Ministério Público Do Estado Do Paraná x Marcos Andre Lima Machado
ID: 305904693
Tribunal: TJPR
Órgão: 12ª Vara Criminal de Curitiba
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO SUMARíSSIMO
Nº Processo: 0040827-39.2021.8.16.0182
Data de Disponibilização:
24/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
GUSTAVO BATAGINI
OAB/PR XXXXXX
Desbloquear
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ Comarca da Região Metropolitana de Curitiba Foro Central 12ª Vara Criminal Autos nº: 0040827-39.2021.8.16.0182 Autor: Ministério Público do Estado do Paraná Réu: …
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ Comarca da Região Metropolitana de Curitiba Foro Central 12ª Vara Criminal Autos nº: 0040827-39.2021.8.16.0182 Autor: Ministério Público do Estado do Paraná Réu: Marcos Andre Lima Machado SENTENÇA 1. Relatório: Marcos Andre Lima Machado, brasileiro, divorciado, desempregado, natural de Ivaiporã/PR, portador da CI/RG nº 12.321.624-5, inscrito no CPF sob o nº 800.424.509-93, nascido em 12/02/1981, com 40 (quarenta) anos de idade na data dos fatos, filho de Neusa Rodrigues Lima e Ítalo Manoel dos Santos Machado, em situação de rua, foi denunciado, junto a Paulo Henrique da Silva Oshiro, como incurso nas sanções do artigo 331 do Código Penal, conforme se extrai da narrativa fática exposta na denúncia de mov. 69.2, in verbis: “ No dia 13 de dezembro de 2021, por volta de 10h30min, na Praça Osório, localizada na Rua Voluntários da Pátria, nº 400, Centro, nesta cidade e capital de Curitiba/PR, os guardas municipais Aline Heimann Bruni e Felipe Deslandes de Souza foram solicitados por um transeunte, alegando que haviam alguns indivíduos realizando ameaças nas proximidades. Após se deslocarem ao local indicado e realizarem a abordagem aos indivíduos, posteriormente identificados como sendo os denunciados e PAULO HENRIQUE DA SILVA OSHIRO MARCOS ANDRE LIMA MACHADO, estes, com consciência e vontadePODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ Comarca da Região Metropolitana de Curitiba Foro Central 12ª Vara Criminal dirigidas ao fim ilícito, com a clara intenção de menosprezar a função pública exercida pelos referidos guardas municipais, os desacataram, afirmando "que não respeitavam a guarda municipal", "que não iam ser abordados" "folgados", "que os guardas eram porcos". Ato contínuo, o denunciado PAULO HENRIQUE DA SILVA OSHIRO partiu para cima da equipe portando uma faca e um garfo (apreendidos ao mov. 8.2, fl. 23), e quando os guardas solicitaram que entregasse os objetos, afirmou "que não ia entregar”, e jogou um prato de comida no guarda municipal nada Felipe Deslandes de Souza. Por fim, após a contenção dos noticiados, durante o deslocamento destes ao 1º Distrito Policial da Capital, os denunciados continuaram a desacatar os guardas municipais, com os dizeres “porcos, “ filhos da puta”, “folgados" tudo conforme B.O. de mov. 8.1 e 8.2".” O procedimento teve início mediante a lavratura de termo circunstanciado de ocorrência (mov. 8.2). Foi oferecida a denúncia ao Juízo do 8º Juizado Especial Criminal de Curitiba (mov. 69.2). Ante a não localização dos denunciados, os autos foram remetidos ao Juízo comum (mov. 133.1), mediante requerimento do Ministério Público, com base no artigo 66, parágrafo único, da Lei 9.099/95 (mov. 130.1). Recebidos os autos (mov. 138.1), o ilustre representante do Ministério Público pugnou pelo recebimento da denúncia contida no mov. 69.2 e pela citação dos denunciados por edital (mov. 141.1).PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ Comarca da Região Metropolitana de Curitiba Foro Central 12ª Vara Criminal Recebida a denúncia em 24/06/2024, foi determinada a citação do denunciados por edital (mov. 144.1). Citados via edital (movs. 154.1 a 158.0), os acusados não compareceram ao processo e tampouco constituíram defensor, razão pela qual foram suspensos o processo e o curso do prazo prescricional, nos termos da decisão proferida no dia 29 de agosto de 2024 (mov. 165.1). O acusado Marcos foi pessoalmente citado (mov. 176.1). Revogada a suspensão do processo (mov. 180.1). O réu Marcos apresentou resposta à acusação por intermédio de advogado dativo (mov. 188.1). Os autos foram desmembrados com relação ao denunciado Paulo Henrique, mantendo-se no polo passivo desta demanda apenas o acusado Marcos (mov. 191.1) Durante a instrução processual, foram ouvidas as duas testemunhas comuns às partes e, ao final, o réu foi interrogado (mov. 211). Em suas alegações finais apresentadas oralmente (mov. 211.2), o douto representante do parquet destacou a presença dos pressupostos processuais e condições da ação. No mérito, requereu a procedência da denúncia, a fim condenar o denunciado nas sanções do artigo 331, caput, do Código Penal. Ao final, teceu comentários acerca do procedimento dosimétrico. Por sua vez, a douta defesa, em suas alegações finais (mov. 216.1), requereu, na fase de dosimetria da pena, a aplicação das atenuantes previstas na alínea d, inciso III, do artigo 65, e no artigo 66, ambos do CódigoPODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ Comarca da Região Metropolitana de Curitiba Foro Central 12ª Vara Criminal Penal, com o objetivo de reduzir a pena in concreto até o seu patamar mínimo legal ou, até mesmo, para aquém do mínimo legal, sob o fundamento de que a Súmula 231 do STJ seria flagrantemente inconstitucional. Em seguida, vieram-me os autos conclusos. 2. Fundamentação: Do mérito: Ao réu Marcos Andre Lima Machado foi imputada a prática das sanções descritas no artigo 331, caput, do Código Penal. A materialidade do crime de desacato restou suficientemente evidenciada por meio de boletim de ocorrência (mov. 8.1), termo circunstanciado (mov. 8.2), bem como pela prova oral colhida em Juízo. A responsabilidade criminal do réu, da mesma forma, é indiscutível e decorre das provas coligidas nas fases indiciária e judicial, estando suficientemente comprovada a autoria do delito. O guarda municipal Felipe Deslandes de Souza, em Juízo (mov. 211.5), relatou que, à época dos fatos, trabalhava na região central, próximo à Praça Osório, quando a sua equipe foi acionada por um transeunte que informou que um senhor estava sendo ameaçado por um “pessoal”. Disse que, juntamente com sua parceira, se deslocou para averiguar o que estava acontecendo. Detalhou que, ao chegarem ao local, abordaram as pessoas que lá estavam e perguntaram o que estava ocorrendo. Acrescentou que havia bastante gente no local e que o Sr. Marcos (réu) e o Sr. Paulo se alteraram. Naquela ocasião, ambos começaram a xingá-lo, e o Sr. Paulo, que estava segurando um prato de comida, o lançou contra si. Acrescentou que o Sr. Paulo estava com um garfo e uma faca nas mãos e tentou atacar a equipe, razão pela qual foi solicitadoPODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ Comarca da Região Metropolitana de Curitiba Foro Central 12ª Vara Criminal apoio de outra guarnição. Relatou que conseguiu conter os indivíduos e efetuar a prisão, e que, durante o trajeto até a Delegacia, eles continuaram a proferir xingamentos de dentro do camburão da viatura. Detalhou que, ao chegar ao local, a vítima da ameaça se encontrava junto ao grupo de pessoas que lá estava. Informou que já conhecia o local e os indivíduos, pois eles sempre frequentam a área, motivo pelo qual não realizou uma “abordagem policial”, mas sim uma abordagem para conversar e entender o que estava acontecendo. Disse que foi nesse momento em que o denunciado se exaltou juntamente com o Sr. Paulo. Contou que, posteriormente, o denunciado Marcos chegou a pedir desculpas. Relatou que não sabe se eles estavam sob efeito de álcool, mas, no momento da abordagem, foram bastante agressivos. Confirmou que o denunciado e o Sr. Paulo o ofenderam, bem como à sua parceira, com palavras. Informou que não se recorda com precisão das palavras proferidas, mas, ao reler o boletim de ocorrência, rememorou que ambos os chamaram de “porcos” e, durante o trajeto até a Delegacia, continuaram a ofendê- los. Informou que o denunciado e o Sr. Paulo eram conhecidos na região e sempre estavam próximos à Praça Osório com grupos de pessoas. Acrescentou que frequentemente atendia ocorrências envolvendo ambos, geralmente relacionadas a reclamações ou perturbação. Confirmou novamente que, após a oitiva realizada com o Delegado, os indivíduos pediram desculpas. No mesmo sentido, a guarda municipal Aline Heimann Bruni, em Juízo (mov. 211.4), declarou que, no dia dos fatos, estava em patrulhamento próximo à Praça Osório, quando um determinado indivíduo informou que havia uma briga em andamento e que um morador de rua estaria com uma faca ou um garfo na mão ameaçando uma terceira pessoa. Relatou que a equipe se deslocou até o local e verificou que um dos indivíduos, o qual mencionou acreditar ser o senhor Paulo, de fato estava com os referidos objetos nas mãos. Contou que, ao chegarem, deram voz de abordagem e, logo em seguida, os sujeitos passaram a xingar a equipe, dizendo: “não vou atender às suas ordens” e “vocês são porcos”. Acrescentou que, ao serem conduzidos até a delegacia, durante o trajeto, os indivíduos continuaram a xingá-PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ Comarca da Região Metropolitana de Curitiba Foro Central 12ª Vara Criminal los. Informou que um deles, inclusive, arremessou contra seu parceiro uma vasilha com comida. Confirmou que o denunciado proferiu xingamentos contra a equipe tanto na praça quanto no interior da viatura, bem como após a chegada à Delegacia de Polícia do 1º Distrito. Por fim, informou não se recordar de qualquer pedido de desculpas. Ao final, o acusado, em seu interrogatório judicial (mov. 211.3), confessou a prática do crime, confirmando que proferiu xingamentos aos guardas municipais, dizendo: “porcos”, “filhos da puta” e “folgados”. Detalhou que, no dia dos fatos, encontrava-se sob efeito de álcool quando proferiu as referidas ofensas. Relatou que, na ocasião, estava na praça bebendo álcool. Informou que é “morador de rua” e que, no local do fato, havia outros “moradores de rua”. Informou que possui dois cachorros e que uma das pessoas tentou agredir sua cadela, situação que não aceitou e, por isso, revidou. Esclareceu que, em razão dessa confusão, a polícia foi acionada. Disse que a Guarda Municipal chegou enquanto estavam almoçando, “impondo respeito” . Acrescentou que não gostaram da abordagem e, por estarem alterados, teve início a discussão com os agentes. Disse que, em seguida, foram presos e conduzidos ao 1º Distrito Policial, onde assinaram um boletim de ocorrência. Disse que os xingamentos ocorreram e que, de fato, proferiu ofensas contra os guardas. Por fim, declarou estar arrependido pela prática do delito. Assim, com o encerramento da instrução processual, verifica- se que o feito reúne os elementos suficientes à formação de juízo de mérito, impondo-se a devida análise do conjunto probatório. Nesse diapasão, prudente trazer à baila as lições de Guilherme de Souza Nucci quanto ao elemento objetivo do tipo penal do crime sob análise: “ Desacatar (desprezar, faltar com o respeito ou humilhar) funcionário público no exercício da função ou em razão dela (exige-se que a palavra ofensiva ou o ato injurioso sejaPODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ Comarca da Região Metropolitana de Curitiba Foro Central 12ª Vara Criminal dirigido ao funcionário que esteja exercendo suas atividades ou, ainda que ausente delas, tenha o autor levado em consideração a função pública). Pode implicar em qualquer tipo de palavra grosseira ou ato ofensivo contra a pessoa que exerce função pública, incluindo ameaças e agressões físicas. 1 ” Sabe-se que o bem juridicamente protegido no crime de desacato é a administração pública, no caso, o Estado. O funcionário público, além de vítima secundária, também é o objeto material, mormente porque desacatado no exercício de sua função ou em razão dela. Assim, no caso dos autos, verifica-se que os dois agentes da Guarda Municipal relataram, em Juízo, que, no estrito exercício de suas funções públicas, realizavam patrulhamento de rotina nas proximidades da Praça Osório quando foram abordados por um transeunte, que lhes informou que um senhor estaria sendo ameaçado nas imediações por uma pessoa que estaria com uma faca e um garfo na mão. De posse das informações, os agentes se deslocaram ao local dos fatos e, ao chegarem lá, deram voz de abordagem às pessoas presentes, indagando-as sobre o que estava ocorrendo. Na sequência, o acusado e o codenunciado, Paulo, passaram a proferir ofensas com palavras de baixo calão contra os servidores públicos, desacatando-os de forma direta e explícita, mediante expressões como: “porcos”, “folgados” e “filhos da puta”. Conforme se depreende dos autos, tais fatos foram descritos na denúncia e confirmados em Juízo pelas declarações dos próprios guardas municipais. 1 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Direito Penal. 16 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020. p. 1492.PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ Comarca da Região Metropolitana de Curitiba Foro Central 12ª Vara Criminal Nesse sentido, convém destacar que as palavras dos guardas municipais, mesmo quando integram o polo passivo dos crimes sob análise, se revestem de especial valor probatório, mormente quando amparadas por outros elementos de prova, assim como no caso dos autos. A propósito, cumpre transcrever o seguinte julgado: “ APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME DE DESACATO. ARTIGO 331 DO CÓDIGO PENAL. PLEITO ABSOLUTÓRIO. ALEGAÇÃO DE INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA. DEMONSTRADA A VONTADE DE DESACATAR FUNCIONÁRIO PÚBLICO NO EXERCÍCIO DA FUNÇÃO. DECLARAÇÕES PRESTADAS POR GUARDAS MUNICIPAIS DOTADAS DE FÉ PÚBLICA. PROVAS SUFICIENTES PARA A CONDENAÇÃO. PLEITO DE COMPENSAÇÃO DA AGRAVANTE E ATENUANTE. EXCLUSÃO DA CIRCUNSTÂNCIA DA REINCIDÊNCIA. AUSÊNCIA DE CERTIDÃO DE ANTECEDENTES CRIMINAIS NOS AUTOS. APLICAÇÃO ÚNICA DA ATENUANTE. ALTERAÇÃO DA PENA. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.” (TJPR - 6ª Turma Recursal dos Juizados Especiais - 0005951- 78.2020.8.16.0025 - Araucária - Rel.: JUIZ DE DIREITO DA TURMA RECURSAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS AUSTREGESILO TREVISAN - J. 23.03.2025). – grifei. Assim, tem-se que as palavras dos agentes são plenamente viáveis a embasar um decreto condenatório, havendo que se considerar a relevância dos seus testemunhos, especialmente quando prestados em Juízo, sob o crivo do contraditório, tendo em vista que o único interesse por eles demonstrado foi o de narrar a atuação e apontar o verdadeiro autor do delito, inexistindo motivos para a incriminação de inocentes.PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ Comarca da Região Metropolitana de Curitiba Foro Central 12ª Vara Criminal Não obstante a isso, percebe-se que o dolo do réu é evidente, eis que, somada às declarações dos agentes públicos, ele confessou, no seu interrogatório judicial, a prática da infração penal. Nessa linha de ideias, consoante a tese firmada no Tema Repetitivo n° 997, julgado pelo STJ: “A confissão judicial, em princípio, é, obviamente, lícita. Todavia, para a condenação, apenas será considerada a confissão que encontre algum sustento nas demais provas, tudo à luz do art. 197 do CPP.” (REsp n. 1.679.536/RN, Relator Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, julgado em 20/6/2024, DJe de 1/7/2024) – grifei. Outrossim, há de se ressaltar que o ânimo exaltado do acusado, em razão de estar embriagado no momento do crime, não afasta o elemento subjetivo do tipo penal, nos termos do artigo 28, inciso II, do Código Penal. Nesse sentido, colaciona-se o seguinte julgado: APELAÇÃO CRIMINAL. DESACATO. ARTIGO 331 DO CÓDIGO PENAL. DESACATO. SENTENÇA CONDENATÓRIA. INSURGÊNCIA DA RÉ. PLEITO ABSOLUTÓRIO. ALEGAÇÃO DE INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA. NÃO ACOLHIMENTO. PALAVRA DOS AGENTES PÚBLICOS QUE DETÊM FÉ PÚBLICA. DEPOIMENTOS JUDICIAIS COERENTES E HARMÔNICOS, CORROBORADOS POR DEPOIMENTO TESTEMUNHAL E DEMAIS ELEMENTOS CONTIDOS NO TERMO CIRCUNSTÂNCIADO. INTENÇÃO DE OFENDER E MENOSPREZAR FUNCIONÁRIO PÚBLICO NO EXERCÍCIO DA FUNÇÃO. OFENSAS AOS POLICIAIS MILITARES NO EXERCÍCIO DE SUAS FUNÇÕES. ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE DOLO DECORRENTE DO ESTADO DE EMBRIAGUEZ VOLUNTÁRIA. IMPOSSIBILIDADE. CONDIÇÃO QUE NÃO EXCLUI O DOLO NEM A IMPUTABILIDADE PENAL. ARTIGO 28, INCISO II, DO CÓDIGO PENAL. TEORIA DA ACTIO LIBERA IN CAUSA. UMA VEZ QUE O AGENTEPODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ Comarca da Região Metropolitana de Curitiba Foro Central 12ª Vara Criminal OPTOU POR INGERIR DETERMINADA SUBSTÂNCIA, POR ATO DE SEU LIVRE-ARBÍTRIO, MESMO QUANDO TINHA A OPÇÃO DE NÃO O FAZER, ELE SE TORNA RESPONSÁVEL PELO RESULTADO DECORRENTE DAS CONSEQUÊNCIAS GERADAS POR SEUS EFEITOS.CONDENAÇÃO MANTIDA PELOS PRÓPRIOS E JURÍDICOS FUNDAMENTOS EXARADOS NA SENTENÇA. APLICABILIDADE DO ART. 82, §5º DA LEI 9.099/95. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.I. CASO EM (TJPR - 4ª Turma Recursal - 0014637-70.2022.8.16.0031 - Guarapuava - Rel.: JUIZ DE DIREITO DA TURMA RECURSAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS LEO HENRIQUE FURTADO ARAUJO - J. 24.03.2025). – grifei. Deste modo, não restam dúvidas de que o crime de desacato restou consumado, porquanto foi comprovada a existência do dolo, além das exigências do tipo, visto que os guardas municipais sofreram as agressões verbais do réu enquanto estavam no exercício das suas funções, sendo certo que o denunciado agiu com o intuito de desmoralizar a administração pública através dos agentes que se encontravam no cumprimento de suas funções legais, bem como humilhá-los, a fim de ferir a honra deles. Portanto, da análise dos fatos constantes nos autos, verifica- se o preenchimento dos elementos objetivo e subjetivo do tipo penal previsto no artigo 331 do Código Penal, especialmente em razão da prova oral colhida em Juízo, com destaque para a confissão do acusado, a qual, somada aos demais elementos de prova, revela-se suficiente para embasar um édito condenatório. Além disso, depreende-se que não concorre qualquer causa excludente de antijuridicidade ou que afaste a culpabilidade do acusado. Ao contrário, o conjunto probatório traz elementos que indicam a sua potencialPODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ Comarca da Região Metropolitana de Curitiba Foro Central 12ª Vara Criminal consciência da ilicitude e possibilidade de assumir conduta diversa, consoante ao ordenamento jurídico e imputabilidade. Destarte, deve o acusado receber a reprimenda penal em razão da prática do crime de desacato. 3. Dispositivo: Diante do exposto, julgo procedente a pretensão punitiva contida na denúncia, para o fim de condenar o réu Marcos Andre Lima Machado pela prática do delito tipificado no artigo 331 do Código Penal. 4. Dosimetria da pena: Considerando as diretrizes estabelecidas no artigo 59 e correlatas do Código Penal, passo à individualização da pena. Circunstâncias Judiciais: Culpabilidade: o grau de reprovabilidade do agente se mostrou elevado, e no quesito em análise deve ser considerado desfavorável, já que a sua atuação se deu enquanto cumpria pena nos autos de execução penal nº 0002091-93.2015.8.16.0009, o que demonstra o seu total descaso com o processo de ressocialização, extrapolando os limites da culpabilidade fixados no tipo penal. Este é o entendimento do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Paraná: “APELAÇÃO CRIMINAL. CRIMES DE LESÃO CORPORAL QUALIFICADA, AMEAÇA E INCÊNDIO QUALIFICADO. TIPIFICAÇÃO NOS ARTS. 129, § 13, 147, CAPUT, E 250, § 1º, INCISO II, ALÍNEA "A", TODOS DO CÓDIGO PENAL. SENTENÇA CONDENATÓRIA PROFERIDA. INSURGÊNCIA DAPODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ Comarca da Região Metropolitana de Curitiba Foro Central 12ª Vara Criminal DEFESA. [...] DOSIMETRIA DA PENA. PLEITO PARA EXCLUSÃO DA VALORAÇÃO NEGATIVA DA CULPABILIDADE. IMPROCEDÊNCIA. PRÁTICA DO DELITO DURANTE O CUMPRIMENTO DE PENA POR CONDENAÇÃO ANTERIOR. CONDUTA QUE REFLETE EVIDENTE DESRESPEITO ÀS REGRAS DE EXECUÇÃO PENAL E MENOSPREZO ÀS CONDIÇÕES DE RESSOCIALIZAÇÃO. ENTENDIMENTO CONSOLIDADO NO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA E NESTA CORTE ESTADUAL. [...] RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESTA EXTENSÃO, DESPROVIDO.” (TJPR - 2ª Câmara Criminal - 0000280-79.2024.8.16.0172 - Ubiratã - Rel.: DESEMBARGADOR KENNEDY JOSUE GRECA DE MATTOS - J. 24.02.2025) – grifei. Antecedentes: o acusado possui maus antecedentes. Verifica-se, da análise da certidão extraída do Sistema Oráculo, que o réu é considerado multirreincidente, eis que ostenta múltiplas condenações configuradoras de reincidência e de maus antecedentes, sendo considerada nesta fase a sua condenação na ação penal nº 0003852-50.2015.8.16.0013, que tramitou perante a 9ª Vara Criminal de Curitiba/PR, em razão da prática de crime de tráfico de drogas, com trânsito em julgado em 04/11/2016 e extinção de pena em 30/06/2022. Portanto, o quesito em análise deve ser considerado desfavorável. Insta consignar, desde já, que a valoração negativa dos maus antecedentes aliada à aplicação da agravante da reincidência em caso de multiplicidade de condenações transitadas em julgados não causa bis in idem, máxime quando a fundamentação fizer alusão a condenações de processos distintos. Nesse sentido, é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ Comarca da Região Metropolitana de Curitiba Foro Central 12ª Vara Criminal “DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. COMPENSAÇÃO ENTRE A ATENUANTE DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA E A AGRAVANTE DA REINCIDÊNCIA. MULTIRREINCIDÊNCIA. IMPOSSIBILIDADE DE COMPENSAÇÃO INTEGRAL. UTILIZAÇÃO DE CONDENAÇÃO PARA MAUS ANTECEDENTES E REINCIDÊNCIA. AUSÊNCIA DE BIS IN IDEM. ORDEM DENEGADA. I. CASO EM EXAME [...] A defesa alega constrangimento ilegal pela não compensação da atenuante da confissão espontânea com a agravante da reincidência, sob o argumento de que o paciente não é multirreincidente, e pela suposta ocorrência de bis in idem na utilização da mesma condenação tanto para maus antecedentes quanto para reincidência. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. [...] ii) verificar se houve bis in idem na utilização da mesma condenação para valorar os maus antecedentes e a reincidência. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. [...] 5. A utilização de condenações distintas para valorar maus antecedentes na primeira fase da dosimetria da pena e reincidência na segunda fase não configura bis in idem, conforme jurisprudência pacífica do STJ, desde que as condenações sejam diferentes, como no caso dos autos. 6. Não há ilegalidade na exasperação da pena com base nos maus antecedentes, tampouco há possibilidade de compensação integral entre as circunstâncias. IV. HABEAS CORPUS DENEGADO.” (HC n. 837.289/MS, relatora Ministra Daniela Teixeira, Quinta Turma, julgado em 27/11/2024, DJEN de 4/12/2024.) – grifei. Conduta social e personalidade: não há nos autos elementos para se aquilatar essas circunstâncias, razão pela qual sua valoração permanece neutra.PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ Comarca da Região Metropolitana de Curitiba Foro Central 12ª Vara Criminal Motivos do crime: não há peculiaridades que justifiquem a valoração negativa do quesito em análise. Circunstâncias do crime: comuns ao tipo. Consequências: nada a indicar uma valoração negativa. Do comportamento da vítima: em nada contribuiu para a eclosão do evento criminoso. Desta feita, diante da existência de duas circunstâncias judiciais desfavoráveis ao réu, fixo-lhe a pena-base em 2/8 (dois oitavos) acima de seu mínimo legal, vale dizer, em 07 (sete) meses e 15 (quinze) dias de detenção. Agravantes e atenuantes: Na segunda fase da fixação da pena, verifica-se que o réu cometeu novo delito depois de ter recebido múltiplas condenações transitadas em julgado, conforme se observa das informações constantes do Sistema Oráculo, sem que, entre as datas dos trânsitos em julgados e/ou extinções das penas e a prática do crime sob análise, ultrapassasse tempo superior ao período depurador previsto no art. 64, inciso I, do Código Penal. Visualiza-se, deste modo, a condição pessoal de multirreincidente do acusado, eis que, quando praticou o novo crime pelo qual está sendo sentenciado, já possuía duas ou mais condenações transitadas em julgado por outros delitos. No caso, para configuração da agravante da reincidência, serão utilizadas as suas condenações nas ações penais nº 0000994- 71.2000.8.16.0013, que tramitou perante 11ª Vara Criminal de Curitiba/PR, em razão da prática do crime de roubo, com transito em julgado em 07/08/2000 ePODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ Comarca da Região Metropolitana de Curitiba Foro Central 12ª Vara Criminal extinção da pena em 27/02/2018; nº 0000002-18.2001.8.16.0097, que tramitou perante a Vara Criminal de Ivaiporã/PR, em razão da prática do crime de furto simples, com trânsito em julgado em 15/05/2003 e extinção da pena 27/02/2018; e nº 0002402-82.2009.8.16.0013, que tramitou perante a 6ª Vara Criminal de Curitiba/PR, em razão da prática do crime de tráfico de drogas, com trânsito em julgado em 08/10/2010 e extinção da pena em 27/02/2018. Sob outro prisma, presente a circunstância atenuante relativa à confissão espontânea, disposta no artigo 65, inciso III, alínea d, do Código Penal, uma vez que o acusado confessou a prática do delito quando interrogado judicialmente. Insta salientar que, em havendo a incidência da reincidência e da confissão, deve ser realizada a compensação, já que a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do EREsp 1.154.752/RS, pacificou o entendimento no sentido de que a agravante da reincidência e a atenuante da confissão espontânea - que envolve a personalidade do agente - são igualmente preponderantes, razão pela qual devem ser compensadas. Todavia, o mesmo Superior Tribunal de Justiça, seguindo a orientação firmada pelo Supremo Tribunal Federal (STF. 2ª Turma. Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 18/03/2014), consolidou o entendimento excepcionando que, se o réu for multirreincidente, não é possível promover a compensação entre a atenuante da confissão espontânea e a agravante da reincidência, caso em que irá prevalecer o aumento da pena advindo da reincidência, conforme se observa do AgRg no REsp 1.424.247-DF , Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 3/2/2015, disposto no Informativo n. 555. Nesse sentido, é o excerto:PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ Comarca da Região Metropolitana de Curitiba Foro Central 12ª Vara Criminal “Tratando -se de réu multirreincidente, não é possível promover a compensação entre a atenuante da confissão espontânea e a agravante da reincidência. De fato, a Terceira Seção do STJ firmou o entendimento de que a atenuante da confissão espontânea pode ser compensada com a agravante da reincidência (EREsp 1.154.752-RS, DJe 4/9/2012). No entanto, tratando-se de réu multirreincidente, promover essa compensação implicaria ofensa aos princípios da individualização da pena e da proporcionalidade. Isso porque a multirreincidência exige maior reprovação do que aquela conduta perpetrada por quem ostenta a condição de reincidente por força, apenas, de um único evento isolado em sua vida”. (AgRg no REsp 1.424.247-DF, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 3/2/2015, DJe 13/2/2015) - grifei. Dessa forma, prevalece, no presente caso, a agravante da reincidência. Sendo assim, tendo em vista a condição de multirreincidente do réu, a sua pena será agravada em 1/6 (um sexto), de modo que fixo a pena intermediária em 08 (oito) meses e 22 (vinte e dois) dias de detenção. E apenas por argumentação, não merece prosperar o pleito defensivo de reconhecimento da atenuante genérica prevista no artigo 66 do Código Penal, pois os elementos trazidos pela defesa não se revelam aptos a justificar a incidência da referida atenuante inominada. Com efeito, o fato de o réu afirmar que, momentos antes, teria se envolvido em desentendimento com terceiro que supostamente tentou agredirPODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ Comarca da Região Metropolitana de Curitiba Foro Central 12ª Vara Criminal seus animais de estimação, não guarda qualquer relação com a conduta posteriormente dirigida contra os agentes públicos, tampouco serve para abrandar sua reprovabilidade. Ademais, o eventual arrependimento manifestado em Juízo, embora digno de registro em sede subjetiva, é insuficiente, por si só, para justificar a incidência da atenuante genérica, notadamente porque não caracteriza circunstância capaz de evidenciar especial redução da culpabilidade ou da reprovação social do fato, estando, na realidade, mais relacionado à própria percepção da repercussão de seus atos, já refletida na confissão judicial devidamente valorada. Assim, ausente qualquer elemento concreto que revele circunstância relevante, anterior ou posterior ao delito, capaz de atenuar a conduta, incabível a aplicação da atenuante do artigo 66 do Código Penal, como pretende a defesa. Causas de aumento e diminuição: Na terceira fase da dosimetria da pena, não se fazem presentes majorantes e/ou minorantes, razão pela qual a pena se torna definitiva em 08 (oito) meses e 22 (vinte e dois) dias de detenção. Considerando o quantum da reprimenda estabelecido, a análise das circunstâncias judiciais e a condição pessoal de multirreincidente do acusado, com supedâneo no artigo 33, §§ 2º e 3º, do Código Penal, determino o regime semiaberto para o cumprimento inicial da pena imposta. Deixo de substituir a pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, em razão da análise negativa de circunstâncias judiciais e daPODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ Comarca da Região Metropolitana de Curitiba Foro Central 12ª Vara Criminal multirreincidência do réu em crime doloso (artigo 44, incisos I e II, do Código Penal). Deixo, ainda, de beneficiar o denunciado com a suspensão condicional da pena, haja vista as circunstâncias judiciais e a sua condição pessoal de multirreincidente em crime doloso (artigo 77, incisos I e II, do Código Penal). Relativamente à detração penal, o réu não chegou a ser preso preventivamente no presente feito, bem como entendo que se trata de matéria afeta ao Juízo da execução. Neste sentido, cumpre transcrever o seguinte julgado: “APELAÇÃO CRIMINAL. CONTRAVENÇÃO VIAS DE FATO E CRIMES DE DESACATO E RESISTÊNCIA. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. IRRESIGNAÇÃO DEFENSIVA. PEDIDO DE DETRAÇÃO DO PERÍODO QUE CUMPRIU A MEDIDA CAUTELAR DE RECOLHIMENTO DOMICILIAR. MATÉRIA AFETA AO JUÍZO DA EXECUÇÃO. RECURSO NÃO CONHECIDO.” (TJPR - 2ª Câmara Criminal - 0000197- 08.2022.8.16.0019 - Ponta Grossa - Rel.: DESEMBARGADOR KENNEDY JOSUE GRECA DE MATTOS - J. 09.12.2024) – grifei. 5. Considerações gerais: Verifica-se que o réu respondeu ao processo em liberdade e que não houve alteração do quadro fático ou o advento das causas ensejadoras da decretação da prisão preventiva. Portanto, concedo-lhe o direito de recorrer em liberdade.PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ Comarca da Região Metropolitana de Curitiba Foro Central 12ª Vara Criminal Intimem-se os guardas municipais, vítimas indiretas da presente sentença, em conformidade com a redação do artigo 201, §2º, do Código de Processo Penal. Condeno o Estado do Paraná ao pagamento de honorários advocatícios ao Dr. Gustavo Batagini, OAB 82.180N-PR, nomeado nos presentes autos, que arbitro no valor de R$1.900,00 (mil e novecentos reais), considerando a complexidade da causa, o tempo de desenvolvimento do processo, além de que o douto defensor atuou integralmente na defesa do acusado, nos termos da disposição da tabela de honorários contida na Resolução Conjunta nº 06/2024-PGE/SEFA. Consigno que a presente decisão é válida como certidão para a execução de honorários, na forma da Resolução 80/2010 da PGE/PR. Finalmente, condeno o réu ao pagamento das custas processuais (art. 804 do Código de Processo Penal). Após o trânsito em julgado desta decisão: a) Expeça-se a guia de recolhimento definitiva, encaminhando-a à Vara de Execuções Penais competente, conforme contido no Código de Normas da douta Corregedoria Geral de Justiça, bem como façam-se as comunicações necessárias; b) Comunique-se ao juízo eleitoral, na forma do artigo 15, inciso III, da Constituição Federal; c) Remetam-se os autos à Secretaria do Contador para o cálculo das custas impostas, intimando-se o acusado para efetuar o pagamento no prazo de 10 (dez) dias. Caso o réu não seja encontrado, intime-se por edital.PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ Comarca da Região Metropolitana de Curitiba Foro Central 12ª Vara Criminal Cumpra-se, no que for aplicável, o contido no Código de Normas da Corregedoria Geral da Justiça. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Curitiba, data de inserção da assinatura no Sistema. CRISTINE LOPES Juíza de Direito
Conteúdo completo bloqueado
Desbloquear