Processo nº 7003927-74.2025.8.22.0005
ID: 318620775
Tribunal: TJRO
Órgão: Ji-Paraná - 1º Juizado Especial
Classe: Procedimento do Juizado Especial da Fazenda Pública
Nº Processo: 7003927-74.2025.8.22.0005
Data de Disponibilização:
07/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
NILSON SOUZA SANTOS
OAB/RO XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RONDÔNIA Tribunal de Justiça de Rondônia Ji-Paraná - 1º Juizado Especial Avenida Brasil, nº 595, Bairro Nova Brasília, CEP 76908-594, Ji-Paraná, (69) 34112910 Processo: …
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RONDÔNIA Tribunal de Justiça de Rondônia Ji-Paraná - 1º Juizado Especial Avenida Brasil, nº 595, Bairro Nova Brasília, CEP 76908-594, Ji-Paraná, (69) 34112910 Processo: 7003927-74.2025.8.22.0005 Classe: Procedimento do Juizado Especial da Fazenda Pública Assunto: Adidos, Agregados e Adjuntos, Defeito, nulidade ou anulação, Tutela de Urgência REQUERENTE: PAULO CESAR SANTOS SOUZA, CPF nº 87784300204, RUA JOSÉ MESSIAS FILHO 205 COLINA PARK I - 76906-544 - JI-PARANÁ - RONDÔNIA ADVOGADO DO REQUERENTE: NILSON SOUZA SANTOS, OAB nº RO12984 REQUERIDO: ESTADO DE RONDONIA, AVENIDA FARQUAR 2986, - DE 2882 A 3056 - LADO PAR PEDRINHAS - 76801-470 - PORTO VELHO - RONDÔNIA ADVOGADO DO REQUERIDO: PROCURADORIA GERAL DO ESTADO DE RONDÔNIA SENTENÇA Relatório dispensado, nos termos do art. 38 da Lei n. 9.099/95 c/c art. 27 da Lei n. 12.153/09. Trata-se de ação anulatória de ato administrativo disciplinar proposta por Paulo Cesar Santos Souza em face do Estado de Rondônia, objetivando a nulidade do Processo Administrativo Disciplinar (PAD) que resultou na imposição de sanção disciplinar ao autor. O feito comporta julgamento antecipado, nos termos do art. 355, I, do CPC, por ser desnecessária a produção de outras provas, , considerando que a matéria controvertida é exclusivamente de direito e os fatos já estão suficientemente demonstrados pela prova documental. A parte autora alega, em síntese, a ocorrência de diversos vícios no PAD n.º 07/CORREGEBOM/2024, em especial: ausência de nexo funcional entre os fatos apurados e suas funções militares; parcialidade na condução do feito pela comissão processante; desconsideração de provas exculpatórias apresentadas em sua defesa; e falta de motivação adequada na decisão administrativa que lhe impôs a penalidade. Em razão dessas nulidades, requer a anulação do processo disciplinar e da sanção aplicada. Regularmente citado, o Estado de Rondônia contestou aduzindo a legalidade do procedimento disciplinar e a inexistência de vícios capazes de invalidá-lo. Alegou que o PAD observou os requisitos formais e materiais exigidos em lei, sustentando que o Poder Judiciário não pode se imiscuir no mérito do ato disciplinar militar, sob pena de violação da separação dos poderes e da hierarquia militar. I. DA POSSIBILIDADE DE CONTROLE JUDICIAL DO ATO DISCIPLINAR MILITAR Inicialmente, destaca-se que, embora as corporações militares estaduais (Polícia Militar e Corpo de Bombeiros Militar) possuam regime disciplinar próprio e os princípios da hierarquia e disciplina sejam basilares, isso não exclui a possibilidade de controle judicial de atos administrativos disciplinares. Com efeito, atos administrativos sancionatórios – inclusive os de natureza disciplinar militar – estão submetidos à lei e à Constituição, de modo que eventuais ilegalidades ou violações a direitos fundamentais no âmbito do PAD podem e devem ser apreciadas pelo Poder Judiciário. A propósito, o Superior Tribunal de Justiça consolidou recentemente entendimento sobre os limites e alcance do controle jurisdicional em matéria disciplinar, por meio da Súmula n. 665. Segundo o enunciado sumular, o Judiciário deve restringir-se ao exame da regularidade do procedimento e da legalidade do ato, à luz dos princípios do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal, sendo vedada a incursão no mérito administrativo, salvo em hipóteses excepcionais de flagrante ilegalidade, teratologia ou manifesta desproporcionalidade da sanção aplicada. Em outras palavras, não cabe ao juiz substituir a Administração na valoração disciplinar ou na escolha da pena, mas é seu dever anular ou corrigir o ato administrativo disciplinar quando identificados vícios que afrontem a legalidade ou os direitos do acusado – por exemplo, violação ao devido processo legal, ausência de contraditório e defesa, falta de motivação, parcialidade ou sanção evidentemente desproporcional. Esse entendimento sumulado alinha-se à evolução do Direito Administrativo contemporâneo, em que a noção de legalidade administrativa é ampliada para abarcar não apenas a conformidade com a lei em sentido estrito, mas também a observância dos princípios constitucionais que regem a Administração Pública. Nesse contexto, princípios como o da ampla defesa, do contraditório, do devido processo legal, da motivação, da isonomia, da proporcionalidade e outros derivados dos valores constitucionais possuem força normativa e integram o parâmetro de legalidade dos atos administrativos. Portanto, o controle judicial de um PAD militar deve verificar se tais princípios foram respeitados no caso concreto, sem que isso signifique indevida interferência no mérito disciplinar, mas sim garantia de que o ato punitivo atenda às exigências do Estado de Direito. Passo a examinar cada um desses pontos à luz da jurisprudência e da doutrina pertinente. II. DA ALEGADA VIOLAÇÃO À HIERARQUIA No caso, em análise dos autos, verifica-se que o PAD e a sindicância foram instaurados e conduzidos por superiores hierárquicos do autor, conforme prevê a estrutura disciplinar militar. A norma não exige que o responsável pela condução do procedimento tenha patente superior a todas as testemunhas ou a terceiros citados no processo. O oficial superior mencionado (Capitão, hoje Major) não era investigado, mas apenas ouvinte/testemunha no procedimento. A tese trazida pelo Estado, nesse ponto, encontra-se correta e, portanto, rejeita-se a alegação de nulidade com base nesse aspecto. III. DO NEXO FUNCIONAL E DA LEGALIDADE DA IMPUTAÇÃO DISCIPLINAR O primeiro vício a ser apontado no procedimento administrativo é a ausência de nexo funcional entre a conduta atribuída ao autor e o exercício de suas funções militares. Em sede disciplinar militar, é princípio basilar que somente comportamentos que violem deveres funcionais ou afetem a disciplina e o serviço militar possam ser tipificados como transgressões disciplinares. Ainda que o Estatuto Militar e o Código Penal Militar (art. 9º, inciso II, alínea “a”) enquadrem o militar da ativa — mesmo quando de folga, licenciado, trajando roupas civis e fora do quartel — para fins de tipificação penal, essa condição não autoriza a imputação disciplinar, sem que haja nexo funcional entre a conduta e a missão militar. É o exercício da função — e não a condição pessoal do agente — que legitima a aplicação do poder disciplinar. No caso concreto, verifica-se que o episódio ocorreu em âmbito estritamente familiar, em horário de folga e sua totalidade fora do quartel, sem qualquer conexão com atividades militares. Não houve manifestação de comportamento funcional ou disciplinares. Como se vê, o evento foi desvinculado do ambiente institucional, sem repercussão sobre o serviço, a disciplina ou a hierarquia militar. Trata-se, portanto, de fato sem nexo funcional, o que o torna formalmente pessoal e alheio ao exercício militar. Para efeito penal, o militar da ativa pode sim ser responsabilizado — ainda quando “fora de serviço” — por crime militar contra outro militar. No entanto, a disciplina interna exige nexo funcional, evidenciado pela prática infrativa no exercício da função ou em ato que se refira à atividade militar. Tal requisito não foi observado: a conduta decorreu do foro íntimo, sem qualquer relação com deveres, ordens ou atividades funcionais. Deve ser afastada a penalidade quando os elementos de convicção dos autos não permitirem concluir que houve descumprimento deliberado do dever funcional do servidor. Assim, a invocação do art. 9º do CPM não tem eficácia para impedir a anulação por ausência de nexo disciplinar, pois jamais se tratou de crime no exercício ou em razão da atividade militar. Ressalte-se que essa análise acerca da tipicidade disciplinar não significa invadir o mérito administrativo, mas sim verificar a legalidade da capitulação dada aos fatos pela Administração. Diversos precedentes admitem que o Poder Judiciário afaste punições disciplinares quando a conduta imputada não se enquadra nas hipóteses legais de infração, seja por atipicidade, seja – como alegado aqui – por inexistência de vínculo do fato com o exercício da função pública (o que poderíamos chamar de “atipicidade material” por falta de nexo funcional). Assim, reputo presente esse vício, o qual por si só já compromete a legitimidade do ato punitivo impugnado. IV. DA IMPARCIALIDADE NA CONDUÇÃO DO PAD E DA ISONOMIA PROCEDIMENTAL Outro ponto fulcral diz respeito à alegada parcialidade na condução do processo disciplinar, bem como tratamento desigual conferido à defesa do acusado (violação à isonomia entre acusação e defesa no PAD). É premissa indiscutível que o servidor (militar, no caso) tem direito subjetivo a ser processado livre de influências indevidas ou de pré-julgamentos. No devido processo, impõe-se que a instrução seja equilibrada, dando iguais oportunidades para acusação e defesa apresentarem provas e argumentos, e que o julgamento seja feito de forma neutra. Selecionar apenas as provas incriminatórias e desconsiderar as exculpatórias, ou negar à defesa meios de prova e contraditório efetivo, configura não só ofensa à ampla defesa, mas também quebra da isonomia e impessoalidade, na medida em que o acusado não recebeu o mesmo tratamento justo que a Administração dispensou à busca da punição. Verifica-se nos autos que houve valorização desproporcional do depoimento da vítima em relação aos relatos dos policiais militares, o que sugere possível desequilíbrio na análise probatória. O depoimento prestado pelo policial militar Odiley de Souza Dias — Chefe da guarnição que procedeu à abordagem — é elucidativo e corroborativo da tese de inocência funcional do autor. O militar afirmou em deu termo de depoimento ( ID 120558516 - pagina 100) que: "ao chegar ao local, o sindicado foi abordado de forma regular, sem resistência, sem profusão de ameaças, sem desacato verbal ou gestual. e que a expressão proferida pelo autor "não foram dirigidas a sua guarnição ou a um Militar especifico , que entende que foi mais uma forma de se expressar e falar por estar inconformado com a situação". Outrossim, o depoimento do policial militar Huanderson complementa, de forma inequívoca, a narrativa anterior sobre a lisura da conduta do autor. Segundo seus próprios termos, “em nenhum momento se sentiu constrangido, coagido ou intimidado pelo 1º Sargento” e “tão pouco sua guarnição foi destratada pelo mesmo”. A CB PM MAZALI (id 120558518 - pag. 62) relatou que: "encontrava-se de plantão na Viatura Tático 02 e quando estava chegando do Quartel do 2ºBPM passou pelo Sindicado e estranhou sua postura e semblante, momentos depois após a saída da Viatura daquela OPM a Central solicitou o retorno da Guarnição até a caixa d'água onde se encontrava o CAP PM FERNANDO SOUZA que deu a ordem para que realizassem a abordagem do Sindicado e que este estaria armado e embriagado, que naquele momento imaginou que pudesse se tratar de uma possível tentativa contra a própria vida ou de terceiros; Que realizaram a abordagem em frente ao Supermercado Irmãos Gonçalves na Avenida Marechal Rondon; Perguntado se o Sindicado ofendeu, difamou ou proferiu alguma ameaça contra a guarnição, respondeu que não, que em nenhum momento este ofereceu risco, perigo ou qualquer outra coisa fora do normal a todos da guarnição; Perguntado da postura do Sindicado após a chegada da segunda guarnição, respondeu que a Guarnição do Tático 01 chegou de forma enérgica e que a informação foi copiada pela rede rádio e que os membros da Guarnição não tinham conhecimento de todo teor da ocorrência, que ao chegarem foi realizada a abordagem de forma padrão e que pelo ímpeto empregado pela segunda guarnição foram exaltados os ânimos, mas que logo em seguida tornou-se a normalidade,". O depoimento do Sr. José Rodrigues de Oliveira (Num. 120558518 - Pág. 83), motorista de mototáxi que acompanhou o autor ao local, reforça a tese de inexistência de qualquer infração ou conduta agressiva por parte do autor. Conforme relatado, durante todo o trajeto, o autor não apresentou sinais de embriaguez, nem gesticulou de forma hostil. Ao chegar ao supermercado em frente à Avenida Marechal Rondon, o autor acatou todas as ordens da guarnição, sem demonstrar postura ofensiva ou intimidatória. Nesse contexto, é pacífica a jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça no sentido de que os depoimentos prestados por policiais têm valor probante, na medida em que seus atos são revestidos de fé pública, sobretudo quando se mostram coerentes e compatíveis com os demais elementos de prova dos autos. Veja-se: PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. TRÁFICO DE DROGAS. PRETENSÃO ABSOLUTÓRIA . ALEGADA INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. REVOLVIMENTO DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. SÚMULA N. 7/STJ . IMPOSSIBILIDADE. DEPOIMENTOS DOS POLICIAIS CORROBORADOS POR OUTROS ELEMENTOS DE PROVAS. VALOR PROBANTE. OFENSA AO ART . 155 DO CPP. NÃO CONFIGURADA. CONDENAÇÃO LASTREADA EM ELEMENTOS SUBMETIDOS AO CRIVO DO CONTRADITÓRIO JUDICIAL. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO . 1. No que concerne à pretensão absolutória, extrai-se do acórdão recorrido que o Tribunal de origem concluiu, com amparo em farto acervo de fatos e provas constante dos autos, notadamente diante do auto de apreensão, do auto de constatação provisória de substância entorpecente, do boletim unificado, do laudo definitivo de exame em substância, da prisão do recorrente em flagrante delito, em local conhecido como ponto de intenso comércio de drogas, dos depoimentos dos policiais, tanto na fase inquisitiva quanto na judicial, e a partir da ponderação das circunstâncias do delito - apreensão de 16, 4g (dezesseis gramas e quatro decigramas) de cocaína, fracionadas em 4 (quatro) papelotes, além da apreensão de dinheiro em espécie, em poder do recorrente, totalizando R$ 360,00 (trezentos e sessenta reais) -, que a autoria e materialidade do delito de tráfico de drogas ficaram suficientemente demonstradas (e-STJ fls. 215/218). 2 . Nesse contexto, inviável, no caso em tela, entender de modo diverso, dada a necessidade de reexame de elementos fático-probatórios, vedado nesta via recursal. Incidência do óbice da Súmula n. 7/STJ. 3 . Ademais, conforme asseverado pelas instâncias ordinárias, a prática do delito pelo recorrente foi devidamente comprovada por elementos de prova colhidos na fase investigativa, e corroborados pela prova testemunhal colhida na fase judicial, circunstância que afasta a alegada violação do art. 155, do CPP. 4. Outrossim, é pacífica a jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça no sentido de que os depoimentos prestados por policiais têm valor probante, na medida em que seus atos são revestidos de fé pública, sobretudo quando se mostram coerentes e compatíveis com os demais elementos de prova dos autos, e ausentes quaisquer indícios de motivos pessoais para a incriminação injustificada do investigado, como na espécie . Precedentes. 5. Agravo regimental não provido.(STJ - AgRg no AREsp: 1997048 ES 2021/0336495-0, Relator.: Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, Data de Julgamento: 15/02/2022, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 21/02/2022) - Destaquei. Em síntese, não se constatou qualquer tipo de infração disciplinar ou penal pela autoridade policial, fato que reforça, substancialmente, a tese de cerceamento da defesa e valoração seletiva das provas no PAD e motivação deficiente, impondo a sua anulação. V. DO CONTRADITÓRIO SUBSTANCIAL E DA CONSIDERAÇÃO DAS PROVAS A Constituição Federal, em seu art. 5º, inciso LV, assegura aos acusados em geral o contraditório e ampla defesa nos processos judiciais e administrativos. Tais garantias significam não apenas que o investigado possa formalmente apresentar defesa, mas principalmente que ele tenha oportunidade efetiva de influenciar o convencimento da autoridade julgadora – o que a doutrina e a jurisprudência denominam “contraditório substancial”. Em outras palavras, não basta franquear ao acusado o direito de falar; é necessário ouvi-lo de verdade, considerar seriamente seus argumentos e provas antes da decisão. No PAD impugnado, a parte autora sustenta que houve cerceamento de defesa, pois as provas por ela apresentadas, de caráter exculpatório, não teriam sido consideradas ou valoradas pela comissão. Verifica-se que, no caso, não houve manifestação sobre as provas trazidas pela defesa (depoimentos dos militares), o que configura-se violação ao contraditório e à ampla defesa. Deixar de considerar provas de defesa sem justificativa equivale a negar ao acusado o direito de se defender de forma ampla e vicia a motivação da decisão, por omitir parte do acervo probatório. A jurisprudência é pacífica ao afirmar: REEXAME NECESSÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. NULIDADE DE ATO ADMINISTRATIVO. SERVIDORA PÚBLICA . PENA DE SUSPENSÃO. AUSÊNCIA DE NOTIFICAÇÃO. PROCEDIMENTO QUE NÃO OBSERVOU OS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA AMPLA DEFESA E DO CONTRADITÓRIO. NULIDADE EVIDENCIADA . É nulo o ato administrativo que pune servidor público, em processo disciplinar que deixa de observar os princípios do contraditório e da ampla defesa, consagrados no artigo 5º., inciso LV da Constituição Federal. LESÃO A DIREITO LÍQUIDO E CERTO CONFIGURADA. SEGURANÇA CONCEDIDA . SENTENÇA CONFIRMADA EM GRAU DE REEXAME NECESSÁRIO.(TJ-PR 7747277 PR 774727-7 (Acórdão), Relator.: Abraham Lincoln Calixto, Data de Julgamento: 07/02/2012, 4ª Câmara Cível) - Destaquei. APELAÇÃO – AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE ATO ADMINISTRATIVO C/C INDENIZATÓRIA POR DANOS MATERIAIS E MORAIS - Servidora Pública Municipal – Técnica de Enfermagem – Pretensão à anulação do procedimento administrativo disciplinar nº 06/2019, que culminou na demissão a bem do serviço público, bem como, de que seja indenizada por danos materiais e morais – Sentença de improcedência – Decisão que merece reforma - Cerceamento de defesa que autoriza a anulação do processo administrativo pelo Poder Judiciário - O Controle jurisdicional dos processos administrativos disciplinares se limita à observância do procedimento, à luz dos princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, vedado o exame do mérito administrativo. Portaria de instauração do procedimento disciplinar genérica que apenas elencou dispositivos legais, sem descrever fatos e condutas dos investigados – Ausência de individualização da conduta da autora durante todo o processo administrativo disciplinar, que redunda na inobservância das garantias constitucionais à ampla defesa e ao contraditório – Prejuízo à defesa configurado – Processo administrativo disciplinar anulado – Reintegração ao cargo e pagamento de remuneração durante o período em que restou afastada que se impõem – Danos morais não configurados – Precedentes desta E. Corte Bandeirante - Decisão reformada em parte. Recurso provido, em parte .(TJ-SP - AC: 10020423220208260510 SP 1002042-32.2020.8.26 .0510, Relator.: Danilo Panizza, Data de Julgamento: 25/02/2022, 1ª Câmara de Direito Público, Data de Publicação: 25/02/2022) - Destaquei. Constata-se que o julgamento administrativo priorizou as evidências incriminatórias em detrimento das exculpatórias. Destaca-se que o depoimento do próprio SGT PM Odiley (ID 120558516 - pagina 100), no qual esclareceu que suas expressões não foram dirigidas à guarnição, nem a qualquer militar específico, mas expressavam apenas descontentamento pela situação, foi totalmente ignorado — inclusive no julgamento de pedido de reconsideração (id 120558515). Tal procedimento pode caracterizar violação ao princípio da valoração lógica e imparcial da prova. Tal conduta compromete a integridade da instrução e revela que o contraditório foi meramente formal, não substancial. O devido processo legal exige que haja paridade de armas na colheita e análise da prova: se a Administração colige provas contra o servidor, deve igualmente admitir e sopesar as provas por ele produzidas em contrário, fundamentando de forma clara as razões de eventual desconsideração. A motivação da decisão deve refletir que os argumentos e provas da defesa foram examinados; a inexistência dessa análise configura omissão decisória e afronta o artigo 50 da Lei Federal nº 9.784/99 (que impõe a motivação expressa, clara e congruente dos atos administrativos). Portanto, restando demonstrado que provas potencialmente exculpatórias foram indevidamente desprezadas – sem qualquer contrarrazão ou análise no julgamento –, impõe-se reconhecer a nulidade do julgamento administrativo por cerceamento de defesa. VI. DA MOTIVAÇÃO DOS ATOS ADMINISTRATIVOS DISCIPLINARES A exigência de motivação das decisões administrativas, especialmente daquelas de cunho sancionatório, é hoje princípio assentado tanto na legislação quanto na jurisprudência pátria. Todo ato que impõe uma sanção disciplinar deve vir acompanhado da exposição clara dos motivos que levaram à punição – isto é, a indicação dos fatos apurados, das provas colhidas, da norma violada e das razões pelas quais se entendeu adequada a aplicação daquela penalidade. A motivação é corolário do devido processo legal substantivo e da transparência na Administração, permitindo ao interessado conhecer as razões da sua punição e viabilizando o controle (administrativo ou judicial) da legalidade do ato. No caso concreto, aponta-se que o Julgamento do PAD (120558515 - p.193-198) limitou-se a repetir termos genéricos, sem enfrentar pontos cruciais da defesa apresentada nem explicitar de forma suficiente a correlação entre os fatos e a sanção aplicada. Essa deficiência de motivação, além de violar o art. 50 da Lei 9.784/99 (lei geral do processo administrativo, de aplicação supletiva), afronta diretamente o princípio da publicidade/motivação insculpido no art. 37 da CF/88 e os direitos do administrado à informação e à defesa. A jurisprudência classifica a ausência ou insuficiência de motivação como vício grave do ato administrativo. Tanto é assim que o próprio verbete da Súmula 665/STJ, já citado, inclui como exemplo de situação teratológica que autoriza a incursão judicial no mérito aparente do ato, para fins de anulá-lo. Em outras palavras, se a autoridade aplica uma sanção sem fundamentar adequadamente o porquê daquela decisão, tal ato é arbitrário e padecerá de legalidade, legitimando sua invalidação pelo Judiciário. Afinal, a motivação deficiente impede verificar se a sanção decorreu de uma análise objetiva e imparcial dos fatos, ou se foi fruto de capricho, perseguição ou erro. A esse respeito, verifica-se jurisprudência: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE - PROCON - APLICAÇÃO DE MULTA - SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA - ANÁLISE DA LEGALIDADE E LEGITIMIDADE DO ATO ADMINISTRATIVO PELO PODER JUDICIÁRIO - SOLICITAÇÃO DE CONTRATO DE FINANCIAMENTO E PEDIDO DE REVISÃO DAS CLÁUSULAS PELO RECLAMANTE - DECISÃO ADMINISTRATIVA GENÉRICA E BASEADA NA FALSA PREMISSA DA NÃO APRESENTAÇÃO DO CONTRATO PELA RECLAMADA - VIOLAÇÃO AO DEVIDO PROCESSO LEGAL ADMINISTRATIVO - DEVER DE MOTIVAÇÃO E CONTRADITÓRIO SUBSTANCIAL NÃO OBSERVADOS - FUNDAMENTAÇÃO INSUFICIENTE DA DECISÃO ADMINISTRATIVA - NULIDADE - REFORMA DA SENTENÇA - JULGAMENTO DE PROCEDÊNCIA - PROVIMENTO DA APELAÇÃO. Cabe ao Poder Judiciário a análise de legalidade e legitimidade do ato administrativo, de acordo com as normas e princípios atinentes à matéria, sem se imiscuir no mérito da decisão administrativa relativo à conveniência, oportunidade ou justiça do pronunciamento da autoridade, sob pena de ingerência na atuação do Poder Executivo. O art. 5º, inciso LV, da CF/88, assegura aos litigantes, em processo judicial e administrativo e aos acusados em geral, a ampla defesa e o contraditório, devendo este ser observado não apenas em sua acepção formal, mas também substancial, revelando o direito de influência nas decisões. A presença de fundamentação genérica, sem a subsunção da conduta perpetrada à norma sancionadora viola o dever de motivação (TJPB - ACÓRDÃO/DECISÃO do Processo Nº 00624397920148152001, 1ª Câmara Especializada Cível, Relator DESA. MARIA DE FÁTIMA MORAES BEZERRA CAVALCANTI, j. em 21-05-2019)(TJ-PB 00624397920148152001 PB, Relator.: DESA. MARIA DE FÁTIMA MORAES BEZERRA CAVALCANTI, Data de Julgamento: 21/05/2019, 1ª Câmara Especializada Cível) - Destaquei. No presente caso, a falta de motivação adequada se revela, por exemplo, na não explicação sobre a desconsideração das provas de defesa (conforme já mencionado) e na ausência de indicação precisa de como o comportamento do autor configurou transgressão grave a ponto de justificar a sanção aplicada. Essa lacuna impede até mesmo aferir se a penalidade foi proporcional, já que não há fundamentação que pondere a gravidade dos fatos, a eventual existência de "dolo" etc. Portanto, resta caracterizado também esse vício, que, à luz da jurisprudência e da doutrina, conduz à nulidade do ato administrativo disciplinar por falta de motivação. No caso apresentado, o servidor foi punido com 8 dias de prisão disciplinar e perda de 4 pontos de comportamento funcional, com base em um PAD que carece de motivação adequada. A decisão administrativa limitou-se a reproduzir o relatório da sindicância, sem enfrentar os elementos exculpatórios apresentados pela defesa, como os depoimentos dos policiais militares que atenderam à ocorrência e declararam que o autor não apresentou resistência, não proferiu ameaças. Essa ausência de análise crítica das provas e de fundamentação adequada configura vício de forma, tornando o ato administrativo nulo. VII. DA PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE DA SANÇÃO DISCIPLINAR O princípio da proporcionalidade (e seu corolário, o da razoabilidade) vincula a Administração Pública na medida em que exige que as penalidades impostas sejam adequadas, necessárias e proporcionais em sentido estrito em relação à falta cometida. Em termos simples, a pena disciplinar deve guardar justa medida: nem excesso (punindo além do que a gravidade do fato comporta) nem leniência indevida. No âmbito militar, reconhece-se a necessidade de rigor na manutenção da disciplina. Contudo, isso não legitima sanções desarrazoadas ou manifestamente exageradas frente à conduta do servidor. A isonomia também exerce papel aqui, pois a proporcionalidade implica punir casos semelhantes com medidas equivalentes, evitando disparidades injustificadas. No caso sub examine, considerando-se os vícios materiais apontados (falta de nexo funcional, fragilidade da prova, etc.), é possível que a sanção aplicada – cuja natureza exata não foi informada nos autos – tenha sido desproporcional. Nesse sentido: Ementa: RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. DIREITO ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. PROCESSO ADMINISTRATIVO . ALEGAÇÃO DE CERCEAMENTO DE DEFESA. IMPROCEDÊNCIA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE PREJUÍZO. PENA DE DEMISSÃO . IMPOSIÇÃO. NÃO OBSERVÂNCIA DOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. ABSOLVIÇÃO DO RECORRENTE NO ÂMBITO PENAL. PENALIDADE DESCONSTITUÍDA . RECURSO PROVIDO. 1. Os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade devem nortear a Administração Pública como parâmetros de valoração de seus atos sancionatórios, por isso que a não observância dessas balizas justifica a possibilidade de o Poder Judiciário sindicar decisões administrativas. 2 .(...) ; e) Consoante disposto no artigo 128 da Lei nº 8 .112/90, na aplicação da sanção ao servidor devem ser observadas a gravidade do ilícito disciplinar, a culpabilidade do servidor, o dano causado ao erário, as circunstâncias agravantes ou atenuantes e os antecedentes funcionais. Em outras palavras, a referida disposição legal impõe ao administrador a observância dos postulados da proporcionalidade e da razoabilidade na aplicação de sanções; f) A absolvição penal, que, in casu, ocorreu, nem sempre vincula a decisão a ser proferida no âmbito administrativo disciplinar, sendo certo que não há comprovação, no caso sub judice, da prática de qualquer falta residual de gravidade ímpar capaz de justificar a sua demissão; g) Na hipótese dos autos, conforme o relatório do Processo Administrativo Disciplinar, o recorrente teria, supostamente, facilitado a liberação de documentos aos interessados na aquisição de cadastros de terras públicas, em razão de sua influência, mesmo estando afastado de suas atribuições originárias; h) Mercê de o delito acima, que é grave, não ter sido comprovado no âmbito Penal, não se tem notícia da prática de outros atos irregulares por parte do recorrente, podendo-se afirmar que se trata de servidor público possuidor de bons antecedentes, além de detentor de largo tempo de serviço prestado ao Poder Público; i) Ex positis, dou provimento ao presente recurso ordinário em mandado de segurança para desconstituir a pena de demissão cominada a Ermino Moraes Pereira e determinar sua imediata reintegração ao quadro do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária INCRA. 5. Recurso ordinário em mandado de segurança provido para desconstituir a penalidade de demissão imposta ao ora recorrente .(STF - RMS: 28208 DF, Relator.: Min. LUIZ FUX, Data de Julgamento: 25/02/2014, Primeira Turma, Data de Publicação: ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-055 DIVULG 19-03-2014 PUBLIC 20-03-2014) - Destaquei. Em suma, a análise conjunta dos princípios da motivação e da proporcionalidade conduz à conclusão de que a decisão disciplinar, para ser válida, precisa demonstrar de forma motivada a gravidade da infração e a adequação da pena escolhida. Na ausência disso, ou havendo disparidade chocante entre a falta e a punição, o ato sancionador não se sustenta no ordenamento vigente. VIII. DA DESCONSIDERAÇÃO DE PROVAS EXCULPATÓRIAS A análise dos autos revela valoração seletiva das provas, priorizando exclusivamente os elementos incriminatórios em detrimento de depoimentos exculpatórios prestados pelos próprios agentes que realizaram a abordagem do autor. A desconsideração sistemática dessas provas exculpatórias, sem fundamentação adequada, configura violação aos princípios da motivação, imparcialidade e devido processo legal, viciando irreparavelmente a decisão administrativa. A situação torna-se ainda mais grave quando o enquadramento disciplinar se funda em comportamento supostamente “grave” — em razão do Decreto n.º 13.255/2007, art. 17, XXXII — por “fazer ameaça a outro policial militar”. Tal infração deveria exigir prova robusta e inequívoca de ameaça e intenção agressiva. Todavia, a análise unilateral e superficial dos depoimentos — sem respaldo em prova objetiva, como filmagens, ou em testemunhas idôneas — impede qualquer conclusão segura acerca da presença dos requisitos fáticos necessários à configuração da transgressão disciplinar. Dessa forma, a valoração seletiva do depoimento da vítima, em detrimento de outras evidências que atestam a ausência de ameaça, de desacato ou de uso indevido de arma, reforça a tese de nulidade por vício na motivação, cerceamento de defesa e ausência de base fática adequada para enquadramento disciplinar grave. No caso concreto, não há nos autos elementos que demonstrem, de forma segura e inequívoca, que a conduta do autor tenha configurado ameaça idônea a incutir verdadeiro temor à suposta vítima, seu irmão e então superior hierárquico. A mera alegação de desentendimento verbal, sem que tenha havido, apontamento de arma ou manifestação concreta de intenção lesiva, não é suficiente para caracterizar a conduta de ("ameaçar alguém, por palavra ou gesto, de causar-lhe mal injusto e grave"). Desse modo, ausente a comprovação de dolo específico ou de conduta objetivamente lesiva à segurança, à ordem ou à hierarquia militar, inexiste substrato fático suficiente para sustentar o enquadramento disciplinar. Tais defeitos, isoladamente, já seriam suficientes para anular o processo disciplinar e, em conjunto, reforçam ainda mais a conclusão de invalidade do ato administrativo disciplinar. Diante de todo o exposto, restou evidenciado que o PAD impugnado padeceu de múltiplas nulidades: (a) vício de motivo e de finalidade, por punir conduta sem relação funcional com o serviço público militar; (b) vício de imparcialidade, pela condução tendenciosa e não equidistante do feito, ferindo a isonomia e a impessoalidade; (c) vício de cerceamento de defesa, pela inobservância do contraditório substancial e pela desconsideração imotivada de provas apresentadas pelo acusado; e (d) vício de forma/motivação, pela ausência de fundamentação adequada e congruente na decisão sancionadora. Assim, da análise conjunta dos elementos probatórios constantes nos autos, conclui-se que: I – Art. 15, I (transgressão leve) – não há qualquer evidência de conduta inconveniente, desrespeitosa ou em desacordo com normas sociais. As testemunhas não confirmaram postura inadequada ou falta de decoro. Ao contrário, os depoimentos reforçam comportamento dentro da normalidade, sem descaso às convenções sociais. II – Art. 17, XII (ofensa, provocação ou desafio) – ainda que tenha sido narrado episódio envolvendo proferimento de xingamentos (“...jogou as chaves e disse ‘vai tomar no cú’...”), tal conduta foi descrita como desabafo emocional, sem indicação de hostilidade funcional, nem de direcionamento a militar específico. A condição emocional do autor no momento não evidencia intenção imprópria, mas reação pessoal. Não há nos autos qualquer evidência de que o autor tenha desafiado intencionalmente outro militar, sacado arma com finalidade de ameaçar ou exercido gesto de hostilidade direcionado – elementos necessários à configuração das transgressões previstas nos arts. 17, XII e 17, XXXII, do Decreto n.º 13.255/2007. III – Art. 17, XXXII (ameaça a outro policial militar) – inexiste comprovação de ameaça idônea à vítima, irmão do autor. Vale destacar que a denúncia não descreve qual teria sido a conduta ameaçadora, nem os termos específicos da suposta ameaça, o que a torna genérica e desprovida de elemento objetivo mínimo para a sua caracterização. A única narrativa de medo foi vaga, não qualificada, não indicando quando, como, nem por qual motivo teria havido ameaça. Isso inviabiliza qualquer enquadramento no art.17, XXXII, do Regulamento Disciplinar. IX - DISPOSITIVO Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido inicial, para DECLARAR a NULIDADE do Processo Administrativo Disciplinar n.º 07/CORREGEBOM/2024 e de todos os autos dele decorrentes. Determino o restabelecimento da plena situação funcional do autor, com a imediata exclusão da penalidade imposta e o retorno de seus direitos e vantagens funcionais como se inexiste a sansão disciplinar ora invalidadas. Defiro a gratuidade de Justiça ao autor. Sem custas processuais e honorários advocatícios, nos termos do artigo 55, caput, da Lei n. 9.099/95. Transitada em julgado, arquivem-se. SERVE A PRESENTE COMO CARTA AR / MANDADO / OFÍCIO E/OU CARTA PRECATÓRIA. Ji-Paraná/RO, 6 de julho de 2025. Ana Lucia Mortari Juíza Substituta
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