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"5007611-72.2023.4.03.6181" - Resultados da Busca

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Frederico Luis Jacomel x Eduardo Sbaraini e outros

ID: 258186673

Tribunal: TJPR Órgão: 9ª Vara Cível de Londrina Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 0044632-14.2024.8.16.0014

Data de Disponibilização: 17/04/2025

Polo Ativo:

FREDERICO LUIS JACOMEL

Polo Passivo:

EDUARDO SBARAINI SBARAINI ADMINISTRADORA DE CAPITAIS LTDA SBARAINI CAPITAL LTDA SBARAINI SECURITIZADORA S.A

Conclusão

Advogados:

GUSTAVO BONINI GUEDES

OAB/PR XXXXXX Desbloquear

MURILO FONSECA DE ALMEIDA

OAB/PR XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ COMARCA DA REGIÃO METROPOLITANA DE LONDRINA - FORO CENTRAL DE LONDRINA 9ª VARA CÍVEL DE LONDRINA - PROJUDI Avenida Duque de Caxias, 689 - Anexo I, 6º And - Caiçar… PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ COMARCA DA REGIÃO METROPOLITANA DE LONDRINA - FORO CENTRAL DE LONDRINA 9ª VARA CÍVEL DE LONDRINA - PROJUDI Avenida Duque de Caxias, 689 - Anexo I, 6º And - Caiçaras - Londrina/PR - CEP: 86.015-902 - Fone: 3028-7304 - E-mail: lon-9vj-e@tjpr.jus.br Autos nº. 0044632-14.2024.8.16.0014 Processo: 0044632-14.2024.8.16.0014 Classe Processual: Procedimento Comum Cível Assunto Principal: Rescisão do contrato e devolução do dinheiro Valor da Causa: R$85.000,00 Autor(s): FREDERICO LUIS JACOMEL (RG: 84083402 SSP/PR e CPF/CNPJ: 053.582.499-82) Rua Virgílio Jorge, 554 - San Remo - LONDRINA/PR - CEP: 86.062-270 - E-mail: murilofons@gmail.com - Telefone(s): (43) 99997-6347 Réu(s): Eduardo Sbaraini (RG: 76052441 SSP/PR e CPF/CNPJ: 040.155.269-10) Rua Herculano Carlos Franco de Souza, 272 apto 601 - Água Verde - CURITIBA/PR - CEP: 80.240-290 SBARAINI ADMINISTRADORA DE CAPITAIS LTDA (CPF/CNPJ: 32.020.860/0001-83) Avenida Cândido de Abreu, 526 Bloco B - Sala 307 - Centro Cívico - CURITIBA/PR - CEP: 80.530-000 SBARAINI CAPITAL LTDA (CPF/CNPJ: 41.633.411/0001-00) Avenida Cândido de Abreu, 526 bloco B, SL 307 - Centro Cívico - CURITIBA/PR - CEP: 80.530-000 SBARAINI SECURITIZADORA S.A (CPF/CNPJ: 47.304.773/0001-25) Avenida Cândido de Abreu, 526 Bloco B, sala 307 - Centro Cívico - CURITIBA/PR - CEP: 80.530-905 RELATÓRIO O autor, Frederico Luis Jacomel, ajuizou ação de restituição de valores com pedido de tutela de urgência e arresto de bens em face de Sbaraini Administradora de Capitais Ltda., Sbaraini Capital Ltda., Sbaraini Securitizadora S.A. e Eduardo Sbaraini, aduzindo ter contratado, em junho de 2023, serviços financeiros oferecidos pela primeira ré, relativos a investimentos em ativos digitais, mediante promessa de liquidez em até dois dias. Realizou aportes no valor total de R$ 75.000,00, por meio de seis transferências via PIX. Em dezembro de 2023, ao tentar resgatar seus investimentos, encontrou restrição na plataforma e não teve mais acesso aos ativos, tampouco obteve respostas claras dos réus, sendo informado posteriormente de que a empresa estava sendo investigada por fraude pela Polícia Federal de Itajaí/SC (autos nº 5015023-50.2023.4.04.7208). Defendeu a incidência do Código de Defesa do Consumidor, com pedido de inversão do ônus da prova, sob o argumento de que a relação é de consumo e os réus enquadram-se como fornecedores. Requereu o reconhecimento de existência de grupo econômico entre as empresas rés, e a desconsideração da personalidade jurídica com a inclusão do sócio Eduardo Sbaraini no polo passivo. Formulou, também, pedido de tutela de urgência, com base nos arts. 300 a 302 do CPC, para que fosse determinado o arresto de bens por meio do SISBAJUD e penhora no rosto dos autos da ação penal em trâmite na Justiça Federal de Itajaí, com o objetivo de resguardar o resultado útil do processo. Pleiteou a condenação dos réus ao pagamento de danos materiais no valor de R$ 75.000,00, e morais no valor de R$ 10.000,00. Ao final, pediu a concessão da justiça gratuita (mov. 1). Determinada a emenda, o autor juntou documentos e reiterou os pedidos (mov. 45). Sobreveio decisão interlocutória, por meio da qual este juízo analisou o pedido de tutela de urgência formulado pelo autor, reconhecendo a presença dos requisitos legais previstos no art. 300 do Código de Processo Civil, notadamente a probabilidade do direito, evidenciada pelos comprovantes dos depósitos (movs. 1.7 a 1.12) e pelas tentativas frustradas de encerramento da conta (mov. 1.15), bem como o perigo de dano, justificado na situação financeira delicada da empresa ré e nas investigações criminais em curso relativas a suposto esquema fraudulento. Destacando a reversibilidade da medida, determinou o bloqueio de valores encontrados em contas da ré Sbaraini Administradora de Capitais Ltda., via sistema SISBAJUD, limitado ao valor efetivamente investido de R$ 75.000,00. Determinou, ainda, a expedição de ofício ao Juízo Criminal de Itajaí/SC, para fins de averbação de arresto no rosto dos autos n. 5007611-34.2024.4.04.7208. Por outro lado, ao examinar o pedido de tutela de urgência de natureza antecipada voltado contra Sbaraini Capital Ltda., Sbaraini Securitizadora S.A. e Eduardo Sbaraini, entendeu-se pela ausência de provas que permitissem, em sede de cognição sumária, concluir pela presença dos requisitos do art. 50 do Código Civil, especialmente quanto à demonstração de desvio de finalidade ou confusão patrimonial, fundamentos exigidos para a desconsideração da personalidade jurídica. Ressaltou que a mera insolvência da empresa ou a alegada existência de grupo econômico não bastam, por si sós, para justificar a medida extrema pleiteada, especialmente quando se visa o arresto imediato de ativos (mov. 47). Citados, os réus habilitaram advogado e apresentaram contestação, postulando o benefício da justiça gratuita, alegando hipossuficiência financeira em razão dos efeitos da Operação Ouranós, deflagrada em novembro de 2023, que teria causado bloqueio de contas, restrições patrimoniais e colapso do fluxo de caixa. As rés sustentaram que a presente ação tem natureza indenizatória fundada em suposto ilícito penal, razão pela qual defendem a suspensão do processo civil até o exaurimento da ação penal n. 5006460-33.2024.4.04.7208, em trâmite na 1ª Vara Federal de Itajaí/SC, com base nos artigos 313, V, “a” e 315 do CPC, e art. 64 do CPP. Alegaram que eventual absolvição criminal implicaria ausência de responsabilidade civil, e que o prosseguimento da demanda afrontaria o princípio da presunção de inocência. No mérito, alegaram que investimentos em criptoativos são complexos, arriscados e geralmente realizados por pessoas com patrimônio significativo e conhecimento técnico, como seria o caso do autor, conforme declaração de imposto de renda (mov. 12.4). Aduziram, ainda, que não se pode exigir prova diabólica dos réus quanto à inexistência de determinadas condutas. As rés argumentaram que não houve descumprimento contratual voluntário. A suspensão das operações, incluindo o bloqueio da plataforma e dos ativos dos clientes, teria decorrido exclusivamente de ordem judicial no bojo da Operação Ouranós, não se tratando de falha na prestação de serviços. Invocaram cláusula contratual que excepciona a obrigação de resgate em caso de ordem judicial impeditiva. Sustentam que não houve dolo, culpa, desvio de finalidade, nem confusão patrimonial. Asseveram que, mesmo na hipótese de aplicação do CDC e da responsabilidade objetiva, o caso seria de culpa exclusiva de terceiro, excludente prevista no art. 14, § 3º, II, do CDC, o que afastaria a responsabilização da empresa. Apontaram que a paralisação das atividades foi determinada por autoridade policial e judicial, e que tal circunstância torna impossível o cumprimento das obrigações, não havendo como imputar o insucesso ao fornecedor. Impugnaram o valor reclamado a título de restituição de capital investido, alegando que, embora o autor tenha comprovado transferências, não demonstrou o saldo efetivo existente na plataforma na data da paralisação. Apontraram que, diante da suspensão da plataforma e dos acessos pela investigação criminal, não possuem meios de confirmar os valores supostamente existentes. Argumentaram, por fim, que os aportes efetuados pelo autor são investimentos de risco em criptoativos, modalidade que, por sua natureza, apresenta volatilidade e ausência de garantias. Nesse contexto, reforçaram que não houve ilicitude ou violação contratual, e que eventual prejuízo decorreu de fatores alheios à vontade das empresas. Concluíram pela improcedência (mov. 73). Oportunizada a especificação de provas, as partes pleitearam o julgamento antecipado, nos termos do art. 355, I, do Código de Processo Civil. É o relatório. Passo a decidir. FUNDAMENTAÇÃO Inicialmente, no que se refere ao pedido de assistência judiciária gratuita formulado pela parte ré, considero-o insubsistente. Isso porque, com base na análise técnica dos documentos acostados aos autos (movs. 87.4 a 87.9), conclui-se que os elementos apresentados não comprovam, de forma idônea e suficiente, a alegada hipossuficiência econômica das rés, tampouco do corréu Eduardo Sbaraini. Com efeito, o Relatório de Situação Fiscal de mov. 87.4, emitido pela Receita Federal, revela que o corréu possui diversas pendências tributárias, tanto em nome próprio (CPF) quanto na condição de contribuinte individual. Destacam-se débitos referentes a IRPF, IRRF, contribuições previdenciárias (segurado e patronal), com valores devidos expressivos. Apesar da existência de dívidas, não consta qualquer informação que demonstre efetiva insolvência, ausência de patrimônio ou rendimento insuficiente. Trata-se, portanto, de inadimplemento fiscal, não sendo elemento probatório suficiente à concessão da justiça gratuita. Por igual, os extratos bancários de movs. 87.5 e 87.6, embora evidenciem utilização de cheque especial com saldo negativo, incidência de juros e IOF, e ausência de aplicações financeiras, revelando momento financeiro desfavorável, não foram acompanhados de declaração de rendimentos, atividade profissional ou outros elementos exigidos pelo § 2º do art. 99 do CPC, de modo que não restou comprovada a impossibilidade de arcar com as custas processuais sem prejuízo do sustento próprio. No que se refere ao relatório emitido pela Receita Federal acerca da empresa SBARAINI CAPITAL LTDA (mov. 87.9), vê-se indicar a existência de omissão de obrigações acessórias (DCTF, ECF e EFD-Contribuições) em 2023 e 2024. Contudo, não há registro de pendências ou débitos junto à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, o que indica regularidade quanto à exigibilidade de créditos tributários. Trata-se de microempresa ativa, com capital social integralizado e sob administração de Eduardo Sbaraini. A ausência de cumprimento de obrigações acessórias, por si só, não comprova incapacidade econômica ou risco de falência. Também a situação da SBARAINI SECURITIZADORA S.A. (mov. 87.8) não discrepa. Seu relatório fiscal aponta omissão de DIRF, DCTF, ECF e EFD-Contribuições em 2023 e 2024, bem como pendências de débitos vencidos (IRRF e CSRF), embora de pequeno valor (R$ 199,39). Não foram detectadas pendências junto à PGFN. A empresa permanece ativa, com sede própria e diretoria regularmente constituída. Portanto, não se verifica a situação excepcional de ruína financeira alegada, sendo o quadro mais compatível com desorganização fiscal e contábil. A concessão da assistência judiciária gratuita exige prova da insuficiência de recursos para arcar com os custos do processo sem prejuízo do sustento próprio (art. 98 do CPC). Quando se trata de pessoas jurídicas, a jurisprudência majoritária exige demonstração robusta da precariedade financeira, não bastando alegações genéricas, pendências fiscais ou extratos bancários isolados. Além disso, o art. 99, § 2º, do CPC impõe ao requerente o dever de juntar aos autos comprovação de renda e declaração de bens, sob pena de indeferimento do benefício. No caso dos autos, os documentos apresentados não suprem essa exigência legal. Por fim, a jurisprudência do STJ, em situações análogas, tem exigido a demonstração clara de que a parte encontra-se em situação econômica crítica, com ausência de faturamento, suspensão das atividades ou decretação de falência — o que não se verifica nos documentos ora analisados, indicativos, isto sim, no máximo, de inadimplemento pontual de obrigações fiscais e bancárias, sem prova concreta de que estejam impedidos de arcar com os ônus do processo. Assim, a pretensão de concessão da gratuidade judiciária deve ser indeferida. Sustentaram os réus, ainda, que a presente ação de restituição de valores e reparação por danos morais encontra-se fundada em suposto ilícito penal, razão pela qual requerem a suspensão do feito com amparo nos arts. 313, V, "a", e 315 do Código de Processo Civil, bem como no art. 64 do Código de Processo Penal, até o exaurimento da ação penal n. 5006460-33.2024.4.04.7208, em trâmite pela 1ª Vara Federal de Itajaí/SC. A alegação, contudo, não merece acolhimento. Com efeito, a jurisprudência pátria e a doutrina consolidada reconhecem a independência entre as instâncias cível, penal e administrativa, de modo que a apuração da responsabilidade civil independe do resultado do processo criminal, salvo nas hipóteses expressamente previstas no artigo 935 do Código Civil, que dispõe: “a responsabilidade civil é independente da criminal, não se podendo questionar mais sobre a existência do fato ou sobre quem seja o seu autor, quando estas questões se acharem decididas no juízo criminal.” A interpretação desse dispositivo revela que apenas a existência do fato e a autoria reconhecidas na esfera penal, mediante sentença penal absolutória com trânsito em julgado fundada na inexistência do fato ou na negativa de autoria, vinculam o juízo cível. Fora dessas hipóteses, a jurisdição cível é plenamente competente para julgar o pedido indenizatório, com base na prova dos autos. No caso concreto, o autor pleiteia a restituição de valores investidos e não resgatados, bem como a indenização pelos danos morais decorrentes da falha na prestação de serviços financeiros, consubstanciada na restrição de acesso à plataforma digital das rés e ausência de liquidez, fatos estes aptamente comprovados documentalmente e passíveis de verificação à luz do direito civil e do Código de Defesa do Consumidor. Ainda que os mesmos fatos estejam sendo apurados na esfera criminal — sob a ótica da suposta prática de fraude contra o sistema financeiro — tal circunstância não obsta o exame da responsabilidade civil e contratual das rés, tampouco justifica a paralisação do feito, sob pena de injustificada subordinação da jurisdição cível à jurisdição penal, o que contraria o princípio da celeridade processual e da tutela efetiva dos direitos fundamentais do consumidor. A aplicação do art. 313, V, “a”, do CPC, exige demonstração concreta de que a controvérsia cível dependa, necessariamente, do resultado do processo penal, o que não se verifica nos autos. O objeto da presente demanda diz respeito à obrigação contratual de restituição e à falha no serviço prestado, cuja análise não está condicionada à prévia apuração de crime, sendo certo que eventual sentença penal condenatória ou absolutória, quando proferida, poderá produzir efeitos reflexos ou ser objeto de análise superveniente, sem prejudicar o regular processamento da ação civil. Nesse sentido, é pacífico o entendimento de que a suspensão do processo civil em razão da existência de processo criminal apenas se justifica quando da decisão criminal puder decorrer, necessariamente, a solução da causa civil, o que não se verifica quando os pedidos formulados na ação civil podem ser analisados com base em provas próprias e autônomas. Logo, diante da autonomia do juízo cível, da inexistência de prejuízo à defesa e da suficiência da instrução já realizada, impõe-se o indeferimento do pedido de suspensão, com o regular prosseguimento do feito. Justifico, nos termos do art. 355, inciso I, do Código de Processo Civil, ser efetivamente cabível o julgamento antecipado do mérito, dado que a questão de fato é incontroversa e já está suficientemente provada por meio documental, sendo desnecessária a produção de outras provas. Aliás, no presente caso, ambas as partes manifestaram-se expressamente pela desnecessidade de dilação probatória e requereram o julgamento antecipado da lide (movs. 89 e 90), o que demonstra o consenso quanto à suficiência da prova documental acostada aos autos. Ademais, os fatos relevantes à solução da controvérsia — especialmente os depósitos realizados pelo autor, a alegada falha na restituição dos valores e os fundamentos invocados pelas rés em defesa — encontram-se documentalmente demonstrados, não havendo controvérsia que justifique a produção de prova oral, pericial ou a realização de audiência. Ressalte-se que a controvérsia travada nos autos é eminentemente de direito, ou, quando envolve matéria de fato, esta se mostra documentalmente provada, o que permite ao juízo formar convencimento seguro e embasado para o julgamento do feito. Assim, diante da ausência de questões de fato pendentes de prova e da suficiência do conjunto probatório constante dos autos, impõe-se o julgamento antecipado do mérito, nos termos do art. 355, I, do CPC. Pois bem, o argumento central das rés, no tocante à inexistência de responsabilidade civil, se volta ao fato de que os aportes realizados pelo autor constituiriam investimentos de risco em criptoativos, e que a paralisação das atividades empresariais e o bloqueio de ativos decorreram exclusivamente de ordem judicial no âmbito da denominada Operação Ouranós, razão pela qual não haveria falha na prestação dos serviços. Todavia, tal raciocínio não merece acolhida. Inicialmente, cumpre observar que a relação jurídica estabelecida entre o autor e as rés se insere no conceito de relação de consumo, conforme previsão expressa do art. 2º e 3º do Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/90). O autor, na qualidade de destinatário final dos serviços prestados, figura como consumidor, ao passo que as rés, enquanto fornecedoras de serviços voltados à captação, gestão e intermediação de aplicações financeiras em criptoativos, assumem papel inequívoco de fornecedores. Nesse cenário, a responsabilidade civil das rés é objetiva, nos termos do art. 14 do CDC, a qual independe da demonstração de culpa. O risco da atividade econômica recai sobre o fornecedor, que responde pelos danos decorrentes de falhas na prestação dos serviços, salvo prova cabal de culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro, o que não restou evidenciado no presente feito. O fato de os investimentos envolverem ativos de natureza volátil, como as criptomoedas, não exime o fornecedor de responsabilidade quanto à lisura, segurança e regularidade da operação. O risco próprio do mercado não se confunde com riscos oriundos de desvio de finalidade, má gestão ou incapacidade de cumprimento das obrigações contratuais, seja qual for a sua causa. O consumidor não pode suportar os efeitos negativos de intervenções estatais que recaem sobre a empresa fornecedora, especialmente quando tais intervenções decorrem de apurações relacionadas à própria atividade comercial que ela desenvolve. A alegação de que a suspensão dos serviços e a indisponibilidade de ativos decorreram de ordem judicial não elide a responsabilidade civil. Isso porque, na sistemática do CDC, eventuais fatos impeditivos do cumprimento contratual vinculados à esfera do fornecedor — ainda que oriundos de ato estatal — não afastam o dever de indenizar, porquanto constituem risco da própria atividade econômica escolhida pela empresa. A cláusula contratual invocada pelas rés, que supostamente excepcionaria a obrigação de resgate dos valores investidos na hipótese de ordem judicial impeditiva, mostra-se manifestamente abusiva e, portanto, nula de pleno direito, nos termos do art. 51, incisos IV e XI, do Código de Defesa do Consumidor. Nos contratos de consumo, a proteção da parte vulnerável impõe limites à autonomia privada, especialmente quanto à estipulação de cláusulas que imponham desequilíbrio excessivo entre os contratantes ou que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, contrariando a boa-fé objetiva e a função social do contrato. É precisamente o que ocorre na hipótese dos autos. Ao admitir cláusula que afaste o dever de resgate de valores investidos em razão de ordem judicial, transfere-se ao consumidor o ônus por fatos estranhos à sua conduta e à própria relação de consumo, o que contraria frontalmente o regime de responsabilidade objetiva do fornecedor. Mais grave, tal disposição contratual perpetua a submissão do consumidor a um serviço de intermediação e gestão de ativos cuja confiança foi abalada, impedindo-o de reaver os valores aplicados e, por consequência, de buscar alternativas seguras e legítimas de investimento. Em outras palavras, converte-se o contrato em instrumento de retenção forçada de recursos sob a alegação de evento externo, de cuja existência e abrangência o consumidor não tem qualquer controle ou ingerência. O art. 6º, inciso IV, do CDC assegura ao consumidor a proteção contra cláusulas e práticas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos e serviços, e o §1º do art. 51 estabelece que se presume excessiva, entre outras, a vantagem que impossibilite, mesmo que parcialmente, o exercício de direitos inerentes à natureza do contrato. Dentre esses direitos, figura com centralidade o direito de resgatar os valores aplicados, ao qual não se pode opor cláusula que resulte, na prática, em expropriação sem fundamento legal ou contratual legítimo. Por conseguinte, eventual cláusula que exonere a fornecedora de cumprir sua obrigação de restituição dos valores sob sua guarda, ainda que sob pretexto de ordem judicial impeditiva, revela-se abusiva e incompatível com os princípios que regem as relações de consumo, não podendo prevalecer. Ainda que se admita, por argumentação, a incidência da causa excludente de responsabilidade prevista no art. 14, § 3º, II, do Código de Defesa do Consumidor — qual seja, a culpa exclusiva de terceiro —, a tese não se sustenta no presente caso. A chamada “culpa exclusiva de terceiro” configura-se apenas quando o evento danoso decorre inteiramente da atuação de um terceiro estranho à cadeia de fornecimento e à própria atividade empresarial do prestador de serviço. Não é o que se verifica nos autos. A atuação do Poder Público, por meio da autoridade policial e do Poder Judiciário, que culminou na suspensão das operações da empresa, está diretamente relacionada à atividade desenvolvida pelas rés e à forma como essa atividade era conduzida. Trata-se, portanto, de fato inserido no escopo do risco da própria atividade, e não de intervenção absolutamente externa e imprevisível. A alegada ordem judicial — oriunda da Operação Ouranós — não constitui fato novo ou excepcional apto a afastar a responsabilidade objetiva do fornecedor. Ao contrário, a deflagração de investigações e medidas cautelares revela a existência de fundadas suspeitas de irregularidades na operação das empresas, as quais, por sua própria conduta, deram causa à situação que resultou na indisponibilidade dos ativos. No que se refere à impugnação dos valores postulados pelo autor a título de restituição, também não procede a alegação de ausência de comprovação do saldo existente na plataforma na data da paralisação. A dinâmica das plataformas digitais de investimento e a opacidade dos controles operacionais sob a exclusiva administração das rés tornam inviável exigir do consumidor a prova de fato negativo ou de informações que se encontram exclusivamente sob posse do fornecedor. A esse respeito, é vedada a exigência de chamada “prova diabólica” ao consumidor. O art. 6º, inciso VIII, do CDC assegura a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive mediante a inversão do ônus da prova quando verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente. Estando demonstradas as transferências bancárias realizadas pelo autor às contas indicadas pelas rés (mov. 1.4 e seguintes), caberia a estas comprovar a efetiva destinação dos valores, os registros contábeis da plataforma e o eventual saldo disponível no momento da suspensão das atividades, ônus do qual não se desincumbiram. Por fim, a tentativa das rés de escudar-se na natureza arriscada dos investimentos realizados tampouco afasta o dever de indenizar. Ainda que se reconheça a volatilidade dos criptoativos como característica intrínseca ao mercado, não é disso que se trata no presente caso. O risco de mercado diz respeito à variação dos ativos e aos prejuízos oriundos da própria dinâmica econômica. Não se confunde com a indisponibilidade absoluta dos valores investidos, decorrente de falhas ou ilicitudes na gestão da plataforma, que configuram vício na prestação do serviço. Em resumo, os prejuízos experimentados pelo autor não derivaram da oscilação natural do mercado de criptoativos, mas sim da total interrupção da atividade empresarial das rés, da ausência de transparência e da impossibilidade de resgate de valores — elementos que traduzem falha grave na prestação do serviço e ensejam a responsabilização das fornecedoras nos moldes do CDC. Por outro lado, no caso concreto, compreendo não caracterizada a violação a direito da personalidade do autor que justifique a reparação pecuniária pretendida. Em primeiro lugar, cumpre destacar que o autor, pessoa maior e capaz, deliberadamente decidiu investir recursos próprios em uma modalidade de aplicação financeira marcada por características notoriamente arriscadas, em um setor de regulação incipiente, operado por empresas que não se submetem aos mecanismos convencionais de fiscalização típicos do sistema financeiro nacional. A decisão de ingressar no mercado de criptoativos — cujas especificidades são amplamente conhecidas, inclusive quanto à volatilidade, à ausência de garantias e à inexistência de regulamentação formal — revela o exercício consciente da autonomia privada, com a assunção voluntária dos riscos próprios desse tipo de operação. Além disso, os elementos constantes dos autos não evidenciam que o autor tenha sofrido lesão a direitos existenciais, tampouco situação de aflição, humilhação ou sofrimento anormal, a ponto de ultrapassar os dissabores ordinários decorrentes das relações negociais. A jurisprudência consolidada dos tribunais pátrios vem reiteradamente decidindo que o mero inadimplemento contratual — ainda que envolva frustração patrimonial —, por si só, não configura dano moral indenizável, salvo se demonstrada repercussão concreta e relevante na esfera íntima do indivíduo, o que não foi comprovado nos autos. Ademais, a própria impossibilidade momentânea de restituição dos valores não decorreu de conduta arbitrária ou dolosa das rés, mas sim da imposição de medidas cautelares determinadas por autoridade judicial no contexto de investigação criminal em curso. Ainda que, como anteriormente exposto, tal circunstância não afaste a responsabilidade objetiva das fornecedoras quanto à reparação de eventuais perdas patrimoniais, serve, por outro lado, como elemento apto a afastar a incidência de dano moral, sobretudo por inexistir qualquer conduta deliberada, vexatória ou atentatória à dignidade do consumidor. Importante assinalar que a pretensão de indenização por dano moral não pode ser banalizada, tampouco servir como mecanismo de reparação automática em toda e qualquer hipótese de inadimplemento contratual. Tal compreensão comprometeria a própria finalidade do instituto, que visa tutelar valores extrapatrimoniais de envergadura, vinculados à dignidade da pessoa humana. No caso dos autos, a frustração patrimonial experimentada pelo autor, embora relevante sob a ótica econômica, limita-se ao descumprimento da contraprestação pactuada e não se reveste das características necessárias à configuração de dano moral, razão pela qual o pedido indenizatório não merece acolhida. Quanto à extensão subjetiva da condenação, importa ressaltar que, embora a responsabilidade tenha sido reconhecida exclusivamente em face da ré SBARAINI ADMINISTRADORA DE CAPITAIS LTDA. — única empresa com a qual restou comprovada a efetiva relação contratual com o autor —, tal circunstância não implica sucumbência do demandante frente às demais rés. Isso porque, não obstante ausente prova suficiente, nesta fase de conhecimento, para o deferimento da desconsideração da personalidade jurídica ou reconhecimento de confusão patrimonial, as demais rés (SBARAINI CAPITAL LTDA., SBARAINI SECURITIZADORA S.A. e EDUARDO SBARAINI) integram o mesmo grupo econômico, constituíram procurador comum e apresentaram defesa de mérito em nome próprio e da ré condenada, em verdadeira hipótese de encampação da defesa. Assim, foram partes legítimas à lide e contribuíram, conjuntamente, para a instrução do feito, o que afasta qualquer condenação do autor em honorários em seu favor. Ressalte-se, ademais, que eventual desconsideração da personalidade jurídica ou responsabilização subsidiária de outras empresas ou sócio poderá ser oportunamente discutida em sede de cumprimento de sentença, caso venham a ser demonstrados os respectivos pressupostos legais exigidos pelo art. 50 do Código Civil e pelas normas processuais incidentes. DISPOSITIVO Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos, para condenar a ré Sbaraini Administradora de Capitais Ltda. à restituição do valor de R$ 75.000,00 ao autor, com o acréscimo da atualização legal prevista nos termos dos arts. 389, parágrafo único, 406 e 407 do Código Civil (com a redação dada pela Lei n° 14.905/2024), vigorando a correção monetária a partir da data de cada depósito (movs. 1.7 a 1.12), enquanto os juros fluirão a partir da data da citação, observados, em ambos os casos, os critérios disciplinados pela Resolução CMN nº 5.171/2024. Dada à sucumbência recíproca, condeno os réus ao pagamento de 88% das custas e despesas processuais, bem como de honorários ao advogado do autor, fixados à razão de 10% sobre o valor atualizado da condenação. O autor arcará com os 12% restantes das custas e despesas processuais, bem como com o pagamento dos honorários devidos ao advogado da parte ré, calculados à razão de 10% sobre o valor do pedido de compensação por danos morais não acolhido, observados, em ambos os casos, os critérios disciplinados pelo art. 85, § 2º, do Código de Processo Civil. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Londrina, 16 de abril de 2025. Aurênio José Arantes de Moura Juiz de Direito

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Resultados para o tribunal: TJPR

Resultados para "5007611-72.2023.4.03.6181"

Frederico Luis Jacomel x Eduardo Sbaraini e outros