Processo nº 0814758-27.2018.8.14.0301
ID: 281448766
Tribunal: TJPA
Órgão: 13ª Vara Cível e Empresarial de Belém
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Nº Processo: 0814758-27.2018.8.14.0301
Data de Disponibilização:
28/05/2025
Polo Passivo:
Advogados:
CRISTOVINA PINHEIRO DE MACEDO
OAB/PA XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ 13ª VARA CÍVEL E EMPRESARIAL DE BELÉM [Usufruto] PROCESSO Nº:0814758-27.2018.8.14.0301 REQUERENTE: Nome: ANTONIO CARLOS DIAS ALVES Endereço: Ave…
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ 13ª VARA CÍVEL E EMPRESARIAL DE BELÉM [Usufruto] PROCESSO Nº:0814758-27.2018.8.14.0301 REQUERENTE: Nome: ANTONIO CARLOS DIAS ALVES Endereço: Avenida Governador Magalhães Barata, 202, BL A, São Brás, BELÉM - PA - CEP: 66060-281 Nome: ELIZABETH RUSSO RODRIGUES ALVES Endereço: Avenida Governador Magalhães Barata, 202, BL A, São Brás, BELÉM - PA - CEP: 66060-281 REQUERIDO: Nome: MARIA DE JESUS MACHADO DIAS Endereço: Travessa de Breves, 1182, APARTAMENTO 1003, Jurunas, BELÉM - PA - CEP: 66030-140 SENTENÇA Trata-se de ação de extinção de usufruto cumulada com pedido de tutela de urgência, proposta por ANTONIO CARLOS DIAS ALVES e ELIZABETH RUSSO RODRIGUES ALVES, em face de MARIA DE JESUS MACHADO DIAS, visando o reconhecimento da extinção do usufruto vitalício que esta detém sobre dois imóveis situados em Belém/PA, sob a alegação de desuso por mais de 14 anos, além da necessidade de impedir sua própria remoção do imóvel onde residem em companhia de seus filhos. Os autores ingressaram com a presente ação (ID 3741512) narrando que, embora os imóveis tenham sido doados pela ré com reserva de usufruto, ela não exerce a posse, nem aufere qualquer fruto dos bens. Argumentam que, desde 2004, residem no apartamento 202, Bloco A, Edifício Pedro Carneiro, situado à Av. Magalhães Barata, n. 1050, bairro de São Brás, nesta cidade, arcando com todas as obrigações fiscais e condominiais, enquanto a requerida jamais contribuiu com qualquer ônus, tampouco reside ou utiliza os imóveis. Além disso, sustentam que foram surpreendidos com notificação extrajudicial da ré exigindo a desocupação do imóvel, gerando iminente risco de despejo, sem que tenham para onde ir. Requereram, inicialmente, a concessão da tutela de urgência para impedir qualquer ação da ré que visasse removê-los do imóvel, bem como a extinção judicial do usufruto nos termos do art. 1.410, VIII, do Código Civil, além da concessão da justiça gratuita. A decisão judicial de ID 3772184 deferiu os pedidos de justiça gratuita e tutela de urgência, reconhecendo a probabilidade do direito invocado e o risco de dano irreparável aos autores, diante da vulnerabilidade socioeconômica e da ocupação prolongada do imóvel sem oposição da usufrutuária. Em 08/02/2018, os autores emendaram a inicial (ID 3811689) pugnando para que fosse deferida a administração do apartamento 102, bloco B, do Ed. Sérgio Cardoso, situado nesta cidade à Trav. Timbó, n. 1348, bairro Pedreira, em vista da iminente penhora da garagem do imóvel, por falta de pagamento das taxas condominiais pela RÉ, com a entrega das chaves do imóvel. Deferi o pleito, da parte autora, na data de 14/06/2018 (ID 5333527). Em contestação com reconvenção (ID 5721712), a requerida sustentou inicialmente sua condição de pessoa idosa e hipossuficiente, requerendo prioridade na tramitação e assistência judiciária gratuita. Preliminarmente impugna o deferimento de justiça gratuita aos requerentes aduzindo que estes não juntam declaração de hipossuficiência, nem qualquer outro documento que indique dificuldade financeira. Alega ainda, em sede preliminar, pela inépcia do valor da causa, tendo em vista que o uso de imóveis que suplantam o valor de R$ 1.000.000,00 (hum milhão de reais), devendo, portanto, ser determinado o ajuste do valor da causa com o consequente recolhimento das custas processuais. No mérito, assevera que os imóveis foram por ela doados ao filho e à nora com reserva de usufruto, visando garantir seu sustento. Alega que o imóvel do Ed. Pedro Carneiro, n. 1050, apto 202-A foi cedido em comodato, e que vem tentando retomá-lo por necessidade financeira, negando o abandono dos bens. Aponta, ainda, que tentou alugar o imóvel do Ed. Sérgio Cardoso, mas enfrentou inadimplência do inquilino, razão pela qual passou a residir nesse imóvel. Por fim, formulou pedido reconvencional para que os autores fossem compelidos a desocupar o imóvel do Ed. Pedro Carneiro alegando esbulho por parte dos requerentes, pugnando pela cobrança de aluguel que a reconvinte está deixando de auferir com a locação do imóvel. Em réplica (ID 5898478), os autores impugnaram os argumentos defensivos da ré, apontando contradições em sua versão dos fatos. Argumentaram que a ré é proprietária de diversos bens imóveis e que viaja a lazer, não sendo crível a alegação de hipossuficiência. Sustentam que, ao contrário do afirmado, a requerida não reside nos imóveis e só buscou retomá-los após ser acionada judicialmente. Alegam que a ré agiu com má-fé ao obstruir a tentativa dos autores de alugar o imóvel do Ed. Sérgio Cardoso para quitar dívidas condominiais, criando situação vexatória para os autores. Na data de 08/06/2021 (ID 26384039), determinei que as partes delimitassem seus pedidos, sob pena de redistribuição do feito caso persistisse controvérsia quanto à propriedade ou à averbação dos imóveis. Determinei ainda, que a parte autora corrigisse o valor da causa, adequando-o ao valor real dos bens discutidos nos autos. Na mesma oportunidade deferi o pedido de gratuidade de justiça em favor da parte requerida, na qualidade de autora da reconvenção e solicitei manifestação das partes quanto à eventual existência de conexão com outras ações envolvendo os mesmos imóveis. Os autores peticionaram (ID 27830219) atribuindo o valor da causa em R$ 500.000,00 (Quinhentos mil reais), esclareceram os presentes autos não têm conexão com o processo nº 0826267-86.2017.8.14.0301 sob trâmite perante a 2ª Vara do Juizado Especial Cível de Belém/PA, que se trata de uma AÇÃO DE EXECUÇÃO DAS TAXAS CONDOMINIAIS do apartamento nº 102, bloco B, do Ed, Sérgio Cardoso, situado à Trav. Timbó, 1348, bairro Pedreira, Belém-PA, onde autor e ré destes autos, foram citados para pagar o débito, que incumbe à Ré, vez que esta alugou o imóvel, vem recebendo o valor dos aluguéis e não paga as taxas condominiais, na forma do art. 1.403, II, do CC/2002. Pugnaram que fosse determinado ao inquilino do imóvel que passasse a depositar em juízo o valor do aluguel para fazer frente ao pagamento das taxas condominiais atuais e as atrasadas, bem como, impostos e eventuais despesas com o imóvel. A parte autora peticionou (ID 29155234) requerendo o pagamento de R$3.000,00 (três mil reais) a título de aluguéis, a contar da notificação extrajudicial de desocupação do imóvel, desde 19/01/2018, até a efetiva reintegração. Esclareceu ainda, que não há qualquer conexão dos presentes autos com outros processos. A decisão de saneamento processual (ID 64683358) autorizou a produção de prova testemunhal e documental, indeferindo perícia. Posteriormente, as testemunhas arroladas pela ré foram desistidas e a audiência de instrução cancelada, momento em que determinei o julgamento antecipado da lide (ID 72023285). A requerida, por sua vez, apresentou manifestação com documentos para comprovar que atualmente reside no imóvel do Ed. Sérgio Cardoso, tendo encerrado contrato de locação anterior e passado a pagar as despesas condominiais, argumentando que o uso do bem se mantém e que não houve abandono. Por fim, os autores requereram a expedição de mandado de imissão na posse, fundamentando o pedido no acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Pará que, embora tenha reformado parcialmente a decisão liminar, reconheceu que a administração do imóvel deveria ser transferida aos autores, dada a inércia da ré e a existência de cobranças fiscais em nome dos nus-proprietários. É o relatório do essencial. Passo a decidir. Cuida-se de Ação de Extinção de Usufruto que ANTONIO CARLOS DIAS ALVES e ELIZABETH RUSSO RODRIGUES ALVES movem em face de MARIA DE JESUS MACHADO DIAS, pela qual requerem a extinção do usufruto que incide sobre os imóveis descritos na inicial. I – DAS PRELIMINARES: Inicialmente, analiso as preliminares suscitadas pela parte requerida em sede de contestação. 1. Da justiça gratuita dos autores: A parte requerida impugna o deferimento da gratuidade judiciária aos autores, sob alegação de que não comprovaram situação de hipossuficiência econômica. Ocorre que os autores, desde a exordial, formularam pedido fundamentado, sustentando a impossibilidade de arcar com os custos processuais sem prejuízo ao próprio sustento, sendo esse pedido corroborado por declaração expressa, além do fato de estarem representados por advogada atuando “pro bono”. Ademais, a jurisprudência consolidada admite a presunção “juris tantum” da declaração de hipossuficiência, sendo ônus da parte contrária infirmá-la por meio de prova robusta, o que não se verificou no caso. Rejeito, portanto, a preliminar. 2. Da inépcia do valor da causa: A parte requerida também questiona o valor atribuído à causa, afirmando que seria inferior ao real valor de mercado dos imóveis discutidos. Todavia, a parte autora, em observância à determinação deste juízo, corrigiu o valor da causa (ID 27830219), atribuindo-lhe o montante de R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais), o que é razoável e proporcional à natureza dos bens litigiosos e à causa de pedir. Rejeito, pois, a preliminar. II – DO MÉRITO: A controvérsia cinge-se à análise da existência ou não de causa extintiva do usufruto vitalício constituído em favor da requerida, nos termos do art. 1.410 do Código Civil, sobre dois imóveis: - Apartamento nº 202, bloco A, do Edifício Pedro Carneiro situado à Av. Magalhães Barata, n. 1050, bairro de São Brás, nesta cidade; - Apartamento nº 102, bloco B, do Edifício Sérgio Cardoso situado nesta cidade à Trav. Timbó, n. 1348, bairro Pedreira. 1. Do apartamento no Ed. Pedro Carneiro: No tocante ao imóvel situado na Av. Magalhães Barata, nº 1050, Ed. Pedro Carneiro, os próprios autores reconheceram que residem no imóvel desde o ano de 2004 com anuência da usufrutuária, ora ré, que lhes cedeu a posse a título gratuito, caracterizando-se um contrato de comodato verbal. Tal circunstância não configura "não uso" ou abandono pela usufrutuária. A jurisprudência é clara ao considerar que a cessão gratuita de imóvel usufruído a nu-proprietário caracteriza fruição indireta, afastando a incidência do art. 1.410, VIII, do Código Civil: "(...) Impossibilidade de se falar em extinção do usufruto pelo não uso ou pela não fruição da coisa sobre a qual recai o usufruto, a que alude o inciso VIII do art. 1.410 do atual CC - Autores que cederam o ventilado imóvel, por meio de comodato verbal, aos nu-proprietários - Fato que demonstra a fruição da coisa por parte dos usufrutuários, ou seja, dos autores" (TJ-SP - Apelação Cível nº 0122380-13.2009.8.26.0001, Rel. Des. José Marcos Marrone, j. 14/12/2011, 23ª Câmara de Direito Privado). A tese de extinção do usufruto por "não uso" exige, para sua configuração, a demonstração de que o usufrutuário tenha abandonado por completo o exercício do direito real, abstendo-se não apenas da posse direta, mas também de qualquer forma de fruição econômica ou social do bem. A finalidade do art. 1.410, VIII, do Código Civil é sancionar a inércia absoluta, que torna o direito de fruir sem função concreta no mundo dos fatos. Nesse sentido, a jurisprudência e a doutrina têm entendido que a cessão gratuita do bem usufruído, inclusive ao próprio nu-proprietário, não configura abandono, mas sim fruição indireta. Trata-se de manifestação da autonomia do usufrutuário, que pode exercer seu direito de forma direta ou mediata, por comodato, arrendamento ou locação. Assim, a cessão verbal realizada pela requerida em favor de seu filho e nora constitui exercício legítimo do usufruto, não havendo falar em não fruição. A posse dos autores decorre de liberalidade da usufrutuária, por meio de comodato tácito, situação que impede o reconhecimento da causa extintiva prevista no art. 1.410, VIII, do Código Civil. Ademais, o próprio acórdão proferido no Agravo de Instrumento nº 0805607-67.2018.8.14.0000, relatoria da Exma. Desª Margui, reconheceu que houve comodato entre mãe (usufrutuária) e filho (nu-proprietário), o que afasta qualquer alegação de esbulho ou abandono. O uso da coisa permaneceu indireto, mas contínuo. Pela necessidade de esclarecimento do caso transcrevo excerto da decisão ao norte mencionada. Vejamos: "(...) No que diz respeito ao direito à moradia dos autores, entendo que o argumento moral de que a agravante, enquanto mãe do autor, não poderia requerer o despejo de seus descendentes, os quais não têm onde morar, não prospera. Embora seja realmente desalentador ver mãe e filho litigando na esfera judicial, nos termos aqui propostos, ainda assim as questões jurídicas hão de ser vistas sob o prisma técnico, notadamente quando se vê, de igual modo, o filho beneficiado pela doação de imóveis por sua mãe litigar em Juízo para desconstituir o usufruto gravado em favor de sua beneficiadora. Percebo que realmente há indícios nos autos de que a agravante desrespeitou o dever contido no art. 1.403, inciso II, que lhe determina o custeio das prestações e tributos devidos pela posse e rendimento da coisa usufruída, tendo em vista a existência de ação judicial em desfavor dos autores para cobrança das taxas condominiais relativas ao imóvel da travessa Timbó, ora alugado a terceiros. Lembrando que estamos ainda diante de análise superficial sobre o pedido liminar, onde apenas é admitida uma cognição sumária dos fatos, tenho que a agravante possui direito real sobre os dois imóveis. Quanto ao primeiro, ocupado pelos agravados, não detém a posse direta, mas somente a indireta, uma vez que estabeleceu entre eles uma relação de comodato, permitindo-os utilizar o apartamento para sua moradia. Assim, nunca abandonou ou deixou de fazer justo uso do bem, mas tão somente deixou de ter a posse direta sobre o imóvel em favor dos comodatários. Em relação ao segundo, as provas carreadas aos autos indiciam que ficou por longo tempo desocupado, havendo dívida relativa a taxas condominiais que datam do ano de 2015 a 2017, somando um montante de mais de onze mil reais (ID n. 761303 - Pág. 5/10). Quanto a tal dívida, a agravante alega que somente deixou de custeá-las em decorrência das dificuldades financeiras que tem experimentado, todavia, permanecem os autores sofrendo as consequências da inadimplência. Comprovou a assinatura de contrato de locação em junho de 2018, quase seis meses, portanto, após a propositura da ação de extinção de usufruto (ID n. 761314 - Pág. 1/05). Há ainda comprovantes de pagamento de IPTU sobre o imóvel no Edifício Sérgio Cardoso, relativos aos anos de 2006, 2012 e 2015 – ID n. 761315 - Pág. 5 /11 e declarações de pintor e pedreiro, afirmando que realizaram reparos a mando da agravante no imóvel do Edifício Sérgio Cardoso, em 2018 – ID n. 765758 - Pág. 1 e ID n. 765759 - Pág. 1. Como se observa, entre o ano de 2015 e o ano de 2018 não há ainda nos autos elementos a indicar o justo uso do imóvel pela agravante. A doação do imóvel e a existência do usufruto vitalício sobre os dois imóveis é fato incontroverso nos autos, restando a controvérsia em relação à implementação da causa extintiva de tais usufrutos. Quanto ao tema, diz o código civil de 2002: Art. 1.410. O usufruto extingue-se, cancelando-se o registro no Cartório de Registro de Imóveis: I - pela renúncia ou morte do usufrutuário; II - pelo termo de sua duração; III - pela extinção da pessoa jurídica, em favor de quem o usufruto foi constituído, ou, se ela perdurar, pelo decurso de trinta anos da data em que se começou a exercer; IV - pela cessação do motivo de que se origina; V - pela destruição da coisa, guardadas as disposições dos arts. 1.407, 1.408, 2ª parte, e 1.409; VI - pela consolidação; VII - por culpa do usufrutuário, quando aliena, deteriora, ou deixa arruinar os bens, não lhes acudindo com os reparos de conservação, ou quando, no usufruto de títulos de crédito, não dá às importâncias recebidas a aplicação prevista no parágrafo único do art. 1.395; VIII - Pelo não uso, ou não fruição, da coisa em que o usufruto recai (arts. 1.390 e 1.399). (...) Destarte, entendo de fato preenchidos in casu os requisitos legais para deferimento da tutela de urgência, como feito pelo Juízo de origem, todavia, discordo da forma como a tutela foi deferida. Isso porque, a concessão da administração total do imóvel situado no Edifício Sérgio Cardoso, apartamento 102, bloco B, aos autores não implica necessariamente o recebimento da totalidade dos valores recebidos dos locatários do imóvel. Para tal conclusão, basta a leitura do art. 1.394 do CC/02, que dispõe acerca dos direitos do usufrutuário, tratando o direito à administração como direito autônomo em relação ao direito à percepção de frutos, dentre os quais os civis, como aluguéis. Ora, se o objetivo da tutela de urgência é sanar falhas da usufrutuária quanto às obrigações decorrentes do usufruto, entendo viável a concessão da tutela provisória apenas para atribuir a eles a administração do imóvel, com o pagamento de obrigações condominiais e tributárias decorrentes da própria res, devendo os valores remanescentes dos alugueis serem depositados em Juízo à disposição da usufrutuária, devidamente acompanhados da prestação de contas sobre os valores, impedindo-se, assim, que a tutela de urgência transmude-se em julgamento antecipado da lide, esvaziando por completo o objeto da demanda, tudo com base no disposto no art. 296 do CPC/15. Ante o exposto, conheço e nego provimento ao agravo interno, consoante fundamentação e, conheço parcialmente o agravo de instrumento e, na parte conhecida, dou parcial provimento, revogando a liminar concedida e modificando a tutela de urgência, para conceder aos autores a administração sobre o imóvel situado no Edifício Sérgio Cardoso, apartamento 102, bloco B, utilizando-se dos alugueis respectivos para o pagamento das taxas condominiais devidas e de eventuais obrigações tributárias sobre o bem, devendo os valores remanescentes serem depositados em Juízo à disposição da usufrutuária, tudo devidamente acompanhado das prestações de contas cabíveis, consoante fundamentação supra. É como voto." (Agravo de Instrumento nº 0805607-67.2018.8.14.0000, Julgado em 13/06/2022 - 20ª Sessão de Plenário Virtual da 1ª Turma de Direito Privado) Desta feita, não restou caracterizado o “não uso” da coisa pela usufrutuária em relação ao imóvel do Ed. Pedro Carneiro. A pretensão de extinção do usufruto, quanto a este bem, é improcedente. 2. Do apartamento no Ed. Sérgio Cardoso: Diversa é a situação do imóvel localizado na Trav. Timbó, nº 1348, Apartamento nº 102, bloco B, Edifício Sérgio Cardoso. Quanto a este, ficou cabalmente demonstrado nos autos que a requerida deixou de exercer qualquer uso efetivo ou fruição direta ou indireta entre os anos de 2015 e 2018, sendo omissa inclusive no pagamento das obrigações condominiais e tributárias. Com efeito, o usufruto trata-se de direito real, em que o proprietário permanece na posse indireta e com poder de disposição do bem, todavia, transfere a terceiro a faculdade de usar, administrar e extrair os frutos do bem (art. 1.394, CC). Sobre o assunto, Sílvio de Salvo Venosa ensina que “é um direito real transitório que concede a seu titular o poder de usar e gozar durante certo tempo, sob certa condição ou vitaliciamente, de bens pertencentes a outra pessoa, a qual conserva a sua substância” (Direito Civil: direitos reais 4ª Ed. – São Paulo: Atlas, 2004, v.5, p. 457). Exsurge, desse contexto, relação jurídica na qual o usufrutuário – na medida em que é o titular exclusivo dos poderes de uso e fruição – se obriga, por força do disposto no art. 1.228, § 1º, do Código Civil, a exercer seu direito em consonância com as finalidades, social e econômica, a que se destina a propriedade. Segundo a legislação de regência, entre as diversas formas previstas para a extinção do usufruto, como a renúncia, a morte do usufrutuário, destruição da coisa ou inobservância das obrigações legais, destaca-se a extinção pelo uso ou não fruição do bem, antevista no art. 1.410, inc. VIII, do Código Civil. Art. 1.410. O usufruto extingue-se, cancelando-se o registro no Cartório de Registro de Imóveis: (...) VIII - pelo não uso, ou não fruição, da coisa em que o usufruto recai. É com o escopo de assegurar o cumprimento dessa função social, já erigida à categoria de direito fundamental pela Constituição de 1988, em seu art. 5º, inc. XXIII, que o Código Civil de 2002 instituiu o não uso ou a não fruição da coisa como causa extintiva do usufruto. Assim, o não uso ou não fruição do imóvel gravado de cláusula de usufruto tem o condão de extingui-lo. Esta é exatamente a situação dos autos. A ausência de pagamento das taxas condominiais resultou em cobrança judicial dirigida contra os autores, que são apenas nus-proprietários. Houve tentativa destes de alugar o bem para saldar a dívida, obstada pela ré, que apenas promoveu a locação após o ajuizamento da presente demanda, e mesmo assim, por curto período, pois rescindido por inadimplemento do locatário. A própria relatora do agravo de instrumento reconheceu a inércia da ré, afirmando que “entre o ano de 2015 e o ano de 2018 não há ainda nos autos elementos a indicar o justo uso do imóvel pela agravante”. Portanto, resta configurado o abandono e não uso do bem pela usufrutuária, nos termos do art. 1.410, VIII, do Código Civil. Impõe-se, assim, o reconhecimento da extinção do usufruto sobre o imóvel do Ed. Sérgio Cardoso. III – DA RECONVENÇÃO: A parte requerida, MARIA DE JESUS MACHADO DIAS, na qualidade de reconvinte, formulou pedido reconvencional de reintegração de posse do imóvel localizado na Avenida Magalhães Barata, nº 1050, apartamento 202, bloco A, Edifício Pedro Carneiro, nesta cidade de Belém/PA, e pleiteou, ainda, a condenação dos reconvindos, ANTONIO CARLOS DIAS ALVES e ELIZABETH RUSSO RODRIGUES ALVES, ao pagamento de aluguéis mensais (lucros cessantes) pelo uso indevido do referido bem após a notificação para desocupação. Com efeito, dos autos extrai-se que o imóvel em litígio foi doado pela reconvinte ao filho e à nora, autores da presente ação, com reserva de usufruto vitalício. Em sua petição inicial, os autores expressamente reconhecem que a posse que exercem sobre o imóvel decorre de autorização da requerida, o que evidencia que a posse exercida pelos autores decorre de contrato de comodato verbal firmado com a reconvinte. Vejamos: “(...) residem no apartamento 202, bloco A, Edifício Pedro Carneiro, com seus filhos, desde o ano de 2004, com o consentimento da genitora do autor, MARIA DE JESUS MACHADO DIAS, usufrutuária vitalícia do bem (...)” (ID 3741512) Além disso, restou comprovado de forma inequívoca nos autos que, em 16/01/2017, a requerida notificou extrajudicialmente os autores para desocuparem o imóvel, pretensão que não foi atendida, o que levou os autores, ao invés de restituírem o bem, a ajuizarem a presente ação buscando a extinção do usufruto. Nesse contexto, a jurisprudência pátria é firme no sentido de que, cessado o comodato mediante notificação extrajudicial, a posse anteriormente justa torna-se injusta, caracterizando-se o esbulho caso não haja a restituição voluntária do imóvel, como bem demonstram os julgados abaixo: “Esbulho que se caracterizou pela não desocupação espontânea do imóvel, a partir do momento em que teve ciência inequívoca da intenção de retomada pela demandante. Possibilidade de arbitramento de aluguéis.” (TJ-SP – ApCív 1090269-93.2022.8.26.0100, Rel. Des. Sergio Gomes, j. 01/07/2024) “A notificação judicial prévia transforma a posse justa do comodatário em injusta, se acaso não devolver o imóvel no prazo consignado... Reintegração de posse pleiteada pelo comodante, ora apelado, que deve ser deferida.” (TJ-RJ – ApCív 0025527-52.2017.8.19.0066, Rel.ª Des.ª Maria Helena Pinto Machado, j. 17/11/2022) Não prospera, portanto, a tese de que a posse dos autores continuava legítima após a notificação. A jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, no agravo de instrumento interposto contra a decisão que inicialmente concedeu a tutela de urgência aos autores, reconheceu a existência da relação de comodato, mas também indicou que a discussão quanto à permanência dos autores no imóvel dependia de apreciação de mérito, não sendo possível decisão definitiva em sede liminar. Com o desenvolvimento da instrução processual e a análise integral das provas, verifica-se que a reconvinte exerceu posse legítima como usufrutuária, cedeu o bem aos autores por meio de comodato verbal, e posteriormente manifestou sua intenção de retomada mediante notificação formal e prévia, conforme prevê a boa técnica jurídica. A permanência dos autores no imóvel, sem justa causa e sem restituir o bem, configura posse injusta e esbulho, nos termos dos artigos 1.210 e 1.196 do Código Civil. Impõe-se, pois, o reconhecimento do direito da reconvinte à reintegração de posse, deferindo-se a medida requerida. Quanto ao pedido de lucros cessantes, embora a reconvenção tenha sido inicialmente omissa quanto à fixação de valor, a reconvinte apresentou posterior petição (ID 29155234), indicando expressamente o montante de R$ 3.000,00 mensais, a contar da data da notificação extrajudicial (19/01/2018), até a efetiva desocupação do imóvel. Embora tal formulação posterior não tenha possibilitado a apuração imediata do valor debatido, o pedido é juridicamente possível e encontra amparo no artigo 582 do Código Civil, segundo o qual, não restituído o bem, o comodatário deve indenizar o comodante pelo uso indevido, inclusive com o pagamento de aluguéis proporcionais. A jurisprudência, mais uma vez, é pacífica nesse sentido: “Devida a condenação da ré ao pagamento de aluguéis após o prazo dado para desocupação, nos termos do art. 582 do Código Civil, bem como das despesas relativas ao condomínio e IPTU.” (TJ-SP – ApCív 1090269-93.2022.8.26.0100, Rel. Des. Sergio Gomes, j. 01/07/2024) Desta forma, reconheço o direito da reconvinte à percepção de lucros cessantes decorrentes da indevida ocupação do imóvel, os quais deverão ser apurados em fase de liquidação de sentença por arbitramento, observando-se o valor médio de mercado do aluguel do bem, bem como o período de ocupação indevida. IV – DISPOSITIVO Ante o exposto, com fulcro no art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil: 1. JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados por ANTONIO CARLOS DIAS ALVES e ELIZABETH RUSSO RODRIGUES ALVES, para declarar extinto o usufruto vitalício constituído em favor de MARIA DE JESUS MACHADO DIAS sobre o imóvel localizado à Trav. Timbó, nº 1348, apartamento 102, bloco B, Ed. Sérgio Cardoso, nesta cidade, determinando-se o cancelamento da averbação junto ao Cartório de Registro de Imóveis competente, mediante o trânsito em julgado. 2. JULGO IMPROCEDENTE o pedido de extinção do usufruto sobre o imóvel localizado à Av. Magalhães Barata, nº 1050, apartamento 202, bloco A, Ed. Pedro Carneiro, reconhecendo que a requerida o cedeu em comodato aos autores, caracterizando fruição indireta. 3. JULGO PROCEDENTE o pedido reconvencional formulado por MARIA DE JESUS MACHADO DIAS para: - Determinar, após o trânsito em julgado, a reintegração da reconvinte na posse do imóvel localizado na Av. Magalhães Barata, nº 1050, apartamento 202, bloco A, Edifício Pedro Carneiro, nesta cidade, expedindo-se, para tanto, Mandado de Desocupação Voluntária do imóvel no prazo de 30 dias. Decorrido o prazo, expeça-se Mandado de Reintegração de Posse; - Reconhecer o direito à percepção de aluguéis (lucros cessantes) referentes à ocupação indevida do imóvel pelos reconvindos, desde o fim do prazo da notificação extrajudicial (ID 3748546 - Pág. 1) até a efetiva restituição, os quais deverão ser apurados em sede de liquidação de sentença por arbitramento, nos termos do art. 509, inciso I, do Código de Processo Civil; 4. Fixam-se os ônus sucumbenciais, nos seguintes termos: - Condeno a parte autora ao pagamento de 50% das custas processuais e honorários advocatícios que fixo em 10% sobre o valor da causa, nos termos do art. 85, §2º, do CPC, suspensa a exigibilidade por força da justiça gratuita. - Condeno a parte requerida ao pagamento dos 50% restantes, também com base no art. 85, §2º, do CPC, igualmente suspensa a exigibilidade em virtude da justiça gratuita deferida. Havendo Embargos de Declaração tempestivos (art. 1.022 do NCPC), serão recebidos sem efeito suspensivo; o prazo recursal será interrompido (art. 1.026 do NCPC); e a 3ª UPJ, mediante ATO ORDINATÓRIO, deverá intimar o(s) embargado(s) para, querendo, manifestar(em)-se, no prazo de 05 (cinco) dias úteis (art. 1.023, §2º, do NCPC), certificando-se o ocorrido e em seguida fazendo conclusão dos autos para apreciação. Havendo apelação, intime-se o apelado para apresentar, caso queira, Contrarrazões, no prazo legal. Após, certifique-se e encaminhem-se os autos ao E. Tribunal de Justiça do Estado do Pará para os devidos fins. Na hipótese de trânsito em julgado, expeça-se ofício ao Cartório de Registro de Imóveis e, nada sendo requerido, arquive-se com baixa da distribuição. Belém, (data constante na assinatura digital). DOCUMENTO ASSINADO DIGITALMENTE CONFORME LEI 11.419/2006, CONFORME IMPRESSÃO À MARGEM 08
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