Jadir Junior Araujo De Oliveira x Rudinei Barros Da Silva
ID: 332009021
Tribunal: TJRO
Órgão: Porto Velho - 1ª Vara da Auditoria Militar
Classe: AçãO PENAL MILITAR - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Nº Processo: 7009758-89.2023.8.22.0000
Data de Disponibilização:
23/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
ADA CLEIA SICHINEL DANTAS BOABAID
OAB/RO XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RONDÔNIA VARA DA AUDITORIA MILITAR E CARTAS PRECATÓRIAS CÍVEIS E CRIMINAIS Fórum Geral César Montenegro - Av. Pinheiro Machado, 777, Olaria - Porto Velho RO CEP 76.801-2…
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RONDÔNIA VARA DA AUDITORIA MILITAR E CARTAS PRECATÓRIAS CÍVEIS E CRIMINAIS Fórum Geral César Montenegro - Av. Pinheiro Machado, 777, Olaria - Porto Velho RO CEP 76.801-235 Central de Atendimento Processual: (69) 3309-7000 | Central de Atendimento Criminal: (69) 3309-7001 E-mail: cpe1gamil@tjro.jus.br | Balcão de atendimento virtual: https://balcaovirtual.tjro.jus.br/ PROCESSO: 7009758-89.2023.8.22.0000 CLASSE: Ação Penal Militar - Procedimento Ordinário ASSUNTO: Injúria AUTOR: MPRO - Ministério Público do Estado de Rondônia ADVOGADO DO AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE RONDÔNIA REU: RUDINEI BARROS DA SILVA ADVOGADO DO REU: ADA CLEIA SICHINEL DANTAS BOABAID, OAB nº RO10375 SENTENÇA Trata-se de ação penal militar movida pelo Promotor de Justiça, Dr. Elias Chaquian Filho, que denunciou o policial militar CB PM Rudinei Barros da Silva (à época SD), qualificado nos autos, imputando-lhe o crime de injúria real majorada (art. 217 c/c art. 218 inciso IV, ambos do Código Penal Militar), porque, segundo a denúncia, em 17/09/2022 por volta das 00h45min, Cervejaria e Distribuidora Top Beer em Porto Velho/RO o acusado CB PM Barros “injuriou a vítima J. J. A. O., ao chamá-lo de “vagabundo”, ofendendo-lhe sua dignidade, bem como desferiu um tapa no rosto da vítima, ofendendo sua integridade física.”. O contexto fático apresentado na denúncia esclarece que a guarnição da força tática realizava uma abordagem e revista na vítima, e, em determinado momento, o acusado: sem qualquer reação e/ou resistência da vítima, passou a xingá-la de “vagabundo” e, não satisfeito, ainda desferiu um tapa no rosto dela”. A ação ainda teria sido registrada pelas câmeras de segurança do estabelecimento e juntada aos autos constando o momento do tapa no rosto da vítima. (Denúncia ID 105393114) A denúncia foi recebida em 29/05/2024 (ID 106465109), instruída com o Inquérito Policial Militar RGF nº 23.01.5856, instaurado por meio da Portaria nº 11/2023/PM-5BPMP6, de 14/04/2023, contendo, entre outras, as seguintes peças: Boletim de Ocorrência Policial Militar nº 2022-A-67 (ID 98538379 - Pág. 6), Informação nº 307/2022/PM-CORREGDPJM (ID 98538379 - Pág. 10), Escala de Serviço do dia 16/09/2022 (ID 98538379 - Pág. 16), Relatório (ID 105765080 - Pág. 15-16) e Homologação (ID 105765081 - Pág. 5-6). Em diligência complementar o Ministério Público requereu a juntada do vídeo referido na Informação nº 243/2022/PM-CORREGDPJM, identificado como VID-20220917-0019, referente ao registro da abordagem. A diligência foi atendida (ID 105765081 - Pág. 11) e as mídias respectivas juntadas no PJE (IDs 105765082, 105765083, 105765464 e 105765465) Citação realizada em 04/07/2024 (ID 108045770). Resposta à acusação sem preliminares (ID 108416262). Durante a instrução processual, inquiriu-se, por videoconferência, pela plataforma Google Meet, a vítima J. J. A., a informante E. R. A e as testemunhas SGT PM Sandro dos Santos Ferreira, CB PM José Heverton Costa Lins e CB PM Ricardo Pisa Lopes (IDs 113933330 e 119226572). Interrogatório (ID 119226572). As gravações das audiências foram disponibilizadas no sistema “DRS Audiências”. Na fase do art. 427 do CPPM, o Ministério Público e a Defesa declararam não ter diligências a requerer (ID 119226572- item 7 Ata de Audiência). Por memoriais, o Ministério Público, por meio do Promotor de Justiça Dr. Mauro Adilson Tomal, consignou que a materialidade e a autoria delitivas restaram devidamente comprovadas pelas provas colhidas no curso da instrução, concluindo que o conjunto probatório ratifica os fatos narrados na denúncia. Ao final, requereu seja julgado procedente o pedido formulado na inicial, para condenar o acusado CB PM Rudinei Barros da Silva como incurso nas penas do artigo 217 c/c artigo 218, inciso IV, ambos do Código Penal Militar. (ID 119540656) A Defesa, por sua vez, sustentou a ausência de dolo específico na conduta do acusado, destacando que sua reação teria sido reflexa, em resposta à resistência ativa e à postura exaltada da vítima durante a abordagem policial. Afirmou que o vídeo constante nos autos não comprova o animus injuriandi e que o depoimento das testemunhas militares corrobora a versão defensiva. Requereu o reconhecimento da legítima defesa e, alternativamente, a absolvição por ausência de provas suficientes, com fundamento nos arts. 439, alíneas “d” e “e”, do CPPM c/c art. 386, VI e VII, do CPP, em observância ao princípio do in dubio pro reo. (ID 120141107) É o relatório. Decido. Sem preliminares arguidas pelas partes, razão pela qual passo à análise do mérito. Imputa-se ao acusado CB PM Rudinei Barros da Silva o delito de injúria real, previsto no artigo 217 c/c art. 218, inciso IV combinados com o art. 9, II, alínea “c” do Código Penal Militar Injúria real Art. 217. Se a injúria consiste em violência, ou outro ato que atinja a pessoa, e, por sua natureza ou pelo meio empregado, se considera aviltante: Pena - detenção, de três meses a um ano, além da pena correspondente à violência. Disposições comuns Art. 218. As penas cominadas nos antecedentes artigos deste capítulo aumentam-se de um terço, se qualquer dos crimes é cometido: (...) IV – na presença de 2 (duas) ou mais pessoas ou de inferior hierárquico do ofendido, ou por meio que facilite a divulgação da calúnia, da difamação ou da injúria. (Redação dada pela Lei nº 14.688, de 2023) A injúria real é crime que tutela a honra e a incolumidade física do indivíduo, sem a necessidade de produção de lesão corporal. O que a distingue da injúria simples é o emprego de violência física ou de outro meio aviltante, seja pela sua natureza ou pelo modo como é empregado – exemplos típicos incluem: tapa no rosto, empurrão, rasgar vestes para expor ao ridículo, atirar bebida ou cuspir em alguém, arremessar fezes, puxar a orelha, levantar a saia de uma mulher, cortar cabelo etc. Trata-se de forma qualificada de injúria, em que a agressão física, mesmo sem resultar em lesões, tem o objetivo específico de humilhar ou menosprezar o ofendido. Distingue-se da lesão corporal justamente por não visar atingir a integridade física, mas sim a dignidade e o respeito moral da vítima, por meio de gestos ou atos físicos de conteúdo depreciativo. A pena cominada é de detenção de três meses a um ano, cumulada com a pena correspondente à violência, caso dela resulte lesão. O crime admite o aumento de pena previsto no art. 218, IV, quando cometido na presença de duas ou mais pessoas, como se verifica no caso concreto. Conforme narrado na denúncia, atribui-se ao acusado a prática de conduta típica ocorrida em 17/09/2022, durante serviço policial ostensivo, em Porto Velho/RO, quando integrava guarnição da Força Tática da PMRO. Consta que, ao proceder abordagem a um civil, o CB PM Barros teria desferido um tapa no rosto da vítima, além de chamá-la de “vagabundo”, agindo de forma desproporcional, ofendendo a integridade física da vítima. Sobre a existência do fato, verifica-se que o episódio foi formalmente registrado no mesmo dia na Corregedoria-Geral da Polícia Militar, por meio do Boletim de Ocorrência nº 2022-A-67 (ID 98538379 - pág. 6), em que a vítima relatou ter sido agredida por policial militar durante abordagem da guarnição da Força Tática. Em sequência, os fatos foram objeto da Informação nº 243/2022/PM-CORREGDPJM, que referenciou o boletim e requisitou a identificação da guarnição envolvida (ID 98538379). Em resposta à referida informação, sobreveio a Informação nº 307/2022/PM-CORREGEDPJM, constando que: No momento que cumprimento Vossa Senhoria, aproveito para lhe informar que foi identificada a Guarnição que realizou a abordagem (id 0033800860), trata-se de G.U. da Força Tática do 5° BPM, comandada pelo CB PM Sandro. Segundo relato da vítima no BOP (0032370782) foi abordado de forma truculenta, recebeu um tapa no rosto e foi chamado de vagabundo. E após assistir os vídeos disponibilizados no link na informação 243 (id 0032371265), foi possível verificar nitidamente no vídeo VID - 20220917 - WA0019.MP4 quando em dado momento da abordagem o SD PM BARROS (Id 0034168065) deferiu um tapa no rosto da vítima imobilizada na presença dos demais PPMM da guarnição e de civis dentro de um estabelecimento comercial. Dessa forma, vislumbro indícios de crime militar de Injúria real tipificado do Código Penal Militar em seu art. 217. "Se a injúria consiste em violência, ou outro ato que atinja a pessoa, e, por sua natureza ou pelo meio empregado, se considera aviltante: Pena - detenção, de três meses a um ano, além da pena correspondente à violência." Assim, sugiro instauração de Inquérito Policial Militar. (ID 98538379 - Pág. 10). A título de registro, conforme consta na Escala de Serviço Especializado da área do 5º Batalhão referente ao dia 16/09/2022, o acusado estava escalado para atuar na guarnição da Força Tática – Tático 2, no período das 16h00 às 04h00, desempenhando a função de patrulheiro. Integravam a mesma equipe o CB PM Sandro (comandante), o CB PM Pisa (motorista) e o SD PM Lins (também patrulheiro). (ID 98538379 - pág. 16) Os autos também são instruídos com imagens extraídas da câmera de segurança do estabelecimento comercial onde ocorreu a abordagem, sendo possível visualizar a dinâmica dos fatos. (IDs 105765082, 105765083, 105765464 e 105765465). Dessa forma, as filmagens complementam os demais elementos probatórios. Quanto à autoria e culpabilidade, passo a análise. Em juízo, o acusado, SD PM Barros, apresentou uma confissão parcial, relatou que, durante patrulhamento, a guarnição avistou a vítima em uma conveniência. A suspeita surgiu quando a vítima, ao perceber a viatura, entrou rapidamente no estabelecimento, levando a mão à cintura. Na tentativa de abordagem verbal, foi dado voz de parada pelo Comandante da guarnição, porém a vítima recusou-se a cooperar, gritando que não era "vagabundo" e que não seria abordado, o que intensificou a suspeita da guarnição. Quanto à eventual embriaguez ou odor etílico exalado pela vítima, afirmou não se recordar. Explicou que, diante da resistência da vítima, o SGT PM Pisa (à época CB) iniciou a abordagem física segurando as mãos da vítima, que tentava se debater. O acusado também participou da contenção e da busca pessoal. Admitiu ter levado a mão ao rosto da vítima, descrevendo o ato como um reflexo instintivo, mais um empurrão do que um tapa, sem intenção de lesionar. Justificou a ação pelo receio de que a vítima J. J. A. O., que estava muito alterado e se debatendo, pudesse agredi-lo ou avançar sobre ele, já que a todo momento tentava se desvencilhar da abordagem. Afirmou que a ação não deixou marcas ou lesões. Negou ter chamado a vítima de "vagabundo", alegando que a própria vítima usava o termo, insinuando que os policiais eram vagabundos. Ele confirmou que a revista pessoal foi realizada, mas nada ilícito foi encontrado. A abordagem, que deveria ser rotineira, tornou-se atípica devido à reação da vítima. Ressaltou, que uma parente da vítima, presente no local, pedia para ele se acalmar, mencionando que ele sempre teve problemas com a polícia e reagia de forma estranha às abordagens. Após esse momento inicial de resistência, a abordagem prosseguiu normalmente. Conta que o acusado nunca havia abordado a vítima antes e não teve contato com ele após a ocorrência. Por fim, reforçou que a abordagem policial é um procedimento padrão, independente de características pessoais, e que a ação foi um reflexo instintivo, não planejado, sem qualquer intenção de agressão. (Interrogatório SD PM Rudinei Barros da Silva - ID 119226572) Em contrapartida, a vítima J. J. A. D. O., relatou que estava em uma conveniência aguardando sua irmã retornar com uma chave de casa. Ao entrar no estabelecimento para carregar o telefone, foi surpreendido pela chegada dos policiais. Ele descreveu que um sargento se aproximou com a arma em punho, momento em que se assustou, pois nunca havia tido uma arma apontada para si e, apesar do susto inicial, colaborou com a abordagem colocando as mãos na cabeça. Conta que se identificou diversas vezes, fornecendo nome e CPF. Quanto ao momento da abordagem, a vítima narra que, após o sargento e o CB Barros o abordarem e revistar, o segurou com agressividade, apertando suas mãos. Disse que, mesmo após ter sido revistado e já estar com as mãos na cabeça, o CB Barros desferiu um tapa em seu rosto e o chamou de "vagabundo". Ele mencionou que, antes do tapa, havia dito que não precisava de tanta agressividade, pois era trabalhador e não "vagabundo". Explicou que sofreu a lesão, mas optou por não realizar o exame de corpo de delito, sugerindo que a força do tapa pode ser percebida no vídeo da ocorrência. Dias após ocorrido, a vítima conta que dois policiais não identificados o procuraram para tentar um acordo, a fim de evitar que o caso fosse levado à justiça, o que ele recusou, por já ter denunciado o fato. Por fim, esclareceu que não resistiu à abordagem inicial, afirmando que sua reação foi de susto, mencionando que nunca teve problemas com a justiça ou com a polícia antes deste incidente, mas que já foi abordado diversas vezes por ser confundido com outras pessoas e sua irmã, que já trabalhou na conveniência, foi quem lhe forneceu a filmagem da ocorrência. (Vítima J. J. A. D. O - ID 119226572) Ouvida como informante, a tia da vítima, Sra. E. R. de A., afirmou que no das dos fatos estava com ele na conveniência, onde estavam também sua patroa e a filha desta. Relatou que estavam sentados em uma mesa do lado de fora da conveniência, quando a viatura policial se aproximou. Disse que, ao perceber a polícia, orientou sua patroa sobre a criança, momento em que tanto a patroa, quanto a vítima se levantaram. Conta que a vítima entrou na conveniência para mexer em seu celular que estava carregando. A viatura, então, fez uma manobra e os policiais abordaram a vítima, questionando-o sobre sua atitude e chamando-o de "vagabundo". Narra que a vítima ficou nervosa e revoltada, pois não aceitou a abordagem, alegando ser trabalhador. Esclareceu que não se recorda de ter ouvido a vítima xingar ou ofender os policiais. Ela testemunhou a agressão física, afirmando que um dos policiais o imobilizou por trás, enquanto outro desferiu uma "mãozada" em seu rosto. Confirmou que os policiais proferiram xingamentos como "vagabundo" e "fica quieto vagabundo". Ela também mencionou que havia imagens da ocorrência, que foi fornecida pela sua patroa. Após intervir, pedindo para se acalmarem, a vítima foi liberada e não chegou a ser presa. Informou que, posteriormente, dois policiais tentaram contatar a vítima para um acordo, a fim de evitar que o caso fosse levado à justiça, o que foi recusado. Relatou que a vítima possui um "trauma" e está em tratamento psicológico por depressão devido a abordagens policiais anteriores, nas quais, segundo ela, ele já foi agredido sem motivo, simplesmente por ser "menino pobre, periferia, preto". (InformanteE. R. de A. - ID 113933330) O comandante da guarnição no dia dos fatos era o SGT Sandro. Juntamente com ele, compunha a guarnição o CB PM Pisa (motorista), o acusado CB Barros e o SD Lins (patrulheiros). Relatou que, durante patrulhamento, ao se aproximarem de uma conveniência, a vítima, ao avistar a viatura, levantou-se rapidamente e entrou no estabelecimento, levando a mão à altura da cintura. Essa atitude da vítima gerou suspeita, levando a guarnição a abordá-lo para verificar a presença de armas ou ilícitos. Ao ser abordado, a vítima demonstrou nervosismo, falava alto, aparentava estar alcoolizado e recusava-se a ser abordado, afirmando que não era "vagabundo". A tia da vítima, presente no local, tentava acalmá-lo a todo instante. A abordagem foi realizada com o procedimento padrão de revista, que foi executada pelo CB Barros e que nada de ilícito foi encontrado. Quanto a suposta agressão, afirmou que não presenciou o momento em que o CB PM Barros desferiu um tapa no rosto de Jadir. Ele tomou conhecimento do ocorrido posteriormente, ao ver imagens veiculadas por Jadir em um grupo de amigos. Reiterou que, no momento da abordagem, a vítima estava alterado e se recusava a cooperar, apesar das tentativas de verbalização e intervenção da tia para que se acalmasse. (Testemunha SGT PM Sandro dos Santos Ferreira - ID 113933330). A testemunha CB PM Lins (à época SD), também patrulheiro da guarnição composta pelo acusado, afirmou que a abordagem ocorreu em uma distribuidora localizada na Rua União. Narra que a guarnição retornou ao local após visualizar um indivíduo tentando se esconder ao avistar a viatura. Por determinação do comandante, a guarnição desembarcou para realizar a abordagem. A testemunha permaneceu na retaguarda da equipe, não presenciando diretamente o contato físico entre o acusado e a vítima. Questionado sobre a existência de aglomeração, explicou que o local estava movimentado e que era procedimento da equipe prevenir aproximações para garantir a segurança. Sobre a abordagem, conta que houve resistência inicial de forma passiva e, em seguida, ativa, com o abordado recusando-se a colocar as mãos na cabeça e a virar de costas, dificultando a busca pessoal. Disse que o homem ainda proferiu que estava sendo abordado por ser negro, enquanto uma mulher, identificada como parente, tentava intervir. Reiterou que foi necessário uso de força moderada para contenção e realização da revista. Quanto ao tapa desferido pelo CB Barros na vítima, disse não ter visto, pois estava na retaguarda da equipe. Esclareceu que nenhum ilícito foi encontrado com o abordado, tampouco houve registro de ocorrência, e que não tem conhecimento de qualquer contato posterior com a vítima. Afirmou não conhecer o abordado anteriormente. Indagado sobre eventual embriaguez, disse que o homem estava agitado, mas não teve proximidade suficiente para afirmar se havia odor etílico. (Testemunha CB PM José Heverton Costa Lins - ID 119226572). A testemunha de defesa, SGT Ricardo Pisa Lopes (à época SD), motorista da guarnição naquele dia, declarou que a abordagem ocorreu após a vítima ser vista na parte externa de uma distribuidora e, ao notar a viatura, correr para o interior do estabelecimento com a mão na cintura, gerando suspeita de que estaria armado. Disse que a guarnição desembarcou e seguiu o protocolo padrão de abordagem, posicionando-se estrategicamente. A vítima apresentou resistência, inicialmente de forma verbal e, em seguida, física, recusando-se a obedecer às ordens da equipe, como virar de costas e colocar as mãos na cabeça. Afirmou que tentou conter a vítima, utilizando força compatível com a resistência apresentada, e que houve necessidade de segurar firmemente a mão do abordado para realizar a revista pessoal. Acrescentou que o homem estava muito alterado, falava alto e afirmava que não era “vagabundo”, além de se recusar a ser abordado. Informou que, embora tenha se aproximado da vítima, não percebeu sinais claros de embriaguez. Indagado sobre eventual agressão praticada pelo acusado CB PM Barros contra a vítima, negou ter presenciado qualquer ato violento, como tapa ou outra conduta ofensiva. Confirmou que viu as imagens registradas por câmeras, mas reiterou que, no momento da abordagem, estava concentrado em conter a vítima, que se debatia e tentava se desvencilhar da equipe. Destacou que, diante da suspeita de que o abordado estivesse armado, a guarnição buscou preservar a segurança da ocorrência e evitar o uso de força letal. (Testemunha SGT PM Ricardo Pisa Lopes - ID 119226572). Pois bem! Embora o acusado tenha alegado ausência de dolo específico e afirmado que sua conduta foi reflexa, motivada por receio de agressão, admitiu ter levado a mão ao rosto da vítima. Tal versão é contraposta de forma clara pelos relatos da vítima e da informante, que confirmaram a agressão, qual seja, um tapa no rosto, e o xingamento “vagabundo”. A narrativa é corroborada de forma inequívoca pelas imagens anexadas aos autos, extraídas das câmeras de segurança do local da abordagem. Em juízo, o acusado CB PM Barros reafirmou que o gesto foi instintivo e não teve por objetivo ofender ou agredir a vítima. Negou ter proferido qualquer xingamento, sustentando que sua ação visou conter eventual reação violenta da vítima, que estaria exaltada e resistente à abordagem. Por outro lado, as declarações prestadas pela vítima e pela informante mostraram-se coesas, harmônicas entre si e em plena convergência com o conteúdo das filmagens. Tal consistência confere credibilidade aos depoimentos e reforça a conclusão de que o réu, de fato, praticou os atos que configuram injúria real, ao desferir um tapa no rosto da vítima e chamá-la de “vagabundo”. Os outros três componentes da guarnição limitam-se a dizer que não presenciaram eventual agressão, pois estavam focados na contenção da vítima ou posicionados na retaguarda. Consta nos autos, nos ID’s105765082, 105765083, 105765464 e 105765465, mídia audiovisual captada por câmera de monitoramento instalada no local dos fatos. As gravações, embora desprovidas de áudio, permitem verificar a movimentação corporal do acusado, especialmente no momento em que, após a revista, desfere um tapa no rosto da vítima. A nitidez da imagem, aliada à posição dos envolvidos e à ausência de reação da vítima no momento do tapa, permite concluir pela prática da injúria. No vídeo de ID 105765465, a viatura da polícia militar encosta na conveniência. Dela, desembarcam três policiais, permanecendo apenas o motorista, que manobra, estaciona a viatura e vai de encontro com os outros policiais. Toda a ação do acusado, objeto da denúncia, está registrada na filmagem de ID 105765464, é possível visualizar a mesma cena, da chegada da viatura, porém pelo lado de dentro da conveniência. Observa-se que o primeiro policial a adentrar no estabelecimento faz um gesto com a mão, indicando que a vítima deveria sair para fora. Nesse exato momento a vítima demonstra não entender o motivo da abordagem. Na mesma cena, é possível identificar três policiais no interior da conveniência, possivelmente o comandante e os dois patrulheiros, entre eles o acusado, enquanto o motorista ainda posicionava a viatura no lado de fora. Destaca-se também, que a filmagem registra a presença de ao menos duas pessoas no interior do estabelecimento. A sequência da abordagem, ocorre de forma mais agitada, a vítima aparenta estar nervoso e gesticula para os policiais que, decidem dar início à revista pessoal da vítima. A abordagem segue de forma mais incisiva: a vítima é revistada pelos policiais SGT PM Pisa e CB PM Barros, com uso de força física. É possível visualizar um chute desferido pelo acusado na perna da vítima e, logo em seguida, o tapa no rosto, momento em que a vítima já se encontrava com as mãos na cabeça, sem oferecer ameaça. Após o tapa, a vítima é conduzida para fora da conveniência. Nas imagens do ID 105765083, observa-se diálogo entre os policiais e a vítima, sem novo contato físico. A informante aparece trazendo uma mochila, que a vítima coloca sobre a viatura. Há movimentação em torno de objetos, possivelmente um celular, mas sem agressividade ou resistência por parte da vítima. Por fim, conforme mostra o ID 105765082, não houve elaboração de boletim de ocorrência, tendo a situação sido resolvida de forma verbal. A sincronia entre o relato e o conteúdo audiovisual confirmam os atos de violência. Não há dúvida quanto à autoria do ato físico ofensivo. O próprio acusado admitiu ter levado a mão ao rosto da vítima, e as imagens constantes dos autos permitem identificá-lo com clareza no momento em que desfere o tapa. A autoria também foi reconhecida expressamente pela Corregedoria da PMRO, conforme se extrai da Informação nº 307/2022/PM-CORREGDPJM, ao consignar que “foi possível verificar nitidamente no vídeo VID-20220917-WA0019.MP4, quando em dado momento da abordagem, o SD PM BARROS (Id 0034168065) deferiu um tapa no rosto da vítima imobilizada, na presença dos demais PPMM da guarnição e de civis dentro de um estabelecimento comercial.” O tipo penal de injúria real exige, como elemento subjetivo, o dolo específico de ofender a dignidade ou o decoro da vítima, consubstanciado no chamado animus injuriandi, o que a defesa tenta afastar. Todavia, entendo que o dolo encontra respaldo no conjunto probatório. Explico. O ato praticado consistiu em um tapa no rosto de civil imobilizado, em ambiente público e diante de terceiros, revelando carga humilhante e conteúdo evidentemente aviltante. A alegação defensiva de que o gesto foi reflexo instintivo, sem intenção de agredir ou menosprezar, não se sustenta diante das circunstâncias registradas: a vítima já se encontrava contida, sem oferecer risco real, e foi atingida no rosto, região comumente associada à ofensa moral. Soma-se a isso o fato de ter sido chamada de “vagabundo”, conforme relatado de forma firme e coerente tanto pela vítima quanto pela informante, o que reforça o caráter deliberado e ofensivo da conduta. Trata-se, portanto, de ato incompatível com uma mera reação defensiva, revelando, ao contrário, a intenção de menosprezar a vítima no contexto de uma abordagem desproporcional. A ação configura claramente o crime de injúria real, nos exatos termos narrados pela vítima e corroborados pelas imagens. A ação ocorreu no interior de estabelecimento comercial aberto ao público, durante a madrugada, momento em que havia circulação de pessoas, conforme demonstram as imagens constantes dos autos. A filmagem evidencia a presença de, ao menos, duas testemunhas civis no local, tanto dentro como fora, além dos demais policiais da própria guarnição, circunstância que confere à conduta caráter ainda mais aviltante, pois a agressão foi praticada de forma ostensiva, em ambiente público e na presença de terceiros, aumentando o constrangimento imposto à vítima. A conduta do acusado amolda-se ao tipo penal previsto no art. 217 do CPM (injúria real), na medida em que ofenderam a dignidade e o decoro da vítima durante a abordagem, praticando contra ela violência física. Vale citar a precisa lição do ilustre professor Enio Luiz Rosseto: "A injúria real se distingue da injúria simples pelo emprego de violência física ou de outro ato aviltante. É a forma mais grave entre os crimes contra a honra, pois há dupla objetividade jurídica: são protegidas a honra e a incolumidade física, pela punição da violência em concurso material [...] as vias de fato (empurrão, bofetada) integram a violência." (ROSSETO, Enio Luiz. Código Penal Militar Comentado. 2a ed. São Paulo, Revista dos Tribunais. 2015, p. 713). Salienta-se que a atuação da polícia militar, embora muitas vezes se dê em situações tensas e de risco, não autoriza o extrapolamento dos limites da legalidade. Ainda que a vítima estivesse exaltada ou resistisse verbalmente à abordagem, tal conduta, por si só, não legitima a adoção de meios abusivos, como o desferimento de tapa no rosto. O poder conferido ao agente estatal deve ser exercido dentro dos parâmetros da legalidade, da proporcionalidade e do respeito à dignidade da pessoa abordada, sob pena de a atuação policial, ao invés de preservar a ordem, violá-la. Não há de se interpretar, contudo, que para não sofrerem condenação, devam permanecer inativos e inertes, mas redobrar a observância das formalidades legais. Inclusive há casos em que a própria lei reconhece situações necessárias e aptas a excluir a ilicitude ou culpabilidade do agente, não alcançadas no caso concreto. Assim, a condenação é decorrência lógica. Diante da confirmação, pelas testemunhas, de que a contenção da vítima foi realizada exclusivamente pela guarnição da Força Tática, e da compatibilidade entre os vídeos e a narrativa apresentada pela vítima e pela informante, restam plenamente demonstradas a existência do fato, a autoria e o dolo específico do acusado na prática do delito previsto no art. 217 c/c art. 218, IV, do Código Penal Militar. POSTO ISTO, e por tudo mais que dos autos consta JULGO PROCEDENTE a pretensão punitiva do Estado deduzida na denúncia para o fim de CONDENAR o policial militar CB PM Rudinei Barros da Silva, qualificado nos autos, por infração a norma contida no artigo 217 c/c 218, inciso IV, c/c com artigo 9º, inciso II, alínea “c”, ambos do Código Penal Militar, o que tudo faço conforme as razões expostas na fundamentação acima. Passo a dosimetria da pena, seguindo as diretrizes do artigo 58, 69 (gravidade do crime praticado, personalidade do réu, maior ou menor extensão do dano ou perigo de dano, os meios empregados, o modo de execução, os motivos determinantes, as circunstâncias de tempo e lugar, os antecedentes dos réus e suas atitudes de insensibilidade, indiferença ou arrependimento após o crime) e seguintes do Código Penal Militar. A culpabilidade, entendida como o juízo de censurabilidade do fato, está evidenciada. O acusado, apesar de conter amotações em seus antecedentes, é tecnicamente primário (ID 108793206). Não há elementos nos autos indicativos da personalidade, presumindo-se, assim, que seja normal. A conduta social, à falta de outras informações desabonadoras, presume-se boa. Quanto à conduta funcional do acusado, possui comportamento ótimo, ostentando elogios e sem punição disciplinar (ficha individual ID 119540568). As demais circunstâncias são normais ao crime, constituindo, assim, a própria tipicidade. Nessas condições, não se verifica razão para exasperação da pena base. Sopesadas as circunstâncias judiciais, nada justifica elevar a pena base acima do mínimo legal, que fixo em 03 (três) meses de detenção. Inexiste atenuante, porém também subsiste em seu desfavor a agravante “estando de serviço” (art. 70, inciso II, alínea ‘l’ do CPM) razão pela qual elevo a reprimenda em , nos termos do art. 73, CPM, correspondente ao acréscimo de 18 (dezoito) dias, atingindo o patamar de 03 (três) meses e 18 (dezoito) dias de detenção. Não vislumbro causa diminuição, mas há causa de aumento de pena - art. 218, inciso IV, do Código Penal Militar, uma vez que o crime foi cometido na presença de terceiros, ensejando o aumento em , correspondente a 36 (trinta) e seis dias, para encontrar a pena de 04 (quatro) meses e 24 (vinte e quatro) dias de detenção a qual torno DEFINITIVA nesse patamar, ante a ausência de outras causas modificadoras. Regime inicialmente aberto domiciliar, nos termos do artigo 59 e 61, do Código Penal Militar, e orientação do STF (HC 104.174/RJ, 2a Turma, 29/03/2011, publicação: 18/05/2011). O regime aberto domiciliar, conforme reiteradas decisões dos tribunais superiores, é matéria pacificada. Neste sentido: TJRO no Agravo de Execução Penal no 0006869-10.2011.8.22.0000, 2a Câmara Criminal do TJRO, Rel. Daniel Ribeiro Lagos. j. 06.09.2011, unânime, DJe 13.09.2011; STF no Habeas Corpus no 82329/SP, 1a Turma do STF, Rel. Min. Sydney Sanches. j. 11.02.2003, unânime, DJU 11.04.2003) e STJ no AgRg no Habeas Corpus no 212259/RS (2011/0155803-3), 6a Turma do STJ, Rel. Sebastião Reis Júnior. j. 15.03.2012, unânime, DJe 16.04.2012. A fiscalização do regime aberto domiciliar será sem monitoração eletrônica, porém com visitas periódicas no endereço do acusado, para checar o cumprimento da pena. Da substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direito. Deixo de reconhecer a possibilidade de aplicar a regra do artigo 44, do CPB (substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direito) à legislação castrense, porque não existe previsão legal no CPM e CPPM, diferente do sursis (artigo 84, do CPM e 607, do CPPM). A lei comum, como é o CPB, só se aplica à legislação especial (CPM), se esta for omissa. Neste sentido, artigo 12, CP e 17 do CPM. A jurisprudência do STF é neste sentido: STF HC 91709, 1a turma, relatora Cármem Lúcia, julgado em 13/03/09; STF Rec. Extraordinário n. 273.900-6/SC, julg. 08/08/2000, Rel. Min. Sepúlveda Pertence. De forma semelhante: “(...) 4. Substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direito. Descabimento. A Lei no 9.178/94, que alterou o art. 44 do Código Penal comum, não modificou as leis especiais, tal como não modificou as leis especiais, tal como o Código Penal Militar. (...)” (AI 858175 AgR, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 28/05/2013, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-111 DIVULG 12-06-2013 PUBLIC 13-06-2013). Sursis. Cabível, pois preenchem os requisitos legais (art. 84 e 88, CPM). Diante das circunstâncias judiciais favoráveis, por entender que o réu não voltará a delinquir e tratando-se de delito punido com detenção, concedo a suspensão condicional da pena, por 02 (dois) anos, nos termos dos artigos 607 e 608, §§, CPPM, mediante as seguintes condições: 1) Não mudar de endereço sem comunicar ao Juízo; 2) Comparecimento pessoal e obrigatório em Juízo, bimestralmente, nos primeiros dez dias dos meses pares do ano; 3) Não deixar a comarca por mais de 60 dias sem autorização do Juízo a que estiver subordinado; 4) Manter comportamento honesto e compatível com a vida em comunidade. Se intimados, pessoalmente ou por edital, com prazo de 10 dias, não comparecerem os réus à audiência admonitória, a suspensão ficará sem efeito e será executada imediatamente a pena privativa de liberdade, salvo prova de justo impedimento (art. 612, CPPM). Faculta-se ao acusado o apelo em liberdade, porque nesta condição foi processado. No processo penal militar não comporta o recolhimento de custas, emolumentos ou selos (art. 712, CPPM). Com o trânsito em julgado, dê-se conhecimento à Corregedoria da Polícia Militar e também ao INI, TRE/RO – suspensão dos direitos políticos – art. 15, III, CF, etc., da presente sentença, para as anotações devidas, e expeça-se o necessário para execução de pena no Sistema Eletrônico de Execução Unificado – SEEU. Sentença publicada no diário da justiça para fins de intimação da defesa constituída. Intime-se o Ministério Público via sistema PJE. Após o trânsito em julgado, proceda às baixas, comunicações e anotações de estilo e arquive-se. Serve a presente SENTENÇA como MANDADO DE INTIMAÇÃO para que o acusado CB PM Rudinei Barros da Silva tome pleno conhecimento teor da sentença, assegurando-lhe ainda, caso deseje, o prazo de legal de 05 (cinco) dias para interpor eventual recurso contra a sentença. Em observância às diretrizes estabelecidas pela Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), a qualificação completa das pessoas a serem intimadas da sentença, bem como o endereço para cumprimento da intimação, encontra-se em anexo. Para a vítima, determino a expedição de mandado de intimação em apartado para que tome conhecimento apenas do dispositivo da sentença. À CPE, determino: 1. Proceda à intimação pessoal do Ministério Público via sistema (PJE) para fins de conhecimento acerca da presente sentença; 2. Considerando que a SENTENÇA serve como MANDADO DE INTIMAÇÃO para conhecimento dos acusados, proceda à distribuição junto à Central de Mandados para cumprimento acompanhada do respectivo anexo de endereços; 3. Expeça-se MANDADO DE INTIMAÇÃO em apartado para a vítima J. J. A. O., nele fazendo constar somente o dispositivo da sentença proferida, para conhecimento (endereço ID 116666700); 4. Aguarde-se o prazo do Ministério Público e Defesa quanto à interposição de eventual recurso, havendo recurso, concluso; 4. Inexistindo recurso, certifique-se o trânsito em julgado; 5. Após o trânsito em julgado e mantida a absolvição: a) Comunique-se ao IICC e à Corregedoria-Geral da PMRO. 6. Procedidas às comunicações, arquive-se. Porto Velho/RO, terça-feira, 22 de julho de 2025 Vitor Marcellino Tavares Da Silva Juiz de Direito
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