Processo nº 0802133-55.2023.8.15.0301
ID: 282805743
Tribunal: TJPB
Órgão: 2ª Vara Mista de Pombal
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Nº Processo: 0802133-55.2023.8.15.0301
Data de Disponibilização:
29/05/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
FELICIANO LYRA MOURA
OAB/PB XXXXXX
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TRIBUNAL DE JUSTIÇA DA PARAÍBA COMARCA DE POMBAL Juízo da 2ª Vara Mista de Pombal Fórum Promotor Nelson da Nóbrega Rua José Guilhermino de Santana, nº 414, Centro, Pombal - PB - CEP: 58840-000 Tel.: …
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DA PARAÍBA COMARCA DE POMBAL Juízo da 2ª Vara Mista de Pombal Fórum Promotor Nelson da Nóbrega Rua José Guilhermino de Santana, nº 414, Centro, Pombal - PB - CEP: 58840-000 Tel.: (83) 3431-2298 / 99142-2743; e-mail: pom-vmis02@tjpb.jus.br v.1.00 SENTENÇA Nº do Processo: 0802133-55.2023.8.15.0301 Classe Judicial: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) Assunto: [Direito de Imagem, Direito de Imagem, Cartão de Crédito] AUTOR: MARIA DE FATIMA SANTOS DE SOUSA REU: BANCO PAN Vistos. Trata-se de ação de repetição de indébito c/c indenizatória por danos morais proposta por MARIA DE FATIMA SANTOS DE SOUSA em desfavor do BANCO PAN S/A. A parte requerente questiona a existência descontos referente a cartão de crédito de margem consignada (contrato nº0229730072186), o qual não teria contratado. Pede a gratuidade da justiça, a inversão do ônus da prova, a inexigibilidade do negócio, a devolução em dobro dos valores descontados e a condenação por danos morais. Indeferida a tutela antecipada de urgência. Citado, o promovido apresentou contestação, suscitando preliminar prescrição, decadência, falta de interesse de agir, comprovante de residência desatualizado, ausência de extrato bancário, conexão e impugnação ao valor da causa. No mérito, a improcedência dos pedidos formulados na exordial e, em caso de anulação do negócio jurídico, a devolução dos valores recebidos pelo autor. Juntou documentos, dentre os quais contrato do empréstimo, documentos das testemunhas, faturas do cartão de crédito e TED. Impugnação à contestação. Intimados para especificarem as provas que pretendiam produzir, a parte autora não se manifestou e o promovido requereu a intimação da autora para juntar extratos bancários da conta de sua titularidade. Deferido o pedido, intimada a autora, o prazo decorreu sem manifestação. Vieram-me os autos conclusos. É o relatório. Fundamento e decido. I - DO JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE O Código de Processo Civil disciplina que o Magistrado deve velar pela rápida solução do litígio (art. 139, II), bem assim que conhecerá diretamente do pedido, proferindo sentença, quando a questão de mérito for unicamente de direito, ou, sendo de direito e de fato, não houver necessidade de produzir provas em audiência (art. 355 do CPC/15). É interessante afirmar que o julgamento antecipado da lide não constitui, quando satisfeitos os requisitos legais, constrangimento ou cerceamento de defesa. Claro que, caso entenda que a prova carreada aos autos não é suficiente para firmar sua convicção, o Magistrado pode determinar a dilação probatória. No presente feito, não há necessidade de dilação probatória, bem como é improvável a conciliação, de modo que em homenagem aos princípios da economia processual e da celeridade, é imperativo julgar antecipadamente a lide. II - DAS QUESTÕES PROCESSUAIS II.1 - DA FALTA DE INTERESSE DE AGIR A preliminar de falta de interesse processual não comporta acolhimento. O interesse de agir em juízo encontra-se presente quando da conjugação da necessidade com a utilidade da tutela jurisdicional postulada para a solução do conflito. Vale dizer, há interesse quando a prestação jurisdicional requestada for capaz de trazer ao demandante alguma utilidade do ponto de vista prático. Na hipótese sub judice, a tutela jurisdicional pleiteada mostra-se útil e, notadamente, necessária. De fato, tem aptidão a outorgar à parte demandante o bem da vida pleiteado, contanto comprovadas as alegações contidas na peça vestibular no curso da instrução processual (utilidade). De outro lado, não se pode olvidar a oposição da parte demandada ao pedido (necessidade) o que reveste a pretensão de interesse processual. O caso, portanto, demanda uma resposta jurisdicional de mérito. Por tais fundamentos, afasto a preliminar aventada. II.2 - DA PRESCRIÇÃO Inicialmente, urge firmar qual prazo aplica-se à hipótese versada nos autos. É cediço que o Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras, conforme corretamente sustentado pela parte autora e em consonância com entendimento firmado pelo STJ na Súmula nº 297: “Súmula nº 297. O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras.” Desse modo, e constatando-se que o caso concreto versado nos autos revela, em tese, a ocorrência de fato do serviço, inequívoca a aplicação do artigo 27, do diploma consumerista, a reconhecer o prazo prescricional quinquenal na relação sub examine. Prescreve em cinco anos a pretensão à reparação pelos danos causados por fato do produto ou do serviço, sendo este prazo aplicável às instituições financeiras (art. 27, da Lei nº 8.078, de 11/09/1990, e Súmula nº 297, do STJ). Nesse sentido, é a jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado da Paraíba: EMENTA: DECLARATÓRIA C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. CONTA BANCÁRIA UTILIZADA PARA RECEBIMENTO DE SALÁRIO. COBRANÇA DE SERVIÇOS SUPOSTAMENTE NÃO CONTRATADOS. RESTITUIÇÃO DOS VALORES DESCONTADOS E DANOS EXTRAPATRIMONIAIS. PROCEDÊNCIA PARCIAL DO PEDIDO. APELAÇÃO DO BANCO PROMOVIDO. PREJUDICIAL DE MÉRITO. PRESCRIÇÃO. RELAÇÃO DE CONSUMO. APLICAÇÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL QUINQUENAL, PREVISTO NO ART. 27 DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR, CONTADO DO CONHECIMENTO DO DANO E DE SUA AUTORIA. CONDENAÇÃO LIMITADA AOS CINCO ANOS ANTERIORES AO AJUIZAMENTO. REJEIÇÃO. MÉRITO. DESCONTO DE TARIFA DE SERVIÇOS (CESTA B. EXPRESSO). ALEGAÇÃO DE QUE A CONTA ERA DE NATUREZA COMUM. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DA EFETIVA CONTRATAÇÃO POR MEIO DE INSTRUMENTO HÁBIL. ILEGITIMIDADE DAS COBRANÇAS. DESCUMPRIMENTO DO DISPOSTO NA RESOLUÇÃO N.º 3.402/2006 DO BANCO CENTRAL. RESPONSABILIDADE INDENIZATÓRIA DA INSTITUIÇÃO BANCÁRIA. REPETIÇÃO DO INDÉBITO. ERRO INESCUSÁVEL. DEVOLUÇÃO EM DOBRO, COM FULCRO NO ART. 42, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. CONTA DESTINADA A RECEBIMENTO DE VERBA SALARIAL. NATUREZA ALIMENTAR. LESÃO EXTRAPATRIMONIAL PRESUMIDA. PRECEDENTES DESTE TJPB. QUANTUM INDENIZATÓRIO. FIXAÇÃO PROPORCIONAL, RAZOÁVEL E CONDIZENTE COM A EXTENSÃO DO DANO. APELO DESPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA. 1. Prescreve em cinco anos a pretensão à reparação pelos danos causados por fato do produto ou do serviço, iniciando-se a contagem do prazo a partir do conhecimento do dano e de sua autoria. Inteligência do art. 27, do Código de Defesa do Consumidor. 2. A Resolução n.º 3.402/2006, do Banco Central, que dispõe sobre a prestação de serviços de pagamento de salários, aposentadorias e similares sem cobrança de tarifas bancárias, veda à Instituição Financeira cobrar dos beneficiários, a qualquer título, tarifas destinadas ao ressarcimento pela realização dos serviços. 3. Ao alegar que a conta era de natureza comum e não conta-salário, a Instituição Financeira atrai para si o dever de demonstrar tal alegação, sob pena de, restando incontroversa a cobrança indevida da “cesta de serviços”, ser condenada a restituir os valores indevidamente descontados a esse título. Precedentes das Câmaras Cíveis deste Tribunal de Justiça. 4. O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável. Inteligência do art. 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor. 5. Na fixação do quantum indenizatório, o magistrado deve sopesar a situação financeira das partes, o abalo experimentado pela vítima, a duração do dano, a fim de proporcionar uma compensação econômica para esta, e impor um caráter punitivo ao causador do dano, impedindo a prática de tais ilícitos. VISTOS, relatados e discutidos os presentes autos. ACORDA a Quarta Câmara Especializada Cível deste Tribunal de Justiça, por unanimidade, acompanhando o voto do Relator, em conhecer da Apelação para, rejeitada a prejudicial de prescrição, no mérito, negar-lhe provimento. (TJPB. 0800880-37.2021.8.15.0031, Rel. Des. Romero Marcelo da Fonseca Oliveira, APELAÇÃO CÍVEL, 4ª Câmara Cível, juntado em 07/12/2021) Ademais, ainda é necessário destacar que, para verificação do início de fluência do prazo prescricional, o direito civil brasileiro adota a teoria da actio nata, vislumbrando-a em uma percepção subjetiva. Assim, inicia-se o curso do prazo prescricional no momento em que o titular do direito subjetivo violado tem ciência de sua violação. Aplicando-se tal teoria ao caso concreto submetido a juízo, tem-se que, desde o primeiro desconto, a parte autora tinha ciência da alegada violação a seu direito subjetivo, iniciando-se, naquele momento, o prazo prescricional. De fato, assiste parcial razão à parte autora ao asseverar que a narrativa contida nos autos aponta para a existência de uma obrigação de trato sucessivo, hipótese em que se renova mês a mês o prazo prescricional. A prescrição, in casu, verificar-se-á relativamente a cada uma das parcelas e, no caso dos autos, atingirá as parcelas referentes ao período anterior a 17/11/2018, pois distantes a mais de 5 (cinco) anos do ajuizamento da ação (11/11/2023). Deste modo, não tenho por fulminadas as parcelas pela prescrição porque o desconto das parcelas iniciou em novembro de 2019 (vide id. 82309935 – Pág. 3). II.3 – DA CONEXÃO Não há conexão entre as ações que têm por fundamento contratos diversos. Nos termos do artigo 55 do NCPC, reputam-se conexas às ações quando lhes for comum o pedido ou a causa de pedir, o que autoriza a reunião dos processos de ofício ou a requerimento, a fim de serem julgadas simultaneamente para evitar decisões conflitantes, exceto quando uma delas já houver sido sentenciada. Em se tratando de fatos distintos, não havendo identidade de causa de pedir a ensejar a suposta prejudicialidade das demandas, não há que se falar em conexão. É exatamente o caso dos autos, uma vez que o processo apontado pela parte ré em sua peça resistiva não preenche os requisitos que ensejariam a conexão, ou seja, os elementos da demanda são diversos e não há prejudicialidade probatória entre eles. Não há entre os feitos apontados pela parte ré risco de decisões conflitantes ou contraditórias, de modo que não há razão para a reunião deles para julgamento conjunto. Dessa forma, rejeito a preliminar de conexão. II.4 - DA DECADÊNCIA Em suas razões, o demandado afirma que se operou a decadência do direito material, nos termos do art. 178, do Código Civil, uma vez que já decorreu 04 (quatro) anos entre a data da celebração do contrato e o ajuizamento da ação. Não assiste razão ao promovido. O objeto da presente demanda diz respeito à anulação do negócio jurídico firmado entre as partes, cujos descontos ocorrem mensamente no benefício previdenciário da autora enquanto vigente o contrato. A relação jurídica em análise é de trato sucessivo, consequentemente, a decadência do direito do consumidor não ocorre enquanto a violação ao direito se renova periodicamente pelo fornecedor. Neste sentido, é a jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado da Paraíba: RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. IMPROCEDÊNCIA. APELAÇÃO CÍVEL. PREJUDICIAL DE PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA. REJEIÇÃO. MÉRITO. CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO. COMPROVANTE DE SAQUES E COMPRAS NO CARTÃO DE CRÉDITO PELA PARTE AUTORA. ANUÊNCIA TÁCITA AOS TERMOS DO CONTRATO. DESCONTOS EM FOLHA DEVIDOS. INEXISTÊNCIA DE ATO ILÍCITO. PRECEDENTES DESTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. DESPROVIMENTO. 1. A jurisprudência sedimentada no âmbito do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que, fundando-se o pedido na ausência de contratação de empréstimo com instituição financeira, ou seja, em decorrência de defeito do serviço bancário, aplica-se o prazo quinquenal previsto no art. 27 do Código de Defesa do Consumidor. 2. Contudo, o termo inicial da contagem do prazo prescricional é a data do último desconto realizado no benefício previdenciário da apelante. 3. Assim, cuidando-se de descontos efetivados mês a mês no benefício previdenciário do autor, portanto de trato sucessivo, não há que se falar em prescrição trienal, vez que os descontos continuam sendo feitos, nem decadência do direito. 4. Restou evidenciada a efetiva contratação do cartão de crédito, sem nenhum indício de fraude nos autos, devendo, pois, ser mantida a sentença recorrida. VISTOS, relatados e discutidos os presentes autos. ACORDAM os integrantes da Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado da Paraíba, à unanimidade, rejeitar a prejudicial de prescrição e decadência e, no mérito, negar provimento ao apelo, nos termos do voto do relator e da certidão de julgamento retro. (STJ. 0834702-58.2020.8.15.2001, Rel. Des. José Aurélio da Cruz (vago), APELAÇÃO CÍVEL, 2ª Câmara Cível, juntado em 24/02/2022) (destaquei). Assim, por óbvio, não se iniciou a contagem do prazo decadencial, razão pela qual tal prejudicial resta rejeitada. II.5 - DO COMPROVANTE DE ENDEREÇO O promovido suscitou preliminar de indeferimento da exordial por carência de documentos necessários para a propositura da demanda, uma vez que aponta que o autor acostou comprovante de residência desatualizado. Nesse sentido, o entendimento do Tribunal de Justiça da Paraíba é de que a mera indicação do endereço basta para o prosseguimento inicial do feito. In verbis: “APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RESTAURAÇÃO DE REGISTRO CIVIL. COMPROVANTE DE RESIDÊNCIA ACOSTADO PELO AUTOR PERTENCENTE A TERCEIRO. DETERMINAÇÃO DE EMENDA. DECURSO DE PRAZO SEM MANIFESTAÇÃO. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM JULGAMENTO DE MÉRITO. IRRESIGNAÇÃO. IRRELEVÂNCIA DO COMPROVANTE DE RESIDÊNCIA ESTAR EM NOME DE TERCEIRO. HIPÓTESE NÃO PREVISTAS ENTRE AQUELAS ENCARTADAS NO ART.319 DO CPC. PROVIMENTO — O comprovante de endereço em nome próprio não constitui documento indispensável à propositura da ação, não estando elencado no art. 319 do CPC como requisito da petição inicial, de sorte que se entende suficiente a indicação do local de residência. (TJMG; APCV 0103384-74.2015.8.13.0079; Contagem; Décima Câmara Cível; Rel. Des. Claret de Moraes; Julg. 21/05/2019; DJEMG 31/05/2019). VISTOS, RELATADOS E DISCUTIDOS os presentes autos acima identificados. ACORDA a Egrégia Terceira Câmara Cível do Colendo Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em dar provimento ao recurso, para anular a sentença, nos termos do voto do relator. (TJPB. 0801249-96.2018.8.15.0981, Rel. Des. Saulo Henriques de Sá e Benevides, APELAÇÃO CÍVEL, 3ª Câmara Cível, juntado em 26/06/2020)” II.6 – INDEFERIMENTO DA INICIAL – AUSÊNCIA DE EXTRATOS BANCÁRIOS O promovido suscita preliminar em virtude da parte autora não ter juntado extrato bancário para demonstrar o não recebimento do valor referente ao empréstimo discutido. Cabe às partes a instrução do processo, sendo indevida a pretensão de transpor tal obrigação para a Escrivania deste Juízo. O ônus da prova em relação a fato impeditivo, modificativo ou extintivo do autor compete ao promovido, o qual juntou fatura do cartão para comprovar o saque dos valores aduzidos pela promovente. Além disso, a obtenção de extratos bancários é medida corriqueira e para a qual não se verifica na praxe grandes dificuldades pelo titular da conta bancária. Nesse caso, o ônus da prova é da parte autora, que deveria comprovar que não recebeu, recebeu e não usou ou devolveu os valores creditados em sua conta bancária e desconstituir a prova do repasse de valores, por exemplo, sob pena de arcar com os ônus de sua inércia. II.6 - DO VALOR DA CAUSA Na ação em que há cumulação de pedidos (inexigibilidade do débito e indenização por danos materiais e morais), o valor da causa corresponderá a quantia correspondente à soma dos valores de todos eles, nos termos do art. 292, VI, CPC, razão pela, não se afigura necessário a correção de ofício desse montante, visto que o valor da causa é resultante da soma dos valores requeridos a título de indenização, somados a cifra do empréstimo que a autora pretende ver desconstituído por entender indevido (dano moral (R$6.600,00) + dano material (R$ 6.600,00) + repetição de indébito (R$ 4.557,12). Portanto, afasto a preliminar aventada. Sem mais preliminares ou prejudiciais, passo ao mérito. III – DO MÉRITO III.1 - DA APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR A relação jurídica é de consumo (art.3º, §2º, CDC). Portanto aplico ao presente caso as normas jurídicas do Código de Defesa do Consumidor. III.2 - DA INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA A parte autora é indubitavelmente hipossuficiente em relação à ré. Ademais, suas alegações são verossímeis. Assim, inverto o ônus da prova com espeque no artigo 6.º, inciso VIII, do Código de Defesa do Consumidor: “Art. 6º São direitos básicos do consumidor: VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências;” Nesse sentido: “É pacífico o entendimento desta Corte de que a aplicação do art. 6º, inciso VIII, do CDC depende da análise, pelas instâncias ordinárias, da verossimilhança da alegação e da demonstração de hipossuficiência do consumidor.” (STJ, AgInt no AREsp 1005323/MG, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 16/03/2017, DJe 28/03/2017) Portanto, não há que se falar em indeferimento da inversão do ônus da prova. III.3 - DA RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA Por se tratar de prestação de serviço, derivada da relação de consumo, a responsabilidade civil do réu é objetiva, ou seja, independente de culpa, consoante o artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor: “Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.” III.4 - DA NULIDADE DO CONTRATO Tratando-se de ação que visa aferir a responsabilidade civil do requerido para responder pelos prejuízos teoricamente suportados pela parte autora, faz-se necessário analisar os três requisitos necessários para sua configuração, a saber: conduta ilícita, dano e nexo causal. Cumpre destacar que a relação estabelecida entre as partes é regida pelo Código de Defesa do Consumidor, uma vez que as posições do autor e do réu se amoldam às definições legais de fornecedor de produtos e de serviços e consumidor (ainda que lato sensu), respectivamente. É princípio básico em matéria de relações de consumo que sendo verossímil a afirmação do consumidor sobre um determinado fato, inverte-se o ônus da prova a esse respeito (artigo 6º, VIII, do CDC). Nesse cenário, o fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços (artigo 14 do CDC). A responsabilização só não vai ocorrer quando o fornecedor provar que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste ou a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro (artigo 14, parágrafo 3º, incisos I e II, CDC). Dessa forma, considerando que o autor nega a existência de contratação de cartão de crédito consignado, constitui ônus do banco-réu a prova da origem e validade do débito. Não teria, deveras, o suposto contratante como fazer prova de fato negativo. O autor relata que não celebrou o contrato de cartão de crédito consignado nº 0229730072186 com o promovido. Por seu turno, o promovido alegou que as cobranças impugnadas nesses autos dizem respeito à contratação de cartão de crédito consignado devidamente pactuado pela autora e com autorização expressa da promovente para a Reserva de Margem Consignável em seu benefício, com disponibilização de quantia para saque autorizado no valor de R$1.278,98, inexistindo qualquer irregularidade na conduta do promovido. Para suportar suas alegações, o Banco juntou aos autos o contrato e documento de identificação (autora e testemunhas) para comprovar que o desconto efetuado na conta corrente da parte autora decorreu de efetiva contratação do cartão de crédito consignado e comprovante de transferência via TED. No caso em tela, o contrato acostado aos autos contém apenas a marca de digital da consumidora com a assinatura de duas testemunhas, desprovida da assinatura a rogo por terceiro (vide id. 84368960), o que, a meu sentir, demonstra suficientemente a invalidade da contratação. É inconteste nos autos que a autora é analfabeta (id.84368960 - Pág. 6) e, apesar de a pessoa não alfabetizada não ser considerada incapaz para os atos da vida civil, sua manifestação de vontade depende da forma escrita que comprove a sua real compreensão sobre o conteúdo do negócio entabulado. Dispõe o artigo 166, incisos IV e V, do Código Civil que é nulo o negócio jurídico quando não revestir a forma prescrita em lei ou for preterida alguma solenidade que a lei considere essencial para a sua validade. O negócio jurídico celebrado com pessoa analfabeta deve ser formalizado por instrumento público ou mediante procuração pública. A doutrina e a jurisprudência do STJ têm admitido que a assinatura se dê de forma hológrafa (a rogo), acompanhada de duas testemunhas. O art. 595 do Código Civil exige que: "No contrato de prestação de serviço, quando qualquer das partes não souber ler, nem escrever, o instrumento poderá ser assinado a rogo e subscrito por duas testemunhas". A instituição financeira tinha plena ciência da condição de analfabeto do consumidor, uma vez que seu próprio RG não possui assinatura, e não poderia, em hipótese alguma, ter firmado contrato apenas com a aposição da impressão digital da autora e subscrito por duas testemunhas sem a assinatura a rogo de terceiro. Destarte, o contrato de empréstimo de cartão consignado realizado por pessoa analfabeta, sem assinatura a rogo, apesar de a subscrição por duas testemunhas, é nulo de pleno direito, por ausência de forma legal, devendo ser restabelecido o denominado "status quo ante". Nesse sentido, é o entendimento do STJ: DIREITO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE NEGÓCIO JURÍDICO C/C PEDIDOS DE RESTITUIÇÃO DE VALORES E COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS. CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO FIRMADO POR IDOSO INDÍGENA ANALFABETO. VALIDADE. REQUISITO DE FORMA. ASSINATURA DO INSTRUMENTO CONTRATUAL A ROGO POR TERCEIRO, NA PRESENÇA DE DUAS TESTEMUNHAS. ART. 595 DO CC/02. PROCURADOR PÚBLICO. DESNECESSIDADE. 1. Ação ajuizada em 20/07/2018. Recurso especial interposto em 22/05/2020 e concluso ao gabinete em 12/11/2020. 2. O propósito recursal consiste em dizer acerca da forma a ser observada na contratação de empréstimo consignado por idoso indígena que não sabe ler e escrever (analfabeto).3. Os analfabetos, assim como os índios, detêm plena capacidade civil, podendo, por sua própria manifestação de vontade, contrair direitos e obrigações, independentemente da interveniência de terceiro. 4. Como regra, à luz dos princípios da liberdade das formas e do consensualismo, a exteriorização da vontade dos contratantes pode ocorrer sem forma especial ou solene, salvo quando exigido por lei, consoante o disposto no art. 107 do CC/02. 5. Por essa razão, em um primeiro aspecto, à míngua de previsão legal expressa, a validade do contrato firmado por pessoa que não saiba ler ou escrever não depende de instrumento público. 6. Noutra toada, na hipótese de se tratar de contrato escrito firmado pela pessoa analfabeta, é imperiosa a observância da formalidade prevista no art. 595 do CC/02, que prevê a assinatura do instrumento contratual a rogo por terceiro, com a subscrição de duas testemunhas. 7. Embora o referido dispositivo legal se refira ao contrato de prestação de serviços, deve ser dada à norma nele contida o máximo alcance e amplitude, de modo a abranger todos os contratos escritos firmados com quem não saiba ler ou escrever, a fim de compensar, em algum grau, a hipervulnerabilidade desse grupo social. 8. Com efeito, a formalização de negócios jurídicos em contratos escritos - em especial, os contratos de consumo - põe as pessoas analfabetas em evidente desequilíbrio, haja vista sua dificuldade de compreender as disposições contratuais expostas em vernáculo. Daí porque, intervindo no negócio jurídico terceiro de confiança do analfabeto, capaz de lhe certificar acerca do conteúdo do contrato escrito e de assinar em seu nome, tudo isso testificado por duas testemunhas, equaciona-se, ao menos em parte, a sua vulnerabilidade informacional. 9. O art. 595 do CC/02 se refere a uma formalidade a ser acrescida à celebração de negócio jurídico por escrito por pessoa analfabeta, que não se confunde com o exercício de mandato. O contratante que não sabe ler ou escrever declara, por si próprio, sua vontade, celebrando assim o negócio, recorrendo ao terceiro apenas para um auxílio pontual quanto aos termos do instrumento escrito. 10. O terceiro, destarte, não celebra o negócio em representação dos interesses da pessoa analfabeta, como se mandatário fosse. Por isso, não é necessário que tenha sido anteriormente constituído como procurador. 11. Se assim o quiser, o analfabeto pode se fazer representar por procurador, necessariamente constituído mediante instrumento público, à luz do disposto no art. 654, caput, do CC/02. Nessa hipótese, típica do exercício de mandato, não incide o disposto no art. 595 do Código e, portanto, dispensa-se a participação das duas testemunhas. 12. Recurso especial conhecido e provido (REsp 1907394/MT, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 04/05/2021, DJe 10/05/2021) (destaquei) A jurisprudência majoritária dos tribunais do país segue a orientação acima constatada. Ilustrativamente, cito o precedente abaixo, extraído de julgamento do Tribunal de Justiça do Estado da Paraíba que apreciou situação análoga a ora decidida: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. ALEGAÇÃO DE NÃO REALIZAÇÃO DO PACTO. AUTOR ANALFABETO. AUSÊNCIA DE ASSINATURA A ROGO. INOBSERVÂNCIA DOS REQUISITOS LEGAIS. VÍCIO CONFIGURADO. ATO ILÍCITO DEMONSTRADO. RETORNO DAS PARTES AO STATUS QUO ANTE. DANOS MORAIS CONFIGURADOS. DEVER DE INDENIZAR. SENTENÇA REFORMADA. PROVIMENTO DO RECURSO APELATÓRIO. - Evidenciado nos autos que o negócio jurídico litigioso foi firmado por analfabeto sem que fosse observada a forma prescrita em lei, a nulidade absoluta resulta caracterizada e deve ser declarada de ofício, impondo-se o retorno das partes ao status quo ante. - Ao analisar o contrato juntado aos autos pelo banco promovido, constata-se ausência de assinatura a rogo, mas, tão somente de duas testemunhas, o que gera a nulidade do negócio jurídico. - O Código de Defesa do Consumidor estabelece que o fornecedor responderá, objetivamente, pelos prejuízos causados ao consumidor em razão de serviços mal prestados, prevista no § 2º, do art. 14, do CDC. VISTOS, relatados e discutidos os autos acima referenciados. ACORDA a Primeira Câmara Especializada Cível do Egrégio Tribunal de Justiça da Paraíba, à unanimidade de votos, DAR PROVIMENTO AO RECURSO. (0803439-72.2022.8.15.0211, Rel. Des. José Ricardo Porto, APELAÇÃO CÍVEL, 1ª Câmara Cível, juntado em 27/06/2023) (destaquei) Como se sabe, por se tratar de suposto fato extintivo do direito do promovente, a prova da adesão incumbia à parte ré, nos termos do artigo 373, II do CPC. Dessume-se que cabia ao réu provar a formalização de contrato de adesão pela parte autora. Se não cumpre com seu ônus, a consequência é ter este contrato como não realizado. Assim, esse tipo de contratação assegura vantagem extrema ao Banco Réu, pois os descontos mensais não cessam, na medida em que são abatidos apenas os juros do período e, portanto, não são revertidos ao consumidor de modo a abater o débito ou finalizá-lo, o que, praticamente, por vias oblíquas, deixa o saldo devedor do mútuo bancário aberto indefinidamente e obriga o consumidor a fazer uso constante do cartão contra sua vontade. Além disso, configura-se a suposta contratação é abusiva, nos termos do art. 51, IV, da Lei nº. 8.078/90, pois estabelece obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ao permitir o desconto de parcelas mensais no limite do cartão de crédito contratado, com constituição a título de RMC (Reserva de Margem Consignável), independentemente de o consumidor fazer uso do cartão de crédito consignado. Insta salientar, ainda, que a Reserva de Margem Consignável (RMC) é autorizada a contratos de empréstimo consignado por cartão de crédito, “desde que expressamente autorizada” conforme Instrução Normativa do INSS n. 39/2009, art. 3º, item III, o que não foi provado no caderno processual. Por óbvio, o contrato de empréstimo vinculado a um cartão de crédito é possível, mas tais informações devem ser claras no momento da contratação. Caso contrário, o consumidor poderá permanecer pagamento indefinidamente pela dívida, o que não se mostra viável. Essa ilação foi reforçada com a recente edição da Lei nº 14.151, de 12/05/2021, que alterou o Código de Defesa do Consumidor, a fim de aperfeiçoar a disciplina do crédito ao consumidor e dispor sobre a prevenção e o tratamento do superendividamento. Vejamos o teor dos artigos 54-B, 54-D e 54-G do CDC: Art. 54-B. No fornecimento de crédito e na venda a prazo, além das informações obrigatórias previstas no art. 52 deste Código e na legislação aplicável à matéria, o fornecedor ou o intermediário deverá informar o consumidor, prévia e adequadamente, no momento da oferta, sobre: I - o custo efetivo total e a descrição dos elementos que o compõem; II - a taxa efetiva mensal de juros, bem como a taxa dos juros de mora e o total de encargos, de qualquer natureza, previstos para o atraso no pagamento; III - o montante das prestações e o prazo de validade da oferta, que deve ser, no mínimo, de 2 (dois) dias; IV - o nome e o endereço, inclusive o eletrônico, do fornecedor; V - o direito do consumidor à liquidação antecipada e não onerosa do débito, nos termos do § 2º do art. 52 deste Código e da regulamentação em vigor. § 1º As informações referidas no art. 52 deste Código e no caput deste artigo devem constar de forma clara e resumida do próprio contrato, da fatura ou de instrumento apartado, de fácil acesso ao consumidor. § 2º Para efeitos deste Código, o custo efetivo total da operação de crédito ao consumidor consistirá em taxa percentual anual e compreenderá todos os valores cobrados do consumidor, sem prejuízo do cálculo padronizado pela autoridade reguladora do sistema financeiro. § 3º Sem prejuízo do disposto no art. 37 deste Código, a oferta de crédito ao consumidor e a oferta de venda a prazo, ou a fatura mensal, conforme o caso, devem indicar, no mínimo, o custo efetivo total, o agente financiador e a soma total a pagar, com e sem financiamento. (...) Art. 54-D. Na oferta de crédito, previamente à contratação, o fornecedor ou o intermediário deverá, entre outras condutas: I - informar e esclarecer adequadamente o consumidor, considerada sua idade, sobre a natureza e a modalidade do crédito oferecido, sobre todos os custos incidentes, observado o disposto nos arts. 52 e 54-B deste Código, e sobre as consequências genéricas e específicas do inadimplemento; II - avaliar, de forma responsável, as condições de crédito do consumidor, mediante análise das informações disponíveis em bancos de dados de proteção ao crédito, observado o disposto neste Código e na legislação sobre proteção de dados; III - informar a identidade do agente financiador e entregar ao consumidor, ao garante e a outros coobrigados cópia do contrato de crédito. Parágrafo único. O descumprimento de qualquer dos deveres previstos no caput deste artigo e nos arts. 52 e 54-C deste Código poderá acarretar judicialmente a redução dos juros, dos encargos ou de qualquer acréscimo ao principal e a dilação do prazo de pagamento previsto no contrato original, conforme a gravidade da conduta do fornecedor e as possibilidades financeiras do consumidor, sem prejuízo de outras sanções e de indenização por perdas e danos, patrimoniais e morais, ao consumidor. Art. 54-G. Sem prejuízo do disposto no art. 39 deste Código e na legislação aplicável à matéria, é vedado ao fornecedor de produto ou serviço que envolva crédito, entre outras condutas: (...) II - recusar ou não entregar ao consumidor, ao garante e aos outros coobrigados cópia da minuta do contrato principal de consumo ou do contrato de crédito, em papel ou outro suporte duradouro, disponível e acessível, e, após a conclusão, cópia do contrato; (...) § 1º Sem prejuízo do dever de informação e esclarecimento do consumidor e de entrega da minuta do contrato, no empréstimo cuja liquidação seja feita mediante consignação em folha de pagamento, a formalização e a entrega da cópia do contrato ou do instrumento de contratação ocorrerão após o fornecedor do crédito obter da fonte pagadora a indicação sobre a existência de margem consignável. Não é outro o entendimento dos Tribunais pátrios em casos análogos: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. VÍCIOS DE CONTRATAÇÃO CARACTERIZADOS. NULIDADE DECLARADA. DESCONTO INDEVIDO EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. REGULARIDADE DA COBRANÇA NÃO COMPROVADA. FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS ART. 14 DO CDC. DANO COMPROVADO. FIXAÇÃO DOS DANOS MORAIS. CARÁTER PEDAGÓGICO. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. DEVOLUÇÃO EM DOBRO. CONDUTA CONTRÁRIA À BOA-FÉ OBJETIVA. - Embora a modalidade de contratação de cartão de crédito consignado seja amplamente utilizada e validada pelo Banco Central, estando prevista na Lei nº 10.820/2003, com a redação que lhe foi dada pela Lei nº 13.172/2015, é indispensável que o contrato seja escrito e que haja clareza na indicação da modalidade de contratação, para que a parte contratante não seja induzida a erro.- Tendo a parte autora negado a contratação de empréstimo descontado em seu benefício, compete à parte requerida fazer prova do negócio jurídico, como fato modificativo, extintivo e impeditivo do direito autoral (artigo 373, inciso II do Código de Processo Civil). - O desconto indevido no provento de aposentadoria gera indubitável perturbação à esfera moral do consumidor, eis que este necessita do dinheiro para sua mantença. - Os danos morais devem ser fixados dentro dos parâmetros de punição do ofensor e compensação do ofendido pelos danos sofridos, sem ocasionar enriquecimento ilícito e nem estimulação de repetição do ato do ofensor, tendo em seu vista o seu caráter pedagógico. - No caso de descontos indevidos no benefício previdenciário da parte requerente, o dano material é evidente, correspondendo à injusta diminuição patrimonial que decorre das cobranças indevidas. - A nova orientação jurisprudencial do STJ é no sentido de que "a restituição em dobro do indébito (parágrafo único do artigo 42 do CDC) independe da natureza do elemento volitivo do fornecedor que realizou a cobrança indevida, r evelando-se cabível quando a referida cobrança consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva". (EAREsp 676.608/RS, Rel. Ministro OG FERNANDES, CORTE ESPECIAL, julgado em 21/10/2020, DJe 30/03/2021). (TJMG - Apelação Cível 1.0000.22.068481-5/001, Relator(a): Des.(a) Luiz Carlos Gomes da Mata , 13ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 15/09/2022, publicação da súmula em 16/09/2022) (destaquei) EMENTA: – APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO DE CARTÃO DE CREDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC) E INEXISTÊNCIA DE DÉBITO CUMULADA COM RESTITUIÇÃO DE VALORES EM DOBRO E INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL - CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO – COBRANÇA INDEVIDA – SERVIÇO NÃO CONTRATADO – RETENÇÃO DE MARGEM CONSIGNÁVEL NO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO DO APELADO – NÃO COMPROVAÇÃO DE CONSENTIMENTO – FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO – INSTITUIÇÃO FINANCEIRA – RESPONSABILIDADE OBJETIVA – DANO MORAL – CONFIGURAÇÃO – MANUTENÇÃO DA SENTENÇA – DESPROVIMENTO DO APELO. Vistos, relatados e discutidos os presentes autos acima identificados. Acordam os desembargadores da Terceira Câmara Cível do Tribunal de Justiça, por unanimidade, em negar provimento ao apelo. (TJPB. 0801662-44.2021.8.15.0031, Rel. Des. Marcos Cavalcanti de Albuquerque, APELAÇÃO CÍVEL, 3ª Câmara Cível, juntado em 17/08/2022) (destaquei) CONTRATO BANCÁRIO – Alegada ausência de contratação e autorização para os descontos efetuados no benefício previdenciário (aposentadoria) do autor relativamente a cartão de crédito consignado – Inexistência de relação jurídica entre o autor e o banco réu – Dano moral bem caracterizado – Damnum in re ipsa - Arbitramento realizado segundo os critérios da prudência e razoabilidade – Procedência em parte mantida – Recurso improvido. (TJSP; Apelação Cível 1001087-57.2021.8.26.0286; Relator (a): Correia Lima; Órgão Julgador: 20ª Câmara de Direito Privado; Foro de Itu – 2ª Vara Cível; Data do Julgamento: 22/09/2022; Data de Registro: 22/09/2022) (destaquei) Portanto, diante da ausência de prova robusta por parte do Banco demandado no sentido de provar a contratação do cartão de crédito consignado e de que a autora tinha plena consciência do que estava contratando, bem como do montante devido, e de que com isso anuiu, considero abusivo o desconto mensal a título de cartão de crédito consignado sob a RMC. Dessarte, presumo como verdadeira a afirmação da parte autora de que não contratou os serviços de cartão de crédito consignado com o requerido. Anote-se ainda que não houve nenhuma impugnação da autora quanto à alegação de liberação dos valores em seu favor. Portanto, declaro como inexistente, por ausência de validade, o contrato de cartão de crédito consignado nº 0229730072186 (id. 82309935 – Pág. 3). III.5 – DA REPETIÇÃO DE INDÉBITO Nulo o contrato, os descontos no benefício previdenciário do autor são ilegais, devendo o promovido devolver o total das parcelas descontadas indevidamente dos proventos de aposentadoria da autora a título de Cartão de Crédito Consignado com Reserva de Margem Consignável. A respeito da repetição de indébito, o Código de Defesa do Consumidor, em seu artigo 42, parágrafo único, disciplina: Art. 42. Na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será exposto a ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça. Parágrafo único. O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável. Dessa forma, restando configurada a cobrança e respectivo pagamento indevido, gera o direito a repetição do indébito. Nesse sentido, a jurisprudência do C. STJ: RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. TARIFA E ÁGUA E ESGOTO. ENQUADRAMENTO NO REGIME DE ECONOMIAS. CULPA DA CONCESSIONÁRIA. RESTITUIÇÃO EM DOBRO. 1. O art. 42, parágrafo único, do CDC estabelece que "o consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável". 2. Interpretando o referido dispositivo legal, as Turmas que compõem a Primeira Seção desta Corte de Justiça firmaram orientação no sentido de que "o engano, na cobrança indevida, só é justificável quando não decorrer de dolo (má-fé) ou culpa na conduta do fornecedor do serviço" (REsp 1.079.064/SP, 2ª Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe de 20.4.2009). Ademais, "basta a culpa para a incidência de referido dispositivo, que só é afastado mediante a ocorrência de engano justificável por parte do fornecedor" (REsp 1.085.947/SP, 1ª Turma, Rel. Min. Francisco Falcão, DJe de 12.11.2008). Destarte, o engano somente é considerado justificável quando não decorrer de dolo ou culpa. 3. Na hipótese dos autos, conforme premissas fáticas formadas nas instâncias ordinárias, não é razoável falar em engano justificável. A cobrança indevida de tarifa de água e esgoto deu-se em virtude de culpa da concessionária, a qual incorreu em erro no cadastramento das unidades submetidas ao regime de economias. Assim, caracterizada a cobrança abusiva, é devida a repetição de indébito em dobro ao consumidor, nos termos do parágrafo único do art. 42 do CDC. 4. Recurso especial provido” (STJ 1ª turma Min. Rel. Denise Arruda REsp 1084815/SP DJ 5.8.2009). ADMINISTRATIVO E CONSUMIDOR. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. SERVIÇOS TELEFÔNICOS NÃO SOLICITADOS PELO USUÁRIO. COBRANÇA INDEVIDA. DEVOLUÇÃO EM DOBRO. REVISÃO DO ACÓRDÃO. SÚMULA 7/STJ. 1. Dispõe o art. 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor que "o consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável". 2. Segundo a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, o engano é considerado justificável quando não decorrer de dolo (má-fé) ou culpa na conduta do prestador do serviço público. 3. No caso, o Tribunal de origem, soberano na análise das circunstâncias fáticas da causa, concluiu que a cobrança indevida de serviços telefônicos não solicitados pelo usuário enseja a restituição em dobro dos valores pagos.4. A modificação do julgado, nos termos propugnado, demandaria a análise acerca do elemento subjetivo norteador da conduta do agente (dolo ou culpa) o que é vedado a teor do contido no enunciado 7 da Súmula do STJ. 5. Agravo regimental a que se nega provimento.(AgRg no AREsp 431.065/SC, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, julgado em 17/12/2013, DJe 03/02/2014) Nessa senda, tenho que o direito à repetição do indébito é nítido e deve ser concedido à autora em decorrência dos descontos indevidos, uma vez que estes decorreram de falha na prestação do serviço, sem qualquer comprovação nestes autos da existência de erro justificável. Patente à indução do promovente em erro, já que a consumidora estabeleceu a intenção de contratar empréstimo consignado e não cartão de crédito, restando evidenciada a ausência de esclarecimentos acerca da contratação, o que viola os princípios da informação, probidade e boa-fé contratual. Portanto, a indenização deve ser em dobro neste caso. Esse fato configura, no mínimo, conduta negligente e, portanto, culposa, por parte do banco-requerido, que deve agir com mais cautela na prestação de serviços e na execução da sua atividade empresarial – a qual já é suficientemente remunerada pelos consumidores. Desse modo, demonstrada a ausência de cuidados mínimos na celebração do contrato, impossível concluir que houve atenção aos deveres da boa-fé objetiva, dando espaço para a repetição em dobro. Deve, portanto, o banco restituir as importâncias comprovadamente descontadas do benefício previdenciário da parte autora, em dobro, atualizadas monetariamente do desembolso e acrescidas de juros de mora, devendo, contudo, haver compensação com o valor disponibilizado para o requerente durante o período impugnado na exordial, tendo em vista a inclusão do contrato em 11/10/2019 (id.82309935 – pág. 3), observando a prescrição quinquenal na forma supracitada. III.6 – DA INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS No que tange ao “quantum” indenizatório, deve ser fixado a partir dos critérios de proporcionalidade e razoabilidade, observada a natureza jurídica do bem lesado, as consequências do fato, o grau de culpa e demais circunstâncias do caso, atendendo a um sistema bifásico consagrado pelo Superior Tribunal de Justiça. Por esse método, na primeira fase, é fixado um valor básico de indenização de acordo com o interesse jurídico lesado e em conformidade com a jurisprudência consolidada do Tribunal (grupo de casos). Na segunda fase, há a fixação definitiva da indenização de acordo com as circunstâncias particulares do caso concreto (gravidade do fato em si, culpabilidade do agente, culpa concorrente da vítima, condição econômica das partes, entre outros fatores). Nesse sentido, colaciono: “O método bifásico, como parâmetro para a aferição da indenização por danos morais, atende às exigências de um arbitramento equitativo, pois, além de minimizar eventuais arbitrariedades, evitando a adoção de critérios unicamente subjetivos pelo julgador, afasta a tarifação do dano. Traz um ponto de equilíbrio, pois se alcançará uma razoável correspondência entre o valor da indenização e o interesse jurídico lesado, além do fato de estabelecer montante que melhor corresponda às peculiaridades do caso. Na primeira fase, o valor básico ou inicial da indenização é arbitrado tendo-se em conta o interesse jurídico lesado, em conformidade com os precedentes jurisprudenciais acerca da matéria (grupo de casos). Na segunda fase, ajusta-se o valor às peculiaridades do caso, com base nas suas circunstâncias (gravidade do fato em si, culpabilidade do agente, culpa concorrente da vítima, condição econômica das partes), procedendo-se à fixação definitiva da indenização, por meio de arbitramento equitativo pelo juiz. Ainda na segunda fase de fixação, tendo em vista tratar-se de um núcleo familiar como titular da indenização, há que se ponderar acerca da individualização do dano, uma vez que um evento danoso capaz de abalar o núcleo familiar deve ser individualmente considerado em relação a cada um de seus membros (EREsp 1127913/RS, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Corte Especial, DJe 05/08/2014)” (STJ, REsp1.332.366/MS, 4.ª Turma, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, j.10.11.2016, DJe 07.12.2016). Na verdade, a utilização do método bifásico consolidou-se de tal forma no âmbito da citada Corte que, em 2019, foi publicada a Edição n. 125 da ferramenta Jurisprudência em Teses do STJ, dedicada à responsabilidade civil e ao dano moral. Conforme a assertiva n. 1, “a fixação do valor devido a título de indenização por danos morais deve considerar o método bifásico, que conjuga os critérios da valorização das circunstâncias do caso e do interesse jurídico lesado, e minimiza eventual arbitrariedade ao se adotar critérios unicamente subjetivos do julgador, além de afastar eventual tarifação do dano”. Nessa hipótese, infere-se a ocorrência dos descontos do empréstimo desde o ano de 2019 e a inércia da parte autora no dever de mitigar o próprio prejuízo. Portanto, é a hipótese de aplicação do princípio da boa-fé objetiva por meio da teoria do Duty to Mitigate the Loss, consoante orientação do Enunciado nº 169 da III Jornada do Direito Civil - CJF: “O princípio da boa-fé objetiva deve levar o credor a evitar o agravamento do próprio prejuízo”. Cotejados esses fatores, fixo a indenização por danos morais em R$ 1.500,00 (um mil e quinhentos reais). IV – DISPOSITIVO Diante do exposto, com resolução de mérito (art. 487, inc. I, CPC/2015), JULGO PROCEDENTE os pedidos da parte autora para: a) DECLARAR a inexistência do contrato de cartão de crédito de margem consignada objeto desta lide; b) CONDENAR o réu a pagar-lhe indenização por danos morais no valor de R$ 1.500,00 (um mil e quinhentos reais), que deverão ser acrescidos de juros desde o evento danoso com o primeiro débito (STJ, Súmula nº 54), aplicando-se o IPCA para a correção monetária a partir desta data de arbitramento (Súmula nº 362/STJ) e a SELIC para juros de mora, abatido o valor do IPCA (art. 389 e art. 406, §1º, CC/02 com as alterações da Lei nº 14.905/24 e REsp nº 1.795.982/SP); c) CONDENAR o Banco a restituir-lhe, em dobro, o valor das parcelas comprovadamente descontadas até a data da efetiva suspensão, corrigido monetariamente pelo IPCA e com juros moratórios pela taxa SELIC, deduzido o IPCA, desde cada desconto indevido (Súm. nº 43/STJ; Súm. nº 54/STJ, art. 398, CC); d) COMPENSAR eventual crédito comprovadamente transferido/disponibilizado na conta corrente da autora; tudo liquidável com meros cálculos aritméticos. CONDENO o promovido a pagar as custas processuais, encargos legais, honorários sucumbenciais no percentual de 10% do valor da condenação. Sentença publicada e registrada eletronicamente. Intimem-se. Em caso de eventual recurso, intime-se a recorrida para contrarrazões, após o que, remeta-se à instância superior. Transitado em julgado, calculem as custas, expeça-se a guia de recolhimento e intime-se o promovido para pagá-las, sob pena de inscrição em dívida ativa, bem como intime-se a parte autora para requerer o que entender de devido, ambos no prazo de 15 dias. Decorrido o prazo sem pagamento das custas, proceda-se conforme o Código de Normas Judicial da CGJ/TJPB. Nada sendo requerido pela parte autora e satisfeitas as diligências em relação as custas, independente de nova conclusão, arquivem-se os autos definitivamente. Cumpra-se. Pombal/PB, data conforme certificação digital. Roberto César Lemos de Sá Cruz Juiz de Direito
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