título de argumentação, a ocorrência de força maior, a responsabilidade da companhia aérea não estaria de todo afastada. Isso porque persiste o dever de prestar assistência material aos passageiros, conforme expressamente previsto no artigo 27 da Resolução nº 400/2016 da Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC). Tal dever compreende o fornecimento de facilidades de comunicação, alimentação e, em casos de atraso superior a quatro horas com pernoite, serviço de hospedagem e traslado. A Recorrida alega ter cumprido com tais obrigações, mas, novamente, não apresenta qualquer prova documental que corrobore sua assertiva. Não há nos autos recibos, vouchers assinados pelos passageiros ou qualquer outro documento que demonstre o efetivo fornecimento de alimentação, transporte ou hospedagem. A ausência de provas concretas, aliada à vulnerabilidade dos consumidores, que no caso são pessoas idosas, torna a falha da empresa ainda mais grave. A omissão em prestar a devida assistência material configura, por si só, um descumprimento contratual e legal, agravando os transtornos já impostos aos Recorrentes e reforçando a caracterização do ato ilícito. III. Da Configuração do Dano Material O pedido de reparação por danos materiais encontra-se devidamente comprovado nos autos. O documento de ID 295794399 demonstra a reserva e o pagamento de uma diária de hotel para a data de chegada originalmente prevista. Em decorrência direta do atraso de 24 horas, os Recorrentes foram impossibilitados de usufruir do serviço de hotelaria pelo qual pagaram, suportando um prejuízo financeiro direto no valor de R$ 1.734,78 (mil, setecentos e trinta e quatro reais e setenta e oito centavos). O nexo de causalidade entre a conduta da Recorrida (cancelamento do voo e atraso na reacomodação) e o dano patrimonial experimentado pelos Recorrentes é patente, impondo-se o dever de ressarcimento integral. IV. Da Ocorrência do Dano Moral e da Fixação do Quantum A situação vivenciada pelos Recorrentes extrapolou, em muito, a esfera do mero dissabor ou aborrecimento cotidiano. O cancelamento de um voo de férias, a longa e angustiante espera de 24 horas para chegar ao destino, a ausência de assistência adequada por parte da companhia aérea e a frustração de todo o planejamento de viagem, especialmente para um casal de idosos, são fatores que, somados, configuram um abalo moral significativo, passível de indenização. A dignidade dos consumidores foi aviltada pela desídia da Recorrida, que não apenas falhou em cumprir o contrato de transporte, mas também se omitiu no dever de mitigar os danos, deixando os passageiros em situação de vulnerabilidade e desconforto. A aflição, a angústia e o sentimento de impotência vivenciados são inegáveis e merecem reparação. Neste eito, a jurisprudência desta Turma Recursal também reconhece que: “O atraso de voo superior a quatro horas configura, por si só, falha na prestação de serviço e enseja indenização por danos morais, salvo prova de prejuízo concreto. A majoração do quantum indenizatório é devida para atender aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, além de cumprir com o caráter pedagógico e compensar a parte consumidora pelos transtornos sofridos.” (N.U 1085380-51.2024.8.11.0001, Primeira Turma Recursal, rel. Juíza Eulice Cherulli, julgado em 22/04/2025, DJE 24/04/2025) No que tange à fixação do quantum indenizatório, entendo que o valor deve atender à dupla finalidade do instituto: compensar a vítima pelos transtornos sofridos e impor uma sanção de caráter pedagógico ao ofensor, a fim de desestimular a reiteração de condutas semelhantes. Considerando as particularidades do caso concreto – o atraso considerrável, a ausência de assistência material comprovada e a condição de idosos dos Recorrentes –, bem como os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, fixo a indenização por danos morais no valor de R$ 3.000,00 (três mil reais) para cada um dos autores. DISPOSITIVO Ante o exposto, com fundamento no artigo 932 do Código de Processo Civil e na jurisprudência consolidada desta Turma Recursal, conheço do Recurso Inominado interposto e, no mérito, dou-lhe provimento para reformar integralmente a respeitável sentença de primeiro grau (ID 295794882) e, por conseguinte, julgar parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial, para o fim de: a) CONDENAR a Recorrida, GOL LINHAS AÉREAS S.A., a pagar aos Recorrentes, HELENA MARIA CORREA GONZALES e JAIR SARTORI GONZALES, a quantia de R$ 1.734,78 (mil, setecentos e trinta e quatro reais e setenta e oito centavos), a título de danos materiais, a qual deverá ser corrigida monetariamente pelo INPC a partir da data do efetivo prejuízo e acrescida de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, a contar da citação (art. 405 do Código Civil); b) CONDENAR a Recorrida, GOL LINHAS AÉREAS S.A., a pagar a cada um dos Recorrentes, HELENA MARIA CORREA GONZALES e JAIR SARTORI GONZALES, a quantia de R$ 3.000,00 (três mil reais), a título de indenização por danos morais, totalizando a importância de R$ 6.000,00 (seis mil reais), valor este que deverá ser corrigido monetariamente pelo INPC a partir da data desta decisão (Súmula 362 do STJ) e acrescido de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, a contar da citação. Sem condenação em custas e honorários advocatícios, ante o provimento do recurso, nos termos do artigo 55 da Lei nº 9.099/95. Advirto que a interposição de agravo interno manifestamente inadmissível ou infundado poderá ensejar a aplicação de multa, nos termos do art. 1.021, § 4º, do CPC. Preclusa a via recursal, certifique-se o trânsito em julgado e devolvam-se os autos ao Juízo de origem. Publique-se. Intimem-se. Cumpra-se. EDUARDO CALMON DE ALMEIDA CEZAR Juiz de Direito Relator

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Processo nº 1000433-93.2023.8.11.0035

ID: 261825540

Tribunal: TJMT Órgão: VARA ÚNICA DE ALTO GARÇAS Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1000433-93.2023.8.11.0035

Data de Disponibilização: 29/04/2025

Polo Ativo:

LINDOLFO GALDINO DE ALMEIDA

Polo Passivo:

Intimação

Advogados:

AURELIO DIAS DOS SANTOS

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WALEF CAIK CALIXTO FEITOSA

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO VARA ÚNICA DE ALTO GARÇAS SENTENÇA Processo: 1000433-93.2023.8.11.0035. Vistos. Trata-se de AÇÃO PREVIDENCIÁRIA CONCESSÃO DO BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE ajuizada… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO VARA ÚNICA DE ALTO GARÇAS SENTENÇA Processo: 1000433-93.2023.8.11.0035. Vistos. Trata-se de AÇÃO PREVIDENCIÁRIA CONCESSÃO DO BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE ajuizada por LINDOLFO GALDINO DE ALMEIDA em desfavor do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS. Narra a inicial que a requerente passou a ser assolada por problemas físicos que a impossibilitam de exercer suas atividades habituais. Alega que requereu junto à Autarquia a concessão de benefício de auxílio-doença, o qual fora deferido administrativamente, tendo percebido benefício (NB: 547.697.442-0) pelo período compreendido entre 26/08/2011 a 31/08/2011. Narra que o benefício foi cessado fundado em “alta médica programada”. Contudo, alega que a cessação do benefício se deu de forma indevida, na medida em que a parte autora não possui condições de desempenhar suas atividades habituais, em razão das patologias que lhe afetam, e que o seu estado de saúde vem se agravando com o passar dos dias. Por essa razão, pugna pela concessão do benefício de incapacidade. Com a inicial, vieram documentos. A inicial foi recebida, sendo-lhe deferida as benesses da justiça gratuita, foi determinado a citação do requerido e determinada a realização de exame médico pericial (prova pericial) (ID 115841744). Laudo pericial ao ID 130449603. Contestação ao ID 131353349. Laudo complementar ao ID 158013735. Instado, o INSS pugnou pela improcedência da ação, alegando, em síntese, ausência de período de carência (ID 161149638). Instada, a parte autora quedou-se inerte (ID 161207229). Instada sobre as provas que desejam produzir, a parte autora pugnou pelo julgamento do feito (ID 172680515 -) enquanto a Autarquia ré quedou-se inerte (ID 180384359). Vieram os autos conclusos. É a síntese do necessário. DECIDO. I. PREJUDICIAL DE MÉRITO A parte requerida, em sede de contestação arguiu a prejudicial de mérito concernente a prescrição do fundo de direto, ou seja, o reconhecimento da prescrição entre o indeferimento administrativo e a interposição de ação, nos termos do art. 1º do Decreto 20.910/32. É cediço que o indeferimento e/ou cessação de benefício previdenciário enseja lesão ao direito subjetivo do requerente, surgindo, a partir daí a pretensão de exercê-lo judicialmente, desde que, seja respeitado o prazo prescricional previsto no art. 1º decreto-lei 20.910/32. Ocorre que, conforme entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça “o direito fundamental a benefícios previdenciários não é atingido pela prescrição de fundo de direito, sendo objeto de relação de trato sucessivo e de natureza alimentar, incidindo a prescrição somente sobre as parcelas vencidas antes do quinquênio anterior à propositura da ação”. (AgInt no REsp n. 1.805.428/PB). “Diante da decisão do STF na ADI 6.096/DF, não é possível inviabilizar o próprio pedido de concessão do benefício (ou de restabelecimento) em razão do transcurso de quaisquer lapsos temporais - seja decadencial ou prescricional -, de modo que a prescrição se limita apenas às parcelas pretéritas vencidas no quinquênio que precedeu à propositura da ação, nos termos da Súmula 85/STJ”. (AgInt no REsp n. 1.805.428/PB). Deste modo, conclui-se pela não ocorrência da prescrição conforme alegado pelo requerido. Motivo pelo qual, REJEITO a prejudicial de mérito ventilada. II. MÉRITO Cuida-se de pedido para estabelecimento de auxílio-doença, alegando o(a) requerente estar acometido(a) de patologia que o(a) impede de trabalhar. O processo está em ordem, não havendo nulidades a serem sanadas ou a serem reconhecidas de ofício. Todos os pressupostos processuais de desenvolvimento válido e regular do processo se fazem presentes, assim como as condições da ação, estando o feito apto a receber um julgamento com resolução de mérito. Ingressando na análise de mérito, mister consignar que é garantido ao segurado(a) a percepção de auxílio-doença quando for impedido de trabalhar por período superior a quinze dias consecutivos em decorrência de acidente ou doença. Destarte, é necessário comprovar a condição de segurado da Previdência Social, cumprida a carência exigida e demonstrada a impossibilidade para o exercício de atividade laborativa que lhe garanta o sustento. Nesta medida, imperativo à concessão do auxílio-doença tem-se os seguintes requisitos: 1) vínculo do segurado com a Previdência Social; 2) incapacidade temporária para o trabalho; 3) carência de 12 contribuições mensais (art. 25, inciso I, da LB), à exceção dos casos de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como nos casos de segurado que, após filiar-se ao Regime Geral de Previdência Social, for acometido de alguma das doenças e afecções especificados em lista elaborada pelos Ministérios da Saúde e do Trabalho e da Previdência Social a cada 3 (três) anos, de acordo com os critérios de estigma, deformação, mutilação, deficiência, ou outro fator que lhe confira especificidade e gravidade que mereçam tratamento particularizado (art. 26, II, da LB). Na hipótese de ocorrer à cessação do recolhimento das contribuições, prevê o art. 15 da Lei nº 8.213/91 e art. 13 do Decreto n° 3.048/99 o denominado "período de graça", que permite a prorrogação da qualidade de segurado durante um determinado lapso temporal: Art. 15. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições: I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício; II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem remuneração; III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de segregação compulsória; IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso; V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para prestar serviço militar; VI - até 6 (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo. § 1º O prazo do inciso II será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já tiver pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado. § 2º Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social. § 3º Durante os prazos deste artigo, o segurado conserva todos os seus direitos perante a Previdência Social. § 4º A perda da qualidade de segurado ocorrerá no dia seguinte ao do término do prazo fixado no Plano de Custeio da Seguridade Social para recolhimento da contribuição referente ao mês imediatamente posterior ao do final dos prazos fixados neste artigo e seus parágrafos. Art. 13. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições: I - sem limite de prazo, o segurado que estiver em gozo de benefício, exceto na hipótese de auxílio-acidente; II - até doze meses após a cessação de benefício por incapacidade ou das contribuições, observado o disposto nos §7º e §8º e no art. 19-E; III - até doze meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de segregação compulsória; IV - até doze meses após o livramento, o segurado detido ou recluso; V - até três meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para prestar serviço militar; e VI - até seis meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo. §1º O prazo do inciso II será prorrogado para até vinte e quatro meses, se o segurado já tiver pago mais de cento e vinte contribuições mensais sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado. §2º O prazo do inciso II ou do § 1º será acrescido de doze meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação por registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e Emprego. §3º Durante os prazos deste artigo, o segurado conserva todos os seus direitos perante a previdência social. §4º Aplica-se o disposto no inciso II do caput e no §1º ao segurado que se desvincular de regime próprio de previdência social. §5º A perda da qualidade de segurado não será considerada para a concessão das aposentadorias por tempo de contribuição e especial. §6º Aplica-se o disposto no § 5º à aposentadoria por idade, desde que o segurado conte com, no mínimo, o número de contribuições mensais exigido para efeito de carência na data do requerimento do benefício. §7º Para o contribuinte individual, o período de manutenção da qualidade de segurado inicia-se no primeiro dia do mês subsequente ao da última contribuição com valor igual ou superior ao salário-mínimo. §8º O segurado que receber remuneração inferior ao limite mínimo mensal do salário de contribuição somente manterá a qualidade de segurado se efetuar os ajustes de complementação, utilização e agrupamento a que se referem o §1º do art. 19-E e o §27-A do art. 216. A concessão do benefício de auxílio-doença pressupõe a averiguação da incapacidade para o exercício de atividade que garanta a subsistência do segurado, e terá vigência enquanto o segurado permanecer nessa condição. A incapacidade é verificada mediante exame médico-pericial a cargo da Previdência Social, podendo o segurado, às suas expensas, fazer-se acompanhar de médico de sua confiança. Dispõe, outrossim, a Lei 8.213/91 que a doença ou lesão de que o segurado já era portador ao filiar-se ao Regime Geral de Previdência Social não lhe conferirá direito ao benefício, salvo quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento da doença ou lesão. Em análise ao caso concreto, verifica-se que o autor alega ser portador de Fratura da Perna, Incluindo Tornozelo (CID 10 S82) e Sequelas de Traumatismos do Membro Inferior (CID 10 T93). Narra que devido as enfermidades que o acometem se encontra incapacitado para exercer sua atividade laboral. À vista disso, requereu junto à Autarquia a concessão de benefício de auxílio-doença, o qual fora deferido administrativamente, tendo percebido benefício (NB: 547.697.442-0) pelo período compreendido entre 26/08/2011 a 31/08/2011. Narra que o benefício foi cessado fundado em “alta médica programada”. Contudo, alega que a cessação do benefício se deu de forma indevida. É cediço que o Poder Judiciário não se encontra vinculado às razões que levaram a Administração a recusar pedidos de concessão/reestabelecimento de benefícios, considerando que existem outros requisitos legais a serem preenchidos para que o indivíduo faça jus à concessão de benefícios previdenciários. Conforme alhures mencionado, para concessão do referido benefício é necessário o preenchimento dos seguintes requisitos: 1) qualidade de segurado; 2) incapacidade temporária para o trabalho; 3) carência de 12 contribuições mensais (art. 25, inciso I, da LB). Passamos a análise dos requisitos: Quanto à incapacidade para o trabalho, analisando a prova pericial, observa-se que o “expert” asseverou no laudo pericial que o autor foi submetido a perícia a qual concluiu que possuí patologia de artrose pós-traumática - M 19.1 com limitação parcial e permanente para as atividades laborais (ID 130449603). É sabido que o Magistrado não está adstrito ao laudo pericial, exercendo o livre convencimento, contudo, ele constitui ferramenta fundamental para reconhecer a existência ou não de incapacidade. Todavia, referida prova não possui condão de valor absoluto, sendo possível afastá-la, fundamentadamente, caso uma das partes apresente elementos consistentes que possam conduzir o Juízo de convicção diversa ao da conclusão do perito judicial, ou ainda, se apesar da conclusão, a própria perícia traga elementos que a contradigam. No presente, o laudo pericial concluiu que a parte autora encontra-se parcialmente e permanentemente incapaz para as atividades que exijam médios e grandes esforços, inclusive para a atividade habitual exercida pelo requerente. Conforme alhures mencionado, em processo desta natureza o julgador firma sua convicção, usualmente, com base no laudo técnico, muito embora não esteja adstrito a ele. Para afastar o laudo seria necessário um arcabouço probatório robusto, haja vista tratar-se de profissional com conhecimento técnico necessário à solução da controvérsia, tratando-se de pessoa imparcial e com maior credibilidade para a análise das condições laborais da parte autora. Outrossim, cumpre ressaltar que o fato de alguém ser portador de alguma lesão/doença, ainda que grave, não necessariamente o torna incapaz de exercer alguma atividade laborativa que lhe proporcione subsistência. Quanto à qualidade de segurado e ao período de carência. Infere-se dos autos que que a parte autora, quando do surgimento da incapacidade para o trabalho (DII 12/2022), foi admitida no RGPS como contribuinte individual, na competência de 01/2022, realizando o primeiro recolhimento em 24/06/2022 e afetou o pagamento de mais 11 contribuições ao sistema previdenciário (período 02/2022 a 12/2022). Em manifestação, a Autarquia ré alegou que a parte autora efetuou somente um pagamento de contribuição dentro do prazo legal, qual seja, o mês 12 de 2022. Alega que o recolhimento das demais contribuições no período de 01/2022 a 11/2022 se deram em atraso, porquanto os pagamentos dos meses de 01 a 05 de 2022, foram efetuados em 24/06/2022, dos meses de 06 a 09 de 2022 foram efetuados em 01/11/2022, dos meses 10 e 11 de 2022 foram efetuados em 17/11/2022. À vista disso, alega que não podem ser consideradas contribuições em atraso para cômputo do período de carência. Pois bem. O art. 27, inciso II, da Lei nº 8.213/91 dispõe que serão consideradas para efeito de carência as contribuições “realizadas a contar da data de efetivo pagamento da primeira contribuição sem atraso”. A Turma Nacional de Uniformização ao julgar o Tema Representativo nº 192, fixou a seguinte tese: “Contribuinte individual. Recolhimento com atraso das contribuições posteriores ao pagamento da primeira contribuição sem atraso. Perda da qualidade de segurado. Impossibilidade de cômputos das contribuições recolhidas com atraso relativas ao período entre a perda da qualidade de segurado e a sua reaquisição para efeito de carência.”. Nesta linha, tem-se que o pagamento das contribuições em atraso devem ocorrer dentro do período de qualidade de segurado. Dessa forma, verifica-se que no presente, a parte autora não detém qualidade de segurada, na medida em que, embora tenha vertido contribuições das competências dos meses de 01 a 11 de 2022, em 24/06/2022, data do pagamento das parcelas atrasadas dos meses 01 a 05 de 2022; na data de 01/11/2022, data do pagamento das parcelas atrasadas dos meses 06 a 09 de 2022 e na data de 17/11/2022, data do pagamento das parcelas atrasadas dos meses 10 e 11 de 2022, o requerente não possuía qualidade de segurado, de modo que o pagamento em atraso deveria ter ocorrido dentro do período de carência, que se deu até 02/2022, porquanto a última contribuição constante no CNIS, anterior ao período de 01 a 12/2022, se deu em 02/2021 (ID 115326291 - Pág. 9). Frisa-se, que embora o autor tenha efetuado o pagamento da competência de 02/2022, infere-se que essa se deu em atraso, em 24/06/2022, ou seja, após a perda da qualidade segurado. À vista disso, o pagamento em atraso do período de 01 a 11 de 2022 não surtirá efeito para carência, apenas tempo de contribuição. Portanto, uma vez ausente a qualidade de segurado, o que consequentemente acarreta o não cumprimento de todos os requisitos exigidos para concessão do benefício (art. 59 da Lei n.º 8.213/91), o indeferimento é medida que se impõe. Diante do exposto, JULGO IMPROCEDENTE os pedidos constantes na exordial, e por conseguinte, DECLARO o feito EXTINTO COM RESOLUÇÃO DO MÉRITO, de acordo do art. 487, inciso I, do CPC. Condeno a parte autora (art. 91, caput, CPC) no pagamento das taxas, custas e despesas do processo existentes e, com fulcro na isonomia, honorários advocatícios (art. 85, caput, CPC) fixados em 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a sentença, em tese e caso reconhecido o direito/benefício econômico pretendido, até a prolação desta sentença, nos termos do Enunciado n. 111 da Súmula do STJ, cuja exigibilidade permanecerá suspensa e somente poderão ser executadas se, nos 5 (cinco) anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que as certificou, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade, extinguindo-se, passado esse prazo, tais obrigações do beneficiário, em decorrência da concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita (art. 98, § 2º e 3º). Requisite-se o pagamento dos honorários periciais pelo Sistema da AJG, acaso não tenha sido feito. A sentença não está sujeita a recurso necessário, por força do disposto no § 3º, I, do artigo 496 do CPC. Havendo recurso de apelação, INTIME-SE a parte adversa para apresentar contraminuta, após proceda à remessa dos autos ao E. TRF1. Com o trânsito em julgado devidamente certifico, e nada requerido, ARQUIVE-SE os autos, autos com as baixas e anotações de estilo. Prescindível o registro da sentença, nos termos do artigo 317, § 4º, da Consolidação das Normas da Corregedoria-Geral de Justiça – CNGC. PUBLIQUE-SE. REGISTRE-SE. INTIMEM-SE. CUMPRA-SE, expedindo-se o necessário. Às providências. Alto Garças/MT, 23 de abril de 2025. Luiz Antônio Muniz Rocha Juiz de Direito

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Processo nº 1001322-50.2024.8.11.0055

ID: 292338545

Tribunal: TJMT Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1001322-50.2024.8.11.0055

Data de Disponibilização: 09/06/2025

Polo Ativo:

AYMORE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. KADOSH AUTOMOVEIS LTDA

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

RAILTON FERREIRA DE AMORIM

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

HERICK PAVIN

OAB/PR XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1001322-50.2024.8.11.0055 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Compra e Venda, Rescisão do contrato e devolução… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1001322-50.2024.8.11.0055 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Compra e Venda, Rescisão do contrato e devolução do dinheiro, Indenização por Dano Moral, Financiamento de Produto, Efeitos] Relator: Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA Turma Julgadora: [DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES] Parte(s): [VALDNEY CLOVALSKY - CPF: 865.903.591-72 (APELADO), JULIA DALLA ROSA BITTENCOURT - CPF: 037.549.121-00 (ADVOGADO), KADOSH AUTOMOVEIS LTDA - CNPJ: 33.603.422/0001-00 (APELANTE), RAILTON FERREIRA DE AMORIM - CPF: 019.973.051-27 (ADVOGADO), LUIZ FELIPE MARTINS DE ARRUDA - CPF: 014.598.251-36 (ADVOGADO), AYMORE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. - CNPJ: 07.707.650/0001-10 (APELANTE), HERICK PAVIN - CPF: 035.679.869-02 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A APELANTE(S): KADOSH AUTOMOVEIS LTDA e AYMORE CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. APELADO(S): VALDNEY CLOVALSKY. EMENTA: DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. PRELIMINAR. NULIDADE DE SENTENÇA POR CERCEAMENTO DE DEFESA REJEITADO. MÉRITO. COMPRA DE VEÍCULO COM VÍCIO NÃO SANADO. REITERADAS TENTATIVAS ADMINISTRATIVAS DE SOLUÇÃO. INDENIZAÇÃO MANTIDA. DEVOLUÇÃO DO VALOR PAGO. RECURSO DE AYMORE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. NÃO CONHECIDO. RECURSO DE KADOSH AUTOMOVEIS LTDA DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME Apelação cível interposta contra sentença que julgou parcialmente procedente ação de rescisão contratual cumulada com indenização por danos materiais e morais, em razão de vício oculto não sanado em veículo adquirido, condenando a fornecedora à restituição integral dos valores pagos e ao pagamento de compensação por danos morais. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há cinco questões em discussão: (i) saber se houve cerceamento de defesa pela ausência de instrução probatória; (ii) saber se estão presentes os requisitos para rescisão do contrato de compra e venda por vício do produto; (iii) saber se é devida a restituição integral dos valores pagos; (iv) saber se é cabível a indenização por danos morais; e (v) saber se o valor fixado para os danos morais é proporcional e razoável. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. O julgamento antecipado da lide é válido quando os elementos constantes dos autos são suficientes à formação do convencimento judicial, inexistindo cerceamento de defesa. 4. Comprovada a persistência de vícios não sanados no prazo legal, é legítima a rescisão contratual, com devolução dos valores pagos, conforme prevê o art. 18, § 1º, II, do CDC. 5. A frustração legítima do consumidor, diante da ineficácia da assistência técnica e da reiterada tentativa de solução administrativa, configura abalo moral indenizável. 6. O valor fixado a título de dano moral atende aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade, cumprindo função compensatória e pedagógica. 7. Recurso da instituição financeira não conhecido por ausência de interesse recursal, diante do reconhecimento de ilegitimidade passiva em primeira instância. IV. DISPOSITIVO E TESE 8. Recursos conhecidos parcialmente e, na parte conhecida, desprovidos. Tese de julgamento: "1. O julgamento antecipado da lide não configura cerceamento de defesa quando o conjunto probatório é suficiente para o deslinde da causa. 2. O fornecedor responde objetivamente por vícios do produto que o tornam impróprio ao uso, sendo cabível a rescisão contratual e restituição dos valores pagos quando não sanado o defeito no prazo legal. 3. A falha reiterada na prestação do serviço e a frustração do consumidor caracterizam dano moral indenizável." Dispositivos relevantes citados: CDC, arts. 6º, VI; 14; 18, § 1º, II; CC, art. 884. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no AREsp 1.096.303/SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 4ª Turma, DJe 29.08.2017; TJMT, N.U 1004622-65.2024.8.11.0040, Rel. Des. Marcos Regenold Fernandes, j. 04.02.2025. R E L A T Ó R I O RELATÓRIO EXMO. SR. DES. SEBASTIÃO DE ARRUDA ALMEIDA. Egrégia Câmara: Trata-se de Recurso de Apelação Cível tirado contra sentença proferida pelo Juízo da 5ª Vara Cível da Comarca de Tangará da Serra que julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais, declarando a rescisão do contrato de compra e venda do veículo. Na mesma oportunidade, condenou a requerida KADOSH AUTOMÓVEIS LTDA. à restituição do valor de R$ 45.744,07 (quarenta e cinco mil, setecentos e quarenta e quatro reais e sete centavos), bem como ao pagamento de indenização por danos morais no montante de R$ 6.000,00 (seis mil reais), em razão de defeito (vício) apresentado no veículo adquirido pelo apelado, dentro do prazo de garantia contratual, não sanado no prazo legal pela recorrida. Por fim, acolheu a tese suscitada pela apelante AYMORE CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A., reconhecendo sua ilegitimidade passiva “ad causam”. Em suas razões recursais a parte apelante invoca os seguintes argumentos fático-jurídicos: 1. Preliminar arguida pela parte apelante KADOSH AUTOMOVEIS LTDA. 1.1. Da nulidade de sentença por cerceamento de defesa – Prova testemunhal. 2. Das razões recursais da parte apelante KADOSH AUTOMOVEIS LTDA. 2.1. Da falta de responsabilidade civil – Ausência de motivos para rescisão contratual. 2.2. Desnecessidade de devolução dos valores. 2.3. Da vistoria prévia e da concretização do negócio. 2.4. Da inexistência de provas do alegado dano moral. 2.5. Do combate ao valor indenizatório a título de danos morais. 3. Das razões recursais da parte apelante AYMORE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. 3.1. Da ilegitimidade passiva da instituição financeira. 3.2. Da inexistência de responsabilidade da instituição financeira apelante. 3.3. Da inexistência dos danos morais. 3.4. Do combate ao valor indenizatório a título de danos morais. A partes apelada VALDNEY CLOVALSKY apresentou suas contrarrazões (ID. 286616961 e 286616960), rebatendo as alegações das apelantes, e defendendo o desprovimento recursal. É o relatório. Sebastião de Arruda Almeida Desembargador Relator V O T O R E L A T O R APELANTE(S): KADOSH AUTOMOVEIS LTDA e AYMORE CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. APELADO(S): VALDNEY CLOVALSKY. VOTO Egrégia Câmara: De proêmio, consigno que o presente comporta juízo de admissibilidade positivo, em relação aos requisitos extrínsecos e intrínsecos da espécie recursal. Reitero que se trata de recurso de Apelação Cível tirado contra sentença proferida pelo Juízo da 5ª Vara Cível da Comarca de Tangará da Serra que julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais, declarando a rescisão do contrato de compra e venda do veículo. Na mesma oportunidade, condenou a requerida KADOSH AUTOMÓVEIS LTDA. à restituição do valor de R$ 45.744,07 (quarenta e cinco mil, setecentos e quarenta e quatro reais e sete centavos), bem como ao pagamento de indenização por danos morais no montante de R$ 6.000,00 (seis mil reais), em razão de defeito (vício) apresentado no veículo adquirido pelo apelado, dentro do prazo de garantia contratual, não sanado no prazo legal pela recorrida. Por fim, acolheu a tese suscitada pela apelante AYMORE CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A., reconhecendo sua ilegitimidade passiva “ad causam”. VOTO-PRELIMINAR 1. Preliminar arguida pela parte apelante KADOSH AUTOMOVEIS LTDA. 1.1. Da nulidade de sentença por cerceamento de defesa. A Apelante sustenta a preliminar de cerceamento de defesa, alegando que o juízo de origem afastou a necessidade de realização de audiência de instrução e julgamento para a colheita do depoimento de supostas testemunhas da parte apelante, o qual, segundo afirma, seria essencial para comprovar os fatos narrados. Todavia, ao analisar os autos, entendo que essa preliminar não merece acolhimento. Isso porque os elementos probatórios já apresentados pelas partes mostram-se suficientes para a análise da controvérsia, não havendo necessidade de produção de prova oral, como requerido. Segundo a Apelante, o depoimento de testemunhas da parte requerente esclareceria com exatidão os fatos narrados no processo. No entanto, conforme já mencionado, a demanda em questão é eminentemente documental, tornando desnecessária a realização de audiência apenas para reiterar argumentos já constantes dos autos. De mais a mais, sabe-se que de acordo com o artigo 355, caput e inciso I, do Código de Processo Civil, o juiz julgará antecipadamente o pedido, proferindo sentença com resolução de mérito, quando não houver necessidade de produção de outras provas. Segundo o princípio do livre convencimento motivado, o juiz é livre na pesquisa da prova, podendo, dentro da linha de seu raciocínio, emprestar o valor que entender devido a cada uma das provas produzidas, desde que o faça motivadamente, demonstrando as razões de seu convencimento. Dessa forma, cabe-lhe determinar as provas necessárias à instrução do feito, "indeferindo as diligências inúteis ou meramente protelatórias" (art. 370, parágrafo único, do CPC). Sobre o tema, Marinoni, Arenhart e Mitidiero ensinam que: "Diligências inúteis são aquelas que nada podem adiantar a quem as requereu. Meramente protelatórias são as diligências que têm por único fito atrasar o desenvolvimento do processo. Umas e outras podem ser indeferidas pelo juiz. (...) A prova é inadmissível tão somente se impertinente, irrelevante ou incontroversa a alegação de fato a provar." (In: Código de Processo Civil comentado. 5 ed. Ver.,atualizada e ampl. - São Paulo: Thomson Reuters, 2019, p. 500). Anota-se que é firme o entendimento quanto à desnecessidade de produção de novas provas ou alegações em juízo, quando as já juntadas aos autos se mostram suficientes para o convencimento do prolator da sentença. Só ao Juiz diretor do processo cabe avaliar a necessidade ou não de novas provas, não configurando, portanto, cerceamento de defesa a sua não produção. Desta forma, compete ao juiz decidir antecipadamente a lide sempre que entender presentes as provas necessárias para formar seu convencimento, mormente quando o processo tenha sido instruído com documentos suficientes para embasá-lo. O Superior Tribunal de Justiça já resolveu neste sentido: “Constantes dos autos elementos de prova documental suficientes para formar o convencimento do julgador, inocorre cerceamento de defesa se julgada antecipadamente a controvérsia.” (STJ – 4ª Turma – Agravo 14.952-DF-AgRg – Relator Ministro Sálvio de Figueiredo) Descabe, ainda, afirmar que a sentença é contraditória, uma vez que, ao examinar o conjunto probatório, entendeu suficientes para basear o seu livre convencimento e realizar a análise do direito, ainda que as provas produzidas nos autos não se mostrem suficientes para comprovar a legalidade alegada em peça contestatória. Portanto, rejeito a preliminar cerceamento de defesa. É como voto. VOTO-MÉRITO 2. Das razões recursais da parte apelante KADOSH AUTOMOVEIS LTDA. 2.1. Da falta de responsabilidade civil – Ausência de motivos para rescisão contratual. Versam os autos sobre ação de rescisão contratual cumulada com pedido de restituição de valores e indenização por danos morais, fundada na aquisição de veículo automotor que apresentou vícios logo após sua entrega, vícios esses graves e persistentes, que tornaram o bem absolutamente inidôneo ao uso, nos termos do artigo 18 do Código de Defesa do Consumidor. Compulsando os autos, verifica-se que os elementos probatórios constantes nos autos – especialmente o serviço de Raster emitidos por oficinas especializadas (ID 286616875; 286616873) e as comunicações entre as partes – permitem afirmar, com o grau de certeza exigido para o julgamento da causa, que os defeitos não eram perceptíveis ao consumidor médio no momento da contratação, tomando conhecimento somente após o recebimento e uso do veículo pela parte apelada. Extrai-se dos autos que, três dias após a entrega do veículo ao adquirente, ora apelado, a camionete Mitsubishi L200 Triton Flex apresentou defeito que ocasionou vazamento de óleo do motor e do cabeçote. Posteriormente, diante da ocorrência de novos defeitos, a parte apelada, em 10/05/2023, encaminhou novamente a camionete à empresa apelante. Todavia, mesmo após reclamações formuladas junto ao PROCON, o problema não foi sanado. Ressalte-se que, embora a parte apelante tenha informado, em sua defesa apresentada perante o PROCON, que o veículo estaria à disposição do consumidor, não há nos autos elementos que demonstrem que o defeito, de fato, tenha sido efetivamente sanado. Assim, verifica-se que, mesmo após as tentativas de reparo efetuadas, o problema não foi resolvido de forma definitiva, o que demonstra ineficácia da assistência prestada e a persistência da inaptidão do bem à sua destinação natural. Nesse sentido, aplica-se a sistemática do artigo 18, §1º, do CDC, o qual faculta ao consumidor, diante do insucesso da reparação, a rescisão contratual com restituição integral dos valores pagos, senão vejamos: Art. 18. Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com a indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas. § 1° Não sendo o vício sanado no prazo máximo de trinta dias, pode o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha: I - a substituição do produto por outro da mesma espécie, em perfeitas condições de uso; II - a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos; III - o abatimento proporcional do preço. (g.n.) Consoante o tema retratado nos autos, assim se manifesta a jurisprudência caseira: DIREITO DO CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL. RECURSOS DE APELAÇÃO. RESCISÃO CONTRATUAL. COMPRA E VENDA DE VEÍCULO USADO COM VÍCIO OCULTO. FINANCIAMENTO ATRELADO. RESPONSABILIDADE DO FORNECEDOR E DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. DANOS MORAIS. PRELIMINARES AFASTADAS. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. RECURSOS DESPROVIDOS. I. Caso em exame 1. Apelações interpostas pelo Banco Pan S/A e por Willian Dias Canhamero contra sentença que julgou procedente ação de rescisão contratual c/c pedido de indenização por danos morais, determinando a devolução do veículo ao vendedor, a restituição do valor correspondente à motocicleta entregue na negociação e o pagamento de indenização por danos morais à consumidora. II. Questão em discussão 2. Há três questões em discussão: (i) a legitimidade passiva do banco financiador no caso de rescisão do contrato principal de compra e venda do veículo; (ii) a alegação de cerceamento de defesa por ausência de produção de provas essenciais ao julgamento da causa; e (iii) a responsabilidade do fornecedor e do banco pela devolução dos valores pagos e pelo pagamento de danos morais. III. Razões de decidir 3. O julgamento antecipado da lide é válido quando o conjunto probatório dos autos se mostra suficiente para o deslinde da controvérsia, não configurando cerceamento de defesa a ausência de outras provas se o magistrado, fundamentadamente, considera desnecessária sua produção. 4. O contrato de financiamento é coligado ao contrato de compra e venda, de modo que a rescisão deste implica a inexigibilidade daquele, sendo o banco parte legítima para figurar no polo passivo da demanda. 5. O fornecedor responde pelos vícios ocultos do produto, nos termos do art. 18 do Código de Defesa do Consumidor, cabendo ao consumidor exigir a substituição do bem ou a devolução dos valores pagos quando o defeito não é sanado no prazo legal. 6. O descumprimento do dever de reparar os vícios apresentados pelo veículo adquirido, aliado à frustração legítima da consumidora, configura dano moral indenizável. IV. Dispositivo e tese Recursos desprovidos. Tese de julgamento: 1. O julgamento antecipado da lide não configura cerceamento de defesa quando o conjunto probatório existente nos autos é suficiente para o deslinde da causa. 2. O fornecedor responde pelos vícios ocultos do produto e deve restituir os valores pagos pelo consumidor quando o defeito não é sanado no prazo legal. 3. O contrato de financiamento vinculado à compra e venda de veículo apresenta caráter acessório, de modo que a rescisão do contrato principal implica a inexigibilidade do contrato de crédito. 4. O descaso do fornecedor em reparar defeitos do produto e a consequente frustração do consumidor configuram dano moral indenizável. Dispositivos relevantes citados: CDC, arts. 6º, VI e VIII, 7º, 18 e 54-F; CPC, arts. 355, I, 370, 371, 373, 487, I, e 85, § 11. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no AREsp 1.096.303/SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 4ª Turma, DJe 29/08/2017; TJMT, N.U 1015522-58.2023.8.11.0003, Rel. Des. Guiomar Teodoro Borges, 4ª Câmara de Direito Privado, j. 02/10/2024; TJMT, N.U 1001428-95.2022.8.11.0050, Rel. Des. Carlos Alberto Alves da Rocha, 3ª Câmara de Direito Privado, j. 06/11/2024. (N.U 1004622-65.2024.8.11.0040, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARCOS REGENOLD FERNANDES, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 04/02/2025, Publicado no DJE 07/02/2025) (g.n.) Ementa: DIREITO DO CONSUMIDOR. RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO INDENIZATÓRIA DE DANOS MATERIAIS C/C COMPENSATÓRIA DE DANOS MORAIS. PRODUTO COM DEFEITO. SUBSTITUIÇÃO INEFICAZ. VÍCIOS RECORRENTES NÃO SANADOS. RESTITUIÇÃO INTEGRAL DO VALOR PAGO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS MAJORADA. PROVIMENTO PARCIAL. I. CASO EM EXAME 1. Recurso de Apelação Cível interposto por Marcela Nunes contra sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de Barra do Garças, que julgou procedente a ação indenizatória contra Loja Electrolux Comércio Virtual de Eletrodomésticos Ltda e Magazine Luiza S/A, condenando-as ao pagamento de R$ 3.000,00 por danos morais e R$ 220,00 por danos materiais. A autora busca a restituição integral do valor pago pelo produto defeituoso (R$ 2.159,10) e a majoração da indenização por danos morais para R$ 21.591,00. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (i) Definir se a parte apelante tem direito à restituição integral do valor pago pelo produto defeituoso, conforme previsto no art. 18, § 1º, II, do Código de Defesa do Consumidor; (ii) Estabelecer se o montante fixado para indenização por danos morais deve ser majorado em razão dos transtornos experimentados pela consumidora. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. O art. 18, § 1º, II, do Código de Defesa do Consumidor assegura ao consumidor o direito de optar pela restituição integral do valor pago quando o vício do produto não é sanado no prazo máximo de 30 dias. 4. Restou demonstrado que o produto adquirido apresentou defeitos sucessivos, mesmo após tentativas de reparo e substituição, caracterizando a ineficácia das medidas adotadas pelas fornecedoras. 5. O princípio da vulnerabilidade do consumidor (art. 4º, I, do CDC) e o direito à reparação de danos (art. 6º, VI, do CDC) exigem que o fornecedor adote providências eficazes para sanar os vícios ou restituir integralmente o valor pago. 6. A responsabilidade objetiva do fornecedor, prevista no art. 14 do CDC, prescinde de comprovação de culpa e impõe o ressarcimento quando o produto não atende às condições adequadas de qualidade e segurança. 7. Considerando os transtornos ocasionados pela falha reiterada na prestação do serviço e o descaso das fornecedoras, o valor fixado para a indenização por danos morais (R$ 3.000,00) mostra-se insuficiente, devendo ser majorado para R$ 5.000,00. 8. A quantificação do dano moral deve observar os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, visando compensar o sofrimento da parte autora e desestimular condutas semelhantes por parte das fornecedoras. IV. DISPOSITIVO E TESE 9. Recurso provido em parte. Tese de julgamento: 1. O consumidor tem direito à restituição integral do valor pago quando o vício do produto não é sanado no prazo legal de 30 dias, conforme previsto no art. 18, § 1º, II, do Código de Defesa do Consumidor. 2. O valor da indenização por danos morais deve ser fixado com base nos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, considerando a extensão do dano e a conduta das fornecedoras. Dispositivos relevantes citados: CDC, arts. 4º, I; 6º, VI; 14; 18, § 1º, II; Constituição Federal, art. 5º, V e X. Jurisprudência relevante citada: TJMT, Apelação Cível nº 1000560-27.2023.8.11.0004, Rel. Des. RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, Quarta Câmara de Direito Privado, j. 28/02/2025. (N.U 1000433-89.2023.8.11.0004, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARCIO VIDAL, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 01/04/2025, Publicado no DJE 04/04/2025) (g.n.) Desse modo, entendo que a tese jurídica sustentada pela parte apelante deve ser rejeitada, na medida em que o vício apresentado no veículo não foi sanado no prazo legal. Ademais, não tendo a empresa apelante procedido à substituição do bem ou à restituição do valor pago, resta caracterizada a falha na prestação do serviço, razão pela qual deve ser mantida a sentença objurgada. 2.2. Da inexistência de provas do alegado dano moral. Neste ponto recursal, entendo que não assiste razão a parte apelante, isto porque, o dano moral aqui debatido decorre do defeito não sanado pela revenda de automóveis, bem como, das reiteradas tentativas infrutíferas do consumidor em solucionar o problema na esfera administrativa, fato que, sem dúvida, gera desconforto, aflição e transtornos e, tem a extensão suficiente para configurar o dano moral. Imperioso destacar, também, que o deslinde da questão fático-jurídica aqui registrada passa pela responsabilidade civil do fornecedor que, em casos tais, é objetiva, em face da sua condição de prestador de serviços que lhe impõe o dever de zelar pela perfeita qualidade do serviço prestado, em conformidade com os ditames do art. 14, “caput”, do Código de Defesa do Consumidor, senão vejamos: Art. 14. O fornecedor de serviços responde independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. Por isso, diante da falha na prestação dos serviços, penso que inegavelmente, trouxe desgaste emocional e prejuízos de ordem moral à parte recorrente, indenizáveis, portanto. 2.3. Do combate ao valor indenizatório a título de danos morais. Neste ponto recursal, entendo ser razoável a estipulação da quantia de R$ 6.000,00 (seis mil reais), a título de indenização por danos morais sofridos pela parte recorrente, atendendo-se assim, ao binômio jurídico da reparabilidade do dano experimentado e o efeito pedagógico a ser imposto à parte recorrida, sem descurar das condições pessoais e financeiras das partes litigantes. 2.4. Desnecessidade de devolução dos valores. A tese recursal em análise não merece prosperar, uma vez que restou comprovada, nos autos, a falha na prestação do serviço, consubstanciada no defeito não sanado pela parte apelante. Assim, tendo a parte apelante recebido valores como forma de pagamento pelo veículo defeituoso, impõe-se a devolução dos montantes pagos (ID 286615987; ID 286615986), diante da resolução do negócio jurídico, sob pena de enriquecimento sem causa, nos termos do art. 884 do Código Civil. Dessa forma, rejeito a pretensão recursal, devendo ser mantida a r. sentença. 3. Das razões recursais da parte apelante AYMORE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. O recurso interposto pela parte ora apelante não deve ser conhecido, por lhe faltar interesse de agir, uma vez que, na sentença proferida pelo juízo a quo, foi reconhecida a ilegitimidade passiva ad causam da instituição financeira, ora apelante. Desse modo, falta à parte excluída da lide interesse recursal, por não ter sido vencida na demanda. Não possui interesse em recorrer a parte que não sofreu os efeitos da sentença, tampouco foi condenada. Conclusão Por essas razões, não conheço do recurso de AYMORE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. e conheço do recurso de KADOSH AUTOMOVEIS LTDA e NEGO-LHE PROVIMENTO, mantendo-se, na integralidade, a sentença objurgada. Em face do que dispõe o §11º do art. 85 do Código de Processo Civil, majoro a condenação em honorários sucumbenciais para o importe de 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação. Preclusa a via recursal, retornem os autos ao Juízo de origem. É como voto. Sebastião de Arruda Almeida Desembargador Relator Data da sessão: Cuiabá-MT, 03/06/2025

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Processo nº 1001322-50.2024.8.11.0055

ID: 292338553

Tribunal: TJMT Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1001322-50.2024.8.11.0055

Data de Disponibilização: 09/06/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

VALDNEY CLOVALSKY

Acórdão

Advogados:

JULIA DALLA ROSA BITTENCOURT

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1001322-50.2024.8.11.0055 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Compra e Venda, Rescisão do contrato e devolução… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1001322-50.2024.8.11.0055 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Compra e Venda, Rescisão do contrato e devolução do dinheiro, Indenização por Dano Moral, Financiamento de Produto, Efeitos] Relator: Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA Turma Julgadora: [DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES] Parte(s): [VALDNEY CLOVALSKY - CPF: 865.903.591-72 (APELADO), JULIA DALLA ROSA BITTENCOURT - CPF: 037.549.121-00 (ADVOGADO), KADOSH AUTOMOVEIS LTDA - CNPJ: 33.603.422/0001-00 (APELANTE), RAILTON FERREIRA DE AMORIM - CPF: 019.973.051-27 (ADVOGADO), LUIZ FELIPE MARTINS DE ARRUDA - CPF: 014.598.251-36 (ADVOGADO), AYMORE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. - CNPJ: 07.707.650/0001-10 (APELANTE), HERICK PAVIN - CPF: 035.679.869-02 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A APELANTE(S): KADOSH AUTOMOVEIS LTDA e AYMORE CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. APELADO(S): VALDNEY CLOVALSKY. EMENTA: DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. PRELIMINAR. NULIDADE DE SENTENÇA POR CERCEAMENTO DE DEFESA REJEITADO. MÉRITO. COMPRA DE VEÍCULO COM VÍCIO NÃO SANADO. REITERADAS TENTATIVAS ADMINISTRATIVAS DE SOLUÇÃO. INDENIZAÇÃO MANTIDA. DEVOLUÇÃO DO VALOR PAGO. RECURSO DE AYMORE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. NÃO CONHECIDO. RECURSO DE KADOSH AUTOMOVEIS LTDA DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME Apelação cível interposta contra sentença que julgou parcialmente procedente ação de rescisão contratual cumulada com indenização por danos materiais e morais, em razão de vício oculto não sanado em veículo adquirido, condenando a fornecedora à restituição integral dos valores pagos e ao pagamento de compensação por danos morais. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há cinco questões em discussão: (i) saber se houve cerceamento de defesa pela ausência de instrução probatória; (ii) saber se estão presentes os requisitos para rescisão do contrato de compra e venda por vício do produto; (iii) saber se é devida a restituição integral dos valores pagos; (iv) saber se é cabível a indenização por danos morais; e (v) saber se o valor fixado para os danos morais é proporcional e razoável. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. O julgamento antecipado da lide é válido quando os elementos constantes dos autos são suficientes à formação do convencimento judicial, inexistindo cerceamento de defesa. 4. Comprovada a persistência de vícios não sanados no prazo legal, é legítima a rescisão contratual, com devolução dos valores pagos, conforme prevê o art. 18, § 1º, II, do CDC. 5. A frustração legítima do consumidor, diante da ineficácia da assistência técnica e da reiterada tentativa de solução administrativa, configura abalo moral indenizável. 6. O valor fixado a título de dano moral atende aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade, cumprindo função compensatória e pedagógica. 7. Recurso da instituição financeira não conhecido por ausência de interesse recursal, diante do reconhecimento de ilegitimidade passiva em primeira instância. IV. DISPOSITIVO E TESE 8. Recursos conhecidos parcialmente e, na parte conhecida, desprovidos. Tese de julgamento: "1. O julgamento antecipado da lide não configura cerceamento de defesa quando o conjunto probatório é suficiente para o deslinde da causa. 2. O fornecedor responde objetivamente por vícios do produto que o tornam impróprio ao uso, sendo cabível a rescisão contratual e restituição dos valores pagos quando não sanado o defeito no prazo legal. 3. A falha reiterada na prestação do serviço e a frustração do consumidor caracterizam dano moral indenizável." Dispositivos relevantes citados: CDC, arts. 6º, VI; 14; 18, § 1º, II; CC, art. 884. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no AREsp 1.096.303/SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 4ª Turma, DJe 29.08.2017; TJMT, N.U 1004622-65.2024.8.11.0040, Rel. Des. Marcos Regenold Fernandes, j. 04.02.2025. R E L A T Ó R I O RELATÓRIO EXMO. SR. DES. SEBASTIÃO DE ARRUDA ALMEIDA. Egrégia Câmara: Trata-se de Recurso de Apelação Cível tirado contra sentença proferida pelo Juízo da 5ª Vara Cível da Comarca de Tangará da Serra que julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais, declarando a rescisão do contrato de compra e venda do veículo. Na mesma oportunidade, condenou a requerida KADOSH AUTOMÓVEIS LTDA. à restituição do valor de R$ 45.744,07 (quarenta e cinco mil, setecentos e quarenta e quatro reais e sete centavos), bem como ao pagamento de indenização por danos morais no montante de R$ 6.000,00 (seis mil reais), em razão de defeito (vício) apresentado no veículo adquirido pelo apelado, dentro do prazo de garantia contratual, não sanado no prazo legal pela recorrida. Por fim, acolheu a tese suscitada pela apelante AYMORE CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A., reconhecendo sua ilegitimidade passiva “ad causam”. Em suas razões recursais a parte apelante invoca os seguintes argumentos fático-jurídicos: 1. Preliminar arguida pela parte apelante KADOSH AUTOMOVEIS LTDA. 1.1. Da nulidade de sentença por cerceamento de defesa – Prova testemunhal. 2. Das razões recursais da parte apelante KADOSH AUTOMOVEIS LTDA. 2.1. Da falta de responsabilidade civil – Ausência de motivos para rescisão contratual. 2.2. Desnecessidade de devolução dos valores. 2.3. Da vistoria prévia e da concretização do negócio. 2.4. Da inexistência de provas do alegado dano moral. 2.5. Do combate ao valor indenizatório a título de danos morais. 3. Das razões recursais da parte apelante AYMORE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. 3.1. Da ilegitimidade passiva da instituição financeira. 3.2. Da inexistência de responsabilidade da instituição financeira apelante. 3.3. Da inexistência dos danos morais. 3.4. Do combate ao valor indenizatório a título de danos morais. A partes apelada VALDNEY CLOVALSKY apresentou suas contrarrazões (ID. 286616961 e 286616960), rebatendo as alegações das apelantes, e defendendo o desprovimento recursal. É o relatório. Sebastião de Arruda Almeida Desembargador Relator V O T O R E L A T O R APELANTE(S): KADOSH AUTOMOVEIS LTDA e AYMORE CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. APELADO(S): VALDNEY CLOVALSKY. VOTO Egrégia Câmara: De proêmio, consigno que o presente comporta juízo de admissibilidade positivo, em relação aos requisitos extrínsecos e intrínsecos da espécie recursal. Reitero que se trata de recurso de Apelação Cível tirado contra sentença proferida pelo Juízo da 5ª Vara Cível da Comarca de Tangará da Serra que julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais, declarando a rescisão do contrato de compra e venda do veículo. Na mesma oportunidade, condenou a requerida KADOSH AUTOMÓVEIS LTDA. à restituição do valor de R$ 45.744,07 (quarenta e cinco mil, setecentos e quarenta e quatro reais e sete centavos), bem como ao pagamento de indenização por danos morais no montante de R$ 6.000,00 (seis mil reais), em razão de defeito (vício) apresentado no veículo adquirido pelo apelado, dentro do prazo de garantia contratual, não sanado no prazo legal pela recorrida. Por fim, acolheu a tese suscitada pela apelante AYMORE CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A., reconhecendo sua ilegitimidade passiva “ad causam”. VOTO-PRELIMINAR 1. Preliminar arguida pela parte apelante KADOSH AUTOMOVEIS LTDA. 1.1. Da nulidade de sentença por cerceamento de defesa. A Apelante sustenta a preliminar de cerceamento de defesa, alegando que o juízo de origem afastou a necessidade de realização de audiência de instrução e julgamento para a colheita do depoimento de supostas testemunhas da parte apelante, o qual, segundo afirma, seria essencial para comprovar os fatos narrados. Todavia, ao analisar os autos, entendo que essa preliminar não merece acolhimento. Isso porque os elementos probatórios já apresentados pelas partes mostram-se suficientes para a análise da controvérsia, não havendo necessidade de produção de prova oral, como requerido. Segundo a Apelante, o depoimento de testemunhas da parte requerente esclareceria com exatidão os fatos narrados no processo. No entanto, conforme já mencionado, a demanda em questão é eminentemente documental, tornando desnecessária a realização de audiência apenas para reiterar argumentos já constantes dos autos. De mais a mais, sabe-se que de acordo com o artigo 355, caput e inciso I, do Código de Processo Civil, o juiz julgará antecipadamente o pedido, proferindo sentença com resolução de mérito, quando não houver necessidade de produção de outras provas. Segundo o princípio do livre convencimento motivado, o juiz é livre na pesquisa da prova, podendo, dentro da linha de seu raciocínio, emprestar o valor que entender devido a cada uma das provas produzidas, desde que o faça motivadamente, demonstrando as razões de seu convencimento. Dessa forma, cabe-lhe determinar as provas necessárias à instrução do feito, "indeferindo as diligências inúteis ou meramente protelatórias" (art. 370, parágrafo único, do CPC). Sobre o tema, Marinoni, Arenhart e Mitidiero ensinam que: "Diligências inúteis são aquelas que nada podem adiantar a quem as requereu. Meramente protelatórias são as diligências que têm por único fito atrasar o desenvolvimento do processo. Umas e outras podem ser indeferidas pelo juiz. (...) A prova é inadmissível tão somente se impertinente, irrelevante ou incontroversa a alegação de fato a provar." (In: Código de Processo Civil comentado. 5 ed. Ver.,atualizada e ampl. - São Paulo: Thomson Reuters, 2019, p. 500). Anota-se que é firme o entendimento quanto à desnecessidade de produção de novas provas ou alegações em juízo, quando as já juntadas aos autos se mostram suficientes para o convencimento do prolator da sentença. Só ao Juiz diretor do processo cabe avaliar a necessidade ou não de novas provas, não configurando, portanto, cerceamento de defesa a sua não produção. Desta forma, compete ao juiz decidir antecipadamente a lide sempre que entender presentes as provas necessárias para formar seu convencimento, mormente quando o processo tenha sido instruído com documentos suficientes para embasá-lo. O Superior Tribunal de Justiça já resolveu neste sentido: “Constantes dos autos elementos de prova documental suficientes para formar o convencimento do julgador, inocorre cerceamento de defesa se julgada antecipadamente a controvérsia.” (STJ – 4ª Turma – Agravo 14.952-DF-AgRg – Relator Ministro Sálvio de Figueiredo) Descabe, ainda, afirmar que a sentença é contraditória, uma vez que, ao examinar o conjunto probatório, entendeu suficientes para basear o seu livre convencimento e realizar a análise do direito, ainda que as provas produzidas nos autos não se mostrem suficientes para comprovar a legalidade alegada em peça contestatória. Portanto, rejeito a preliminar cerceamento de defesa. É como voto. VOTO-MÉRITO 2. Das razões recursais da parte apelante KADOSH AUTOMOVEIS LTDA. 2.1. Da falta de responsabilidade civil – Ausência de motivos para rescisão contratual. Versam os autos sobre ação de rescisão contratual cumulada com pedido de restituição de valores e indenização por danos morais, fundada na aquisição de veículo automotor que apresentou vícios logo após sua entrega, vícios esses graves e persistentes, que tornaram o bem absolutamente inidôneo ao uso, nos termos do artigo 18 do Código de Defesa do Consumidor. Compulsando os autos, verifica-se que os elementos probatórios constantes nos autos – especialmente o serviço de Raster emitidos por oficinas especializadas (ID 286616875; 286616873) e as comunicações entre as partes – permitem afirmar, com o grau de certeza exigido para o julgamento da causa, que os defeitos não eram perceptíveis ao consumidor médio no momento da contratação, tomando conhecimento somente após o recebimento e uso do veículo pela parte apelada. Extrai-se dos autos que, três dias após a entrega do veículo ao adquirente, ora apelado, a camionete Mitsubishi L200 Triton Flex apresentou defeito que ocasionou vazamento de óleo do motor e do cabeçote. Posteriormente, diante da ocorrência de novos defeitos, a parte apelada, em 10/05/2023, encaminhou novamente a camionete à empresa apelante. Todavia, mesmo após reclamações formuladas junto ao PROCON, o problema não foi sanado. Ressalte-se que, embora a parte apelante tenha informado, em sua defesa apresentada perante o PROCON, que o veículo estaria à disposição do consumidor, não há nos autos elementos que demonstrem que o defeito, de fato, tenha sido efetivamente sanado. Assim, verifica-se que, mesmo após as tentativas de reparo efetuadas, o problema não foi resolvido de forma definitiva, o que demonstra ineficácia da assistência prestada e a persistência da inaptidão do bem à sua destinação natural. Nesse sentido, aplica-se a sistemática do artigo 18, §1º, do CDC, o qual faculta ao consumidor, diante do insucesso da reparação, a rescisão contratual com restituição integral dos valores pagos, senão vejamos: Art. 18. Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com a indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas. § 1° Não sendo o vício sanado no prazo máximo de trinta dias, pode o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha: I - a substituição do produto por outro da mesma espécie, em perfeitas condições de uso; II - a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos; III - o abatimento proporcional do preço. (g.n.) Consoante o tema retratado nos autos, assim se manifesta a jurisprudência caseira: DIREITO DO CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL. RECURSOS DE APELAÇÃO. RESCISÃO CONTRATUAL. COMPRA E VENDA DE VEÍCULO USADO COM VÍCIO OCULTO. FINANCIAMENTO ATRELADO. RESPONSABILIDADE DO FORNECEDOR E DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. DANOS MORAIS. PRELIMINARES AFASTADAS. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. RECURSOS DESPROVIDOS. I. Caso em exame 1. Apelações interpostas pelo Banco Pan S/A e por Willian Dias Canhamero contra sentença que julgou procedente ação de rescisão contratual c/c pedido de indenização por danos morais, determinando a devolução do veículo ao vendedor, a restituição do valor correspondente à motocicleta entregue na negociação e o pagamento de indenização por danos morais à consumidora. II. Questão em discussão 2. Há três questões em discussão: (i) a legitimidade passiva do banco financiador no caso de rescisão do contrato principal de compra e venda do veículo; (ii) a alegação de cerceamento de defesa por ausência de produção de provas essenciais ao julgamento da causa; e (iii) a responsabilidade do fornecedor e do banco pela devolução dos valores pagos e pelo pagamento de danos morais. III. Razões de decidir 3. O julgamento antecipado da lide é válido quando o conjunto probatório dos autos se mostra suficiente para o deslinde da controvérsia, não configurando cerceamento de defesa a ausência de outras provas se o magistrado, fundamentadamente, considera desnecessária sua produção. 4. O contrato de financiamento é coligado ao contrato de compra e venda, de modo que a rescisão deste implica a inexigibilidade daquele, sendo o banco parte legítima para figurar no polo passivo da demanda. 5. O fornecedor responde pelos vícios ocultos do produto, nos termos do art. 18 do Código de Defesa do Consumidor, cabendo ao consumidor exigir a substituição do bem ou a devolução dos valores pagos quando o defeito não é sanado no prazo legal. 6. O descumprimento do dever de reparar os vícios apresentados pelo veículo adquirido, aliado à frustração legítima da consumidora, configura dano moral indenizável. IV. Dispositivo e tese Recursos desprovidos. Tese de julgamento: 1. O julgamento antecipado da lide não configura cerceamento de defesa quando o conjunto probatório existente nos autos é suficiente para o deslinde da causa. 2. O fornecedor responde pelos vícios ocultos do produto e deve restituir os valores pagos pelo consumidor quando o defeito não é sanado no prazo legal. 3. O contrato de financiamento vinculado à compra e venda de veículo apresenta caráter acessório, de modo que a rescisão do contrato principal implica a inexigibilidade do contrato de crédito. 4. O descaso do fornecedor em reparar defeitos do produto e a consequente frustração do consumidor configuram dano moral indenizável. Dispositivos relevantes citados: CDC, arts. 6º, VI e VIII, 7º, 18 e 54-F; CPC, arts. 355, I, 370, 371, 373, 487, I, e 85, § 11. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no AREsp 1.096.303/SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 4ª Turma, DJe 29/08/2017; TJMT, N.U 1015522-58.2023.8.11.0003, Rel. Des. Guiomar Teodoro Borges, 4ª Câmara de Direito Privado, j. 02/10/2024; TJMT, N.U 1001428-95.2022.8.11.0050, Rel. Des. Carlos Alberto Alves da Rocha, 3ª Câmara de Direito Privado, j. 06/11/2024. (N.U 1004622-65.2024.8.11.0040, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARCOS REGENOLD FERNANDES, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 04/02/2025, Publicado no DJE 07/02/2025) (g.n.) Ementa: DIREITO DO CONSUMIDOR. RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO INDENIZATÓRIA DE DANOS MATERIAIS C/C COMPENSATÓRIA DE DANOS MORAIS. PRODUTO COM DEFEITO. SUBSTITUIÇÃO INEFICAZ. VÍCIOS RECORRENTES NÃO SANADOS. RESTITUIÇÃO INTEGRAL DO VALOR PAGO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS MAJORADA. PROVIMENTO PARCIAL. I. CASO EM EXAME 1. Recurso de Apelação Cível interposto por Marcela Nunes contra sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de Barra do Garças, que julgou procedente a ação indenizatória contra Loja Electrolux Comércio Virtual de Eletrodomésticos Ltda e Magazine Luiza S/A, condenando-as ao pagamento de R$ 3.000,00 por danos morais e R$ 220,00 por danos materiais. A autora busca a restituição integral do valor pago pelo produto defeituoso (R$ 2.159,10) e a majoração da indenização por danos morais para R$ 21.591,00. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (i) Definir se a parte apelante tem direito à restituição integral do valor pago pelo produto defeituoso, conforme previsto no art. 18, § 1º, II, do Código de Defesa do Consumidor; (ii) Estabelecer se o montante fixado para indenização por danos morais deve ser majorado em razão dos transtornos experimentados pela consumidora. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. O art. 18, § 1º, II, do Código de Defesa do Consumidor assegura ao consumidor o direito de optar pela restituição integral do valor pago quando o vício do produto não é sanado no prazo máximo de 30 dias. 4. Restou demonstrado que o produto adquirido apresentou defeitos sucessivos, mesmo após tentativas de reparo e substituição, caracterizando a ineficácia das medidas adotadas pelas fornecedoras. 5. O princípio da vulnerabilidade do consumidor (art. 4º, I, do CDC) e o direito à reparação de danos (art. 6º, VI, do CDC) exigem que o fornecedor adote providências eficazes para sanar os vícios ou restituir integralmente o valor pago. 6. A responsabilidade objetiva do fornecedor, prevista no art. 14 do CDC, prescinde de comprovação de culpa e impõe o ressarcimento quando o produto não atende às condições adequadas de qualidade e segurança. 7. Considerando os transtornos ocasionados pela falha reiterada na prestação do serviço e o descaso das fornecedoras, o valor fixado para a indenização por danos morais (R$ 3.000,00) mostra-se insuficiente, devendo ser majorado para R$ 5.000,00. 8. A quantificação do dano moral deve observar os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, visando compensar o sofrimento da parte autora e desestimular condutas semelhantes por parte das fornecedoras. IV. DISPOSITIVO E TESE 9. Recurso provido em parte. Tese de julgamento: 1. O consumidor tem direito à restituição integral do valor pago quando o vício do produto não é sanado no prazo legal de 30 dias, conforme previsto no art. 18, § 1º, II, do Código de Defesa do Consumidor. 2. O valor da indenização por danos morais deve ser fixado com base nos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, considerando a extensão do dano e a conduta das fornecedoras. Dispositivos relevantes citados: CDC, arts. 4º, I; 6º, VI; 14; 18, § 1º, II; Constituição Federal, art. 5º, V e X. Jurisprudência relevante citada: TJMT, Apelação Cível nº 1000560-27.2023.8.11.0004, Rel. Des. RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, Quarta Câmara de Direito Privado, j. 28/02/2025. (N.U 1000433-89.2023.8.11.0004, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARCIO VIDAL, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 01/04/2025, Publicado no DJE 04/04/2025) (g.n.) Desse modo, entendo que a tese jurídica sustentada pela parte apelante deve ser rejeitada, na medida em que o vício apresentado no veículo não foi sanado no prazo legal. Ademais, não tendo a empresa apelante procedido à substituição do bem ou à restituição do valor pago, resta caracterizada a falha na prestação do serviço, razão pela qual deve ser mantida a sentença objurgada. 2.2. Da inexistência de provas do alegado dano moral. Neste ponto recursal, entendo que não assiste razão a parte apelante, isto porque, o dano moral aqui debatido decorre do defeito não sanado pela revenda de automóveis, bem como, das reiteradas tentativas infrutíferas do consumidor em solucionar o problema na esfera administrativa, fato que, sem dúvida, gera desconforto, aflição e transtornos e, tem a extensão suficiente para configurar o dano moral. Imperioso destacar, também, que o deslinde da questão fático-jurídica aqui registrada passa pela responsabilidade civil do fornecedor que, em casos tais, é objetiva, em face da sua condição de prestador de serviços que lhe impõe o dever de zelar pela perfeita qualidade do serviço prestado, em conformidade com os ditames do art. 14, “caput”, do Código de Defesa do Consumidor, senão vejamos: Art. 14. O fornecedor de serviços responde independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. Por isso, diante da falha na prestação dos serviços, penso que inegavelmente, trouxe desgaste emocional e prejuízos de ordem moral à parte recorrente, indenizáveis, portanto. 2.3. Do combate ao valor indenizatório a título de danos morais. Neste ponto recursal, entendo ser razoável a estipulação da quantia de R$ 6.000,00 (seis mil reais), a título de indenização por danos morais sofridos pela parte recorrente, atendendo-se assim, ao binômio jurídico da reparabilidade do dano experimentado e o efeito pedagógico a ser imposto à parte recorrida, sem descurar das condições pessoais e financeiras das partes litigantes. 2.4. Desnecessidade de devolução dos valores. A tese recursal em análise não merece prosperar, uma vez que restou comprovada, nos autos, a falha na prestação do serviço, consubstanciada no defeito não sanado pela parte apelante. Assim, tendo a parte apelante recebido valores como forma de pagamento pelo veículo defeituoso, impõe-se a devolução dos montantes pagos (ID 286615987; ID 286615986), diante da resolução do negócio jurídico, sob pena de enriquecimento sem causa, nos termos do art. 884 do Código Civil. Dessa forma, rejeito a pretensão recursal, devendo ser mantida a r. sentença. 3. Das razões recursais da parte apelante AYMORE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. O recurso interposto pela parte ora apelante não deve ser conhecido, por lhe faltar interesse de agir, uma vez que, na sentença proferida pelo juízo a quo, foi reconhecida a ilegitimidade passiva ad causam da instituição financeira, ora apelante. Desse modo, falta à parte excluída da lide interesse recursal, por não ter sido vencida na demanda. Não possui interesse em recorrer a parte que não sofreu os efeitos da sentença, tampouco foi condenada. Conclusão Por essas razões, não conheço do recurso de AYMORE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. e conheço do recurso de KADOSH AUTOMOVEIS LTDA e NEGO-LHE PROVIMENTO, mantendo-se, na integralidade, a sentença objurgada. Em face do que dispõe o §11º do art. 85 do Código de Processo Civil, majoro a condenação em honorários sucumbenciais para o importe de 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação. Preclusa a via recursal, retornem os autos ao Juízo de origem. É como voto. Sebastião de Arruda Almeida Desembargador Relator Data da sessão: Cuiabá-MT, 03/06/2025

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