Processo nº 0813883-43.2025.8.14.0000
ID: 329429615
Tribunal: TJPA
Órgão: 1ª Turma de Direito Privado - Desembargadora MARIA FILOMENA DE ALMEIDA BUARQUE
Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO
Nº Processo: 0813883-43.2025.8.14.0000
Data de Disponibilização:
21/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
CRISTIANE BELINATI GARCIA LOPES
OAB/PR XXXXXX
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1ª TURMA DE DIREITO PRIVADO ORIGEM: JUÍZO DE DIREITO DA 2ª VARA CÍVEL E EMPRESARIAL DE ANANINDEUA AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 0813883-43.2025.8.14.0000 AGRAVANTE: IRAN SOUZA DOS SANTOS AGRAVADA: ITAÚ SA…
1ª TURMA DE DIREITO PRIVADO ORIGEM: JUÍZO DE DIREITO DA 2ª VARA CÍVEL E EMPRESARIAL DE ANANINDEUA AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 0813883-43.2025.8.14.0000 AGRAVANTE: IRAN SOUZA DOS SANTOS AGRAVADA: ITAÚ SA RELATORA: DESA. MARIA FILOMENA DE ALMEIDA BUARQUE Ementa: DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO ASSINADA DIGITALMENTE. VALIDADE DO CONTRATO ELETRÔNICO. CONSTITUIÇÃO DE MORA. POSSIBILIDADE DE REVISÃO CONTRATUAL. INEXISTÊNCIA DE ÓBICE À CONSOLIDAÇÃO DA POSSE DO VEÍCULO. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Agravo de instrumento interposto contra decisão que deferiu liminar de busca e apreensão em ação ajuizada com base em cédula de crédito bancário emitida eletronicamente, por inadimplemento contratual em contrato de financiamento com garantia de alienação fiduciária de veículo. A parte agravante alegou ausência de validade do contrato eletrônico, ausência de comprovação da mora e existência de cláusulas abusivas, pleiteando a revogação da medida liminar. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há três questões em discussão: (i) definir se é válida a cédula de crédito bancário assinada eletronicamente como título apto a embasar a liminar de busca e apreensão; (ii) estabelecer se houve constituição válida da mora do devedor fiduciário; (iii) determinar se a alegação de cláusulas abusivas afasta os efeitos da mora e impede a consolidação da propriedade do bem apreendido. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. O contrato eletrônico, assinado digitalmente com mecanismos de autenticação que asseguram a identificação do signatário, é válido juridicamente e suficiente para instruir a ação de busca e apreensão, conforme previsão do art. 10, § 2º, da MP nº 2.200-2/2001 e jurisprudência do STJ (REsp 2.159.442/PR). 4. A cédula de crédito bancário eletrônica ostenta os requisitos de integridade e autenticidade, não sendo exigida sua apresentação em meio físico quando assinada com certificação que garanta a identificação inequívoca do signatário. 5. A mora do devedor resta comprovada por notificação extrajudicial enviada via AR ao endereço contratualmente pactuado, em conformidade com o art. 2º, § 2º, do Decreto-Lei nº 911/1969. 6. A mera alegação de existência de cláusulas abusivas ou encargos indevidos não descaracteriza a mora do devedor, tampouco impede a consolidação da propriedade do bem apreendido em favor do credor fiduciário, conforme entendimento consolidado no STJ (Súmula 380). 7. A discussão acerca da eventual abusividade de cláusulas contratuais demanda dilação probatória, sendo inadequada sua análise no âmbito restrito do agravo de instrumento. IV. DISPOSITIVO E TESE 8. Recurso desprovido. Tese de julgamento: 1. A cédula de crédito bancário eletrônica assinada digitalmente é juridicamente válida para instruir pedido de busca e apreensão, desde que assegurada a identificação do signatário. 2. A constituição em mora do devedor fiduciário é válida com o envio de notificação ao endereço constante no contrato, ainda que recebida por terceiro. 3. A mera alegação de cláusulas abusivas não afasta a mora do devedor nem impede a consolidação da propriedade do bem apreendido em favor do credor fiduciário. ________________________________________ Dispositivos relevantes citados: MP nº 2.200-2/2001, art. 10, § 2º; Lei nº 10.931/2004, arts. 26, 28 e 29; Decreto-Lei nº 911/1969, art. 2º, § 2º; CPC, arts. 411, I, 932, IV e V, "a". Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 2.159.442/PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, 3ª Turma, j. 24.09.2024; STJ, Súmula nº 380; TJPA, AI nº 0811386-90.2024.8.14.0000, Rel. Des. Ricardo Ferreira Nunes, j. 23.07.2024; TJ-DF, AI nº 0742264-53.2022.8.07.0000, Rel. Des. Ana Cantarino, j. 18.04.2023; TJ-SP, AC nº 1010706-56.2022.8.26.0001, Rel. Des. Mário Daccache, j. 27.02.2023. DECISÃO MONOCRÁTICA Trata-se de AGRAVO DE INSTRUMENTO interposto por IRAN SOUZA DOS SANTOS contra decisão proferida pelo Juízo da 1ª Vara Cível e Empresarial de ANANINDEUA, nos autos da Ação de Busca e Apreensão em Alienação Fiduciária ajuizada por ITAÚ SA., em que foi deferido o pleito liminar. Narram os autos de origem que as partes, em Na data de 17/01/2024, as partes celebraram Cédula de Crédito Bancário (doc. anexo), sob o nº 000000187669106, no valor total de R$83.190,10, com pagamento por meio de 48 parcelas mensais. Tendo como objeto o bem com as seguintes características: MARCA:FIAT MODELO:TORO FREEDON1.8AT616 ANO:2020/2020 PLACA:QVS8E10 CHASSI:98822611BMKD66748 RENAVAM: 01248753930 Diz que a parte Requerida não cumpriu com as obrigações das parcelas assumidas, deixando de efetuar o pagamento da 12 parcela em 30/05/2025, acarretando, consequentemente, o vencimento antecipado de toda a sua dívida, que, atualizada até a data do ajuizamento da ação, resulta no valor total de R$80.980,84. Nessa linha, requereu a busca e apreensão do bem. O juízo aquo deferiu o pedido liminar nos seguintes termos, cujo dispositivo da decisão agravada transcrevo seguir:(Id.28215102– autos de origem): (...) 4. O Requerido poderá pagar a dívida em 05 (cinco) dias depois de executada a liminar, de acordo com os valores apresentados pelo requerente na inicial, hipótese em que o bem lhe ser restituído livre de ônus. 5. Uma vez executada a liminar e decorrido o prazo de 05 (cinco) dias sem que haja pagamento integral da dívida pendente, segundo os valores apresentados pelo requerente, a propriedade e posse do veículo em questão ficará consolidada e integrada ao patrimônio do credor fiduciário. 6. Se o bem alienado fiduciariamente não for encontrado ou não se achar na posse do devedor, intime-se a parte Autora para que, se quiser, nos mesmos autos, peça a conversão do pleito de busca e apreensão em ação executiva, na forma do CPC, segundo indica o artigo 4º, do Decreto Lei nº 911/1.969. 7. Haja vista que se trata, aparentemente, de cédula de crédito bancário emitida eletronicamente, em que não há, propriamente, a cártula em papel, que permita endosso físico e que possa ser fisicamente depositada em secretaria, proíbo o autor de fazer o endosso/transferência do título de crédito em questão, que é a causa de pedir de fundo desta ação, como corolário lógico da providência autorizada no artigo 425, § 2º, do CPC, que seria levada a efeito, como de praxe, se o título fosse físico e depositável em Secretaria, considerando que a finalidade do depósito nesta última era, exatamente, não permitir endossos, para que não houvesse tumulto ou soluções de continuidade no processo. Caso necessário, servirá a presente como MANDADO DE BUSCA E APREENSÃO/INTIMAÇÃO/CITAÇÃO/AR/OFÍCIO, nos termos dos Provimentos nº 03/2009 da CJRMB e da CJCI do Tribunal de Justiça do Estado do Pará (TJPA). Caso necessário, expeça-se CARTA PRECATORIA. Cumpra-se, expedindo-se para tanto o necessário, com as cautelas legais. INTIMEM-SE as partes e CITE-SE o devedor fiduciário. P.R.I.C. Ananindeua/PA, data e hora firmados na assinatura eletrônica. (Documento assinado digitalmente) ANDREY MAGALHÃES BARBOSA Juiz de Direito Titular da 2ª Vara Cível e Empresarial de Ananindeu Inconformado, o Agravante IRAN SOUZA DOS SANTOS, recorre a esta instância, requerendo a reforma da decisão que deferiu a liminar, argumentando acerca da ausência de validade do contrato eletrônico e da falta de requisitos da validade digital. Defende o direito à revisão das cláusulas contratuais abusivas pelo devedor em sede de ação de busca e apreensão, ao que busca o afastamento da própria mora, com o reconhecimento da abusividade dos encargos no período da normalidade contratual, notadamente, quanto à tarifa de cadastro, à cláusula de registro de contrato e ao seguro prestamista. Sustenta abusividade na capitalização diária de juros, sem a indicação da taxa diária, cfe. entendimento do C. STJ no RESP 1.826.463/SC. Pugnou pela concessão do efeito suspensivo ativo e, no mérito, pelo provimento do recurso, com a restituição do veículo em caso de apreensão, sendo revogada a medida liminar. Juntou documentos. É o relatório. DECIDO. Inicio a presente manifestação analisando a possibilidade do julgamento do recurso em decisão monocrática. Com efeito, de acordo com o art. 932, incisos IV e V, alínea “a”, do CPC, o relator do processo está autorizado, em demandas repetitivas, a apreciar o mérito recursal, em decisão monocrática. Referida previsão está disciplinada no art. 133, do Regimento Interno desta Corte, que visa dar cumprimento ao comento legal imposto no art. 926, §1º, do CPC. Vejamos: Art. 926. Os tribunais devem uniformizar sua jurisprudência e mantê-la estável, íntegra e coerente. § 1o Na forma estabelecida e segundo os pressupostos fixados no regimento interno, os tribunais editarão enunciados de súmula correspondentes a sua jurisprudência dominante. Gize-se, ainda, que tais decisões têm por finalidade desafogar os Órgãos Colegiados, buscando dar mais efetividade ao princípio da celeridade e economia processual, sem deixar de observar, por óbvio, as garantias constitucionais do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa. Assim, plenamente cabível o julgamento do recurso por meio de decisão monocrática, porque há autorização para tanto no sistema processual civil vigente, pelo que passo a analisá-lo. Prima facie defiro os benefícios da justiça gratuita, por estarem presentes os requisitos para sua concessão. Cinge-se a matéria recursal, primeiramente, à verificação dos requisitos para concessão da liminar de busca e apreensão, no que concerne à validade do contrato eletrônico e da assinatura eletrônica. Centra-se também a discussão na possibilidade ou não de revisão de cláusulas contratuais por iniciativa do devedor em sede de ação de busca e apreensão de veículo alienado fiduciariamente, embasada em cédula de crédito bancário de alienação fiduciária em garantia, bem como à necessidade ou não de afastamento da mora do Agravante, caso reconhecida eventual abusividade. Passo a apreciar os argumentos da parte Agravante. DA ALEGADA AUSÊNCIA DE VALIDADE DO CONTRATO ELETRÔNICO E DA ASSINATURA DIGITAL No que tange à necessidade de apresentação do contrato original, necessário remontar à Lei nº 10.931/2004, que, dentre outras providências, instituiu a cédula de crédito bancário, prevendo ser esta um título de crédito, com força de título executivo extrajudicial, vejamos: “Art. 26. A Cédula de Crédito Bancário é título de crédito emitido, por pessoa física ou jurídica, em favor de instituição financeira ou de entidade a esta equiparada, representando promessa de pagamento em dinheiro, decorrente de operação de crédito, de qualquer modalidade. § 1º A instituição credora deve integrar o Sistema Financeiro Nacional, sendo admitida a emissão da Cédula de Crédito Bancário em favor de instituição domiciliada no exterior, desde que a obrigação esteja sujeita exclusivamente à lei e ao foro brasileiros. § 2º A Cédula de Crédito Bancário em favor de instituição domiciliada no exterior poderá ser emitida em moeda estrangeira. (...) Art. 28. A Cédula de Crédito Bancário é título executivo extrajudicial e representa dívida em dinheiro, certa, líquida e exigível, seja pela soma nela indicada, seja pelo saldo devedor demonstrado em planilha de cálculo, ou nos extratos da conta corrente, elaborados conforme previsto no § 2º.” Diante da leitura dos referidos artigos, nota-se que a juntada da via original do contrato é requisito obrigatório para o deferimento da busca e apreensão, haja vista a sua possibilidade de circulação, conforme o entendimento firmado no julgamento do REsp nº 1.291.575⁄PR, que assim decidiu: "a Cédula de Crédito Bancário é título executivo extrajudicial, representativo de operações de crédito de qualquer natureza (...)". Em sendo a cédula de crédito bancário considerada por lei como título de crédito, possui as características gerais atinentes à literalidade, cartularidade, autonomia, abstração, independência e circulação, este último atributo expressamente consignado no art. 29, § 1º, da Lei nº 10.931/2004: “Art. 29. A Cédula de Crédito Bancário deve conter os seguintes requisitos essenciais: (...) §1º A Cédula de Crédito Bancário será transferível mediante endosso em preto, ao qual se aplicarão, no que couberem, as normas do direito cambiário, caso em que o endossatário, mesmo não sendo instituição financeira ou entidade a ela equiparada, poderá exercer todos os direitos por ela conferidos, inclusive cobrar os juros e demais encargos na forma pactuada na Cédula. (...) § 5º A assinatura de que trata o inciso VI do caput deste artigo poderá ocorrer sob a forma eletrônica, desde que garantida a identificação inequívoca de seu signatário. (Incluído pela Lei nº 13.986, de 2020).” Neste sentido, tendo em vista a prevenção da eventual circulação ilegítima do título, bem como da possibilidade em dobro da cobrança contra o devedor, entendeu-se pela obrigatoriedade de apresentação do original da cédula em Secretaria, ainda que para instruir a ação de busca e apreensão processada pelo Decreto-Lei nº 911/69. Há DESNECESSIDADE de juntada da cédula de crédito bancário quando a contratação ocorreu na forma eletrônica, em razão da Medida Provisória N.º 2.200-2, de 24 de agosto de 2001, em seu artigo 10, § 2º, que admitem válidos outros meios de comprovação da autoria e integridade de documentos em forma eletrônica, inclusive os que utilizem certificados não emitidos pela ICP-Brasil, desde que admitido pelas partes como válido ou aceito pela pessoa a quem for oposto o documento. Corroborando essa ideia, recentemente, a 3ª Turma do STJ firmou o entendimento de que assinaturas eletrônicas realizadas por plataformas privadas, não certificadas pela ICP-Brasil, também possuem validade jurídica, para fins de busca e apreensão. A decisão foi tomada no julgamento do Recurso Especial n. 2.159.442-PR e teve como relatora a ministra NANCY ANDRIGHI. Segundo o julgado, a Medida Provisória permite o uso de outras formas de comprovação de autenticidade, desde que aceitas pelas partes e com padrões de segurança. Segue a ementa: RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. INDEFERIMENTO INICIAL. EXTINÇÃO. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIA. ENDOSSO. EMISSÃO E ASSINATURA ELETRÔNICOS. VALIDAÇÃO JURÍDICA DE AUTENTICIDADE E INTEGRIDADE. ENTIDADE AUTENTICADORA ELEITA PELAS PARTES SEM CREDENCIAMENTO NO SISTEMA ICP-BRASIL. POSSIBILIDADE. ASSINATURA ELETRÔNICA. MODALIDADES. FORÇA PROBANTE. JUIZ. IMPUGNAÇÃO DE OFÍCIO. INVIABILIDADE. ÔNUS DAS PARTES. 1. Ação de busca e apreensão, ajuizada em 14/10/2021, da qual foi extraído o presente recurso especial, interposto em 26/03/2024 e concluso ao gabinete em 02/08/2024. 2. O propósito recursal consiste em saber se é possível elidir presunção de veracidade de assinatura eletrônica, certificada por pessoa jurídica de direito privado, pelo simples fato de a entidade não ser credenciada na Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira (ICP-Brasil). Interpretação do art. 10, § 2º, da MPV 2200/2001. 3. A intenção do legislador foi de criar níveis diferentes de força probatória das assinaturas eletrônicas (em suas modalidades simples, avançada ou qualificada), conforme o método tecnológico de autenticação utilizado pelas partes, e - ao mesmo tempo - conferir validade jurídica a qualquer das modalidades, levando em consideração a autonomia privada e a liberdade das formas de declaração de vontades entre os particulares. 4. O reconhecimento da validade jurídica e da força probante dos documentos e das assinaturas emitidos em meio eletrônico caminha em sintonia com o uso de ferramentas tecnológicas que permitem inferir (ou auditar) de forma confiável a autoria e a autenticidade da firma ou do documento. Precedentes 5. O controle de autenticidade (i.e., a garantia de que a pessoa quem preencheu ou assinou o documento é realmente a mesma) depende dos métodos de autenticação utilizados no momento da assinatura, incluindo o número e a natureza dos fatores de autenticação (v.g., "login", senha, códigos enviados por mensagens eletrônicas instantâneas ou gerados por aplicativos, leitura biométrica facial, papiloscópica, etc.). 6. O controle de integridade (i.e., a garantia de que a assinatura ou o conteúdo do documento não foram modificados no trajeto entre a emissão, validação, envio e recebimento pelo destinatário) é feito por uma fórmula matemática (algoritmo) que cria uma “impressão digital virtual” cuja singularidade é garantida com o uso de criptografia, sendo a função criptográfica "hash" SHA-256 um dos padrões mais utilizados na área de segurança da informação por permitir detecção de adulteração mais eficiente, a exemplo do denominado "efeito avalanche". 7. Hipótese em que as partes - no legítimo exercício de sua autonomia privada - elegeram meio diverso de comprovação da autoria e integridade de documentos em forma eletrônica, com uso de certificado não emitido pela ICP-Brasil, tendo o Tribunal de Origem considerado a assinatura eletrônica em modalidade avançada insuficiente para evitar abuso ou fraude apesar de constar múltiplos fatores de autenticação, constantes do relatório de "logs" gerado na emissão dos documentos e das assinaturas eletrônicos. 8. A refutação da veracidade da assinatura eletrônica e dos documentos sobre os quais elas foram eletronicamente apostas - seja no aspecto de sua integridade, seja no aspecto de sua autoria - deve ser feita por aquele a quem a norma do art. 10, § 2º, da MPV 20200/2001 expressamente se dirigiu, que é a "pessoa a quem for oposto o documento", que é a mesma pessoa que admite o documento como válido (i.e., o destinatário). Essa é, aliás, a norma do art. 411, I, do CPC, ao criar a presunção de autenticidade do documento particular quando a parte contra quem ele for produzido deixar de impugná-lo. 9. A pessoa a quem o legislador refere é uma das partes na relação processual (no caso de execução de título de crédito, o emitente, o endossante ou o endossatário), o que - por definição - exclui a pessoa do juiz, sob pena de se incorrer no tratamento desigualitário, vetado pela norma do art. 139, I, do CPC. 10. A assinatura eletrônica avançada seria o equivalente à firma reconhecida por semelhança, ao passo que a assinatura eletrônica qualificada seria a firma reconhecida por autenticidade - ou seja, ambas são válidas, apenas se diferenciando no aspecto da força probatória e no grau de dificuldade na impugnação técnica de seus aspectos de integridade e autenticidade. 11. Negar validade jurídica a um título de crédito, emitido e assinado de forma eletrônica, simplesmente pelo fato de a autenticação da assinatura e da integridade documental ter sido feita por uma entidade sem credenciamento no sistema ICP-Brasil seria o mesmo que negar validade jurídica a um cheque emitido pelo portador e cuja firma não foi reconhecida em cartório por autenticidade, evidenciando um excessivo formalismo diante da nova realidade do mundo virtual. 12. Recurso especial conhecido e provido para determinar a devolução dos autos à origem a fim de que se processe a ação de busca e apreensão. (STJ – REsp 2.159.442/PR – Terceira Turma - Rel. Min. NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 24.09.2024, Data de Publicação: 27.09.2024) É O CASO EM COMENTO, porque o contrato apresentado (id.28215102), assinado digitalmente pela parte Agravante, observa as exigências legais de integridade, autenticidade e irretratabilidade, tendo sido produzida a assinatura com a utilização do processo de certificação a identificá-la, mediante geolocalização, e-mail e logs de contratação, ostentando presunção de veracidade, inexistindo contrato físico - original em papel - que possa ser apresentado em juízo. DA POSSIBILIDADE DE REVISÃO CONTRATUAL EM SEDE DE BUSCA E APREENSÃO E DA ALEGADA AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA MORA Quanto à alegada ausência de comprovação da mora da parte recorrente, não lhe assiste a razão, uma vez que efetivamente comprovado nos autos que a notificação extrajudicial foi recebida no endereço da devedora aposto no contrato no id.2821510 (RODOVIA MARIO COVAS 00102 BL 10 APTO 102 COQUEIRO ANANINDEUA - PA 67115-000), cfe. aviso de recebimento dos Correios no id. 28215102, e demais documentos que instruem a ação de busca e apreensão. Na dicção legal vigente do Decreto nº 911/67, art. 2º, § 2º, com redação dada pela Lei nº 13.343/2014 -, para a regular constituição do devedor em mora, é suficiente o envio de notificação por carta registrada, com aviso de recebimento ao endereço constante no contrato, devendo esta ser devidamente recebida/assinada, ainda que não seja entregue pessoalmente a ele, in verbis: Art. 2º (...) § 2º A mora decorrerá do simples vencimento do prazo para pagamento e poderá ser comprovada por carta registrada com aviso de recebimento, não se exigindo que a assinatura constante do referido aviso seja a do próprio destinatário. (Redação dada pela Lei nº 13.043, de 2014) Dessa forma, o fato de o AR que acompanhava a notificação extrajudicial ter sido enviado ao endereço informado no contrato pela parte Ré/Agravante (Id. 28215102,) apenas corrobora a sua constituição em mora. Assim, perfeitamente válida a notificação extrajudicial constante dos autos de origem não cabendo falar, por exemplo, em ausência de dados sobre o valor das parcelas e na consequente inviabilização de quitação do débito pela devedora, uma vez que as informações nela presentes são suficientemente claras para fins de pagamento da dívida pela parte Requerida. Por fim, argumenta a parte Agravante quanto à suposta abusividade dos encargos previstos em cláusulas contratuais (com capitalização diária de juros, sem a indicação da taxa diária, bem como em relação à tarifa de cadastro, à cláusula de registro de contrato e ao seguro prestamista) e quanto ao direito à revisão pelo devedor em sede de ação de busca e apreensão, com o afastamento da mora. Cumpre ressaltar que a retomada do bem dado em garantia fiduciária configura exercício regular de direito pelo credor, não se podendo afastar os efeitos da mora pela simples alegação da existência de cláusulas abusivas ou de cobrança de encargos ilegais no contrato firmado entre as partes. Deve ser aplicada, de forma analógica ao caso, a tese firmada pelo STJ no enunciado de Súmula nº 380, no sentido de que "A simples propositura da ação de revisão do contrato não inibe a caracterização da mora do autor". Assim, a mera alegação de abusividade de cláusulas contratuais não inibe a caracterização da mora do devedor, devendo tais alegações ser analisadas de forma mais aprofundada na origem, em respeito aos princípios do contraditório e ampla defesa. Nesse sentido, colaciono o entendimento jurisprudencial: AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. PEDIDO DE REVISÃO DE CLÁUSULAS FORMULADO NO BOJO DA CONTESTAÇÃO. POSSIBILIDADE. TUTELA DE URGÊNCIA. PROBABILIDADE DO DIREITO. PERIGO DE DANO. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. ALEGAÇÃO DE ABUSIVIDADE DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS. DISCUSSÃO. NECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA. SÚMULA 380 DO STJ. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. O Código de Processo Civil dispõe em seu artigo 300 acerca do instituto da tutela de urgência, destacando que sua concessão ocorrerá quando houver demonstração da probabilidade do direito e do perigo de dano ou de risco ao resultado útil do processo. 2. A jurisprudência admite a análise do pedido de revisão de cláusulas contratuais formulado na contestação da ação de busca e apreensão. 3. A mera alegação de que os juros do contrato são abusivos por serem superiores à taxa média de mercado divulgada pelo Banco Central do Brasil, não autoriza que se afaste o legítimo direito da instituição financeira em promover a busca e apreensão do veículo ou de inscrever o nome da parte ré agravante nos cadastros de proteção ao crédito, na hipótese de inadimplência do contrato. 4. O Enunciado nº 380 da Súmula do c. Superior Tribunal de Justiça estabelece que "a simples propositura da ação de revisão de contrato não inibe a caracterização da mora do autor." 5. A controvérsia acerca de eventual abusividade nas cláusulas contratuais demanda uma instrução mais aprofundada da causa, o que não é viável nesta via recursal de cognição estreita e não exauriente devendo ser objeto de dilação probatória, respeitados os princípios da ampla defesa e do contraditório perante o magistrado de origem. 6. Agravo de instrumento conhecido e não provido. (TJ-DF 07422645320228070000 1690624, Relator: ANA CANTARINO, Data de Julgamento: 18/04/2023, 5ª Turma Cível, Data de Publicação: 02/05/2023) Busca e apreensão – Alienação fiduciária de veículo – Inadimplemento – Mora comprovada por carta registrada enviada ao endereço do contrato, com aviso de recebimento assinado por terceiro – Vencimento antecipado do débito – Transcurso do prazo para depósito do valor da dívida – Consolidação da propriedade em mãos do credor – Inconformismo da ré – Reconhecida a ilegalidade da cobrança da tarifa de avaliação do bem, pois não comprovada a efetiva prestação dos serviços – Indevido, ainda, o valor cobrado a título de seguro atrelado ao financiamento, sem demonstração da livre manifestação da contratante – Existência de eventuais cláusulas abusivas no contrato, contudo, não afastam a mora da devedora – Mera alegação de abusividade, sem prova de pagamento de valores incontroversos, revela-se insuficiente para evitar a perda do bem – Sentença reformada apenas para afastar a cobrança dos encargos considerados abusivos e determinar a devolução das quantias pagas, de forma simples – Parcial provimento do recurso. (TJ-SP - AC: 10107065620228260001 SP 1010706-56.2022.8.26.0001, Relator: Mário Daccache, Data de Julgamento: 27/02/2023, 29ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 27/02/2023) Portanto, o debate sobre as cláusulas contratuais não serve, de pronto, para descaracterizar a mora do ora Agravante, como esse pretende. Além do mais, no caso em concreto, não há que se falar em abusividade na cobrança de capitalização de juros diária, uma vez que sequer houve previsão contratual dessa periodicidade, constando expressamente na cédula de crédito bancário a informação do percentual utilizado, em suas bases mensal e anual (id. 28215102). Por fim, no que se refere a eventual irregularidade na cobrança das tarifas de registro, seguro e cadastro, sabe-se que, caso existentes, não têm o condão de afastar a mora, já que não se trata de encargos acessórios ao contrato, sendo impertinente a apreciação delas neste juízo recursal. Nesse sentido, julgado deste e. TJPA, no AGRAVO DE INSTRUMENTO n. 08113869020248140000 20911929, Relator: RICARDO FERREIRA NUNES, 2ª Turma de Direito Privado, Data do Julgamento: 23/07/2024, Data da Publicação: 23/07/2024. Dessa forma, não assiste a razão à Agravante. Logo, o improvimento do agravo de instrumento é medido que se impõe, devendo ser mantido in totum o interlocutório guerreado. DISPOSITIVO Ante o exposto, CONHEÇO do AGRAVO DE INSTRUMENTO e NEGO-LHE PROVIMENTO, mantendo na íntegra a decisão a quo recorrida, nos termos da fundamentação. Publique-se. Intimem-se. Comunique-se ao Juízo de origem. Belém, data registrada no sistema. MARIA FILOMENA DE ALMEIDA BUARQUE Desembargadora Relatora
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