Ministério Público Do Estado Do Paraná x Joel Dos Reis
ID: 319627100
Tribunal: TJPR
Órgão: 3ª Vara Criminal de Cascavel
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Nº Processo: 0049705-19.2019.8.16.0021
Data de Disponibilização:
08/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
REGIANE GARCIA DE SOUZA
OAB/MS XXXXXX
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AÇÃO PENAL Nº 0049705-19.2019.8.16.0021 SENTENÇA I. RELATÓRIO: Trata-se de ação penal proposta pelo Ministério Público do Estado do Paraná em face de JOEL DOS REIS, já qualificado nos autos, como inc…
AÇÃO PENAL Nº 0049705-19.2019.8.16.0021 SENTENÇA I. RELATÓRIO: Trata-se de ação penal proposta pelo Ministério Público do Estado do Paraná em face de JOEL DOS REIS, já qualificado nos autos, como incurso nas sanções do artigo 155, caput (FATOS 01, 02 e 03) e artigo 155, caput, c/c artigo 14, inciso II (FATO 04), em continuidade delitiva, na forma do artigo 71, todos do Código Penal, pela prática, em tese, dos seguintes fatos narrados na denúncia (mov. 31): “ FATO 01 No dia 21 de novembro de 2019, em horário não preciso nos autos, mas certo que antes das 15h00min, no estabelecimento comercial denominado “Casa do Colono”, localizado na Rua Duque de Caxias, nº 650, bairro Centro, neste Município e Comarca de Cascavel/PR, Comarca de Cascavel/PR, o denunciado JOEL DOS REIS, com consciência e vontade, ciente da ilicitude e reprovabilidade de sua conduta, subtraiu, para si, coisa alheia móvel consistente em 09 (nove) ursos de pelúcias, avaliados em R$ 266,00 (duzentos e sessenta e seis reais), de propriedade do estabelecimento vítima “Casa do Colono” representado pela proprietária Elisabete Scapini Coutinho, (cf. auto de exibição e apreensão mov. 1.5, auto de entrega mov. 1.7, boletim de ocorrência mov. 1.15 e auto de avaliação de mov. 25.1). FATO 02 No dia 21 de novembro de 2019, em horário não preciso nos autos, mas certo que antes das 15h00min, no estabelecimento comercial denominado “Loja Barato Mania”, localizado na Rua Rio Grande do Sul, nº 1031, bairro Centro, neste Município e Comarca de Cascavel/PR, Comarca de Cascavel/PR, o denunciado JOEL DOS REIS, com consciência e vontade, ciente da ilicitude e reprovabilidade de sua conduta, subtraiu, para si, coisa alheia móvel consistente em 03 (três) pares de chinelos, avaliados em R$ 36, 0 0 (trinta e seis reais) cada, de propriedade do estabelecimento vítima “ Loja Barato Mania ” representado pela proprietária Marli Rodrigues Figueiredo (cf. auto de exibição e apreensão mov. 1.5, termo de declaração da proprietária de mov. 1.10, boletim de ocorrência mov. 1.15 e auto de avaliação de mov. 25.1). FATO 03 No dia 21 de novembro de 2019, em horário não preciso nos autos, mas certo que antes das 15h00min, no estabelecimento comercial denominado “Loja Bela Modas”, localizado na Rua Rio Grande do Sul, nº 918, bairro Centro, neste Município e Comarca de Cascavel/PR, Comarca de Cascavel/PR, o denunciado JOEL DOS REIS, com consciência e vontade, ciente da ilicitude e reprovabilidade de sua conduta, subtraiu, para si, coisa alheia móvel consistente em 03 (três) shorts, avaliados em R$ 50,00 (cinquenta reais) cada, de propriedade do estabelecimento vítima “ Loja Bela Modas ”representado pela proprietária Maristela da Silva Apolinario (cf. auto de exibição e apreensão mov. 1.5, auto de entrega mov. 1.17, boletim de ocorrência mov. 1.15 e auto de avaliação de mov. 25.1). FATO 04No dia 21 de novembro de 2019, por volta das 15h00min, no estabelecimento comercial denominado “Loja Stangeri”, localizado na Rua Rio Grande do Sul, nº 764, bairro Centro, neste Município e Comarca de Cascavel/PR, Comarca de Cascavel/PR, o denunciado JOEL DOS REIS, com consciência e vontade, ciente da ilicitude e reprovabilidade de sua conduta, tentou subtraiu, para si, coisa alheia móvel consistente em 09 (nove) peças de roupas infantis, 08 (oito) maiôs e 01 (um) biquíni, todos avaliados em R$ 651,00 (seiscentos e cinquenta e um reais), de propriedade do estabelecimento vítima “ Loja Stangeri ” representado pelo proprietário Emiliano Kupicki , ato que apenas não se consumou por circunstância alheia à sua vontade, eis que próximo à saída do estabelecimento, foi abordado pelo proprietário da loja, que o deteve e conseguiu reaver os bens. (cf. auto de exibição e apreensão mov. 1.5, auto de entrega mov. 1.9, boletim de ocorrência mov. 1.15 e auto de avaliação de mov. 25.1). Conforme consta, o denunciado entrou na loja “Stangeri” com uma sacola nas mãos, momento em que Emiliano Kupicki avistou o denunciado colocar várias peças de roupas na sacola e de pronto, ainda no interior do estabelecimento, realizou a sua abordagem/contenção e acionou a Polícia Militar. Ato contínuo, com a chegada da equipe policial, verificou-se que o denunciado estava na posse de outros produtos e não possuía nenhuma nota fiscal de compra. Foi possível identificar que os produtos pertenciam a 3 (três) lojas que haviam sido anteriormente furtadas pelo denunciado, sendo que os responsáveis compareceram à Delegacia de polícia e reconheceram os produtos, que após apreendidos e avaliados, foram restituídos a quem de direito.” O acusado foi preso em flagrante delito no dia 21 de novembro de 2019 (mov. 1.2) e lhe foi concedida a liberdade provisória no dia seguinte (mov. 11.1). Recebida a denúncia (mov. 34), o réu foi pessoalmente citado (mov. 52) e apresentou resposta à acusação por intermédio de defensor nomeado (mov. 88). Não sendo o caso de absolvição sumária, seguiu-se à instrução processual (mov. 91). No ato designado, foi decretada a revelia do réu, foram ouvidas três vítimas e duas testemunhas e foram apresentadas alegações orais pelo Ministério Público (mov. 248). O Ministério Público pugnou pela procedência da denúncia, com a condenação em relação ao fato 04 na forma consumada, o reconhecimento da continuidade delitiva, com o agravamento em seu patamar máximo e a decretação da prisão preventiva. A Defesa, em alegações finais por memoriais apresentadas pela Defensoria Pública, requereu a absolvição do réu por insuficiência de provas quanto aos fatos 01, 02 e 03; a absolvição por atipicidade de conduta com a aplicação do princípio da insignificância para todos os fatos; a absolvição por crime impossível quanto ao fato 04 e, subsidiariamente, o reconhecimento da tentativa; a aplicação da fração mínima de aumento pela continuidade delitiva e o estabelecimento do regime inicial de cumprimento diverso do fechado (mov. 255). Vieram os autos conclusos. É, no essencial, o relatório. Decido.II. FUNDAMENTAÇÃO: Na análise minuciosa dos autos, verifico presentes os pressupostos processuais e as condições da ação penal. Ademais, não se vislumbra a ocorrência de prescrição da pretensão punitiva sobre o delito imputado na denúncia ou nulidade absoluta, nem qualquer outra que pudesse resultar prejuízo às partes. O feito tramitou de forma regular, restando preservadas as garantias e os direitos do acusado. Desse modo, prossigo à análise do cerne da lide penal. Primeiramente, restou demonstrada de forma satisfatória a materialidade dos crimes descritos na denúncia, imputados ao réu. Dos elementos de prova pertinentes à fase indiciária, destaco o auto de prisão em flagrante (mov. 1.2), o boletim de ocorrência (mov. 1.15), o auto de exibição e apreensão (mov. 1.5), os autos de entrega (mov. 1.7, 1.9, e 1.17) o auto de avaliação indireta (mov. 25) e os autos de reconhecimento fotográfico (mov. 30.4 e mov. 30.5). Esses elementos, juntamente com os depoimentos prestados na Delegacia de Polícia, serviram de base ao oferecimento da denúncia, tratando-se a formação da opinio delicti de verdadeiro filtro inicial do processo penal. Além disso, a prova oral colhida em juízo, que será detalhadamente analisada adiante, mostra-se no mesmo sentido dos documentos já apontados. A partir da análise do conjunto probatório é possível confirmar a existência do delito de forma cabal, bem como afirmar a autoria delitiva quanto ao réu, a qual já se presume de forma relativa em razão do auto de prisão em flagrante do mov. 1.2, afinal, "A prisão em flagrante gera uma presunção relativa acerca da autoria do fato, incumbindo à defesa, a teor da regra do art. 156 do Código de Processo Penal, produzir as provas tendentes a demonstrar a sua inocência e a inverossimilhança da tese acusatória.” (TRF-4 - ACR: 50004033620184047005 PR 5000403-36.2018.4.04.7005, Relator: Revisora, Data de Julgamento: 27/08/2019, SÉTIMA TURMA). Essa presunção relativa de autoria se justifica porque o legislador, ao traçar as hipóteses flagranciais, exigiu a plausibilidade (ou certeza) em relação ao autor do fato. Além disso, o presente momento processual traz confiabilidade no auto de prisão em flagrante, considerando a análise judicial efetivada no movimento 11. Nesse sentido, de forma a ratificar a materialidade e autoria identificadas no caderno policial, resta analisar o teor da prova oral produzida sob o crivo do contraditório e da ampla defesa. A vítima ELISABETE SCAPINI COUTINHO contou que não viu o réu furtando seu estabelecimento, mas seu vizinho, dono da loja Stangerie, foi até seu comércio com uma sacola cheia de brinquedos de cachorro que pertenciam à depoente e questionou se eram seus. Imagina que o réu tenha furtado os itens de sua loja e chegado com a sacola de produtos no estabelecimento do seu vizinho. A loja Stangerie fica há duas quadras da sua. Nunca tinha visto o réu anteriormente. Ninguém o viu na loja.A vítima EMILIANO KUPICKI disse que viu o réu pegando objetos dos cabides, colocando dentro de uma sacola que não era da sua loja e saindo do local. Ao vê-lo saindo da loja com os produtos, o deteve e o questionou, pelo que o réu disse que estava os levando. Ligou para a delegacia e foram identificadas as empresas donas dos demais produtos furtados pelo réu. Conteve o acusado até a chegada da polícia. Constatou odor etílico no réu. Todos os itens furtados de sua loja foram recuperados. A vítima MARLI RODRIGUES FIGUEIREDO GARCIA disse não lembrar de muitos detalhes do ocorrido. Foi até a delegacia onde reconheceu os itens da loja, mas não viu o réu. Lembra vagamente da fisionomia do réu, quem o viu melhor foram as demais funcionárias. Assim que o réu furtou os itens, foi chamada pelas demais funcionárias e chamaram a polícia. Os itens foram recuperados. A policial militar KAMILA CRISTINA DA SILVA narrou que receberam a notícia do furto na loja Stangerie. No local, foram constatados os produtos da loja e de demais locais. Outra pessoa chegou ao local e informou que havia sido furtada pelo réu. Identificaram os comércios onde o réu cometeu os furtos e os funcionários puderam confirmar que os itens de fato pertenciam aos respectivos estabelecimentos. As atendentes de uma loja narraram tê-lo visto. Não consegue lembrar quem eram as vítimas de cada comércio. Não identificou nenhum comportamento anormal do réu ou sinais do consumo de drogas ou bebidas por ele. O policial militar FÁBIO RODRIGO SCHÜTZ disse que a equipe foi acionada pelo proprietário da loja Stangerie, que visualizou um indivíduo cometendo furtos na loja e o segurou até a chegada da equipe. Na sacola que estava com o réu, identificaram vários itens do estabelecimento e de outros locais. Pelas etiquetas dos objetos, conseguiram identificar as outras lojas em que o réu cometeu furtos. Quanto ao depoimento prestado por policiais, “[...] inexiste qualquer impedimento à consideração do relato de agentes públicos que testemunham em Juízo, sob o crivo do contraditório, mormente quando eles acabam por revelar, antes de qualquer antagonismo ou incompatibilidade, absoluta coerência e harmonia com o restante do material probatório.” (TJPR - 4ª Câmara Criminal - 0010520-72.2018.8.16.0129 - Paranaguá - Rel.: DESEMBARGADOR CELSO JAIR MAINARDI - J. 12.12.2023). Assim, “o depoimento dos policiais prestado em juízo constitui meio de prova idôneo a respaldar a condenação, cabendo à defesa o ônus de demonstrar a imprestabilidade da prova, fato que não ocorreu na hipótese” (AgRg no HC 391.080/SC, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 01/06/2017, DJe 09/06/2017). O réu é revel e, na delegacia, JOEL DOS REIS limitou-se a indicar que havia bebido um litro de cachaça. Encerrada a instrução, entendo que a autoria delitiva é certa e recai sobre a pessoa do acusado. O réu foi preso logo após ter sido flagrado furtando a loja Stangerie, e portando consigo objetos furtados de três outros locais, dentre eles a loja Barato Mania, onde também foi visto pelas funcionárias do local. Em face disso, foi realizado reconhecimento fotográfico com Emiliano e Genina, proprietário da primeira loja e funcionária da segunda, que puderam identificar o réu (movimentos 30.4 e 30.5).Embora não tenha sido visualizado cometendo o crime nas lojas Casa do Colono e Bella Modas, portava itens dessas lojas na mesma sacola que utilizou para furtar os outros locais. Tais itens foram reconhecidos pelas vítimas como subtraídos do seu estoque, conforme os termos de depoimento de movimentos 1.6 e 1.16. Assim, é inegável que o réu tenha subtraído todos esses itens, o que chancela édito condenatório em seu desfavor. Na análise da tipicidade, é imprescindível pontuar que “Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel” caracteriza o crime de furto, definido no artigo 155, caput, do Código Penal. Assevero que “Com relação ao momento consumativo do crime de furto, nos mesmos moldes do crime de roubo, é assente a adoção da teoria da amotio por esta Corte e pelo Supremo Tribunal Federal, segundo a qual os referidos crimes patrimoniais consumam-se no momento da inversão da posse, tornando-se o agente efetivo possuidor da coisa, ainda que não seja de forma mansa e pacífica, sendo prescindível que o objeto subtraído saia da esfera de vigilância da vítima (HC n. 495.846/SP, Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, DJe 11/6/2019).” É dizer, basta a inversão da esfera jurídica em que o bem se encontra, deixando a da vítima e passando à do réu. Em todos os locais por que passou naquela tarde, o réu pegou itens das lojas e colocou em uma sacola que lhe pertencia, fugindo ou tentando fugir do local logo em seguida. No contexto do fato 04, alvo de pedido de reconhecimento da tentativa pela Defesa, a denúncia narra que o réu colocou os itens da loja em sua sacola e se dirigia para a saída quando foi abordado pelo proprietário, que o conteve até a chegada da polícia. Embora inicialmente o Ministério Público tenha denunciado Joel na forma tentada, em audiência postulou a aplicação da emendatio libelli para que seja condenado na forma consumada, o que se mostra cabível no presente caso, vez que a inversão da posse está descrita na denúncia e ocorreu no momento em que o réu colocou os itens em sua sacola, pouco importando que não tenha saído da esfera de vigilância da vítima ou que não tenha a possuído de forma pacífica, nos termos do entendimento descrito acima. Também quanto ao ocorrido na loja Stangerie, a Defesa sustenta a absolvição do acusado por entender que o proprietário da loja acompanhou toda a conduta delitiva, tornando o crime impossível, o que não merece acolhimento. Embora a vítima tenha acompanhado as ações do réu, fato é que o acusado conseguiu colocar os itens em sua sacola e até mesmo sair da loja, conforme é especificado pelo ofendido em ambos os seus depoimentos. Desse modo, uma vez que o crime foi consumado, é impossível falar em inadequação absoluta do meio. Além disso, mesmo se o entendimento não fosse pela consumação do crime, havendo plausibilidade na hipótese de o réu despistar a vítima ou esquivar-se da sua investida (a vítima o pegou pelo braço), como ocorre no presente caso, também restaria impedido o reconhecimento do meio empregado como absolutamente inapto a atingir a consumação do crime.Nesse exato sentido foi a análise realizada pelo ministro Ribeiro Dantas em processo similar, em que destacou: “ Com efeito, a vigilância e a observação do agente por empregado do estabelecimento não induzem, necessariamente, à configuração do crime impossível, pois é factível que o agente, por habilidade ou rapidez, burle o sistema ou despiste o funcionário e consiga empreender fuga do local, bem como pode ocorrer do próprio sistema vir a falhar por problemas técnicos, conforme a inteligência da Súmula 567 do STJ.” (REsp n. 2.140.831, Ministro Ribeiro Dantas, DJe de 13/06/2024.) Tal entendimento é consoante com o entendimento consolidado na Corte 1 . Por sua vez, o precedente destacado pela Defesa frisa que o entendimento aplicado aquele caso concreto “não conduz, automaticamente, à atipicidade de toda e qualquer subtração em estabelecimento comercial que tenha sido monitorada pelo corpo de seguranças ou pelo sistema de vigilância” e que “a conclusão pela atipicidade, tal como se deu na espécie, dependerá da análise individualizada das circunstâncias de cada caso concreto”. Além disso, a Defesa suscita tese de atipicidade material da conduta (princípio da insignificância), pela inexpressividade dos bens subtraídos pelo réu. Inicialmente, cumpre esclarecer que “(…) a aplicação do princípio da insignificância reflete o entendimento de que o Direito Penal deve intervir somente nos casos em que a conduta ocasionar lesão jurídica de certa gravidade, devendo ser reconhecida a atipicidade material de perturbações jurídicas mínimas ou leves, essas consideradas não só no seu sentido econômico, mas também em função do grau de afetação da ordem social que ocasionem.” 2 Nesse sentido, “(..) o princípio da insignificância baseia-se na necessidade de lesão jurídica expressiva para a incidência do Direito Penal, afastando a tipicidade do delito em certas hipóteses em que, apesar de típica a conduta, ausente dano juridicamente relevante.” É bem verdade, ainda, que “(…) além da subsunção formal da conduta humana a um tipo penal, deve haver uma aplicação seletiva, subsidiária e fragmentária do Direito Penal, para aferir se houve ofensividade relevante aos valores tidos como indispensáveis à ordem social.” 3 Notável, ainda, a partir do entendimento sedimentado em repercussão geral do Supremo Tribunal Federal 4 , que o referido princípio tem como vetores concomitantes: (I) 1 [...] 2. De acordo com o entendimento consolidado nesta Corte, o fato de a conduta dos acusados ter sido monitorada de forma contínua e ininterrupta por funcionários da empresa vítima não é suficiente, por si só, para tornar absolutamente ineficaz o meio empregado pelos agentes e impossível a consumação do crime de furto, não obstante a maior dificuldade apresentada diante dos sistemas de vigilância levados a efeito. [...] (AgRg nos EDcl no REsp 2103535 / SP, Rel. Ministro Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, julgado em 08/04/2024, DJe 11/04/2024.) 2 (AgRg no HC 449.192/MS, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 04/12/2018, DJe 04/02/2019) 3 (AgInt no HC 299.297/MS, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 19/05/2016, DJe 31/05/2016) 4 (…) O princípio da insignificância - que deve ser analisado em conexão com os postulados da fragmentariedade e da intervenção mínima do Estado em matéria penal - tem o sentido de excluir ou de afastar a própria tipicidade penal, examinada na perspectiva de seu caráter material. Doutrina. Tal postulado - que considera necessária, na aferição do relevo material da tipicidade penal, a presença de certos vetores, tais como (a) a mínima ofensividade da conduta do agente, (b) a nenhuma periculosidade social da ação, (c) o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e (d) a inexpressividade da lesão jurídica provocada - apoiou-se, em seu processo de formulação teórica, no reconhecimento de que o caráter subsidiário do sistema penal reclama e impõe, em função dos própriosmínima ofensividade da conduta do agente; (II) nenhuma periculosidade social da ação; (III) o reduzido grau de reprovabilidade do comportamento; (IV) inexpressividade da lesão jurídica provocada. Na hipótese dos autos, verifica-se que o réu, reincidente em crimes patrimoniais, furtou quatro locais diferentes, o que torna inequívoca a reprovabilidade da sua conduta, conforme entendimento jurisprudencial: “ AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. APRECIAÇÃO DO MÉRITO DO RECURSO ESPECIAL. REQUISITOS DE ADMISSIBILIDADE ULTRAPASSADOS. ESTELIONATO CONSUMADO E TENTADO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. CONTINUIDADE DELITIVA. NÃO APLICAÇÃO. AGRAVO DESPROVIDO. 1. Ao se julgar o mérito recursal, subentende-se terem sido ultrapassados os requisitos de admissibilidade do recurso especial. 2. Quando a empreitada criminosa se dá com o reconhecimento da ficção jurídica da continuidade delitiva, a jurisprudência deste Tribunal Superior é firme no sentido de que prática de delitos de furto em continuidade delitiva evidencia o maior grau de reprovabilidade da conduta do agente, sendo inviável a aplicação do princípio da insignificância (ut, HC 351.207/RS, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, Sexta Turma, DJe 1º/8/2016 3. Agravo regimental não provido. (AgRg no AREsp n. 964.688/MT, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 13/12/2016, DJe de 1/2/2017.)” Assim, não demonstrado o reduzidíssimo grau de reprovabilidade da conduta praticada, não há atipicidade material. No tocante ao elemento subjetivo do tipo penal, ainda que não se possa perscrutar o íntimo do acusado, depreende-se que o agir foi doloso, por todas as circunstâncias e provas que envolvem o feito, considerando que o elemento volitivo, pela difícil aferição, deve ser apreciado consoante a exteriorização de atos por parte do agente. Outrossim, verifico que não concorrem causas excludentes da antijuridicidade ou da culpabilidade em face da conduta do acusado. Ao contrário, o conjunto probatório traz elementos robustos que indicam potencial consciência da ilicitude e possibilidade de assumir conduta diversa, consoante o ordenamento jurídico e a imputabilidade, mostrando- se imperiosa a decisão condenatória. objetivos por ele visados, a intervenção mínima do Poder Público. O POSTULADO DA INSIGNIFICÂNCIA E A FUNÇÃO DO DIREITO PENAL: "DE MINIMIS, NON CURAT PRAETOR". - O sistema jurídico há de considerar a relevantíssima circunstância de que a privação da liberdade e a restrição de direitos do indivíduo somente se justificam quando estritamente necessárias à própria proteção das pessoas, da sociedade e de outros bens jurídicos que lhes sejam essenciais, notadamente naqueles casos em que os valores penalmente tutelados se exponham a dano, efetivo ou potencial, impregnado de significativa lesividade. O direito penal não se deve ocupar de condutas que produzam resultado, cujo desvalor - por não importar em lesão significativa a bens jurídicos relevantes - não represente, por isso mesmo, prejuízo importante, seja ao titular do bem jurídico tutelado, seja à integridade da própria ordem social. (HC 84412, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Segunda Turma, julgado em 19/10/2004, DJ 19-11-2004 PP-00037 EMENT VOL-02173-02 PP-00229 RT v. 94, n. 834, 2005, p. 477-481 RTJ VOL- 00192-03 PP-00963)Por fim, no tocante ao concurso de crimes, o réu cometeu mais de uma ação e praticou mais de uma vez o mesmo crime, nas mesmas condições de tempo, com decurso de apenas alguns minutos entre os fatos, lugar, em estabelecimentos com poucas quadras de distância entre si, e maneira de execução, com a invasão dos locais e subtração de itens sortidos. Desse modo, imperioso reconhecer a continuidade delitiva entre os fatos, na forma do artigo 71, do Código Penal, com a aplicação da pena mais gravosa, a aumentado de um sexto a dois terços. III. DISPOSITIVO: Face o exposto, julgo procedente o pedido contido na denúncia para o fim de CONDENAR o réu JOEL DOS REIS, já qualificado nos autos, pela prática dos crimes descritos no artigo 155, caput, do Código Penal, em quatro vezes, em continuidade delitiva, nos termos do artigo 71. A partir dos preceitos dos artigos 68 e 59 do Código Penal, passo à dosimetria da pena em relação a um dos fatos, uma vez que as penas atreladas a todos são idênticas. O tipo penal do artigo 155, caput, do Código Penal é punido com pena de reclusão de 01 (um) a 04 (quatro) anos e pagamento de multa. Estes são os limites da pena-base (e intermediária – súmula nº 231 do E. STJ). Das circunstâncias judiciais: Quanto aos antecedentes, de acordo com a certidão acostada ao movimento 180, tem-se que o réu possuía três condenações com trânsito em julgado dentro do período depurador na época dos fatos, nos autos 0022182-92.2015.8.16.0014, 0072499- 94.2015.8.16.0014 e 0066354-51.2017.8.16.0014. Assim, utilizo a mais antiga para configurar os maus antecedentes. Não existem elementos concretos nos autos para aferir a conduta social e personalidade do réu. A culpabilidade, as circunstâncias e a motivação do crime não merecem valoração negativa, por se mostrarem comuns à espécie em análise. As consequências do crime também são comuns ao delito. Não há que se falar em comportamento da vítima que reflita na fixação da pena base. Diante do norte estabelecido no artigo 59 do Código Penal, havendo a valoração desfavorável de uma circunstância judicial, aumento a pena à fração de 1/8 5 sobre o 5 “Com relação ao quanto de aumento, cumpre ressaltar que, diante do silêncio do legislador, a jurisprudência passou a reconhecer como critério ideal para individualização da pena na primeira etapa do procedimento dosimétrico o aumento na fração de 1/8 a cada circunstância judicial negativamente valorada, sendo facultado ao julgador, desde que mediante fundamentação idônea, estabelecer quantum superior. A fração de 1/8 deve incidir sobre o intervalo entre as penas mínima e máxima cominadas ao delito” (HC 518.900/MS, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 23/06/2020, DJe 26/06/2020)intervalo mínimo/máximo, de modo que fixo a pena-base em 01 (um) ano, 04 (quatro) meses e 15 (quinze) dias de reclusão, com o equivalente a 22 (vinte e dois) dias-multa. Das atenuantes e agravantes: Na segunda fase, não há atenuantes e nota-se a multirreincidência do acusado. Neste panorama, agravo a pena na fração de 1/6, fixando a pena intermediária em 01 (um) ano, 07 (sete) meses e 7 (sete) dias de reclusão, com o equivalente a 30 (trinta) dias- multa. Das causas de aumento e diminuição da pena: Não se constata a presença de causas de aumento ou diminuição da pena. Sendo assim, torno definitiva a pena em 01 (um) ano, 07 (sete) meses e 7 (sete) dias de reclusão, com o equivalente a 30 (trinta) dias-multa. Da continuidade delitiva Conforme exposto, o réu cometeu os crimes na forma do artigo 71, do Código Penal. Neste enfoque, o verbete sumular n. 659 do STJ dispõe que “A fração de aumento em razão da prática de crime continuado deve ser fixada de acordo com o número de delitos cometidos, aplicando-se 1/6 pela prática de duas infrações, 1/5 para três, 1/4 para quatro, 1 /3 para cinco, 1/2 para seis e 2/3 para sete ou mais infrações.” Considerando que o réu praticou quatro infrações idênticas, aplico a pena de uma, cuja dosimetria expus, com acréscimo de 1/4, de modo que fixo a PENA FINAL para os delitos em comento em 02 (dois) anos de reclusão com 43 (quarenta e três) dias- multa. Ademais, fixo o valor unitário dos dias-multa no mínimo legal de 1/30 do valor do salário mínimo vigente à época dos fatos, tendo em vista a ausência de dados concretos, ou que sequer permitam presunção, acerca das condições econômico-financeiras do réu, critérios estipulados para essa etapa, de acordo com os artigos 49, § 1º, e 60, ambos do Código Penal. Da execução da pena. Em que pese o quantum de pena aplicado, reputo inaplicável a súmula 269 do STJ, tendo em vista que foi sopesada negativamente circunstância judicial relacionadas com os antecedentes criminais do acusado e pela reiteração delitiva em total desrespeito à con fiança que lhe foi concedida em várias oportunidades pelo Poder Público, o que é aliado ainda à multirreincidência do réu, que se operou em virtude de crimes patrimoniais, de sorte que, na forma do a rtigo 33, §2º e §3° do Código Penal, fixo o regime FECHAD O para o início do cumprimento da pena.Nesse sentido, inclusive, caminha a jurisprudência, confira - se: “ A reincidência e os antecedentes criminais justificam a fixação do regime fechado para o início do cumprimento da pena, ainda que o quantum de reprimen da seja inferior a quatro anos .” (AgRg no AREsp n. 2.400.779/SP, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 5/12/2023, DJe de 11/12/2023) Nada obstante, em razão da reincidência operada em crime patrim onial reputo incabíveis as benesses da s ubstituição de pena privativa de liberdade por restritivas de direitos e de suspensão condicional da pena, regradas pelos artigos 44 e 77 do Código Penal. O sentenciado respondeu ao processo em liberdade e pela inalteração dos elementos considerados na decisão de movimento 11 , concedo - lhe o direito de recorrer na mesma condição. Sabe-se que "a fixação de valor mínimo para reparação dos danos materiais causados pela infração exige, além de pedido expresso na inicial, a indicação de valor e instrução probatória específica, de modo a possibilitar ao réu o direito de defesa com a comprovação de inexistência de prejuízo a ser reparado ou a indicação de quantum diverso" (AgRg no REsp 1.724.625/RS, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 21/06/2018, DJe de 28/06/2018). No caso em tela, não há pedido pelo Ministério Público, o réu não obteve sucesso em subtrair qualquer item e as vítimas não sofreram prejuízos. Assim, impossível a fixação do valor indenizatório mínimo. DISPOSIÇÕES FINAIS: a) Condeno o réu ao pagamento das custas processuais, conforme artigo 804 do Código de Processo Penal. b) Fixo honorários advocatícios no valor de R$ 450,00 para a Dra. BIANCA CRISTINA PEREIRA KAIZER (OAB/PR 115.223), nomeada para patrocinar a defesa do réu na audiência de instrução, conforme prevê o Anexo I, da Resolução Conjunta nº 06/2024 – PGE/SEFA, tendo em conta o zelo do ato desempenhado. A presente sentença tem força de certidão de honorários, ficando a Secretaria dispensada de expedi-la. Após o trânsito em julgado: a) Expeça-se guia de recolhimento definitiva, encaminhando uma via para o juízo de execução penal competente, conforme Código de Normas. b) Comuniquem-se os órgãos de identificação, o Cartório Distribuidor, a Delegacia de Polícia e o Tribunal Regional Eleitoral. c) Encaminhem-se os autos à contadoria judicial para o cálculo das custas processuais e da pena de multa (se houver). A pena de multa deverá ser recolhida dentro em 10 dias, a contar do trânsito em julgado desta decisão (artigo 50 do Código Penal). Intime-se o réu para efetuar o pagamento voluntário da multa. Decorrido o prazo sem o pagamento, inscreva-se o valor em dívida ativa junto ao FUPEN, órgão responsável pela execução da pena de multa penal (artigo 51 do Código Penal). Não havendo requerimento de execução da pena de multa, pelo Ministério Público, arquivem-se os autos. O réu também deverá ser intimadopara recolher as custas processuais, no mesmo prazo. Decorrido o prazo sem o pagamento, proceda-se ao protesto das custas. d) Comuniquem-se as vítimas por qualquer meio idôneo da presente sentença condenatória (art. 201, §§2° e 3°, do Código de Processo Penal). Após certificada a existência de execução da pena junto ao juízo de execução penal competente, arquivem-se os presentes autos. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Cascavel, datado eletronicamente (9) RAQUEL FRATANTONIO PERINI Juíza de Direito
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