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Processo nº 0002010-86.2023.8.17.2580

ID: 335389643

Tribunal: TJPE Órgão: Vara Única da Comarca de Exu Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 0002010-86.2023.8.17.2580

Data de Disponibilização: 28/07/2025

Polo Ativo:

VICENTE DE SOUSA CELESTINO NETO

Polo Passivo:

Sentença (Outras)

Advogados:

JACIANE LIMA DA SILVA

OAB/CE XXXXXX Desbloquear

ARTUR JORGE BEZERRA ULISSES FILHO

OAB/PE XXXXXX Desbloquear

Tribunal de Justiça de Pernambuco Poder Judiciário Vara Única da Comarca de Exu AV EDMUNDO DANTAS, S/N, FORUM JUIZ VALDIR BARBOSA, Centro, EXU - PE - CEP: 56230-000 - F:(87) 38792928 Processo nº 0002… Tribunal de Justiça de Pernambuco Poder Judiciário Vara Única da Comarca de Exu AV EDMUNDO DANTAS, S/N, FORUM JUIZ VALDIR BARBOSA, Centro, EXU - PE - CEP: 56230-000 - F:(87) 38792928 Processo nº 0002010-86.2023.8.17.2580 AUTOR(A): VICENTE DE SOUSA CELESTINO NETO RÉU: BANCO DO BRASIL SA SENTENÇA 1. RELATÓRIO VICENTE DE SOUSA CELESTINO NETO, devidamente qualificado nos autos, ajuizou a presente ação de obrigação de fazer c/c indenização por danos morais em face do BANCO DO BRASIL S.A., pessoa jurídica também qualificada. Narra o autor, em sua petição inicial, que manteve com sua ex-cônjuge, Sra. Evanuza Precilia Carvalho de França, uma conta corrente conjunta junto à agência da instituição financeira ré. Aduz que, em virtude de divórcio consensual homologado judicialmente nos autos do processo nº 0000009-31.2023.8.17.2580 (ID 154705853), ficou acordado que o imóvel financiado, atrelado à referida conta, permaneceria com a ex-cônjuge, que assumiria a integralidade das obrigações financeiras correspondentes. Sustenta que, a despeito do acordo e de ter se dirigido por diversas vezes à agência bancária, acompanhado da cotitular, para formalizar sua exclusão da conta, o banco réu negou-se a proceder com a alteração, sob a alegação de que normativas internas não o permitiam. Diante da recusa, e temendo ser responsabilizado por débitos futuros, pleiteou a concessão de tutela de urgência para a imediata exclusão de seu nome da titularidade da conta. No mérito, requereu a confirmação da tutela, a condenação do réu ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 3.000,00 (três mil reais), além da inversão do ônus da prova e os benefícios da justiça gratuita. A decisão de ID 154852543 deferiu a gratuidade de justiça, porém indeferiu o pedido de tutela de urgência, por entender ausentes, em cognição sumária, provas robustas da ilegalidade do ato e da própria vinculação do autor à conta. Na mesma oportunidade, determinou-se a citação do réu. Devidamente citado (ID 157970851), o Banco do Brasil S.A. apresentou contestação (ID 160701349). Em sua defesa, arguiu, em síntese, a inexistência de falha na prestação de serviços. Sustentou que, conforme suas normas internas e o instrumento contratual, por ser o autor o 1º titular da conta, sua exclusão não seria possível. A providência correta, segundo o réu, seria a solicitação de exclusão pela 2ª titular (a ex-cônjuge), que deveria, então, abrir uma nova conta para a transferência do financiamento. Invocou os princípios da pacta sunt servanda e da boa-fé contratual. Impugnou o pedido de danos morais, por ausência de ato ilícito e por se tratar de mero aborrecimento, e rechaçou a inversão do ônus da prova. O autor apresentou réplica à contestação (ID 164145009), rebatendo os argumentos da defesa. Ressaltou que a conduta do banco viola seu próprio material informativo identificado como de “cartilha de conta corrente” (ID 154705850), que prevê a possibilidade de exclusão mediante concordância de todos os titulares, requisito que alega ter cumprido. Argumentou que a negativa do banco é abusiva e contrária ao Código de Defesa do Consumidor, e que a situação ultrapassa o mero dissabor, configurando dano moral indenizável em virtude do abuso de direito cometido pelo banco réu. Instadas as partes a especificarem as provas que pretendiam produzir (ID 180574727), o autor manifestou-se pelo julgamento antecipado da lide (ID 181515880), quedando-se silente a parte ré. É o relatório. Decido. 2. FUNDAMENTAÇÃO O feito comporta julgamento antecipado, nos termos do art. 355, I, do Código de Processo Civil, porquanto a matéria controvertida é eminentemente de direito e os fatos relevantes já se encontram suficientemente comprovados pelos documentos carreados aos autos, sendo desnecessária a produção de outras provas. 2.1 Da Relação de Consumo e da Legislação Aplicável Inicialmente, cumpre assentar que a relação jurídica estabelecida entre as partes é, inequivocamente, de consumo, nos exatos termos dos artigos 2º e 3º do Código de Defesa do Consumidor (CDC). O autor figura como destinatário final dos serviços prestados pela instituição financeira ré, que, por sua vez, enquadra-se perfeitamente no conceito de fornecedora. A matéria deve, portanto, ser analisada sob a égide do microssistema consumerista, cujos princípios, notadamente o da vulnerabilidade do consumidor, o do dever de informação e o da boa-fé objetiva, orientarão a presente decisão. 2.2 Do Mérito A controvérsia central cinge-se em verificar a legitimidade da recusa do banco réu em proceder à exclusão do autor da titularidade da conta corrente conjunta, e, em caso de ilicitude, se tal conduta enseja a reparação por danos morais. 2.2.1 Da Obrigação de Fazer – exclusão de cotitular O autor busca desvincular-se de uma obrigação contratual (a titularidade de uma conta corrente) cuja causa determinante, a sociedade conjugal, já não mais subsiste. O divórcio das partes, devidamente formalizado e homologado em juízo (ID 154705853), pôs fim ao vínculo que, presumivelmente, justificava a manutenção de uma conta conjunta. O acordo de divórcio (ID 154705857) foi claro ao destinar o imóvel financiado e a responsabilidade pelo seu pagamento exclusivamente à ex-cônjuge. Tal pacto, embora produza efeitos plenos entre os divorciandos, não é, por si só, oponível à instituição financeira, que não participou da avença. Contudo, serve como prova robusta da ausência de interesse do autor na manutenção do vínculo contratual com o banco. O cerne da questão repousa na conduta da instituição financeira. O banco réu fundamenta sua recusa em uma suposta norma interna, segundo a qual, sendo o autor o "primeiro titular", este não poderia ser excluído, cabendo à "segunda titular" a iniciativa de encerrar a relação e transferir o financiamento para uma nova conta. Tal argumento, todavia, não se sustenta, por ao menos três razões fundamentais. Primeiro, a tese defensiva colide frontalmente com a informação prestada pelo próprio banco em sua "Cartilha de Conta Corrente" (ID 154705850), documento juntado pelo autor. Na página 07 do referido manual, sob o título "exclusão de titular", o texto é ao dizer que: A exclusão de titular de conta conjunta, solidária ou não, somente pode ocorrer com a concordância formal de todos os titulares. É necessário que o cliente elabore um documento solicitando a retirada de um ou mais titulares, porém na correspondência deve conter a assinatura de todos os titulares, inclusive do(s) que vai (ão) ser retirado(s). Também existe um documento específico disponibilizado na agência onde é mantida a conta. (grifo nosso) Ora, o autor alega, e o réu não nega especificamente, que compareceu à agência acompanhado da cotitular, anuindo ambos com a exclusão. Cumpriu, portanto, o requisito que o próprio fornecedor tornou público. A informação veiculada de forma clara e precisa integra o contrato e vincula o fornecedor, nos termos do art. 30 do CDC. A imposição de um procedimento diverso, mais oneroso e não publicizado (a distinção entre "1º" e "2º" titular) representa conduta contraditória, que viola a boa-fé objetiva e a legítima expectativa do consumidor. Segundo, a pretensão do autor encontra amparo no princípio da liberdade de associação, previsto no art. 5º, XX, da Constituição Federal, que, por analogia, irradia seus efeitos sobre as relações contratuais de trato sucessivo, garantindo que ninguém pode ser compelido a permanecer indefinidamente vinculado a um contrato, mormente quando exaurido seu objeto ou finalidade. Manter o autor atrelado a uma conta que serve a um financiamento pelo qual não mais se responsabiliza (perante a ex-cônjuge) e de um bem que não mais usufrui, representa uma onerosidade excessiva, vedada pelo art. 51, IV, do CDC. Terceiro, a recusa do banco, ao criar um embaraço injustificado a um direito do consumidor, configura falha na prestação do serviço, violando o dever de informação e cooperação. Se existia um procedimento interno específico, cabia ao banco orientar os correntistas sobre como proceder, e não simplesmente negar a solicitação. Desta forma, a procedência do pedido de obrigação de fazer é medida que se impõe, para determinar que o banco réu promova a exclusão do nome do autor da titularidade da conta corrente nº 21.324-1, agência 1059-6, ressalvando-se, contudo, que tal exclusão não o exime de eventuais débitos solidários contraídos até a data da efetiva alteração cadastral. 2.2.2 Do Dano Moral Superada a questão da ilicitude da conduta do réu, passa-se à análise do pleito indenizatório. O dano moral, em sua acepção moderna, não se configura por qualquer dissabor ou aborrecimento. Exige-se uma lesão a direito da personalidade, uma ofensa que transcenda a normalidade e cause ao indivíduo dor, angústia ou humilhação significativas. No caso em tela, a situação vivenciada pelo autor ultrapassa o mero descumprimento contratual. O consumidor, após resolver sua situação familiar por meio de um divórcio judicial, buscou, de boa-fé e seguindo as orientações públicas do próprio fornecedor, solucionar a pendência administrativa. Contudo, deparou-se com uma negativa injustificada e com a imposição de barreiras burocráticas que o forçaram a buscar a tutela jurisdicional para exercer um direito que lhe era manifesto. Aplica-se à hipótese a teoria do desvio produtivo do consumidor, segundo a qual o tempo vital do consumidor, desperdiçado para a solução de problemas gerados pela má prestação de serviços, constitui um bem juridicamente tutelável, cuja violação enseja reparação. O autor foi obrigado a despender seu tempo e recursos, que poderiam ser empregados em trabalho, lazer ou descanso, para tentar resolver uma questão que o fornecedor tinha o dever de solucionar administrativamente. A conduta do banco réu, ao se negar a resolver a questão de forma simples e eficaz, gerou no autor angústia e impotência, sentimentos que extrapolam o dissabor cotidiano e configuram, sim, o dano moral indenizável. Neste sentido, é jurisprudência deste E. Tribunal de Justiça, senão vejamos: PROCESSO CIVIL. DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. CONTRATO DE SEGURO DE AUTOMÓVEL. SINISTRO. PAGAMENTO DA INDENIZAÇÃO SECURITÁRIA NEGADO NA VIA ADMINISTRATIVA. NÃO COMPROVADA A EXISTÊNCIA DE CLÁUSULA EXCLUDENTE DE COBERTURA NOS CASOS DE EMBRIAGUEZ DA PARTE CONDUTORA. ÔNUS DA SEGURADORA. ALEGAÇÃO DE EMBRIAGUEZ DA PARTE CONDUTORA NÃO COMPROVADA POR PROVAS TÉCNICAS. NEXO DE CAUSALIDADE NÃO DEMONSTRADO. ÔNUS PROBATÓRIO DA SEGURADORA. DEVIDO O PAGAMENTO DA INDENIZAÇÃO SECURITÁRIA. TABELA FIPE. PREVISÃO APÓLICE. NEGATIVA INJUSTIFICADA DA SEGURADORA. DANO MORAL CONFIGURADO. QUANTUM INDENIZATÓRIO FIXADO. INVERSÃO DO ÔNUS SUCUMBENCIAL. FIXAÇÃO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. ARTIGO 85, § 2º DO CPC. RECURSO PROVIDO.1. O caso em deslinde deve ser enquadrado, por equiparação, às hipóteses de relação de consumo, uma vez que as partes litigantes integram as definições legais de consumidora e de fornecedora de produtos e serviços, respectivamente, conforme o expressamente disposto nos artigos 2º e 3º do Código de Defesa do Consumidor, razão pela qual devem ser aplicadas à presente lide as normas protetivas do referido Diploma Legal.2. Não obstante o entendimento do c. Superior Tribunal de Justiça no sentido de que é lícita a cláusula que preveja a exclusão da cobertura securitária nos casos em que o sinistro ocorrer por embriaguez do condutor, verifica-se que o Banco do Brasil Seguro Auto não apresenta aos autos as condições gerais do seguro contratado, não comprovando a existência da aludida cláusula excludente, ônus probatório que competia à seguradora demandada (artigo 6º, inciso VIII, do CDC c/c artigo 373, inciso II, do CPC).3. A alegação de embriaguez da parte autora no momento do sinistro - fato não comprovado nos autos, diante da ausência de exames e provas técnicas - não seria motivo para, por si só, ensejar a negativa de pagamento da indenização securitária, devendo ser demonstrado pela seguradora, ainda, o nexo de causalidade existente entre o acidente automobilístico e o estado alcóolico do segurado. Precedentes dos Tribunais Pátrios. 4. Diante da ausência de comprovação de cláusula contratual excludente de cobertura securitária nos casos em que comprovada a embriaguez da parte condutora, e não demonstrada nos autos que a suposta ingestão de bebida alcóolica seria a causa determinante para o acidente automobilístico, mostra-se devido o pagamento da indenização securitária pelo Banco do Brasil Seguro Auto, nos termos acordados no contrato firmado.5. Falha na prestação do serviço que é capaz de ocasionar transtornos significativos à autora, em razão da injustificada negativa administrativa da seguradora para efetuar o pagamento da indenização securitária contratada, mormente se considerado que até o presente momento, isto é, após 10 (dez) anos do sinistro, o pagamento não foi realizado.6. Aplicação da "Teoria do Desvio Produtivo do Consumidor". Teoria que categoriza o tempo não apenas como um fato jurídico, mas também como um bem jurídico que deve ser tutelado pelo Poder Judiciário. Consumidor que deve ser reparado caso lesado em seu tempo por desídia ou falha na prestação do serviço fornecido. Precedente do STJ.7. Mediante análise das peculiaridades do caso concreto e com base nos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, mostra-se devida a fixação de indenização por danos morais, no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), considerando os transtornos sofridos e o potencial econômico da parte ofensora. Precedentes dos Tribunais Pátrios.8. Inversão do ônus sucumbencial. Seguradora demandada/recorrida que deve ser condenada a pagar as custas processuais e os honorários sucumbenciais, estes fixados em 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação (Artigo 85, § 2º, do CPC).9. Provimento da Apelação Cível. Decisão unânime. (Apelação Cível 555920-20014916-37.2013.8.17.0001, Rel. Eurico de Barros Correia Filho, 4ª Câmara Cível, julgado em 01/12/2022, DJe 05/01/2023) (grifo nosso) DIREITO DO CONSUMIDOR E CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. FRAUDE EM OPERAÇÕES BANCÁRIAS. CONTRATAÇÃO NÃO RECONHECIDA DE EMPRÉSTIMOS PESSOAIS E CONSIGNADO. TRANSFERÊNCIAS VIA PIX A TERCEIROS. OPERAÇÃO ATÍPICA. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. DANO MORAL CONFIGURADO. MANUTENÇÃO DO MONTANTE INDENIZATÓRIO. RECURSOS NÃO PROVIDOS. I. CASO EM EXAME Apelações interpostas contra sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos em ação declaratória de inexistência de débito cumulada com indenização por danos materiais e morais, ajuizada por idosa pensionista em face de instituição financeira, em razão de contratação não reconhecida de empréstimos e realização de transferências via PIX. A sentença declarou a inexistência do contrato, determinou a restituição simples dos valores descontados antes de 31/03/2021 e em dobro dos posteriores, e fixou indenização por danos morais no valor de R$ 5.000,00. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Há duas questões em discussão: (i) definir se a instituição financeira incorreu em falha na prestação do serviço ao permitir a ocorrência de fraude mediante contratação irregular de empréstimos e transferências bancárias atípicas; (ii) avaliar a adequação do valor fixado a título de indenização por danos morais. III. RAZÕES DE DECIDIR 1. A responsabilidade da instituição financeira é objetiva, nos termos do artigo 14, § 3º, inciso II, do Código de Defesa do Consumidor, e não se afasta pela simples alegação de uso de senha e token, quando presentes indícios objetivos de fraude e ausência de medidas de segurança adequadas. 2. A contratação dos empréstimos e a subsequente transferência dos valores, em sequência e com expressivos montantes via PIX, destoam do perfil da consumidora – idosa e pensionista – e não foram precedidas de medidas de autenticação adequadas, como biometria facial e geolocalização. 3. As transferências foram realizadas em horários atípicos e de forma concentrada, sem a adoção de qualquer mecanismo de contenção por parte da instituição financeira, que deixou de adotar as providências previstas no artigo 38, inciso II, da Resolução BCB nº 01/2020, aplicável também por força do artigo 32, inciso V, do mesmo normativo. 4. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (REsp 2.052.228/DF, Terceira Turma, Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 12/09/2023) consagra o dever de segurança como inerente à atividade bancária, impondo às instituições financeiras a obrigação de prevenir fraudes, independentemente da atuação do consumidor. 5. Verificada a falha na prestação do serviço e o dano decorrente, é devida a reparação moral, reconhecida inclusive pelo desvio produtivo da autora, que teve de mobilizar tempo e esforço para buscar solução à controvérsia causada por terceiro, sem qualquer culpa sua. 6. O valor de R$ 5.000,00 arbitrado a título de indenização por dano moral mostra-se adequado às circunstâncias do caso, atendendo aos critérios de razoabilidade, proporcionalidade e ao caráter compensatório da medida, inexistindo fundamento para majoração. IV. DISPOSITIVO Recursos não providos. (TJSP; Apelação Cível 1002139-96.2024.8.26.0411; Relator (a):Domingos de Siqueira Frascino; Órgão Julgador: Núcleo de Justiça 4.0 em Segundo Grau – Turma IV (Direito Privado 2); Foro de Pacaembu -2ª Vara; Data do Julgamento: 16/05/2025; Data de Registro: 16/05/2025) (grifo nosso) No que tange à fixação do quantum indenizatório, este deve ser arbitrado com moderação e razoabilidade, em observância às peculiaridades do caso, à capacidade econômica das partes e ao duplo caráter da medida: compensatório para a vítima e punitivo-pedagógico para o ofensor. O valor de R$ 3.000,00 (três mil reais), pleiteado na inicial, mostra-se adequado e proporcional à extensão do dano, sendo suficiente para reparar o abalo sofrido pelo autor sem implicar enriquecimento ilícito, e para desestimular a reiteração de condutas semelhantes por parte do réu. 3. DISPOSITIVO Ante o exposto, e por tudo mais que dos autos consta, com fundamento nos artigos 5º, XX, da Constituição Federal, e nos artigos 6º, III, 14, 30 e 51, IV, do Código de Defesa do Consumidor, JULGO PROCEDENTES os pedidos formulados na inicial, para: a) TORNAR DEFINITIVA A TUTELA DE URGÊNCIA, que ora concedo, e DETERMINAR que o BANCO DO BRASIL S.A., no prazo de 10 (dez) dias a contar da intimação desta sentença, promova a exclusão definitiva do nome de VICENTE DE SOUSA CELESTINO NETO da titularidade da conta corrente nº 21.324-1, da agência 1059-6, sob pena de multa diária que fixo em R$ 500,00 (quinhentos reais) limitada incialmente a R$ 10.000,00 (dez mil reais), sem prejuízo de outras medidas coercitivas que se fizerem necessárias; b) CONDENAR o BANCO DO BRASIL S.A. a pagar ao autor, a título de indenização por danos morais, o valor de R$ 3.000,00 (três mil reais), corrigido monetariamente pela tabela ENCOGE a partir da data desta sentença (Súmula 362 do STJ) e acrescido de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, a contar da citação (art. 405 do Código Civil). Em consequência, EXTINGO O PROCESSO COM RESOLUÇÃO DO MÉRITO, nos termos do art. 487, I, do Código de Processo Civil. Em razão da sucumbência, condeno a parte ré ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, que fixo em 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação, considerando o zelo do profissional, a natureza da causa e o trabalho realizado, nos termos do art. 85, § 2º, do CPC. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Após o trânsito em julgado, cumpridas as formalidades legais, arquivem-se os autos com as devidas baixas. Exu/PE, data conforme o sistema. João Victor Rocha da Silva Juiz Substituto

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Processo nº 0002010-86.2023.8.17.2580

ID: 335389646

Tribunal: TJPE Órgão: Vara Única da Comarca de Exu Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 0002010-86.2023.8.17.2580

Data de Disponibilização: 28/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

BANCO DO BRASIL SA

Sentença (Outras)

Advogados:

GIZA HELENA COELHO

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Tribunal de Justiça de Pernambuco Poder Judiciário Vara Única da Comarca de Exu AV EDMUNDO DANTAS, S/N, FORUM JUIZ VALDIR BARBOSA, Centro, EXU - PE - CEP: 56230-000 - F:(87) 38792928 Processo nº 0002… Tribunal de Justiça de Pernambuco Poder Judiciário Vara Única da Comarca de Exu AV EDMUNDO DANTAS, S/N, FORUM JUIZ VALDIR BARBOSA, Centro, EXU - PE - CEP: 56230-000 - F:(87) 38792928 Processo nº 0002010-86.2023.8.17.2580 AUTOR(A): VICENTE DE SOUSA CELESTINO NETO RÉU: BANCO DO BRASIL SA SENTENÇA 1. RELATÓRIO VICENTE DE SOUSA CELESTINO NETO, devidamente qualificado nos autos, ajuizou a presente ação de obrigação de fazer c/c indenização por danos morais em face do BANCO DO BRASIL S.A., pessoa jurídica também qualificada. Narra o autor, em sua petição inicial, que manteve com sua ex-cônjuge, Sra. Evanuza Precilia Carvalho de França, uma conta corrente conjunta junto à agência da instituição financeira ré. Aduz que, em virtude de divórcio consensual homologado judicialmente nos autos do processo nº 0000009-31.2023.8.17.2580 (ID 154705853), ficou acordado que o imóvel financiado, atrelado à referida conta, permaneceria com a ex-cônjuge, que assumiria a integralidade das obrigações financeiras correspondentes. Sustenta que, a despeito do acordo e de ter se dirigido por diversas vezes à agência bancária, acompanhado da cotitular, para formalizar sua exclusão da conta, o banco réu negou-se a proceder com a alteração, sob a alegação de que normativas internas não o permitiam. Diante da recusa, e temendo ser responsabilizado por débitos futuros, pleiteou a concessão de tutela de urgência para a imediata exclusão de seu nome da titularidade da conta. No mérito, requereu a confirmação da tutela, a condenação do réu ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 3.000,00 (três mil reais), além da inversão do ônus da prova e os benefícios da justiça gratuita. A decisão de ID 154852543 deferiu a gratuidade de justiça, porém indeferiu o pedido de tutela de urgência, por entender ausentes, em cognição sumária, provas robustas da ilegalidade do ato e da própria vinculação do autor à conta. Na mesma oportunidade, determinou-se a citação do réu. Devidamente citado (ID 157970851), o Banco do Brasil S.A. apresentou contestação (ID 160701349). Em sua defesa, arguiu, em síntese, a inexistência de falha na prestação de serviços. Sustentou que, conforme suas normas internas e o instrumento contratual, por ser o autor o 1º titular da conta, sua exclusão não seria possível. A providência correta, segundo o réu, seria a solicitação de exclusão pela 2ª titular (a ex-cônjuge), que deveria, então, abrir uma nova conta para a transferência do financiamento. Invocou os princípios da pacta sunt servanda e da boa-fé contratual. Impugnou o pedido de danos morais, por ausência de ato ilícito e por se tratar de mero aborrecimento, e rechaçou a inversão do ônus da prova. O autor apresentou réplica à contestação (ID 164145009), rebatendo os argumentos da defesa. Ressaltou que a conduta do banco viola seu próprio material informativo identificado como de “cartilha de conta corrente” (ID 154705850), que prevê a possibilidade de exclusão mediante concordância de todos os titulares, requisito que alega ter cumprido. Argumentou que a negativa do banco é abusiva e contrária ao Código de Defesa do Consumidor, e que a situação ultrapassa o mero dissabor, configurando dano moral indenizável em virtude do abuso de direito cometido pelo banco réu. Instadas as partes a especificarem as provas que pretendiam produzir (ID 180574727), o autor manifestou-se pelo julgamento antecipado da lide (ID 181515880), quedando-se silente a parte ré. É o relatório. Decido. 2. FUNDAMENTAÇÃO O feito comporta julgamento antecipado, nos termos do art. 355, I, do Código de Processo Civil, porquanto a matéria controvertida é eminentemente de direito e os fatos relevantes já se encontram suficientemente comprovados pelos documentos carreados aos autos, sendo desnecessária a produção de outras provas. 2.1 Da Relação de Consumo e da Legislação Aplicável Inicialmente, cumpre assentar que a relação jurídica estabelecida entre as partes é, inequivocamente, de consumo, nos exatos termos dos artigos 2º e 3º do Código de Defesa do Consumidor (CDC). O autor figura como destinatário final dos serviços prestados pela instituição financeira ré, que, por sua vez, enquadra-se perfeitamente no conceito de fornecedora. A matéria deve, portanto, ser analisada sob a égide do microssistema consumerista, cujos princípios, notadamente o da vulnerabilidade do consumidor, o do dever de informação e o da boa-fé objetiva, orientarão a presente decisão. 2.2 Do Mérito A controvérsia central cinge-se em verificar a legitimidade da recusa do banco réu em proceder à exclusão do autor da titularidade da conta corrente conjunta, e, em caso de ilicitude, se tal conduta enseja a reparação por danos morais. 2.2.1 Da Obrigação de Fazer – exclusão de cotitular O autor busca desvincular-se de uma obrigação contratual (a titularidade de uma conta corrente) cuja causa determinante, a sociedade conjugal, já não mais subsiste. O divórcio das partes, devidamente formalizado e homologado em juízo (ID 154705853), pôs fim ao vínculo que, presumivelmente, justificava a manutenção de uma conta conjunta. O acordo de divórcio (ID 154705857) foi claro ao destinar o imóvel financiado e a responsabilidade pelo seu pagamento exclusivamente à ex-cônjuge. Tal pacto, embora produza efeitos plenos entre os divorciandos, não é, por si só, oponível à instituição financeira, que não participou da avença. Contudo, serve como prova robusta da ausência de interesse do autor na manutenção do vínculo contratual com o banco. O cerne da questão repousa na conduta da instituição financeira. O banco réu fundamenta sua recusa em uma suposta norma interna, segundo a qual, sendo o autor o "primeiro titular", este não poderia ser excluído, cabendo à "segunda titular" a iniciativa de encerrar a relação e transferir o financiamento para uma nova conta. Tal argumento, todavia, não se sustenta, por ao menos três razões fundamentais. Primeiro, a tese defensiva colide frontalmente com a informação prestada pelo próprio banco em sua "Cartilha de Conta Corrente" (ID 154705850), documento juntado pelo autor. Na página 07 do referido manual, sob o título "exclusão de titular", o texto é ao dizer que: A exclusão de titular de conta conjunta, solidária ou não, somente pode ocorrer com a concordância formal de todos os titulares. É necessário que o cliente elabore um documento solicitando a retirada de um ou mais titulares, porém na correspondência deve conter a assinatura de todos os titulares, inclusive do(s) que vai (ão) ser retirado(s). Também existe um documento específico disponibilizado na agência onde é mantida a conta. (grifo nosso) Ora, o autor alega, e o réu não nega especificamente, que compareceu à agência acompanhado da cotitular, anuindo ambos com a exclusão. Cumpriu, portanto, o requisito que o próprio fornecedor tornou público. A informação veiculada de forma clara e precisa integra o contrato e vincula o fornecedor, nos termos do art. 30 do CDC. A imposição de um procedimento diverso, mais oneroso e não publicizado (a distinção entre "1º" e "2º" titular) representa conduta contraditória, que viola a boa-fé objetiva e a legítima expectativa do consumidor. Segundo, a pretensão do autor encontra amparo no princípio da liberdade de associação, previsto no art. 5º, XX, da Constituição Federal, que, por analogia, irradia seus efeitos sobre as relações contratuais de trato sucessivo, garantindo que ninguém pode ser compelido a permanecer indefinidamente vinculado a um contrato, mormente quando exaurido seu objeto ou finalidade. Manter o autor atrelado a uma conta que serve a um financiamento pelo qual não mais se responsabiliza (perante a ex-cônjuge) e de um bem que não mais usufrui, representa uma onerosidade excessiva, vedada pelo art. 51, IV, do CDC. Terceiro, a recusa do banco, ao criar um embaraço injustificado a um direito do consumidor, configura falha na prestação do serviço, violando o dever de informação e cooperação. Se existia um procedimento interno específico, cabia ao banco orientar os correntistas sobre como proceder, e não simplesmente negar a solicitação. Desta forma, a procedência do pedido de obrigação de fazer é medida que se impõe, para determinar que o banco réu promova a exclusão do nome do autor da titularidade da conta corrente nº 21.324-1, agência 1059-6, ressalvando-se, contudo, que tal exclusão não o exime de eventuais débitos solidários contraídos até a data da efetiva alteração cadastral. 2.2.2 Do Dano Moral Superada a questão da ilicitude da conduta do réu, passa-se à análise do pleito indenizatório. O dano moral, em sua acepção moderna, não se configura por qualquer dissabor ou aborrecimento. Exige-se uma lesão a direito da personalidade, uma ofensa que transcenda a normalidade e cause ao indivíduo dor, angústia ou humilhação significativas. No caso em tela, a situação vivenciada pelo autor ultrapassa o mero descumprimento contratual. O consumidor, após resolver sua situação familiar por meio de um divórcio judicial, buscou, de boa-fé e seguindo as orientações públicas do próprio fornecedor, solucionar a pendência administrativa. Contudo, deparou-se com uma negativa injustificada e com a imposição de barreiras burocráticas que o forçaram a buscar a tutela jurisdicional para exercer um direito que lhe era manifesto. Aplica-se à hipótese a teoria do desvio produtivo do consumidor, segundo a qual o tempo vital do consumidor, desperdiçado para a solução de problemas gerados pela má prestação de serviços, constitui um bem juridicamente tutelável, cuja violação enseja reparação. O autor foi obrigado a despender seu tempo e recursos, que poderiam ser empregados em trabalho, lazer ou descanso, para tentar resolver uma questão que o fornecedor tinha o dever de solucionar administrativamente. A conduta do banco réu, ao se negar a resolver a questão de forma simples e eficaz, gerou no autor angústia e impotência, sentimentos que extrapolam o dissabor cotidiano e configuram, sim, o dano moral indenizável. Neste sentido, é jurisprudência deste E. Tribunal de Justiça, senão vejamos: PROCESSO CIVIL. DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. CONTRATO DE SEGURO DE AUTOMÓVEL. SINISTRO. PAGAMENTO DA INDENIZAÇÃO SECURITÁRIA NEGADO NA VIA ADMINISTRATIVA. NÃO COMPROVADA A EXISTÊNCIA DE CLÁUSULA EXCLUDENTE DE COBERTURA NOS CASOS DE EMBRIAGUEZ DA PARTE CONDUTORA. ÔNUS DA SEGURADORA. ALEGAÇÃO DE EMBRIAGUEZ DA PARTE CONDUTORA NÃO COMPROVADA POR PROVAS TÉCNICAS. NEXO DE CAUSALIDADE NÃO DEMONSTRADO. ÔNUS PROBATÓRIO DA SEGURADORA. DEVIDO O PAGAMENTO DA INDENIZAÇÃO SECURITÁRIA. TABELA FIPE. PREVISÃO APÓLICE. NEGATIVA INJUSTIFICADA DA SEGURADORA. DANO MORAL CONFIGURADO. QUANTUM INDENIZATÓRIO FIXADO. INVERSÃO DO ÔNUS SUCUMBENCIAL. FIXAÇÃO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. ARTIGO 85, § 2º DO CPC. RECURSO PROVIDO.1. O caso em deslinde deve ser enquadrado, por equiparação, às hipóteses de relação de consumo, uma vez que as partes litigantes integram as definições legais de consumidora e de fornecedora de produtos e serviços, respectivamente, conforme o expressamente disposto nos artigos 2º e 3º do Código de Defesa do Consumidor, razão pela qual devem ser aplicadas à presente lide as normas protetivas do referido Diploma Legal.2. Não obstante o entendimento do c. Superior Tribunal de Justiça no sentido de que é lícita a cláusula que preveja a exclusão da cobertura securitária nos casos em que o sinistro ocorrer por embriaguez do condutor, verifica-se que o Banco do Brasil Seguro Auto não apresenta aos autos as condições gerais do seguro contratado, não comprovando a existência da aludida cláusula excludente, ônus probatório que competia à seguradora demandada (artigo 6º, inciso VIII, do CDC c/c artigo 373, inciso II, do CPC).3. A alegação de embriaguez da parte autora no momento do sinistro - fato não comprovado nos autos, diante da ausência de exames e provas técnicas - não seria motivo para, por si só, ensejar a negativa de pagamento da indenização securitária, devendo ser demonstrado pela seguradora, ainda, o nexo de causalidade existente entre o acidente automobilístico e o estado alcóolico do segurado. Precedentes dos Tribunais Pátrios. 4. Diante da ausência de comprovação de cláusula contratual excludente de cobertura securitária nos casos em que comprovada a embriaguez da parte condutora, e não demonstrada nos autos que a suposta ingestão de bebida alcóolica seria a causa determinante para o acidente automobilístico, mostra-se devido o pagamento da indenização securitária pelo Banco do Brasil Seguro Auto, nos termos acordados no contrato firmado.5. Falha na prestação do serviço que é capaz de ocasionar transtornos significativos à autora, em razão da injustificada negativa administrativa da seguradora para efetuar o pagamento da indenização securitária contratada, mormente se considerado que até o presente momento, isto é, após 10 (dez) anos do sinistro, o pagamento não foi realizado.6. Aplicação da "Teoria do Desvio Produtivo do Consumidor". Teoria que categoriza o tempo não apenas como um fato jurídico, mas também como um bem jurídico que deve ser tutelado pelo Poder Judiciário. Consumidor que deve ser reparado caso lesado em seu tempo por desídia ou falha na prestação do serviço fornecido. Precedente do STJ.7. Mediante análise das peculiaridades do caso concreto e com base nos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, mostra-se devida a fixação de indenização por danos morais, no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), considerando os transtornos sofridos e o potencial econômico da parte ofensora. Precedentes dos Tribunais Pátrios.8. Inversão do ônus sucumbencial. Seguradora demandada/recorrida que deve ser condenada a pagar as custas processuais e os honorários sucumbenciais, estes fixados em 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação (Artigo 85, § 2º, do CPC).9. Provimento da Apelação Cível. Decisão unânime. (Apelação Cível 555920-20014916-37.2013.8.17.0001, Rel. Eurico de Barros Correia Filho, 4ª Câmara Cível, julgado em 01/12/2022, DJe 05/01/2023) (grifo nosso) DIREITO DO CONSUMIDOR E CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. FRAUDE EM OPERAÇÕES BANCÁRIAS. CONTRATAÇÃO NÃO RECONHECIDA DE EMPRÉSTIMOS PESSOAIS E CONSIGNADO. TRANSFERÊNCIAS VIA PIX A TERCEIROS. OPERAÇÃO ATÍPICA. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. DANO MORAL CONFIGURADO. MANUTENÇÃO DO MONTANTE INDENIZATÓRIO. RECURSOS NÃO PROVIDOS. I. CASO EM EXAME Apelações interpostas contra sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos em ação declaratória de inexistência de débito cumulada com indenização por danos materiais e morais, ajuizada por idosa pensionista em face de instituição financeira, em razão de contratação não reconhecida de empréstimos e realização de transferências via PIX. A sentença declarou a inexistência do contrato, determinou a restituição simples dos valores descontados antes de 31/03/2021 e em dobro dos posteriores, e fixou indenização por danos morais no valor de R$ 5.000,00. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Há duas questões em discussão: (i) definir se a instituição financeira incorreu em falha na prestação do serviço ao permitir a ocorrência de fraude mediante contratação irregular de empréstimos e transferências bancárias atípicas; (ii) avaliar a adequação do valor fixado a título de indenização por danos morais. III. RAZÕES DE DECIDIR 1. A responsabilidade da instituição financeira é objetiva, nos termos do artigo 14, § 3º, inciso II, do Código de Defesa do Consumidor, e não se afasta pela simples alegação de uso de senha e token, quando presentes indícios objetivos de fraude e ausência de medidas de segurança adequadas. 2. A contratação dos empréstimos e a subsequente transferência dos valores, em sequência e com expressivos montantes via PIX, destoam do perfil da consumidora – idosa e pensionista – e não foram precedidas de medidas de autenticação adequadas, como biometria facial e geolocalização. 3. As transferências foram realizadas em horários atípicos e de forma concentrada, sem a adoção de qualquer mecanismo de contenção por parte da instituição financeira, que deixou de adotar as providências previstas no artigo 38, inciso II, da Resolução BCB nº 01/2020, aplicável também por força do artigo 32, inciso V, do mesmo normativo. 4. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (REsp 2.052.228/DF, Terceira Turma, Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 12/09/2023) consagra o dever de segurança como inerente à atividade bancária, impondo às instituições financeiras a obrigação de prevenir fraudes, independentemente da atuação do consumidor. 5. Verificada a falha na prestação do serviço e o dano decorrente, é devida a reparação moral, reconhecida inclusive pelo desvio produtivo da autora, que teve de mobilizar tempo e esforço para buscar solução à controvérsia causada por terceiro, sem qualquer culpa sua. 6. O valor de R$ 5.000,00 arbitrado a título de indenização por dano moral mostra-se adequado às circunstâncias do caso, atendendo aos critérios de razoabilidade, proporcionalidade e ao caráter compensatório da medida, inexistindo fundamento para majoração. IV. DISPOSITIVO Recursos não providos. (TJSP; Apelação Cível 1002139-96.2024.8.26.0411; Relator (a):Domingos de Siqueira Frascino; Órgão Julgador: Núcleo de Justiça 4.0 em Segundo Grau – Turma IV (Direito Privado 2); Foro de Pacaembu -2ª Vara; Data do Julgamento: 16/05/2025; Data de Registro: 16/05/2025) (grifo nosso) No que tange à fixação do quantum indenizatório, este deve ser arbitrado com moderação e razoabilidade, em observância às peculiaridades do caso, à capacidade econômica das partes e ao duplo caráter da medida: compensatório para a vítima e punitivo-pedagógico para o ofensor. O valor de R$ 3.000,00 (três mil reais), pleiteado na inicial, mostra-se adequado e proporcional à extensão do dano, sendo suficiente para reparar o abalo sofrido pelo autor sem implicar enriquecimento ilícito, e para desestimular a reiteração de condutas semelhantes por parte do réu. 3. DISPOSITIVO Ante o exposto, e por tudo mais que dos autos consta, com fundamento nos artigos 5º, XX, da Constituição Federal, e nos artigos 6º, III, 14, 30 e 51, IV, do Código de Defesa do Consumidor, JULGO PROCEDENTES os pedidos formulados na inicial, para: a) TORNAR DEFINITIVA A TUTELA DE URGÊNCIA, que ora concedo, e DETERMINAR que o BANCO DO BRASIL S.A., no prazo de 10 (dez) dias a contar da intimação desta sentença, promova a exclusão definitiva do nome de VICENTE DE SOUSA CELESTINO NETO da titularidade da conta corrente nº 21.324-1, da agência 1059-6, sob pena de multa diária que fixo em R$ 500,00 (quinhentos reais) limitada incialmente a R$ 10.000,00 (dez mil reais), sem prejuízo de outras medidas coercitivas que se fizerem necessárias; b) CONDENAR o BANCO DO BRASIL S.A. a pagar ao autor, a título de indenização por danos morais, o valor de R$ 3.000,00 (três mil reais), corrigido monetariamente pela tabela ENCOGE a partir da data desta sentença (Súmula 362 do STJ) e acrescido de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, a contar da citação (art. 405 do Código Civil). Em consequência, EXTINGO O PROCESSO COM RESOLUÇÃO DO MÉRITO, nos termos do art. 487, I, do Código de Processo Civil. Em razão da sucumbência, condeno a parte ré ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, que fixo em 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação, considerando o zelo do profissional, a natureza da causa e o trabalho realizado, nos termos do art. 85, § 2º, do CPC. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Após o trânsito em julgado, cumpridas as formalidades legais, arquivem-se os autos com as devidas baixas. Exu/PE, data conforme o sistema. João Victor Rocha da Silva Juiz Substituto

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Processo nº 0000009-53.2024.8.17.6021

ID: 318799312

Tribunal: TJPE Órgão: 8ª Câmara Cível Especializada - 1º (8CCE-1º) Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 0000009-53.2024.8.17.6021

Data de Disponibilização: 08/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

RITA DE CASSIA NUNES PEREIRA ARAUJO

Intimação (Outros)

Advogados:

JOSEFA RENE SANTOS PATRIOTA

OAB/PE XXXXXX Desbloquear

Tribunal de Justiça de Pernambuco Poder Judiciário 8ª Câmara Cível Especializada - 1º (8CCE-1º) Apelação Cível nº: 0000009-53.2024.8.17.6021 Agravante (s): AMIL ASSISTENCIA MEDICA INTERNACIONAL S.A A… Tribunal de Justiça de Pernambuco Poder Judiciário 8ª Câmara Cível Especializada - 1º (8CCE-1º) Apelação Cível nº: 0000009-53.2024.8.17.6021 Agravante (s): AMIL ASSISTENCIA MEDICA INTERNACIONAL S.A Agravado (s): RITA DE CASSIA NUNES PEREIRA ARAUJO Relator: DES. PAULO ROBERTO ALVES DA SILVA Decisão Terminativa AMIL ASSISTENCIA MEDICA INTERNACIONAL S.A interpôs apelação em face da sentença que julgou procedentes os pedidos de obrigação de fazer e condenou a apelante ao pagamento de compensação por danos morais. Na origem, a parte apelada ajuizou ação de obrigação de fazer, cumulada com pedido de indenização por danos morais e tutela de urgência, informando que é beneficiária do plano coletivo por adesão contratado junto à apelante e que sempre adimpliu regularmente o contrato. Relata que a operadora notificou a demandante com o intuito de romper o vínculo de forma unilateral pela operadora sem observar que a beneficiária, diagnosticada grave doença crônica, sendo portadora de REUMATÓIDE (CID M06.0); SÍNDROME SECA = SJOGHEN (CID M35) E FIBRAS FINAS (CID G63), doenças crônicas e incurável, necessitando de acompanhamento médico e exames para controle da doença e tratamento contínuo. Afirmou que a conduta das demandadas configura ofensa ao Código de Defesa do Consumidor e à Lei nº 9.656/98, bem como lesão aos direitos da personalidade da autora a ensejar a devida compensação por danos morais. Por isso, ajuizou a presente demanda, com pedido de obrigação de fazer c/c tutela de urgência e indenização por danos morais. Tutela de urgência deferida para determinar a reativação do plano de saúde da autora, sem a necessidade de cumprimento de novos prazos de carência, mediante contraprestação da mensalidade. Citada, a demandada ofereceu contestação, com preliminares de ilegitimidade passiva e pedido de denunciação da lide. No mérito, defende a regularidade do cancelamento, sob o fundamento de que o contrato em questão se refere a um plano coletivo por adesão e que a medida encontra autorização na Lei nº 9.656/98. Ao decidir, o juízo de origem afastou as preliminares julgou procedente o pedido de obrigação de fazer, confirmando a tutela de urgência e condenou a demanda ao pagamento de indenização por danos morais. Inconformada, a ré interpôs recurso de apelação. Em suas razões, a Amil suscitou preliminar de ilegitimidade passiva, e, no mérito, alegou que agiu em exercício regular de direito, afirmando que a possibilidade de migração para plano de comercialização de outras Operadoras, junto à Administradora ALLCARE, inclusive prevendo a possibilidade de migração de carência. No mais, defendeu a possibilidade de rescisão unilateral e imotivada do plano coletivo por adesão e que obedeceu os requisitos necessários para a promoção do encerramento do vínculo nessa condição, não havendo que se falar em dano moral. Intimada, a parte apelada ofereceu contrarrazões pelo não provimento dos recursos. É o relatório. Decido. Cinge-se a controvérsia à análise da legitimidade do cancelamento unilateral do plano coletivo e se o fato ensejou lesão extrapatrimonial indenizável. De início, observo que a apelante arguiu preliminar de ilegitimidade passiva. A questão se confunde com o mérito, motivo pelo qual passo a apreciar o tema em tópico específico, referente ao exame meritório. Pois bem. É relevante apontar que o caso em tela deve ser regido não apenas pelas disposições da Lei nº 9.656/98 e atos normativos da ANS, como também pelo Código de Defesa do Consumidor, aplicável aos planos de saúde, conforme previsão contida no art. 1º da Lei nº 9.656/981 e da Súmula nº 608 do STJ2. Assim, a apelante figuram como fornecedora de serviço, na forma do art. 3º do CDC, sendo solidariamente responsável com a administradora por vícios na prestação por força do disposto no art. 20 do mesmo diploma3. Por isso, não faz sentido discutir nestes autos a quem cabia ofertar novos produtos ao beneficiário ou quem foi o responsável pelo cancelamento, já que a solidariedade é imposta pela lei aos fornecedores, independentemente de quem deu causa ao ato danoso. Superada a questão, passa-se ao exame do cancelamento unilateral do plano. O tema é tratado pelo art. 17 da RN nº 195 da ANS, vigente à época do contrato que prevê a possibilidade da medida, desde que observada a vigência mínima de 12 meses e mediante prévia notificação, no prazo mínimo de 60 dias. Portanto, não se pode admitir que a ANS tenha autorizado de forma irrestrita e imotivada o cancelamento dos planos coletivos por adesão. Nesse sentido, vem entendendo a jurisprudência pátria: RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. SAÚDE SUPLEMENTAR. RESCISÃO UNILATERAL E IMOTIVADA DE PLANO DE SAÚDE COLETIVO. RESOLUÇÃO NORMATIVA DA ANS. CONTROLE DE LEGALIDADE PELO STJ. MOTIVAÇÃO IDÔNEA. NECESSIDADE. TRATAMENTO DE CÂNCER. INTERRUPÇÃO. BOA-FÉ. CONTROLE JUDICIAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS RECURSAIS. MAJORAÇÃO. 1. Ação ajuizada em 29/09/15. Recurso especial interposto em 24/11/16 e concluso ao gabinete em 06/11/17. 2. O propósito recursal é definir se é válida, em qualquer circunstância, a rescisão unilateral imotivada de plano de saúde coletivo por parte da operadora de plano de saúde. 3. A ANS estabeleceu por meio de Resolução Normativa que os contratos coletivos por adesão ou empresarial "somente poderão ser rescindidos imotivadamente após a vigência do período de doze meses e mediante prévia notificação da outra parte com antecedência mínima de sessenta dias" (art. 17, parágrafo único, da RN/ANS 195/09). 4. Não se pode admitir que a rescisão do contrato de saúde - cujo objeto, frise-se, não é mera mercadoria, mas bem fundamental associado à dignidade da pessoa humana - por postura exclusiva da operadora venha a interromper tratamento de doenças e ceifar o pleno restabelecimento da saúde do beneficiário enfermo. 5. Deve ser mantida a validade da cláusula contratual que permite a rescisão unilateral do contrato de plano de saúde coletivo, desde que haja motivação idônea. 6. No particular, a beneficiária estava em pleno tratamento de tumor cerebral e foi surpreendida com a rescisão unilateral e imotivada do plano de saúde. Considerando as informações concretamente registradas pelo acórdão recorrido, mantém-se o vínculo contratual entre as partes, pois inexistente motivação idônea para a rescisão do plano de saúde. 7. Recurso especial conhecido e não provido, com majoração de honorários. (STJ - REsp: 1762230 SP 2017/0267483-6, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 12/02/2019, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 15/02/2019) No caso, o cancelamento se deu de forma irregular, tendo em vista que a operadora deixou de assegurar a continuidade dos tratamentos que o paciente se submetia, tampouco permitiu a possibilidade de realizar portabilidade para outro plano. Cumpre destacar que esse dever foi reconhecido pelo STJ no julgamento do REsp: 1842751 (Tema Repetitivo nº 1.082): RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. PLANO DE SAÚDE COLETIVO. CANCELAMENTO UNILATERAL. BENEFICIÁRIO SUBMETIDO A TRATAMENTO MÉDICO DE DOENÇA GRAVE. 1. Tese jurídica firmada para fins do artigo 1.036 do CPC: "A operadora, mesmo após o exercício regular do direito à rescisão unilateral de plano coletivo, deverá assegurar a continuidade dos cuidados assistenciais prescritos a usuário internado ou em pleno tratamento médico garantidor de sua sobrevivência ou de sua incolumidade física, até a efetiva alta, desde que o titular arque integralmente com a contraprestação (mensalidade) devida." 2. Conquanto seja incontroverso que a aplicação do parágrafo único do artigo 13 da Lei 9.656/1998 restringe-se aos seguros e planos de saúde individuais ou familiares, sobressai o entendimento de que a impossibilidade de rescisão contratual durante a internação do usuário - ou a sua submissão a tratamento médico garantidor de sua sobrevivência ou da manutenção de sua incolumidade física - também alcança os pactos coletivos. 3. Isso porque, em havendo usuário internado ou em pleno tratamento de saúde, a operadora, mesmo após exercido o direito à rescisão unilateral do plano coletivo, deverá assegurar a continuidade dos cuidados assistenciais até a efetiva alta médica, por força da interpretação sistemática e teleológica dos artigos 8º, § 3º, alínea b, e 35-C, incisos I e II, da Lei n. 9.656/1998, bem como do artigo 16 da Resolução Normativa DC/ANS n. 465/2021, que reproduz, com pequenas alterações, o teor do artigo 18 contido nas Resoluções Normativas DC/ANS n. 428/2017, 387/2015 e 338/2013. 4. A aludida exegese também encontra amparo na boa-fé objetiva, na segurança jurídica, na função social do contrato e no princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, o que permite concluir que, ainda quando haja motivação idônea, a suspensão da cobertura ou a rescisão unilateral do plano de saúde não pode resultar em risco à preservação da saúde e da vida do usuário que se encontre em situação de extrema vulnerabilidade. 5. Caso concreto: (i) o pai do menor aderiu, em 7.2.2014, ao seguro-saúde coletivo empresarial oferecido pela ré, do qual a sua empregadora era estipulante; (ii) no referido pacto, havia cláusula expressa prevendo que, após o período de 12 meses de vigência, a avença poderia ser rescindida imotivadamente por qualquer uma das partes, mediante notificação por escrito com no mínimo 60 dias de antecedência; (iii) diante da aludida disposição contratual, a operadora enviou carta de rescisão ao estipulante, indicando o cancelamento da apólice em 16.12.2016; (iv) desde 10.11.2016, foi constatado que o menor - à época, recém-nascido - é portador de cardiopatia congênita, além de sequelas provenientes de infecção urinária causada por superbactéria, o que reclama o acompanhamento contínuo de cardiologista e de nefrologista a fim de garantir a sua sobrevivência; (v) em razão do cancelamento unilateral da apólice coletiva, o menor e o seu genitor - dependente e titular - ajuizaram a presente demanda, em 15.12.2016, postulando a manutenção do seguro-saúde enquanto perdurar a necessidade do referido acompanhamento médico e respectivo tratamento de saúde; (vi) em 15.12.2016, foi deferida antecipação da tutela jurisdicional pela magistrada de piso determinando que a ré custeasse o tratamento médico e hospitalar do menor (fls. 26-27), o que ensejou a reativação do plano de saúde em 19.12.2016; e (vii) a sentença - mantida pelo Tribunal de origem - condenou a ré a revogar o cancelamento da apólice objeto da lide, restabelecendo, assim, o seguro-saúde e as obrigações pactuadas. 6. Diante desse quadro, merece parcial reforma o acórdão estadual para se determinar que, observada a manutenção da cobertura financeira dos tratamentos médicos do usuário dependente que se encontrem em curso, seja o coautor (usuário titular) devidamente cientificado, após a alta médica, da extinção do vínculo contratual, contando-se, a partir de então, o prazo normativo para o exercício do direito de requerer a portabilidade de carência, nos termos da norma regulamentadora, salvo se optar por aderir a novo plano coletivo eventualmente firmado pelo seu atual empregador. 7. Recurso especial parcialmente provido. (STJ - REsp: 1842751 RS 2019/0145595-3, Data de Julgamento: 22/06/2022, S2 - SEGUNDA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 01/08/2022) Dessa forma, não prospera a tese de exercício regular de direito. No que se refere ao dano moral, entende-se com tal aquele que atinge o ofendido como pessoa, não lesando seu patrimônio. É lesão de bem a integrar os direitos da personalidade, tais como, a honra, a dignidade, a intimidade, a imagem, o bom nome, dentre outros. Importa destacar que o entendimento prevalente na doutrina e na jurisprudência é no sentido de que os danos morais não se confundem com a dor, o vexame, ou o sofrimento, pois estes são meras consequências que podem advir dos danos morais. A respeito do tema, convém destacar a lição de Anderson Schreiber4: Figura de notável importância na prática judicial brasileira, o dano moral consiste justamente na lesão a um atributo da personalidade humana. Assim, a lesão a qualquer dos direitos da personalidade, sejam expressamente reconhecidos ou não pelo Código Civil, configura dano moral. À conceituação do dano moral como lesão à personalidade humana opõe-se outro entendimento bastante difundido na doutrina e jurisprudência brasileiras, segundo o qual o dano moral consistiria na “dor, vexame, sofrimento ou humilhação.” Dessa forma, é possível compreender que para o reconhecimento dos danos morais é necessária a demonstração de lesão aos atributos da personalidade da vítima, gerada pela conduta do ofensor, cujo ônus recai, como regra, sobre aquele que alega ter sofrido, na forma do art. 373, I, do CPC, ficando ressalvadas as situações excepcionais em que o dano moral é presumido (in re ipsa)5. Pois bem. Nos casos de cancelamento indevido de contrato de plano de saúde, a jurisprudência é firme no sentido de que o ato enseja ofensa aos direitos da personalidade, especialmente quando o beneficiário encontra-se em tratamento médico e com a saúde fragilizada, causando abalo à saúde e à dignidade. Nesse sentido: CONSUMIDOR. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DECISÃO DA PRESIDÊNCIA. RECONSIDERAÇÃO. PLANO DE SAÚDE. CANCELAMENTO INDEVIDO. RESPONSABILIDADE. DANO MORAL CONFIGURADO. VALOR RAZOÁVEL E PROPORCIONAL. AGRAVO INTERNO PROVIDO PARA CONHECER DO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO. 1. A operadora do plano de saúde é responsável pelo cancelamento sumário do plano, sem nenhuma informação à parte prejudicada. 2. O Tribunal de origem entendeu que a condenação em R$ 10.000,00 (dez mil reais), a título de compensação por danos morais, se mostra razoável para indenizar a beneficiária do plano e suas dependentes, que são pessoas de idade avançada, que sofreram "aflição incomum, diante do cancelamento irregular do plano de saúde e da negativa para a realização de exame de natureza grave, por envolver neoplasia maligna". Tal valor se mostra razoável e proporcional. 3. Agravo interno provido para conhecer do agravo e negar provimento ao recurso especial. (STJ - AgInt no AREsp: 2474586 CE 2023/0362113-2, Relator: Ministro RAUL ARAÚJO, Data de Julgamento: 22/04/2024, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 02/05/2024) APELAÇÃO CÍVEL - CIVIL - OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - CANCELAMENTO INDEVIDO DE PLANO DE SAÚDE - DANO MORAL - CRITÉRIOS PARA FIXAÇÃO DO VALOR DA INDENIZAÇÃO - DEU-SE PROVIMENTO. 1. O cancelamento indevido de plano de saúde gera dano moral, pois repercute em violação à incolumidade física e psíquica do consumidor. 2. Para o arbitramento do valor da indenização por danos morais devem ser levados em consideração o grau de lesividade da conduta ofensiva e a capacidade econômica da parte pagadora, a fim de se fixar uma quantia moderada, que não resulte inexpressiva para o causador do dano. No caso, R$ 15.000,00 (quinze mil reais). 3. Deu-se provimento ao apelo. (TJ-DF 20150310271840 0026698-43.2015.8.07.0003, Relator: SÉRGIO ROCHA, Data de Julgamento: 16/11/2016, 4ª TURMA CÍVEL, Data de Publicação: Publicado no DJE : 24/01/2017 . Pág.: 641/657) Em relação ao quantum, registro que o valor da indenização não pode ser de ordem que venha a causar ao autor do ato ilícito um empobrecimento indevido, impondo-lhe um valor excessivo. Ao mesmo tempo, não há de ser um valor vil, a ponto de deixar um sentimento de “impunidade”, incentivando à prática de novos atos por parte do agente causador ou por outrem. A indenização tem, também, um condão de educar; de ser medida com finalidade pedagógica, a exemplificar para que o ato não venha a ser renovado pelo agente causador ou por qualquer outro, levando-se em consideração a capacidade do agente causador e a dor e sofrimento experimentados pela vítima. Vale mencionar entendimento jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça, ao decidir sobre critérios de apuração do dano moral, a saber: “Na fixação da indenização por danos morais, recomendável que o arbitramento seja feito com moderação, proporcionalmente ao grau de culpa, ao nível socioeconômico dos autores, e, ainda, ao porte da empresa recorrida, orientando-se o juiz pelos critérios sugeridos pela doutrina e jurisprudência, com razoabilidade, valendo-se de sua experiência e do bom senso, atento à realidade da vida e às peculiaridades de cada caso.” (Resp 135.202-0-SP, 4ªT., rel. Min Sálvio de Figueiredo, j. 19-5-1998). Deve-se observar, também, para fixação da indenização, a lição do Professor Rizzato Nunes, em sua obra Curso de Direito do Consumidor, da editora Saraiva e que vale a pena cita alguns critérios, a seguir enumerados: A natureza específica da ofensa; A intensidade real, concreta, efetiva do sofrimento do ofendido; A sua repercussão no meio social em que vive; A existência de dolo (má fé) por parte do ofensor, na prática do ato danoso e o grau de sua culpa; A situação econômica do ofensor; A capacidade e possibilidade de ofensor voltar à prática do ato ilícito; As atenuantes realizadas pelo ofensor visando diminuir a dor do ofendido; A necessidade de punição ao caso concreto. Considerando tudo o que foi exposto, entendo que a sentença fixou o valor da indenização em patamar razoável de R$ 5.000,00 em relação às particularidades do caso, como o valor desfalcado e a condição econômica das partes, não havendo o que reformar. Por fim, no que se refere à obrigação de fazer, consistente na reativação do plano, trata-se, conforme mencionado, de dever da operadora, que promoveu o cancelamento do contrato enquanto o autor/apelado realizava tratamento médico garantidor de sua sobrevivência, ou da manutenção de sua incolumidade física, nos moldes do que foi estabelecido pelo STJ no julgamento do Tema nº 1.082. No mais, a Resolução nº 19 do Conselho de Saúde Suplementar (CONSU) prevê, em seu art. 1º, que: “as operadoras de planos ou seguros de assistência à saúde, que administram ou operam planos coletivos empresariais ou por adesão para empresas que concedem esse benefício a seus empregados, ou ex-empregados, deverão disponibilizar plano ou seguro de assistência à saúde na modalidade individual ou familiar ao universo de beneficiários, no caso de cancelamento desse benefício, sem necessidade de cumprimento de novos prazos de carência.” Em razão de tais fundamentos, é de rigor a manutenção da sentença vergastada. Ante o exposto, com fulcro no art. 932, IV, “b”, nego provimento ao recurso e condeno os apelados ao pagamento de honorários advocatícios devidos ao advogado da apelante no percentual de 20% sobre o valor da causa. Recife, na data da assinatura eletrônica. Des. Paulo Roberto Alves da Silva Relator 03 1. art. 1º, Lei nº 9.656/98: Submetem-se às disposições desta Lei as pessoas jurídicas de direito privado que operam planos de assistência à saúde, sem prejuízo do cumprimento da legislação específica que rege a sua atividade e, simultaneamente, das disposições da Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990 (Código de Defesa do Consumidor), adotando-se, para fins de aplicação das normas aqui estabelecidas, as seguintes definições 2. Súmula nº 608 do STJ: "Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde, salvo os administrados por entidades de autogestão.” 3. art. 20, CDC: O fornecedor de serviços responde pelos vícios de qualidade que os tornem impróprios ao consumo ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade com as indicações constantes da oferta ou mensagem publicitária, podendo o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha: (…) 4 SCHREIBER, Anderson Direitos da Personalidade/ Anderson Schreiber. 2. ed. - São Paulo: Atlas, 2013. 5 Súmula 403 do STJ: Independe de prova do prejuízo a indenização pela publicação não autorizada de imagem de pessoa com fins econômicos ou comerciais.

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Processo nº 0000009-53.2024.8.17.6021

ID: 318799317

Tribunal: TJPE Órgão: 8ª Câmara Cível Especializada - 1º (8CCE-1º) Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 0000009-53.2024.8.17.6021

Data de Disponibilização: 08/07/2025

Polo Ativo:

AMIL ASSISTENCIA MEDICA INTERNACIONAL S.A.

Polo Passivo:

Intimação (Outros)

Advogados:

PAULO ROBERTO VIGNA

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

Tribunal de Justiça de Pernambuco Poder Judiciário 8ª Câmara Cível Especializada - 1º (8CCE-1º) Apelação Cível nº: 0000009-53.2024.8.17.6021 Agravante (s): AMIL ASSISTENCIA MEDICA INTERNACIONAL S.A A… Tribunal de Justiça de Pernambuco Poder Judiciário 8ª Câmara Cível Especializada - 1º (8CCE-1º) Apelação Cível nº: 0000009-53.2024.8.17.6021 Agravante (s): AMIL ASSISTENCIA MEDICA INTERNACIONAL S.A Agravado (s): RITA DE CASSIA NUNES PEREIRA ARAUJO Relator: DES. PAULO ROBERTO ALVES DA SILVA Decisão Terminativa AMIL ASSISTENCIA MEDICA INTERNACIONAL S.A interpôs apelação em face da sentença que julgou procedentes os pedidos de obrigação de fazer e condenou a apelante ao pagamento de compensação por danos morais. Na origem, a parte apelada ajuizou ação de obrigação de fazer, cumulada com pedido de indenização por danos morais e tutela de urgência, informando que é beneficiária do plano coletivo por adesão contratado junto à apelante e que sempre adimpliu regularmente o contrato. Relata que a operadora notificou a demandante com o intuito de romper o vínculo de forma unilateral pela operadora sem observar que a beneficiária, diagnosticada grave doença crônica, sendo portadora de REUMATÓIDE (CID M06.0); SÍNDROME SECA = SJOGHEN (CID M35) E FIBRAS FINAS (CID G63), doenças crônicas e incurável, necessitando de acompanhamento médico e exames para controle da doença e tratamento contínuo. Afirmou que a conduta das demandadas configura ofensa ao Código de Defesa do Consumidor e à Lei nº 9.656/98, bem como lesão aos direitos da personalidade da autora a ensejar a devida compensação por danos morais. Por isso, ajuizou a presente demanda, com pedido de obrigação de fazer c/c tutela de urgência e indenização por danos morais. Tutela de urgência deferida para determinar a reativação do plano de saúde da autora, sem a necessidade de cumprimento de novos prazos de carência, mediante contraprestação da mensalidade. Citada, a demandada ofereceu contestação, com preliminares de ilegitimidade passiva e pedido de denunciação da lide. No mérito, defende a regularidade do cancelamento, sob o fundamento de que o contrato em questão se refere a um plano coletivo por adesão e que a medida encontra autorização na Lei nº 9.656/98. Ao decidir, o juízo de origem afastou as preliminares julgou procedente o pedido de obrigação de fazer, confirmando a tutela de urgência e condenou a demanda ao pagamento de indenização por danos morais. Inconformada, a ré interpôs recurso de apelação. Em suas razões, a Amil suscitou preliminar de ilegitimidade passiva, e, no mérito, alegou que agiu em exercício regular de direito, afirmando que a possibilidade de migração para plano de comercialização de outras Operadoras, junto à Administradora ALLCARE, inclusive prevendo a possibilidade de migração de carência. No mais, defendeu a possibilidade de rescisão unilateral e imotivada do plano coletivo por adesão e que obedeceu os requisitos necessários para a promoção do encerramento do vínculo nessa condição, não havendo que se falar em dano moral. Intimada, a parte apelada ofereceu contrarrazões pelo não provimento dos recursos. É o relatório. Decido. Cinge-se a controvérsia à análise da legitimidade do cancelamento unilateral do plano coletivo e se o fato ensejou lesão extrapatrimonial indenizável. De início, observo que a apelante arguiu preliminar de ilegitimidade passiva. A questão se confunde com o mérito, motivo pelo qual passo a apreciar o tema em tópico específico, referente ao exame meritório. Pois bem. É relevante apontar que o caso em tela deve ser regido não apenas pelas disposições da Lei nº 9.656/98 e atos normativos da ANS, como também pelo Código de Defesa do Consumidor, aplicável aos planos de saúde, conforme previsão contida no art. 1º da Lei nº 9.656/981 e da Súmula nº 608 do STJ2. Assim, a apelante figuram como fornecedora de serviço, na forma do art. 3º do CDC, sendo solidariamente responsável com a administradora por vícios na prestação por força do disposto no art. 20 do mesmo diploma3. Por isso, não faz sentido discutir nestes autos a quem cabia ofertar novos produtos ao beneficiário ou quem foi o responsável pelo cancelamento, já que a solidariedade é imposta pela lei aos fornecedores, independentemente de quem deu causa ao ato danoso. Superada a questão, passa-se ao exame do cancelamento unilateral do plano. O tema é tratado pelo art. 17 da RN nº 195 da ANS, vigente à época do contrato que prevê a possibilidade da medida, desde que observada a vigência mínima de 12 meses e mediante prévia notificação, no prazo mínimo de 60 dias. Portanto, não se pode admitir que a ANS tenha autorizado de forma irrestrita e imotivada o cancelamento dos planos coletivos por adesão. Nesse sentido, vem entendendo a jurisprudência pátria: RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. SAÚDE SUPLEMENTAR. RESCISÃO UNILATERAL E IMOTIVADA DE PLANO DE SAÚDE COLETIVO. RESOLUÇÃO NORMATIVA DA ANS. CONTROLE DE LEGALIDADE PELO STJ. MOTIVAÇÃO IDÔNEA. NECESSIDADE. TRATAMENTO DE CÂNCER. INTERRUPÇÃO. BOA-FÉ. CONTROLE JUDICIAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS RECURSAIS. MAJORAÇÃO. 1. Ação ajuizada em 29/09/15. Recurso especial interposto em 24/11/16 e concluso ao gabinete em 06/11/17. 2. O propósito recursal é definir se é válida, em qualquer circunstância, a rescisão unilateral imotivada de plano de saúde coletivo por parte da operadora de plano de saúde. 3. A ANS estabeleceu por meio de Resolução Normativa que os contratos coletivos por adesão ou empresarial "somente poderão ser rescindidos imotivadamente após a vigência do período de doze meses e mediante prévia notificação da outra parte com antecedência mínima de sessenta dias" (art. 17, parágrafo único, da RN/ANS 195/09). 4. Não se pode admitir que a rescisão do contrato de saúde - cujo objeto, frise-se, não é mera mercadoria, mas bem fundamental associado à dignidade da pessoa humana - por postura exclusiva da operadora venha a interromper tratamento de doenças e ceifar o pleno restabelecimento da saúde do beneficiário enfermo. 5. Deve ser mantida a validade da cláusula contratual que permite a rescisão unilateral do contrato de plano de saúde coletivo, desde que haja motivação idônea. 6. No particular, a beneficiária estava em pleno tratamento de tumor cerebral e foi surpreendida com a rescisão unilateral e imotivada do plano de saúde. Considerando as informações concretamente registradas pelo acórdão recorrido, mantém-se o vínculo contratual entre as partes, pois inexistente motivação idônea para a rescisão do plano de saúde. 7. Recurso especial conhecido e não provido, com majoração de honorários. (STJ - REsp: 1762230 SP 2017/0267483-6, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 12/02/2019, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 15/02/2019) No caso, o cancelamento se deu de forma irregular, tendo em vista que a operadora deixou de assegurar a continuidade dos tratamentos que o paciente se submetia, tampouco permitiu a possibilidade de realizar portabilidade para outro plano. Cumpre destacar que esse dever foi reconhecido pelo STJ no julgamento do REsp: 1842751 (Tema Repetitivo nº 1.082): RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. PLANO DE SAÚDE COLETIVO. CANCELAMENTO UNILATERAL. BENEFICIÁRIO SUBMETIDO A TRATAMENTO MÉDICO DE DOENÇA GRAVE. 1. Tese jurídica firmada para fins do artigo 1.036 do CPC: "A operadora, mesmo após o exercício regular do direito à rescisão unilateral de plano coletivo, deverá assegurar a continuidade dos cuidados assistenciais prescritos a usuário internado ou em pleno tratamento médico garantidor de sua sobrevivência ou de sua incolumidade física, até a efetiva alta, desde que o titular arque integralmente com a contraprestação (mensalidade) devida." 2. Conquanto seja incontroverso que a aplicação do parágrafo único do artigo 13 da Lei 9.656/1998 restringe-se aos seguros e planos de saúde individuais ou familiares, sobressai o entendimento de que a impossibilidade de rescisão contratual durante a internação do usuário - ou a sua submissão a tratamento médico garantidor de sua sobrevivência ou da manutenção de sua incolumidade física - também alcança os pactos coletivos. 3. Isso porque, em havendo usuário internado ou em pleno tratamento de saúde, a operadora, mesmo após exercido o direito à rescisão unilateral do plano coletivo, deverá assegurar a continuidade dos cuidados assistenciais até a efetiva alta médica, por força da interpretação sistemática e teleológica dos artigos 8º, § 3º, alínea b, e 35-C, incisos I e II, da Lei n. 9.656/1998, bem como do artigo 16 da Resolução Normativa DC/ANS n. 465/2021, que reproduz, com pequenas alterações, o teor do artigo 18 contido nas Resoluções Normativas DC/ANS n. 428/2017, 387/2015 e 338/2013. 4. A aludida exegese também encontra amparo na boa-fé objetiva, na segurança jurídica, na função social do contrato e no princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, o que permite concluir que, ainda quando haja motivação idônea, a suspensão da cobertura ou a rescisão unilateral do plano de saúde não pode resultar em risco à preservação da saúde e da vida do usuário que se encontre em situação de extrema vulnerabilidade. 5. Caso concreto: (i) o pai do menor aderiu, em 7.2.2014, ao seguro-saúde coletivo empresarial oferecido pela ré, do qual a sua empregadora era estipulante; (ii) no referido pacto, havia cláusula expressa prevendo que, após o período de 12 meses de vigência, a avença poderia ser rescindida imotivadamente por qualquer uma das partes, mediante notificação por escrito com no mínimo 60 dias de antecedência; (iii) diante da aludida disposição contratual, a operadora enviou carta de rescisão ao estipulante, indicando o cancelamento da apólice em 16.12.2016; (iv) desde 10.11.2016, foi constatado que o menor - à época, recém-nascido - é portador de cardiopatia congênita, além de sequelas provenientes de infecção urinária causada por superbactéria, o que reclama o acompanhamento contínuo de cardiologista e de nefrologista a fim de garantir a sua sobrevivência; (v) em razão do cancelamento unilateral da apólice coletiva, o menor e o seu genitor - dependente e titular - ajuizaram a presente demanda, em 15.12.2016, postulando a manutenção do seguro-saúde enquanto perdurar a necessidade do referido acompanhamento médico e respectivo tratamento de saúde; (vi) em 15.12.2016, foi deferida antecipação da tutela jurisdicional pela magistrada de piso determinando que a ré custeasse o tratamento médico e hospitalar do menor (fls. 26-27), o que ensejou a reativação do plano de saúde em 19.12.2016; e (vii) a sentença - mantida pelo Tribunal de origem - condenou a ré a revogar o cancelamento da apólice objeto da lide, restabelecendo, assim, o seguro-saúde e as obrigações pactuadas. 6. Diante desse quadro, merece parcial reforma o acórdão estadual para se determinar que, observada a manutenção da cobertura financeira dos tratamentos médicos do usuário dependente que se encontrem em curso, seja o coautor (usuário titular) devidamente cientificado, após a alta médica, da extinção do vínculo contratual, contando-se, a partir de então, o prazo normativo para o exercício do direito de requerer a portabilidade de carência, nos termos da norma regulamentadora, salvo se optar por aderir a novo plano coletivo eventualmente firmado pelo seu atual empregador. 7. Recurso especial parcialmente provido. (STJ - REsp: 1842751 RS 2019/0145595-3, Data de Julgamento: 22/06/2022, S2 - SEGUNDA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 01/08/2022) Dessa forma, não prospera a tese de exercício regular de direito. No que se refere ao dano moral, entende-se com tal aquele que atinge o ofendido como pessoa, não lesando seu patrimônio. É lesão de bem a integrar os direitos da personalidade, tais como, a honra, a dignidade, a intimidade, a imagem, o bom nome, dentre outros. Importa destacar que o entendimento prevalente na doutrina e na jurisprudência é no sentido de que os danos morais não se confundem com a dor, o vexame, ou o sofrimento, pois estes são meras consequências que podem advir dos danos morais. A respeito do tema, convém destacar a lição de Anderson Schreiber4: Figura de notável importância na prática judicial brasileira, o dano moral consiste justamente na lesão a um atributo da personalidade humana. Assim, a lesão a qualquer dos direitos da personalidade, sejam expressamente reconhecidos ou não pelo Código Civil, configura dano moral. À conceituação do dano moral como lesão à personalidade humana opõe-se outro entendimento bastante difundido na doutrina e jurisprudência brasileiras, segundo o qual o dano moral consistiria na “dor, vexame, sofrimento ou humilhação.” Dessa forma, é possível compreender que para o reconhecimento dos danos morais é necessária a demonstração de lesão aos atributos da personalidade da vítima, gerada pela conduta do ofensor, cujo ônus recai, como regra, sobre aquele que alega ter sofrido, na forma do art. 373, I, do CPC, ficando ressalvadas as situações excepcionais em que o dano moral é presumido (in re ipsa)5. Pois bem. Nos casos de cancelamento indevido de contrato de plano de saúde, a jurisprudência é firme no sentido de que o ato enseja ofensa aos direitos da personalidade, especialmente quando o beneficiário encontra-se em tratamento médico e com a saúde fragilizada, causando abalo à saúde e à dignidade. Nesse sentido: CONSUMIDOR. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DECISÃO DA PRESIDÊNCIA. RECONSIDERAÇÃO. PLANO DE SAÚDE. CANCELAMENTO INDEVIDO. RESPONSABILIDADE. DANO MORAL CONFIGURADO. VALOR RAZOÁVEL E PROPORCIONAL. AGRAVO INTERNO PROVIDO PARA CONHECER DO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO. 1. A operadora do plano de saúde é responsável pelo cancelamento sumário do plano, sem nenhuma informação à parte prejudicada. 2. O Tribunal de origem entendeu que a condenação em R$ 10.000,00 (dez mil reais), a título de compensação por danos morais, se mostra razoável para indenizar a beneficiária do plano e suas dependentes, que são pessoas de idade avançada, que sofreram "aflição incomum, diante do cancelamento irregular do plano de saúde e da negativa para a realização de exame de natureza grave, por envolver neoplasia maligna". Tal valor se mostra razoável e proporcional. 3. Agravo interno provido para conhecer do agravo e negar provimento ao recurso especial. (STJ - AgInt no AREsp: 2474586 CE 2023/0362113-2, Relator: Ministro RAUL ARAÚJO, Data de Julgamento: 22/04/2024, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 02/05/2024) APELAÇÃO CÍVEL - CIVIL - OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - CANCELAMENTO INDEVIDO DE PLANO DE SAÚDE - DANO MORAL - CRITÉRIOS PARA FIXAÇÃO DO VALOR DA INDENIZAÇÃO - DEU-SE PROVIMENTO. 1. O cancelamento indevido de plano de saúde gera dano moral, pois repercute em violação à incolumidade física e psíquica do consumidor. 2. Para o arbitramento do valor da indenização por danos morais devem ser levados em consideração o grau de lesividade da conduta ofensiva e a capacidade econômica da parte pagadora, a fim de se fixar uma quantia moderada, que não resulte inexpressiva para o causador do dano. No caso, R$ 15.000,00 (quinze mil reais). 3. Deu-se provimento ao apelo. (TJ-DF 20150310271840 0026698-43.2015.8.07.0003, Relator: SÉRGIO ROCHA, Data de Julgamento: 16/11/2016, 4ª TURMA CÍVEL, Data de Publicação: Publicado no DJE : 24/01/2017 . Pág.: 641/657) Em relação ao quantum, registro que o valor da indenização não pode ser de ordem que venha a causar ao autor do ato ilícito um empobrecimento indevido, impondo-lhe um valor excessivo. Ao mesmo tempo, não há de ser um valor vil, a ponto de deixar um sentimento de “impunidade”, incentivando à prática de novos atos por parte do agente causador ou por outrem. A indenização tem, também, um condão de educar; de ser medida com finalidade pedagógica, a exemplificar para que o ato não venha a ser renovado pelo agente causador ou por qualquer outro, levando-se em consideração a capacidade do agente causador e a dor e sofrimento experimentados pela vítima. Vale mencionar entendimento jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça, ao decidir sobre critérios de apuração do dano moral, a saber: “Na fixação da indenização por danos morais, recomendável que o arbitramento seja feito com moderação, proporcionalmente ao grau de culpa, ao nível socioeconômico dos autores, e, ainda, ao porte da empresa recorrida, orientando-se o juiz pelos critérios sugeridos pela doutrina e jurisprudência, com razoabilidade, valendo-se de sua experiência e do bom senso, atento à realidade da vida e às peculiaridades de cada caso.” (Resp 135.202-0-SP, 4ªT., rel. Min Sálvio de Figueiredo, j. 19-5-1998). Deve-se observar, também, para fixação da indenização, a lição do Professor Rizzato Nunes, em sua obra Curso de Direito do Consumidor, da editora Saraiva e que vale a pena cita alguns critérios, a seguir enumerados: A natureza específica da ofensa; A intensidade real, concreta, efetiva do sofrimento do ofendido; A sua repercussão no meio social em que vive; A existência de dolo (má fé) por parte do ofensor, na prática do ato danoso e o grau de sua culpa; A situação econômica do ofensor; A capacidade e possibilidade de ofensor voltar à prática do ato ilícito; As atenuantes realizadas pelo ofensor visando diminuir a dor do ofendido; A necessidade de punição ao caso concreto. Considerando tudo o que foi exposto, entendo que a sentença fixou o valor da indenização em patamar razoável de R$ 5.000,00 em relação às particularidades do caso, como o valor desfalcado e a condição econômica das partes, não havendo o que reformar. Por fim, no que se refere à obrigação de fazer, consistente na reativação do plano, trata-se, conforme mencionado, de dever da operadora, que promoveu o cancelamento do contrato enquanto o autor/apelado realizava tratamento médico garantidor de sua sobrevivência, ou da manutenção de sua incolumidade física, nos moldes do que foi estabelecido pelo STJ no julgamento do Tema nº 1.082. No mais, a Resolução nº 19 do Conselho de Saúde Suplementar (CONSU) prevê, em seu art. 1º, que: “as operadoras de planos ou seguros de assistência à saúde, que administram ou operam planos coletivos empresariais ou por adesão para empresas que concedem esse benefício a seus empregados, ou ex-empregados, deverão disponibilizar plano ou seguro de assistência à saúde na modalidade individual ou familiar ao universo de beneficiários, no caso de cancelamento desse benefício, sem necessidade de cumprimento de novos prazos de carência.” Em razão de tais fundamentos, é de rigor a manutenção da sentença vergastada. Ante o exposto, com fulcro no art. 932, IV, “b”, nego provimento ao recurso e condeno os apelados ao pagamento de honorários advocatícios devidos ao advogado da apelante no percentual de 20% sobre o valor da causa. Recife, na data da assinatura eletrônica. Des. Paulo Roberto Alves da Silva Relator 03 1. art. 1º, Lei nº 9.656/98: Submetem-se às disposições desta Lei as pessoas jurídicas de direito privado que operam planos de assistência à saúde, sem prejuízo do cumprimento da legislação específica que rege a sua atividade e, simultaneamente, das disposições da Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990 (Código de Defesa do Consumidor), adotando-se, para fins de aplicação das normas aqui estabelecidas, as seguintes definições 2. Súmula nº 608 do STJ: "Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde, salvo os administrados por entidades de autogestão.” 3. art. 20, CDC: O fornecedor de serviços responde pelos vícios de qualidade que os tornem impróprios ao consumo ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade com as indicações constantes da oferta ou mensagem publicitária, podendo o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha: (…) 4 SCHREIBER, Anderson Direitos da Personalidade/ Anderson Schreiber. 2. ed. - São Paulo: Atlas, 2013. 5 Súmula 403 do STJ: Independe de prova do prejuízo a indenização pela publicação não autorizada de imagem de pessoa com fins econômicos ou comerciais.

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Processo nº 0002774-91.2019.8.17.0000

ID: 260558160

Tribunal: TJPE Órgão: Gabinete do Des. Cláudio Jean Nogueira Virgínio Classe: REVISãO CRIMINAL Nº Processo: 0002774-91.2019.8.17.0000

Data de Disponibilização: 25/04/2025

Polo Ativo:

DAMIAO PEREIRA DA SILVA

Polo Passivo:

Intimação (Outros)

Advogados:

HENRIQUE MARCULA LIMA

OAB/PE XXXXXX Desbloquear

Tribunal de Justiça de Pernambuco Poder Judiciário Seção Criminal Praça da República, s/n, Santo Antônio, RECIFE - PE - CEP: 50010-040 - F:( ) Processo nº 0002774-91.2019.8.17.0000 APELANTE: DAMIAO P… Tribunal de Justiça de Pernambuco Poder Judiciário Seção Criminal Praça da República, s/n, Santo Antônio, RECIFE - PE - CEP: 50010-040 - F:( ) Processo nº 0002774-91.2019.8.17.0000 APELANTE: DAMIAO PEREIRA DA SILVA, FRANCISCO PEREIRA DA SILVA, CICERO PEREIRA DA SILVA APELADO(A): MINISTERIO PUBLICO DE PERNAMBUCO INTEIRO TEOR Relator: CLAUDIO JEAN NOGUEIRA VIRGINIO Relatório: Poder Judiciário Tribunal de Justiça de Pernambuco Gabinete do Des. Cláudio Jean Nogueira Virgínio REVISÃO CRIMINAL Nº: 0002774-91.2019.8.17.0000 REQUERENTES: DAMIÃO PEREIRA DA SILVA, FRANCISCO PEREIRA DA SILVA, CÍCERO PEREIRA DA SILVA ADVOGADO: HENRIQUE MARCULA LIMA REQUERIDA: JUSTIÇA PÚBLICA ÓRGÃO JULGADOR: SEÇÃO CRIMINAL RELATOR: DES. CLÁUDIO JEAN NOGUEIRA VIRGÍNIO PROCURADOR: JOSÉ CORREIA DE ARAÚJO RELATÓRIO Compulsando os autos, e em conformidade com a certidão de ID 43801982, destaco que a presente revisão criminal já conta com relatório devidamente lançado, com data de 23/08/2022 (ID 43801982), quando o processo ainda tramitava na modalidade física. Sendo assim, transcrevo o teor do relatório apenas para fins de registro no julgamento a ser feito por meio desta plataforma digital: "Cuida-se de revisão criminal ajuizada por Damião Pereira da Silva, Francisco Pereira da Silva e Cícero Pereira da Silva, com fundamento no art. 621, incisos I e III, do Código de Processo Penal, objetivando desconstituir condenação proferida pelo Juízo de Direito da 1ª Vara da Comarca de Cabrobó, nos autos do Proc. nº 0000009-66.1985.8.17.0380, em que foi aplicada: ao primeiro, a pena de 16 (dezesseis) anos de reclusão; e ao segundo e terceiro, a pena de 13 (treze) anos de reclusão; todos pela prática do crime previsto no art. 121, § 2°, incisos II e IV, do Código Penal (homicídio duplamente qualificado). Narram os Requerentes que foram denunciados nos autos do processo supramencionado sob a acusação de terem assassinado a vítima Sebastião Adauto da Silva, no dia 20/01/1985. Afirmam que, encerrada a primeira fase da instrução, o revisionando Damião Pereira da Silva foi pronunciado como incurso nas penas do art. 121, caput, do Código Penal, ao passo que o revisionando Cícero Pereira da Silva foi impronunciado, e Francisco Pereira da Silva teve a conduta desclassificada para a do tipo penal previsto no art. 121, § 1°, do Código Penal (homicídio privilegiado). Aduzem que o Ministério Público interpôs recurso em sentido estrito, o qual foi provido pela Terceira Câmara Criminal deste Tribunal de Justiça, para fins de pronunciar os Revisionandos pelo crime de homicídio com as qualificadoras do motivo torpe e da surpresa, embora tenha constado do acórdão o tipo do art. 121, § 2°, incisos II (motivo fútil) e IV, do Código Penal. Dizem que foram submetidos a julgamento pelo Tribunal do Júri, oportunidade em que foram condenados nos moldes já descritos. Descrevem que interpuseram apelação, mas esta foi desprovida pela Segunda Câmara Criminal deste TJPE, tendo o acórdão transitado em julgado sem qualquer insurgência recursal. Alegam, nesta revisão criminal, que o processo originário está eivado de diversas nulidades. Asseveram que a primeira nulidade decorreu da intempestividade do recurso em sentido estrito interposto pela acusação, pois 'é inquestionável que o douto representante do Ministério Público que laborava no feito originário na época, foi intimado pessoalmente da sentença de pronúncia no caso, na data de 27.08.1990', conforme rubrica aposta ao lado da certidão de intimação da decisão de pronúncia, que, por exclusão, indubitavelmente é do Parquet, enquanto o recurso em sentido estrito somente foi interposto no dia 21/02/1994. Sustentam a ocorrência de uma segunda nulidade por ofensa às garantias do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, pelo fato de que, após a renúncia do advogado constituído pelos Requerentes, o juiz de primeiro grau nomeou como defensora dativa a Bela. Virgínia Nogueira Santos, sem antes intimar os réus para constituírem novo patrono. Argumentam, ainda, que a referida causídica, ao contra-arrazoar o recurso em sentido estrito interposto pelo Ministério Público, não o fez em relação aos acusados Damião Pereira da Silva e Francisco Pereira da Silva, mas apenas se pronunciou quanto ao revisionando Cícero Pereira da Silva e a outros dois corréus, o que configura mais uma nulidade, por ausência de defesa no tocante a Damião e Francisco. Pontuam, outrossim, que a defensora dativa, nas mesmas contrarrazões, 'não exerceu o seu múnus público de defesa com manifestação plena, efetiva e fundamentada, limitando-se a tão somente se aludir aos termos da sentença de pronúncia'. Apontam, em seguida, nulidade absoluta do processo por defeito na quesitação no julgamento pelo Tribunal do Júri, pois o acórdão que deu provimento ao recurso em sentido estrito, ao pronunciar os Revisionandos, incluiu a qualificadora do motivo torpe, enquanto a qualificadora submetida à apreciação dos jurados foi a do motivo fútil. Defendem, por fim, que a condenação é contrária à evidência dos autos, uma vez que Damião agiu sob o manto das excludentes de ilicitude da legítima defesa putativa e da coação moral irresistível, ao passo que Cícero e Francisco não participaram do delito pelo qual foram condenados, além do que as qualificadoras do motivo fútil e da surpresa não estão configuradas no caso concreto. Pedem, liminarmente, o sobrestamento da execução das penas impostas aos Requerentes, para que possam aguardar em liberdade o julgamento desta revisão criminal, expedindo-se os competentes alvarás de soltura em seu favor. No mérito, pugnam pelo deferimento do pedido revisional, para fins de: a) anular o processo originário em razão dos vícios acima descritos; ou, subsidiariamente, b) absolver os Revisionandos, em virtude de a condenação ter sido contrária à evidência dos autos; ou, em último caso, c) afastar as qualificadoras do motivo fútil e da surpresa, modificando-se as penas e o regime de seu cumprimento. Requerem, também, o benefício da justiça gratuita. A inicial veio instruída com os documentos de fls. 73/345. Às fls. 353/356, indeferi o pedido de liminar, ao tempo que solicitei ao juízo de primeiro grau a remessa dos autos originários, tendo sido estes devidamente apensados. Com vista, a Procuradoria de Justiça, pelo Procurador José Correia de Araújo, manifestou-se pelo não acolhimento da preliminar de nulidade do processo e, no mérito, pelo indeferimento do pleito (fls. 370/372). Foi acostada petição do Conselho Indigenista Missionário, às fls. 375/379, com o intuito de 'reforçar a importância de atenção específica aos direitos das pessoas indígenas em situação de prisão', como é o caso dos Revisionandos, que pertencem ao povo indígena Truká, de Cabrobó. Vieram-me, então, os autos conclusos. É, em síntese, o relatório. Quanto ao pedido de gratuidade da justiça, destaco que, nos termos do art. 98 e seguintes do Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015), o deferimento do referido benefício não exige formalidade além do requerimento expresso da parte. Ressalte-se, ainda, que, segundo o art. 99, § 4º, do novo CPC, “a assistência do requerente por advogado particular não impede a concessão de gratuidade da justiça”. Diante disso, uma vez afirmada a necessidade do benefício, no bojo da petição inicial, e não havendo motivos que indiquem situação diversa, entendo que deve ser acatado o pedido em apreço. Corroborando o exposto, trago à colação o seguinte julgado do Superior Tribunal de Justiça: 'PROCESSUAL PENAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. (...) 2. Consoante reza a Lei n. 1.060/1950 e as novas disposições do Código de Processo Civil vigente (art. 98 e seguintes), a declaração de hipossuficiência da parte goza de presunção de veracidade, devendo o benefício da gratuidade da justiça ser concedido até mesmo por simples peticionamento, caso inexistam motivos que evidenciem a falta dos pressupostos legais. (...) 4. Embargos de declaração rejeitados.' [1] (grifei) Diante do exposto, e com base no art. 150, inciso XXII, do RITJPE[2], concedo aos Revisionandos o benefício da justiça gratuita. (...)" (grifos do original) Sem mais, faça-se conclusão dos autos ao revisor, Exmo. Des. Evandro Sérgio Netto de Magalhães Melo (vide ID 37994912). Recife, data registrada pelo sistema. Des. Cláudio Jean Nogueira Virgínio Relator \rftbm [1] STJ, EDcl no AgRg no AREsp 329.970/SP, rel. Min. Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, DJe 10/11/2016. [2] Art. 150. São atribuições do relator: (...) XXII - decidir o pedido de assistência judiciária gratuita; Voto vencedor: Poder Judiciário Tribunal de Justiça de Pernambuco Gabinete do Des. Cláudio Jean Nogueira Virgínio REVISÃO CRIMINAL Nº: 0002774-91.2019.8.17.0000 REQUERENTES: DAMIÃO PEREIRA DA SILVA, FRANCISCO PEREIRA DA SILVA, CÍCERO PEREIRA DA SILVA ADVOGADO: HENRIQUE MARCULA LIMA REQUERIDA: JUSTIÇA PÚBLICA ÓRGÃO JULGADOR: SEÇÃO CRIMINAL RELATOR: DES. CLÁUDIO JEAN NOGUEIRA VIRGÍNIO PROCURADOR: JOSÉ CORREIA DE ARAÚJO VOTO Conforme relatado, insurgem-se os Requerentes contra a condenação sofrida nos autos do Proc. nº 0000009-66.1985.8.17.0380, pedindo: a) o reconhecimento de nulidades diversas no feito; ou, subsidiariamente, b) a absolvição, em virtude de a condenação ter sido contrária à evidência dos autos; ou, em último caso, c) o afastamento das qualificadoras do motivo fútil e da surpresa, modificando-se as penas e o regime de seu cumprimento. Como se sabe, a revisão criminal, na qualidade de ação que objetiva desconstituir sentença condenatória transitada em julgado, tem hipóteses de cabimento bastante restritas, previstas no rol taxativo do art. 621 do Código de Processo Penal[1]. Na espécie, verifica-se da inicial que o pedido revisional ampara-se no inciso I do art. 621 do CPP, ou seja, fundamenta-se na contrariedade da sentença condenatória à evidência dos autos, bem como no inciso III, que trata da descoberta de novas provas de inocência ou de circunstância que enseje redução da pena. Vejamos, então. Extrai-se dos autos que os Requerentes foram denunciados com outros 03 (três) indivíduos, todos incursos nas penas do art. 121, § 2°, incisos II e IV, do Código Penal, pelo seguinte fato (fls. 02/04 dos autos apensos – ID 37994914): “(...) no dia 20 de janeiro do ano corrente [1985], por volta das 16:40 horas aproximadamente, na casa de Antonio Brito, popular ‘Antonio Cabeça’, quando chegaram os denunciados acima citados, os 4 (quatro) primeiros irmãos e os 2 (dois) primos, lá se encontrava a vítima SEBASTIÃO ADAUTO DA SILVA, e algumas pessoas jogando sinuca, quando Damião Pereira da Silva, sacou de um revólver e disparou por várias vezes pelas costas da vítima, ficando este caído ao solo, com vários ferimentos no corpo, enquanto o acusado saiu em disparada, juntamente com os outros, livrando-se do flagrante, estes não atiraram, segundo as testemunhas, porém, todos com suas armas em punho servindo de reforço, para que o acusado praticasse o bárbaro delito; o crime foi praticado a sangue frio, sem que a vítima pudesse se defender; O crime se deu em virtude do acusado Damião, já andar perseguindo a vítima, por este andar com um determinado inimigo dos acusados. (...)” Encerrada a primeira fase da instrução do processo originário: a) Damião Pereira da Silva foi pronunciado como incurso nas penas do art. 121, caput, do Código Penal (homicídio simples); b) Francisco Pereira da Silva foi pronunciado como incurso nas penas do art. 121, § 1°, do Código Penal (homicídio privilegiado); e c) Cícero Pereira da Silva foi impronunciado, assim como os 03 (três) acusados restantes (fls. 94/95-v dos autos originários – ID 37995252 e 37995253). Inconformado, o Ministério Público interpôs recurso em sentido estrito (fls. 102/104 – ID 37995362). A Terceira Câmara Criminal deste Tribunal de Justiça deu provimento parcial ao recurso, para afastar da denúncia o acusado José Pereira da Silva e pronunciar Damião Pereira da Silva, Cícero Pereira da Silva, Francisco Pereira da Silva e os outros 02 (dois) réus como incursos nas penas do art. 121, § 2°, incisos II e IV, do Código Penal (fl. 138 – ID 37995392). Levados a júri, os Revisionandos foram condenados pela prática do crime previsto no art. 121, § 2°, incisos II e IV, do Código Penal, tendo recebido as seguintes penas: a) Damião Pereira da Silva, 16 (dezesseis) anos de reclusão; b) Francisco Pereira da Silva, 13 (treze) anos de reclusão; e c) Cícero Pereira da Silva, 13 (treze) anos de reclusão (fls. 301/305 – ID 37995973). A defesa interpôs apelação (fls. 350/375 – ID 37996231, 37996257, 37996276, 37996278, 37996279, 37996280, 37996282, 37996285, 37996287, 37996232, 37996235, 37996237, 37996240, 37996242, 37996244, 37996247, 37996249, 37996252, 37996254, 37996259, 37996262, 37996265, 37996267, 37996270, 37996272 e 37996274), a qual foi desprovida em relação aos Requerentes (fls. 406/425 – ID 37996453, 37996455, 37996457, 37996458 e 37996661). A condenação, então, transitou em julgado (fls. 432 e 435 – ID 37996669 e 37996675). Pois bem. Inicialmente, cumpre salientar que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça, à qual me filio, têm caminhado no sentido de não se admitir a dita “nulidade de algibeira” – aquela guardada para ser utilizada em tempo oportuno, quando a parte em tese prejudicada achar por bem alegá-la –, tudo como forma de salvaguardar a coisa julgada e o princípio da segurança jurídica. Entende-se que as nulidades, relativas ou mesmo absolutas, submetem-se à preclusão, não se podendo admitir que elas possam ser suscitadas por prazo ilimitado, sob pena de se gerar um grave quadro de insegurança e instabilidade para as decisões judiciais. No caso dos autos, como visto, o fato criminoso ocorreu em 20/01/1985, a pronúncia data de 28/08/1989, o julgamento do recurso em sentido estrito ocorreu em 17/05/2000, a sessão do júri realizou-se no dia 20/06/2013, e a apelação defensiva foi julgada em 02/09/2015, com trânsito em julgado no dia 03/11/2015. A presente revisão criminal, por sua vez, somente foi protocolada em 07/06/2019, mais de 20 (vinte) anos após o primeiro dos eventos que os Requerentes reputam configuradores de nulidade, e quase 06 (seis) anos depois do último vício alegado. Ora, não parece razoável o decurso de período tão longo sem que as supostas irregularidades mencionadas na inicial tenham sido minimamente ventiladas, seja no curso do feito, seja imediatamente após o seu encerramento – sobretudo no nível de gravidade que o defensor dos Requerentes busca lhes atribuir. Chama a atenção, ainda, o fato de que os Revisionandos foram representados na sessão plenária do júri por defensor constituído, a saber, o Procurador Federal João Fula Ferreira da Costa Neto, da Fundação Nacional do Índio (FUNAI), o qual, no início do julgamento, limitou-se a alegar a inépcia da denúncia, silenciando quanto a eventuais nulidades (fls. 296/300 – ID 37995971, págs. 15-19). Já nas razões de apelação, ofertadas por outro Procurador Federal da FUNAI, o Bel. Ricardo Ramos Coutinho, foi mais uma vez suscitada preliminar de nulidade da condenação “com base em denúncia genérica”, nada tendo sido dito em relação às matérias trazidas na presente revisão criminal (fls. 350/375 - ID 37996231, 37996257, 37996276, 37996278, 37996279, 37996280, 37996282, 37996285, 37996287, 37996232, 37996235, 37996237, 37996240, 37996242, 37996244, 37996247, 37996249, 37996252, 37996254, 37996259, 37996262, 37996265, 37996267, 37996270, 37996272 e 37996274). Ou seja, identifica-se a atuação de outros defensores técnicos que, revisitando todo o conteúdo dos autos, não deram qualquer atenção às eventuais nulidades apontadas no presente feito. Forçoso é concluir, assim, que os argumentos deduzidos nesta ação revisional mostram-se extemporâneos e, nessa condição, não são dignos de guarida, submetidos que estão ao instituto da preclusão. Corroborando esse entendimento, trago à colação os seguintes julgados do STJ: “AGRAVO REGIMENTAL. HABEAS CORPUS. RECEPTAÇÃO. (...) TRÂNSITO EM JULGADO. IMPOSSIBILIDADE DE DISCUSSÃO DA MATÉRIA, AVENTADA EM HABEAS CORPUS, APÓS O DECURSO DE 14 ANOS. PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA. (...) 2. Ademais, consoante se depreende das informações prestadas, o trânsito em julgado do acórdão objeto da presente insurgência deu-se em 1998, e a presente impetração somente aportou a esta Corte Superior em 2012, ou seja, 14 (quatorze) anos depois. 3. Esta Corte já sinalizou que ‘Os questionamentos expostos no presente mandamus se referem a ação penal iniciada no ano de 1999, cuja sentença condenatória transitou em julgado em 2004. Dessa forma, até mesmo eventual nulidade absoluta que possa ter-se verificado em tão longínqua data já não tem mais o condão de repercutir sobre a realidade processual dos autos, encontrando-se a alegação não apenas preclusa, mas, principalmente, acobertada pelo manto da coisa julgada. Princípio da segurança jurídica. Precedentes do STJ e do STF’ (HC n. 368.217/MA, rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 2/5/2017, DJe 8/5/2017). 4. Agravo regimental improvido.” (STJ, AgRg no HC n. 253.988/RJ, relator Ministro Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, DJe de 1/8/2018) “AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO QUALIFICADO. CONDENAÇÃO TRANSITADA EM JULGADO. (...) VÍCIO NO RECONHECIMENTO FOTOGRÁFICO REALIZADO NA SEDE POLICIAL E AUSÊNCIA DE PROVA JUDICIALIZADA. NULIDADES DE ALGIBEIRA E PRECLUSÃO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO RECONHECIDO. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO. (...) 2. As alegações de nulidade apresentadas mais de 10 (dez) anos após a prolatação da sentença de pronúncia e mais de 7 (sete) anos após a realização da sessão plenária do Tribunal do Júri evidencia verdadeira ‘nulidade de algibeira’, o que é vedado em virtude da violação da boa-fé processual. (...) 4. Agravo regimental improvido.” (STJ, AgRg no HC n. 705.762/SP, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, DJe de 16/12/2021) Isso dito, apenas por amor ao debate, e como forma de evitar que uma vez mais se alegue cerceamento de defesa, enfrento a matéria trazida aos presentes autos, destacando, desde já, que não assiste razão aos Requerentes. Explico o porquê. Quanto à primeira das nulidades arguidas, referente a uma suposta intempestividade do recurso em sentido estrito interposto pelo Ministério Público, observa-se uma certidão à fl. 96 dos autos originários (ID 37995254, pág. 1), datada de 28/08/1989, dando conta da intimação das “partes interessadas” acerca da decisão de pronúncia. Há duas rubricas ao redor da mencionada certidão, datadas de 28/08/1989 e 28/08/1990, mas sem identificação de seus autores. Segue-se que, em 07/02/1994, a juíza de primeiro grau determinou a intimação do promotor de justiça sobre a decisão de pronúncia (fl. 101 – ID 37995360). Em fevereiro de 1994 (não preenchido o campo concernente ao dia), foi aberta vista ao Ministério Público, todavia não há comprovação da efetiva remessa dos autos àquele órgão (fl. 101-v – ID 37995361). Consta, logo abaixo, petição do promotor de justiça, datada de 21/02/1994, requerendo renumeração de folhas dos autos e informando a interposição de recurso em sentido estrito (fl. 101-v – ID 37995361), o qual foi recebido pela secretaria do juízo em 22/02/1994 (fl. 102 – ID 37995362). Após despacho da magistrada singular, determinando a verificação “se houve intimação do rep. do Ministério Público após a sentença de pronúncia”, a escrivã da Comarca lavrou certidão em 25/02/1994, no seguinte sentido: “a rubrica existente na sentença, datada de 27.08.90, não é possível identificar, em virtude do grande espaço de tempo; desta forma não posso certificar se houve ciente do Promotor de Justiça da Comarca, na época” (fl. 105 – ID 37995363, pág. 1). Desse modo, se a comprovação da ciência do Ministério Público acerca da decisão de fls. 94/95-v (ID 37995252 e 37995253) somente se deu no dia 21/02/1994, com a manifestação do Parquet nos autos, não há como se considerar intempestivo o recurso em sentido estrito interposto em 22/02/1994, pois dentro do quinquídio previsto no art. 586 do Código de Processo Penal. No tocante à segunda nulidade suscitada, nota-se que, após a interposição do recurso em sentido estrito pelo Ministério Público, o advogado constituído pelos Revisionandos desistiu do patrocínio da causa, por motivo de foro íntimo (fl. 105-v – ID 37995363, pág. 2). Diante disso, o juiz singular de imediato nomeou como defensora dativa dos Requerentes a Bela. Virgínia Nogueira Santos (fl. 106 – ID 37995364). Não se desconhece a jurisprudência firmada por nossos tribunais superiores no sentido de que, antes de tal providência, o magistrado de piso deveria ter intimado os réus para, querendo, constituírem novo patrono de sua confiança. Ainda assim, considero que não há falar na decretação de nulidade. Como dito, as nulidades, mesmo as absolutas, dependem da demonstração de prejuízo e da arguição em tempo oportuno, sob pena de preclusão[2]. Na hipótese dos autos, observa-se que, durante toda a fase de instrução, desde o oferecimento da defesa prévia (fl. 52 – ID 37994952) até as alegações finais (fl. 84 – ID 37995243), os Requerentes foram representados por seu advogado constituído, o Bel. Eudes Caldas Cavalcanti. A defensora dativa foi nomeada tão somente na etapa de apresentação das contrarrazões ao recurso em sentido estrito ministerial, quando cabia a discussão acerca das provas que já haviam sido produzidas e que inevitavelmente seriam revisitadas in totum por este Tribunal de Justiça no julgamento do recurso. Além disso, observa-se que, apesar de a peça ter sido sucinta e de ter omitido os nomes dos revisionandos Francisco Pereira da Silva e Damião Pereira da Silva, a defensora cumpriu seu papel a contento, pedindo a manutenção da decisão impugnada em todos os seus termos, o que atendia aos anseios de todos os recorridos (fls. 110/111 – ID 37995368). Saliente-se, a propósito, o enunciado da Súmula 523 do Supremo Tribunal Federal, a saber: “No processo penal, a falta da defesa constitui nulidade absoluta, mas a sua deficiência só o anulará se houver prova de prejuízo para o réu”. Desse modo, não se identificando prejuízo concreto para a defesa dos Requerentes, não há falar em nulidade. Se isso não bastasse, os vícios alegados datam de mais de 20 (vinte) anos atrás e nunca antes foram suscitados, mesmo tendo havido oportunidades para tanto na sessão plenária e na interposição do recurso de apelação, quando os Requerentes já estavam assistidos por patrono constituído. Sendo assim, é forçoso reconhecer a preclusão da matéria, cuidando-se de típico caso de nulidade de algibeira. Corroborando o entendimento acima, colaciono os seguintes julgados do STJ: “AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO QUALIFICADO. NULIDADE. AUSÊNCIA DE APRESENTAÇÃO DAS RAZÕES NO RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO CONFIGURADO. VÍCIO NÃO ALEGADO NA PRIMEIRA OPORTUNIDADE. NULIDADE DE ALGIBEIRA. PRÁTICA NÃO TOLERADA. VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA BOA-FÉ. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. A disciplina que rege as nulidades no processo penal leva em consideração, em primeiro lugar, a estrita observância das garantias constitucionais, sem tolerar arbitrariedades ou excessos que desequilibrem a dialética processual em prejuízo do acusado. Por isso, o reconhecimento de nulidades é necessário toda vez que se constatar a supressão ou a mitigação de garantia processual que possa trazer agravos ao exercício do contraditório e da ampla defesa. Por outro lado, para o reconhecimento do vício é indispensável que seja demonstrado o prejuízo causado pela inobservância da forma, nos termos do art. 563 do Código de Processo Penal, que consagrou o princípio pas de nullité sans grief. 2. O Tribunal de origem, ao apreciar o recurso em sentido estrito interposto por Francisco Nilton Bezerra Farias Júnior e Sandro Barreto da Silva, afirmou que a defesa do ora agravante, embora tenha interposto petição recursal, não apresentou as razões respectivas, não obstante as oportunidades que lhe foram dadas, nos termos da Lei Processual Penal. Desse modo, não se constata o cerceamento de defesa alegado, tendo em vista que foi oportunizado à defesa a apresentação das razões recursais, sem que esta providência fosse realizada. 3. Além disso, a defesa, de fato, deixou de alegar a suposta nulidade nas diversas oportunidades que teve antes da impetração do habeas corpus, o que caracteriza a chamada nulidade de algibeira. Esse procedimento é incompatível com o princípio da boa-fé, que norteia o sistema processual vigente, exigindo lealdade e cooperação de todos os sujeitos envolvidos na relação jurídico-processual. 4. Agravo regimental não provido.” (STJ, AgRg no HC n. 658.016/AP, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 20/4/2021, DJe de 26/4/2021) “PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. HOMICÍDIO. NULIDADE POR CERCEAMENTO DE DEFESA. PEDIDO DE ADIAMENTO DA AUDIÊNCIA NEGADO. DECISÃO DEVIDAMENTE FUNDAMENTADA. NOMEAÇÃO DE DEFENSOR DATIVO. PREJUÍZO NÃO DEMONSTRADO. MATÉRIA PRECLUSA. NULIDADE DE ALGIBEIRA. PRÁTICA NÃO TOLERADA PELA JURISPRUDÊNCIA. (...) 1. A questão controvertida limita-se à alegação de nulidade do julgado por ausência do Defensor Público a audiência de instrução e julgamento e pela ausência de intimação do acusado por edital. 2. Diante da nomeação de defensor dativo, da qual não resultou prejuízo para o réu, inexiste nulidade pela ausência do Defensor Público em audiência. 3. A jurisprudência desta Corte Superior há muito se firmou no sentido de que a declaração de nulidade exige a comprovação de prejuízo, em consonância com o princípio pas de nullité sans grief, previsto no art. 563 do Código de Processo Penal. 4. Acrescente-se, ainda, que, no caso em exame, deixou a defesa para alegar a aludida questão em sede de memorais de apelação, mantendo-se silente quando da apresentação das alegações finais e, assim, tornando preclusa a matéria. 5. Cabe ao réu manter seu endereço atualizado junto ao Juízo processante. Por isso, não pode a defesa alegar nulidade à qual ela mesma deu causa. 6. Agravo regimental desprovido.” (STJ, AgRg no AREsp n. 1.842.781/TO, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 17/8/2021, DJe de 23/8/2021) “AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL PENAL. TRIBUNAL DO JÚRI. ALEGADA QUEBRA DA INCOMUNICABILIDADE DOS JURADOS. REEXAME DE CIRCUNSTÂNCIAS FÁTICAS. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE DEFESA TÉCNICA NÃO CARACTERIZADA DE PLANO. AFERIÇÃO DE EVENTUAL PREJUÍZO. IMPOSSIBILIDADE. ÓBICE DO VERBETE SUMULAR N.º 7/STJ. AGRAVO DESPROVIDO. (...) 3. O oferecimento de alegações finais sucintas, a não interposição de recurso em sentido estrito contra a decisão de pronúncia e a ausência de contrariedade ao libelo acusatório não caracterizam, de plano, a ausência de defesa técnica. Precedentes. (...) 6. Agravo regimental desprovido.” (STJ, AgRg no AREsp n. 33.110/PR, relatora Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, julgado em 26/11/2013, DJe de 9/12/2013) Não é demais salientar que a fase de pronúncia é marcada apenas por um juízo de admissibilidade da acusação, visto que o procedimento afeto aos crimes dolosos contra a vida é bifásico, com possibilidade de nova produção de provas e amplo espaço para argumentação na sessão plenária, cabendo ao Conselho de Sentença a decisão final acerca da responsabilidade penal do réu. Ou seja, mesmo que remotamente se cogitasse de deficiência de defesa na atuação da defensora dativa – porque em ausência de defesa decerto não há falar – mais um motivo há para se concluir que não ficou configurado prejuízo para os Requerentes, e o decurso de tão longo período desde os atos impugnados até os dias atuais apenas vem a corroborar essa conclusão. Nesse sentido: “AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO QUALIFICADO. DECISÃO DE PRONÚNCIA. NULIDADE. MATÉRIAS NÃO DEBATIDAS NA ORIGEM. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. SENTENÇA SEM NECESSIDADE DE FUNDAMENTAÇÃO EXAURIENTE. PRECLUSÃO. VÍCIO NÃO ALEGADO NA PRIMEIRA OPORTUNIDADE. NULIDADE DE ALGIBEIRA. PRÁTICA NÃO TOLERADA. VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA BOA-FÉ. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. (...) 2. A decisão de pronúncia possui natureza interlocutória mista e encerra apenas um juízo preliminar de admissibilidade da acusação pela prática de crime doloso contra a vida, sem debater questões referentes à responsabilidade penal do acusado. 3. Além disso, a defesa, de fato, deixou de alegar a suposta nulidade nas diversas oportunidades que teve antes da impetração do habeas corpus, o que caracteriza a chamada nulidade de algibeira. Esse procedimento é incompatível com o princípio da boa-fé, que norteia o sistema processual vigente, exigindo lealdade e cooperação de todos os sujeitos envolvidos na relação jurídico-processual. 3. Agravo regimental desprovido.” (STJ, AgRg no RHC n. 131.676/CE, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 15/9/2020, DJe de 21/9/2020) No que concerne à última das nulidades arguidas, a pretensão dos Revisionandos igualmente não merece prosperar. Ora, os Revisionandos foram denunciados por homicídio qualificado pelo motivo fútil e pela impossibilidade de defesa da vítima, e o Ministério Público, em seu recurso em sentido estrito, pugnou pela inclusão das referidas qualificadoras na pronúncia. Por ocasião do julgamento, deu-se provimento ao recurso ministerial, e, tanto na parte final do voto, quanto na síntese do acórdão, está registrada a decisão pela pronúncia dos Requerentes como incursos nas penas do art. 121, § 2°, incisos II e IV, do Código Penal, sendo o primeiro desses incisos relativo à qualificadora do motivo fútil. Fica nítido, portanto, que as duas menções à expressão “motivo torpe, no corpo do voto do relator (fl. 144 – ID 37995394, pág. 4) e na ementa (fl. 138 – ID 37995392), consistem de mero erro material, mesmo porque este Tribunal não poderia ter prolatado decisão extra petita, reconhecendo qualificadora diversa da pretendida pela acusação. Assim, inexiste qualquer mácula na inclusão de quesito sobre a futilidade do motivo do crime, por ter essa qualificadora constado tanto da denúncia, quanto do acórdão que encerrou a fase de pronúncia. De qualquer forma, uma vez mais deve ser salientado que não houve qualquer pronunciamento do causídico dos Requerentes sobre a matéria quando da sessão do júri, o que também implica preclusão. Nessa linha: STJ, AgRg no RHC n. 115.647/GO, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 13/10/2020, DJe de 20/10/2020. Em resumo, não se pode admitir uma verdadeira caça a nulidades, mormente por fatos ocorridos há tantos anos, sem demonstração de prejuízo e sem arguição em tempo oportuno. Por fim, quanto à alegação de que a condenação é contrária à evidência dos autos, cumpre ressaltar, na esteira do parecer ofertado pela Procuradoria de Justiça, que o acervo fático-probatório do processo de origem já foi analisado no primeiro e reanalisado no segundo grau de jurisdição, tendo esta Corte de Justiça entendido, ao julgar a apelação defensiva, que a condenação dos Revisionandos pelo crime de homicídio duplamente qualificado estava devidamente apoiada nas provas produzidas (fls. 406/425 dos autos originários – – ID 37996453, 37996455, 37996457, 37996458 e 37996661). Agora, em sede de revisão criminal, os Requerentes buscam simplesmente revolver a matéria fático-probatória, sem trazerem aos autos qualquer prova nova e sem apontarem, de forma concreta, a existência de manifesto erro judiciário. Conclui-se, assim, que os Requerentes manejaram esta via revisional, nesse ponto específico, como se uma segunda apelação fosse, sem que estivessem preenchidos os requisitos do art. 621 do CPP, o que impossibilita o deferimento do pedido. Confirmando o entendimento acima, trago à colação estes julgados: “AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. HOMICÍDIO QUALIFICADO CONSUMADO E TENTADO. REVISÃO CRIMINAL. ART. 621, INCISO I, DO CPP. PLEITO ABSOLUTÓRIO. FRAGILIDADE PROBATÓRIA. PRETENSÃO INVIÁVEL NO JUÍZO RESCISÓRIO. NECESSIDADE DE PATENTE CONTRARIEDADE ENTRE A CONDENAÇÃO E AS PROVAS DOS AUTOS. (...) 1. A revisão criminal não deve ser adotada como um segundo recurso de apelação, pois o acolhimento da pretensão revisional reveste-se de excepcionalidade, cingindo-se às hipóteses em que a contradição à evidência dos autos seja manifesta, induvidosa, dispensando a interpretação ou análise subjetiva das provas produzidas. 2. Nessa senda, este "Superior Tribunal de Justiça já pacificou o entendimento no sentido do não cabimento da revisão criminal quando utilizada como nova apelação, com vistas ao mero reexame de fatos e provas, não se verificando hipótese de contrariedade ao texto expresso da lei penal ou à evidência dos autos, consoante previsão do art. 621, I, do CPP." (HC 206.847/SP, Rel. Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, julgado em 16/02/2016, DJe 25/02/2016). (...) 4. Agravo improvido.” [3] “EMENTA: PROCESSUAL PENAL. REVISÃO CRIMINAL. (...) AUSÊNCIA DE PROVA NOVA APTA A ENSEJAR O REEXAME DA SENTENÇA. REITERAÇÃO DOS ARGUMENTOS EXPENDIDOS NO RECURSO DE APELAÇÃO E NO RECURSO ESPECIAL. PEDIDO INDEFERIDO. DECISÃO UNÂNIME. (...) III - A Revisão Criminal não se presta ao reexame de questões já exaustivamente analisadas pelo juízo de 1º grau e pelo Colegiado Estadual, mormente quando o requerente não apresenta qualquer prova que evidencie a sua inocência ou a ocorrência de qualquer das hipóteses previstas no art. 621, do Código de Processo Penal, possibilitando rever a matéria em sede desta via processual. IV - Revisão indeferida. Decisão unânime.” [4] “REVISÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA O PATRIMÔNIO. RECEPTAÇÃO SIMPLES. PRELIMINAR DE NULIDADE POR CERCEAMENTO DE DEFESA REJEITADA. MÉRITO, AUSÊNCIA DE PROVA NOVA. TESES JÁ ANALISADAS NO CURSO DA AÇÃO PENAL. Preliminar de Nulidade. A questão da propriedade dos fios apreendidos na posse do requerente já estava solucionada nos autos, através do auto de restituição e do laudo técnico juntado aos autos, fl. 19, circunstância devidamente considerada na sentença e no acórdão que analisou o caso. Mérito. A revisão criminal não pode funcionar como uma segunda apelação, sendo inviável o reexame da prova, especialmente quando e pedido não apresenta qualquer prova e apresenta as mesmas teses já repelidas durante o curso da ação penal, sem a demonstração de qualquer das hipóteses autorizadoras da revisional, como é o caso. PRELIMINAR DE NULIDADE REJEITADA. REVISÃO CRIMINAL JULGADA IMPROCEDENTE. UNÂNIME.” [5] Ante todo o exposto, em consonância com o parecer da Procuradoria de Justiça, voto julgando improcedente o pedido revisional. Recife, data registrada pelo sistema. Des. Cláudio Jean Nogueira Virgínio Relator [1] Art. 621. A revisão dos processos findos será admitida: I - quando a sentença condenatória for contrária ao texto expresso da lei penal ou à evidência dos autos; II - quando a sentença condenatória se fundar em depoimentos, exames ou documentos comprovadamente falsos; III - quando, após a sentença, se descobrirem novas provas de inocência do condenado ou de circunstância que determine ou autorize diminuição especial da pena. [2] Nesse diapasão: STJ, AgRg no HC 723241/SP, rel. Min. Ribeiro Dantas, Quinta Turma, DJe 29/06/2022. [3] STJ, AgRg no AREsp 830.554/SP, rel. Min. Jorge Mussi, Quinta Turma, DJe 28/09/2018. [4] TJPE, Revisão Criminal nº 0372011-8, rel. Des. Daisy Maria de Andrade Costa Pereira, Seção Criminal, j. em 18/06/2015. [5] TJRS, Revisão Criminal nº 70045591906, rel. Des. Ícaro Carvalho de Bem Osório, 3º Grupo de Câmaras Criminais, j. em 05/04/2013. Demais votos: Poder Judiciário Tribunal de Justiça de Pernambuco Gabinete do Des. Evandro Magalhães Melo SEÇÃO CRIMINAL Revisão Criminal n. 0002774-91.2019.8.17.0000 Requerente: Damião Pereira da Silva, Francisco Pereira da Silva e Cícero Pereira da Silva Requerida: Justiça Pública Relator: Des. Cláudio Jean Nogueira Virgínio Revisor: Des. Evandro Magalhães Melo Procuradoria de Justiça: Dr. José Correia de Araújo VOTO DO REVISOR Inicialmente, cumpre ressaltar que a revisão criminal, nos termos do artigo 621 do Código de Processo Penal, não se presta a funcionar como uma nova instância recursal para rediscussão de teses já apreciadas em juízo de cognição exauriente. Trata-se de remédio processual excepcional, cabível apenas quando demonstrado que a condenação decorreu de manifesta ilegalidade, contrariedade à evidência dos autos, prova falsa ou surgimento de nova prova de inocência ou de atenuação da pena. No caso em apreço, os requerentes fundamentam seu pedido na revisão do acórdão exarado pela 2ª Câmara Criminal deste e. Tribunal de Justiça que, nos termos do art. 121, § 2º, incisos II e IV c/c art. 29 ambos do CPB, manteve a condenação fixada pelo Juízo de Cabrobó às penas de 16 (dezesseis) anos de reclusão para Damião Pereira da Silva e 13 (treze) anos de reclusão para Francisco Pereira da Silva e Cícero Pereira da Silva (Id. 37995973). Após minuciosa análise dos autos, compartilho integralmente das razões expostas pelo eminente Relator, Desembargador Cláudio Jean Nogueira Virgínio, cujo voto reflete acurada interpretação da legislação aplicável, bem como criteriosa apreciação dos elementos constantes dos autos. Inicialmente os requerentes alegam nulidades diversas, incluindo a intempestividade do recurso em sentido estrito do Ministério Público e a ausência de intimação para nomeação de novo defensor. Ocorre que no presente caso a alegação da defesa fere a segurança jurídica e a estabilidade das decisões jurisdicionais, haja vista que já se passaram mais de 20 anos da primeira nulidade alegada com o julgamento do recurso em sentido estrito. Tal lapso temporal evidencia uma tentativa tardia de rediscutir matéria já definitivamente julgada, o que não se coaduna com os princípios que norteiam nosso ordenamento jurídico. Conduta que vem sendo rechaçada pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, à luz dos princípios da lealdade processual, respeito à coisa julgada, fundamentais à manutenção da segurança jurídica, estando a matéria sujeita à perda do direito de impugnar pelo longo decurso do tempo. Na forma dos seguintes julgados: “AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. LATROCÍNIO. DOSIMETRIA. WRIT IMPETRADO MAIS DE NOVE ANOS APÓS O TRÂNSITO EM JULGADO DA CONDENAÇÃO. PRECLUSÃO TEMPORAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUVO DE REVISÃO CRIMINAL. INVIABILIDADE. AUSÊNCIA DE FLAGRANTE ILEGALIDADE. I - "A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça - STJ, em respeito à segurança jurídica e à lealdade processual, tem se orientado no sentido de que mesmo as nulidades denominadas absolutas, ou qualquer outra falha ocorrida no acórdão impugnado, também devem ser arguidas em momento oportuno, sujeitando-se à preclusão temporal" (AgRg no HC n. 690.070/PR, Quinta Turma, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, DJe de 25/10/2021). II - O presente writ foi impetrado mais de 9 anos após o trânsito em julgado da condenação, de modo que o mandamus não pode ser conhecido em decorrência da preclusão da matéria, devendo prevalecer a coisa julgada e o princípio da segurança jurídica. III - O exame das alegações do impetrante se mostra processualmente inviável, uma vez que transmuta o habeas corpus em sucedâneo de revisão criminal, configurando, assim, usurpação da competência do Tribunal de origem, nos termos do artigo 105, I, "e" da Constituição Federal. IV - Consoante artigo 210 do Regimento Interno do STJ, bem como nos moldes da jurisprudência desta Corte Superior, quando o pedido for manifestamente incabível, ou for manifesta a incompetência do Tribunal para dele tomar conhecimento originariamente, ou for reiteração de outro com os mesmos fundamentos, o relator o indeferirá liminarmente, não havendo ilegalidade a ser sanada quanto ao ponto. Agravo regimental desprovido.” (AgRg no HC n. 908.528/MG, relator Ministro Messod Azulay Neto, Quinta Turma, julgado em 21/5/2024, DJe de 28/5/2024.) Além disso, os defensores dos requerentes tanto na sessão plenária do Júri, quanto na interposição do apelo defensivo eram Procuradores Federais da FUNAI, inexistindo qualquer irregularidade na condução do feito, afastando a tese de cerceamento de defesa. Os requerentes sustentam que a condenação seria contrária à evidência dos autos, tese que, na prática, busca reabrir a valoração do acervo probatório. Contudo, a revisão criminal não pode ser usada como uma segunda apelação, cabendo somente em situações excepcionais, quando há erro manifesto no julgamento. O acórdão que manteve a condenação baseou-se em farta prova testemunhal, corroborando a autoria e a materialidade do crime, bem como a presença das qualificadoras imputadas e mantidas por meio de decisão soberana exarada pelo Tribunal do Júri. Assim, não há contradição manifesta com a prova dos autos, mas apenas a insatisfação dos requerentes face a condenação transitada em julgado. Diante do exposto, inexistindo qualquer vício que justifique a desconstituição da sentença condenatória, acompanho o eminente Relator e voto pelo indeferimento da revisão criminal, mantendo-se o acórdão condenatório em todos os seus termos. É como voto. Recife, data da assinatura eletrônica. Des. Evandro Magalhães Melo Revisor Poder Judiciário Tribunal de Justiça de Pernambuco Gabinete do Des. Evandro Magalhães Melo SEÇÃO CRIMINAL Revisão Criminal n. 0002774-91.2019.8.17.0000 Requerente: Damião Pereira da Silva, Francisco Pereira da Silva e Cícero Pereira da Silva Requerida: Justiça Pública Relator: Des. Cláudio Jean Nogueira Virgínio Revisor: Des. Evandro Magalhães Melo Procuradoria de Justiça: Dr. José Correia de Araújo VOTO DO REVISOR Inicialmente, cumpre ressaltar que a revisão criminal, nos termos do artigo 621 do Código de Processo Penal, não se presta a funcionar como uma nova instância recursal para rediscussão de teses já apreciadas em juízo de cognição exauriente. Trata-se de remédio processual excepcional, cabível apenas quando demonstrado que a condenação decorreu de manifesta ilegalidade, contrariedade à evidência dos autos, prova falsa ou surgimento de nova prova de inocência ou de atenuação da pena. No caso em apreço, os requerentes fundamentam seu pedido na revisão do acórdão exarado pela 2ª Câmara Criminal deste e. Tribunal de Justiça que, nos termos do art. 121, § 2º, incisos II e IV c/c art. 29 ambos do CPB, manteve a condenação fixada pelo Juízo de Cabrobó às penas de 16 (dezesseis) anos de reclusão para Damião Pereira da Silva e 13 (treze) anos de reclusão para Francisco Pereira da Silva e Cícero Pereira da Silva (Id. 37995973). Após minuciosa análise dos autos, compartilho integralmente das razões expostas pelo eminente Relator, Desembargador Cláudio Jean Nogueira Virgínio, cujo voto reflete acurada interpretação da legislação aplicável, bem como criteriosa apreciação dos elementos constantes dos autos. Os requerentes alegam nulidades diversas, incluindo a intempestividade do recurso em sentido estrito do Ministério Público e a ausência de intimação para nomeação de novo defensor. Ocorre que no presente caso a alegação da defesa fere a segurança jurídica e a estabilidade das decisões jurisdicionais, haja vista que já se passaram mais de 20 anos da primeira nulidade alegada com o julgamento do recurso em sentido estrito. Tal lapso temporal evidencia uma tentativa tardia de rediscutir matéria já definitivamente julgada, o que não se coaduna com os princípios que norteiam nosso ordenamento jurídico. Conduta que vem sendo rechaçada pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, à luz dos princípios da lealdade processual, respeito à coisa julgada, fundamentais à manutenção da segurança jurídica, estando a matéria sujeita à perda do direito de impugnar pelo longo decurso do tempo. Na forma dos seguintes julgados: “AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. LATROCÍNIO. DOSIMETRIA. WRIT IMPETRADO MAIS DE NOVE ANOS APÓS O TRÂNSITO EM JULGADO DA CONDENAÇÃO. PRECLUSÃO TEMPORAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUVO DE REVISÃO CRIMINAL. INVIABILIDADE. AUSÊNCIA DE FLAGRANTE ILEGALIDADE. I - "A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça - STJ, em respeito à segurança jurídica e à lealdade processual, tem se orientado no sentido de que mesmo as nulidades denominadas absolutas, ou qualquer outra falha ocorrida no acórdão impugnado, também devem ser arguidas em momento oportuno, sujeitando-se à preclusão temporal" (AgRg no HC n. 690.070/PR, Quinta Turma, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, DJe de 25/10/2021). II - O presente writ foi impetrado mais de 9 anos após o trânsito em julgado da condenação, de modo que o mandamus não pode ser conhecido em decorrência da preclusão da matéria, devendo prevalecer a coisa julgada e o princípio da segurança jurídica. III - O exame das alegações do impetrante se mostra processualmente inviável, uma vez que transmuta o habeas corpus em sucedâneo de revisão criminal, configurando, assim, usurpação da competência do Tribunal de origem, nos termos do artigo 105, I, "e" da Constituição Federal. IV - Consoante artigo 210 do Regimento Interno do STJ, bem como nos moldes da jurisprudência desta Corte Superior, quando o pedido for manifestamente incabível, ou for manifesta a incompetência do Tribunal para dele tomar conhecimento originariamente, ou for reiteração de outro com os mesmos fundamentos, o relator o indeferirá liminarmente, não havendo ilegalidade a ser sanada quanto ao ponto. Agravo regimental desprovido.” (AgRg no HC n. 908.528/MG, relator Ministro Messod Azulay Neto, Quinta Turma, julgado em 21/5/2024, DJe de 28/5/2024.) Além disso, os defensores dos requerentes tanto na sessão plenária do Júri, quanto na interposição do apelo defensivo eram Procuradores Federais da FUNAI, inexistindo qualquer irregularidade na condução do feito, afastando a tese de cerceamento de defesa. Os requerentes sustentam que a condenação seria contrária à evidência dos autos, tese que, na prática, busca reabrir a valoração do acervo probatório. Contudo, a revisão criminal não pode ser usada como uma segunda apelação, cabendo somente em situações excepcionais, quando há erro manifesto no julgamento. O acórdão que manteve a condenação baseou-se em farta prova testemunhal, corroborando a autoria e a materialidade do crime. Assim, não há contradição manifesta com a prova dos autos, mas apenas a insatisfação dos requerentes com a decisão. Diante do exposto, inexistindo qualquer vício que justifique a desconstituição da decisão condenatória, acompanho o eminente Relator e voto pelo indeferimento da revisão criminal, mantendo-se o acórdão condenatório em todos os seus termos. É como voto. Recife, data da assinatura eletrônica. Des. Evandro Magalhães Melo Revisor Poder Judiciário Tribunal de Justiça de Pernambuco Gabinete do Des. Cláudio Jean Nogueira Virgínio REVISÃO CRIMINAL Nº: 0002774-91.2019.8.17.0000 REQUERENTES: DAMIÃO PEREIRA DA SILVA, FRANCISCO PEREIRA DA SILVA, CÍCERO PEREIRA DA SILVA ADVOGADO: HENRIQUE MARCULA LIMA REQUERIDA: JUSTIÇA PÚBLICA ÓRGÃO JULGADOR: SEÇÃO CRIMINAL RELATOR: DES. CLÁUDIO JEAN NOGUEIRA VIRGÍNIO PROCURADOR: JOSÉ CORREIA DE ARAÚJO VOTO Conforme relatado, insurgem-se os Requerentes contra a condenação sofrida nos autos do Proc. nº 0000009-66.1985.8.17.0380, pedindo: a) o reconhecimento de nulidades diversas no feito; ou, subsidiariamente, b) a absolvição, em virtude de a condenação ter sido contrária à evidência dos autos; ou, em último caso, c) o afastamento das qualificadoras do motivo fútil e da surpresa, modificando-se as penas e o regime de seu cumprimento. Como se sabe, a revisão criminal, na qualidade de ação que objetiva desconstituir sentença condenatória transitada em julgado, tem hipóteses de cabimento bastante restritas, previstas no rol taxativo do art. 621 do Código de Processo Penal[1]. Na espécie, verifica-se da inicial que o pedido revisional ampara-se no inciso I do art. 621 do CPP, ou seja, fundamenta-se na contrariedade da sentença condenatória à evidência dos autos, bem como no inciso III, que trata da descoberta de novas provas de inocência ou de circunstância que enseje redução da pena. Vejamos, então. Extrai-se dos autos que os Requerentes foram denunciados com outros 03 (três) indivíduos, todos incursos nas penas do art. 121, § 2°, incisos II e IV, do Código Penal, pelo seguinte fato (fls. 02/04 dos autos apensos – ID 37994914): “(...) no dia 20 de janeiro do ano corrente [1985], por volta das 16:40 horas aproximadamente, na casa de Antonio Brito, popular ‘Antonio Cabeça’, quando chegaram os denunciados acima citados, os 4 (quatro) primeiros irmãos e os 2 (dois) primos, lá se encontrava a vítima SEBASTIÃO ADAUTO DA SILVA, e algumas pessoas jogando sinuca, quando Damião Pereira da Silva, sacou de um revólver e disparou por várias vezes pelas costas da vítima, ficando este caído ao solo, com vários ferimentos no corpo, enquanto o acusado saiu em disparada, juntamente com os outros, livrando-se do flagrante, estes não atiraram, segundo as testemunhas, porém, todos com suas armas em punho servindo de reforço, para que o acusado praticasse o bárbaro delito; o crime foi praticado a sangue frio, sem que a vítima pudesse se defender; O crime se deu em virtude do acusado Damião, já andar perseguindo a vítima, por este andar com um determinado inimigo dos acusados. (...)” Encerrada a primeira fase da instrução do processo originário: a) Damião Pereira da Silva foi pronunciado como incurso nas penas do art. 121, caput, do Código Penal (homicídio simples); b) Francisco Pereira da Silva foi pronunciado como incurso nas penas do art. 121, § 1°, do Código Penal (homicídio privilegiado); e c) Cícero Pereira da Silva foi impronunciado, assim como os 03 (três) acusados restantes (fls. 94/95-v dos autos originários – ID 37995252 e 37995253). Inconformado, o Ministério Público interpôs recurso em sentido estrito (fls. 102/104 – ID 37995362). A Terceira Câmara Criminal deste Tribunal de Justiça deu provimento parcial ao recurso, para afastar da denúncia o acusado José Pereira da Silva e pronunciar Damião Pereira da Silva, Cícero Pereira da Silva, Francisco Pereira da Silva e os outros 02 (dois) réus como incursos nas penas do art. 121, § 2°, incisos II e IV, do Código Penal (fl. 138 – ID 37995392). Levados a júri, os Revisionandos foram condenados pela prática do crime previsto no art. 121, § 2°, incisos II e IV, do Código Penal, tendo recebido as seguintes penas: a) Damião Pereira da Silva, 16 (dezesseis) anos de reclusão; b) Francisco Pereira da Silva, 13 (treze) anos de reclusão; e c) Cícero Pereira da Silva, 13 (treze) anos de reclusão (fls. 301/305 – ID 37995973). A defesa interpôs apelação (fls. 350/375 – ID 37996231, 37996257, 37996276, 37996278, 37996279, 37996280, 37996282, 37996285, 37996287, 37996232, 37996235, 37996237, 37996240, 37996242, 37996244, 37996247, 37996249, 37996252, 37996254, 37996259, 37996262, 37996265, 37996267, 37996270, 37996272 e 37996274), a qual foi desprovida em relação aos Requerentes (fls. 406/425 – ID 37996453, 37996455, 37996457, 37996458 e 37996661). A condenação, então, transitou em julgado (fls. 432 e 435 – ID 37996669 e 37996675). Pois bem. Inicialmente, cumpre salientar que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça, à qual me filio, têm caminhado no sentido de não se admitir a dita “nulidade de algibeira” – aquela guardada para ser utilizada em tempo oportuno, quando a parte em tese prejudicada achar por bem alegá-la –, tudo como forma de salvaguardar a coisa julgada e o princípio da segurança jurídica. Entende-se que as nulidades, relativas ou mesmo absolutas, submetem-se à preclusão, não se podendo admitir que elas possam ser suscitadas por prazo ilimitado, sob pena de se gerar um grave quadro de insegurança e instabilidade para as decisões judiciais. No caso dos autos, como visto, o fato criminoso ocorreu em 20/01/1985, a pronúncia data de 28/08/1989, o julgamento do recurso em sentido estrito ocorreu em 17/05/2000, a sessão do júri realizou-se no dia 20/06/2013, e a apelação defensiva foi julgada em 02/09/2015, com trânsito em julgado no dia 03/11/2015. A presente revisão criminal, por sua vez, somente foi protocolada em 07/06/2019, mais de 20 (vinte) anos após o primeiro dos eventos que os Requerentes reputam configuradores de nulidade, e quase 06 (seis) anos depois do último vício alegado. Ora, não parece razoável o decurso de período tão longo sem que as supostas irregularidades mencionadas na inicial tenham sido minimamente ventiladas, seja no curso do feito, seja imediatamente após o seu encerramento – sobretudo no nível de gravidade que o defensor dos Requerentes busca lhes atribuir. Chama a atenção, ainda, o fato de que os Revisionandos foram representados na sessão plenária do júri por defensor constituído, a saber, o Procurador Federal João Fula Ferreira da Costa Neto, da Fundação Nacional do Índio (FUNAI), o qual, no início do julgamento, limitou-se a alegar a inépcia da denúncia, silenciando quanto a eventuais nulidades (fls. 296/300 – ID 37995971, págs. 15-19). Já nas razões de apelação, ofertadas por outro Procurador Federal da FUNAI, o Bel. Ricardo Ramos Coutinho, foi mais uma vez suscitada preliminar de nulidade da condenação “com base em denúncia genérica”, nada tendo sido dito em relação às matérias trazidas na presente revisão criminal (fls. 350/375 - ID 37996231, 37996257, 37996276, 37996278, 37996279, 37996280, 37996282, 37996285, 37996287, 37996232, 37996235, 37996237, 37996240, 37996242, 37996244, 37996247, 37996249, 37996252, 37996254, 37996259, 37996262, 37996265, 37996267, 37996270, 37996272 e 37996274). Ou seja, identifica-se a atuação de outros defensores técnicos que, revisitando todo o conteúdo dos autos, não deram qualquer atenção às eventuais nulidades apontadas no presente feito. Forçoso é concluir, assim, que os argumentos deduzidos nesta ação revisional mostram-se extemporâneos e, nessa condição, não são dignos de guarida, submetidos que estão ao instituto da preclusão. Corroborando esse entendimento, trago à colação os seguintes julgados do STJ: “AGRAVO REGIMENTAL. HABEAS CORPUS. RECEPTAÇÃO. (...) TRÂNSITO EM JULGADO. IMPOSSIBILIDADE DE DISCUSSÃO DA MATÉRIA, AVENTADA EM HABEAS CORPUS, APÓS O DECURSO DE 14 ANOS. PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA. (...) 2. Ademais, consoante se depreende das informações prestadas, o trânsito em julgado do acórdão objeto da presente insurgência deu-se em 1998, e a presente impetração somente aportou a esta Corte Superior em 2012, ou seja, 14 (quatorze) anos depois. 3. Esta Corte já sinalizou que ‘Os questionamentos expostos no presente mandamus se referem a ação penal iniciada no ano de 1999, cuja sentença condenatória transitou em julgado em 2004. Dessa forma, até mesmo eventual nulidade absoluta que possa ter-se verificado em tão longínqua data já não tem mais o condão de repercutir sobre a realidade processual dos autos, encontrando-se a alegação não apenas preclusa, mas, principalmente, acobertada pelo manto da coisa julgada. Princípio da segurança jurídica. Precedentes do STJ e do STF’ (HC n. 368.217/MA, rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 2/5/2017, DJe 8/5/2017). 4. Agravo regimental improvido.” (STJ, AgRg no HC n. 253.988/RJ, relator Ministro Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, DJe de 1/8/2018) “AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO QUALIFICADO. CONDENAÇÃO TRANSITADA EM JULGADO. (...) VÍCIO NO RECONHECIMENTO FOTOGRÁFICO REALIZADO NA SEDE POLICIAL E AUSÊNCIA DE PROVA JUDICIALIZADA. NULIDADES DE ALGIBEIRA E PRECLUSÃO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO RECONHECIDO. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO. (...) 2. As alegações de nulidade apresentadas mais de 10 (dez) anos após a prolatação da sentença de pronúncia e mais de 7 (sete) anos após a realização da sessão plenária do Tribunal do Júri evidencia verdadeira ‘nulidade de algibeira’, o que é vedado em virtude da violação da boa-fé processual. (...) 4. Agravo regimental improvido.” (STJ, AgRg no HC n. 705.762/SP, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, DJe de 16/12/2021) Isso dito, apenas por amor ao debate, e como forma de evitar que uma vez mais se alegue cerceamento de defesa, enfrento a matéria trazida aos presentes autos, destacando, desde já, que não assiste razão aos Requerentes. Explico o porquê. Quanto à primeira das nulidades arguidas, referente a uma suposta intempestividade do recurso em sentido estrito interposto pelo Ministério Público, observa-se uma certidão à fl. 96 dos autos originários (ID 37995254, pág. 1), datada de 28/08/1989, dando conta da intimação das “partes interessadas” acerca da decisão de pronúncia. Há duas rubricas ao redor da mencionada certidão, datadas de 28/08/1989 e 28/08/1990, mas sem identificação de seus autores. Segue-se que, em 07/02/1994, a juíza de primeiro grau determinou a intimação do promotor de justiça sobre a decisão de pronúncia (fl. 101 – ID 37995360). Em fevereiro de 1994 (não preenchido o campo concernente ao dia), foi aberta vista ao Ministério Público, todavia não há comprovação da efetiva remessa dos autos àquele órgão (fl. 101-v – ID 37995361). Consta, logo abaixo, petição do promotor de justiça, datada de 21/02/1994, requerendo renumeração de folhas dos autos e informando a interposição de recurso em sentido estrito (fl. 101-v – ID 37995361), o qual foi recebido pela secretaria do juízo em 22/02/1994 (fl. 102 – ID 37995362). Após despacho da magistrada singular, determinando a verificação “se houve intimação do rep. do Ministério Público após a sentença de pronúncia”, a escrivã da Comarca lavrou certidão em 25/02/1994, no seguinte sentido: “a rubrica existente na sentença, datada de 27.08.90, não é possível identificar, em virtude do grande espaço de tempo; desta forma não posso certificar se houve ciente do Promotor de Justiça da Comarca, na época” (fl. 105 – ID 37995363, pág. 1). Desse modo, se a comprovação da ciência do Ministério Público acerca da decisão de fls. 94/95-v (ID 37995252 e 37995253) somente se deu no dia 21/02/1994, com a manifestação do Parquet nos autos, não há como se considerar intempestivo o recurso em sentido estrito interposto em 22/02/1994, pois dentro do quinquídio previsto no art. 586 do Código de Processo Penal. No tocante à segunda nulidade suscitada, nota-se que, após a interposição do recurso em sentido estrito pelo Ministério Público, o advogado constituído pelos Revisionandos desistiu do patrocínio da causa, por motivo de foro íntimo (fl. 105-v – ID 37995363, pág. 2). Diante disso, o juiz singular de imediato nomeou como defensora dativa dos Requerentes a Bela. Virgínia Nogueira Santos (fl. 106 – ID 37995364). Não se desconhece a jurisprudência firmada por nossos tribunais superiores no sentido de que, antes de tal providência, o magistrado de piso deveria ter intimado os réus para, querendo, constituírem novo patrono de sua confiança. Ainda assim, considero que não há falar na decretação de nulidade. Como dito, as nulidades, mesmo as absolutas, dependem da demonstração de prejuízo e da arguição em tempo oportuno, sob pena de preclusão[2]. Na hipótese dos autos, observa-se que, durante toda a fase de instrução, desde o oferecimento da defesa prévia (fl. 52 – ID 37994952) até as alegações finais (fl. 84 – ID 37995243), os Requerentes foram representados por seu advogado constituído, o Bel. Eudes Caldas Cavalcanti. A defensora dativa foi nomeada tão somente na etapa de apresentação das contrarrazões ao recurso em sentido estrito ministerial, quando cabia a discussão acerca das provas que já haviam sido produzidas e que inevitavelmente seriam revisitadas in totum por este Tribunal de Justiça no julgamento do recurso. Além disso, observa-se que, apesar de a peça ter sido sucinta e de ter omitido os nomes dos revisionandos Francisco Pereira da Silva e Damião Pereira da Silva, a defensora cumpriu seu papel a contento, pedindo a manutenção da decisão impugnada em todos os seus termos, o que atendia aos anseios de todos os recorridos (fls. 110/111 – ID 37995368). Saliente-se, a propósito, o enunciado da Súmula 523 do Supremo Tribunal Federal, a saber: “No processo penal, a falta da defesa constitui nulidade absoluta, mas a sua deficiência só o anulará se houver prova de prejuízo para o réu”. Desse modo, não se identificando prejuízo concreto para a defesa dos Requerentes, não há falar em nulidade. Se isso não bastasse, os vícios alegados datam de mais de 20 (vinte) anos atrás e nunca antes foram suscitados, mesmo tendo havido oportunidades para tanto na sessão plenária e na interposição do recurso de apelação, quando os Requerentes já estavam assistidos por patrono constituído. Sendo assim, é forçoso reconhecer a preclusão da matéria, cuidando-se de típico caso de nulidade de algibeira. Corroborando o entendimento acima, colaciono os seguintes julgados do STJ: “AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO QUALIFICADO. NULIDADE. AUSÊNCIA DE APRESENTAÇÃO DAS RAZÕES NO RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO CONFIGURADO. VÍCIO NÃO ALEGADO NA PRIMEIRA OPORTUNIDADE. NULIDADE DE ALGIBEIRA. PRÁTICA NÃO TOLERADA. VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA BOA-FÉ. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. A disciplina que rege as nulidades no processo penal leva em consideração, em primeiro lugar, a estrita observância das garantias constitucionais, sem tolerar arbitrariedades ou excessos que desequilibrem a dialética processual em prejuízo do acusado. Por isso, o reconhecimento de nulidades é necessário toda vez que se constatar a supressão ou a mitigação de garantia processual que possa trazer agravos ao exercício do contraditório e da ampla defesa. Por outro lado, para o reconhecimento do vício é indispensável que seja demonstrado o prejuízo causado pela inobservância da forma, nos termos do art. 563 do Código de Processo Penal, que consagrou o princípio pas de nullité sans grief. 2. O Tribunal de origem, ao apreciar o recurso em sentido estrito interposto por Francisco Nilton Bezerra Farias Júnior e Sandro Barreto da Silva, afirmou que a defesa do ora agravante, embora tenha interposto petição recursal, não apresentou as razões respectivas, não obstante as oportunidades que lhe foram dadas, nos termos da Lei Processual Penal. Desse modo, não se constata o cerceamento de defesa alegado, tendo em vista que foi oportunizado à defesa a apresentação das razões recursais, sem que esta providência fosse realizada. 3. Além disso, a defesa, de fato, deixou de alegar a suposta nulidade nas diversas oportunidades que teve antes da impetração do habeas corpus, o que caracteriza a chamada nulidade de algibeira. Esse procedimento é incompatível com o princípio da boa-fé, que norteia o sistema processual vigente, exigindo lealdade e cooperação de todos os sujeitos envolvidos na relação jurídico-processual. 4. Agravo regimental não provido.” (STJ, AgRg no HC n. 658.016/AP, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 20/4/2021, DJe de 26/4/2021) “PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. HOMICÍDIO. NULIDADE POR CERCEAMENTO DE DEFESA. PEDIDO DE ADIAMENTO DA AUDIÊNCIA NEGADO. DECISÃO DEVIDAMENTE FUNDAMENTADA. NOMEAÇÃO DE DEFENSOR DATIVO. PREJUÍZO NÃO DEMONSTRADO. MATÉRIA PRECLUSA. NULIDADE DE ALGIBEIRA. PRÁTICA NÃO TOLERADA PELA JURISPRUDÊNCIA. (...) 1. A questão controvertida limita-se à alegação de nulidade do julgado por ausência do Defensor Público a audiência de instrução e julgamento e pela ausência de intimação do acusado por edital. 2. Diante da nomeação de defensor dativo, da qual não resultou prejuízo para o réu, inexiste nulidade pela ausência do Defensor Público em audiência. 3. A jurisprudência desta Corte Superior há muito se firmou no sentido de que a declaração de nulidade exige a comprovação de prejuízo, em consonância com o princípio pas de nullité sans grief, previsto no art. 563 do Código de Processo Penal. 4. Acrescente-se, ainda, que, no caso em exame, deixou a defesa para alegar a aludida questão em sede de memorais de apelação, mantendo-se silente quando da apresentação das alegações finais e, assim, tornando preclusa a matéria. 5. Cabe ao réu manter seu endereço atualizado junto ao Juízo processante. Por isso, não pode a defesa alegar nulidade à qual ela mesma deu causa. 6. Agravo regimental desprovido.” (STJ, AgRg no AREsp n. 1.842.781/TO, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 17/8/2021, DJe de 23/8/2021) “AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL PENAL. TRIBUNAL DO JÚRI. ALEGADA QUEBRA DA INCOMUNICABILIDADE DOS JURADOS. REEXAME DE CIRCUNSTÂNCIAS FÁTICAS. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE DEFESA TÉCNICA NÃO CARACTERIZADA DE PLANO. AFERIÇÃO DE EVENTUAL PREJUÍZO. IMPOSSIBILIDADE. ÓBICE DO VERBETE SUMULAR N.º 7/STJ. AGRAVO DESPROVIDO. (...) 3. O oferecimento de alegações finais sucintas, a não interposição de recurso em sentido estrito contra a decisão de pronúncia e a ausência de contrariedade ao libelo acusatório não caracterizam, de plano, a ausência de defesa técnica. Precedentes. (...) 6. Agravo regimental desprovido.” (STJ, AgRg no AREsp n. 33.110/PR, relatora Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, julgado em 26/11/2013, DJe de 9/12/2013) Não é demais salientar que a fase de pronúncia é marcada apenas por um juízo de admissibilidade da acusação, visto que o procedimento afeto aos crimes dolosos contra a vida é bifásico, com possibilidade de nova produção de provas e amplo espaço para argumentação na sessão plenária, cabendo ao Conselho de Sentença a decisão final acerca da responsabilidade penal do réu. Ou seja, mesmo que remotamente se cogitasse de deficiência de defesa na atuação da defensora dativa – porque em ausência de defesa decerto não há falar – mais um motivo há para se concluir que não ficou configurado prejuízo para os Requerentes, e o decurso de tão longo período desde os atos impugnados até os dias atuais apenas vem a corroborar essa conclusão. Nesse sentido: “AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO QUALIFICADO. DECISÃO DE PRONÚNCIA. NULIDADE. MATÉRIAS NÃO DEBATIDAS NA ORIGEM. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. SENTENÇA SEM NECESSIDADE DE FUNDAMENTAÇÃO EXAURIENTE. PRECLUSÃO. VÍCIO NÃO ALEGADO NA PRIMEIRA OPORTUNIDADE. NULIDADE DE ALGIBEIRA. PRÁTICA NÃO TOLERADA. VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA BOA-FÉ. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. (...) 2. A decisão de pronúncia possui natureza interlocutória mista e encerra apenas um juízo preliminar de admissibilidade da acusação pela prática de crime doloso contra a vida, sem debater questões referentes à responsabilidade penal do acusado. 3. Além disso, a defesa, de fato, deixou de alegar a suposta nulidade nas diversas oportunidades que teve antes da impetração do habeas corpus, o que caracteriza a chamada nulidade de algibeira. Esse procedimento é incompatível com o princípio da boa-fé, que norteia o sistema processual vigente, exigindo lealdade e cooperação de todos os sujeitos envolvidos na relação jurídico-processual. 3. Agravo regimental desprovido.” (STJ, AgRg no RHC n. 131.676/CE, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 15/9/2020, DJe de 21/9/2020) No que concerne à última das nulidades arguidas, a pretensão dos Revisionandos igualmente não merece prosperar. Ora, os Revisionandos foram denunciados por homicídio qualificado pelo motivo fútil e pela impossibilidade de defesa da vítima, e o Ministério Público, em seu recurso em sentido estrito, pugnou pela inclusão das referidas qualificadoras na pronúncia. Por ocasião do julgamento, deu-se provimento ao recurso ministerial, e, tanto na parte final do voto, quanto na síntese do acórdão, está registrada a decisão pela pronúncia dos Requerentes como incursos nas penas do art. 121, § 2°, incisos II e IV, do Código Penal, sendo o primeiro desses incisos relativo à qualificadora do motivo fútil. Fica nítido, portanto, que as duas menções à expressão “motivo torpe, no corpo do voto do relator (fl. 144 – ID 37995394, pág. 4) e na ementa (fl. 138 – ID 37995392), consistem de mero erro material, mesmo porque este Tribunal não poderia ter prolatado decisão extra petita, reconhecendo qualificadora diversa da pretendida pela acusação. Assim, inexiste qualquer mácula na inclusão de quesito sobre a futilidade do motivo do crime, por ter essa qualificadora constado tanto da denúncia, quanto do acórdão que encerrou a fase de pronúncia. De qualquer forma, uma vez mais deve ser salientado que não houve qualquer pronunciamento do causídico dos Requerentes sobre a matéria quando da sessão do júri, o que também implica preclusão. Nessa linha: STJ, AgRg no RHC n. 115.647/GO, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 13/10/2020, DJe de 20/10/2020. Em resumo, não se pode admitir uma verdadeira caça a nulidades, mormente por fatos ocorridos há tantos anos, sem demonstração de prejuízo e sem arguição em tempo oportuno. Por fim, quanto à alegação de que a condenação é contrária à evidência dos autos, cumpre ressaltar, na esteira do parecer ofertado pela Procuradoria de Justiça, que o acervo fático-probatório do processo de origem já foi analisado no primeiro e reanalisado no segundo grau de jurisdição, tendo esta Corte de Justiça entendido, ao julgar a apelação defensiva, que a condenação dos Revisionandos pelo crime de homicídio duplamente qualificado estava devidamente apoiada nas provas produzidas (fls. 406/425 dos autos originários – – ID 37996453, 37996455, 37996457, 37996458 e 37996661). Agora, em sede de revisão criminal, os Requerentes buscam simplesmente revolver a matéria fático-probatória, sem trazerem aos autos qualquer prova nova e sem apontarem, de forma concreta, a existência de manifesto erro judiciário. Conclui-se, assim, que os Requerentes manejaram esta via revisional, nesse ponto específico, como se uma segunda apelação fosse, sem que estivessem preenchidos os requisitos do art. 621 do CPP, o que impossibilita o deferimento do pedido. Confirmando o entendimento acima, trago à colação estes julgados: “AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. HOMICÍDIO QUALIFICADO CONSUMADO E TENTADO. REVISÃO CRIMINAL. ART. 621, INCISO I, DO CPP. PLEITO ABSOLUTÓRIO. FRAGILIDADE PROBATÓRIA. PRETENSÃO INVIÁVEL NO JUÍZO RESCISÓRIO. NECESSIDADE DE PATENTE CONTRARIEDADE ENTRE A CONDENAÇÃO E AS PROVAS DOS AUTOS. (...) 1. A revisão criminal não deve ser adotada como um segundo recurso de apelação, pois o acolhimento da pretensão revisional reveste-se de excepcionalidade, cingindo-se às hipóteses em que a contradição à evidência dos autos seja manifesta, induvidosa, dispensando a interpretação ou análise subjetiva das provas produzidas. 2. Nessa senda, este "Superior Tribunal de Justiça já pacificou o entendimento no sentido do não cabimento da revisão criminal quando utilizada como nova apelação, com vistas ao mero reexame de fatos e provas, não se verificando hipótese de contrariedade ao texto expresso da lei penal ou à evidência dos autos, consoante previsão do art. 621, I, do CPP." (HC 206.847/SP, Rel. Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, julgado em 16/02/2016, DJe 25/02/2016). (...) 4. Agravo improvido.” [3] “EMENTA: PROCESSUAL PENAL. REVISÃO CRIMINAL. (...) AUSÊNCIA DE PROVA NOVA APTA A ENSEJAR O REEXAME DA SENTENÇA. REITERAÇÃO DOS ARGUMENTOS EXPENDIDOS NO RECURSO DE APELAÇÃO E NO RECURSO ESPECIAL. PEDIDO INDEFERIDO. DECISÃO UNÂNIME. (...) III - A Revisão Criminal não se presta ao reexame de questões já exaustivamente analisadas pelo juízo de 1º grau e pelo Colegiado Estadual, mormente quando o requerente não apresenta qualquer prova que evidencie a sua inocência ou a ocorrência de qualquer das hipóteses previstas no art. 621, do Código de Processo Penal, possibilitando rever a matéria em sede desta via processual. IV - Revisão indeferida. Decisão unânime.” [4] “REVISÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA O PATRIMÔNIO. RECEPTAÇÃO SIMPLES. PRELIMINAR DE NULIDADE POR CERCEAMENTO DE DEFESA REJEITADA. MÉRITO, AUSÊNCIA DE PROVA NOVA. TESES JÁ ANALISADAS NO CURSO DA AÇÃO PENAL. Preliminar de Nulidade. A questão da propriedade dos fios apreendidos na posse do requerente já estava solucionada nos autos, através do auto de restituição e do laudo técnico juntado aos autos, fl. 19, circunstância devidamente considerada na sentença e no acórdão que analisou o caso. Mérito. A revisão criminal não pode funcionar como uma segunda apelação, sendo inviável o reexame da prova, especialmente quando e pedido não apresenta qualquer prova e apresenta as mesmas teses já repelidas durante o curso da ação penal, sem a demonstração de qualquer das hipóteses autorizadoras da revisional, como é o caso. PRELIMINAR DE NULIDADE REJEITADA. REVISÃO CRIMINAL JULGADA IMPROCEDENTE. UNÂNIME.” [5] Ante todo o exposto, em consonância com o parecer da Procuradoria de Justiça, voto julgando improcedente o pedido revisional. Recife, data da assinatura eletrônica. Des. Cláudio Jean Nogueira Virgínio Relator [1] Art. 621. A revisão dos processos findos será admitida: I - quando a sentença condenatória for contrária ao texto expresso da lei penal ou à evidência dos autos; II - quando a sentença condenatória se fundar em depoimentos, exames ou documentos comprovadamente falsos; III - quando, após a sentença, se descobrirem novas provas de inocência do condenado ou de circunstância que determine ou autorize diminuição especial da pena. [2] Nesse diapasão: STJ, AgRg no HC 723241/SP, rel. Min. Ribeiro Dantas, Quinta Turma, DJe 29/06/2022. [3] STJ, AgRg no AREsp 830.554/SP, rel. Min. Jorge Mussi, Quinta Turma, DJe 28/09/2018. [4] TJPE, Revisão Criminal nº 0372011-8, rel. Des. Daisy Maria de Andrade Costa Pereira, Seção Criminal, j. em 18/06/2015. [5] TJRS, Revisão Criminal nº 70045591906, rel. Des. Ícaro Carvalho de Bem Osório, 3º Grupo de Câmaras Criminais, j. em 05/04/2013. Ementa: Poder Judiciário Tribunal de Justiça de Pernambuco Gabinete do Des. Cláudio Jean Nogueira Virgínio REVISÃO CRIMINAL Nº: 0002774-91.2019.8.17.0000 REQUERENTES: DAMIÃO PEREIRA DA SILVA, FRANCISCO PEREIRA DA SILVA, CÍCERO PEREIRA DA SILVA ADVOGADO: HENRIQUE MARCULA LIMA REQUERIDA: JUSTIÇA PÚBLICA ÓRGÃO JULGADOR: SEÇÃO CRIMINAL RELATOR: DES. CLÁUDIO JEAN NOGUEIRA VIRGÍNIO PROCURADOR: JOSÉ CORREIA DE ARAÚJO EMENTA: PENAL. PROCESSUAL PENAL. REVISÃO CRIMINAL. HOMICÍDIO DUPLAMENTE QUALIFICADO. ALEGAÇÕES DE NULIDADES. AJUIZAMENTO DE AÇÃO REVISIONAL MAIS DE 20 (VINTE) ANOS APÓS O PRIMEIRO DOS VÍCIOS SUSCITADOS E MAIS DE 03 (TRÊS) ANOS APÓS O TRÂNSITO EM JULGADO DA CONDENAÇÃO. NULIDADE DE ALGIBEIRA. PRECLUSÃO. PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA. PRECEDENTES: STJ. INTEMPESTIVIDADE DO RECURSO EM SENTIDO ESTRITO MINISTERIAL. INOCORRÊNCIA. NOMEAÇÃO DE DEFENSORA DATIVA. NÃO COMPROVAÇÃO DE PREJUÍZO E AUSÊNCIA DE ARGUIÇÃO DE VÍCIO EM TEMPO OPORTUNO. NULIDADE NA QUESITAÇÃO. NÃO CONFIGURAÇÃO. CONTRARIEDADE DA CONDENAÇÃO À PROVA DOS AUTOS. PRETENSÃO DE REVOLVIMENTO DO ACERVO FÁTICO-PROBATÓRIO JÁ ANALISADO EM DUAS INSTÂNCIAS. MANEJO INADEQUADO DA AÇÃO REVISIONAL COMO SEGUNDA APELAÇÃO. PEDIDO INDEFERIDO. DECISÃO UNÂNIME. I – A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça têm caminhado no sentido de não se admitir a dita “nulidade de algibeira” – aquela guardada para ser utilizada em tempo oportuno, quando a parte em tese prejudicada achar por bem alegá-la –, tudo como forma de salvaguardar a coisa julgada e o princípio da segurança jurídica. II – No caso dos autos, o fato criminoso ocorreu em 20/01/1985, a pronúncia data de 28/08/1989, o julgamento do recurso em sentido estrito ocorreu em 17/05/2000, a sessão do júri realizou-se no dia 20/06/2013, e a apelação defensiva foi julgada em 02/09/2015, com trânsito em julgado no dia 03/11/2015. A presente revisão criminal, por sua vez, somente foi protocolada em 07/06/2019, mais de 20 (vinte) anos após o primeiro dos eventos que os Requerentes reputam configuradores de nulidade, quase 06 (seis) anos depois do último vício alegado e mais de 03 (três) anos após o trânsito em julgado da condenação. Não parece razoável o decurso de período tão longo sem que as supostas irregularidades mencionadas na inicial tenham sido minimamente ventiladas, seja no curso do feito, seja imediatamente após o seu encerramento, concluindo-se que os argumentos deduzidos nesta ação revisional mostram-se extemporâneos e, nessa condição, não são dignos de guarida, submetidos que estão ao instituto da preclusão. III – Ad argumentandum tantum, não há falar em nulidade por intempestividade do recurso em sentido estrito interposto pela acusação, pois a comprovação da ciência do Ministério Público acerca da decisão de pronúncia/impronúncia somente se deu no dia 21/02/1994, e o referido recurso foi interposto em 22/02/1994, dentro do quinquídio previsto no art. 586 do Código de Processo Penal. IV – Não se identifica prejuízo concreto para a defesa dos Requerentes decorrente da nomeação de defensora dativa, ocorrida apenas na etapa de apresentação das contrarrazões ao recurso em sentido estrito ministerial, sobretudo porque durante toda a instrução probatória os Revisionandos foram representados por advogado constituído. Outrossim, considerando que os vícios alegados datam de mais de 20 (vinte) anos atrás e nunca antes foram suscitados, mesmo tendo havido oportunidades para tanto na sessão plenária e na interposição do recurso de apelação, quando os Requerentes já estavam assistidos por novo patrono constituído, não há falar na decretação de nulidade do feito. V – Inexiste qualquer mácula na inclusão de quesito sobre a futilidade do motivo do crime, por ter essa qualificadora constado tanto da denúncia, quanto do acórdão que encerrou a fase de pronúncia, sendo certo que as duas menções à expressão “motivo torpe, no corpo do voto do relator e na ementa, consistem de mero erro material. De qualquer forma, não houve qualquer pronunciamento do causídico dos Requerentes sobre a matéria quando da sessão do júri, o que também implica preclusão. VI – Ao alegarem a contrariedade da condenação à evidência dos autos, os Requerentes buscam simplesmente revolver a matéria fático-probatória, pretendendo que esta ação faça as vezes de uma segunda apelação, sem trazerem aos autos qualquer prova nova e sem apontarem, de forma concreta, a existência de manifesto erro judiciário. VII – Ademais, o acervo fático-probatório do processo de origem já foi analisado no primeiro e reanalisado no segundo grau de jurisdição, tendo esta Corte de Justiça entendido, ao julgar a apelação defensiva, que a condenação dos Revisionandos pelo crime de homicídio duplamente qualificado estava devidamente apoiada na prova dos autos, inexistindo, portanto, motivos para o revolvimento da matéria na via da revisão criminal, mormente quando não alegado qualquer fato novo. VIII – Pedido revisional julgado improcedente. Decisão unânime. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os autos da Revisão Criminal nº 0002774-91.2019.8.17.0000 (0531467-8), em que figuram como partes as retromencionadas, ACORDAM os Excelentíssimos Senhores Desembargadores da Seção Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco, por unanimidade de votos, em julgar improcedente o pedido revisional, tudo de conformidade com o relatório e votos constantes das notas taquigráficas anexas, devidamente rubricadas, que passam a integrar o presente aresto, devidamente assinado. Recife, data da assinatura eletrônica. Des. Cláudio Jean Nogueira Virgínio Relator Proclamação da decisão: Por unanimidade de votos, indeferiu-se o pedido revisional, nos termos do voto da Turma. Magistrados: [EVANDRO SERGIO NETTO DE MAGALHAES MELO, CARLOS FREDERICO GONCALVES DE MORAES, ALEXANDRE GUEDES ALCOFORADO ASSUNCAO, FAUSTO DE CASTRO CAMPOS, MAURO ALENCAR DE BARROS, CLAUDIO JEAN NOGUEIRA VIRGINIO, DAISY MARIA DE ANDRADE COSTA PEREIRA, EUDES DOS PRAZERES FRANCA, DEMOCRITO RAMOS REINALDO FILHO, HONORIO GOMES DO REGO FILHO, ISAIAS ANDRADE LINS NETO, EVANDRO SERGIO NETTO DE MAGALHAES MELO, EDUARDO GUILLIOD MARANHAO, JOSE VIANA ULISSES FILHO, ANDRE VICENTE PIRES ROSA, MARCOS ANTONIO MATOS DE CARVALHO] RECIFE, 7 de abril de 2025 Magistrado

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