Ministério Público Do Estado Do Paraná x Edinilson Ferreira Orias
ID: 315395945
Tribunal: TJPR
Órgão: Vara Criminal de Chopinzinho
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Nº Processo: 0002207-72.2022.8.16.0068
Data de Disponibilização:
03/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
FERNANDA HUMENIUK BERLATTO
OAB/PR XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ COMARCA DE CHOPINZINHO VARA CRIMINAL DE CHOPINZINHO - PROJUDI Rua Antônio Vicente Duarte, 4000 - Centro - Chopinzinho/PR - CEP: 85.560-000 - Fone: (46) 3905-6171 …
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ COMARCA DE CHOPINZINHO VARA CRIMINAL DE CHOPINZINHO - PROJUDI Rua Antônio Vicente Duarte, 4000 - Centro - Chopinzinho/PR - CEP: 85.560-000 - Fone: (46) 3905-6171 - Celular: (46) 99933-6518 - E-mail: CHO-2VJ-E@tjpr.jus.br Processo: 0002207-72.2022.8.16.0068 Classe Processual: Ação Penal - Procedimento Ordinário Assunto Principal: Furto Qualificado Data da Infração: 21/09/2022 Autor(s): MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ Vítima(s): LUIZ PASQUALI Réu(s): EDINILSON FERREIRA ORIAS SENTENÇA I. RELATÓRIO Trata-se de ação penal pública movida pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ em face de EDINILSON FERREIRA ORIAS, imputando-lhe a prática, em tese, do crime previsto no art. 155, §1° e §4°, inciso I c/c art. 14, inciso II, ambos do Código Penal. Consta na denúncia que: “No dia 21 de setembro de 2022, por volta das 21h40min, durante o repouso noturno, no estabelecimento empresarial denominado ‘Instituto de Desenvolvimento Rural (EMATER) localizado na Rua Quatorze de Dezembro, nº 4965, Centro, neste município e comarca de Chopinzinho/PR, o denunciado EDINILSON FERREIRA ORIAS, com consciência e vontade, ciente da ilicitude e reprovabilidade de sua conduta, tentou subtrair, para si, coisa alheia móvel, na medida em que arrombou uma grade de proteção e o vidro da janela pertencente a EMATER, somente não logrando êxito em consumar o delito, por circunstâncias alheias à sua vontade, uma vez que foi flagrado pela Polícia Militar (cf. Boletim de Ocorrência de mov. 1.2 e imagens da câmera de monitoramento de movs. 11.5/10). Consta dos autos que a equipe da Polícia Militar foi acionada pelo fato de que um indivíduo teria ouvido barulhos de batidas no estabelecimento EMATER. Em sequência, o denunciado foi visualizado pelos militares, momento em que aquele empreendeu fuga, mas foi abordado próximo ao local. Nesta oportunidade, restou apurado que o indivíduo abordado seria o mesmo daquele visto dentro da empresa EMATER, bem como ocorreu a conferência pode meio das imagens de monitoramento. Por fim, extrai-se do presente caderno investigativo que o prejuízo ocasionado à vítima perfaz o valor de R$ 280,00 (duzentos e oitenta reais), pelo conserto na janela danificada pelo denunciado (mov. 11.2, 12.1/2).” A denúncia foi oferecida no dia 16 de maio de 2023 (mov. 17.1), sendo devidamente recebida no dia 17 de julho de 2023 (mov. 26.1). Citado, o acusado apresentou resposta à acusação (mov. 45.1). Ausentes as hipóteses de absolvição sumária, previstas no art. 397 do Código de Processo Penal, designou-se audiência de instrução e julgamento (mov. 47.1). Em audiência de instrução e julgamento, ocorrida no dia 09 de junho de 2025, realizou-se a oitiva da vítima Luiz Pasquali (mov. 124.2), das testemunhas Francieli Eloisa Correia dos Santos (mov. 124.3) e Alexsandro Bertan (mov. 124.4) e, ao final, procedeu-se o interrogatório do réu (mov. 124.5). Encerrada a instrução processual, o Ministério Público postulou em sede de alegações finais pela condenação do réu nos termos da denúncia (mov. 129.1). A defesa, ao revés, pugnou em derradeiras alegações finais pela absolvição do acusado ante a insuficiência probatória (mov. 133.1). Após, vieram-me conclusos. É o breve relato. DECIDO. II. FUNDAMENTAÇÃO Antes de adentrar ao mérito, constato que não há irregularidades e nulidades a serem sanadas ou decididas, sendo devidamente respeitado o contraditório e ampla defesa. Inicialmente, segundo o doutrinador Nélson Hungria, o conceito de patrimônio constitui: “complexo de bens ou interesses de valor econômico em relação de pertinência com uma pessoa. Consequentemente, os crimes contra o patrimônio podem ser definidos como espécies de ilícito penal que ofendem ou expõem a perigo de lesão qualquer bem, interesse ou direito economicamente relevante, privado ou público”. O Código Penal brasileiro dispõe que se caracteriza como o crime de furto, previsto no art. 155, “Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel”. A visão sobre a conduta do autor Rogério Sanches Cunha[1] é: “A conduta punida no tipo em estudo é apoderar-se o agente, para si ou para outrem, de coisa alheia móvel, tirando-a de quem detém (diminui-se o patrimônio da vítima). O apoderamento pode ser direto (apreensão manual) ou indireto (valendo-se de interposta pessoa ou até animais). Da análise do tipo em estudo, fica claro que o objeto material do crime deve ser coisa alheia móvel, economicamente apreciável. O interesse apenas moral ou sentimental da coisa, desde que relevantes, segundo alguns, também configura o crime, pois não deixa de integrar o patrimônio de alguém”. No que diz respeito à consumação do delito, o Superior Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Federal adotam a corrente amotio ou apprehensio. De acordo com o posicionamento das correntes mencionadas, a consumação ocorre quando a res furtiva passa para o poder do agente, independente de deslocamento ou posse mansa e pacífica. Sanches assevera que “já se decidiu consumado o delito no momento em que o proprietário perde, no todo ou em parte, a possibilidade de contato material com a res ou de exercício da custódia dominical, seja porque o agente logrou bem sucedida fuga, seja porque destruiu a coisa apoderada.” Se o crime for cometido durante o repouso noturno, índice a causa de aumento de 1/3, conforme previsto no §1º, do art. 155. E o que se entende por repouso noturno? “Em síntese, o critério para definir repouso noturno é variável, não se identificando com a noite, mas sim com o tempo em que a cidade ou local costumeiramente recolhe-se para o repouso diário”.[2] E sendo o crime cometido mediante a “destruição ou rompimento de obstáculo à subtração da coisa”, a pena passa a ser de 02 a 08 anos de reclusão, além de multa. Sem mais delongas, passa-se à análise minuciosa dos depoimentos colhidos na fase de instrução: Luiz Pasquali – Vítima (mov. 124.2): Que é engenheiro agrônomo do IDR Paraná, na cidade de Chopinzinho; Que na data de 21/09/2022 estava em casa e, por volta das 20h30min, recebeu uma ligação de um número estranho e não atendeu, já na segunda vez atendeu a ligação de um policial informando que a sede do IDR havia sido arrombada e pedindo se ele poderia ir até lá; Que se deslocou até o local e encontrou os policiais já na área interna do IDR, tendo verificado que uma das janelas de vidro havia sido quebrada, bem como uma grade da cozinha estava arrebentada; Que no interior da sede havia gavetas abertas e papéis espalhados pelo chão, mas nenhum bem de valor foi subtraído; Que com o auxílio de um colega improvisou um isolamento com madeira, a fim de proteger os equipamentos como computadores; Que os policiais saíram em busca do autor do crime; Que posteriormente foi até a unidade da Polícia Militar para registrar o boletim de ocorrência por volta das 22h; Que enquanto aguardava, foi informado pelo atendente que o suspeito havia fugido da sala onde estava detido, após conseguir retirar as algemas; Que não sabe como a polícia chegou; Que o autor ficou pouco tempo na sala, pois abriu gavetas e jogou papeis, porém não pegou nada; Que ele só quebrou a grade e o vidro onde ele entrou; que acredita que os policiais deveriam estar passando como coincidência e visualizado ele entrando, momento em que o autor viu a polícia e pulou a cerca; Que o prejuízo referente ao dano foi de R$ 280,00 (duzentos e oitenta reais), valor este já orçado e reparado com a substituição do vidro e da grade danificada. Francieli Eloisa Correia dos Santos – Testemunha (mov. 124.3): Que é policial militar e atendeu a ocorrência na Emater/ IDR em Chopinzinho, na noite de 21 de setembro de 2022; Que ao chegar ao local, visualizou a perna de um indivíduo dentro do pátio da empresa, que ao perceber a presença policial, empreendeu fuga para o terreno da empresa vizinha (Lubrifil); Que a equipe realizou diligências a pé, conseguindo abordar o suspeito Ednilson Ferreira Orias, com quem não foi encontrado nenhum objeto ilícito; Que o solicitante Alexandro Bertan apresentou imagens de câmeras de segurança que confirmavam a identidade do abordado; Que diante disso, Ednilson foi algemado e conduzido ao pelotão da PM em Chopinzinho, onde acabou fugindo pela janela da sala onde estava retido; Que foram feitas buscas, mas ele não foi localizado; Que segundo relato do representante da Emater, Sr. Luiz Pasquali, houve danos no imóvel, como uma janela quebrada e grade danificada, embora nada tenha sido subtraído; Que já conhecia Ednilson de outras ocorrências por furto; Que confirmou ter visualizado os danos causados à sede da Emater. Alexsandro Bertan – Testemunha (mov. 124.4): Que é empresário, residente vizinho à sede da Emater/IDR no município de Chopinzinho; Que foi ele quem chamou a polícia no dia do ocorrido e disponibilizou as filmagens das câmeras de segurança de sua residência; Que depois do ocorrido visualizou os danos, verificando que estava tudo bagunçado e quebrado; Que na data dos fatos, por volta das 22h00min ou 23h00min, escutou barulhos suspeitos e ao verificar pela janela de sua residência, visualizou um indivíduo tentando abrir uma das janelas do prédio da Emater; Que diante disso, acionou imediatamente a Polícia Militar, tendo inclusive ligado duas vezes em razão da demora no atendimento; Que não se recorda de portas; Que a polícia demorou em torno de 15 a 20 min para vir. Edinilson Ferreira Orias – Réu (mov. 124.5): Que estava sob efeito de entorpecentes no dia dos fatos e, por isso, lembra-se pouco da situação; Que confirma ter entrado no pátio da Emater em Chopinzinho na noite de 21 de setembro de 2022, mas com o objetivo de usar drogas, e não de furtar; Que usava crack naquele momento e procurava um local escuro para não ser visto; Que admite ter quebrado uma janela, mas nega qualquer intenção de subtrair objetos; Que afirmou que, caso quisesse, poderia ter furtado algo, pois já havia acesso, mas não levou nada; Que retomou a consciência apenas depois, já no batalhão da PM; Que não se recorda de ter mexido em gavetas dentro da Emater. Pois bem. a) Da emendatio libelli De plano, vislumbro que, da detida análise dos autos, é caso de emendatio libelli. Sobre o presente tema, “segundo o princípio da correlação entre denúncia e sentença, o réu se defende dos fatos e não da capitulação jurídica indicada na inicial acusatória. Assim, comprovando-se que a conduta descrita se subsume a tipo criminal diverso, caberá ao Juiz natural da causa, no momento da prolação da sentença e observando as provas colhidas, proceder à emendatio libelli, se for o caso, nos termos do art. 383 do Código de Processo Penal (AgRg no HC n. 507.006/SP, Relator Ministro RIBEIRO DANTAS, Quinta Turma, julgado em 25/8/2020, DJe 3/9/2020)”[3]. Nesse sentido, assim se manifestou o Supremo Tribunal Federal, em acórdão de relatoria do Ministro Edson Fachin: AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DISPARO DE ARMA DE FOGO (ART. 15 DA LEI 10.826/2003). EMENDATIO LIBELLI. PORTE DE ARMA DE FOGO (ART. 14. DA LEI 10.823/20030). POSSIBILIDADE. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. Nos termos do art. 383 do CPP, a emendatio libelli consiste na atribuição de definição jurídica diversa ao arcabouço fático descrito na inicial acusatória, ainda que isso implique agravamento da situação jurídica do réu, mantendo-se, contudo, intocada a correlação fática entre acusação e sentença, afinal, o réu defende-se dos fatos no processo penal. (...) plenamente possível ao Tribunal realizar emendatio libelli para a correta aplicação da hipótese de incidência, desde que dentro da matéria devolvida e não implique reformatio in pejus, caso haja recurso exclusivo da defesa. 3. Como verificado na descrição. (...) (STF - HC 221403, relator(a): Min. EDSON FACHIN. Julgamento: 02/10/2023, publicação: 04/10/2023). Na mesma perspectiva, o TJRN: Apelação Criminal nº 0801626-60.2024.8.20 .5300 Origem: Juízo da 8ª Vara Criminal da Comarca de Natal/RN. Apelante: Fabiano da Silva Felipe. Representante: Defensoria Pública. Apelado: Ministério Público . Relator.: Desembargador Glauber Rêgo. Ementa: DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. FURTO QUALIFICADO NA FORMA TENTADA . AUSÊNCIA DE ANIMUS FURANDI. EMENDATIO LIBELLI. DESCLASSIFICAÇÃO PARA O CRIME DE DANO. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO . I. CASO EM EXAME 1. Recurso de Apelação Criminal interposto em desfavor de sentença condenatória proferida pelo Juízo da 8ª Vara Criminal da Comarca de Natal/RN, que condenou o réu pelo crime de furto qualificado tentado (art. 155, §§ 1º e 4º, I c/c art . 14, II, parágrafo único, do Código Penal), à pena de 2 anos, 1 mês e 12 dias de reclusão, em regime inicial aberto. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. A questão em discussão consiste em verificar se houve dolo específico para a prática do crime de furto qualificado tentado ou se a conduta do réu deve ser desclassificada para outro tipo penal . III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A individualização dos bens supostamente subtraídos não foi demonstrada nos autos, inexistindo prova inequívoca do animus furandi. 4 . O próprio réu, tanto na fase policial quanto em juízo, negou a intenção de furtar, afirmando que adentrou na agência bancária para se proteger de terceiros que o perseguiam. 5. O depoimento de testemunha corroborou parcialmente a versão do réu, indicando que populares estavam no entorno do banco no momento da invasão, reforçando a tese de que o acusado buscava refúgio. 6 . Diante da ausência do elemento subjetivo do crime de furto, impõe-se a reclassificação da conduta para o crime de dano simples (art. 163, caput, do Código Penal), diante da destruição de bens no interior da agência bancária. 7. A emendatio libelli pode ser aplicada, pois não houve inovação fática, sendo desnecessário o aditamento da denúncia pelo Ministério Público, uma vez que o réu se defende dos fatos imputados, e não da sua qualificação jurídica . IV. DISPOSITIVO E TESE 8. Recurso conhecido e parcialmente provido. Tese de julgamento: 1 . A ausência de prova do animus furandi impede a condenação por furto qualificado tentado; 2. A destruição de bens pertencentes à agência bancária caracteriza o crime de dano simples (art. 163, caput, do Código Penal). Dispositivos relevantes citados: Código Penal, arts . 155, §§ 1º e 4º, I; 14, II, parágrafo único; 163, caput; e 150. (TJ-RN - APELAÇÃO CRIMINAL: 08016266020248205300, Relator: GLAUBER ANTONIO NUNES REGO, Data de Julgamento: 10/03/2025, Câmara Criminal, Data de Publicação: 11/03/2025) A exposição fática espelhada na denúncia, inobstante a tipificação entendida pelo Ministério Público ser caso de tentativa de furto qualificado, se amolda ao delito de dano qualificado, em especial, pela ausência de animus furandi. O animus Furandi nada mais é que o dolo de furtar, ou seja, a intenção de subtrair para si ou outrem coisa alheia móvel, com o ânimo de assenhoramento definitivo. Contudo, o acusado nega qualquer intenção de subtrair bens da vítima, afirmando que estava sob efeito de entorpecentes e que procurava apenas um local escuro para uso de drogas, o que é coerente com a ausência de subtração de objetos, mesmo tendo tido acesso ao interior do prédio e tempo hábil para furtar. A testemunha Alexsandro, vizinho da EMATER, afirmou que visualizou o acusado adentrando a propriedade da vítima através da janela, porém não verificou qualquer conduta do acusado visando subtrair algum bem do local, bem como afirmou que a polícia levou cerca de 20 min para chegar. Além disso, nenhum objeto foi encontrado em sua posse, tampouco houve apreensão de bens subtraídos. A acusação, ao narrar os fatos da denúncia, se limitou em apresentar que o acusado “tentou subtrair, para si, coisa alheia móvel”, sem, contudo, especificar qual bem o réu tentou subtrair, o que corrobora com a tese defensiva de que inexistia animus furandi em sua conduta. A abertura de gavetas e revirar papéis, ainda que tenha ocorrido, não comprova, de forma inequívoca, a intenção de furtar, podendo ter diversas explicações, principalmente diante da confissão do réu em estar sob uso de entorpecentes (crack). Assim, conduta praticada pelo réu se limitou à quebra de uma janela e de uma grade, o que figura como crime de dano qualificado (art. 163, inciso III, do CP), uma vez que a vítima é uma empresa pública. Portanto, opera-se o instituto da emendatio libelli, prevista no art. 383 do CPP, alterando a tipificação do crime de furto qualificado tentado para o crime de dano qualificado consumado. b) Do crime de dano qualificado O crime de dano está previsto no art. 163 do Código Penal, ao dispor que àquele que “destruir, inutilizar ou deteriorar coisa alheia” estará sujeito à pena de um a seis meses de detenção, ou multa. O referido crime possui três verbos nucleares, o que o torna um delito de ação múltipla. Para ser mais específico, aqui há a tutela do patrimônio que, eventualmente, venha a ser alvo de danos. Especificamente neste crime, o agente pratica a conduta com o intuito de causar dano físico ao patrimônio da vítima. Nas palavras de Rogério Sanches Cunha, ao lecionar sobre o ilícito em debate: “O crime de dano pode ocorrer na forma comissiva (mais comum) e omissiva, como no caso do agente encarregado de zelar pela integridade de certo bem móvel, mas que se abstém, dolosamente, de sua obrigação, permitindo que a coisa seja atingida por destruição, inutilização ou deterioração. (...) Consuma-se com a prática do dano ofensivo, seja total ou parcialmente. Não há delito de dano quando a coisa não fica prejudicada em sua utilidade, ou em seu valor, sendo indiferente, para a caracterização do delito, o proveito que o agente porventura dele retire (RF 115/572).[1]” O inciso III do parágrafo único do referido artigo, por sua vez, traz uma modalidade qualificada, na qual a pena é de detenção, de seis meses a três anos, e multa para àquele que praticar o delito “contra o patrimônio da União, de Estado, do Distrito Federal, de Município ou de autarquia, fundação pública, empresa pública, sociedade de economia mista ou empresa concessionária de serviços públicos”. Pois bem. A materialidade está evidenciada por meio do boletim de ocorrência (mov. 1.2), fotografias (mov. 11.4), imagens de câmeras de segurança (mov. 11.5/11.10), auto de avaliação (mov. 12.2), depoimentos colhidos na fase de instrução e policial, bem como os demais elementos probatórios constantes nos autos. Outrossim, a autoria é certa e recai sobre a pessoa do réu. Da análise do conjunto probatório, a conduta do réu se amolda perfeitamente ao tipo penal de dano qualificado, pois o requerido quebrou a janela e arrombou a grade de proteção, ocasionando os danos descritos no auto de avaliação, sendo necessária a realização de reparos. Destaco que as palavras dos policiais possuem relevante valor probatório, não apenas por gozarem da presunção de veracidade e fé pública, mas também por mostrarem depoimentos coerentes e harmônicos com as demais provas carreadas aos autos, afastando contradições ou dúvidas envolvendo os fatos. Assim sendo, oportuno colacionar a jurisprudência do TJPR: APELAÇÃO CRIMINAL. DANO QUALIFICADO (ART. 163, P.Ú, INC . III, DO CP). SENTENÇA ABSOLUTÓRIA. RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. PRETENSÃO DE CONDENAÇÃO DOS RÉUS . ACOLHIMENTO. AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. CRIME COMETIDO NA MODALIDADE QUALIFICADA CONTRA O PATRIMÔNIO PÚBLICO . LESÃO A BEM JURÍDICO DE RELEVANTE VALOR SOCIAL. CONDENAÇÃO QUE SE IMPÕE. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO, COM ARBITRAMENTO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. (TJ-PR 00034134220208160117 Medianeira, Relator.: Mario Nini Azzolini, Data de Julgamento: 02/02/2025, 3ª Câmara Criminal, Data de Publicação: 05/02/2025) direito penal e processual penal – apelação criminal – dano qualificado (art. 163, parágrafo único, inciso iii, do cp)– sentença condenatória – insurgência defensiva – pretensão absolutória – descabimento – réu que atuou com o propósito de danificar bem público municipal – servidor público que presenciou o ato e identificou o réu – prova produzida corroborada pelos depoimentos dos policiais militares que atenderam a ocorrência – pleito desclassificatório para a forma simples do dano – inviabilidade - carro de som devidamente identificado com o brasão da prefeitura – PEDIDO DE FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS ao advogado dativo PELA OFERTA do apelo – CABIMENTO - FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS CONFORME A TABELA Nº 015/2019 PGE/SEFA – recurso conhecido e desprovido. (TJPR - 5ª Câmara Criminal - 0000246-86.2021.8.16.0115 - Matelândia - Rel.: JUIZ DE DIREITO SUBSTITUTO EM SEGUNDO GRAU HUMBERTO GONCALVES BRITO - J. 18.02.2023) As imagens constantes nos autos, aliado aos depoimentos colhidos na fase instrutória e policial afastam quaisquer dúvidas, ainda mais em consonância com a confissão do réu. Ademais, veja-se que a defesa não apresentou quaisquer provas aptas a provocar dúvidas acerca dos fatos, ônus que, a propósito, lhe competia, o qual evidentemente não se desincumbiu, na forma do art. 156 do CPP. Com efeito, malgrado a defesa postule pela absolvição do réu, não há como o pleito absolutório prosperar, porquanto devidamente comprovada ocorrência do crime de dano qualificado. Frisa-se que os depoimentos das testemunhas não estão isolados, encontrando amparo nos documentos amealhados aos autos. No mais, ressalto que inexiste qualquer causa de exclusão da antijuridicidade ou culpabilidade, de forma que restou demonstrada a prática do fato e materialmente típico, a antijuridicidade da conduta frente ao ordenamento vigente, além da culpabilidade do agente, de forma que é de se reconhecer a pretensão punitiva estatal. Assim sendo, diante da comprovação dos fatos, a condenação do réu é medida que se impõe. III. DISPOSITIVO DIANTE DO EXPOSTO, JULGO PARICALMENTE PROCEDENTE a pretensão punitiva estatal deduzida na denúncia para CONDENAR o acusado EDINILSON FERREIRA ORIAS, devidamente qualificado, como incurso nas sanções previstas no art. 163, parágrafo único, inciso III, do Código Penal. IV. DOSIMETRIA Na forma do art. 68 do Código Penal, passo a individualizar a pena pelo sistema trifásico de Nelson Hungria (art. 5º, XLVI, da CF). 1ª FASE. Circunstâncias judiciais – art. 59, do Código Penal: Para estabelecer a pena-base, a jurisprudência do STJ se firmou no sentido de que se utiliza (i) a aplicação do aumento de 1/6 sobre a pena mínima ou (ii) 1/8 sobre o intervalo entre as penas mínima e máxima por vetorial negativada (REsp nº 2166259/SP). Eventualmente, também é possível que (iii) "o magistrado fixe a pena-base no máximo legal, ainda que tenha valorado tão somente uma circunstância judicial, desde que haja fundamentação idônea e bastante para tanto" (AgRg no AREsp n. 2.500.435/SP, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 9/9/2024, DJe de 11/9/2024) . Utilizo o primeiro critério – majoritário na jurisprudência. Vejamos cada vetorial: CULPABILIDADE: Nada consta em relação à culpabilidade para ensejar aumento de pena. ANTECEDENTES: Conforme Oráculo (mov. 126.1), o réu possui maus antecedentes. CONDUTA SOCIAL: Inexistem elementos capazes de subsidiar a análise da conduta social. PERSONALIDADE: Inexistem elementos capazes de subsidiar a análise da personalidade. MOTIVO: Não há informações sobre motivação. CIRCUNSTÂNCIAS: Não há informações que destoam à espécie. CONSEQUÊNCIAS: Não houve consequências outras que não aquelas do tipo penal. COMPORTAMENTO DA VÍTIMA: Não influiu na prática delituosa. Portanto, fixo a pena-base em 07 (sete) meses de detenção. Fixo multa: 12 (doze) dias-multa. 2ª FASE. Atenuantes e agravantes - arts. 61 a 66, do Código Penal: Para estabelecer a pena intermediária, a jurisprudência do STJ se firmou no sentido de que se utiliza a aplicação da fração de 1/6 sobre cada agravante/atenuante, seja para aumentar, seja para diminuir. Em qualquer caso, a pena não pode ficar aquém do mínimo legal (v.g. Súmula 231, do STJ, REsp n. 1.869.764/MS), nem ultrapassar o máximo cominado pelo legislador. Vejamos cada uma delas: ATENUANTES: Presente a atenuante prevista no art. 65, inciso I, do CP, uma vez que o réu era menor de vinte e um a anos na data do fato. AGRAVANTES: Por outro lado, presente a agravante da reincidência, prevista no art. 61, inciso I, do CP, razão pela qual compenso a atenuante pela agravante. Portanto, fixo a pena intermediária em 07 (sete) meses de detenção. Fixo multa: 12 (doze) dias-multa. 3ª FASE. Minorantes e majorantes - parte geral e parte especial, do Código Penal: Para estabelecer a pena definitiva, analisa-se a presença de causas de aumento ou de diminuição. O quantum de aumento ou diminuição é previsto especificamente pela majorante/minorante, não estando o Juízo limitado à pena mínima ou máxima abstratamente cominadas pelo legislador. Vejamos cada uma delas: MINORANTES: Ausente qualquer causa de diminuição. MAJORANTES: Ausente qualquer causa de aumento. DIANTE DO EXPOSTO, FIXO A PENA DEFINITIVA em 07 (SETE) meses de detenção. Fixo multa: 12 (doze) dias-multa. PENA DE MULTA (art. 49, do CP): Fixo o valor do dia-multa em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo nacional vigente à época dos fatos, por não ter informações sobre a situação econômica do réu (art. 49, do CP). A multa deverá ser atualizada quando da Execução (art. 49, §2º, do CP). CONCURSO DE CRIMES (arts. 69 a 72, do CP): Não há que se falar em concurso de crimes, ante a imputação de um só fato pelo Ministério Público. REGIME INICIAL DE CUMPRIMENTO DE PENA (art. 33, do CP): Tendo em vista a presença dos requisitos do artigo 33, §2º, alínea "c" do Código Penal, o réu deverá iniciar o cumprimento da pena no regime aberto. DETRAÇÃO (art. 387, §2º do CPP): O réu não foi segregado nestes autos, razão pela qual não há que se falar em detração. SUBSTITUIÇÃO DA PPL POR PRD (art. 44, do CP): Incabível a substituição da PPL por PRD, ante o não preenchimento dos requisitos exigidos pelo art. 44, incisos II e III, do Código Penal. SUSPENSÃO CONDICIONAL DA PENA (art. 77, do CP): Incabível a suspensão condicional da pena, uma vez que ausentes os requisitos estabelecidos no inciso I e II do art. 77 do CP. DIREITO DE APELAR EM LIBERDADE (art. 387, §1º, do CPP): Não estão presentes os requisitos para a prisão preventiva, nem para imposição de medidas cautelares outras, de maneira que garanto o réu o direito de apelar em liberdade. VALOR MÍNIMO PARA REPARAÇÃO DOS DANOS (art. 387, IV, CPP): Fixo em favor da vítima, a título de valor mínimo para reparação dos danos, o valor de R$280,00, conforme auto de avaliação (mov. 12.2). Nada obstante, destaco que a vítima poderá ingressar no Juízo Cível para discutir eventual majoração do valor. V. DISPOSIÇÕES FINAIS Condeno o acusado ao pagamento das custas processuais (art. 804, do CPP). Frise-se que eventual gratuidade da justiça é matéria afeta ao Juízo de Execução, devendo ser formulado pedido no momento oportuno (TJPR - 1ª Câmara Criminal - 0007682-77.2023.8.16.0131 - Pato Branco - Rel.: SUBSTITUTO SERGIO LUIZ PATITUCCI - J. 14.06.2025). Após o trânsito em julgado: Lance-se o nome do réu nos registros de antecedentes criminais, conforme previsto no art. 824 do Código de Normas da CGJ (Instituto de Identificação do PR); Com a fixação do regime, expeça-se a competente Guia de Recolhimento e remeta-se à Vara de Execução Penal para o início da execução. No caso de expedição de mandado de prisão, o condenado será intimado para dar início ao cumprimento de pena, sem prejuízo da realização de audiência admonitória e do disposto na Súmula Vinculante 56, conforme art. 31 da Resolução nº 93/2013 do Órgão Especial e orientações especificadas no Ofício nº 1003 – DMF (1412326), seguindo a Resolução nº 474/2022 do CNJ; Expeça-se ofício ao TRE sobre a suspensão dos direitos políticos do réu, de acordo com o art. 15, III da Constituição Federal, via INFODIP-WEB; Encaminhem-se os autos à Contadoria Judicial para fins de cálculo das custas judiciais; Efetue-se a emissão das guias do FUPEN e FUNJUS e intime-se o réu para o pagamento das custas processuais no prazo de 10 dias, salvo quando beneficiário da justiça gratuita; À Secretaria para que proceda com as anotações e comunicações de estilo, com observância do Código de Normas da Corregedoria Geral de Justiça; Conforme previsto no art. 201, §2º do Código de Processo Penal e art. 809 do Código de Normas da Corregedoria Geral de Justiça, intime-se a vítima, acrescentando que os autos e o inteiro teor da decisão estão disponíveis para consulta na Secretaria; O réu fica ciente que, sobrevindo notícia de prática de crime doloso, tal conduta ensejará a regressão de regime de cumprimento de pena; Havendo bens apreendidos, certifique-se e instaure-se incidente em apartado, vindo à conclusão para decisão sobre a destinação; Ante a falta de Defensoria Pública instalada na Comarca, condeno o Estado do Paraná ao pagamento dos honorários advocatícios devidos ao defensor dativo. Considerando a atuação da advogada FERNANDA HUMENIUK BERLATTO como defensora dativa do réu, bem como o trabalho desempenhado no presente feito, arbitro seus honorários advocatícios em R$ 2.000,00 (dois mil reais), com fundamento no item 1.2. da tabela de honorários aprovada pela Resolução Conjunta n. 06/2024 – SEFA/PGE, servindo a presente decisão como certidão de honorários. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Cumpridas as determinações acima e nada mais sendo requerido, dê-se baixa e arquivem-se. Chopinzinho, 01 de julho de 2025. Jean Rodrigues Juiz Substituto [1] CUNHA, Rogério Sanches. Manual de direito penal: parte especial (arts. 121 ao 361) / Rogério Sanches Cunha – 12 ed. ver., atual., e ampl. – Salvador: JusPODIVM, 2020. [2] Art. 824. A secretaria comunicará ao Instituto de Identificação do Estado do Paraná: I – o arquivamento do procedimento investigatório; II – a homologação da transação penal; III – a decisão de recebimento da denúncia ou da queixa-crime; IV – a concessão e a revogação do acordo de não persecução penal; V – o aditamento da denúncia ou da queixa-crime; VI – a concessão e a revogação da suspensão condicional do processo; VII – a preclusão da decisão de pronúncia ou impronúncia; VIII – o trânsito em julgado da sentença ou acórdão da condenação; IX – o trânsito em julgado da sentença ou acórdão da absolvição própria ou imprópria; X – a decisão de modificação de competência para outro juízo de outro Estado; e XI – a decisão de extinção da punibilidade ou da pena.
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