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Processo nº 5001926-46.2024.4.03.6344

ID: 324078650

Tribunal: TRF3 Órgão: 2º Núcleo de Justiça 4.0 Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL Nº Processo: 5001926-46.2024.4.03.6344

Data de Disponibilização: 14/07/2025

Polo Ativo:

EDMUNDO DE OLIVEIRA NETO

Polo Passivo:

Sentença

Advogados:

PRISCILLA MEDEIROS DE ARAUJO BACCILE

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO 2º Núcleo de Justiça 4.0 Informações em https://www.trf3.jus.br/justica-40 https://www.trf3.jus.br/balcao-virtual PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL (436) Nº 5001926-46.2024.4.03… PODER JUDICIÁRIO 2º Núcleo de Justiça 4.0 Informações em https://www.trf3.jus.br/justica-40 https://www.trf3.jus.br/balcao-virtual PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL (436) Nº 5001926-46.2024.4.03.6344 AUTOR: EDMUNDO DE OLIVEIRA NETO ADVOGADO do(a) AUTOR: PRISCILLA MEDEIROS DE ARAUJO BACCILE - SP483220 REU: UNIÃO FEDERAL SENTENÇA Trata-se de ação proposta por EDMUNDO DE OLIVEIRA NETO em face da UNIÃO FEDERAL, em que requer implantação em folha de pagamento do Bônus de Eficiência previsto na Lei n. 13.464/2017, de forma integral, com pagamento de atrasados. Dispensado o relatório pelo artigo 38 da Lei n. 9.099/95 c/c art. 1º da Lei n. 10.259/01. Os Núcleos de Justiça 4.0 da Justiça Federal da 3ª Região são competentes em razão da matéria para processar e julgar o feito, conforme previsto no art. 33 do Provimento CJF3R n. 103, de 2024. No mesmo sentido, o valor da causa não ultrapassa a alçada prevista no art. 3°, § 2°, da Lei 10.259/01. Assim, afirmo a competência deste Núcleo de Justiça 4.0 da Justiça Federal da 3ª Região para processar e julgar a presente demanda. Afasto a prevenção. Dentre os feitos indicados na certidão (id 331362430), verifico que os processos n. 5025518-17.2020.4.03.6100 (adicional de periculosidade), n. 0003067-30.2020.4.03.6344 (abono de permanência) e n. 5001831-21.2021.4.03.6344 (pagamento em pecúnia) objetivavam provimentos jurisdicionais diversos do presente feito, conforme comprovam os documentos apresentados pelo autor no id 332230607. Por sua vez, embora o processo n. 5000939-18.2024.4.03.6309, detenha as mesmas partes, pedido e causa de pedir do presente feito, verifico que o feito foi extinto sem resolução do mérito por incompetência territorial, a teor da sentença (id 332230619) e respectiva certidão de trânsito em julgado (id 332230620). Rejeito a arguição de incompetência do Juizado Especial Federal, tendo em vista que o autor renunciou expressamente, na petição inicial, ao excedente a 60 (sessenta) salários mínimos. Considero prescritas as prestações vencidas antes dos 05 (cinco) anos que antecederam a propositura da presente ação, na forma do disposto na Súmula 85/STJ. Rejeito também a preliminar de suspensão do feito em razão da afetação do Tema 332/TNU, tendo em vista que a Turma Nacional de Uniformização julgou o caso em 07/08/2024, não mais remanescendo necessidade de suspensão. No mérito, narra o autor que é servidor aposentado no cargo de auditor fiscal do Trabalho, e que tem recebido o bônus de eficiência previsto em lei em valor inferior ao devido, proporcionalmente ao tempo de inatividade, por se tratar de servidor aposentado. Alega que o pagamento do referido bônus é condicionado a realização de avaliações de eficiência que ainda não foram implementadas, e por isso tem sido paga em parcela igual a todos os servidores da ativa, razão pela qual deve ser extensivo aos aposentados e pensionistas, até que seja implementada a forma de mensuração da produtividade na forma prevista pela lei. Citada, a UNIÃO alegou que o bônus de eficiência possui natureza jurídica de adicional remuneratório em função de resultados laborais, argumentando acerca do caráter pro labore faciendo do bônus de eficiência. Arguiu a ausência de direito à paridade. Da paridade entre ativos e inativos no serviço público O direito à paridade entre servidores ativos e inativos, consistente na revisão de vencimentos em proporções iguais entre tais servidores, se encontrava previsto no § 8º do artigo 40 da Constituição Federal, com redação dada pela Emenda Constitucional n. 20/1998: § 8º Observado o disposto no art. 37, XI, os proventos de aposentadoria e as pensões serão revistos na mesma proporção e na mesma data, sempre que se modificar a remuneração dos servidores em atividade, sendo também estendidos aos aposentados e aos pensionistas quaisquer benefícios ou vantagens posteriormente concedidos aos servidores em atividade, inclusive quando decorrentes da transformação ou reclassificação do cargo ou função em que se deu a aposentadoria ou que serviu de referência para a concessão da pensão, na forma da lei. A disposição constitucional foi alterada pela Emenda Constitucional n. 41/2003, mantendo-se paridade àqueles que à época já ostentavam a condição de aposentados ou tinham preenchido os requisitos para a aposentação: § 8º É assegurado o reajustamento dos benefícios para preservar-lhes, em caráter permanente, o valor real, conforme critérios estabelecidos em lei. Mais tarde, com o advento da Emenda Constitucional n. 47/2005, a paridade foi estendida àqueles que se submetiam às regras de transição do artigo 6º da Emenda Constitucional n. 41/2003 e do artigo 3º da própria Emenda Constitucional n. 47/2005, ficando assim previsto na EC 41: Art. 7º Observado o disposto no art. 37, XI, da Constituição Federal, os proventos de aposentadoria dos servidores públicos titulares de cargo efetivo e as pensões dos seus dependentes pagos pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios, incluídas suas autarquias e fundações, em fruição na data de publicação desta Emenda, bem como os proventos de aposentadoria dos servidores e as pensões dos dependentes abrangidos pelo art. 3º desta Emenda, serão revistos na mesma proporção e na mesma data, sempre que se modificar a remuneração dos servidores em atividade, sendo também estendidos aos aposentados e pensionistas quaisquer benefícios ou vantagens posteriormente concedidos aos servidores em atividade, inclusive quando decorrentes da transformação ou reclassificação do cargo ou função em que se deu a aposentadoria ou que serviu de referência para a concessão da pensão, na forma da lei. Por sua vez, a Emenda Constitucional n. 47/2005, em seus artigos 2º e 3º, parágrafo único, alargou a paridade para os casos em que as aposentadorias ou pensões fossem concedidas de acordo com as regras de transição consagradas no artigo 6º da Emenda 41/2003 e no artigo 3º da própria Emenda 47/2003. Confira-se: Art. 2º Aplica-se aos proventos de aposentadorias dos servidores públicos que se aposentarem na forma do caput do art. 6º da Emenda Constitucional nº 41, de 2003, o disposto no art. 7º da mesma Emenda. Art. 3º Ressalvado o direito de opção à aposentadoria pelas normas estabelecidas pelo art. 40 da Constituição Federal ou pelas regras estabelecidas pelos arts. 2º e 6º da Emenda Constitucional nº 41, de 2003, o servidor da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações, que tenha ingressado no serviço público até 16 de dezembro de 1998 poderá aposentar-se com proventos integrais, desde que preencha, cumulativamente, as seguintes condições: I - trinta e cinco anos de contribuição, se homem, e trinta anos de contribuição, se mulher; II - vinte e cinco anos de efetivo exercício no serviço público, quinze anos de carreira e cinco anos no cargo em que se der a aposentadoria; III - idade mínima resultante da redução, relativamente aos limites do art. 40, § 1º, inciso III, alínea "a", da Constituição Federal, de um ano de idade para cada ano de contribuição que exceder a condição prevista no inciso I do caput deste artigo. Parágrafo único. Aplica-se ao valor dos proventos de aposentadorias concedidas com base neste artigo o disposto no art. 7º da Emenda Constitucional nº 41, de 2003, observando-se igual critério de revisão às pensões derivadas dos proventos de servidores falecidos que tenham se aposentado em conformidade com este artigo. Desta forma, prevalece atualmente o entendimento de que os benefícios e vantagens devidos a servidores ativos, estendem-se aos inativos, desde que se tratem daqueles de natureza genérica, ou seja, os que não exijam qualquer requisito individualizado para sua concessão. Do Programa de Produtividade da Receita Federal do Brasil e o Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade Tributária e Aduaneira A Lei n. 13.464/17, que dispõe, dentre outros, sobre a carreira e remuneração de servidores federais, instituiu o bônus de eficiência e produtividade na atividade de Auditoria-Fiscal do Trabalho, conforme descrito em seu artigo 6º: Art. 16. São instituídos o Programa de Produtividade da Auditoria-Fiscal do Trabalho e o Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade de Auditoria-Fiscal do Trabalho, com objetivo de incrementar a produtividade nas áreas de atuação dos ocupantes do cargo de Auditor-Fiscal do Trabalho. Verifica-se que a referida vantagem pecuniária está diretamente condicionada ao incremento da produtividade nas áreas de atuação a que se destina, sendo que a lei, nos parágrafos seguintes do mesmo artigo, também prevê a forma de mensuração: § 1º O Programa de que trata o caput deste artigo será gerido pelo Comitê Gestor do Programa de Produtividade da Auditoria-Fiscal do Trabalho, composto de representantes do Ministério do Trabalho, do Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão e da Casa Civil da Presidência da República, nos termos a serem definidos em ato do Poder Executivo federal. § 2º O valor global do Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade de Auditoria-Fiscal do Trabalho será definido pelo índice de eficiência institucional, mensurado por meio de indicadores de desempenho e metas estabelecidos nos objetivos ou no planejamento estratégico do Ministério do Trabalho. § 3º Ato do Comitê Gestor do Programa de Produtividade da Auditoria-Fiscal do Trabalho será editado no prazo de 60 (sessenta) dias, contado da data de entrada em vigor da Medida Provisória nº 765, de 29 de dezembro de 2016 , o qual estabelecerá a forma de gestão do Programa e a metodologia para a mensuração da produtividade global da Secretaria de Inspeção do Trabalho e da rede descentralizada de atendimento no exercício da Atividade de Auditoria-Fiscal do Trabalho e fixará o índice de eficiência institucional. § 4º O valor global do Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade de Auditoria-Fiscal do Trabalho a ser distribuído aos beneficiários do programa corresponde à multiplicação da base de cálculo do Bônus pelo índice de eficiência institucional. O texto legal indica ser necessária a mensuração para se obter o valor devido a título do referido bônus, estabelecendo que se trata de vantagem individualizada, uma vez que variável conforme a produtividade de cada servidor: Art. 17. Os ocupantes do cargo de Auditor-Fiscal do Trabalho terão direito ao valor individual do Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade de Auditoria-Fiscal do Trabalho por servidor, na proporção de 1 (um inteiro) § 1º Os servidores ativos em efetivo exercício no cargo de Auditor-Fiscal do Trabalho receberão o Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade de Auditoria-Fiscal do Trabalho proporcionalmente ao período em atividade, de acordo com os percentuais de bonificação definidos na tabela "b" do Anexo III desta Lei, aplicáveis sobre a proporção prevista no caput deste artigo. A referida tabela prevê variação de 0 a 100% de percentual para recebimento do benefício, quanto maior o tempo de atividade no cargo. Não obstante seja uma vantagem pecuniária diretamente ligada ao efetivo exercício de atividades e cumprimento de metas de produtividade, é certo que a lei também dispõe sobre o pagamento dos inativos, quais sejam, os aposentados e pensionistas, estabelecendo as seguintes condições: Art. 17. (...) § 2º Os aposentados receberão o Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade de Auditoria-Fiscal do Trabalho correspondente ao período em inatividade, de acordo com os percentuais de bonificação definidos na tabela "b" do Anexo IV desta Lei, aplicáveis sobre a proporção prevista no caput deste artigo. § 3º Os pensionistas farão jus ao Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade de Auditoria-Fiscal do Trabalho da seguinte forma, aplicável sobre a proporção prevista no caput deste artigo: I - para as pensões instituídas em decorrência do falecimento do servidor na atividade, o valor do Bônus será pago observado o disposto na tabela "b" do Anexo III desta Lei, aplicando-se o disposto na tabela "b" do Anexo IV desta Lei para fins de redução proporcional da pensão a partir do momento em que for instituída? II - para as pensões instituídas em decorrência do falecimento do servidor na inatividade, o valor do Bônus será o mesmo valor pago ao inativo, observado o tempo de aposentadoria, conforme o disposto na tabela "b" do Anexo IV desta Lei. Para tanto, a tabela informada indica a porcentagem máxima a ser recebida do bônus, variável de 100 a 35%, que se reduz gradualmente quanto maior for o tempo em inatividade, o que reforça a finalidade de prestigiar a efetiva contribuição individual do servidor no cumprimento das metas e produtividade estabelecidas na forma da lei. Não obstante, os inativos têm direito ao recebimento com fundamentação diversa, já que não há que se falar em produtividade na inatividade, entendimento corroborado pela existência de tabelas distintas para cada situação, além de percentuais variáveis, não se caracterizando, portanto, a paridade entre ativos e inativos da previsão constitucional. Neste sentido é o entendimento jurisprudencial: CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL. BÔNUS DE EFICIÊNCIA E PRODUTIVIDADE. LEI 13.464/17. PARIDADE ENTRE ATIVOS E INATIVOS. NÃO CABIMENTO. APELAÇÃO DESPROVIDA. 1. Apelação interposta pela parte autora, auditor fiscal da Receita Federal aposentado, contra sentença que julgou improcedente a ação que objetivava o pagamento do Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade Tributária e Aduaneira em seu percentual máximo, no valor idêntico ao percebido pelos servidores ativos, nos termos do art. 7º, § 1º, e 11, I, §2º da Lei 13.464/2017, bem como o pagamento das parcelas vendidas desde dezembro/2016. 2. A pretensão deduzida funda-se no caráter genérico do Bônus de Eficiência e Produtividade, bem como na existência de direito à paridade remuneratória entre servidores ativos e inativos, nos termos do art. 7º da EC n. 41/2003 e art. 3º da EC n.º 47/2005. 3. A parte autora ingressou no serviço público anteriormente a 1988, portanto, antes da entrada em vigor das Emendas Constitucionais 20/1998, 41/2003 e 45/2007, fazendo juz à paridade, nos termos do art. 7 da EC 41/2003. 4. O STF, em regime de repercussão geral (temas 54, 67, 139, 153, 260, 351, 409, 410, 447, 664, 983), fixou a tese de extensão dos benefícios e vantagens de natureza genérica devidas a servidores ativos aos inativos com direito à paridade remuneratória. 5. Em outras palavras, as vantagens pecuniárias que, por sua natureza, somente podem ser atribuídas aos servidores em atividade, não se estendem aos inativos, ainda que preencham os requisitos da paridade constitucional. 6. Independentemente da instauração do Comitê Gestor e da fixação do índice de eficiência institucional, o valor do bônus de eficiência e produtividade a ser pago, tanto para os servidores ativos como inativos, está condicionado aos percentuais previstos nos Anexo III e IV da Lei nº 13.464/17, que variam entre 0% e 100% para os servidores ativos e entre 35% e 100% para os aposentados e pensionistas, consoante disposto no art. 11, §3º, da Lei n. 13.464/2017. Logo, nem todos os servidores ativos receberam o bônus de eficiência e produtividade no valor integral, previsto no caput e §2º do art. 11 da Lei n. 13.464/2017, pois o percentual máximo a ser recebido por cada um está condicionado ao tempo como servidor ativo no cargo. 7. Não há que se falar que o bônus de eficiência e produtividade tem caráter permanente e geral, não sendo pago de maneira indistinta para todos os servidores em atividade, tendo em vista que há diferenciação no percentual máximo do bônus, conforme tabela "a" do Anexo III. 8. E não há como se concluir que a simples falta de definição do índice de eficiência institucional implica em atribuir caráter geral ao bônus, considerado que há expressa determinação legal para que, mesmo enquanto não definidos os critérios para mensurar o resultado institucional, deve ser observado o percentual máximo do bônus, tanto para os servidores em atividade quanto para os inativos. 9. A bonificação não se estende ao inativo por conta da paridade remuneratória, mas sim por liberalidade do legislador infraconstitucional, de forma a contemplar inclusive o servidor que não possui direito à paridade. 10. Apelação desprovida. (TRF 3ª Região, 1ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5007413-83.2020.4.03.6102, Rel. Desembargador Federal HELIO EGYDIO DE MATOS NOGUEIRA, julgado em 26/05/2022, DJEN DATA: 31/05/2022, sem grifo no original) APELAÇÃO CÍVEL. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL APOSENTADO. BÔNUS DE EFICIÊNCIA E PRODUTIVIDADE. LEI 13.464/2017. PARIDADE ENTRE ATIVOS E INATIVOS. NÃO CABIMENTO. - O E.STF fixou a tese de extensão dos benefícios e vantagens de natureza genérica, devidas a servidores ativos, aos servidores inativos, com direito à paridade remuneratória. É dizer, as vantagens pecuniárias de natureza pessoal somente podem ser atribuídas aos servidores em atividade, não podendo ser estendidas aos inativos, mesmo que preencham os requisitos da paridade constitucional. - O bônus de eficiência e produtividade da Lei nº 13.464/2017 tem caráter nitidamente pessoal, e não permanente e geral, pois não é pago de maneira indistinta para todos os servidores em atividade, tendo em vista a diferenciação no percentual/valor máximo do bônus. - O pagamento ao servidor inativo é feito mesmo àqueles que não se aposentaram antes da EC 41/03, ou depois da EC 41/2003 mas segundo as regras de transição da EC 47/05, pois não se trata de vantagem paga em razão da paridade dos inativos com os ativos. Mesmo aqueles servidores aposentados sem direito à paridade podem fazer jus ao bônus, pois não se trata de direito vinculado à paridade constitucional, mas instituído por liberalidade do legislador infraconstitucional. - No caso dos autos, ainda que a autor seja auditora fiscal aposentada com direito à paridade, não faz jus ao bônus de eficiência e produtividade em seu patamar máximo devido à natureza pessoal da vantagem. - Apelação desprovida. (TRF 3ª Região, 2ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5002809-61.2020.4.03.6108, Rel. Desembargador Federal JOSE CARLOS FRANCISCO, julgado em 13/12/2021, DJEN DATA: 17/12/2021, sem grifos no original) De qualquer forma, a Lei n. 13.464/17, prevendo a necessidade de realização das avaliações individualizadas, para fins de enquadramento nos percentuais devidos, regulamentou o recebimento o bônus em valor fixo até que seja efetivada a referida apuração: Art. 21. Para os meses de dezembro de 2016 e janeiro de 2017, será devida aos ocupantes do cargo de Auditor-Fiscal do Trabalho parcela do Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade de Auditoria-Fiscal do Trabalho no valor de R$ 7.500,00 (sete mil e quinhentos reais). § 1º O valor constante do caput deste artigo será concedido a título de antecipação de cumprimento de metas para o período previsto no caput deste artigo, fixadas pelo Secretário de Inspeção do Trabalho, e estará sujeito a ajustes no período subsequente. § 2º A partir do mês de fevereiro de 2017 até o mês de produção dos efeitos do ato referido no § 3º do art. 16 desta Lei, será pago, mensalmente, o valor de R$ 3.000,00 (três mil reais) aos ocupantes do cargo de Auditor-Fiscal do Trabalho, concedido a título de antecipação de cumprimento de metas e sujeito a ajustes no período subsequente. § 3º Os valores a que se referem o caput e o § 2º deste artigo observarão as limitações constantes dos Anexos III e IV desta Lei. § 4º O resultado institucional nos períodos de que tratam o caput e o § 2º deste artigo será considerado para a instituição do índice de eficiência institucional de que trata o § 2º do art. 16 desta Lei. Assim, enquanto não regulamentada a lei, foi previsto o pagamento do valor de R$ 7.500,00 (sete mil e quinhentos reais) para os meses de dezembro de 2016 e de janeiro de 2017 aos Auditores-Fiscais em atividade, e a partir do mês de fevereiro de 2017 até a definição do índice de eficiência institucional, o Bônus de Eficiência passou a ser pago mensalmente no valor de R$ 3.000,00 (três mil reais) aos ocupantes do cargo de Auditor Fiscal do Trabalho em atividade. Sendo certo que a própria lei se refere aos limites dos Anexos III e IV para fins de aplicação do pagamento em valores fixos, é certo que também se aplica aos servidores inativos, ainda que não se caracterize a paridade constitucional, mas apenas extensão da aplicação da lei. De qualquer maneira, o pagamento em valor fixo é devido apenas enquanto não estivesse produzindo efeitos o ato determinado pelo artigo 16, § 3º da referida lei, que assim dispõe: § 3º Ato do Comitê Gestor do Programa de Produtividade da Auditoria-Fiscal do Trabalho será editado no prazo de 60 (sessenta) dias, contado da data de entrada em vigor da Medida Provisória nº 765, de 29 de dezembro de 2016 , o qual estabelecerá a forma de gestão do Programa e a metodologia para a mensuração da produtividade global da Secretaria de Inspeção do Trabalho e da rede descentralizada de atendimento no exercício da Atividade de Auditoria-Fiscal do Trabalho e fixará o índice de eficiência institucional. Por sua vez, o Comitê Gestor do Programa de Produtividade da Auditoria-Fiscal do Trabalho (CGPP-AFT) foi instituído pelo Decreto n. 11.971, de 1º de abril de 2024. Além disso, o referido Comitê emitiu e publicou a Resolução SE/MTE n. 2, de 30 de outubro de 2024, para fixar o Índice de Eficiência Institucional da Auditoria-Fiscal do Trabalho (IEI-AFT) de que trata o inciso IV do art. 2º do Decreto n. 11.971/de 2024, na forma dos Anexos I, II e III1. A partir de então, entendo que o bônus de eficiência passou a ter metodologia específica de aferição de desempenho dos Auditores-Fiscais do Trabalho, dispensando a regra de transição inserta no § 2º do art. 21 da Lei n. 13.464/2017, que estipulou o pagamento de valor fixo até a edição do ato normativo previsto no § 3º do art. 16. Do caso concreto A parte autora alega que o bônus de eficiência e produtividade criado pela Lei n. 13.464/17 para os Auditores-Fiscais do Trabalho tem sido pago de maneira distinta a servidores ativos e inativos. Comprovou sua condição de servidor inativo do Ministério do Trabalho e Emprego (id 331222713), no cargo de Auditor-Fiscal do Trabalho, através de seus comprovantes de rendimento, os quais igualmente comprovam o recebimento do bônus de eficiência em percentual inferior ao total, entre maio de 2020 e janeiro de 2024 (id 331222708 a id 331222712). Desta forma, resta inquestionável que o bônus de eficiência é devido a servidores inativos, uma vez que a parte autora já se encontra em gozo de tal rubrica em sua remuneração. Quanto ao pleito de pagamento em valor fixo, deve ser atendido, porém, até a data de 30/10/2024, quando foi publicada e passou a produzir efeitos a Resolução SE/MTE n. 2/2024, consistente no ato do Comitê Gestor do Programa de Produtividade da Auditoria-Fiscal do Trabalho que fixou o Índice de Eficiência Institucional da Auditoria-Fiscal do Trabalho, regulamentando a metodologia para quantificação do percentual devido do bônus de eficiência, conforme previsto na própria legislação que regulamente a matéria. Portanto, é de rigor o acolhimento parcial desta parcela do pedido inicial, para pagamento do bônus de eficiência, no valor fixo de R$ 3.000,00 (três mil reais) mensais, sendo devidos os atrasados em razão das diferenças não pagas até 30/10/2024, conforme fundamentado. Os demais valores em atraso deverão ser calculados na forma da Resolução SE/MTE n. 2/2024. DISPOSITIVO Em razão do exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE O PEDIDO, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, resolvendo o mérito, para condenar a UNIÃO FEDERAL ao pagamento do Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade de Auditoria-Fiscal do Trabalho, no valor fixo de R$ 3.000,00 mensais até 30/10/2024 e, após a efetiva implementação do índice de eficiência institucional da Auditoria-Fiscal do Trabalho, na forma da Resolução SE/MTE n. 2/2024. Condeno a ré ao pagamento dos valores em atraso, a serem calculados em fase de cumprimento de sentença, após o trânsito em julgado e implantação, descontados os valores já recebidos, atualizados pela Selic até a data do efetivo pagamento (EC 113/2021). Sem custas e sem honorários nesta instância (art. 55 da Lei n. 9.099/95). Caso haja interesse em recorrer desta decisão, cientifico de que o prazo para recurso é de 10 (dez) dias (art. 42 da Lei n. 9.099/95). Havendo apresentação de recurso inominado, intime-se a parte recorrida para, querendo, apresentar contrarrazões no prazo legal. Vindas estas, ou decorrido o prazo in albis, encaminhem-se os presentes autos para a Turma Recursal com nossas homenagens e cautelas de praxe. Certificado o trânsito em julgado da presente sentença e demonstrada a averbação/conversão determinada, se o caso, devolvam-se os autos ao juízo de origem. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Núcleos de Justiça 4.0, datado e assinado eletronicamente. 1 https://www.gov.br/trabalho-e-emprego/pt-br/composicao/orgaos-colegiados/comite-gestor-do-programa-de-produtividade-da-auditoria-fiscal-do-trabalho-cgpp-aft/resolucoes

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Processo nº 5000870-56.2024.4.03.6124

ID: 329025353

Tribunal: TRF3 Órgão: Gab. 40 - DES. FED. NINO TOLDO Classe: APELAçãO CRIMINAL Nº Processo: 5000870-56.2024.4.03.6124

Data de Disponibilização: 18/07/2025

Polo Ativo:

HERIBERTO DOS SANTOS CANDIDO

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

ANDREIA DAMETO

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FELIPE DE SOUZA LIRA

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CAUBI PEREIRA GOMES

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ROGERIO TADEU DE MACEDO

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PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 11ª Turma APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 5000870-56.2024.4.03.6124 RELATOR: Gab. 40 - DES. FED. NINO TOLDO APELANTE: THALITA MIRANDA ALCARAZ, VANES… PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 11ª Turma APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 5000870-56.2024.4.03.6124 RELATOR: Gab. 40 - DES. FED. NINO TOLDO APELANTE: THALITA MIRANDA ALCARAZ, VANESSA DEMETRIO DE SA MACEDO, HERIBERTO DOS SANTOS CANDIDO Advogado do(a) APELANTE: ROGERIO TADEU DE MACEDO - SP177407-A Advogado do(a) APELANTE: CAUBI PEREIRA GOMES - SP346648-A Advogados do(a) APELANTE: ANDREIA DAMETO - SP497399-A, FELIPE DE SOUZA LIRA - SP464484-A APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP OUTROS PARTICIPANTES: PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 11ª Turma APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 5000870-56.2024.4.03.6124 RELATOR: Gab. 40 - DES. FED. NINO TOLDO APELANTE: THALITA MIRANDA ALCARAZ, VANESSA DEMETRIO DE SA MACEDO, HERIBERTO DOS SANTOS CANDIDO Advogado do(a) APELANTE: ROGERIO TADEU DE MACEDO - SP177407-A Advogado do(a) APELANTE: CAUBI PEREIRA GOMES - SP346648-A Advogados do(a) APELANTE: ANDREIA DAMETO - SP497399-A, FELIPE DE SOUZA LIRA - SP464484-A APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NINO TOLDO (Relator): Trata-se de apelações interpostas por THALITA MIRANDA ALCARAZ, HERIBERTO DOS SANTOS CANDIDO e VANESSA DEMÉTRIO DE SÁ MACEDO em face da sentença proferida pela 1ª Vara Federal de Jales (SP), no âmbito da denominada Operação Anonymous, que os condenou, pela prática do crime de organização criminosa (art. 2º, caput, da Lei 12.850/2013), às seguintes penas: i) THALITA MIRANDA ALCARAZ - 4 (quatro) anos, 11 (onze) meses e 15 (quinze) dias de reclusão, em regime inicial fechado, e 113 (cento e treze) dias-multa, no valor unitário mínimo legal; ii) HERIBERTO DOS SANTOS CANDIDO - 4 (quatro) anos e 3 (três) meses de reclusão, em regime inicial semiaberto, e 97 (noventa e sete) dias-multa, no valor unitário mínimo legal; e iii) VANESSA DEMÉTRIO DE SÁ MACEDO - 4 (quatro) anos, 11 (onze) meses e 15 (quinze) dias de reclusão, em regime inicial semiaberto, e 113 (cento e treze) dias-multa, no valor unitário de ½ (metade) do salário mínimo vigente. O Ministério Público Federal (MPF) deixou de propor acordo de não persecução penal (ANPP), “uma vez o acordo não afigura-se suficiente à reprovação e prevenção do crime”. (ID 312630785, p. 2) não tendo havido manifestação das defesas de THALITA e HERIBERTO (ID 312631220 e 312631227). A defesa de VANESSA (ID 312631230) pediu o oferecimento do acordo e o Ministério Público Federal reiterou que não era cabível ANPP (ID 312631283, p.5). Em 27.9.2024 a 2ª Câmara de Coordenação e Revisão Criminal do Ministério Público Federal, por unanimidade, deliberou pela inviabilidade de oferta do acordo de não persecução penal (ID 312631299) Em 28.6.2024, no Pedido de Liberdade Provisória nº 50000741-51.2024.4.03.6124, o juízo a quo converteu a prisão preventiva de VANESSA em prisão domiciliar, com monitoração eletrônica, tendo a sua defesa impetrado em seu favor o Habeas Corpus nº 5019400-50.2024.03.0000, de minha relatoria, que foi julgado em 22.8.2024, tendo a Décima Primeira Turma concedido parcialmente a ordem porque, embora não houvesse razão para ser revogada a prisão domiciliar nem a monitoração eletrônica, assegurou-se “à paciente o direito de deslocar-se da sua residência exclusivamente para as necessidades médicas de seus filhos menores, sem necessidade de prévia autorização do juízo, ficando obrigada a justificar ao juízo impetrado o motivo do deslocamento no prazo de 5 (cinco) dias após a sua ocorrência”. A denúncia (ID 312630785), recebida em 29.7.2024 (ID 312631198), narra: Os fatos a seguir expostos surgiram do Inquérito Policial nº 5000079-24.2023.4.03.6124, instaurado para apurar, inicialmente, a prática de crime previsto no artigo 171, §3º, do Código Penal. A agência da Caixa Econômica Federal (CEF) de Auriflama/SP (ID 273316977 - Pág. 5/34 – IPL 5000079-24.2023.4.03.6124) informou que indivíduo até então não identificado, no dia 13/07/2022, utilizando documentação falsa em nome de Antônio Carlos dos Santos, abriu conta-corrente naquela agência, transferindo o pagamento de benefício previdenciário de aposentadoria recebido pela vítima para a conta fraudulenta. [...] Analisados os dados bancários e realizadas pesquisas, foi possível identificar outros envolvidos – em especial THALITA MIRANDA ALCARAZ, VANESSA DEMETRIO DE SÁ MACEDO, HERIBERTO DOS SANTOS CANDIDO e ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS (núcleo intermediário) – além de novas práticas de estelionato contra a CEF, conforme detalhado no Relatório de Análise de Polícia Judiciária (RAPJ) nº 2291253/2023 (DOC. 1 anexo)1. Havia, nesse momento, fortes indícios da existência de uma Organização Criminosa – doravante referida como ORCRIM – voltada à prática reiterada de crimes de estelionato. Realizada a quebra do sigilo bancário das pessoas identificadas nesse momento, no período de 25/07/2022 a 13/06/2023, conforme autorização judicial nos autos 5000201- 37.2023.4.03.6124, os dados, em especial as movimentações das contas-correntes de THALITA MIRANDA ALCARAZ, foram analisados no Relatório de Análise de Polícia Judiciária (RAPJ) nº 492587/2024 (DOC. 2 anexo). A partir dessas informações, foi possível obter mais detalhes sobre o funcionamento da ORCRIM, além de apontada a participação de outros integrantes e novas vítimas dos crimes. Também foram solicitadas ao Setor de Segurança da CEF informações de outras contas objeto de fraude pelo mesmo grupo, sendo encaminhado, em resposta, o Ofício nº 38/2023/CEFRA/DF (DOC. 3 anexo). Ali, foram relacionadas diversas contas que foram abertas por meio de documentação falsa de beneficiários do INSS e identificados alguns envolvidos diretamente na abertura dessas contas. Segundo estimativa realizada pela CEF, “as operações de crédito nas modalidades Crédito Consignado, Antecipação de Crédito FGTS, Crédito CDC [...], vinculadas às 124 contas abertas com documentos falsos, somam a quantia de R$ 5.122.654,48”. Abre-se um parêntese, neste ponto, para registrar que foram identificados, ao menos, outros 18 (dezoito) procedimentos investigatórios perante a Polícia Federal no Estado de São Paulo instaurados para apurar crimes de estelionato envolvendo algum ou alguns dos membros da ORCRIM aqui desvendada (ID 321348441 - Pág. 32/33 – 5000466-05.2024.4.03.6124), o que demonstra a amplitude de sua atuação e sua estruturação ordenada para a prática de infrações penais. Alguns dos atingidos pelos ilícitos, todos aposentadas e/ou pensionistas, em sua maioria idosos e hipossuficientes, foram ouvidos e confirmaram as fraudes perpetradas contra eles (ID 321348441 - Pág. 76 e ss. – 5000466-05.2024.4.03.6124). [...] No curso das investigações ficou comprovada a existência de uma Organização Criminosa bem estruturada e articulada, especializada em perpetrar fraudes contra instituições financeiras, incluindo a Caixa Econômica Federal (CEF), em vários municípios do país, em sua maioria no Estado de São Paulo. O grupo criminoso opera por meio da utilização de documentos falsificados emitidos em nome de terceiros, geralmente beneficiários de algum tipo de prestação previdenciária, predominantemente idosos, os quais se encontram em condições de saúde debilitadas e são economicamente dependentes das pensões que recebem. Essa vulnerabilidade os torna alvos preferenciais e expõe a gravidade do impacto social dessas fraudes. Diante de todos os elementos apurados, foi possível dividir os membros da ORCRIM nos chamados “núcleos” de atuação, evidenciando a divisão de tarefas e a estrutura funcional do grupo, que se distribui da seguinte forma: [...] 2.3. NÚCLEO AVANÇADO / CENTRAL THALITA MIRANDA ALCARAZ VANESSA DEMETRIO DE SÁ MACEDO RITA DE CÁSSIA BESSA HERIBERTO DOS SANTOS CANDIDO Por fim, o núcleo central do esquema é composto pelos integrantes do topo (alto escalão) da Organização Criminosa, responsáveis por comandarem e coordenarem as ações realizadas pelos núcleos anteriormente descritos, sendo os principais beneficiários do esquema. Conforme apurado, os valores obtidos das vítimas passam pelo núcleo intermediário com destino aos integrantes do núcleo avançado, que usufruem diretamente dos produtos dos crimes perpetrados pelo grupo. A presente denúncia se refere especificamente às condutas dos membros deste núcleo criminoso. 3. OBJETO DA PRESENTE DENÚNCIA: NÚCLEO AVANÇADO Feitas as considerações acima, passa-se a individualizar as condutas das pessoas que compõem o núcleo avançado ou central de atuação do grupo criminoso ora desvendado, demonstrando-se, de maneira individual e específica, a autoria de cada uma em relação ao crime previsto no artigo 2º da Lei nº 12.850/2013 (organização criminosa). 3.1. THALITA MIRANDA ALCARAZ THALITA MIRANDA ALCARAZ integra a ORCRIM, exercendo pessoalmente, embora não isoladamente, o comando da ordenação estrutural, da divisão informal de tarefas e da prática de infrações penais, sendo a principal destinatária e usufrutuária das vantagens financeiras advindas do crime de estelionato qualificado, cuja pena máxima é superior a quatro anos. THALITA movimentou em suas contas-correntes (CC 38551209, do Banco Inter/SA, e CC 846959114, do Banco Nu Pagamentos S.A.), somente no período de 25/07/2022 a 13/06/2023 (menos de 1 ano), abrangido pela quebra de sigilo bancário, o total de R$ 5.897.412,66 (cinco milhões, oitocentos e noventa e sete mil, quatrocentos e doze reais e sessenta e seis centavos), em 3.597 transações. Entre 27/07/2022 e 05/06/2023, a denunciada pagou o total de R$ 171.145,19 somente de fatura de cartão de crédito e gastou R$ 83.200,00 totais com salão de beleza (ID 321346669 - Pág. 34 e 37/39 – 5000466-05.2024.4.03.6124). Essas movimentações são absolutamente incompatíveis com o ínfimo valor de patrimônio e renda declarados pela denunciada no período, tratando-se, portanto, de produto dos crimes praticados. Constam ainda gastos de aproximadamente R$ 63.000,00 com passagens aéreas e pacotes de viagens, tendo como beneficiários tanto THALITA como DAYANA CORREIA RIBEIRO (4 passagens, com trechos entre Salvador, Guarulhos e Congonhas), integrante do núcleo base da ORCRIM; Rita de Cássia Vieira (1 passagem de Congonhas para Salvador) mãe de VINICIUS GABRIEL VIEIRA DA ROCHA, membro do núcleo intermediário; e HERIBERTO DOS SANTOS CANDIDO, parceiro de THALITA e também denunciado nestes autos (ID 321348441 - Pág. 9/12 – 5000466-05.2024.4.03.6124). THALITA é próxima das denunciadas VANESSA DEMETRIO DE SÁ MACEDO e RITA DE CÁSSIA BESSA, com quem divide o comando da ORCRIM. A denunciada utilizou contas-correntes de pessoas próximas, a exemplo de seu parceiro HERIBERTO DOS SANTOS CANDIDO (codenunciado) e suas ex-funcionárias ROSANA SANTOS DE JESUS e MARIA TAINARA SANTOS DE SOUSA (integrantes do núcleo intermediário), como “contas de passagem” para recebimento dos valores auferidos com as fraudes praticadas. [...] THALITA recebeu elevadas quantias dos crimes perpetrados no contexto do esquema criminoso em análise. Somente das fraudes contra aposentados/pensionistas levantadas no Ofício nº 38/2023/CEFRA/DF, as contas da denunciada receberam, diretamente, R$ 215.950,00 (ID 322134146 - Pág. 28 – 5000466-05.2024.4.03.6124). Esse levantamento não leva em consideração transferências realizadas das contas dos intermediários para a denunciada que, como já mencionado anteriormente, atingem valor de movimentação superior a R$ 5.000.000,00 (cinco milhões de reais). A título de exemplo, THALITA recebeu em suas contas, somente por transferência de VINICIUS GABRIEL VIEIRA DA ROCHA (pessoa física e pessoa jurídica DEVOLUÇÃO) e MARIA TAINARA SANTOS DE SOUSA, ambos do núcleo intermediário, aproximadamente, o total de R$ 361.000,00 provenientes das fraudes perpetradas contra os seguintes beneficiários da previdência (ID 321346669 – 5000466- 05.2024.4.03.6124)7: Antônio Carlos dos Santos, Fernando Andreu Mota (pág. 12/14), Antônio José Batista (pág. 15), Edson de Castro Almeida (pág. 19), Vanderlei Silvio dos Santos (pág. 19/21), Verônica Machado Godinho (pág. 21/22), Nilda Pereira Ventura (pág. 26/27), Maria Sônia Ferreira da Silva (pág. 27), Maria Ângela de Paula (pág. 27/28), Juciara Gomes Santos de Oliveira (pág. 28/29), Sérgio Serrano da Corte (pág. 29/30) e Antônio da Silva Santos (pág. 30/31). [...] Na busca e apreensão judicialmente deferida na residência de THALITA e HERIBERTO, localizada à Rua Maniutuba, 104, apto. 53, São Paulo/SP (DOC. 6 anexo)13, no dia 25/06/2024, foram arrecadados diversos elementos que reforçam as práticas delitivas narradas, dentre eles: (a) mais de 20 (vinte) celulares, incluindo 2 Iphones 15 Pro Max; (b) 5 espelhos de RG em branco; (c) cartões de crédito da CAIXA em nome de terceiros; (d) 8 RG’s em nome de terceiras pessoas, porém contendo a mesma foto e dados não oficiais (indicação de falsidade); (e) comprovantes de renda e de residência em nome de terceiros; (f) folhas de repetição (treino de imitações de assinaturas); e (g) diversos cartões bancários em nome dos dois denunciados e cheques de terceiros. Também foram realizadas buscas no apartamento à Rua Baltazar Nunes, 600, bloco 01, apto. 102, Vila Carmosina/SP, utilizado simultaneamente por THALITA e RITA DE CÁSSIA para o armazenamento de diversos documentos ligados às fraudes perpetradas pelo grupo criminoso, cuidando-se de verdadeiro “quartel-geral operacional” da ORCRIM. Durante as buscas, verificou-se que o local atualmente é ocupado por Luiz Gustavo da Silva Bessa, irmão de RITA DE CÁSSIA, que estava no interior do imóvel destruindo alguns dos citados documentos utilizados para práticas ilícitas pelos membros da ORCRIM, em especial (DOC. 7 anexo) : (a) cartões bancários; (b) chip’s telefônicos da TIM (usados e lacrados); (c) retalhos de planilhas e rascunhos contendo dados de terceiros (CPF, limite, telefone e indicação de chip’s), possivelmente vítimas do grupo; (d) correspondências da CEF referente a entrega de cartões em nome de terceiros; (e) comprovante de residência em nome de terceiros, contendo os mesmos dados (indicação de falsidade); e (f) RG’s que se encontravam rasgados ao meio, com dados de pessoas diversas, mas contendo a mesma fotografia (indicação de falsidade), possíveis vítimas do grupo criminoso sob investigação. [...] Portanto, conclui-se que a THALITA MIRANDA ALCARAZ, de data inicial desconhecida, mas, ao menos, mas ao menos a partir do ano de 2021 até o dia 25/06/2024 (deflagração da fase ostensiva da operação), integrou pessoalmente organização criminosa, exercendo seu comando coletivo, voltada para a prática de reiterados crimes de estelionato contra instituições financeiras, incluindo a CEF, e diversos aposentados e pensionistas, auferindo elevadas quantias advindas das fraudes, incorrendo, portanto, na conduta típica descrita no artigo 2º, caput, e §3º, da Lei 12.850/2013. 3.2. VANESSA DEMETRIO DE SÁ MACEDO VANESSA DEMETRIO DE SÁ MACEDO também compõe o núcleo avançado da ORCRIM em análise, ocupando posição de comando em conjunto com THALITA e RITA DE CÁSSIA e sendo uma das principais destinatárias dos altos valores obtidos em prejuízo direto da Caixa Econômica Federal e, indiretamente, dos aposentados e pensionistas. VANESSA é irmã de ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS (núcleo intermediário) e amiga próxima das denunciadas THALITA e RITA DE CÁSSIA e de outros membros da ORCRIM, dentre eles MILENE DARLING DO NASCIMENTO (ID 321346669 - Pág. 115/119 e ID 321348441 - Pág. 3/7 – 5000466-05.2024.4.03.6124). De acordo com os dados bancários obtidos, THALITA enviou da CC 38551209, do Banco Inter/SA, o total de R$ 9.768,00 para VANESSA, recebendo desta o valor de R$ 44.598,16, em 19 (dezenove) transações bancárias realizadas entre 28/07/2022 e 02/06/2023. Já da CC 846959114, do Banco Nu Pagamentos S.A., THALITA enviou R$ 40.486,00 para VANESSA, entre 27/07/2022 e 10/05/2023 (ID 321346669 - Pág. 59/61 – 5000466- 05.2024.4.03.6124). VANESSA também é sócia, em parceria com THALITA, da empresa STRONG COMERCIO DE ROUPAS, que foi utilizada para receber e transferir vultosos valores advindos das fraudes perpetradas pela ORCRIM, conforme explicitado no tópico anterior. Ainda, o filho de VANESSA, Iran Pereira Macedo Junior, exibe em seu Instagram fotos na Europa e realizou, ao menos, 4 (quatro) cursos no exterior, com pagamentos realizados por VANESSA e THALITA (ID 321348441 – 5000466-05.2024.4.03.6124). Ainda, assim como THALITA, utilizou contas-correntes de pessoas próximas, a exemplo de sua mãe Terezinha Demetrio de Sá, como “contas de passagem” para recebimento dos valores auferidos com as fraudes praticadas. Nesse contexto, entre 25/07/2022 e 13/06/2023, a conta-corrente de Terezinha (CC 225500310, Banco Inter) movimentou um valor total de R$ 2.043.779,52 (dois milhões, quarenta e três mil, setecentos e setenta e nove reais e cinquenta e dois centavos), totalmente incompatível com sua renda e patrimônio declarados. [...] Todos os elementos constantes nos autos permitem concluir que VANESSA era a verdadeira operadora da conta-corrente de Terezinha e beneficiária dos valores ali obtidos. Em especial, vale citar uma procuração original apreendida na residência de EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ e TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA (membros da ORCRIM), datada de 06/10/2022, por meio da qual Terezinha Demétrio de Sá outorga amplos poderes para VANESSA representá-la, especialmente, dentre outras situações, perante “BANCOS e ADMINISTRADORAS DE CARTÕES DE CRÉDITO” (DOC. 9 anexo - pág. 9/12). Outras procurações também foram outorgadas por Terezinha a VANESSA no período de operação da ORCRIM (DOC. 10 anexo). [...] A denunciada também recebeu em sua própria conta-corrente elevadas quantias dos crimes praticados no contexto do grupo criminoso. Somente em decorrência das fraudes contra aposentados/pensionistas identificadas e levantadas pela CEF, a conta de VANESSA recebeu o total de R$ 198.772,00 (Ofício nº 38/2023/CEFRA/DF - ID 322134146 - Pág. 28 – 5000466-05.2024.4.03.6124). [...] Portanto, os elementos de prova acima apontados demonstram que a denunciada VANESSA DEMETRIO DE SÁ MACEDO, de data inicial desconhecida, mas, ao menos, ao menos a partir do ano de 2021 até o dia 25/06/2024 (deflagração da fase ostensiva da operação), integrou pessoalmente organização criminosa, exercendo seu comando coletivo, voltada para a prática de reiterados crimes de estelionato contra instituições financeiras, incluindo a CEF, e diversos aposentados e pensionistas, auferindo elevadas quantias advindas das fraudes, incorrendo na conduta típica descrita no artigo 2º, caput, e §3º, da Lei 12.850/2013. [...] 3.4. HERIBERTO DOS SANTOS CANDIDO HERIBERTO DOS SANTOS CANDIDO é parceiro de THALITA e integra o núcleo avançado, usufruindo dos valores obtidos ilicitamente por sua parceira, aderindo às condutas delitivas desta e fornecendo suas contas-correntes como “contas de passagem”, para recebimento de valores subtraídos das vítimas. Este denunciado, que também teve a quebra de sigilos de seus dados bancários, movimentou em sua conta do Banco Nu Pagamentos S.A., entre 25/07/2022 e 29/11/2022, o total de R$ 523.264,56 (ID 321348441 - Pág. 16 – 5000466-05.2024.4.03.6124). As movimentações apuradas indicam que HERIBERTO e THALITA levam um estilo de vida luxuoso e incompatível com o patrimônio e renda declarados, bancado com os recursos advindos das fraudes aqui desvendadas. Cite-se que o denunciado foi beneficiário de diversas passagens aéreas pagas com recursos advindos da conta de THALITA (ID 321348441 - Pág. 9/12 – 5000466-05.2024.4.03.6124). Para além disso, HERIBERTO recebeu da conta de MARIA TAINARA SANTOS DE SOUSA, integrante do núcleo intermediário do esquema, entre 17/08/2022 e 25/11/2022 (três meses), o total de R$ 42.926,75, ao longo de 99 (noventa e nove) transações bancárias (ID 321350442 - Pág. 28 – 5000466-05.2024.4.03.6124). HERIBERTO também foi sócio, no período de 27/11/2018 até 13/04/2023, da empresa STRONG COMERCIO DE ROUPAS (CNPJ 32.108.820/0001-98), que foi utilizada para receber e transferir vultosos valores advindos das fraudes perpetradas pela ORCRIM. Na busca e apreensão judicialmente deferida na residência de THALITA e HERIBERTO foram arrecadados diversos elementos que reforçam as práticas delitivas narradas, dentre eles (DOC. 6 anexo): (a) mais de 20 (vinte) celulares, incluindo 2 Iphones 15 Pro Max; (b) 5 espelhos de RG em branco; (c) cartões de crédito da CAIXA em nome de teceiros; (d) 8 RG’s em nome de terceiras pessoas, porém contendo a mesma foto e dados não oficiais (indicação de falsidade); (e) comprovantes de renda e de residência em nome de terceiros; (f) folhas de repetição (treino de imitações de assinaturas); e (g) diversos cartões bancários em nome dos dois denunciados e cheques de terceiros. Interrogado após sua prisão preventiva durante a deflagração da Operação Anonymous, HERIBERTO se limitou a negar os fatos, informando que “abriu” sua conta-corrente a pedido de THALITA, que tem o nome negativado. Alega ainda que, por esse motivo (nome negativado), também alugou o apartamento em que houve as buscas para THALITA residir. Afirma que, atualmente, está separado de THALITA e “não tinha ciência das atividades ilícitas” por ela realizadas, sendo que seu único vínculo com aquela denunciada é o filho deles. Confirma que teve uma empresa de Tabacaria com THALITA,mas encerraram as atividades (DOC. 6 - Pág. 46/47) A versão, todavia, não é crível. Em primeiro lugar, ambos foram encontrados juntos durante o cumprimento de mandado de busca e apreensão em uma quarta-feira, às 06 da manhã, o que é um fortíssimo indicativo da mentira na versão de que se encontravam separados. Em segundo ponto, ainda que não convivessem mais como um casal, eram parceiros de empreitada delituosa, com dolo direto de Heriberto, como se verifica pelo altíssimo volume que transitou por suas contas e pelo usufruto de diversas passagens aéreas. Em terceiro lugar, o volume e a natureza dos documentos encontrados em sua residência, descritos acima, indicam a sua adesão e auxílio na prática delituosa. As provas dos autos, assim, indicam que HERIBERTO também atua conscientemente no esquema criminoso ora desvendado, auxiliando sua parceira THALITA nas fraudes e sendo destinatário de grande parte dos valores ilícitos auferidos. Assim, conclui-se que HERIBERTO DOS SANTOS CANDIDO, de data inicial desconhecida, mas ao menos a partir do ano de 2021 até o dia 25/06/2024 (deflagração da fase ostensiva da operação), integrou pessoalmente organização criminosa voltada para a prática de reiterados crimes de estelionato contra instituições financeiras, incluindo a CEF, e inúmeros aposentados e pensionistas, auferindo elevadas quantias advindas das fraudes, praticando o crime do artigo 2º, caput, da Lei 12.850/2013. A sentença foi publicada em 18.12.2024. (ID 312631386) Em seu recurso (ID 312631412), a defesa de VANESSA pede a sua absolvição, com base no art. 386, VII do Código de Processo Penal ou a desclassificação da conduta para aquela prevista no art. 288 do Código Penal. Caso mantida a condenação pede: i) a fixação da pena-base no mínimo legal; ii) o afastamento da agravante de comando da organização (art. 2º, § 3º, da Lei nº 12.850/2013); iii) o desconto do tempo de prisão provisória e, em razão disso, a fixação de regime inicial mais brando para cumprimento da pena privativa de liberdade e a substituição dessa pena por restritivas de direitos. Em seu recurso (ID 312631413), a defesa de HERIBERTO pede a sua absolvição, por falta de provas do seu envolvimento com a organização criminosa. Caso mantida a condenação pede: i) a fixação da pena-base no mínimo legal; ii) o desconto do tempo de prisão provisória e, em razão disso, a fixação de regime inicial mais brando para cumprimento da pena privativa de liberdade e a substituição dessa pena por restritivas de direitos. A defesa de THALITA requereu a apresentação das suas razões recursais nos termos do art. 600, § 4º, do Código de Processo Penal. Nestas (ID 313518403), pede, preliminarmente, a expedição de alvará de soltura, para que a apelante possa aguardar o julgamento do recurso em liberdade. No mérito, pede: i) o afastamento da circunstância agravante de comando da organização; ii) a fixação do regime semiaberto para início do cumprimento da pena privativa de liberdade. Foram apresentadas contrarrazões ao recurso de HERIBERTO e VANESSA (ID 312631415 e 312631417). Em cumprimento à decisão proferida no Habeas Corpus nº 5004104-51.2025.4.02.0000, de minha relatoria, foi expedido alvará de soltura em favor de HERIBERTO DOS SANTOS CANDIDO, o qual foi cumprido em 21.02.2025 (ID 318155842). A Procuradoria Regional da República opinou pelo desprovimento dos recursos (ID 320633686). É o relatório. À revisão. PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 11ª Turma APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 5000870-56.2024.4.03.6124 RELATOR: Gab. 40 - DES. FED. NINO TOLDO APELANTE: THALITA MIRANDA ALCARAZ, VANESSA DEMETRIO DE SA MACEDO, HERIBERTO DOS SANTOS CANDIDO Advogado do(a) APELANTE: ROGERIO TADEU DE MACEDO - SP177407-A Advogado do(a) APELANTE: CAUBI PEREIRA GOMES - SP346648-A Advogados do(a) APELANTE: ANDREIA DAMETO - SP497399-A, FELIPE DE SOUZA LIRA - SP464484-A APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NINO TOLDO (Relator): Trata-se de apelações interpostas por THALITA MIRANDA ALCARAZ, HERIBERTO DOS SANTOS CANDIDO e VANESSA DEMÉTRIO DE SÁ MACEDO em face da sentença proferida pela 1ª Vara Federal de Jales (SP), no âmbito da denominada Operação Anonymous, que os condenou pela prática do crime de organização criminosa (art. 2º, caput, § 3º, da Lei 12.850/2013). Inicialmente, anoto que a ausência de contrarrazões pela acusação não implica nulidade (CPP, art. 565), conforme pacífico entendimento desta Turma: ApCrim nº 001596-27.2016.4.03.6102, Rel. Des. Federal Nino Toldo, j. 28.7.2023, Publicação 02.8.2023; ApCrim nº 0004816-12.2009.4.03.6104, Rel. Des. Federal Nino Toldo, j. 31.3.2023, Publicação 10.4.2023; ApCrim nº 0003067-39.2018.4.03.6105, Rel. Des. Federal José Lunardelli, j. 09.02.2024, Publicação 15.02.2024; ApCrim nº 0003067-39.2018.4.03.6105, Rel. Des. Federal José Lunardelli, j. 09.02.2024, Publicação 15.02.2024. Adequação típica dos fatos A defesa de VANESSA pede a desclassificação do crime de organização criminosa para o de associação criminosa (CP, art. 288). Sem razão, porém, pois os fatos narrados na denúncia amoldam-se ao tipo penal do art. 2º da Lei nº 12.850/2013. Enquanto o crime de associação criminosa tem por elementar a associação de três ou mais pessoas para o fim específico de cometer crimes, independentemente de quais sejam esses crimes, a promoção, constituição, financiamento ou integração, pessoalmente ou por interposta pessoa, a organização criminosa tem requisitos mais específicos. Em regra, destaca-se na organização criminosa a hierarquia estrutural, o planejamento empresarial, o uso de recursos tecnológicos, o recrutamento de pessoas, a divisão de funções e tarefas, a sofisticada logística da conduta ilegal, a demarcação territorial das atividades ilícitas, a conexão local, regional, nacional e internacional com outras organizações, com o fim de obtenção de vantagem de qualquer natureza. Trata-se da lógica empresarial voltada ao cometimento de crimes. É essa a hipótese retratada nos autos. A denúncia descreve a existência de uma organização criminosa bem estruturada e articulada, composta por, no mínimo, 20 (vinte) integrantes, especializada em efetuar fraudes contra instituições financeiras, inclusive a Caixa Econômica Federal (CEF), em vários municípios do país, em sua maioria no Estado de São Paulo e descreve a existência de “núcleos” de atuação, evidenciando a divisão de tarefas e a estrutura funcional, da seguinte forma: i) Núcleo base: é composto por integrantes cuja função é se apresentar perante agências bancárias, em sua maioria da CEF, e promover a abertura de contas-correntes em nome de aposentados e/ou pensionistas mediante utilização de documentos falsos fabricados e fornecidos por outros integrantes do grupo; após a abertura da conta, outra parte do grupo promove a alteração da conta de recebimento do benefício previdenciário da vítima para a conta criada fraudulentamente, com a posterior contratação de empréstimos para desconto em tal benefício, sem o conhecimento do aposentado/pensionista; ii) Núcleo intermediário: integrado por aqueles que oferecem suas contas-correntes como “contas de passagem”, para recebimento direto dos valores advindos dos empréstimos fraudulentos, depositados nas contas fraudulentas criadas pelos membros do primeiro núcleo, e posterior transferência para os membros de comando do grupo, integrantes do núcleo avançado; e iii) Núcleo avançado: composto pelos integrantes do topo (alto escalão) da organização criminosa, responsáveis por comandar e coordenar as ações realizadas pelos outros dois núcleos, sendo os principais beneficiários do esquema criminoso. Portanto, está claro que se trata do crime de organização criminosa tipificado no art. 2º da Lei nº 12.850/2013, e não de simples associação criminosa (CP, art. 288). Por isso, rejeito a pretensão de desclassificação da conduta. Mérito das imputações VANESSA DEMÉTRIO DE SÁ MACEDO A defesa de VANESSA pede a sua absolvição por falta de provas. Alega que a condenação baseou-se em “meros elementos informativos não repetido em juízo” e que “a mera juntada de fotos obtidas de redes sociais em local de confraternização em público nada prova quanto ao alegado pela acusação, pois em contexto completamente dissociado da prática criminal imputada”. Alega também que o conteúdo extraído do celular apreendido em poder de Vinicius Gabriel Vieira da Rocha é “mero elemento informativo desprovido de autenticidade e sem confirmação inequívoca em juízo quanto aos seus interlocutores”, e que deve ser declarada a invalidade da oitiva da informante Rita de Cássia Vieira, pois ela é mãe de Vinicius. Sem razão. Consta dos autos que VANESSA recebeu, na sua conta-corrente e na de sua mãe, que também administrava, altos valores provenientes das fraudes identificadas. Somente na conta de sua mãe, apurou-se que essa acusada movimentou R$ 2.043.779,52 (dois milhões, quarenta e três mil setecentos e setenta e nove reais e cinquenta e dois centavos), sendo identificadas diversas transferências e recebimento de valores de diversos outros membros do grupo criminoso. Na conta de sua mãe, recebeu do intermediário Vinicius Gabriel Vieira da Rocha a quantia de R$ 213.721,85 (duzentos e treze mil setecentos e vinte e um reais e oitenta e cinco centavos), proveniente das fraudes perpetradas contra sete vítimas do grupo criminoso. Além disso, a análise do conteúdo extraído do aparelho celular apreendido em poder de Vinicius reforça a posição de comando de VANESSA no esquema criminoso. Ouvida em juízo ela declarou simplesmente que desconhecia as conversas e negou os fatos a ela imputados na denúncia, declarando que a sua renda e a movimentação na sua conta provinham da venda de roupas em sociedade com com a corré THALITA. Nesse sentido, destaco da sentença: A ré também utilizou contas-correntes de outras pessoas para movimentação dos valores advindos dos ilícitos, como de sua mãe TEREZINHA DEMETRIO DE SÁ, como “contas de passagem”, movimentando no período entre 25/07/2022 a 13/06/2023, o montante de R$2.043.779,52, valor totalmente incompatível com sua renda e patrimônio declarados nos exercícios de 2022, 2023 e 2024 (ID 333142240). Observa-se no ID 321346669 dos autos 5000466-05.2024.403.6124 que a conta em nome da mãe de VANESSA foi utilizada para receber e transferir valores para diversos integrantes do grupo criminoso, dentre eles THALITA, a própria ré VANESSA, VINICIUS GABRIEL, DEVOLUÇÃO (pessoa jurídica de VINICIUS GABRIEL), ROSANA SANTOS DE JESUS, MILENE DARLING DO NASCIMENTO, EVELYN CRISTINA D. DE SÁ e CAIO DE JESUS CARDOSO. Consigne-se que VANESSA era quem de fato movimentava a conta-corrente de sua mãe, pois foi apreendida na residência de EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ e TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA (membros da ORCRIM), em 06/10/2022, procuração por meio da qual Terezinha Demétrio de Sá outorga amplos poderes para VANESSA representá-la, especialmente, dentre outras situações, perante “BANCOS e ADMINISTRADORAS DE CARTÕES DE CRÉDITO” (ID 333142243- p. 9/12). Outras procurações também foram outorgadas por Terezinha a VANESSA no período da operação da ORCRIM (ID 333142244). Em seu interrogatório judicial a acusada confirmou que é a responsável por administrar a conta-corrente de sua genitora Terezinha, mediante procuração pública concedida por esta (ID 344278572). Corroborando as provas da posição de comando de VANESSA na organização criminosa, com divisão de tarefas, além de gestora dos valores advindos com as fraudes, VANESSA foi beneficiária final de parte dos valores provenientes das fraudes praticadas contra os beneficiários da previdência Valéria de Carvalho, Maria Inês Barros Santos e Rubens Bravo (ID 321346669, p. 16/17 e p. 45; e ID 322134126, p. 24 – 5000466-05.2024.4.03.6124), além de outros valores advindos da conta fraudulenta criada pela organização em nome de Antonio Fernando Bernardo (Valéria de Carvalho, Maria Inês Barros Santos e Rubens Bravo (ID 321346669 - p. 61; e ID 322134126, p. 3/4 – 5000466-05.2024.4.03.6124). As provas compartilhadas com a presente investigação, apuradas em outros dois inquéritos policiais em que VANESSA aparece como investigada - IPL 2022.0016663-SR/PF/BA (1017508- 62.2023.4.01.3300) – verifica-se que no mandado de busca e apreensão cumprido na residência em que VANESSA residia com sua genitora Terezinha (Termo de Apreensão Nº 3880047/2022), em 14/10/2022, foram apreendidos manuscritos no quarto de VANESSA com as informações provavelmente referentes às fraudes praticadas pelo grupo, sendo elas: a) nome completo e CPF das vítimas, várias delas, inclusive, identificadas no relatório da CEF, e instituição financeira que tem/não tem conta; e b) informações sobre pagamento com nomes de “Maysa”, “Day” e “Veio”, respectivamente, MAYSA REIS PRADO, DAYANA CORREIA RIBEIRO e JORGE LUIS FURTADO OLINDA, todos membros do núcleo base do grupo, responsáveis por realizarem a abertura de conta e obtenção de empréstimos fraudulentos em instituições financeiras (ID 321348441, p. 17 – 5000466-05.2024.4.03.6124). A análise da IPJ nº 3287723/2024 (ID 336725893), elaborada a partir do aparelho celular apreendido em poder de VINICIUS GABRIEL VIEIRA DA ROCHA, também integrante do núcleo intermediário do grupo, reforça a posição de destaque e comando coletivo de VANESSA na organização criminosa, especialmente pelos seguintes excertos realizados pelo MPF: “a) em conversa entre VINICIUS GABRIEL e sua mãe por Whatsapp no dia 09/01/2024, esta menciona que VANESSA só deu para aquele investigado R$ 500,00 por conta. Vale registrar que foi identificado um padrão de que, a cada fraude realizada, a conta de VINICIUS ficava com R$ 500,00 (p. 6 e 10 da IPJ); b) em conversa no Whatsapp com terceira pessoa não identificada, no dia 21/02/2024, VINICIUS GABRIEL informa que somente tem senha para baixar informações de pessoas no INSS, e que somente terá acesso “a outra senha” quando “VANESSA pagar” (pág. 13/14 da IPJ). Essa informação é especialmente relevante, pois demonstra que Vanessa era quem tinha os “contatos” e meios de pagamento para possibilitar a fraude, sendo Vinicius seu operador nessas questões; c) em conversa entre VINICIUS GABRIEL e a ré VANESSA (“vanessa” - 551196154032813) no dia 05/04/2024, esta envia para aquele uma foto da tela de um computador, com o que parece ser uma lista ou tabela e, na sequência, um áudio afirmando que VINICIUS GABRIEL estava recebendo R$ 500,00 por semana e que não deveria ter aceitado trabalhar por esse valor, pois “esse trabalho é o cão”. VANESSA também afirma que VINICIUS GABRIEL deveria cobrar R$ 500,00 só para “usar essa senha”. VINICIUS GABRIEL informa que o trabalho é cansativo e explica que os CPF’s em verde seriam os que já haviam sido consultados e que a senha era utilizada por outras pessoas (pág. 24/29 da IPJ); d) nos dias 09/01/2024 e 15/01/2024, VINICIUS GABRIEL criou três grupos no Whatsapp onde adicionou o contato da ré VANESSA (5511961540328) e o contato de nome leao (5511953361810), até então não identificado, para o compartilhamento de dados de terceiras pessoas necessários às fraudes comumente praticadas pelo grupo, tais como nome completo, CPF, dados cadastrais, conta bancária, históricos de crédito e empréstimos e carta de concessão de benefícios. No grupo, ainda, constam mensagens de VANESSA com os dizeres “Feito veio Dani”, “Fez Daniel caixa pra Piracicaba perdeu doc” e “Abriu veio aleijado em bom Jesus dos perdoes”, dando a entender que contas fraudulentas foram abertas nas cidades de Piracicaba e Bom Jesus dos Perdões por homem chamado DANIEL, muito provavelmente DANIEL MARCELINO, membro do núcleo base da ORCRIM (pág. 14/23 e 29/45); e e) VINICIUS GABRIEL criou, ainda, grupos no Whatsapp inserindo outro contato muito provavelmente da ré VANESSA (“TRP VANESSA” - 5511954991774), contato de nome leao (5511953361810) e o contato “talita trampo” (5511944240621), sendo provavelmente a codenunciada THALITA, outros grupos cujos nomes (“OUTUBRO”, “CONSULTA BB CARO”, “FALTA CONSULTAR BB E PEDIR PRODESP”, “AGOSTO 08”, “MULHERES BAHIA”, “SETEMBRO”, “NOMES MULHERES BAHIA outubro” e “Repescagem OUTUBRO”) indicam que, provavelmente, eram destinados ao compartilhamento de dados para as fraudes (pág. 45/55 da IPJ)”. A ré VANESSA, interrogada em Juízo, negos os fatos imputados na denúncia. Declarou que sua renda era proveniente da venda de roupas em sociedade com THALITA, na empresa STRONG e faturava entre 30 e 40 mil reais mensais líquidos. Afirmou conhecer HERIBERTO, por ser marido de THALITA. Indagada sobre os valores movimentados em sua conta, atribuiu a renda da loja com a venda de roupas. Quanto às conversas obtidas com a análise do celular de VINICIUS GABRIEL, afirmou desconhecer. Como bem assentou o MPF, há diversas contradições entre os interrogatórios de VANESSA e THALITA, a começar pelo faturamento da empresa que são sócias, THALITA declarou que faturava entre 3 a 4 mil reais, enquanto VANESSA de 30 a 40 mil reais; o local de venda também foi divergente, VANESSA alega que ambas mantinham um box na Feira da Madrugada, e THALITA afirmou que vendiam em um camelô, divergências que descredibilizam a versão da origem das grandes quantias movimentadas nas contas-correntes da ré. Por todo o exposto, apesar de negar as imputações da denúncia, é evidente que VANESSA não só integrava a organização criminosa, como também, exercia o comando coletivo, organizava e direcionava as fraudes praticadas pelo grupo, pelo que não acolho o pedido de desclassificação para o delito do artigo 288 do CP, realizado pela defesa da ré. O art. 155 do Código de Processo Penal dispõe que o juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas. O caso em exame entra no rol dessas exceções. Com efeito, os elementos informativos obtidos no inquérito policial (informação policial referente à análise de conteúdo de telefone celular e dados obtidos após quebra de sigilo bancário) tem natureza probatória, cautelar e não repetível, estando amparados na legislação processual penal. Nesse sentido: AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PLEITO DE NULIDADE DA CITAÇÃO POR EDITAL. TODOS OS MEIOS PARA A LOCALIZAÇÃO ESGOTADOS. SÚMULA 7/STJ. CONDENAÇÃO COM PROVAS COLHIDAS NA FASE INVESTIGATIVA. PROVAS IRREPETÍVEIS E ANTECIPADAS. POSSIBILIDADE. SÚMULA 83/STJ. AGRAVO IMPROVIDO. 1. A reversão da premissa fática de que esgotados todos os meios para localização da ré, a justificar a citação por edital, encontra óbice na Súmula 7/STJ. 2. As provas irrepetíveis e antecipadas, como o laudo pericial e o mandado de busca e apreensão, produzidos nos autos do inquérito policial, podem servir como base para condenação. 3. Agravo regimental improvido. (STJ, AgRg no AREsp nº 1.439.910/SC, Quinta Turma, Rel. Ministro Nefi Cordeiro, J. 08.10.2019, DJe 17.10.2019) Portanto, estando devidamente comprovado que VANESSA DEMÉTRIO DE SÁ MACEDO integrava organização criminosa voltada à prática de crimes de estelionato contra instituições financeiras (inclusive a CEF), exercendo posição de comando, mantenho a sua condenação pela prática do crime previsto no art. 2º, caput e § 3º, da Lei nº 12.850/2013, nos termos da denúncia. HERIBERTO DOS SANTOS CANDIDO A defesa de HERIBERTO pede a sua absolvição por falta de provas, pois, segundo alega, os depósitos bancários que são fruto de crime foram feitos em conta por ele aberta para uso exclusivo de sua ex-esposa, THALITA MIRANDA ALCARAZ, sendo que ele não movimentava essa conta e não sabia das atividades criminosos atribuídas a ela. Sem razão, porém. Há nos autos inúmeras provas de que HERIBERTO era parceiro de THALITA e integrou o núcleo avançado da organização criminosa, usufruindo dos valores obtidos com os estelionatos. No cumprimento do mandado de busca e apreensão expedido pelo juízo a quo, o apelante e THALITA foram encontrados juntos, às 6h da manhã de uma quarta-feira. Além disso, a corré VANESSA, em seu interrogatório, afirmou que conhecia HERIBERTO como marido de THALITA, e a mesma coisa foi dita por Rita de Cássia Vieira (mãe de Vinicius Gabriel Vieira da Rocha) e Maria Tainara, na audiência de instrução realizada na Ação Penal nº 50000875-78.2024.6124. A propósito, destaco das contrarrazões da acusação o seguinte trecho (ID 312631417): Em síntese, apurou-se que HERIBERTO, que também teve a quebra de sigilos de seus dados bancários, movimentou em sua conta-corrente, entre 25/07/2022 e 29/11/2022, o total de R$ 523.264,56. As movimentações indicam que HERIBERTO e THALITA levavam um estilo de vida luxuoso e incompatível com o patrimônio e renda declarados, bancado com os recursos advindos das fraudes praticadas pela ORCRIM. Apurou-se, inclusive, que o recorrente foi beneficiário de diversas passagens aéreas pagas com recursos advindos da conta de THALITA. [...] Neste contexto, rememore-se que o apelante foi condenado (em primeira instância) pela prática do crime previsto no art. 171, §3º, do Código Penal nos autos da Ação Penal nº 5000875-78.2024.4.03.6124, também decorrente da Operação Anonymous, junto com outros quatro membros da ORCRIM, inclusive a intermediária MARIA TAINARA, por ter participado e se beneficiado da fraude praticada na agência da CEF em Auriflama contra a vítima Antônio Carlos dos Santos. No interrogatório nos autos daquela ação, MARIA TAINARA confirmou que o recorrente pediu a conta de sua irmã emprestada. Na busca e apreensão judicialmente deferida no apartamento de HERIBERTO e THALITA, foram arrecadados diversos elementos que reforçam as práticas delitivas narradas, dentre eles: (a) mais de 20 (vinte) celulares, incluindo 2 Iphones 15 Pro Max; (b) 5 espelhos de RG em branco; (c) cartões de crédito da CAIXA em nome de terceiros; (d) 8 RG’s em nome de terceiras pessoas, porém contendo a mesma foto e dados não oficiais (indicação de falsidade); (e) comprovantes de renda e de residência em nome de terceiros; (f) folhas de repetição (treino de imitações de assinaturas); e (g) diversos cartões bancários em nome dos dois denunciados e cheques de terceiros. Interrogado na fase policial e em Juízo, conforme melhor destacado nas alegações finais do MPF, o apelante negou o delito imputado e tentou forçar a versão de que estava separado de THALITA na época dos fatos e que, por isso, não participou de suas condutas ilícitas e não teve conhecimento do esquema ora desvendado. Esta versão, todavia, restou afastada pelos elementos de prova dos autos. Conforme já exposto nos memoriais do MPF, o apelante e THALITA foram encontrados juntos durante o cumprimento de mandado de busca e apreensão em uma quarta-feira, às 06 da manhã, o que é um fortíssimo indicativo de que, ao contrário do que alegado, eles não se encontravam separados. Ainda, corré VANESSA em seu interrogatório, afirmou que conhece HERIBERTO como marido de THALITA (ID 344278572 – 00m30s). O mesmo foi dito por Rita de Cássia Vieira, mãe de VINICIUS GABRIEL, e por MARIA TAINARA em audiência de instrução realizada na Ação Penal nº 5000875-78.2024.4.03.6124. Portanto, estando devidamente comprovado que HERIBERTO DOS SANTOS CANDIDO integrou organização criminosa voltada à prática de crimes de estelionato contra instituições financeiras (inclusive a CEF), mantenho a sua condenação pela prática do crime previsto no art. 2º, caput, da Lei nº 12.850/2013, nos termos da denúncia. THALITA MIRANDA ALCARAZ A defesa de THALITA não nega sua participação no crime, tendo ela confessado em juízo sua integração à organização criminosa, negando apenas que exercesse posição de comando. Contudo, ao contrário dessa negativa, há nos autos prova de que ela exercia posição de comando da organização criminosa. Sobre isso, destaco da sentença o seguinte trecho, que é elucidativo da posição dessa apelante na prática criminosa e adoto como fundamentação: A despeito da ré alegar em seu interrogatório judicial que não ficava com todo valor transferido a ela, tampouco comandava o grupo, pois tinha “uma pessoa acima dela”, cujo nome alegou não poder revelar por risco a integridade dela e de sua família, extrai-se dos autos nº 5000466-05.2024.403.6124, que entre 26/07/22 a 12/06/23, THALITA recebeu o montante de R$1.251.823,00 e enviou para os demais membros do grupo, dentre eles VANESSA DEMETRIO DE SÁ MACEDO, MARIA TAINARA, VINICIUS GABRIEL, ELISA APARECIDA DA SILVA, DAYANA CORREIA RIBEIRO, MILENE DARLING DO NASCIMENTO, MAYSA REIS PRADO, RITA DE CÁSSIA BESSA, TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA, EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ, CAIO DE JESUS CARDOSO, ROSANA SANTOS DE JESUS e TAINA CRISTINA DA SILVA, o valor total de R$563.292,19 (cf. IDs 321346669 e 321350442 dos autos 5000466-05.2024.403.6124), não consta, portanto, dados bancários de um terceiro, para quem THALITA tenha enviado o dinheiro, demonstrando ser a destinatária final dos valores. A ré THALITA, como sócia e administradora da empresa STRONG SMOKE UP TABACARIA LTDA ME, atual STRONG COMERCIO DE ROUPAS (CNPJ 32.108.820/0001-98), juntamente com VANESSA, também utilizou as contas da empresa para receber e transferir valores ilícitos, como se observa no ID 321346669, p. 57/59 – 5000466-05.2024.4.03.6124. Apurou-se que a movimentação de R$711.051,64, no período do afastamento do sigilo bancário, foi incompatível com a atividade exercida e o capital social de R$30.000,00, considerando, ainda, que a empresa não declarou renda nem patrimônio à Receita Federal no período investigado (ID 333142214). Como asseverou o MPF, na busca e apreensão judicialmente deferida na residência de THALITA e HERIBERTO (IDs 333142217 e 333142223), no dia 25/06/2024, foram arrecadados diversos elementos que reforçam as práticas delitivas narradas, dentre eles: (a) mais de 20 (vinte) celulares, incluindo 2 Iphones 15 Pro Max; (b) 5 espelhos de RG em branco; (c) cartões de crédito da CAIXA em nome de terceiros; (d) 8 RG’s em nome de terceiras pessoas, porém contendo a mesma foto e dados não oficiais (indicação de falsidade); (e) comprovantes de renda e de residência em nome de terceiros; (f) folhas de repetição (treino de imitações de assinaturas); e (g) diversos cartões bancários em nome dos dois denunciados e cheques de terceiros. No endereço utilizado por THALITA e RITA DE CÁSSIA para armazenamento de diversos documentos ligados às fraudes praticadas pelo grupo, no apartamento à Rua Baltazar Nunes, 600, bloco 01, apto. 102, Vila Carmosina/SP, tratava-se de um “quartel-geral operacional” da organização criminosa, demonstrando a existência de um vínculo associativo para práticas ilícitas e documentos vinculados a THALITA e RITA DE CÁSSIA, bem como parentes de THALITA e a empresa STRONG SMOKE UP. Luiz Gustavo da Silva Bessa, na fase policial, confirmou que a posse do local era exercida por THALITA e RITA DE CÁSSIA. Nesse contexto, os demais membros do grupo, na fase policial, MARIA TAINARA, ROSANA SANTOS DE JESUS, mãe de CAIO DE JESUS CARDOSO, confirmaram que, a pedido de THALITA, emprestaram a conta-corrente para que ela pudesse “fugir” do pagamento de impostos devidos por seu comércio de roupa em São Paulo. CAIO DE JESUS declarou que a ré, como troca da “ajuda”, dava a ele e sua mãe pequenos valores e que THALITA movimentava a conta pelo celular deles. Na IPJ nº 3287723/2024 elaborada após a análise dos dados extraídos do celular apreendido com VINICIUS GABRIEL VIEIRA DA ROCHA, reforça a participação ativa de THALITA no esquema da ORCRIM, além da contemporaneidade dos fatos. A ré, interrogada em Juízo, confessou parcialmente os delitos, declarou que integrava a organização, mas não o comando coletivo. Quanto a seu papel, afirmou que apenas “colocava as pessoas para trabalhar” e entregava o que as “donas” pediam via Whatsapp, acrescentando que os documentos falsos e celulares apreendidos em sua residência (RG’s falsos) seriam repassados pela interrogada para as outras pessoas que concretizariam os “golpes”. Informou que somente tinha contato com quem se apresentava com os documentos falsos nas agências bancárias e que não sabe quem era o responsável pela falsificação. Aduziu, no mais, que sua renda advinha da venda de roupas que adquiria de costureiras para sacoleiros no Brás e que repassava o dinheiro que recebia em suas contas que eram provenientes das fraudes bancárias do grupo. Lado outro, a ré confirmou em Juízo a participação do corréu HERIBERTO e dos intermediários MARIA TAINARA e ROSANA SANTOS DE JESUS, mas aduz que eles não participaram do esquema e apenas emprestaram suas contas sem conhecimento da finalidade para a qual serviriam. Alegou, ainda, que o intermediário VINICIUS GABRIEL emprestava sua conta para a acusada VANESSA, a quem era subordinado, e que tinha pouco contato com ele. Confirmou que os valores enviados a ELISA APARECIDA DA SILVA e MAYSA REIS PRADO, ambas do núcleo base da ORCRIM, provavelmente foram para que elas promovessem a aberturas de contas. Confirmou, ainda, que DAYANA CORREIA RIBEIRO (núcleo base) também abria contas, recebia e repassava dinheiro para a interrogada. Alegou que mantinha relacionamento de amizade com RITA DE CÁSSIA BESSA e que alugou um apartamento para ela, sem saber o que ocorria no local. Por todo o exposto, apesar de negar o comando coletivo, restou evidente que THALITA não só integrava a organização criminosa, como também, organizava e direcionava as fraudes praticadas pelo grupo, além de bancar os gastos jurídicos com o integrante preso em flagrante cometendo algum delito. Com efeito, do exame do que foi apurado depreende-se que o papel de THALITA não era de simples integração à organização criminosa, mas de coordenação das atividades de membros de posição inferior na atividade criminosa, direcionando as fraudes praticadas pelo grupo, inclusive assumindo despesas para a defesa de membros presos por delitos praticados no contexto da organização, como entendeu o juízo. Portanto, estando devidamente comprovado que THALITA MIRANDA ALCARAZ integrava organização criminosa voltada à prática de crimes de estelionato contra instituições financeiras (inclusive a CEF), exercendo posição de comando, mantenho a sua condenação pela prática do crime previsto no art. 2º, caput e § 3º, da Lei nº 12.850/2013, nos termos da denúncia. Dosimetria das penas e regime inicial de cumprimento Passo ao reexame da dosimetria das penas e do regime inicial de cumprimento das penas privativas de liberdade aplicadas aos réus. VANESSA DEMETRIO DE SÁ MACEDO Na primeira fase, o juízo a quo fixou a pena-base em 4 (quatro) anos e 3 (três) meses de reclusão e 97 (noventa e sete) dias-multa pelos seguintes fundamentos: Atento aos critérios constantes no artigo 59 do Código Penal, verifico que ultrapassaram os limites do tipo as circunstâncias do crime, pois a organização criminosa se valia do uso de inúmeros documentos falsificados para a prática das fraudes delitivas apuradas, bem como fazia uso de contas-correntes de interpostas pessoas para dificultar o rastreamento dos valores indevidos obtidos com os crimes; e as consequências do delito, pois a CEF apontou 124 contas abertas por meio de documentação falsa de beneficiários do INSS relacionados ao grupo criminoso, cujas operações de crédito somam a quantia de R$ 5.122.654,48, além das vítimas serem idosos, com saúde debilitada e dependentes economicamente dos benefícios, o que revela a gravidade do impacto social das fraudes. A defesa pede a redução da pena-base ao mínimo legal. Com razão em parte. As circunstâncias e consequências do delito são negativas, mas a elevação feita pelo juízo merece pequeno ajuste, especialmente em relação à pena de multa, pois esta Turma tem entendimento de que a quantificação da pena de multa deve dar-se de forma proporcional à pena privativa de liberdade, segundo o mesmo caráter trifásico de dosimetria (ApCrim nº 0002526-47.2011.4.03.6106/SP, Rel. Des. Federal Nino Toldo, j. 01.9.2015, e-DJF3 Judicial 1 03.9.2015). Por isso, acolho em parte o recurso nesse ponto e reduzo a pena-base para 4 (quatro) anos de reclusão e 13 (treze) dias-multa. Na segunda fase, o juízo não reconheceu nenhuma circunstância atenuante e reconheceu a circunstância agravante do art. 2º, § 3º, da Lei nº 12.850/2013, na fração de 1/6 (um sexto), porque “a ré exercia o comando coletivo da organização criminosa”. A defesa pede o afastamento dessa circunstância agravante, mas não tem razão, pois foi comprovado que ela exercia papel de liderança dentro da organização criminosa, participando da distribuição de tarefas aos membros de menor hierarquia. Por isso, confirmo a circunstância agravante, na fração utilizada, de modo que a pena intermediária fica em 4 (quatro) anos e 8 (oito) meses de reclusão e 15 (quinze) dias-multa. Na terceira fase, o juízo não aplicou nenhuma causa de aumento ou de diminuição de pena, o que confirmo, ficando a pena definitiva estabelecida em 4 (quatro) anos e 8 (oito) meses de reclusão e 15 (quinze) dias-multa, mantido o valor unitário do dia-multa em 1/2 (meio) salário mínimo vigente HERIBERTO DOS SANTOS CANDIDO Na primeira fase, o juízo a quo fixou a pena-base em 4 (quatro) anos e 3 (três) meses de reclusão e 97 (noventa e sete) dias-multa pelos mesmos fundamentos acima transcritos. A defesa pede a redução da pena-base ao mínimo legal e tem parcial razão. Como dito acima, as circunstâncias e consequências do delito são negativas, mas a exasperação feita pelo juízo merece pequeno ajuste, especialmente em relação à pena de multa. Por isso, acolho em parte o recurso nesse ponto e reduzo a pena-base para 4 (quatro) anos de reclusão e 13 (treze) dias-multa. Na segunda fase, o juízo não reconheceu circunstâncias agravantes nem atenuantes, o que confirmo, mantendo-se inalterada a pena intermediária em relação à pena-base. Na terceira fase, o juízo não aplicou nenhuma causa de aumento ou diminuição de pena, o que confirmo, de forma que a pena definitiva fica estabelecida em 4 (quatro) anos de reclusão e 13 (treze) dias-multa. THALITA MIRANDA ALCARAZ Na primeira fase, o juízo a quo fixou a pena-base em 4 (quatro) anos e 3 (três) meses de reclusão e 97 (noventa e sete) dias-multa pelos mesmos fundamentos que utilizou nas penas-base dos demais réus, acima transcritos. A defesa não se insurgiu quanto a esse ponto da sentença. Todavia, por equidade, aplico a essa apelante o mesmo raciocínio desenvolvido para a revisão da pena-base dos outros dois réus, pois lhes são aplicáveis, de modo que reduzo de ofício a pena-base para 4 (quatro) anos de reclusão e 13 (treze) dias-multa. Na segunda fase, o juízo reconheceu a circunstância agravante da reincidência (CP, art. 61, I), por condenação transitada em julgado em 29.9.2022 (autos nº 5001158-27.2021.4.03.6118), e a circunstância atenuante da confissão espontânea (CP, art. 65, III, "d"), compensando-as, o que confirmo, tendo em vista a orientação do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em julgamento de recurso especial representativo de controvérsia, no sentido de que "[é] possível, na segunda fase da dosimetria da pena, a compensação da atenuante da confissão espontânea com a agravante da reincidência" (REsp nº 1.341.370/MT, Terceira Seção, Rel. Ministro Sebastião Reis Júnior, j. 10.4.2013, DJe 17.4.2013), o que confirmo. O juízo também reconheceu a circunstância agravante do art. 2º, § 3º, da Lei nº 12.850/2013, na fração de 1/6 (um sexto), porque a acusada exercia o comando coletivo da organização criminosa, o que confirmo. Não procede a pretensão da defesa de afastamento dessa circunstância agravante porque, como visto acima, foi comprovado que THALITA exercia liderança dentro da organização criminosa. Assim, a pena intermediária passa para 4 (quatro) anos e 8 (oito) meses de reclusão e 15 (quinze) dias-multa. Na terceira fase, o juízo não aplicou nenhuma causa de aumento ou de diminuição de pena, o que confirmo, de forma que a pena definitiva fica estabelecida em 4 (quatro) anos e 8 (oito) meses de reclusão e 15 (quinze) dias-multa. Regime inicial de cumprimento das penas privativas de liberdade O juízo fixou o regime semiaberto para início do cumprimento das penas privativas de liberdade dos corréus VANESSA e HERIBERTO, considerando que as fixara acima de 4 (quatro) anos de reclusão, mas abaixo de 8 (oito). Com relação a VANESSA, mantenho o regime semiaberto porque, apesar da revisão da dosimetria ora feita, sua pena definitiva permaneceu acima de 4 (quatro) anos de reclusão, não sendo cabível a sua substituição por penas restritivas de direitos (CP, art. 44, I). Além disso, o desconto do tempo de prisão provisória (CPP, o art. 387, § 2º) não lhe daria direito a início do cumprimento da pena privativa de liberdade em regime menos gravoso, pois ela foi presa em 25.6.2024 e a sentença condenatória foi publicada no dia 18.12.2024. (ID 312631386), permanecendo acima de quatro anos o tempo de pena privativa de liberdade remanescente. Com relação ao corréu HERIBERTO, diante do redimensionamento da sua pena, e que as circunstâncias judiciais não são negativas (CP, art. 59), provejo a sua apelação nesse ponto para fixar o regime aberto para início do cumprimento da pena privativa de liberdade (CP, art. 33, § 2º, "a"). Ademais, em 28.3.2025 a Décima Primeira Turma, por unanimidade, concedeu ordem de habeas corpus no HC nº 5004104-51.2025.4.03.0000 para afirmar “que o regime adequado para o início do cumprimento da pena é o aberto”. O acórdão tem a seguinte ementa: PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. OPERAÇÃO ANONYMOUS. DETRAÇÃO. REGIME ABERTO. 1. Considerando-se o tempo decorrido entre a prisão preventiva do paciente e a sentença e realizado o necessário desconto, para efeito de estabelecimento do regime aplicável, isso conduzirá o paciente ao regime inicial aberto, que é incompatível com a prisão preventiva. 2. Ordem concedida. Assim, diante do redimensionamento da pena, esse réu cumpre os requisitos do art. 44 do Código Penal e, por isso, substituo a sua pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos, consistentes em: i) prestação de serviços à comunidade ou a entidade pública, pelo período da pena substituída, a ser cumprida em local e modo que serão indicados pelo juízo da execução penal; ii) prestação pecuniária, no valor de 3 (três) salários mínimos, em favor de entidade pública ou privada com destinação social a ser indicada pelo juízo da execução penal. Por fim, com relação à corré THALITA, mantenho o regime fechado para início do cumprimento da sua pena privativa de liberdade (CP, art. 33, § 2º, "a") porque, embora essa pena não seja superior a 8 (oito) anos de reclusão, ela é reincidente, não sendo cabível a substituição dessa pena por penas restritivas de direitos (CP, art. 44, I). Além disso, o desconto de que trata o art. 387, § 2º, do Código de Processo Penal não lhe daria direito a início do cumprimento da pena privativa de liberdade em regime menos gravoso porque ela foi presa em 25.6.2024 e a sentença condenatória foi publicada no dia 18.12.2024. (ID 312631386). Prisão preventiva e prisão domiciliar Mantenho a prisão preventiva de THALITA MIRANDA ALCARAZ porque ainda estão presentes os motivos que levaram à sua decretação e manutenção (garantia da ordem pública e da aplicação da lei penal). Com efeito, ela exerceu papel de liderança da organização criminosa e respondeu presa ao processo. A jurisprudência do STJ firmou-se no sentido de que, em situações como a destes autos, na qual a pessoa acusada respondeu presa ao processo e foi condenada, inclusive ao cumprimento da pena em regime inicial fechado, não há motivo para a revogação da prisão preventiva. A título exemplificativo: HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. TRÁFICO DE DROGAS. NEGATIVA DO DIREITO DE APELAR EM LIBERDADE. RÉU PRESO EM FLAGRANTE E QUE ASSIM PERMANECEU DURANTE A INSTRUÇÃO. EXCESSO DE PRAZO SUSCITADO APÓS A CONDENAÇÃO. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. TESE DESCABIDA. PRISÃO PREVENTIVA. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. GRAVIDADE CONCRETA. QUANTIDADE DE DROGA APREENDIDA (16KG DE MACONHA). FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. CAUTELARES DIVERSAS DA PRISÃO. INSUFICIÊNCIA, NO CASO. ORDEM DE HABEAS CORPUS DENEGADA. PEDIDO DE REPRESENTAÇÃO POR DEMORA NO OFERECIMENTO DE PARECER PELA SUBPROCURADORIA-GERAL DA REPÚBLICA INDEFERIDO. 1. O Recorrente, preso em flagrante no dia 02/03/2018, foi condenado como incurso no art. 33, caput, da Lei n.º 11.343/2006, à pena de 5 (cinco) anos de reclusão, em regime fechado, negado o direito de recorrer em liberdade, por manter em depósito 16kg (dezesseis quilos) d e maconha. [...] 3. A manutenção da custódia cautelar no momento da sentença condenatória, nos casos em que o Acusado permaneceu preso durante toda a instrução criminal, não requer fundamentação exaustiva, sendo suficiente ao entendimento de que permanecem inalterados os motivos que levaram à decretação da medida extrema em um primeiro momento, desde que estejam, de fato, preenchidos os requisitos legais do art. 312 do Código de Processo Penal. Precedentes. 4. A manutenção da custódia cautelar encontra-se suficientemente fundamentada na garantia da ordem pública, pois a prisão preventiva está pautada na gravidade concreta da conduta, demonstrada pela quantidade de droga apreendida, que retrata a periculosidade do Agente e a possibilidade de reiteração delitiva. [...] (HC nº 558.882/SC, Sexta Turma, Rel. Ministra Laurita Vaz, j. 19.5.2020, DJe 02.6.2020) Ademais, a legalidade da prisão preventiva dessa corré foi examinada pela Décima Primeira Turma no julgamento do Habeas Corpus nº 5017470-94.2024.4.03.0000, no qual foi denegada a ordem na sessão de 12.9.2024, por unanimidade. O acórdão tem a seguinte ementa: PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. OPERAÇÃO ANONYMOUS. PRISÃO PREVENTIVA. PRISÃO DOMICILIAR. 1. A prisão preventiva é espécie de prisão cautelar que pode ser decretada pelo juiz em qualquer fase da investigação policial ou do processo penal, a requerimento do Ministério Público, do querelante ou do assistente, ou por representação da autoridade policial, como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria e de perigo gerado pelo estado de liberdade do imputado (CPP, artigos 311 e 312, na redação dada pela Lei nº 13.964/2019), somente sendo determinada quando não for cabível a sua substituição por outra medida cautelar (CPP, artigos 282, § 6º, e 319). É a ultima ratio do sistema de medidas cautelares previsto no Código de Processo Penal, especialmente depois da Lei nº 13.964/2019. 2. Investigação complexa, deflagrada para apurar a existência de organização criminosa especializada na prática de fraudes contra instituições financeiras, inclusive a Caixa Econômica Federal (CEF), por meio da utilização de documentos falsificados. Indícios suficientes de que a paciente compõe, em tese, o núcleo central da organização criminosa. A partir da análise de seus extratos bancários, foi possível constatar movimentações bancárias milionárias em suas contas-correntes e o pagamento de faturas de cartão de crédito de valores significativos, sem prova pré-constituída de que, à época dessas movimentações financeiras, ela tivesse lastro financeiro para tanto. Além disso, a paciente tem condenação criminal transitada em julgado e é investigada em outros inquéritos policiais por delitos semelhantes. Contemporaneidade da medida, conceito que, segundo o STF, está atrelado à ideia de subsistência dos motivos que levaram à decretação da medida, e não ao fator tempo. 3. O fato de a paciente ter um filho de 8 (oito) anos de idade, não justifica, por si só, sua colocação em prisão domiciliar, a despeito do que prevê o art. 318-A do Código de Processo Penal. Ela declarou que reside na cidade de São Paulo e, na audiência de custódia, que seus filhos estão sob o cuidado de sua mãe, na cidade de Salvador. Assim, como não há prova pré-constituída de que seus filhos moravam com ela ao tempo da prisão, não existe motivo para se autorizar a sua prisão domiciliar na casa de sua mãe, em outro estado da Federação. Por isso, dada a particularidade do caso concreto e o fato de que as crianças estão sob os cuidados da avó materna, não se justifica a prisão domiciliar pretendida. 4. Embora a paciente necessite de cuidados médicos pós-operatórios, inexiste indício de que ela não esteja recebendo atendimento médico adequado no estabelecimento prisional em que está custodiada. 5. Ordem denegada. Portanto, dadas as especificidades do caso concreto, justifica-se a manutenção da prisão preventiva dessa corré, observando que, como já houve a expedição de guia de recolhimento pelo juízo de origem, a execução provisória já se iniciou e essa apelante (agora apenada) poderá pleitear ao juízo da execução penal eventuais direitos decorrentes da Lei de Execução Penal (LEP; Lei nº 7.210/1984). Quanto à corré VANESSA DEMÉTRIO DE SÁ MACEDO, mantenho a sua prisão domiciliar porque, da mesma forma, ela exercia função de liderança na organização criminosa e as circunstâncias judiciais não lhe foram favoráveis, tanto que houve exasperação da pena-base, não se justificando, neste momento, a revogação de tal medida cautelar, cujos motivos e fundamentos ainda persistem (garantia da ordem pública e da aplicação da lei penal). Observo que essa manutenção se dá nos termos em que fixada na concessão da ordem de habeas corpus por esta Turma no HC nº 5019400-50.2024.4.03.0000 (sessão de 22.8.2024). Conclusão Posto isso, DOU PARCIAL PROVIMENTO à apelação de VANESSA DEMÉTRIO DE SÁ MACEDO, para reduzir a pena-base; DOU PARCIAL PROVIMENTO à apelação de HERIBERTO DOS SANTOS CANDIDO, para reduzir a pena-base e alterar para o regime aberto o início do cumprimento da sua pena privativa de liberdade, que é substituída por duas penas restritivas de direitos, nos termos acima fixados; NEGO PROVIMENTO à apelação de THALITA MIRANDA ALCARAZ e, DE OFÍCIO, reduzo a pena-base dessa apelante, ficando as penas definitivas estabelecidas em 4 (quatro) anos e 8 (oito) meses de reclusão, em regime inicial semiaberto, e 15 (quinze) dias-multa para VANESSA DEMÉTRIO DE SÁ MACEDO; em 4 (quatro) anos de reclusão, em regime inicial aberto, e 13 (treze) dias-multa para HERIBERTO DOS SANTOS CANDIDO; e em 4 (quatro) anos e 8 (oito) meses de reclusão, em regime inicial fechado, e 15 (quinze) dias-multa para THALITA MIRANDA ALCARAZ, nos termos da fundamentação supra. Comunique-se o teor deste julgamento ao juízo responsável pela custódia de THALITA MIRANDA ALCARAZ, para as providências cabíveis. É o voto. Autos: APELAÇÃO CRIMINAL - 5000870-56.2024.4.03.6124 Requerente: THALITA MIRANDA ALCARAZ e outros Requerido: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP Ementa: Direito penal e processual penal. Apelação criminal. Operação Anonymous. Crimes previstos na Lei da Organização Criminosa. Fraudes contra instituições financeiras. Dosimetria da pena. Recursos parcialmente provido e desprovido. I. Caso em exame 1. Apelações interpostas em face da sentença proferida, no âmbito da denominada Operação Anonymous, que condenou os réus pela prática do crime de organização criminosa (art. 2º, caput, da Lei 12.850/2013). Pede-se a absolvição dos réus por insuficiência de provas para a condenação e a revisão da dosimetria das penas aplicadas. II. Questão em discussão 2. As questões em discussão consistem em saber se há provas suficientes para a condenação e se há motivo para a revisão da dosimetria das penas aplicadas. III. Razões de decidir 3. A denúncia descreve a existência de uma organização criminosa bem estruturada e articulada, composta por, no mínimo, 20 (vinte) integrantes, especializada em efetuar fraudes contra instituições financeiras, inclusive a Caixa Econômica Federal (CEF), em vários municípios do país, em sua maioria no Estado de São Paulo e descreve a existência de “núcleos” de atuação, evidenciando a divisão de tarefas e a estrutura funcional. Correta a adequação típica dos fatos. 4. Materialidade, autoria e dolo comprovados em relação a todos os imputados, sendo que, em relação a dois deles, foi comprovada a liderança do grupo criminoso. 5. Dosimetria das penas revista, reduzindo-se a pena-base. IV. Dispositivo e tese 6. Recursos parcialmente provido e desprovido. _________ Dispositivos relevantes citados: CP, arts. 33, § 2º, "a"; 44; 59; 61, I, e 65, III, "d". CPP, art. 155. Lei nº 12.850/2013, art. 2º, caput e § 3º. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgRg no AREsp nº 1.439.910/SC, Quinta Turma, Rel. Ministro Nefi Cordeiro, J. 08.10.2019, DJe 17.10.2019; REsp nº 1.341.370/MT, Terceira Seção, Rel. Ministro Sebastião Reis Júnior, j. 10.4.2013, DJe 17.4.2013. ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, RATIFICA A REVISÃO O JUIZ FEDERAL CONVOCADO ALEXANDRE SALIBA. A Décima Primeira Turma, por unanimidade, decidiu DAR PARCIAL PROVIMENTO à apelação de VANESSA DEMÉTRIO DE SÁ MACEDO, para reduzir a pena-base; DAR PARCIAL PROVIMENTO à apelação de HERIBERTO DOS SANTOS CANDIDO, para reduzir a pena-base e alterar para o regime aberto o início do cumprimento da sua pena privativa de liberdade, que é substituída por duas penas restritivas de direitos, nos termos acima fixados; NEGAR PROVIMENTO à apelação de THALITA MIRANDA ALCARAZ e, DE OFÍCIO, reduzir a pena-base dessa apelante, ficando as penas definitivas estabelecidas em 4 (quatro) anos e 8 (oito) meses de reclusão, em regime inicial semiaberto, e 15 (quinze) dias-multa para VANESSA DEMÉTRIO DE SÁ MACEDO; em 4 (quatro) anos de reclusão, em regime inicial aberto, e 13 (treze) dias-multa para HERIBERTO DOS SANTOS CANDIDO; e em 4 (quatro) anos e 8 (oito) meses de reclusão, em regime inicial fechado, e 15 (quinze) dias-multa para THALITA MIRANDA ALCARAZ, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. NINO TOLDO Desembargador Federal

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Processo nº 5000187-88.2024.4.03.6004

ID: 329011200

Tribunal: TRF3 Órgão: Gab. 40 - DES. FED. NINO TOLDO Classe: APELAçãO CRIMINAL Nº Processo: 5000187-88.2024.4.03.6004

Data de Disponibilização: 18/07/2025

Polo Ativo:

LOURDES SONIA LAURA VINO

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

LUIZ GONZAGA DA SILVA JUNIOR

OAB/MS XXXXXX Desbloquear

SILVIA DE FATIMA PIRES

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EMANUEL BELEM GOMES

OAB/MG XXXXXX Desbloquear

JOAO LUIZ FREITAS RIBEIRO

OAB/MS XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 11ª Turma APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 5000187-88.2024.4.03.6004 RELATOR: Gab. 40 - DES. FED. NINO TOLDO APELANTE: JOSE GERALDO BARBOSA, HERNAN W… PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 11ª Turma APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 5000187-88.2024.4.03.6004 RELATOR: Gab. 40 - DES. FED. NINO TOLDO APELANTE: JOSE GERALDO BARBOSA, HERNAN WILLY CHOQUE SILVESTRE, LOURDES SONIA LAURA VINO Advogados do(a) APELANTE: LUIZ GONZAGA DA SILVA JUNIOR - MS10283-A, SILVIA DE FATIMA PIRES - MS21905-A Advogado do(a) APELANTE: JOAO LUIZ FREITAS RIBEIRO - MS24106-A Advogados do(a) APELANTE: EMANUEL BELEM GOMES - MG146893-A, JOAO LUIZ FREITAS RIBEIRO - MS24106-A APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP OUTROS PARTICIPANTES: PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 11ª Turma APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 5000187-88.2024.4.03.6004 RELATOR: Gab. 40 - DES. FED. NINO TOLDO APELANTE: JOSE GERALDO BARBOSA, HERNAN WILLY CHOQUE SILVESTRE, LOURDES SONIA LAURA VINO Advogados do(a) APELANTE: CASSANDRA ARAUJO DELGADO GONZALEZ ABBATE - MS12554-A, EMANUEL BELEM GOMES - MG146893-A, JOAO LUIZ FREITAS RIBEIRO - MS24106-A, ROBERSON LOBATO MORATO - MG81108-A Advogados do(a) APELANTE: LUIZ GONZAGA DA SILVA JUNIOR - MS10283-A, SILVIA DE FATIMA PIRES - MS21905-A Advogado do(a) APELANTE: JOAO LUIZ FREITAS RIBEIRO - MS24106-A APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL NO ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NINO TOLDO (Relator): Trata-se de apelações interpostas por JOSÉ GERALDO BARBOSA, HERNAN WILLY CHOQUE SILVESTRE e LOURDES SONIA LAURA VINO em face da sentença proferida pela 1ª Vara Federal de Corumbá (MS) que os condenou à pena de 7 (sete) anos, 3 (três) meses e 15 (quinze) dias de reclusão, em regime inicial fechado, e 729 (setecentos e vinte e nove) dias-multa, cada um, pela prática do crime previsto no art. 33, caput, c.c. o art. 40, I, da Lei nº 11.343/2006. O Ministério Público Federal (MPF) não propôs acordo de não persecução penal (ANPP) por ausência do requisito objetivo do art. 28-A, caput, do Código de Processo Penal (ID 309834983), nada dizendo as defesas em suas respostas à acusação (IDs 309835000, 309835008 e 309835009). JOSÉ GERALDO BARBOSA foi posto em liberdade provisória no dia 21.5.2024 (ID 309834995). A denúncia (ID 325617125, pp. 1/13, negritos no original), recebida em 19.6.2024 (ID 309835010), narra: I. EXPOSIÇÃO DO FATO CRIMINOSO No dia 29 de fevereiro de 2024, por volta das 19h, durante fiscalização de rotina na Rodovia BR-262, no Posto Fiscal Lampião Aceso, em Corumbá/MS, HERNAN WILLY CHOQUE SILVESTRE e JOSE GERALDO BARBOSA foram flagrados importando/transportando/trazendo consigo o total de 113.800g (cento e treze mil e oitocentos gramas) de cocaína, de propriedade de LOURDES SONIA LAURA VINO. Consta nos autos que, na data e local acima mencionados, durante fiscalização de rotina, servidores da Receita Federal do Brasil abordaram o ônibus de placas ARV3E60, em nome da "BEST TURISMO E TRANSPORTES", que tinha como destino a Cidade de São Paulo-SP. Durante procedimento de praxe, a equipe de fiscalização observou que o ônibus transportava uma grande carga de alimentos e outras bagagens, todas sem identificação. Apurou-se, ainda, que não havia sequer lista de passageiros. Na ocasião, foram identificados: a) GIDEVALDO RODRIGUES ALMEIDA e ALCIONE SOUZA, motoristas do veículo; e b) JOSE GERALDO BARBOSA, agenciador da viagem. Pouco tempo depois, chegou, em um carro de aplicativo, HERNAN WILLY CHOQUE SILVESTRE trazendo a lista de passageiros e as etiquetas das bagagens, e se identificando como pessoa que prestava serviço para os organizadores da viagem. Indagados sobre o proprietário da carga de alimentos, JOSE GERALDO BARBOSA e HERNAN WILLY CHOQUE SILVESTRE se dirigiram até os passageiros e buscaram a nacional boliviana FLORA MAMANI GUZMAN, identificada por eles como sendo a dona da referida carga. Ao separar os envolvidos, a equipe de fiscalização passou a entrevistar FLORA MAMANI GUZMAN, oportunidade em que ela declarou que somente possuía uma carga de milho, e que as demais cargas não lhe pertenciam. Em razão das inconsistências, o ônibus foi encaminhado ao Posto Fiscal Esdras, localizado na fronteira do Brasil com a Bolívia, para uma fiscalização minuciosa, sendo avisado aos responsáveis pelo veículo que o que pudesse ser restituído seria devolvido, mas que os produtos orgânicos proibidos seriam encaminhados ao Mapa para destruição. Além disso, foi passada orientação aos responsáveis pela viagem para que retornassem no dia seguinte. Então, no 1º/03/2024, com o auxílio de cães farejadores, foi identificada uma saca de pimenta desidratada, que possuía, em seu interior, um tablete de substância entorpecente. Diante dessa descoberta, a equipe de fiscalização tomou por bem realizar a abertura das demais sacas de pimenta, logrando êxito em encontrar, no seu interior, mais tabletes de cocaína. Na ocasião, a equipe de fiscalização procedeu à apreensão de: a) 15 (quinze) pacotes, contendo o total de 94.500g (noventa e quatro mil e quinhentos gramas) de cocaína, na forma de sal cloridrato, conforme Termo de Apreensão nº 832655/2024 (id. 316509822, págs. 26/28), Laudo Preliminar de Constatação n° 832545/2024 (id. 316509822, págs. 60/62) e Laudo de Perícia Criminal (QUÍMICA FORENSE) nº 390/2024 – SETEC/SR/PF/MS (id. 319752448, págs. 15/19); e b) 03 (três) pacotes, contendo o total de 19.300g (dezenove mil e trezentos gramas) de cocaína, na forma de base livre, conforme Termo de Apreensão nº 832655/2024 (id. 316509822, págs. 26/28), Laudo Preliminar de Constatação n° 832545/2024 (id. 316509822, págs. 60/62) e Laudo de Perícia Criminal (QUÍMICA FORENSE) nº 363/2024 – SETEC/SR/PF/MS (id. 319752448, págs. 10/14). Diante desses fatos, GIDEVALDO RODRIGUES ALMEIDA, ALCIONE SOUZA, JOSE GERALDO BARBOSA, HERNAN WILLY CHOQUE SILVESTRE e FLORA MAMANI GUZMAN foram presos em flagrante e levados à Delegacia da Polícia Federal em Corumbá/MS para as providências de praxe. Interrogada em sede policial (id. 316509822, págs. 11/12), FLORA MAMANI GUZMAN disse que embarcou no ônibus com o objetivo de ir até a Cidade de São Paulo, onde trabalha na rua, comercializando mercadorias e realizando serviços de limpeza e de cozinha. Declarou que a carga de pimenta em que a droga foi encontrada não era de sua propriedade, e que, quando embarcou, o ônibus já estava carregado com a referida carga. Informou que somente levava no ônibus uma pequena carga de milho. Por fim, ressaltou não conhecer os demais envolvidos e nem saber o motivo de terem imputado a ela a propriedade das sacas com a droga. Por outro lado, HERNAN WILLY CHOQUE SILVESTRE, em sede policial (id. 316509822, págs. 13/14), afirmou ter embarcado no ônibus algumas mercadorias de sua propriedade, como trigo, batatas e outros alimentos, mas que precisou sair. Esclareceu que, quando retornou, soube que a fiscalização havia retirado tais mercadorias. Narrou que, com o fim de recuperá-las, tentou apresentar as etiquetas de suas mercadorias, porém foi informado pelos agentes que elas tinham sido apreendidas. Contou que, no momento em que embarcava suas mercadorias, visualizou 3 vans bolivianas trazendo as cargas de pimenta. No mais, ressaltou que FLORA era quem comandava o embarque das cargas de pimenta no ônibus. Já ALCIONE SOUZA VENANCIO, quando interrogado pela autoridade policial, relatou que eventualmente prestava serviços a JOSE GERALDO BARBOSA, acrescentando que esta era a segunda vez, neste ano, que realizava viagem a mando dele, e que receberia R$ 800,00 (oitocentos reais) pela viagem de ida e volta. Narrou que GIDEVALDO era o outro motorista que conduziria o ônibus no trajeto Corumbá - MS/São Paulo - SP. Alegou não conhecer o boliviano identificado como sendo HERNAN WILLY CHOQUE SILVESTRE. Quanto aos fatos, narrou que não estava presente no momento que o embarque das mercadorias foi realizado, visto que ele e GIDELVADO permaneceram no hotel até que todos estivessem embarcados para seguir viagem. Afirmou ter presenciado o momento em que HERNAN e JOSE GERALDO apontaram FLORA como dona da carga de alimentos, mas que não tem ideia de quem realizou o embarque da mercadoria em que a droga foi encontrada. Também interrogado pela autoridade policial (id. 316509822, págs. 19/20), JOSE GERALDO BARBOSA declinou que é proprietário da empresa "BEST TRANSPORTE" e que o ônibus abordado lhe pertence. Confirmou que ALCIONE e GIDEVALDO eram motoristas do ônibus e que eventualmente eles lhe prestam serviço. Quanto a HERNAN, declarou que ele presta serviço de transporte e lhe ajuda ocasionalmente, mas ressaltou não ter vínculo com ele. Relatou que, no dia dos fatos, HERNAN lhe auxiliou com a etiquetagem das bagagens, mas acabou esquecendo os canhotos sobre o carro, e que, ao perceber tal fato, HERNAN pagou um carro de aplicativo e foi ao seu encontro. Nesse ponto, alegou não ter informado HERNAN sobre a abordagem do ônibus. No tocante à carga de alimentos, disse ter acompanhado o momento do embarque das cargas em questão, narrando que 03 (três) vans transportaram a carga até o ônibus e que a responsável pela mercadoria era a passageira FLORA MAMANI GUZMAN. Asseverou que, durante a abordagem, FLORA assumiu a propriedade da carga. No mais, afirmou que HERNAN também levava cargas de alimento no ônibus, mas que a referida carga se encontrava em outro compartimento e estava etiquetada. Reiterou que toda a carga de alimento, cerca de 30 fardos, pertencia à FLORA. Narrou, ainda, que os passageiros foram embarcados em Corumbá/MS, numa casa localizada na Rua Dom Pedro II, indicada por uma agência de São Paulo, de nome “TRANSISAAC”, que foi quem contratou a viagem. Por fim, sustentou que não tinha conhecimento sobre o entorpecente que havia na carga e que não tem qualquer envolvimento com o ilícito. Em seu interrogatório policial (id. 316509822, págs. 17/18), GIDEVALDO reservou-se ao direito de permanecer em silêncio. Realizada análise dos dados constantes no aparelho celular apreendido em poder de HERNAN, foi possível constatar, além do seu envolvimento e de JOSE GERALDO na empreitada criminosa, a proprietária da droga (cf. IPJ nº 1740726/2024 - id. 323747094). Isso, porque, das conversas travadas entre ele e o contato "TIA LURDES" (+55 11 9653-1126), identificada pela Polícia Federal como LOURDES SONIA LAURA VINO (cf. id. 323747094, págs. 07/08), foi possível extrair que foi ela quem enviou as 06 (seis) sacas de pimenta em que os pacotes de droga foram encontrados. Nesse sentido, tem-se que as tratativas do transporte ilícito foram iniciadas no dia anterior à fiscalização, em 28/02/2024, quando LOURDES SONIA LAURA VINO perguntou a HERNAN se ele poderia transportar 06 (seis) sacolas contendo cereais, tendo ele respondido quem sim. Seguem trechos da conversa: [...] À vista das provas constantes nos autos, tem-se que HERNAN WILLY CHOQUE SILVESTRE, JOSE GERALDO BARBOSA e LOURDES SONIA LAURA VINO, de forma livre e consciente da ilicitude de suas condutas, praticaram o crime de tráfico de drogas. II. MATERIALIDADE E AUTORIA A materialidade do crime de tráfico de drogas está evidenciada nos documentos acostados aos autos: Auto de Prisão em Flagrante (id. 316509822, págs. 06/20), Termo de Apreensão nº 832655/2024 (id. 316509822, págs. 26/28), Laudo Preliminar de Constatação n° 832545/2024 (id. 316509822, págs. 60/62), Laudos de Perícia Criminal Federal (QUÍMICA FORENSE) nº 390/2024 – SETEC/SR/PF/MS (id. 319752448, págs. 15/19) e nº 363/2024 – SETEC/SR/PF/MS (id. 319752448, págs. 10/14), e Informação de Polícia Judiciária nº 1740726/2024 (id. 323747094). A autoria, por seu turno, resta clara pela situação de flagrância em tela, pela IPJ nº 1740726/2024 (id. 323747094) e pelos depoimentos do condutor e das testemunhas, todos harmônicos e congruentes entre si. Igualmente, a transnacionalidade é incontroversa, posto que, pela conversa travada entre HERNAN e LOURDES, o ônibus carregado partiu da Bolívia. Ademais, não é crível que quantidade vultosa de droga (mais de 100kg) tenha sido adquirida no Brasil, haja vista que, na cidade de Corumbá/MS, não se produz cocaína. III. CLASSIFICAÇÃO DO CRIME Ante o exposto, considerando que HERNAN WILLY CHOQUE SILVESTRE, JOSE GERALDO BARBOSA e LOURDES SONIA LAURA VINO , de forma consciente e voluntária, importaram/transportaram/trouxeram consigo substância entorpecente identificada como cocaína, sem autorização e em desacordo com as normas legais e regulamentares, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL os denuncia como incursos nas penas do artigo 33, caput, c/c artigo 40, inciso I, ambos da Lei nº 11.343/2006. A sentença (ID 309835649) foi publicada em 04.11.2024. Em seu recurso (ID 309835678), a defesa de JOSÉ GERALDO pede a sua absolvição, nos termos do art. 386, III, IV, V e VII, do Código de Processo Penal ou pelo reconhecimento de erro de tipo. Subsidiariamente, pede a revisão da dosimetria da pena para (i) o redimensionamento da pena-base; (ii) a aplicação de circunstâncias atenuantes; (iii) a aplicação da causa de diminuição de pena prevista no art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/2006; (iv) o afastamento da majorante da transnacionalidade do tráfico de drogas; (v) a modificação do regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade para o aberto, com a substituição dessa pena por penas restritivas de direitos. Em seu recurso (ID 309835676), a defesa de HERNAN pede a sua absolvição, ao argumento de que sua conduta não constitui infração penal (CPP, art. 386, III). Subsidiariamente, pede a revisão da dosimetria da pena para (i) o redimensionamento da pena-base; (ii) a aplicação de circunstâncias atenuantes; (iii) o afastamento da majorante da transnacionalidade do tráfico de drogas; (iv) a modificação do regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade para o aberto, com a substituição dessa pena por penas restritivas de direitos; (v) a concessão do direito de recorrer em liberdade. Em seu recurso (ID 315317376), a defesa de LOURDES pede a sua absolvição por insuficiência de provas para a condenação, nos termos do art. 386, VII, do Código de Processo Penal. Subsidiariamente, pede (i) a aplicação da causa de diminuição de pena prevista no art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/2006 e (ii) a modificação do regime inicial de cumprimento da pena para o semiaberto. Não foram apresentadas contrarrazões. A Procuradoria Regional da República opinou pelo desprovimento das apelações (ID 320084169). É o relatório. À revisão. PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 11ª Turma APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 5000187-88.2024.4.03.6004 RELATOR: Gab. 40 - DES. FED. NINO TOLDO APELANTE: JOSE GERALDO BARBOSA, HERNAN WILLY CHOQUE SILVESTRE, LOURDES SONIA LAURA VINO Advogados do(a) APELANTE: CASSANDRA ARAUJO DELGADO GONZALEZ ABBATE - MS12554-A, EMANUEL BELEM GOMES - MG146893-A, JOAO LUIZ FREITAS RIBEIRO - MS24106-A, ROBERSON LOBATO MORATO - MG81108-A Advogados do(a) APELANTE: LUIZ GONZAGA DA SILVA JUNIOR - MS10283-A, SILVIA DE FATIMA PIRES - MS21905-A Advogado do(a) APELANTE: JOAO LUIZ FREITAS RIBEIRO - MS24106-A APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL NO ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NINO TOLDO (RELATOR): Trata-se de apelações interpostas por JOSÉ GERALDO BARBOSA, HERNAN WILLY CHOQUE SILVESTRE e LOURDES SONIA LAURA VINO em face da sentença que os condenou pela prática do crime de tráfico transnacional de drogas. Inicialmente, anoto que a ausência de contrarrazões pela acusação não implica nulidade (CPP, art. 565), conforme pacífico entendimento desta Turma: ApCrim nº 001596-27.2016.4.03.6102, Rel. Des. Federal Nino Toldo, j. 28.7.2023, Publicação 02.8.2023; ApCrim nº 0004816-12.2009.4.03.6104, Rel. Des. Federal Nino Toldo, j. 31.3.2023, Publicação 10.4.2023; ApCrim nº 0003067-39.2018.4.03.6105, Rel. Des. Federal José Lunardelli, j. 09.02.2024, Publicação 15.02.2024; ApCrim nº 0003067-39.2018.4.03.6105, Rel. Des. Federal José Lunardelli, j. 09.02.2024, Publicação 15.02.2024. Quanto ao mérito das imputações, o juízo a quo condenou os réus pelos seguintes fundamentos (ID 309835649): Excluída a potencial responsabilidade de Flora Mamani, visto que as provas não a indicam, nota-se que não há anos autos sequer menção à possibilidade de outro passageiro ser o responsável pelas cargas de alimentos, inclusive as demais sacolas, onde não se localizou droga. Pois bem, nesse contexto, inserem-se as mensagens identificadas no aparelho telefônico de HERNAN, trocadas com LOURDES (id. 323747094 - Pág. 3-7) e JOSE GERALDO (idem - Pág. 8). Nelas, LOURDES, ainda no dia 28/02/2024, às 23h40m, questiona HERNAN acerca da possibilidade de encaminhar 6 sacolas de cereal, na viagem que HERNAN faria. Na ocasião, ela envia áudios repetidamente avisando que está ocorrendo intensa fiscalização na fronteira, e HERNAN deveria tomar cuidado. No dia 29/02/2024, por volta das 19h, o ônibus é parado e detido, ocasião em que os passageiros são dispensados com suas respectivas bagagens (exceto a carga de alimento não identificada), o ônibus é "lacrado", e os responsáveis pela viagem são indicados a retornarem no dia seguinte, junto com Flora, ao qual foi imputada (por HERNAN e JOSE GERALDO) a propriedade pela carga de alimentos. No dia seguinte (01/03/2024), antes de ir ao Posto Esdras, HERNAN envia mensagens para LOURDES avisando que a carga foi apreendida, que "foi denunciado", e que "Zezinho" carregou os cereais, que não sabe a quem pertence, e que carregou as "seis sacolas", porém não encontraram nada de errado na frota. O réu indica que LOURDES deveria então ir lá buscar seu "material", assinar, e pronto, ao que a ré se recusa, dizendo que poderiam reconhecê-la. LOURDES pergunta então o porquê de não terem enviado um "batedor", e que "Zezinho" deveria ter mandado um "batedor", porque o ônibus estava carregado, e a fiscalização está sempre forte. Na esteira, LOURDES diz que não vai até a receita, e HERNAN responde que também não iria, pois iriam "ferrar" ele. LOURDES responde que vão perguntar onde ele pegou, e pede para ele não dizer que é de sua tia, que ele [JOSE GERALDO] estava levando. Por fim, em mensagens trocadas com JOSE GERALDO, também no dia 01/03/2024, os réus fazem referência ao retorno para tentar "buscar a mercadoria". Exposto o conjunto probatório, nota-se que a tese acusatória prevalece para além da dúvida razoável, sendo certo que as alternativas trazidas pela defesa não encontram respaldo suficiente. Conforme se depreende dos autos, foram seis sacolas apreendidas com droga, sendo certo que, no dia anterior, LOURDES e HERNAN combinaram o envio de "seis sacolas de cereal" para o transporte a ser efetuado, ao tempo em que apresentaram nítido receio com a fiscalização. Em que pese a defesa faça questão de enfatizar a palavra "cereal", utilizada por LOURDES nas mensagens, como incompatível com as pimentas encontradas nas sacolas com droga, nota-se que as demais provas sobrepujam tal inconsistência, visto que LOURDES faz referência inclusive a utilização de um "batedor" para fins de garantir o transporte do material. Ora, é simplesmente incongruente tamanho receio com a apreensão de uma carga de "6 sacolas de cereal", ao ponto de cogitar-se o envio de um "batedor" na frente, visto a evidente ausência de razoabilidade econômica na medida. Ademais, o testemunho de Marcial Vasquez Gutierrez, alegadamente a pessoa que teria levado as 6 sacolas até HERNAN, em nada coopera para tese defensiva, por se tratar de pessoa sem nenhuma relação comprovada com os fatos apurados, havendo inclusive indícios de indução do depoimento por parte da defesa de LOURDES, visto que, no decorrer do depoimento da testemunha, a advogada silencia o microfone, conversa com a testemunha aparentemente explicando algo, e na esteira ativa novamente o microfone. Somado a isso, o testemunho contraditório de HERNAN e JOSE GERALDO na tentativa de imputarem um ao outro as supostas tratativas com Flora Mamani para fins de "carregar os sacos de alimento" reforçam o envolvimento de ambos na empreitada, na busca de se esquivarem da responsabilidade penal, apresentando narrativa contraditória. Nesse sentido cooperam as mensagens de LOURDES, indicando que HERNAN deveria imputar a JOSE GERALDO a responsabilidade pelas sacolas (id. 323747094 - Pág. 7). Por fim, a tese defensiva de que o retorno dos réus indicaria uma suposta consciência limpa não merece prosperar, diante das demais provas. Tendo em vista que a defesa adentra o campo das hipóteses subjetivas ao tratar do estado de consciência dos réus ao retornarem à RFB para fins de nova fiscalização, é imperioso verificar se existem alternativas plausíveis para tal conduta. Pois bem, os réus deixaram o ônibus no local após imputarem a responsabilidade pela carga à Flora Mamani Guzman (em que pese sua negativa desde o início, e a ausência de qualquer prova neste sentido), o que permite inferir a falsa sensação de segurança dos réus de que as autoridades endossariam a imputação de Flora. Além disso, segundo o próprio depoimento de JOSE GERALDO perante este juízo, a fiscalização havia utilizado "cães farejadores" ainda no primeiro dia, o que permitiria crer na possibilidade de não lograrem êxito em identificar a droga, eventualmente restituindo a carga de alto valor, o que inclusive restou evidenciado nas conversas (anseio por buscar a mercadoria e seguir viagem). Pois bem. A materialidade está devidamente comprovada pelo auto de prisão em flagrante (ID 309833630, pp. 1/25), pelo Termo de Apreensão nº 832655/2024 (idem, pp. 26/28), pelo Laudo Preliminar de Constatação nº 832545/2024 (idem, pp. 60/62), confirmado pelos Laudos nº 363/2024 e nº 390/2024 (ID 309834908, pp. 10/19), sendo 19,3 kg (dezenove quilogramas e trezentas gramas) de pasta base de cocaína e 94,5 kg (noventa e quatro quilogramas e quinhentos gramas) de cloridrato de cocaína, bem como pela prova oral produzida em contraditório judicial. Quanto à autoria e ao dolo, destaca-se, inicialmente, o foco da fiscalização na apuração da responsabilidade sobre a carga (na qual foram encontradas as drogas), apreendida no ônibus clandestino abordado em Corumbá (MS), no Posto Fiscal Lampião Acesso, em 29.02.2024, durante fiscalização de rotina da Receita Federal do Brasil (RFB), no qual eram transportados passageiros bolivianos ilegais e mercadorias diversas, tendo por destino a cidade de São Paulo (SP). No momento da abordagem, não havia lista oficial de passageiros nem etiquetas das bagagens. Posteriormente, a lista de passageiros e as etiquetas das bagagens foram apresentadas por HERNAN (agente de viagens). Essa lista continha informações dos passageiros escritas à mão e divergia (quanto aos passageiros) da lista que havia sido informada à Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) para a viagem. Parte das mercadorias acondicionada nos bagageiros não tinha etiqueta, com destaque para seis sacos de pimenta desidratada, nos quais, posteriormente, a droga foi encontrada com o auxílio de cães farejadores. Os depoimentos das testemunhas na audiência de instrução foram bem resumidos pelo juízo na sentença, da qual transcrevo: A testemunha comum Gilson Koiti Huriyama, agente da RFB, ouvido perante este juízo, em resposta às perguntas do MPF, disse que inicialmente, em abordagem no Posto Fiscal Lampião Aceso em Corumbá/MS, n data de 29/02/2024, abordaram o ônibus e identificaram uma grande carga de alimento sem etiqueta de identificação. Que após lacrarem as mercadorias, no dia seguinte, localizaram entorpecente em sacos de pimentão desidratado, com auxílio de um cão farejador. Que ainda no dia inicial (29 de fevereiro) um senhora de nacionalidade boliviana disse que era dona de 2 volumes. Que posteriormente, um responsável da empresa chegou ao local de Uber, e disse que todas sacolas eram da senhora. Que os 2 volumes indicados pela senhora não estavam identificados. Que quando misturaram todos os volumes para abrir, não conseguiram determinar a propriedade. Em resposta à defesa de HERNAN, disse que não se recorda do nome da senhora. Que ela retornou no outro dia para acompanhar a verificação. Que a senhora permaneceu calma, e não pareceu surpresa ou assustada. Que ela aparentou demonstrar desconhecimento acerca do material. Que HERNAN chegou de "Uber" com as listas das passagens e as etiquetas de bagagem. Que ele não se responsabilizou pelos materiais. Em resposta à defesa de JOSE GERALDO, disse que a abordagem foi segmentada em dois dias distintos. Que as mesmas pessoas foram e retornaram no dia seguinte, para prosseguir com a identificação. Que JOSE GERALDO estava inserido entre essas pessoas. Que não reparou nenhuma reação especial dos abordados. Que nenhuma bagagem estava com identificação. Que não identificaram "compartimento secreto" no veículo. Que nos seus anos de experiência nunca viu alguém retornar para "reclamar" materiais que tinham droga. Que realmente é uma conduta inesperada, e faz menção específica à senhora [FLORA] que parecia a mais perdida de todas. Que os demais também, porém reparou mais na senhora [FLORA], pois haviam dois pacotes que ela identificou como seus. Que todos não demonstraram nenhuma reação de fuga. A testemunha comum Fábio Lemos Teixeira, analista da RFB, em resposta às perguntas do MPF, disse que estavam em uma operação no posto Lampião Aceso. Que abordaram um ônibus clandestino, com diversas mercadorias e migrantes irregulares. Que se recorda desse veículo pois foi uma situação bem atípica. Que abordaram o ônibus e pediram a lista de passageiros e a autorização da ANTT. Que cerca de 8 a 10 ônibus irregulares saem de Corumbá diariamente. Que não havia a autorização ou a lista no veículo. Que após 10 minutos parou no local um Uber. Que o rapaz que desceu do veículo estava com a lista de passageiros e indicou quais seriam as mercadorias. Que levaram o veículo ao posto Esdras para posterior análise. Que insistentemente o motorista, JOSÉ GERALDO e "Wilker" apontaram uma senhora como dona das mercadorias. Que ela estava nervosa. Que haviam mais de 3 toneladas de mercadoria, entre elas, batata, chunho, cebola, pimenta desidratada. Que o ônibus foi lacrado, para fins de análise no outro dia. Que então localizaram droga em meio à carga da pimenta desidratada. Que pressionaram a senhora. Que "viam" que a senhora não tinha como ser a proprietária da droga. Que separaram os quatro. Que a senhora negou a posse total das mercadorias, apontando que apenas era proprietária do "chunho" e da batata. Que ela apontou com a cabeça que era uma das pessoas do ônibus. Que desde o primeiro dia a senhora negou a propriedade. Que era muita mercadoria, por isso levaram ao posto Esdras para fiscalização no outro dia. Que os outros "três" continuaram dizendo que era dela. Em resposta à defesa de HERNAN, disse que Flora indicou com a cabeça a pessoa de JOSE GERALDO como o responsável pela droga. Que é comum as pessoas estrangeiras fazerem transporte de mercadoria. Que trabalha nessa área desde 2014, que vê muitas situações de ônibus clandestinos. Que é uma prática comum. Que é incomum a quantidade de droga que imputaram na senhora. Que a droga que costuma ser transportada dessa forma é pouca. Que já fizeram apreensões pequenas. Que mula não leva essa quantidade na sua opinião. Que achou estranho imputarem a ela o crime. Que aparentava ser uma senhora humilde. Que grande parte dessa cocaína era na forma de cloridato, ou seja, cocaína pura. Que essa cocaína vai para Europa. Que HERNAN ficou nervoso quando separaram a senhora dos demais. Que ficou andando de um lado para o outro. Que "Wilker" era o que estava no Uber [na tela, HERNAN aparecia com o nome "Wilker" escrito embaixo]. Em resposta à defesa de LURDES, disse que Flora apontou JOSE GERALDO como o responsável pela mercadoria durante conversa informal. Que só encontraram droga na carga de pimenta desidratada. Em resposta à defesa de JOSE GERALDO, disse que haviam mais de 40 pessoas no ônibus no momento da abordagem. Que na abordagem, relacionaram as mercadorias aos passageiros. Que mandaram descarregar todas as bagagens, e verificarem, dentro do bagageiro, de quem eram as mercadorias. Que então HERNAN chegou ao local com a relação de passageiros. Que, das mercadorias que estavam acondicionadas no bagageiro, incutiram toda responsabilidade à senhora [Flora]. Que não havia lista dos responsáveis pela mercadoria que estava no bagageiro. Que imputaram na hora a responsabilidade à Flora. Que Flora retornou ao local. Que JOSE GERALDO estava muito nervoso, e esse é o grande "x" da questão. Que a todo momento ele e HERNAN imputavam a responsabilidade pela mercadoria a Flora. Que em nenhum momento disseram que era de qualquer outro passageiro. Que JOSE GERALDO se apresentou no dia da abordagem como proprietário do ônibus, e no outro dia compareceu para nova fiscalização de livre e espontânea vontade. A testemunha de defesa Gidevaldo Rodrigues de Almeida, que possuí relação profissional com JOSE GERALDO, disse que desconhece acerca dos fatos apurados. Em resposta à defesa de JOSE GERALDO, disse que é motorista há 30 anos. Que conhece JOSE GERALDO há 2 anos. Que nunca ouviu dizer que o réu seria envolvido com tráfico. Que fez 4 ou 5 viagens para ele. Que nunca viu nenhuma modificação ilícita nos ônibus. Que estava no ônibus no dia da abordagem. Que não sabe se tinham ANTT. Que não se lembra. Que havia uma lista de cerca de 40 passageiros. Que a receita mandou todos descerem para fazer a abordagem. Que então mandaram os demais passageiros embora, e disseram para os investigados retornarem no outro dia. Que Flora estava presente. Que o local onde estava localizado o entorpecente seria o local das bagagens dela. Que JOSE GERALDO não convidou os demais para fugirem. Que se apresentaram no outro dia de livre e espontânea vontade. Em resposta à defesa de LURDES, disse que estava na viagem como segundo motorista. Que as bagagens foram colocadas no carro pelo despachante. Que todas bagagens que vão no ônibus tem identificação. Que acha que o nome dele é "Max". Que no dia da abordagem ele chegou lá pois havia esquecido das etiquetas. Que todas bagagens estavam identificadas. Que a etiquetagem foi feita na rua. Que estavam no hotel aguardando. Que o abastecimento do ônibus é no dia da viagem. Em resposta à defesa de HERNAN, disse que o embarque foi feito no local, em uma rua "Anderson". Que aguardaram no hotel, e quando chegaram já estava tudo pronto, só fecharam o bagageiro e pronto. Que conhece HERNAN das viagens. Que nunca teve outros problemas, sempre trabalharam certinho. A testemunha de defesa Alcione Souza Venâncio disse que conhece JOSE GERALDO, estabelecendo uma relação profissional, pois é motorista. Em resposta à defesa de JOSE GERALDO, disse que conhece o réu desde 2019. Que nunca ouviu falar que o réu é envolvido com tráfico de drogas. Que nas viagens que fez, já foram parados pela fiscalização, com cães farejadores, e nunca encontraram nada. Que nas viagens havia registro regular na ANTT. Que o responsável por guardar as bagagens é o agenciador. Que JOSE GERALDO estava no hotel com os motoristas, e só foi ao ônibus na hora de saírem. Que após a abordagem no posto lampião, levaram todos para o posto da fronteira, verificaram mala por mala, e liberaram todos, mantendo o ônibus apreendido para posterior inspeção das bagagens que restaram. Que JOSE GERALDO não fez um convite para fuga nesse ínterim. Que se soubesse da droga, não retornaria. Que todos retornaram no outro dia, e pensaram que obteriam as mercadorias e seriam liberados. Que no momento da abordagem, ouviu ela dizer que toda mercadoria era dela. Que JOSE GERALDO não ficou com receio de voltar à receita. Que não sabe se ele é milionário, e que trabalha sempre acompanhando as viagens. Que os demais passageiros não foram chamados para prestar depoimento. Em resposta à defesa de LURDES, disse que as mercadorias são etiquetadas. Que o agenciador que etiqueta. Que normalmente é no mesmo dia. Que não sabe de mercadorias que seriam previamente deixadas em um galpão na Bolívia, e depois carregadas. Em resposta à defesa de HERNAN, disse que viu o réu duas ou três vezes, nas viagens. Que nunca houve problema com ilícitos nelas. Que HERNAN não estava no ônibus. Que ele havia esquecido de entregar as etiquetas. Que ele foi ao local porque os ônibus não podem viajar sem essas etiquetas. A testemunha de defesa Marcial Vasquez Gutierrez disse que conhece LURDES. Que atravessou a mercadoria em seis sacos, dois de batatas secas, dois de [ininteligível] secas, e dois de milho em grão. Que naquela noite, Lurdes mandou uma encomenda de 6 sacos de cereal [nesse momento, a defesa mutou o microfone, conversou com a testemunha, e desmutou o microfone]. Que levou os 6 sacos porque HERNAN disse que levaria uma encomenda a pedido de LURDES. Que os 6 sacos estão com o nome "LURDES" e não tem como errar. Em resposta à defesa de LURDES, disse que no dia que levou, HERNAN não estava no local, e deixou em um depósito. Que foi um dia antes do ônibus sair. Que HERNAN disse que etiquetaria. Que deixou claro para HERNAN que os sacos eram de LURDES. Que os sacos consistiam em dois de batatas secas, dois de [ininteligível] secas, e dois de milho em grão. A testemunha de defesa Danilo Nascimento Junqueira, policial judiciário responsável pela elaboração de um laudo pericial em aparelho telefônico apreendido nos autos, disse que apenas fazem constar informações relevantes com o contexto fático apurado. Em resposta à defesa de JOSE GERALDO, disse que não se lembra desse caso específico. Que ultimamente, os celulares são apreendidos, passam por extração, e chegam apenas os dados extraídos. Que seguem um normativo para manutenção da adequada cadeia de custódia. Que se não constam dados relevantes na informação, é porque não foram encontrados. Em seu interrogatório, HERNAN negou envolvimento com o tráfico da droga apreendida. Declarou que apenas prestava assistência aos passageiros, etiquetando suas bagagens e organizando o embarque, e que soube da remessa de mercadorias de uma mulher chamada Flora apenas no momento em que ela já estava dentro do ônibus. Disse que não conhecia Flora e que a organização da bagagem dela fora feita por JOSÉ GERALDO ("Zezinho"), que teria informado que um dos compartimentos de bagagem do ônibus era exclusivo para a bagagem dela. Confrontado com mensagens trocadas com JOSÉ GERALDO, disse que não se lembrava e que, se soubesse da droga, não teria retornado ao posto da RFB, pois estava a um passo da Bolívia, tendo acompanhado JOSÉ GERALDO inocentemente. Disse também que um boliviano levara as seis sacolas de LOURDES à garagem e que nelas havia alimentos (batata e milho), tendo sido essa a primeira vez que ela despachara mercadoria com ele. Em resposta às perguntas do defensor de JOSÉ GERALDO, disse que (conforme a sentença): (...) entregou uma lista com o rol de passageiros e os responsáveis pelas malas. Que a mercadoria que estava separada já estava no ônibus, que não fez o embarque dela. Que JOSE GERALDO disse que tudo era dela. Que não conversou com dona Flora, e a conheceu no momento da viagem. Que não conferiu a mercadoria, e JOSE GERALDO disse que tudo que estava separado no ônibus era de dona Flora. Que não quantas bagagens eram de dona Flora, pois o compartimento dela estava cheio, e não foi o responsável de carregar elas, mas apenas dos demais passageiros. Que JOSE GERALDO o chamou para tentar ir até a receita buscar o ônibus. Que ele não falou nada acerca de drogas. Que fez duas ou três viagens para JOSE GERALDO, e o conhece há cerca de três meses. Que nas outras viagens não houve qualquer problema com droga. Que o agenciamento para transporte das pessoas é feita pelo depoente. Que a contratação da empresa de JOSE GERALDO é para fins de transporte de pessoas. Que o depoente normalmente envia os passageiros pela empresa Andorinha. Que devido a falta de dinheiro dos passageiros, procurou um ônibus mais barato, o de JOSE GERALDO. Que Flora nunca viajou com eles. Que Flora conversou com JOSE GERALDO, e não com o depoente. Que não conhecia dona Flora, e estava cuidando dos passageiros dele (outros 40). Que Flora comprou a passagem com JOSE GERALDO. Que o ônibus era dele, então ele poderia fazer o que quiser. Que dona Flora não estava na lista de passageiros. Que mandou os documentos dos passageiros para o motorista, e o de dona Flora não está incluído. Que JOSE GERALDO tinha dito um dia anterior que levaria as bagagens de dona Flora. Implicou que não há contradição em ser o contratante da viagem, e ao mesmo tempo "permitir" que um compartimento inteiro fosse ocupado por passageiro que não era de sua responsabilidade, e que havia espaço no ônibus para tanto. Que nas outras três viagens, JOSE GERALDO não levou bagagens de outras pessoas. Insiste que não conhecia dona Flora, e que JOSE GERALDO sequer disse o nome da pessoa, apenas dizendo que levaria a mercadoria de uma "senhora". Que no embarque conheceu dona Flora. Que JOSE GERALDO não o chamaria para retornar ao posto de fiscalização se soubesse que havia droga. Disse ainda, em resposta às perguntas do seu defensor, que não tinha ciência da droga no veículo; que trabalhava com turismo fazia um ano e tinha feito duas ou três viagens com JOSÉ GERALDO e que nunca tinha feito transporte de mercadorias; que havia muito controle e, por isso, "no geral pediam para não levar mercadoria". Disse também que avisou a LOURDES da apreensão das mercadorias e também que tentariam recuperar as seis sacolas etiquetadas; que "Scooby" era o motorista e que as mensagens indicando que seguiriam viagem referiam-se a parte dos passageiros que não conseguiu distribuir em outros ônibus. O interrogatório de JOSÉ GERALDO foi bem sintetizado na sentença e, por isso, o transcrevo parcialmente: (...) JOSE GERALDO BARBOSA disse que na data dos fatos, HERNAN, apelidado de "Max", era o contratante da viagem, e iriam chegar em um dia e sair no outro. Que remarcaram a viagem para o dia seguinte. Que por volta das 15h, HERNAN disse que poderiam viajar pois quase todos passageiros estavam no local. Que deixou o ônibus no endereço dele. Que não há local específico de embarque em Corumbá/MS, mas em São Paulo/SP sim. Que evita de trabalhar sem ANTT por causa do "transtorno". Que quando chegou, HERNAN estava etiquetando as bagagens. Que nesse momento chegou uma senhora de nome Flora, com três "vans", e perguntou se havia espaço no ônibus. Que haviam chegado apenas 38 passageiros, e portanto havia espaço. Que ela conversou com HERNAN, e ele perguntou se havia espaço para bagagem dela. Que então respondeu que havia espaço. Que ela acertou com ele acerca da reserva do compartimento. Que os motoristas das "vans" descarregaram os sacos e alojaram no ônibus. Que tiveram que acrescentar o nome dela na lista de passageiros. Que está registrado nos autos com a letra de HERNAN. Que então finalizaram o embarque, e deram início a viagem. Que foram abordados, e na abordagem identificaram as bagagens. Que como as malas de Flora eram pesadas, não desceram no posto lampião, e levaram o veículo ao posto da fronteira. Que lá, liberaram todos que não tinham mercadoria. Que marcaram para retornar no outro dia e terminar a fiscalização. Que Flora estava no outro dia. Que HERNAN disse que havia parte de mercadoria de responsabilidade de LURDES. Que após colocarem cães farejadores, localizaram a droga. Que então foram encaminhados pra Polícia Federal. Que não pode haver mercadoria sem responsável no ônibus. Que as pimentas eram da dona Flora. Que não se lembra quantos fardos eram de LURDES. Em relação à corré LOURDES, transcrevo o resumo do seu interrogatório feito na sentença: (...) disse que estava enviando uma encomenda de cereais para São Paulo/SP. Que eram duas bolsas de Chunho (batata), duas de [ininteligível], e uma de [ininteligível] e uma bolsa de trigo. Que é comum enviar encomendas assim. Que envia para seu irmão em São Paulo/SP, que vende na feira livre. Acerca das conversas com HERNAN no celular, disse que estava com medo da apreensão dos cereais, pois o IAGRO as toma. Que acerca do "batedor", disse que não falou disso com HERNAN. Que os ônibus às vezes contratam "batedor" para evitar fiscalização. Que perguntou se por acaso ele tinha batedor. Que conhece JOSE GERALDO, vulgo "Zezinho" das viagens. Que não estava com medo de ir a RFB. Acerca da mensagem enviada a HERNAN, em que demonstrou medo de a polícia a conhecer, disse que é porque sempre passa mercadorias, e portanto tinha medo de ser reconhecida pela polícia. Que conhece o motorista de apelido "Scooby". Que ainda não havia pago pelo transporte, pois iria pagar quando chegasse ao destino. Que o encarregado etiquetaria a mercadoria, e as delas estavam com o nome. Que uma moça estava recebendo as mercadorias. Em resposta a perguntas do defensor do corréu HERNAN, disse, sobre o batedor, que "só perguntou porque sempre escuta falar que as pessoas enviam 'batedor'. Que já perdeu mercadoria pro IAGRO". Pois bem. Como destacado pelo juízo na sentença: (...) o caso concreto é incomum, visto a divisão do procedimento fiscalizatório em duas etapas, em dias distintos, permitindo-se a comunicação dos investigados após a apreensão inicial da carga, mesmo que, naquela ocasião, ainda não se conhecia a natureza ilícita do material. Registra-se que a conduta adotada pelos agentes, mesmo que justificável (o que não aparentou ser), prejudicou em grande monta o processo penal a que deu origem. A querela reside em torno de quem seria o responsável pela carga de alimentos na qual estava inserida a droga, distribuída em seis sacolas, e acondicionada junto à pimenta seca (matéria orgânica). A defesa de JOSÉ GERALDO pede a sua absolvição alegando insuficiência de provas da autoria e, subsidiariamente, por erro de tipo, pois ele pensava que transportaria material lícito (ID 309835678), ao passo que as defesas de HERNAN e LOURDES pedem suas absolvições ao argumento de que não há prova da autoria em relação a eles. No entanto, como bem observado pelo juízo, tanto JOSÉ GERALDO quanto HERNAN apontaram a passageira Flora Mamani Guzman como sendo a proprietária da carga, mas, ao deporem em juízo, imputaram um ao outro a responsabilidade pelas tratativas com ela acerca do carregamento dessa carga. Contudo, nenhum dos dois esclareceu o motivo pelo qual essa carga não foi etiquetada. Ela, por sua vez, negou a responsabilidade pela carga, dizendo que apenas transportava pequena quantidade de milho e que suas sacolas já estavam no veículo quando nele entrou. O fato é que as sacolas contendo drogas não estavam identificadas (etiquetadas) e era de responsabilidade do transportador etiquetar todas as bagagens despachadas, conforme a Resolução ANTT nº 6.033/2023 citada na sentença. JOSÉ GERALDO admitiu que ajudara a etiquetar as bagagens, mas que "esqueceu" os canhotos sobre um carro e, por isso, HERNAN, vendo as etiquetas sobre o carro, pegou um Uber e as levou até ele, espontaneamente. Tal versão não é crível, pois, como destacado na sentença: Ademais, trata-se de transporte efetuado na região de fronteira Brasil-Bolívia, onde ocorre o fluxo intenso de drogas produzidas no país vizinho, e os custodiados transportavam diversos migrantes estrangeiros, sendo estranha a ausência de cuidado com a etiquetagem justamente em uma fronteira onde o tráfico de drogas é recorrente, usando-se muitas vezes do transporte rodoviário, através de ônibus. Pois bem, para além da ausência de etiquetagem da carga de alimentos, tem-se o fato de que, a lista de passageiros constante na licença de viagem eletrônica da ANTT, juntada pelo réu JOSE GERALDO (id. 319045649 e 321165825), em nada coincide com outras duas listas juntadas pela defesa do réu (id. 319045648 e 321165824), sendo certo que as duas últimas não possuem qualquer teor probatório, visto que tratam-se de meras tabelas em arquivo simples, sem identificação adequada da data de manufatura, ou qualquer tipo de certificação de autenticidade e/ou validade jurídica. Nesse contexto, a atribuição de responsabilidade à Flora Mamani parte unicamente dos depoimentos de HERNAN e JOSE GERALDO, sendo certo que essa negou perante a autoridade policial, assumindo apenas a responsabilidade por uma pequena carga de milho. Além disso, as mensagens trocadas por HERNAN com JOSÉ GERALDO e LOURDES provam a participação dos apelantes no tráfico transnacional de drogas. Como dito pelo juízo: (...) LOURDES, ainda no dia 28/02/2024, às 23h40m, questiona HERNAN acerca da possibilidade de encaminhar 6 sacolas de cereal, na viagem que HERNAN faria. Na ocasião, ela envia áudios repetidamente avisando que está ocorrendo intensa fiscalização na fronteira, e HERNAN deveria tomar cuidado. No dia 29/02/2024, por volta das 19h, o ônibus é parado e detido, ocasião em que os passageiros são dispensados com suas respectivas bagagens (exceto a carga de alimento não identificada), o ônibus é "lacrado", e os responsáveis pela viagem são indicados a retornarem no dia seguinte, junto com Flora, ao qual foi imputada (por HERNAN e JOSE GERALDO) a propriedade pela carga de alimentos. No dia seguinte (01/03/2024), antes de ir ao Posto Esdras, HERNAN envia mensagens para LOURDES avisando que a carga foi apreendida, que "foi denunciado", e que "Zezinho" carregou os cereais, que não sabe a quem pertence, e que carregou as "seis sacolas", porém não encontraram nada de errado na frota. O réu indica que LOURDES deveria então ir lá buscar seu "material", assinar, e pronto, ao que a ré se recusa, dizendo que poderiam reconhecê-la. LOURDES pergunta então o porquê de não terem enviado um "batedor", e que "Zezinho" deveria ter mandado um "batedor", porque o ônibus estava carregado, e a fiscalização está sempre forte. Na esteira, LOURDES diz que não vai até a receita, e HERNAN responde que também não iria, pois iriam "ferrar" ele. LOURDES responde que vão perguntar onde ele pegou, e pede para ele não dizer que é de sua tia, que ele [JOSE GERALDO] estava levando. Por fim, em mensagens trocadas com JOSE GERALDO, também no dia 01/03/2024, os réus fazem referência ao retorno para tentar "buscar a mercadoria". Não é crível a indignação de LOURDES pela ausência de batedores para o transporte da “frota” se o que era transportado (como alegado) fossem apenas alimentos de baixo valor. Além disso, nas conversas travadas entre HERNAN e LOURDES, verifica-se claramente o receio de ambos em retornar no dia seguinte para o posto da RFB, tendo HERNAN mencionado a LOURDES que “Scooby está lá dentro agora, preso, Deus deixou que o libertassem hoje porque graças a Deus eles não encontraram nada de errado na frota”, o que indica claramente a existência de drogas no ônibus que, até então, não haviam sido descobertas. Portanto, está devidamente comprovada a materialidade, a autoria e o dolo de todos os apelantes na prática do tráfico transnacional de drogas narrado na denúncia. Por isso, mantenho as condenações de JOSÉ GERALDO BARBOSA, HERNAN WILLY CHOQUE SILVESTRE e LOURDES SONIA LAURA VINO pela prática do crime de tráfico transnacional de drogas (arts. 33, caput, e 40, I, da Lei nº 11.343/2006), nos termos da denúncia. Passo ao reexame da dosimetria das penas de modo simultâneo, pois são comuns as circunstâncias objetivas, destacando eventuais situações específicas, a fim de observar estritamente o princípio da individualização da pena. Na primeira fase, o juízo a quo fixou a pena-base privativa de liberdade em 6 (seis) anos e 3 (três) meses de reclusão para cada réu, levando em consideração, preponderantemente, a quantidade e a natureza da droga apreendida (113,8 kg de cocaína), nos termos do art. 42 da Lei nº 11.342/2006. As defesas pedem a redução da pena-base, porém sem razão. As circunstâncias do crime relacionadas à natureza e à quantidade da droga apreendida autorizariam a fixação da pena-base em patamar até maior do que o fixado na sentença, de acordo com o entendimento da Turma em casos análogos. Contudo, como não houve recurso da acusação, mantenho a pena-base fixada na sentença. Na segunda fase, o juízo não reconheceu circunstâncias agravantes nem atenuantes, o que confirmo, mantendo-se inalterada a pena intermediária em relação à pena-base. Na terceira fase, o juízo aplicou a causa de aumento prevista no inciso I, do art. 40 da Lei nº 11.343/2006, mas a defesa de HERNAN pede a sua exclusão, argumentando que não foi comprovada a transnacionalidade, pois o veículo não atravessou a fronteira. Sem razão, contudo. A transnacionalidade da droga está comprovada pelo fato de que os passageiros do ônibus eram bolivianos e tinham por destino a cidade de São Paulo, sendo desnecessária a comprovação da transposição de fronteira. Nesse sentido: PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. TRÁFICO DE DROGAS. OFENSA AO ART. 40, I, DA LEI Nº 11.343/06. NÃO OCORRÊNCIA. TRANSNACIONALIDADE DO DELITO COMPROVADA. REEXAME FÁTICO E PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. De acordo com o entendimento desta Corte Superior, para a caracterização da transnacionalidade do tráfico de entorpecentes, é desnecessária a comprovação de transposição de fronteiras, bastando que as circunstâncias do crime indiquem que a droga era proveniente de local fora dos limites territoriais nacionais. 2. Para desconstituir as conclusões do acórdão impugnado, de que a droga não era proveniente do Paraguai ou que o acusado não tinha ciência da origem da droga, a fim de afastar transnacionalidade do delito, seria necessário aprofundado revolvimento do contexto fático-probatório, providência vedada no âmbito do recurso especial pelo óbice na Súmula 7/STJ. 3. Agravo regimental a que se nega provimento. (STJ, AgRg no REsp 1.839.326/MS, Quinta Turma, Rel. Ministro Ribeiro Dantas, j. 19.5.2020, DJe 27.5.2020) PENAL. PROCESSO PENAL. TRÁFICO DE DROGAS. COMPETÊNCIA. JUSTIÇA FEDERAL. TRANSNACIONALIDADE COMPROVADA. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO PROVIDO. 1. Para a configuração da transnacionalidade do delito, não é necessário que o agente ou o entorpecente ultrapasse as fronteiras do País. O delito, com essa causa de aumento, pode ocorrer no território nacional, desde que haja elementos indicativos de que o fato se relacione com o estrangeiro. 2. Recurso em sentido estrito provido. (TRF3, RSE 0003287-61.2014.4.03.6110, Quinta Turma, Rel. Des. Federal André Nekatschalow, j. 23.02.2015, DJF 3 Judicial 1 03.03.2015) Em razão disso, mantenho essa causa de aumento, na fração aplicada. O juízo não aplicou a causa de diminuição de pena prevista no art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/2006 com a seguinte fundamentação: Quanto à minorante da Lei 11.343/2006, artigo 33, § 4º, esta somente deve ser aplicada se o réu preencher cumulativamente as condições legais, quais sejam, ser primário, de bons antecedentes, não se dedicar a atividades criminosas nem integrar organização criminosa. Entendo que a prova do envolvimento com a organização criminosa é da acusação. Andrey Borges de Mendonça e Paulo Roberto Galvão de Carvalho, a esse respeito, afirmam o seguinte: Vislumbramos que, em decorrência do princípio da presunção de inocência, o réu não precisa comprovar que é primário e de bons antecedentes e, principalmente, que não se dedica às atividades criminosas nem integra organização criminosa, devendo tal ônus recair sobre o Ministério Público. (Lei de Drogas: comentada artigo por artigo. 2 ª Ed. São Paulo: Método, 2008. p. 113) No caso dos autos a instrução probatória demonstrou que os réus se dedicam a atividades criminosa. Nesse sentido, endosso a fundamentação trazida pelo parquet no tópico específico dos memoriais, visto que suficiente pra fundamentar a impossibilidade de concessão do benefício (id. 339582752 - pág. 21). De acordo com o art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/2006, as penas do tráfico de drogas poderão ser reduzidas de 1/6 (um sexto) a 2/3 (dois terços), desde que o agente (i) seja primário, (ii) de bons antecedentes, (iii) não se dedique a atividades criminosas (iv) nem integre organização criminosa, devendo esses quatro requisitos concorrer cumulativamente para que a minorante seja aplicada. Embora os apelantes sejam primários e não registrem antecedentes criminais, o contexto do tráfico (droga escondida em sacos de alimentos e colocadas no bagageiro do ônibus sem etiquetas de identificação) mostra que se trata de tráfico organizado. Além disso, o valor da mercadoria ilícita traficada é bastante alto no mercado clandestino de drogas, o que afasta a aplicação da minorante no caso concreto. Por isso, não acolho a pretensão da defesa. Assim, a pena privativa de liberdade para cada apelante fica mantida em 7 (sete) anos, 3 (três) meses e 15 (quinze) dias de reclusão Com relação à pena de multa, o juízo a fixou em 729 (setecentos e vinte e nove) dias-multa, proporcionalmente à pena privativa de liberdade e pelo mesmo critério de aplicação, o que mantenho. No que toca ao regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade, o juízo fixou o regime fechado pelo seguinte fundamento : Em que pese o quantum de pena privativa de liberdade aplicado (superior a quatro anos e inferior a oito anos), determino que o cumprimento da pena seja iniciado no regime fechado, uma vez que as circunstâncias do caso concreto, relacionadas à vinculação da parte ré com organização criminosa dedicada ao tráfico de drogas, demonstram que a imposição de regime menos gravoso não seria suficiente para reprimenda do delito (art. 33, §3º, do Código Penal). Destaco que de acordo com a jurisprudência dos Tribunais Superiores, as circunstâncias do art. 59 do Código Penal são úteis também para a individualização do regime inicial. No caso, as circunstâncias do delito e a quantidade e qualidade da droga autorizam o regime mais gravoso, visto o grau de sofisticação do delito (droga oculta e envolta em carga orgânica), bem como as condutas adotadas pelos réus para buscar se evadir da responsabilidade penal (exercício de atividade comercial voltado ao transporte rodoviário, aproveitando-se dessa condição para não etiquetar as bagagens com droga, dando aparência de casuísmo pré-estabelecido). Ante o exposto, fixo como o regime inicial fechado para início do cumprimento da pena de todos os réus, nos termos do CP, 33, § 2º e 3°. As defesas de JOSÉ GERALDO e HERNAN pedem a alteração do regime inicial para o aberto, ao passo que a defesa de LOURDES pede a alteração para o regime semiaberto. Com razão a defesa de LOURDES e com parcial razão as defesas de JOSÉ GERALDO e HERNAN. Como as penas aplicadas aos apelantes não são superiores a oito anos de reclusão e eles não são reincidentes, sendo que o fator preponderante para a exasperação da pena-base de cada um foi a quantidade e natureza da droga, não se justifica a fixação do regime fechado. Por isso, altero para o regime semiaberto o início do cumprimento da pena privativa de liberdade de cada apelante (CP, art. 33, § 2º, "b"), não podendo essa pena ser substituída por penas restritivas de direitos, por falta de requisito objetivo (CP, art. 44, I). O desconto do tempo de prisão provisória não daria ao corréu HERNAN o direito de iniciar o cumprimento da sua pena em regime menos gravoso, pois ele foi preso em flagrante no dia 01.3.2024 e a sentença condenatória foi publicada no dia 04.11.2024. Quanto à prisão preventiva de HERNAN WILLY CHOQUE SILVESTRE, mantenho-a porque ainda persistem os motivos que levaram à sua decretação. Ele respondeu preso ao processo por crime que, embora não tenha sido praticado com violência ou grave ameaça a pessoa, é de gravidade concreta. Nesse sentido: HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. TRÁFICO DE DROGAS NEGATIVA DO DIREITO DE APELAR EM LIBERDADE. RÉU PRESO EM FLAGRANTE E QUE ASSIM PERMANECEU DURANTE A INSTRUÇÃO. EXCESSO DE PRAZO SUSCITADO APÓS A CONDENAÇÃO. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. TESE DESCABIDA. PRISÃO PREVENTIVA. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. GRAVIDADE CONCRETA. QUANTIDADE DE DROGA APREENDIDA (16KG DE MACONHA). FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. CAUTELARES DIVERSAS DA PRISÃO. INSUFICIÊNCIA, NO CASO. ORDEM DE HABEAS CORPUS DENEGADA. PEDIDO DE REPRESENTAÇÃO POR DEMORA NO OFERECIMENTO DE PARECER PELA SUBPROCURADORIA-GERAL DA REPÚBLICA INDEFERIDO. 1. O Recorrente, preso em flagrante no dia 02/03/2018, foi condenado como incurso no art. 33, caput, da Lei n.º 11.343/2006, à pena de 5 (cinco) anos de reclusão, em regime fechado, negado o direito de recorrer em liberdade, por manter em depósito 16kg (dezesseis quilos) de maconha. 2. O suposto excesso de prazo na formação da culpa é matéria que sequer foi tratada pelo acórdão impugnado, razão pela qual a análise diretamente por este Superior Tribunal de Justiça configuraria vedada supressão de instância. Ainda que assim não fosse, é descabido falar em excesso de prazo na formação da culpa após a prolação de sentença de mérito. 3. A manutenção da custódia cautelar no momento da sentença condenatória, nos casos em que o Acusado permaneceu preso durante toda a instrução criminal, não requer fundamentação exaustiva, sendo suficiente ao entendimento de que permanecem inalterados os motivos que levaram à decretação da medida extrema em um primeiro momento, desde que estejam, de fato, preenchidos os requisitos legais do art. 312 do Código de Processo Penal. Precedentes. 4. A manutenção da custódia cautelar encontra-se suficientemente fundamentada na garantia da ordem pública, pois a prisão preventiva está pautada na gravidade concreta da conduta, demonstrada pela quantidade de droga apreendida, que retrata a periculosidade do Agente e a possibilidade de reiteração delitiva. [...] 6. Ordem de habeas corpus denegada. (HC 558.882/SC, Sexta Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 19.05.2020, DJe 02.06.2020) Além disso, a fixação de regime inicial semiaberto não é impeditivo da manutenção da prisão preventiva, conforme tem entendido o Superior Tribunal de Justiça. A título exemplificativo: DIREITO PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. DECISÃO UNIPESSOAL DO RELATOR. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE. PEDIDO DE APLICAÇÃO DO TRÁFICO PRIVILEGIADO E FIXAÇÃO DO REGIME INICIAL SEMIABERTO. TEMAS NÃO ABORDADOS PELO ARESTO IMPUGNADO. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. PLEITO DE CONCESSÃO DO DIREITO DE RECORRER EM LIBERDADE. MOTIVOS ENSEJADORES DA PRISÃO PREVENTIVA PRESENTES POR OCASIÃO DA SENTENÇA CONDENATÓRIA. ELEMENTOS CONCRETOS A JUSTIFICAR A SEGREGAÇÃO CAUTELAR CONFIRMADOS PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. DESVALOR DA CONDUTA. MODUS OPERANDI. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. ALEGAÇÃO DE EXCESSO DE PRAZO NÃO TRATADA NO ARESTO OBJURGADO. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. CONDIÇÕES PESSOAIS FAVORÁVEIS DO PACIENTE. INSUFICIENTES PARA A REVOGAÇÃO DA CUSTÓDIA PROVISÓRIA. FUNDAMENTOS DA PRISÃO PREVENTIVA A AFASTAR A APLICAÇÃO DE MEDIDAS CAUTELARES ALTERNATIVA À PRISÃO. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. [...] III - A jurisprudência da Quinta Turma deste Tribunal Superior é pacífica no sentido de que a r. sentença condenatória somente constitui novo título para fins de prisão preventiva se apresentar novos fundamentos para manter a segregação cautelar. Precedentes. [...] V - Assinale-se que, segundo entendimento firmado por esta Corte, não há ilegalidade na negativa do direito de recorrer em liberdade ao réu que permaneceu preso durante a instrução criminal, se persistem os motivos da prisão cautelar, como é a hipótese em apreço (HC 396.974/BA, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 22/8/2017, DJe 30/8/2017) (AgRg no RHC n. 154.100/SC, Quinta Turma, Rel. Min. Ribeiro Dantas, DJe 27/10/2021). VI - Neste contexto, a manutenção da prisão preventiva encontra-se em consonância com a jurisprudência desta Corte sobre o tema, pois está devidamente fundamentada em dados concretos extraídos dos autos, que evidenciam a necessidade de garantia da ordem pública, notadamente demonstrada pela grande quantidade de droga apreendida - 109,3 Kg de COCAÍNA - a participação do paciente em organização criminosa, a confissão do paciente de que transportava a droga no caminhão, dentro da carga de poupa de laranja, circunstâncias, indicadoras de maior desvalor da conduta perpetrada e que justificam a aplicação da medida extrema no caso em tela. De mais a mais, importa destacar que a prisão preventiva foi justificada para garantir a ordem pública, em razão do modus operandi do crime. Desta feita, não há se falar em ausência de fundamentação concreta, uma vez que, "se a conduta do agente - seja pela gravidade concreta da ação, seja pelo próprio modo de execução do crime - revelar inequívoca periculosidade, imperiosa a manutenção da prisão para a garantia da ordem pública, sendo despiciendo qualquer outro elemento ou fator externo àquela atividade" (RHC n. 47.871/RJ, Quinta Turma, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, DJe de 28/08/2014). [...] VIII - Ademais, a presença de circunstâncias pessoais favoráveis, tais como primariedade, ocupação lícita e residência fixa, não tem o condão de garantir a revogação da prisão se há nos autos elementos hábeis a justificar a imposição da segregação cautelar, como na hipótese. Pela mesma razão, não há que se falar em possibilidade de aplicação de medidas cautelares diversas da prisão. Agravo regimental desprovido. (AgRg no RHC 159.631/SP, Rel. Ministro Jesuíno Rissato - desembargador Convocado do TJDFT -, Quinta Turma, j. 24.05.2022, DJe 30.05.2022) AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO COM NUMERAÇÃO SUPRIMIDA. INDEFERIMENTO DO DIREITO DE RECORRER EM LIBERDADE. FUNDAMENTOS IDÔNEOS PARA A PRISÃO. AGRAVANTE QUE RESPONDEU PRESO A TODA A AÇÃO PENAL. MAUS ANTECEDENTES. MEDIDAS CAUTELARES ALTERNATIVAS. INSUFICIÊNCIA. AGRAVO DESPROVIDO. 1. A prisão preventiva é uma medida excepcional, de natureza cautelar, que autoriza o Estado, observadas as balizas legais e demonstrada a absoluta necessidade, restringir a liberdade do cidadão antes de eventual condenação com trânsito em julgado (art. 5º, LXI, LXV, LXVI e art. 93, IX, da CF). Exige-se, ainda, na linha inicialmente perfilhada pela jurisprudência dominante deste Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal e agora normatizada a partir da edição da Lei n. 13.964/2019, que a decisão esteja pautada em motivação concreta de fatos novos ou contemporâneos, bem como demonstrado o lastro probatório que se ajuste às hipóteses excepcionais da norma em abstrato e revelem a imprescindibilidade da medida, vedadas considerações genéricas e vazias sobre a gravidade do crime. 2. Hipótese na qual o magistrado singular indeferiu o direito de recorrer em liberdade destacando que o agravante respondeu preso a toda a ação penal, bem como que permanecem íntegras as razões do decreto preventivo, já examinadas e julgadas idôneas por esta Corte no HC nº 713.581/MG. 3. Com efeito, a segregação cautelar foi decretada pelo Juízo processante com esteio em circunstâncias concretas do caso, ressaltando a periculosidade do ora agravante, evidenciada pelo modus operandi, uma vez que, em tese, estava em posse de arma de fogo com numeração suprimida e farta munição - uma arma de fogo calibre 9mm e 34 munições intactas -, sendo que quando avistou os militares, teria tentado se desvencilhar do armamento. Ademais, ressaltou o magistrado que "além de reincidente, o denunciado responde por processo de crime contra a vida, o que evidencia sua periculosidade e o risco de reiteração criminal". 4. Não houve alteração nas circunstâncias fáticas a justificar a revogação da custódia. Ao contrário, sobreveio sentença condenando-o à pena de 3 anos e 6 meses, tendo o juízo ressaltado que ele respondeu preso a toda a ação penal, mantendo-se íntegros os fundamentos prévios. 5. O entendimento exposto pelo magistrado se encontra em harmonia com a jurisprudência desta Corte, no sentido de que, tendo o réu permanecido preso durante todo o andamento da ação penal, não faria sentido, ausentes alterações nas circunstâncias fáticas, que, com a superveniência da condenação, lhe fosse deferida a liberdade. 6. Embora o agravante tenha sido condenado a pena em regime inicial semiaberto, o Tribunal a quo determinou a compatibilização da prisão preventiva. Portanto, presentes os requisitos autorizadores da custódia cautelar, e sendo assegurado seu recolhimento em regime compatível, não há que se falar em constrangimento ilegal. 7. As circunstâncias que envolvem o fato demonstram que outras medidas previstas no art. 319 do Código de Processo Penal são insuficientes para a consecução do efeito almejado. Ou seja, tendo sido exposta de forma fundamentada e concreta a necessidade da prisão, revela-se incabível sua substituição por outras medidas cautelares mais brandas. 8. Agravo desprovido. (AgRg no RHC 164.374/MG, Rel. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, j. 10.05.2022, DJe 13.05.2022) AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. PRISÃO PREVENTIVA. TRÁFICO DE DROGAS E RESISTÊNCIA. GRAVIDADE EM CONCRETO DA CONDUTA DELITIVA. QUANTIDADE E DIVERSIDADE DE ENTORPECENTES APREENDIDOS. RISCO DE REITERAÇÃO. RÉU REINCIDENTE. DECISÃO MANTIDA. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. Para ser compatível com o Estado Democrático de Direito – o qual se ocupa de proteger tanto a liberdade quanto a segurança e a paz públicas – e com a presunção de não culpabilidade, é necessário que a decretação e a manutenção da prisão cautelar se revistam de caráter excepcional e provisório. A par disso, a decisão judicial deve ser suficientemente motivada, mediante análise da concreta necessidade da cautela, nos termos dos artigos 282, incisos I e II c/c 312 do CPP. 2. O Juízo singular apontou a presença dos vetores contidos no art. 312 do Código de Processo Penal, em especial a ameaça à ordem pública, dada a gravidade em concreto da conduta delitiva, face à quantidade dos entorpecentes apreendidos, "eis que trazia consigo expressiva quantidade de drogas, sendo 325g de cocaína, dividida em 290 pinos, e 275g de maconha, dividida em 64 embalagens", bem como o risco de reiteração, dado que se trata de condenado reincidente. 3. Ademais, "a jurisprudência dessa Corte já se manifestou pela compatibilidade entre a prisão preventiva e a fixação de regime semiaberto estabelecido para o cumprimento da pena reclusiva, desde que adequada a segregação à modalidade prisional imposta na condenação" (AgRg no HC n. 687.787/SP, Rel. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, 5ª T., DJe 20/9/2021). 4. Agravo regimental não provido. (AgRg no HC 734.920/PR, Rel. Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, j. 26.04.2022, DJe 03.05.2022) A inexistência de vínculo do réu com o país (é cidadão boliviano) justifica a manutenção da prisão preventiva para garantia ordem pública e da aplicação da lei penal, ainda que o regime inicial fixado para cumprimento da pena privativa de liberdade não seja o fechado, dado o risco de fuga inerente à situação concreta. Nesse sentido também decidiu o Superior Tribunal de Justiça: AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. TRÁFICO DE DROGAS. REGIME INICIAL DE CUMPRIMENTO DA PENA. FECHADO. NATUREZA E QUANTIDADE EXACERBADA. FUNDAMENTOS IDÔNEOS. ALEGADA VIOLAÇÃO AO ART. 312, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. NEGATIVA DO DIREITO DE RECORRER EM LIBERDADE. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. AGRAVO REGIMENTAL. DESPROVIDO. [..] 2. O Superior Tribunal de Justiça possui jurisprudência no sentido de que "[...] não há lógica em deferir ao condenado o direito de recorrer solto quando permaneceu preso durante a persecução criminal, se persistem os motivos para a segregação preventiva" (RHC 98.304/MS, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 23/08/2018, DJe 29/08/2018). 3. A manutenção da custódia cautelar no momento da sentença condenatória, em hipóteses em que o acusado permaneceu preso durante toda a instrução criminal, não requer fundamentação exaustiva, sendo suficiente, para a satisfação do art. 387, § 1.º, do Código de Processo Penal, declinar que permanecem inalterados os motivos que levaram à decretação da medida extrema em um primeiro momento, desde que estejam, de fato, preenchidos os requisitos legais do art. 312 do mesmo diploma. 4. O direito de recorrer em liberdade foi negado com esteio em fundamentação concreta e idônea, porquanto foi demonstrada a necessidade de assegurar a aplicação da lei penal, tendo em vista que o Acusado é estrangeiro, sem residência fixa no Brasil ou quaisquer laços no País, tendo aqui ingressado apenas para cometer crime grave, o que representa concreto risco de fuga, a fim de evitar o cumprimento da pena ou voltar a delinquir. 5. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no AREsp 1.697.713/RJ, Sexta Turma, Rel. Ministra Laurita Vaz, j. 20.10.2020, DJe 29.10.2020) Observo, por oportuno, que houve expedição de guia de recolhimento pelo juízo de origem, possibilitando o início da execução provisória da pena, de modo que esse apelante poderá pleitear ao juízo da execução penal eventuais direitos decorrentes da Lei de Execução Penal (Lei nº 7.210/84), mesmo na condição de preso provisório (Súmula nº 716 do Supremo Tribunal Federal), inclusive a eventual progressão de regime. Transitada em julgado a condenação, ele poderá pleitear sua transferência ao seu país de origem, nos termos dos arts. 103 e 104 da Lei nº 13.445, de 24.5.2017 (Lei de Migração). Posto isso, DOU PARCIAL PROVIMENTO às apelações, para alterar para o regime semiaberto o início do cumprimento da pena privativa de liberdade de cada réu, ficando a pena de cada um deles mantida em 7 (sete) anos, 3 (três) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e 729 (setecentos e vinte e nove) dias-multa, nos termos da fundamentação supra. Comunique-se o teor deste julgamento ao juízo responsável pela fiscalização da prisão de HERNAN WILLY CHOQUE SILVESTRE, para as providências cabíveis. É o voto. Autos: APELAÇÃO CRIMINAL - 5000187-88.2024.4.03.6004 Requerente: JOSE GERALDO BARBOSA e outros Requerido: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL NO ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL Ementa: Direito penal. Apelação criminal. Tráfico transnacional de drogas. Autoria. Dosimetria da pena. Regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade. prisão preventiva. recursos parcialmente providos. I. Caso em exame 1. Apelações interposta em face da sentença que condenou os réus pela prática do crime de tráfico transnacional de drogas. Alega-se que não há prova de autoria e também é pedida a revisão da pena aplicada. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em saber se há provas suficientes da autoria para justificar a condenação pelo crime de tráfico internacional de drogas e; (ii) saber se é possível a aplicação da causa de diminuição de pena do art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/2006, e a modificação do regime inicial de cumprimento da pena dos réus. III. Razões de decidir 3. A materialidade, a autoria e o dolo estão comprovados em relação a todos os réus. 4. Revista a dosimetria da pena, não há alteração a ser feita. Inaplicabilidade da causa de diminuição de pena do art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/2006, por caracterização de vínculo com organização criminosa. 5. Alterado para o semiaberto o regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade de cada apelante, tendo em vista a pena aplicada a cada um. 6. Mantida a prisão preventiva de um corréu porque ainda persistem os motivos que levaram à sua decretação. IV. Dispositivo e tese 9. Recursos parcialmente providos. _________ Dispositivos relevantes citados: CP, arts. 33, § 2º, b, e 44, I. Lei nº 11.343/2006, arts. 33, caput, 40, I, e 33, § 4º. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgRg no REsp 1.839.326/MS, Quinta Turma, Rel. Ministro Ribeiro Dantas, j. 19.5.2020, DJe 27.5.2020; STJ, HC 558.882/SC, Sexta Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 19.05.2020, DJe 02.06.2020;TRF3, RSE 0003287-61.2014.4.03.6110, Quinta Turma, Rel. Des. Federal André Nekatschalow, j. 23.02.2015, DJF 3 Judicial 1 03.03.2015. ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, RATIFICA A REVISÃO O JUIZ FEDERAL CONVOCADO ALEXANDRE SALIBA. A Décima Primeira Turma, por unanimidade, decidiu DAR PARCIAL PROVIMENTO às apelações, para alterar para o regime semiaberto o início do cumprimento da pena privativa de liberdade de cada réu, ficando a pena de cada um deles mantida em 7 (sete) anos, 3 (três) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e 729 (setecentos e vinte e nove) dias-multa, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. NINO TOLDO Desembargador Federal

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Processo nº 5000872-26.2024.4.03.6124

ID: 300544578

Tribunal: TRF3 Órgão: Gab. 40 - DES. FED. NINO TOLDO Classe: APELAçãO CRIMINAL Nº Processo: 5000872-26.2024.4.03.6124

Data de Disponibilização: 17/06/2025

Polo Ativo:

ANDREA DEMETRIO DE SA SANTOS

Polo Passivo:

Intimação

Advogados:

WELLINGTON SILVA CAMPOS

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

CLEMERSON MISAEL DOS SANTOS

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

CESAR RENATO FLORINDO

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 11ª Turma APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 5000872-26.2024.4.03.6124 RELATOR: Gab. 40 - DES. FED. NINO TOLDO APELANTE: ANDREA DEMETRIO DE SA SANTOS, … PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 11ª Turma APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 5000872-26.2024.4.03.6124 RELATOR: Gab. 40 - DES. FED. NINO TOLDO APELANTE: ANDREA DEMETRIO DE SA SANTOS, EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SA, TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA, WESLEY SILVIO BESSA Advogado do(a) APELANTE: CLEMERSON MISAEL DOS SANTOS - SP317298-A Advogado do(a) APELANTE: WELLINGTON SILVA CAMPOS - SP438093-A Advogado do(a) APELANTE: CESAR RENATO FLORINDO - SP405260-A APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP OUTROS PARTICIPANTES: PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 11ª Turma APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 5000872-26.2024.4.03.6124 RELATOR: Gab. 40 - DES. FED. NINO TOLDO APELANTE: ANDREA DEMETRIO DE SA SANTOS, EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SA, TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA, WESLEY SILVIO BESSA Advogado do(a) APELANTE: CLEMERSON MISAEL DOS SANTOS - SP317298-A Advogado do(a) APELANTE: WELLINGTON SILVA CAMPOS - SP438093-A Advogado do(a) APELANTE: CESAR RENATO FLORINDO - SP405260-A APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NINO TOLDO (Relator): Trata-se de apelações interpostas por ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS, EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ, TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA e WESLEY SILVIO BESSA em face da sentença proferida pela 1ª Vara Federal de Jales (SP), no âmbito da denominada Operação Anonymous, que os condenou pela prática do crime de organização criminosa (art. 2º, caput, § 3º, da Lei 12.850/2013) às seguintes penas: i) ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS - 4 (quatro) anos, 11 (onze) meses e 15 (quinze) dias de reclusão, em regime inicial fechado, e 114 (cento e quatorze) dias-multa, no valor unitário mínimo legal; ii) EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ - 4 (quatro) anos e 3 (três) meses de reclusão, em regime inicial semiaberto, e 98 (noventa e oito) dias-multa, no valor unitário mínimo legal; iii) TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA - 4 (quatro) anos e 3 (três) meses de reclusão, em regime inicial semiaberto, e 98 (noventa e oito) dias-multa, no valor unitário mínimo legal; e iv) WESLEY SILVIO BESSA - 4 (quatro) anos e 3 (três) meses de reclusão, em regime inicial semiaberto, e 98 (noventa e oito) dias-multa, no valor unitário mínimo legal. O Ministério Público Federal (MPF) deixou de propor acordo de não persecução penal (ANPP) sob o argumento de que o acordo não se afigura suficiente à reprovação e prevenção do crime (ID 312633703, p. 2), não tendo havido manifestação das defesas de ANDREA, TIAGO e WESLEY sobre isso (ID 312633790, 312633808 e 312633810). A defesa de EVELYN requereu a intimação do MPF para oferecer proposta de ANPP (ID 312633782), mas o MPF reiterou o não cabimento do benefício (ID 312633791) e não houve pedido de envio dos autos ao órgão superior do MPF. A denúncia (ID 312633703), recebida em 29.7.2024 (ID 312633750), narra: Os fatos a seguir expostos surgiram das investigações conduzidas no Inquérito Policial nº 5000079-24.2023.4.03.6124, instaurado para apurar, inicialmente, a prática de crime previsto no artigo 171, §3º, do Código Penal. A agência da Caixa Econômica Federal (CEF) de Auriflama/SP (ID 273316977 - Pág. 5/34 – IPL 5000079-24.2023.4.03.6124) informou que indivíduo até então não identificado, no dia 13/07/2022, utilizando documentação falsa em nome de Antônio Carlos dos Santos, abriu conta-corrente naquela agência, transferindo o pagamento de benefício previdenciário de aposentadoria recebido pela vítima para a conta fraudulenta. [...] Analisados os dados bancários e realizadas pesquisas, foi possível identificar outros envolvidos – em especial THALITA MIRANDA ALCARAZ, VANESSA DEMETRIO DE SÁ MACEDO, ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS e HERIBERTO DOS SANTOS CANDIDO – além de novas práticas de estelionato contra a CEF, conforme detalhado no Relatório de Análise de Polícia Judiciária (RAPJ) nº 2291253/2023 (DOC. 1 anexo)1. Havia, nesse momento, fortes indícios da existência de uma Organização Criminosa – doravante referida como ORCRIM – voltada à prática reiterada de crimes de estelionato. Realizada a quebra do sigilo bancário das pessoas identificadas nesse momento, conforme autorização judicial nos autos 5000201-37.2023.4.03.6124, os dados, em especial as movimentações das contas-correntes de THALITA MIRANDA ALCARAZ, foram analisados no Relatório de Análise de Polícia Judiciária (RAPJ) nº 492587/2024 (DOC. 2 anexo)2. A partir dessas informações, foi possível obter mais detalhes sobre o funcionamento da ORCRIM, além de apontada a participação de outros integrantes e novas vítimas dos crimes. Também foram solicitadas ao Setor de Segurança da CEF informações de outras contas objeto de fraude pelo mesmo grupo, sendo encaminhado, em resposta, o Ofício nº 38/2023/CEFRA/DF (DOC. 3 anexo)3. Ali, foram relacionadas diversas contas que foram abertas por meio de documentação falsa de beneficiários do INSS e identificados alguns envolvidos diretamente na abertura dessas contas. Segundo estimativa realizada pela CEF, “as operações de crédito nas modalidades Crédito Consignado, Antecipação de Crédito FGTS, Crédito CDC [...], vinculadas às 124 contas abertas com documentos falsos, somam aquantia de R$ 5.122.654,48”. Abre-se um parêntese, neste ponto, para registrar que foram identificados, ao menos, outros 18 (dezoito) procedimentos investigatórios perante a Polícia Federal no Estado de São Paulo instaurados para apurar crimes de estelionato envolvendo algum ou alguns dos membros da ORCRIM aqui desvendada (ID 321348441 - Pág. 32/33 – 5000466-05.2024.4.03.6124), o que demonstra a amplitude de sua atuação e sua estruturação ordenada para a prática de infrações penais. Alguns dos atingidos pelos ilícitos, todos aposentadas e/ou pensionistas, em sua maioria idosos e hipossuficientes, foram ouvidos e confirmaram as fraudes perpetradas contra eles (ID 321348441 - Pág. 76 e ss. – 5000466-05.2024.4.03.6124). [...] No curso das investigações ficou comprovada a existência de uma Organização Criminosa bem estruturada e articulada, especializada em perpetrar fraudes contra instituições financeiras, incluindo a Caixa Econômica Federal (CEF), em vários municípios do país, em sua maioria no Estado de São Paulo. O grupo criminoso opera por meio da utilização de documentos falsificados emitidos em nome de terceiros, geralmente beneficiários de algum tipo de prestação previdenciária, predominantemente idosos, os quais se encontram em condições de saúde debilitadas e são economicamente dependentes das pensões que recebem. Essa vulnerabilidade os torna alvos preferenciais e expõe a gravidade do impacto social dessas fraudes. Diante de todos os elementos apurados, foi possível dividir os membros da ORCRIM nos chamados “núcleos” de atuação, evidenciando a divisão de tarefas e a estrutura funcional do grupo, que se distribui da seguinte forma: [...] 2.2. NÚCLEO INTERMEDIÁRIO ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA WESLEY SILVIO BESSA VINICIUS GABRIEL VIEIRA DA ROCHA MARIA TAINARA SANTOS DE SOUSA TAINA CRISTINA DA SILVA CAIO DE JESUS CARDOSO ROSANA SANTOS DE JESUS O segundo núcleo, considerado intermediário, é integrado por aqueles que oferecem suas contas-correntes como de “contas de passagem”, para recebimento direto dos valores advindos dos empréstimos fraudulentos, depositados nas contas fraudulentas criadas pelos membros do primeiro núcleo, e posterior transferência para os membros de comando do grupo, integrantes do núcleo avançado. Os intermediários têm plena consciência da origem ilícita dos valores recebidos em suas contas, participando, assim, de forma direta e ativa no esquema criminoso. A presente denúncia se refere especificamente às condutas de parte dos membros deste núcleo criminoso, sendo outra parte denunciada em apartado (DENÚNCIA 04). [...] 3. OBJETO DA PRESENTE DENÚNCIA: NÚCLEO INTERMEDIÁRIO Feitas as considerações acima, passa-se a individualizar as condutas das pessoas que compõem o núcleo intermediário de atuação do grupo criminoso ora desvendado, demonstrando-se, de maneira individual e específica, a autoria de cada uma em relação ao crime previsto no artigo 2º da Lei nº 12.850/2013 (organização criminosa). [...) ] 3.1. ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS é integrante do núcleo intermediário da ORCRIM e atua, de forma consciente, fornecendo suas contas bancárias para movimentação dos valores advindos dos crimes e auxiliando na abertura de contas em agências bancárias mediante uso de documentos falsos. ANDREA é irmã de VANESSA DEMETRIO DE SÁ MACEDO, uma das integrantes de comando do grupo, com quem mantém proximidade. A denunciada também é mãe de EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ e sogra de TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA (ID 321346669 - Pág. 93/94 – 5000466-05.2024.4.03.6124), que serão tratados nos tópicos seguintes dessa peça. Conversa interceptada após autorização judicial reforça a autoria desta denunciada no esquema criminoso. Trata-se do registro 1733861996, em que EVELYN mantém conversa com interlocutora que a chama de filha, indicando se tratar da denunciada ANDREA, a respeito da prática de nova fraude para “levantar um dinheiro”, relacionada à abertura de conta em agência da CEF de Porto Ferreira/SP, sugerindo se tratar de “bom” lugar para a fraude. Trata-se de ação típica do modo de operação da organização criminosa, consistente na abertura de contas fraudulentas em agências da Caixa localizadas no interior do Estado de São Paulo. EVELYN afirma à mãe que, posteriormente, ela deveria retirar o “cartão de INSS” na residência de algum conhecido, especificamente com caixa de correio de modelo antigo apresentando documento (provavelmente falso), citando que fraude parecida teria sido praticada anteriormente por alguém denominado “VITOR”. Por fim, ANDREA menciona a EVELYN que tentou realizar “uns dez” (provavelmente outras dez fraudes) com outra mulher, mas apenas um deu certo. Assim como sua irmã VANESSA, a denunciada ANDREA recebeu da conta fraudulentamente criada em nome de Antonio Fernando Berardo, em 6 (seis) transações ocorridas entre 29/10/2021 e 25/11/2021, o total de R$ 13.165,00 (ID 322134126 - Pág. 3/4 – 5000466-05.2024.4.03.6124), sendo, portanto, também beneficiária direta do esquema criminoso desvendado. No mais, ANDREA foi presa em flagrante anteriormente, em 24/08/2014, ao tentar obter empréstimo consignado junto à CEF utilizando documentos falsos em nome de uma beneficiária do INSS, o que originou o IPL 680/2015-DELEFAZ/SR/RF/SP (ID 321350442 - Pág. 30/31 – 5000466-05.2024.4.03.6124), demonstrando que se dedica, ao menos há uma década, à prática de “golpes” dessa natureza. O procedimento citado deu origem à Ação Penal nº 0012278-07.2014.403.6181, em trâmite perante a 9ª Vara Criminal Federal de São Paulo, em que ANDREA foi condenada à pena de 03 (três) anos, 06 (seis) meses e 20 dias de reclusão, em regime aberto, por sentença proferida em 2018, já transitada em julgado, junto a outros dois indivíduos, como incursa nos artigos 171, §3° e caput e 171, §3° e caput c.c. art. 14, II, na forma do artigo 71, todos do Código Penal c.c. artigo 297, caput, na forma do artigo 69, ambos do Código Penal, pela utilização de documento falso e obtenção de empréstimos consignados na agência da CEF em Caieiras, em 28 e 29/08/2014, em nome de três beneficiários do INSS (ID 322891125 – 5000466-05.2024.4.03.6124). Portanto, os elementos de prova acima apontados demonstram que a denunciada ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS, de data inicial desconhecida, mas ao menos a partir do ano de 2021 até o dia 25/06/2024 (deflagração da fase ostensiva da operação), integrou pessoalmente organização criminosa voltada para a prática de reiterados crimes de estelionato contra instituições financeiras, incluindo a CEF, e inúmeros aposentados e pensionistas, auferindo elevadas quantias advindas das fraudes, praticando o crime do artigo 2º, caput, da Lei 12.850/2013. 3.2. EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ, filha da codenunciada ANDREA e sobrinha de VANESSA DEMETRIO DE SÁ MACEDO, também integra o núcleo intermediário do grupo criminoso. EVELYN também é parceira do codenunciado TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA e, junto a este e sua genitora ANDREA, atua em favor do esquema criminoso de forma consciente, fornecendo suas contas bancárias para movimentação dos valores advindos dos crimes e auxiliando na abertura de contas em agências bancárias mediante uso de documentos falsos. Neste sentido, na conversa interceptada sob registro de ID 173386199, EVELYN mantém conversa com interlocutora que a chama de filha, indicando se tratar de ANDREA, a respeito da prática de nova fraude para “levantar um dinheiro”, relacionada à abertura de conta em agência da CEF de Porto Ferreira/SP, sugerindo se tratar de “bom” lugar para a fraude. EVELYN afirma à mãe que, posteriormente, ela deveria retirar o “cartão de INSS” na residência de algum conhecido, especificamente com caixa de correio de modelo antigo apresentando documento (provavelmente falso), citando que fraude parecida teria sido praticada anteriormente por alguém denominado “VITOR”. Por fim, ANDREA menciona à EVELYN que tentou realizar “uns dez” (provavelmente outras dez fraudes) com outra mulher, mas apenas um deu certo. No mesmo contexto, dois dias antes do registro acima, foi captada conversa (ID 173030474) em que o denunciado TIAGO, parceiro de EVELYN, planeja junto a uma mulher não identificada a prática de fraude envolvendo benefício previdenciário e documento falso (“estudar RG”), possivelmente concretizada no dia 13/06/2024 em local próximo à Porto Ferreira/SP (ID 328852963 - Pág. 16/21 – 5000607-24.2024.4.03.6124), mesmo município citado por EVELYN na ligação citada anteriormente. EVELYN recebeu de THALITA MIRANDA ALCARAZ (núcleo avançado), aproximadamente, R$ 22.700,00, entre 26/08/2022 e 01/06/2023. A denunciada também recebeu da conta de Terezinha Demetrio de Sá, genitora de ANDREA e VANESSA, de 11/10/2022 a 13/06/2023, aproximadamente R$ 66.560,00, transferindo a ela o total de R$ 50.142,00 (ID 321346669 - Pág. 95/96 – 5000466-05.2024.4.03.6124). Ainda, na busca e apreensão judicialmente deferida na residência desta denunciada e seu esposo TIAGO (DOC. 4 anexo) foram arrecadados dois Iphones Pro Max (modelo 14 e 15), outros 2 (dois) telefones celulares e um veículo Audi Q3, ano 2016/2017, em nome de TIAGO. As diligências revelaram, ainda, que o imóvel, apesar de localizado em bairro de classe média baixa, foi recentemente reformado, contando com duas suítes grandes, área de lazer, sala de TV, cozinha ampla com armários planejados, TV 50" e eletrodomésticos de bom padrão, como geladeira duplex. Esse fato demonstra que a atividade ilícita dos denunciados tem se mostrado rentável. Nesse contexto, o padrão das movimentações bancárias e dos bens apreendidos é totalmente incompatível com as informações de renda de EVELYN, considerando que não foram localizados vínculos empregatícios em seu nome, bem como que a investigada consta como beneficiária de auxílio emergencial (ID 321346669 - Pág. 97 – 5000466- 05.2024.4.03.6124). Tratam-se, portanto, de produtos advindos dos crimes praticados. Desta forma, os elementos de prova acima apontados demonstram que a denunciada EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ, de data inicial desconhecida, mas ao menos a partir do ano de 2021 até o dia 25/06/2024 (deflagração da fase ostensiva da operação), integrou pessoalmente organização criminosa voltada para a prática de reiterados crimes de estelionato contra instituições financeiras, incluindo a CEF, e diversos aposentados e pensionistas, auferindo elevadas quantias advindas das fraudes, incorrendo, portanto, na conduta típica descrita no artigo 2º, caput, da Lei 12.850/2013. 3.3. TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA, conforme citado, atua junto à sua parceira EVELYN em favor do esquema criminoso, de forma consciente, fornecendo suas contas bancárias para movimentação dos valores advindos dos crimes e auxiliando na abertura de contas em agências bancárias mediante uso de documentos falsos. Conversas interceptadas após autorização judicial apontam que TIAGO e EVELYN planejaram a prática de fraude envolvendo abertura de conta e benefício previdenciário, possivelmente concretizada em agência bancária da CEF na cidade de Porto Ferreira/SP (ID 328852963 - Pág. 16/21 e 24/27 – 5000607-24.2024.4.03.6124). Cite-se, neste sentido, a ligação de registro 17303047410, por meio da qual o denunciado TIAGO conversa com interlocutora que chama de “tia”,11 planejando encontrá-la na manhã do dia seguinte em local referenciado como “Dom Bosco” para entregá-la uma colinha relacionada à “benefício”, mencionando que ela deveria “estudar” o “RG” e o “comprovante” pessoalmente. Na manhã do dia seguinte à ligação (13/06/2024), a ERB do celular de TIAGO estava próxima à localização da estação de metrô Dom Bosco, em São Paulo/SP (ID 328852963 - Pág. 6). Em paralelo, no mesmo dia 13/06/2024, o terminal que manteve a citada conversa com TIAGO registrou localizações de ERB, a partir das 10h, em Limeira/SP, se deslocando próximo a Porto Ferreira/SP (mesma cidade citada por EVELYN em conversa captada um dia depois – ligação de ID 173386199) perto das 12h e retornando à São Paulo/SP por volta das 15h (ID 329260116 - Pág. 17/19 – 5000607-24.2024.4.03.6124). Poucos dias após, TIAGO manteve conversa com a mesma interlocutora (registro 17442357412) informando que conseguiu desbloquear determinado cartão e que até as oito horas da manhã chegaria uma senha para “tia”. Ainda, foram identificadas diversas transações bancárias de altos valores, sem origem comprovada, entre o denunciado TIAGO e outras integrantes ligadas ao comando/topo da organização criminosa. Neste sentido, entre 19/08/2022 e 12/06/2023, TIAGO recebeu das contas de THALITA MIRANDA ALCARAZ, aproximadamente, R$ 230.830,00, enviando àquela investigada a quantia aproximada de R$ 81.900,00. O denunciado também recebeu de Terezinha Demetrio de Sá, genitora de ANDREA E VANESSA, entre 01/08/2022 e 27/04/2023, aproximadamente R$ 100.600,00, enviando a ela o total de R$ 53.948,93 (ID 321346669 - Pág. 88/93 e 96 – 5000466-05.2024.4.03.6124). Tratam-se de valores advindos dos crimes praticados. [...] Nesse contexto, o padrão das movimentações bancárias e dos bens apreendidos é totalmente incompatível com as informações de renda de TIAGO, considerando que ele não declarou receitas ao Fisco nos anos de 2022, 2023 e 2024 (DOC. 5 anexo), além de que não foram localizados vínculos empregatícios recentes ou empresas em seu nome e que ele consta como beneficiário de auxílio emergencial (DOC. 6 anexo). Vale destacar que o denunciado possuía dois veículos simples (GM Corsa antigo e VW Gol) e, exatamente no período de operação da ORCRIM, adquiriu um Audi Q3. Tratam-se, portanto, de produtos advindos dos ilícitos praticados. Desta forma, os elementos de prova acima apontados demonstram que o denunciado TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA, de data inicial desconhecida, mas ao menos a partir do ano de 2021 até o dia 25/06/2024 (deflagração da fase ostensiva da operação), integrou pessoalmente organização criminosa voltada para a prática de reiterados crimes de estelionato contra instituições financeiras, incluindo a CEF, e diversos aposentados e pensionistas, auferindo elevadas quantias advindas das fraudes, incorrendo, portanto, na conduta típica descrita no artigo 2º, caput, da Lei 12.850/2013. 3.4. WESLEY SILVIO BESSA WESLEY SILVIO BESSA é sobrinho de RITA DE CASSIA BESSA (núcleo avançado), com quem reside, e atua no esquema criminoso desenvolvido fornecendo suas contas-correntes para os membros de alto escalão para recebimento e repasse de valores advindos dos ilícitos praticados. Este denunciado figura como investigado/envolvido em, ao menos, 7 (sete) inquéritos policiais com a finalidade de apurar crimes de estelionato qualificados contra a CEF, praticados com o mesmo modus operandi dos narrados anteriormente. Em todos os procedimentos, WESLEY foi identificado como beneficiário de parte dos valores provenientes dos empréstimos consignados realizados mediante uso de documentos falsos em nome das vítimas (ID 321346669 - Pág. 111/114 – 5000466-05.2024.4.03.6124). São eles: a) 2022.0016203 – DPF/CAS/SP (PJe 5001339-76.2022.4.03.6123): investiga a abertura de conta mediante documentos falsos em nome de Renato Brandão Cruz Filho e contratação de empréstimo no valor de R$ 35.144,50, no dia 16/12/2021. Após, foram realizadas transferências para vários destinatários, dentre eles WESLEY; b) 2022.0073401 – DPF/SJK/SP (PJe 5000218-39.2023.4.03.6103): apura a abertura de conta em nome de diversos beneficiários do INSS mediante uso de documento falso. WESLEY foi beneficiário de transferências advindas de algumas dessas contas; c) 2022.0037704 – DPF/RPO/SP (PJe 5004041-58.2022.4.03.6102): apura a abertura de conta com documento falso em nome de Juliana Bongiovani Diniz Chiga e contratação de empréstimos consignados com posterior transferência de valores para vários destinatários, dentre eles WESLEY e sua tia RAMISSAYANE STHEFANY DA SILVA BESSA (irmã de RITA DE CASSIA BESSA). A advogada Neusa Schneider14 (OAB/SP 149.438) atua na defesa desses investigados neste procedimento; d) 2022.0026091 – DPF/AQA/SP (PJe 5000987-45.2022.4.03.6115): apura a abertura de conta-corrente mediante uso de documento falso em nome da aposentada Célia Isabel Gardim Ghizzi e obtenção de empréstimo fraudulento. Novamente, WESLEY consta como beneficiário de parte dos valores depositados nessa conta; e) 2022.0069677 – DPF/BRU/SP: investiga a abertura de conta mediante de documento falso em nome de beneficiário do INSS e contratação de empréstimo consignado. WESLEY foi beneficiário de parte dos valores desviados. A advogada Neusa Schneider atuou neste procedimento em defesa de SABRINA BESSA DOS SANTOS, parente daquele denunciado e também beneficiária de parte dos valores obtidos com o ilícito. f) 2022.0062902 – DPF/RPO/SP: investiga a abertura de conta em nome da vítima Jeanne Batista Pinheiro para transferência de recebimento do benefício previdenciário para essa conta e contratação de dois empréstimos consignados fraudulentos. WESLEY também foi destinatário de parte dos valores advindos desta fraude. g) 2022.0066518 – DPF/AQA/SP: apura a abertura de conta em nome da vítima Denise Mecunhe Rosa para transferência de recebimento do benefício previdenciário para essa conta e contratação de dois empréstimos consignados fraudulentos. WESLEY recebeu R$ 79.321,22 em sua conta, advindos desta fraude. Somente em decorrência das fraudes contra aposentados/pensionistas identificadas e levantadas pela CEF, a conta de WESLEY recebeu o total de R$ 211.097,02 (Ofício nº 38/2023/CEFRA/DF - ID 322134146 - Pág. 28 – 5000466-05.2024.4.03.6124). As diligências obtidas após o cumprimento das buscas e apreensões revelaram que WESLEY reside no mesmo imóvel que RITA DE CÁSSIA BESSA, uma das chefes da ORCRIM, onde foram localizados e apreendidos diversos documentos relacionados as práticas delitivas narradas (DOC. 7 anexo)15. Portanto, os elementos de prova acima apontados demonstram que o denunciado WESLEY SILVIO BESSA, de data inicial desconhecida, mas ao menos a partir do ano de 2021 até o dia 25/06/2024 (deflagração da fase ostensiva da operação), integrou pessoalmente organização criminosa voltada para a prática de reiterados crimes de estelionato contra instituições financeiras, incluindo a CEF, e diversos aposentados e pensionistas, auferindo elevadas quantias advindas das fraudes, incorrendo, assim, na conduta típica descrita no artigo 2º, caput, da Lei 12.850/2013. Em 04.11.2024 o juízo de origem revogou a prisão preventiva de EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SA e WESLEY SILVIO BESSA, fixando, em substituição, outras medidas cautelares (ID 312634346). A sentença foi publicada em 17.12.2024. (ID 312634364) Em seu recurso (ID 312634374), a defesa de WELSEY pede a sua absolvição com base no art. 386, VII, do Código de Processo Penal, argumentando que a condenação foi baseada unicamente em prova colhida na fase investigatória, em ofensa ao disposto no art. 155 do Código de Processo Penal. Caso mantida a condenação pede: i) a fixação da pena-base no mínimo legal; ii) o reconhecimento da circunstância atenuante da confissão espontânea (CP, art. 65, III, “d”) ; iii) o reconhecimento da circunstância atenuante da menoridade (CP, art. 65, I – nascido em 15.05.2002); iv) a fixação do regime inicial aberto para cumprimento da pena privativa de liberdade. Foram apresentadas contrarrazões (ID 312634383). Ao interpor o recurso de apelação, a defesa de ANDREA requereu a apresentação das suas razões nos termos do art. 600, § 4º, do Código de Processo Penal. Nestas (ID 312772705), pede, preliminarmente, a revogação do mandado de prisão expedido. No mérito, pede a sua absolvição pela aplicação do princípio da insignificância e por não haver prova da existência de vínculo com a organização criminosa. Caso mantida a condenação, pede: i) a fixação da pena-base no mínimo legal; ii) a fixação do regime semiaberto para início do cumprimento da pena privativa de liberdade; iii) a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita. Em cumprimento à decisão proferida no Habeas Corpus nº 5033888-10.2024.4.02.0000, de minha relatoria, foi expedido alvará de soltura em favor de TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA, o qual foi cumprido em 06.02.2025 (ID 314391770). A defesa conjunta de EVELYN e TIAGO ao interpor o recurso de apelação requereu a apresentação das suas razões nos termos do art. 600, § 4º, do Código de Processo Penal. Nestas (ID 314391769), pede, preliminarmente, seja decretada a nulidade da sentença em razão da incompetência do juízo ou, se afastada, que seja reconhecida a nulidade das provas produzidas por meio do afastamento do sigilo das comunicações telefônicas e telemáticas ou, ainda, que seja oferecido ANPP. Quanto ao mérito das imputações, pede que os apelantes sejam absolvidos (i) por inexistência de prova do crime de participação em organização criminosa; (ii) não comprovação de dolo e (iii) atipicidade das condutas. Subsidiariamente, pede a fixação da pena-base no mínimo legal; sejam suas participações nos crimes consideradas de menor importância; o desconto do tempo de prisão provisória e a fixação do regime inicial aberto para cumprimento da pena privativa de liberdade e a substituição desta por penas restritivas de direitos, mantendo-se a liberdade provisória. Pedem, ainda, a concessão da gratuidade de justiça com a isenção no pagamento da multa. A Procuradoria Regional da República opinou pelo desprovimento dos recursos (ID 315062861). É o relatório. À revisão. PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 11ª Turma APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 5000872-26.2024.4.03.6124 RELATOR: Gab. 40 - DES. FED. NINO TOLDO APELANTE: ANDREA DEMETRIO DE SA SANTOS, EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SA, TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA, WESLEY SILVIO BESSA Advogado do(a) APELANTE: CLEMERSON MISAEL DOS SANTOS - SP317298-A Advogado do(a) APELANTE: WELLINGTON SILVA CAMPOS - SP438093-A Advogado do(a) APELANTE: CESAR RENATO FLORINDO - SP405260-A APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NINO TOLDO (Relator): Trata-se de apelações interpostas por ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS, EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ, TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA e WESLEY SILVIO BESSA em face da sentença que, no âmbito da denominada Operação Anonymous, os condenou pela prática do crime de organização criminosa (art. 2º, caput, da Lei 12.850/2013). Inicialmente, anoto que a ausência de contrarrazões pela acusação não implica nulidade (CPP, art. 565), conforme pacífico entendimento desta Turma: ApCrim nº 001596-27.2016.4.03.6102, Rel. Des. Federal Nino Toldo, j. 28.7.2023, Publicação 02.8.2023; ApCrim nº 0004816-12.2009.4.03.6104, Rel. Des. Federal Nino Toldo, j. 31.3.2023, Publicação 10.4.2023; ApCrim nº 0003067-39.2018.4.03.6105, Rel. Des. Federal José Lunardelli, j. 09.02.2024, Publicação 15.02.2024; ApCrim nº 0003067-39.2018.4.03.6105, Rel. Des. Federal José Lunardelli, j. 09.02.2024, Publicação 15.02.2024. Incompetência do juízo A defesa comum de EVELYN e TIAGO alega, preliminarmente, a incompetência da 1ª Vara Federal de Jales para processar e julgar o feito, argumentando que a competência deve ser definida pelo local de domicílio da vítima, nos termos do art. 70, § 4º do Código de Processo Penal. Por isso, pede seja reconhecida a nulidade da sentença, remetendo-se os autos ao "Juízo Federal da Comarca de Guarujá" [sic]. Sem razão. O art. 70, § 4º, do Código de Processo Penal (CPP) dispõe: Art. 70. A competência será, de regra, determinada pelo lugar em que se consumar a infração, ou, no caso de tentativa, pelo lugar em que for praticado o último ato de execução. [...] § 4º Nos crimes previstos no art. 171 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal ), quando praticados mediante depósito, mediante emissão de cheques sem suficiente provisão de fundos em poder do sacado ou com o pagamento frustrado ou mediante transferência de valores, a competência será definida pelo local do domicílio da vítima, e, em caso de pluralidade de vítimas, a competência firmar-se-á pela prevenção. (Incluído pela Lei nº 14.155, de 2021) A Justiça Federal de Jales era competente para processar e julgar a ação penal, pois não se trata, no caso da hipótese prevista no § 4º do art. 70 do CPP. A propósito, destaco o seguinte trecho do parecer da Procuradoria Regional da República (ID 315062861): Todavia, deve ser rejeitada a alegação de incompetência da Justiça Federal, pois a investigação se iniciou para apurar notícia encaminhada pela agência da CEF de Auriflama, no sentido de que um terceiro então não identificado, no dia 13/07/2022, promoveu a abertura de conta-corrente naquela agência em nome de Antônio Carlos dos Santos (CPF nº 038.607.988-98), residente em Guarujá/SP, efetuando a transferência fraudulenta do benefício previdenciário da vítima e a contratação de empréstimos consignados para desconto no referido benefício, sendo que a conduta investigada configura estelionato qualificado contra a Caixa Econômica Federal. Assim, aplicando a regra prevista no caput do artigo 70 do Código Penal, tem-se que o Juízo da 1ª Vara Federal de Jales é o competente para o processamento do feito, visto que o crime foi consumado no momento da obtenção da vantagem ilícita, que ocorreu na cidade de Auriflama/SP. Portanto, tendo se consumado o crime no momento da obtenção da vantagem ilícita, a regra aplicável é a do do art. 70, caput, do CPP. Observo, por oportuno e para fins didáticos, que não existem comarcas na Justiça Federal e a cidade de Guarujá encontra-se na jurisdição da Subseção Judiciária de Santos. Rejeito, enfim, a preliminar de incompetência da 1ª Vara Federal de Jales. Nulidade das provas: afastamento do sigilo das comunicações telefônicas A defesa comum de EVELYN e TIAGO também pede a declaração de nulidade das provas obtidas por meio do afastamento do sigilo das comunicações telefônicas e telemáticas. Sem razão. O caso concreto em exame reflete, de forma clássica, aquelas situações em que a medida excepcional da interceptação das comunicações telefônicas mostra-se imprescindível para a obtenção da prova. No curso das investigações ficou comprovada a existência de uma organização criminosa estruturada e articulada, especializada em efetuar fraudes contra instituições financeiras, inclusive a Caixa Econômica Federal (CEF), em vários municípios do país, em sua maioria no estado de São Paulo, tendo sido deferido pelo juízo competente o afastamento do sigilo das comunicações telefônicas e telemáticas, bem como a interceptação telefônica dos terminais relacionados às pessoas investigados identificadas, nos autos de Interceptação Telefônica nº 5000607-24.2024.4.03.6124, com observância de todas as garantias constitucionais (princípios do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório). Portanto, rejeito a alegação de nulidade. Princípio da insignificância A defesa de ANDREA pede a sua absolvição pela aplicação do princípio da insignificância, argumentando que os valores movimentados na sua conta são ínfimos quando comparados às quantias movimentadas pelos demais envolvidos (R$ 13.165,00). Sem razão. Não é aplicável o princípio da insignificância em crime de organização criminosa, pois o bem jurídico tutelado é a fé pública e, segundo jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça (STJ), esse princípio não se aplica a crimes dessa natureza. Nesse sentido: PENAL E PROCESSO PENAL. ESTELIONATO PREVIDENCIÁRIO. ARTIGO 171, §3º, DO CP. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. TESE DE QUE A NATUREZA PERMANENTE DO DELITO IMPEDE O RECONHECIMENTO DA CONTINUIDADE DELITIVA. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. Na hipótese dos autos, não é possível o reconhecimento do princípio da insignificância, já que o acórdão impugnado encontra-se em consonância com o entendimento desta Corte Superior, consolidado no sentido de que, no delito tipificado no art. 171, § 3º, do Código Penal, não se aplica o princípio da insignificância, "uma vez que a conduta ofende o patrimônio público, a moral administrativa e a fé pública, bem como é altamente reprovável" (RHC n. 61.931/RS, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, Quinta Turma, DJe 15/2/2016) (AgRg no HC n. 913.137/DF, de minha relatoria, Quinta Turma, julgado em 16/9/2024, DJe de 18/9/2024.). 2. A tese de que a natureza permanente do crime de Estelionato Previdenciário obsta o reconhecimento da continuidade delitiva não foi objeto de debate pela instância ordinária, o que inviabiliza o conhecimento do recurso especial por ausência de prequestionamento. Incide ao caso a Súmula n. 282/STF. 3. Agravo regimental não provido. (AgRg no AgRg no AREsp n. 2.747.808/MG, Quinta Turma, Relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, j. 27.11.2024, DJEN de 04.12.2024) PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. INSERÇÃO DE ASSINATURA FALSA EM DOCUMENTO PÚBLICO CARACTERIZA O DELITO DO ART. 297 DO CP. NÃO CABIMENTO DA DESCLASSIFICAÇÃO PARA FALSIDADE IDEOLÓGICA. NÃO INCIDÊNCIA DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA EM CRIMES CONTRA A FÉ PÚBLICA. PRECEDENTE. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. A inserção de assinatura falsa em documento público ou particular caracteriza ilícito material de perigo abstrato e prescinde de resultado concreto ou de finalidade específica (dolo). Precedente. 2. O princípio da insignificância não é aplicado aos delitos cujo bem tutelado seja a fé pública. Precedente. 3. Agravo regimental não provido. (AgRg no AREsp 1134866/SP, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 10/08/2021, DJe 16/08/2021) Portanto, rejeito a pretensão de aplicação do princípio da insignificância ao caso. Acordo de não persecução penal (ANPP) A defesa comum de EVELYN e TIAGO, em suas razões de apelação, alega que o não oferecimento de ANPP, desacompanhado de motivação idônea, constitui nulidade absoluta e, em razão disso, pede a declaração de nulidade processual desde a negativa do Ministério Público Federal (MPF) em oferecê-lo. Pois bem. O ANPP pode ser celebrado entre o Ministério Público e o autor do delito desde que atendidos os requisitos expressamente previstos no art. 28-A, caput, do Código de Processo Penal, ou seja, (i) confissão formal e circunstanciada por parte do acusado, (ii) infração penal cometida sem violência ou grave ameaça, (iii) com pena mínima inferior a 4 (quatro) anos e (iv) que a medida a ser aplicada seja necessária e suficiente para reprovação e prevenção do crime. Trata-se de instituto resultante de acordo de vontades entre o Ministério Público e o imputado e sua defesa, objetivando dar solução negociada a casos cuja origem sejam crimes de menor gravidade. No caso, o MPF, ao oferecer a denúncia, deixou de propor ANPP pelos seguintes motivos (ID 312633703): Deixo de propor o benefício do Acordo de Não Persecução Penal – ANPP (artigo 28-A, do Código de Processo Penal) aos denunciados, uma vez que o acordo não afigura-se suficiente à reprovação e prevenção do crime. Tratase de infração penal altamente gravosa – Organização Criminosa – prevista em tratados e convenções internacionais como infração a que o Brasil se comprometeu a punir de maneira efetiva. Além disso, foi cometida em concurso com inúmeros estelionatos qualificados (art. 171, § 3º, do Código Penal), o que suplantaria o requisito de pena mínima de 4 (quatro) anos, e que causou prejuízos milionários, em especial a idosos e pessoas vulneráveis. A defesa requereu a intimação do MPF para oferecer proposta de ANPP (ID 312633782) e o MPF reiterou sua manifestação pelo não cabimento do benefício (ID 312633791). Ante essa recusa em oferecer (de forma motivada) o ANPP, os acusados (por sua defesa técnica) tinham o direito de requerer a remessa dos autos ao órgão superior do Ministério Público, nos termos do § 14 do art. 28-A do Código de Processo Penal. Todavia, não o fizeram, conforme se depreende do exame dos autos, tendo ocorrido a preclusão. Além disso, a jurisprudência firmou-se no sentido de que o ANPP não constitui direito subjetivo do acusado, podendo ser proposto pelo Ministério Público quando considerar necessário e suficiente à reprovação e prevenção da infração penal, o que não se verificou no caso. Nesse sentido: STF, HC nº 195.725/SP, Rel. Ministro Alexandre de Moraes, decisão monocrática proferida em 28.01.2021, publicada em 01.02.2021 e transitada em julgado em 12.02.2021. Portanto, a pretensão ao ANPP foi alcançada pela preclusão, razão pela qual não acolho o pedido. Mérito da imputação ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS A defesa de ANDREA pede a sua absolvição, argumentando que foram realizados apenas alguns depósitos em sua conta, em curto intervalo de tempo, o que não configura a estabilidade e a permanência exigidas para a tipificação do crime de organização criminosa. Sem razão. ANDREA é irmã de Vanessa Demetrio de Sá Macedo (apontada como integrante do núcleo avançado, alto escalão da organização criminosa), mãe de EVELYN e sogra de TIAGO. Integrava o núcleo intermediário da organização criminosa, fornecendo sua conta bancária para a movimentação de valores obtidos a partir da abertura de contas com uso de documentos falsos e tendo, desse modo, plena consciência da origem ilícita dos valores que passavam na sua conta. Nas alegações finais que apresentou ao juízo, o MPF transcreveu trechos de uma conversa interceptada (com autorização judicial) que reforçam a participação da acusada na prática criminosa. Além disso, em seu interrogatório em juízo, ela declarou apenas que desconhecia essas conversas, mas confirmou que Elcio Gonçalves dos Santos é seu esposo e o terminal de onde partiram essas conversas está registrado em seu nome. Destaco, sobre isso, o seguinte trecho das alegações finais (ID 312634358): Conversa interceptada após autorização judicial reforça participação desta acusada no esquema criminoso. Trata-se do registro 1733861992 , mantido entre as corrés EVELYN (TMC 11 96970-0480) e ANDREA (TMC 11 96070-2799). Abre-se um parêntese para registrar que o terminal 11 96070-2799 está registrado em nome de Elcio Goncalves dos Santos (CPF 308.118.578-59), esposo de ANDR EA , conforme confirmado por ela em interrogatório nesta ação (ID 343998818 - aos 00m55s), o que corrobora por definitivo que era utilizado por esta acusada na oportunidade do registro. O assunto da citada conversa refere-se à prática de nova fraude para “levantar um dinheiro”, relacionada à abertura de conta em agência da CEF de Porto Ferreira/SP, que EVELYN sugere se tratar de “bom” lugar para a fraude. Trata-se, como visto, de ação típica do modo de operação da organização criminosa, consistente na abertura de contas fraudulentas em agências da Caixa localizadas no interior do Estado de São Paulo. No registro, ainda, EVELYN afirma à mãe que, posteriormente, ela deveria retirar o “cartão de INSS” na residência de algum conhecido, especificamente com caixa de correio de modelo antigo apresentando documento (provavelmente falso), citando que fraude parecida teria sido praticada anteriormente por alguém denominado “VITOR”. Por fim, ANDREA menciona a EVELYN que tentou realizar “uns dez” (provavelmente outras dez fraudes) com outra mulher, mas apenas um deu certo. Segue o registro captado, na íntegra: Alvo: EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ Nº Interceptado: (11)96970-0480 Assunto: Evelyn X MNI Mãe (Andrea) - Conversa sobre possível fraude na Caixa Nº Contato: (11) 96070-2799 ID: 173386199 Data: 14/06/2024 18:30:18 Duração: 00:15:0 Arquivo: 01_19_173386199_20240614183018_20366507 Tipo: Áudio Degravação: MNI: Oi agora posso falar, Não, é porque assim, eu uso o aplicativo, está no meu celular. Aí eu falo com vocês pelo do Kinder. Mas aí quando a gente chega no lugar que a gente dispensa a abertadoria, aí eu pego o celular do Kinder, põe no GPS para até encontrar um produto para a gente pegar novamente, entendeu? Ai eu não posso usar nenhum dos dois… EVELYN: Então.. (inaudível) para falar com o povo MNI: Não, é então, eu estou com o telefone lá para me passar o meu zap para o outro telefone... é, porque eu tenho que andar com três telefones, não tem jeito. (…) [00:11:07:138] Evelyn: Por falar nisso, não tem nenhum documento do velho pronto que você possa levar? MNI: Não ele foi viajar e ele não quer trabalhar mais né filha EVELYN: Porque tem um caixa boa em Porto Feliz.. Em Porto Ferreira.. Pra senhora levantar hoje, só pra levantar um dinheiro.. você faz no caixa aqui, depois vai na agência MNI: Ah, nem precisa abrir conta? EVELYN: Não, você abre a conta no caixa aqui, aí depois de três dias chega a mensagem, você vai na agência e pode assinar e põe a senha. MNI: Aham. E está dando dinheiro isso aí? EVELYN: Tá, e o cartão tem que chegar em qualquer endereço da cidade, você não pode pegar no correio nem no banco. Aí você pega, aí tem que você olha no Google Maps, uma casa que tem aquele carteiro antigo, um correio antigo, sabe, colocar a carta? mas aqueles antigos que você consiga abrir. Aí põe lá dentro e você passa e pega na casa da pessoa mesmo MNI: Aham, ave essa parte é arriscada EVELYN: Mas aí você geralmente faz amizades com as pessoas, eu nunca peguei, quem pegou foi VITOR, ai ele fez a amizade com uma mulher lá e a mulher lá foi e entregou para ele MNI: Tem que ter sangue, porque eu não tenho. EVELYN:É o funcionário que faz isso doida, não é você não tem que ir para o documento, tipo se a pessoa perguntar " Ah, mas e seu nome?", ai "Tá aqui meu documento para você ver que sou eu mesmo, é porque meu cartão (inaudível), acabei de me aposentar, então pensa, eu to sem cartão e até eles trocar eles falaram que demora até trinta dias para chegar... que foi um erro de digitação dele", ai o velho que fala, não é você... MNI: Ata, que susto EVELYN: Ai como geralmente os velhos fazem amizade com outros velhos ai acaba dando.. você sabe que é cartão de INSS ta no nome da pessoa, mostra o documento, entendeu? MNI: Então não, é se voce ta com o documento e prova para pessoa que você é você, não tem problema EVELYN: Então se a senhora tivesse a senhora poderia fazer MNI: É mas não tenho e ele foi viajar EVELYN: Até aquela sua velha burra daria para fazer MNI: Ah deus me livre... não tenho paciência para ela não EVELYN: Não faz nada, ela só senta na mesa a mulher faz tudo lá, espera chega a mensagem, com três dias chega, vai na agência, só assina e pronto… MNI: Ah não, mas ela é uma pessoa muito negativa... No entanto que eu fiz uns dez com ela deu um só. ANDREA recebeu R$ 13.165,00 (treze mil cento e sessenta e cinco reais) de uma conta fraudulenta criada por Daniel Marcelino (integrante do núcleo base) e VANESSA, sua irmã, também recebeu dinheiro dessa conta. Declarou em juízo que esse dinheiro havia sido pagamento pela venda de mercadorias do seu restaurante, que encerrou as atividades durante a pandemia de Covid-19, mas não soube explicar por que sua irmã também recebera dinheiro da mesma pessoa. Consta dos autos a transcrição de uma conversa com uma mulher não identificada, que a orientou a “não sair do buraco”, ou seja, para que permanecesse foragida. Destaco da sentença o seguinte trecho (ID 312634364): A conversa interceptada nos autos nº 5000607-24.2024.403.6124, referente à conversa mantida após a deflagração da operação entre ANDREA e a interlocutora que a orienta a “não sair do buraco”, corrobora os indícios de que ANDREA é integrante da organização criminosa e mantém relação com os demais membros da organização, como se observa na íntegra do registro, extraído do Auto Circunstanciado 02 (ID 339389916): Alvo: ANDREA DEMETRIO DE SA Nº Interceptado: (11)96070-2799 Assunto: Andrea X MNI - Ta tudo com prova / Vanessa entra com pedido que ela tá grávida / Ta todo mundo na mesma cela Nº Contato: (11)97340-8340 ID: 174759445 Data: 25/06/2024 16:18:46 Duração: 00:03:43 Arquivo: 01_125_174759445_20240625161846_20367982 Tipo: Áudio Degravação: MNI: Ai então amiga, tá assim né, o que eu te relatei é o que é, é a sua mãe, você, a talita e a vanessa ai tem os intermediarios que é o gabriel a milena, tem esse menino da caixa e é isso Andrea: E esse negócio de conta ai é, foi a movimentação de transferências MNI: Tudo com prova, tudo com provas... As fotos em rede social... É melhor você ficar no buraco mesmo Andrea: Meu deus do céu e ninguém vai ter audiência hoje né? MNI: Então pode ser que já esteja até tendo… Interrogada em Juízo, ANDREA negou os fatos imputados na denúncia (cf. ID 343998815), que não integra nenhum esquema para a prática de crimes e não possui proximidade com sua irmã VANESSA. Indagada sobre os valores recebidos em sua conta-corrente, entre 29/10/2021 e 25/11/2021, alegou que foram decorrentes da venda das “coisas” que guarneciam o restaurante da interrogada, que faliu na pandemia, para um “rapaz”; não soube explicar, contudo, porque sua irmã VANESSA também recebeu valores daquela conta. Confirmou que é casada com Elcio Gonçalves dos Santos. Sobre a conversa com EVELYN, para levantar dinheiro, afirmou que desconhece a conversa e que não mantém proximidade com EVELYN e nem com TIAGO. A versão apresentada pela ré de que não mantém proximidade com EVELYN e TIAGO se infirma diante da conversa interceptada, na qual restou demonstrado que tratavam de novo esquema fraudulento, a ser praticado em face da agência da CEF de Porto Ferreira/SP. Restou comprovado ainda que entre os membros do grupo criminoso havia uma divisão de tarefas, sendo que a ré, membro do núcleo intermediário, fornecia suas contas como “contas de passagem”, além de receber os valores advindos das fraudes e repassava-os para o comando da organização. A ciência a respeito da prática de atos ilícitos também é inequívoca, consoante o teor das conversas interceptadas. Por conseguinte, diante de todo o explanado, entendo que houve in casu a incidência da norma penal incriminadora aventada na denúncia, pois a ré, de data inicial desconhecida, mas ao menos a partir do ano de 2021 até o dia 25/06/2024 (deflagração da fase ostensiva da operação), integrou pessoalmente organização criminosa voltada para a prática de reiterados crimes de estelionato em face de instituições financeiras, notadamente a CEF. Portanto, tenho por provado que a apelante integrava organização criminosa voltada à prática de crimes de estelionato contra instituições financeiras, dentre as quais a CEF, e, por isso, mantenho a condenação de ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS pela prática do crime previsto no art. 2º, caput, da Lei nº 12.850/2013, nos termos da denúncia. EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ e TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA Examino em conjunto a situação desses dois apelantes, que têm defesa comum, a qual pede sejam eles absolvidos porque, segundo alega, “em nenhum momento ficou comprovado que os valores movimentados nas contas dos apelantes foram originários das contas abertas de forma ilegal” e não estão presentes os requisitos necessários para caracterização de organização criminosa, principalmente pela ausência de estabilidade e permanência. Sem razão, contudo. EVELYN é filha da corré ANDREA e parceira do corréu TIAGO, bem como sobrinha de Vanessa Demétrio de Sá Macedo, tendo fornecido conscientemente suas contas bancárias para movimentação de valores obtidos por meio de fraudes. Ouvida em juízo, ela declarou que não tinha muito contato com a sua mãe, pois fora criada por sua tia (Vanessa), e que os valores que recebia da sua tia referiam-se ao seu trabalho como cuidadora do seu bisavô. Em relação à conversa sobre a fraude na agência da CEF em Porto Ferreira, simplesmente alegou que desconhecia isso. Contudo, destaco da sentença o seguinte trecho (ID 31263434364): A materialidade restou comprovada pelas conversas interceptadas nos autos nº 5000607-24.2024.403.6124, registro nº 173386199, dando conta de que EVELYN mantém conversa com sua mãe ANDREA, a respeito de uma nova fraude, para “levantar um dinheiro”, com a abertura de conta na agência da CEF de Porto Ferreira/SP. Pelo teor da conversa, percebe-se que EVELYN orienta ANDREA como deveria proceder para retirada do cartão do INSS, citando que a fraude teria sido praticada antes por uma pessoa de nome “VITOR”. Apurou-se, ainda, que EVELYN recebeu de THALITA MIRANDA ALCARAZ (núcleo avançado), aproximadamente, R$ 22.700,00, entre 26/08/2022 e 01/06/2023. A acusada também recebeu da conta de Terezinha Demetrio de Sá, movimentada por VANESSA, de 11/10/2022 a 13/06/2023, aproximadamente R$ 66.560,00, transferindo a ela o total de R$ 50.142,00 (ID 321346669 - p. 95/96 – 5000466-05.2024.4.03.6124). No cumprimento do mandado de busca e apreensão deferido pelo Juízo, nos autos nº 5000466-05.2024.4.03.6124, foram apreendidos dois Iphones Pro Max (modelo 14 e 15), outros 2 (dois) telefones celulares e um veículo Audi Q3, ano 2016/2017, em nome de TIAGO, esposo de EVELYN. As diligências realizadas na residência revelaram que o imóvel onde EVELYN reside com seu esposo foi recentemente reformado e possui móveis de alto padrão. Além disso, como destacou o MPF, o padrão das movimentações bancárias de EVELYN e dos bens apreendidos destoam das informações de sua renda, pois não foram encontrados vínculos empregatícios em seu nome, tão somente que fora beneficiária de auxílio emergencial (cf. ID 321346669, p. 97 dos autos nº 5000466-05.2024.4.03.6124). A Ré EVELYN, interrogada em Juízo, negou a imputação, afirmou que não mantém contato com sua mãe ANDREA e desconhece a conversa sobre nova fraude na agência da CEF em Porto Ferreira. Alegou que foi criada por sua tia VANESSA e era quem ajudava financeiramente a ré e seu bisavô. Que o dinheiro enviado para sua conta era porque cuidava de seu bisavô. Sobre o dinheiro recebido de THALITA declarou que, como VANESSA e THALITA eram sócias, recebeu o dinheiro de THALITA como ajuda de VANESSA. Indagada sobre o padrão de vida identificado, informou que ela e o marido TIAGO recebiam ajuda financeira da família do marido. Não é crível a versão apresentada por EVELYN de que recebia ajuda financeira de VANESSA para cuidar de seu bisavô, pois os registros das conversas interceptadas demonstram que a ré atuava conscientemente na organização criminosa, ciente das estratégias do esquema e fornecendo suas contas para movimentação de valores obtidos dos crimes. A defesa não apresentou novos elementos ou provas que pudessem comprovar que os valores recebidos eram destinados para os cuidados do bisavô e do filho de VANESSA. Como visto, observa-se que as escusas apresentadas pela acusada com o intuito de afastar sua autoria não se coadunam com os robustos elementos coligidos nos autos. Em relação a TIAGO, o MPF, em suas alegações finais, transcreveu trechos de uma conversa interceptada (com autorização judicial) que mostra a sua participação na atividade criminosa. Destaco dessa peça o seguinte trecho (ID 312634358): Conversas interceptadas após autorização judicial apontam que TIAGO e EVELYN planejaram a prática de fraude envolvendo abertura de conta e benefício previdenciário, provavelmente concretizada em agência bancária da CEF na cidade de Porto Ferreira/SP (ID 328852963 - Pág. 16/21 e 24/27 – 5000607-24.2024.4.03.6124). Cite-se, neste sentido, a ligação de registro 1730304746 , por meio da qual TIAGO (TMC 11 96818-0464) conversa com interlocutora que chama de “tia” (TMC 11 95883- 8983), planejando encontrá-la na manhã do dia seguinte em local referenciado como “Dom Bosco” para entregá-la uma colinha relacionada à “benefício”, mencionando que ela deveria “estudar” o “RG” e o “comprovante” pessoalmente. Segue a íntegra do diálogo: Alvo: TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA Nº Interceptado: (11) 96818-0464 Assunto: Tiago x MNI Tia - - Colinha no papel do benefício Nº Contato: (11) 95883-8983 ID: 173030474 Data: 12/06/2024 20:42:51 Duração: 00:02:16 Arquivo: 01_12_173030474_20240612204251_20364915 Tipo: Áudio Degravação: Tiago: Oi tia, tudo bem?... Tia deixa eu te falar para a senhora, amanhã, a senhora tem dinheiro no bilhete ai né? Tia: Tenho, dez reais Tiago: Amanhã a senhora consegue… ***Tiago fala fora da ligação*** Tiago: O vida, marca com ela seis e meia, sete horas, o Evelyn Tiago: Tia que horas a senhora chega lá? Seis e meia ou sete horas? Tia: Ah sete horas então… Tiago: Que amanhã eu vou acordar cedo também a sonsinha vai te levar , to indo buscar o carro com ela agora, consegui desbloquear esse inferno aqui… A senhora acha que vai precisar de colinha? Tia: É bom usar né, não tem como não usar, manda aquela colinha lá é rapidinho.. Não não precisa, pelos documentos eu já estudo, viu Tiago: Vou fazer a colinha pra senhora e mandar no papel do beneficio e ai o RG e o comprovante a senhora estuda pessoalmente Tia: Ta joia... Na dom bosco né? Tiago: Isso na dom bosco, ta bom? Sete horas Tia: Ta bom fio, ta marcado, sete horas eu to lá Tiago: Sete horas... dez pra sete eu já ligo pra senhora Na manhã do dia seguinte à ligação (13/06/2024), a ERB do celular de TIAGO estava próxima à localização da estação de metrô Dom Bosco, em São Paulo/SP (ID 328852963 - Pág. 6). Em paralelo, no mesmo dia 13/06/2024, o terminal que manteve a citada conversa com TIAGO registrou localizações de ERB, a partir das 10h00min, em Limeira/SP, se deslocando próximo a Porto Ferreira/SP (mesma cidade citada por EVELYN em conversa captada um dia depois – ligação de ID 173386199) perto das 12h00min e retornando à São Paulo/SP por volta das 15h00min (ID 329260116 - Pág. 17/19 – 5000607-24.2024.4.03.6124). Poucos dias depois, TIAGO manteve conversa com a mesma interlocutora (registro 1744235747) informando que conseguiu desbloquear determinado cartão e que até as oito horas da manhã chegaria uma senha para “tia”, indicando que a fraude combinada dias antes teria se concretizado efetivamente, conforme registro reproduzido abaixo: Alvo: TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA Nº Interceptado: (11)96818-0464 Assunto: Tiago X MNI "Tia" - liberando o aplicativo até umas oito horas sua senha chega Nº Contato: (11)95883-8983 ID: 174423574 Data: 20/06/2024 07:25:05 Duração: 00:01:15 Arquivo: 01_10_174423574_20240620072505_20364915 Tipo: Áudio Degravação: Tiago: Tia, bom dia, tudo bom? Já chegou? MNI Tia: Já, to aqui já Tiago: Tá, deixa eu te falar, to aqui em Itaquera aqui que eu vim desbloquear o cartão..consegui, ta bom? MNI Tia: Ah, ta joia Tiago: Ontem tava dando invalido ontem.. Ai to liberando o aplicativo tem que esperar trinta minutos ta bom? MNI: Ta joia, to aqui, vou sentar aqui no ponto de onibus Tiago: Ta bom, espera ai que até umas oito horas sua senha chega No mais, foram identificadas diversas transações bancárias de altos valores, sem origem comprovada, entre o corréu TIAGO e integrantes ligadas ao comando/topo da organização criminosa. Neste sentido, entre 19/08/2022 e 12/06/2023, TIAGO recebeu das contas de THALITA MIRANDA ALCARAZ, aproximadamente, R$ 230.830,00, enviando àquela acusada a quantia aproximada de R$ 81.900,00. O acusado também recebeu da conta de Terezinha Demetrio de Sá, administrada por VANESSA DEMÉTRIO DE SÁ MACEDO, entre 01/08/2022 e 27/04/2023, aproximadamente R$ 100.600,00, enviando a ela o total de R$ 53.948,93 (ID 321346669 - Pág. 88/93 e 96 – 5000466-05.2024.4.03.6124). Tratam-se de valores advindos dos crimes praticados. Ouvido em juízo, esse apelante negou a prática delitiva e declarou que os valores que recebera em sua conta corrente referiam-se à reforma na casa em que residia com sua esposa (EVELYN), que cuidava do bisavô dela. Quanto aos valores que enviou para Vanessa e Thalita Miranda Alcaraz (integrante do núcleo avançado da organização criminosa), disse que seriam devoluções por serviços não executados na reforma, mas sua defesa não apresentou nenhuma prova de que os valores recebidos na sua conta referiam-se a essa reforma. Ainda sobre o envolvimento do apelante na organização criminosa, constam da Informação de Polícia Judiciária nº 3287723/2024 (ID 312633828, pp. 65/79) as informações extraídas do celular de Vinicius Gabriel Vieira da Rocha (integrante do núcleo intermediário da organização criminosa), segundo as quais ele mantinha conversa com TIAGO no aplicativo Whatsapp, indicando que fornecia informações e dados sobre potenciais vítimas de fraudes bancárias ao apelante. Seguem trechos da IPJ que destacam as principais conversas: No dia 22/01/2024, TIAGO chama VINICIUS GABRIEL e pergunta “meu tá fluindo?”. VINICIUS GABRIEL responde que sim, que quando chegar em casa vai dar uma atenção “no dele” e que na semana anterior VANESSA pesou. Entende-se aqui que VINICIUS GABRIEL estaria também trabalhando para TIAGO realizando buscas e captando nomes de vítimas. TIAGO envia um áudio dizendo que "é foda trabalhar pra mais de uma pessoa" e enfatiza que VANESSA paga VINICIUS GABRIEL semanalmente. TIAGO pede para VINICIUS GABRIEL dar uma atenção para ele naquela semana, pois ele está arrumando outra "funcionária", possivelmente uma mulher para atuar abrindo as contas bancárias em nome das vítimas. TIAGO diz que também arrumou um homem, irmão dessa funcionária, e que vai precisar também de nomes de homens. Ele pede para VINICIUS GABRIEL focar primeiro em nomes femininos.(...) No dia 24/01/2024, TIAGO pergunta se VINICIUS GABRIEL tem novidades. VINICIUS GABRIEL responde que não efetuou buscas por nomes no dia anterior, pois ficou sem energia e quando foi "puxar" os nomes já estava sem limites. Ele diz que falou com uma mulher e que ela ia arrumar. VINICIUS GABRIEL comenta que o dia anterior foi perdido "por conta da senha do INSS". TIAGO pergunta se ele já está procurando por nomes naquele dia e diz que está precisando de pelo menos 20 nomes femininos, pois na segunda-feira vai pedir nomes masculinos, dando a entender que TIAGO estaria se preparando para abrir 20 contas bancárias em nome de vítimas mulheres e depois abrir contas bancárias em nome de vítimas do sexo masculino. (...) No dia 25/01/2024, TIAGO envia mensagens para VINICIUS GABRIEL, porém apaga essas mensagens. VINICIUS GABRIEL diz que conseguiu 11 nomes, mas ainda não consultou se os nomes estão limpos pois está sem senha e pede para TIAGO já ver uma senha para consultar o SCORE. VINICIUS GABRIEL reclama que consultou 27 nomes para conseguir encontrar 1 que está "ok". TIAGO envia diversas mensagens e as apaga. VINICIUS GABRIEL diz que vai tentar entregar todos os nomes até o dia seguinte. (...) No dia 26/01/2024, VINICIUS GABRIEL fiz que "mandou lá", fazendo referência à lista de nomes das vítimas. TIAGO pergunta quantos nomes VINICIUS GABRIEL enviou. VINICIUS GABRIEL responde que conseguiu "puxar" 16 nomes, mas que o último estava sujo e que não tinha mais nomes de mulher na idade estipulada. Mais uma vez, entende-se que VINICIUS GABRIEL estaria não só trabalhando para VANESSA DEMÉTRIO na busca de nomes de vítimas, mas também para TIAGO. Ao ser ouvido em juízo, o apelante declarou que desconhecia essas as ligações. Contudo, conforme consta da sentença, foram apreendidos (no cumprimento de mandado de busca e apreensão realizados no imóvel onde ele reside com EVELYN) dois Iphones Pro Max (modelos 14 e 15), dois telefones celulares e um veículo Audi Q3, ano 2016/2017 (avaliado em R$ 101.279,00 – ID 312633712, p. 19), em seu nome (TIAGO), incompatíveis com a sua renda declarada, pois ele foi beneficiário de auxílio emergencial e não foram localizados vínculos empregatícios em seu nome. Destaco da sentença (ID 31263434364): No cumprimento do mandado de busca e apreensão deferido pelo Juízo, nos autos nº 5000466-05.2024.4.03.6124, foram apreendidos dois Iphones Pro Max (modelo 14 e 15), outros 2 (dois) telefones celulares e um veículo Audi Q3, ano 2016/2017, em nome de TIAGO. As diligências realizadas na residência revelaram que o imóvel onde reside com EVELYN foi recentemente reformado e possui móveis de alto padrão. Além disso, como bem destacou o MPF, o padrão das movimentações bancárias de TIAGO e dos bens apreendidos destoam das informações de sua renda, pois não foram encontrados vínculos empregatícios em seu nome, tão somente que fora beneficiário de auxílio emergencial (cf. ID 333179332). Somado a isso, o conteúdo extraído do aparelho celular de VINICIUS GABRIEL VIEIRA DA ROCHA (IPJ nº 3287723/2024 - ID 336725649) confirma a participação ativa de TIAGO no esquema criminoso desenvolvido pela organização, pois nas conversas entre os dois ficou evidente que VINICIUS fornecia informações e dados sobre potenciais vítimas de fraudes bancárias ao acusado TIAGO. O réu, interrogado em Juízo, negou a prática delitiva, declarando que os valores recebidos de VANESSA em sua conta-corrente, cuja origem o acusado não tinha conhecimento, teriam sido exclusivamente para fazer uma reforma na casa onde sua esposa EVELYN residia e cuidava do bisavô dela e afilhado Davi (filho de VANESSA). Questionado sobre os valores recebidos de THALITA, afirma que também teriam sido enviados por VANESSA, visto que aquela era sócia desta. Questionado sobre os valores enviados para VANESSA e THALITA, respectivamente, nos montantes totais de R$ 81.900,00 e R$ 53.948,93, o acusado alega que seriam referentes à devolução por serviços não prestados quanto à citada reforma. Indagado sobre as ligações com a pessoa “tia”, afirmou desconhecer a ligação, afirmando que reside perto da estação Dom Bosco. A defesa não apresentou novos elementos ou provas que pudessem comprovar que os valores recebidos eram destinados para a referida reforma. Nesse contexto, a testemunha arrolada pela defesa de TIAGO, Bruno Santos da Silva, informou que o réu presta serviço para sua empresa, de forma esporádica e terceirizada, ganhando, dependendo do serviço que presta, de R$500,00 a R$1.000,00 por semana, reforçando que os bens e o padrão de vida de TIAGO é incompatível com a renda que recebe como técnico de refrigeração. Como visto, observa-se que a escusa apresentada pelo acusado com o intuito de afastar sua autoria não se coaduna com os robustos elementos coligidos nos autos. Restou comprovado ainda que entre os membros do grupo criminoso havia uma divisão de tarefas, sendo que o réu, membro do núcleo intermediário, fornecia suas contas como “contas de passagem”, além de receber os valores advindos das fraudes e repassar para o comando da organização, também organizava suas próprias fraudes. Por conseguinte, diante de todo o explanado, entendo que houve in casu a incidência da norma penal incriminadora aventada na denúncia, pois o réu, de data inicial desconhecida, mas ao menos a partir do ano de 2021 até o dia 25/06/2024 (deflagração da fase ostensiva da operação), integrou pessoalmente organização criminosa voltada para a prática de reiterados crimes de estelionato em face de instituições financeiras, notadamente a CEF. Portanto, estando devidamente comprovado que os apelantes integraram organização criminosa voltada à prática de crimes de estelionato contra instituições financeiras, dentre as quais a CEF, mantenho as condenações de EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ e TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA pela prática do crime previsto no art. 2º, caput, da Lei nº 12.850/2013, nos termos da denúncia. WESLEY SILVIO BESSA A defesa de WELSEY pede a sua absolvição, com base no inciso VII do art. 386 do Código de Processo Penal, pois, segundo alega, sua condenação fundamentou-se unicamente em prova colhida na fase investigatória, o que ofende o disposto no art. 155 do Código de Processo Penal. Sem razão. O art. 155 do Código de Processo Penal dispõe que o juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas. O caso em exame entra no rol dessas exceções. Com efeito, foram obtidas várias provas em razão de cumprimento de mandado de busca e apreensão expedido por ordem judicial no Inquérito Policial nº 5000079-24.2023.4.03.6124 e a obtenção dessa prova é cautelar e irrepetível, de modo que está amparada na legislação processual penal. Nesse sentido: AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PLEITO DE NULIDADE DA CITAÇÃO POR EDITAL. TODOS OS MEIOS PARA A LOCALIZAÇÃO ESGOTADOS. SÚMULA 7/STJ. CONDENAÇÃO COM PROVAS COLHIDAS NA FASE INVESTIGATIVA. PROVAS IRREPETÍVEIS E ANTECIPADAS. POSSIBILIDADE. SÚMULA 83/STJ. AGRAVO IMPROVIDO. 1. A reversão da premissa fática de que esgotados todos os meios para localização da ré, a justificar a citação por edital, encontra óbice na Súmula 7/STJ. 2. As provas irrepetíveis e antecipadas, como o laudo pericial e o mandado de busca e apreensão, produzidos nos autos do inquérito policial, podem servir como base para condenação. 3. Agravo regimental improvido. (STJ, AgRg no AREsp nº 1.439.910/SC, Quinta Turma, Rel. Ministro Nefi Cordeiro, J. 08.10.2019, DJe 17.10.2019) Consta das alegações finais do MPF que existem inúmeras provas de que esse apelante participou ativamente do esquema criminoso. Destaco dessa peça o seguinte trecho (ID 312634358): WESLEY SILVIO BESSA é sobrinho de RITA DE CASSIA BESSA (núcleo avançado), com quem residia, e atuou no esquema criminoso desenvolvido fornecendo suas contas-correntes para os membros de alto escalão para recebimento e repasse de valores advindos dos ilícitos praticados. Este acusado figura como investigado/envolvido em, ao menos, 7 (sete) inquéritos policiais com a finalidade de apurar crimes de estelionato qualificados contra a CEF, praticados com o mesmo modus operandi dos narrados anteriormente. Em todos os procedimentos, WESLEY foi identificado como beneficiário de parte dos valores provenientes dos empréstimos consignados realizados mediante uso de documentos falsos em nome das vítimas (ID 321346669 - Pág. 111/114 – 5000466-05.2024.4.03.6124). São eles: [...] Somente em decorrência das fraudes contra aposentados/pensionistas identificadas e levantadas pela CEF, a conta de WESLEY recebeu o total de R$ 211.097,02 (Ofício nº 38/2023/CEFRA/DF - ID 322134146 - Pág. 28 – 5000466-05.2024.4.03.6124) As diligências obtidas após o cumprimento das buscas e apreensões revelaram que WESLEY residia no mesmo imóvel que RITA DE CÁSSIA BESSA, uma das chefes da ORCRIM, onde foram localizados e apreendidos diversos documentos relacionados as práticas delitivas narradas (ID’s 333179336 e 333179340) . Interrogado em juízo, o apelante negou fazer parte da organização criminosa. Alegou que apenas aceitara a proposta de uma pessoa (que conhecia como “Bil”) para receber dinheiro em sua conta e repassá-lo para outras contas, recebendo cem reais a cada mil reais transferidos. Disse que não tinha conhecimento de que os valores eram provenientes de estelionato. Contudo, não é crível que não tivesse conhecimento da origem criminosa dos valores depositados na sua conta, conforme destacado no seguinte trecho da sentença: Interrogado em Juízo, o réu negou a prática do crime imputado. Alegou, em síntese, que aceitou uma proposta para receber valores em sua conta e repassá-los a troco de um percentual, sem saber que os valores eram de estelionato. A proposta foi feita por uma pessoa que se apresentava como “Bil”, que era de fora do convívio do acusado, e o acusado recebia cerca de 20 a 30 mil reais na conta e enviava para outras contas, recebendo cem reais a cada mil reais transferidos. Questionado do porquê outras duas pessoas ligadas a ele e sua tia RITA DE CÁSSIA BESSA (Ramissayane Sthefany da Silva Bessa e Sabrina Bessa dos Santos) também receberam valores provenientes das fraudes praticadas contra os beneficiários do INSS, o réu alegou que ele quem pediu a conta para elas. Por fim, confessou que fazia parte desse esquema de fornecimento de contas. Ainda que alegue que desconhecia a origem do dinheiro que recebia em sua conta, não é crível que não tinha conhecimento das fraudes praticadas pela organização criminosa, sendo que residia com uma das integrantes do núcleo avançado e havia na residência diversos documentos relacionados às fraudes. Como destacou o MPF, o réu não declinou nenhuma outra informação a respeito da pessoa que supostamente o teria proposto o esquema de contas de passagem (“Bil”), o que descredibiliza suas alegações. Como visto, observa-se que as escusas apresentadas pelo acusado com o intuito de afastar sua participação não se coadunam com os robustos elementos coligidos nos autos. Restou comprovado ainda que entre os membros do grupo criminoso havia uma divisão de tarefas, sendo que o réu, membro do núcleo intermediário, fornecia suas contas como “contas de passagem”, além de receber os valores advindos das fraudes, também os repassava para o comando da organização. Por conseguinte, diante de todo o explanado, entendo que houve in casu a incidência da norma penal incriminadora aventada na denúncia, pois o réu, de data inicial desconhecida, mas ao menos a partir do ano de 2021 até o dia 25/06/2024 (deflagração da fase ostensiva da operação), integrou pessoalmente organização criminosa voltada para a prática de reiterados crimes de estelionato em face de instituições financeiras, notadamente a CEF. Portanto, comprovado que o apelante integrou organização criminosa voltada à prática de crimes de estelionato contra instituições financeiras, dentre as quais a CEF, mantenho a condenação de WESLEY SILVIO BESSA pela prática do crime previsto no art. 2º, caput, da Lei nº 12.850/2013, nos termos da denúncia. Dosimetria das penas Passo ao reexame da dosimetria das penas. ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS Na primeira fase, o juízo a quo fixou a pena-base em 4 (quatro) anos e 3 (três) meses de reclusão e 98 (noventa e oito) dias-multa, com base nos seguintes fundamentos: Atento aos critérios constantes no artigo 59 do Código Penal, verifico que ultrapassaram os limites do tipo as circunstâncias do delito, pois a organização criminosa se valia do uso de inúmeros documentos falsificados para a prática das fraudes delitivas apuradas, bem como fazia uso de contas-correntes de interpostas pessoas para dificultar o rastreamento dos valores indevidos obtidos com os crimes; e as consequências do delito, pois a CEF apontou 124 contas abertas por meio de documentação falsa de beneficiários do INSS relacionados ao grupo criminoso, cujas operações de crédito somam a quantia de R$ 5.122.654,48, o que revela a gravidade do impacto social das fraudes. A defesa pede a redução da pena-base ao mínimo legal. Com parcial razão. As circunstâncias e consequências do delito são negativas, porém a elevação feita pelo juízo de primeiro grau merece pequeno ajuste, especialmente em relação à pena de multa. Ocorre que esta Turma tem entendimento de que a quantificação da pena de multa deve dar-se de forma proporcional à pena privativa de liberdade, seguindo o mesmo critério trifásico de dosimetria da pena privativa de liberdade (ApCrim nº 0002526-47.2011.4.03.6106/SP, Rel. Des. Federal Nino Toldo, j. 01.9.2015, e-DJF3 Judicial 1 03.9.2015). Por isso, acolho em parte o recurso nesse ponto e reduzo a pena-base para 4 (quatro) anos de reclusão e 13 (treze) dias-multa. Na segunda fase, o juízo não reconheceu nenhuma circunstância atenuante e reconheceu a circunstância agravante da reincidência (CP, art. 61, I - Ação Penal nº 0012278-07.2014.4.03.6181 – trânsito em julgado em 09.06.2020), na fração de 1/6 (um sexto), o que confirmo. Assim, a pena intermediária fica em 4 (quatro) anos e 8 (oito) meses de reclusão e 15 (quinze) dias-multa. Na terceira fase, o juízo não aplicou nenhuma causa de aumento ou de diminuição de pena, o que confirmo, ficando a pena definitiva estabelecida em 4 (quatro) anos e 8 (oito) meses de reclusão e 15 (quinze) dias-multa, mantido o valor unitário do dia-multa no mínimo legal. EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ e TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA Analiso simultaneamente as penas fixadas para EVELYN e TIAGO porque são semelhantes as circunstâncias de fato a eles relativas. Eventuais situações específicas serão destacadas a fim de se observar estritamente o princípio da individualização da pena. Na primeira fase, o juízo a quo fixou a pena-base em 4 (quatro) anos e 3 (três) meses de reclusão e 98 (noventa e oito) dias-multa, com base nos seguintes fundamentos: Atento aos critérios constantes no artigo 59 do Código Penal, verifico que ultrapassaram os limites do tipo as circunstâncias do crime, pois a organização criminosa se valia do uso de inúmeros documentos falsificados para a prática das fraudes delitivas apuradas, bem como fazia uso de contas-correntes de interpostas pessoas para dificultar o rastreamento dos valores indevidos obtidos com os crimes; e as consequências do delito, pois a CEF apontou 124 contas abertas por meio de documentação falsa de beneficiários do INSS relacionados ao grupo criminoso, cujas operações de crédito somam a quantia de R$ 5.122.654,48, além das vítimas serem idosos, com saúde debilitada e dependentes economicamente dos benefícios, o que revela a gravidade do impacto social das fraudes. A defesa pede a redução da pena-base ao mínimo legal. Com parcial razão. As circunstâncias e consequências do delito são negativas, porém a elevação feita pelo juízo de primeiro grau merece pequeno ajuste, especialmente em relação à pena de multa. Ocorre que esta Turma tem entendimento de que a quantificação da pena de multa deve dar-se de forma proporcional à pena privativa de liberdade, seguindo o mesmo critério trifásico de dosimetria da pena privativa de liberdade (ApCrim nº 0002526-47.2011.4.03.6106/SP, Rel. Des. Federal Nino Toldo, j. 01.9.2015, e-DJF3 Judicial 1 03.9.2015). Por isso, acolho em parte o recurso nesse ponto e reduzo a pena-base para 4 (quatro) anos de reclusão e 13 (treze) dias-multa para cada réu. Na segunda fase, o juízo não reconheceu circunstâncias agravantes nem atenuantes, o que confirmo, não se alterando a pena intermediária em relação à pena-base. Na terceira fase, o juízo não aplicou nenhuma causa de aumento ou de diminuição de pena, porém a defesa pede a aplicação da causa de diminuição prevista no art. 29, § 1º, do Código Penal (participação de menor importância), porém sem razão porque foi comprovado que a atuação dos apelantes não foi menor, mas de ativa participação na organização criminosa pelo fornecimento de contas de passagem, que se mostraram indispensáveis para o seu funcionamento. Assim, a pena definitiva para cada um desses réus fica estabelecida em 4 (quatro) anos de reclusão e 13 (treze) dias-multa, mantido o valor unitário do dia-multa no mínimo legal. WESLEY SILVIO BESSA Na primeira fase, o juízo a quo fixou a pena-base em 4 (quatro) anos e 3 (três) meses de reclusão e 98 (noventa e oito) dias-multa, com base nos mesmos fundamentos acima transcritos. A defesa pede a redução da pena-base ao mínimo legal. Com parcial razão. Conforme dito acima, as circunstâncias e consequências do delito são negativas, porém a elevação feita pelo juízo de primeiro grau merece pequeno ajuste, especialmente em relação à pena de multa, na linha de entendimento da Turma já exposto. Por isso, acolho em parte o recurso nesse ponto e reduzo a pena-base para 4 (quatro) anos de reclusão e 13 (treze) dias-multa. Na segunda fase, o juízo não reconheceu circunstâncias agravantes nem atenuantes, o que confirmo, não se alterando a pena intermediária em relação à pena-base. A defesa pede sejam reconhecidas as circunstâncias atenuantes da confissão espontânea (CP, art. 65, III, “d”) e da menoridade relativa (CP, art. 65, I). Sem razão, porém. Ocorre que o apelante negou a prática do crime, tendo admitido apenas que emprestara sua conta para um indivíduo conhecido, sem saber que os valores eram provenientes de estelionato. Isso, todavia, não configura confissão. Além disso, nascido no dia 15.5.2002, tinha 22 anos completos na data da deflagração da fase ostensiva da Operação Anonymous (em 25.6.2024). Portanto, não ocorre nenhuma das hipóteses atenuantes mencionadas. Na terceira fase, o juízo não aplicou nenhuma causa de aumento ou de diminuição de pena, o que confirmo ficando a pena definitiva estabelecida em 4 (quatro) anos de reclusão e 13 (treze) dias-multa, mantido o valor unitário do dia-multa no mínimo legal. Regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade Mantenho o regime fechado para início do cumprimento da pena privativa de liberdade (CP, art. 33, § 2º, "a") fixada para a corré ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS porque, apesar de o total da pena fixada não ser superior a oito anos de reclusão, ela é reincidente (CP, art. 33, § 2º, "b"), não sendo cabível a substituição dessa pena por restritivas de direitos (CP, art. 44, I e II). Observo que essa apelante não chegou a ser presa preventivamente, razão pela qual não há desconto a ser feito a título de tempo de prisão provisória. Em relação aos corréus EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ, TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA e WESLEY SILVIO BESSA, o juízo havia fixado o regime semiaberto para início do cumprimento de suas respectivas penas privativas de liberdade, considerando que as penas que fixara eram superiores quatro anos de reclusão. Contudo, ante o redimensionamento das penas, que não ultrapassaram quatro anos de reclusão para nenhum deles, e que as circunstâncias judiciais não são negativas (CP, art. 59), dou provimento aos recursos das defesas desses réus nesse ponto para fixar o regime aberto para início do cumprimento das respectivas penas privativas de liberdade (CP, art. 33, § 2º, "c"), observando que, em relação ao corréu TIAGO, a Décima Primeira Turma, por unanimidade, na sessão de 13.3.2025, concedeu ordem de habeas corpus para garantir a esse réu “que o regime adequado para o início do cumprimento da [sua] pena é o aberto”. O acórdão do Habeas Corpus nº 5033888-10.2024.4.02.0000 tem a seguinte ementa: PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. DETRAÇÃO. 1. O art. 387, § 1º, do Código de Processo Penal dispõe que o juiz, na sentença, decidirá, fundamentadamente, sobre a manutenção ou, se for o caso, a imposição de prisão preventiva ou de outra medida cautelar, sem prejuízo do conhecimento de apelação que vier a ser interposta. 2. O regime inicial de cumprimento da pena fixado na sentença (semiaberto) deverá ser objeto de oportuno exame pela Turma no julgamento da apelação criminal interposta pela defesa do paciente. No entanto, considerando a pena fixada na condenação, o tempo de prisão já cumprido pelo paciente, suas condições subjetivas favoráveis e que o MPF não recorreu da sentença, é possível afirmar, desde logo, que o regime adequado para o início do cumprimento da pena é o aberto, que é incompatível com a manutenção da prisão do paciente, cuja liberdade não pode aguardar os trâmites ordinários da expedição e processamento da guia de execução provisória. 3. Ordem concedida. Além disso, presentes os requisitos do art. 44 do Código Penal, substituo as penas privativas de liberdade de cada réu por duas penas restritivas de direitos para cada um, consistentes em: i) prestação de serviços à comunidade ou a entidade pública, pelo período das penas substituídas, em local e modo a serem indicados pelo juízo da execução penal; ii) prestação pecuniária, no valor de 3 (três) salários mínimos, em favor de entidade pública ou privada com destinação social a ser indicada pelo juízo da execução penal. Prisão preventiva A defesa de ANDREA pede a revogação da sua prisão preventiva e o o recolhimento do mandado de prisão expedido em seu desfavor. Sem razão. O juízo de origem manteve a decretação da sua prisão preventiva pelos seguintes fundamentos: Mantendo-se integras as razões cautelares que justificaram a decretação da prisão preventiva da ré, e tendo ela permanecido foragida durante todo o processo, mantenho a sua prisão preventiva decretada (art. 387, §1º, do Código de Processo Penal). Mantenho a prisão preventiva porque ainda estão presentes os motivos que levaram à sua decretação (garantia da ordem pública e da aplicação da lei penal) e a apelante encontra-se foragida desde então, situação que se estendeu ao longo de todo o processo e demonstra não só o descaso da apelante como também a necessidade da sua prisão para garantia da ordem da pública e da aplicação da lei penal. Assistência judiciária gratuita Defiro aos apelantes os benefícios da assistência judiciária gratuita. Contudo, esse deferimento não impede a condenação ao pagamento das custas processuais, sendo sua isenção matéria a ser examinada em sede de execução do julgado (STJ, AgRg no Ag 1.377.544/MG, Quinta Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 31.05.2011, DJe 14.06.2011), tampouco implica provimento de qualquer parte do recurso, pois não foi demonstrado que a gratuidade tenha sido requerida ao juízo de primeiro grau e por ele tenha sido indeferida. Conclusão Posto isso, DOU PARCIAL PROVIMENTO às apelações, para reduzir a pena-base de todos os apelantes e fixar o regime aberto para início de cumprimento das penas privativas de liberdade de EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ, TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA e WESLEY SILVIO BESSA, substituindo-as por penas restritivas de direitos, ficando as penas definitivas estabelecidas em 4 (quatro) anos e 8 (oito) meses de reclusão, em regime inicial fechado, e 15 (quinze) dias-multa, para ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS, e em 4 (quatro) anos de reclusão, em regime inicial aberto, e 13 (treze) dias-multa, para EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ, TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA e WESLEY SILVIO BESSA, nos termos da fundamentação supra. É o voto. Autos: APELAÇÃO CRIMINAL - 5000872-26.2024.4.03.6124 Requerente: ANDREA DEMETRIO DE SA SANTOS e outros Requerido: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP Ementa: Direito penal e processual penal. Apelação criminal. Organização Criminosa. Fraudes bancárias. Operação Anonymous. Nulidades. Competência. Princípio da insignificância. Dosimetria da pena. Pena-base. Recursos parcialmente providos. I. Caso em exame 1. Trata-se de apelações interpostas em face da sentença, no âmbito da denominada Operação Anonymous, que condenou os réus pela prática do crime de organização criminosa (art. 2º, caput, § 3º, da Lei 12.850/2013), na transferência de valores obtidos mediante empréstimos em instituições financeiras com uso de documentos falsos. II. Questão em discussão 2. As questões em discussão consistem em saber se: (i) o juízo de Jales é competente para processar e julgar o feito; (ii) houve nulidade na obtenção das provas mediante interceptação de comunicações telefônicas; (iii) é cabível a aplicação ao caso do princípio da insignificância; (iv) se o não oferecimento de ANPP constitui nulidade; (v) há provas suficientes para a condenação; (vi) está correta a dosimetria das penas. III. Razões de decidir 3. Tendo se consumado o crime no momento da obtenção da vantagem ilícita, a regra aplicável é a do do art. 70, caput, do Código de Processo Penal. A Justiça Federal de Jales era competente para processar e julgar a ação penal. 4. O caso concreto em exame reflete, de forma clássica, aquelas situações em que a medida excepcional da interceptação das comunicações telefônicas mostra-se imprescindível para a obtenção da prova. Nulidade inexistente. 5. Não é aplicável o princípio da insignificância em crime de organização criminosa, pois o bem jurídico tutelado é a fé pública e, segundo jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça (STJ), esse princípio não se aplica a crimes dessa natureza. 6. Ante a recusa do MPF em oferecer (de forma motivada) o ANPP, os acusados (por sua defesa técnica) tinham o direito de requerer a remessa dos autos ao órgão superior do Ministério Público, nos termos do § 14 do art. 28-A do Código de Processo Penal. Todavia, não o fizeram, tendo ocorrido a preclusão. Além disso, a jurisprudência firmou-se no sentido de que o ANPP não constitui direito subjetivo do acusado, podendo ser proposto pelo Ministério Público quando considerar necessário e suficiente à reprovação e prevenção da infração penal, o que não se verificou no caso. 7. Materialidade, autoria e dolo comprovados em relação a todos os réus. São suficientes as provas da participação dos réus na organização criminosa, com base nas conversas telefônicas interceptadas, nos depoimentos e nas movimentações financeiras ilícitas. 8. Dosimetria das penas. Penas-bases redimensionadas e alterado, em relação a três deles, o regime inicial de cumprimento com a possibilidade de substituição por penas restritivas de direitos. IV. Dispositivo e tese 9. Recursos parcialmente providos. Tese de julgamento: “1. Tendo se consumado o crime no momento da obtenção da vantagem ilícita, a regra aplicável é a do do art. 70, caput, do Código de Processo Penal. 2. Interceptações telefônicas autorizadas judicialmente e devidamente fundamentadas são válidas e podem embasar a condenação. 3. O princípio da insignificância não é aplicável ao crime de organização criminosa, dada a tutela da fé pública. 4. O acordo de não persecução penal não constitui direito subjetivo do réu, podendo o Ministério Público recusar o seu oferecimento motivadamente.” _________ Dispositivos relevantes citados: CP, arts. 59, 65, 61, I; CPP, arts. 70, 155, 226, 28-A; Lei nº 12.850/2013, art. 2º, caput e § 3º. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgRg no AREsp nº 2.747.808/MG, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, 5ª Turma, j. 27.11.2024, DJEN 4.12.2024; STF, HC nº 195.725/SP, Rel. Min. Alexandre de Moraes, j. 28.01.2021. ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Primeira Turma, por unanimidade, decidiu DAR PARCIAL PROVIMENTO às apelações, para reduzir a pena-base de todos os apelantes e fixar o regime aberto para início de cumprimento das penas privativas de liberdade de EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ, TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA e WESLEY SILVIO BESSA, substituindo-as por penas restritivas de direitos, ficando as penas definitivas estabelecidas em 4 (quatro) anos e 8 (oito) meses de reclusão, em regime inicial fechado, e 15 (quinze) dias-multa, para ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS, e em 4 (quatro) anos de reclusão, em regime inicial aberto, e 13 (treze) dias-multa, para EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ, TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA e WESLEY SILVIO BESSA, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. NINO TOLDO Desembargador Federal

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Processo nº 5000872-26.2024.4.03.6124

ID: 300544602

Tribunal: TRF3 Órgão: Gab. 40 - DES. FED. NINO TOLDO Classe: APELAçãO CRIMINAL Nº Processo: 5000872-26.2024.4.03.6124

Data de Disponibilização: 17/06/2025

Polo Ativo:

EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SA

Polo Passivo:

Intimação

Advogados:

WELLINGTON SILVA CAMPOS

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

CLEMERSON MISAEL DOS SANTOS

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CESAR RENATO FLORINDO

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PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 11ª Turma APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 5000872-26.2024.4.03.6124 RELATOR: Gab. 40 - DES. FED. NINO TOLDO APELANTE: ANDREA DEMETRIO DE SA SANTOS, … PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 11ª Turma APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 5000872-26.2024.4.03.6124 RELATOR: Gab. 40 - DES. FED. NINO TOLDO APELANTE: ANDREA DEMETRIO DE SA SANTOS, EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SA, TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA, WESLEY SILVIO BESSA Advogado do(a) APELANTE: CLEMERSON MISAEL DOS SANTOS - SP317298-A Advogado do(a) APELANTE: WELLINGTON SILVA CAMPOS - SP438093-A Advogado do(a) APELANTE: CESAR RENATO FLORINDO - SP405260-A APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP OUTROS PARTICIPANTES: PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 11ª Turma APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 5000872-26.2024.4.03.6124 RELATOR: Gab. 40 - DES. FED. NINO TOLDO APELANTE: ANDREA DEMETRIO DE SA SANTOS, EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SA, TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA, WESLEY SILVIO BESSA Advogado do(a) APELANTE: CLEMERSON MISAEL DOS SANTOS - SP317298-A Advogado do(a) APELANTE: WELLINGTON SILVA CAMPOS - SP438093-A Advogado do(a) APELANTE: CESAR RENATO FLORINDO - SP405260-A APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NINO TOLDO (Relator): Trata-se de apelações interpostas por ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS, EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ, TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA e WESLEY SILVIO BESSA em face da sentença proferida pela 1ª Vara Federal de Jales (SP), no âmbito da denominada Operação Anonymous, que os condenou pela prática do crime de organização criminosa (art. 2º, caput, § 3º, da Lei 12.850/2013) às seguintes penas: i) ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS - 4 (quatro) anos, 11 (onze) meses e 15 (quinze) dias de reclusão, em regime inicial fechado, e 114 (cento e quatorze) dias-multa, no valor unitário mínimo legal; ii) EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ - 4 (quatro) anos e 3 (três) meses de reclusão, em regime inicial semiaberto, e 98 (noventa e oito) dias-multa, no valor unitário mínimo legal; iii) TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA - 4 (quatro) anos e 3 (três) meses de reclusão, em regime inicial semiaberto, e 98 (noventa e oito) dias-multa, no valor unitário mínimo legal; e iv) WESLEY SILVIO BESSA - 4 (quatro) anos e 3 (três) meses de reclusão, em regime inicial semiaberto, e 98 (noventa e oito) dias-multa, no valor unitário mínimo legal. O Ministério Público Federal (MPF) deixou de propor acordo de não persecução penal (ANPP) sob o argumento de que o acordo não se afigura suficiente à reprovação e prevenção do crime (ID 312633703, p. 2), não tendo havido manifestação das defesas de ANDREA, TIAGO e WESLEY sobre isso (ID 312633790, 312633808 e 312633810). A defesa de EVELYN requereu a intimação do MPF para oferecer proposta de ANPP (ID 312633782), mas o MPF reiterou o não cabimento do benefício (ID 312633791) e não houve pedido de envio dos autos ao órgão superior do MPF. A denúncia (ID 312633703), recebida em 29.7.2024 (ID 312633750), narra: Os fatos a seguir expostos surgiram das investigações conduzidas no Inquérito Policial nº 5000079-24.2023.4.03.6124, instaurado para apurar, inicialmente, a prática de crime previsto no artigo 171, §3º, do Código Penal. A agência da Caixa Econômica Federal (CEF) de Auriflama/SP (ID 273316977 - Pág. 5/34 – IPL 5000079-24.2023.4.03.6124) informou que indivíduo até então não identificado, no dia 13/07/2022, utilizando documentação falsa em nome de Antônio Carlos dos Santos, abriu conta-corrente naquela agência, transferindo o pagamento de benefício previdenciário de aposentadoria recebido pela vítima para a conta fraudulenta. [...] Analisados os dados bancários e realizadas pesquisas, foi possível identificar outros envolvidos – em especial THALITA MIRANDA ALCARAZ, VANESSA DEMETRIO DE SÁ MACEDO, ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS e HERIBERTO DOS SANTOS CANDIDO – além de novas práticas de estelionato contra a CEF, conforme detalhado no Relatório de Análise de Polícia Judiciária (RAPJ) nº 2291253/2023 (DOC. 1 anexo)1. Havia, nesse momento, fortes indícios da existência de uma Organização Criminosa – doravante referida como ORCRIM – voltada à prática reiterada de crimes de estelionato. Realizada a quebra do sigilo bancário das pessoas identificadas nesse momento, conforme autorização judicial nos autos 5000201-37.2023.4.03.6124, os dados, em especial as movimentações das contas-correntes de THALITA MIRANDA ALCARAZ, foram analisados no Relatório de Análise de Polícia Judiciária (RAPJ) nº 492587/2024 (DOC. 2 anexo)2. A partir dessas informações, foi possível obter mais detalhes sobre o funcionamento da ORCRIM, além de apontada a participação de outros integrantes e novas vítimas dos crimes. Também foram solicitadas ao Setor de Segurança da CEF informações de outras contas objeto de fraude pelo mesmo grupo, sendo encaminhado, em resposta, o Ofício nº 38/2023/CEFRA/DF (DOC. 3 anexo)3. Ali, foram relacionadas diversas contas que foram abertas por meio de documentação falsa de beneficiários do INSS e identificados alguns envolvidos diretamente na abertura dessas contas. Segundo estimativa realizada pela CEF, “as operações de crédito nas modalidades Crédito Consignado, Antecipação de Crédito FGTS, Crédito CDC [...], vinculadas às 124 contas abertas com documentos falsos, somam aquantia de R$ 5.122.654,48”. Abre-se um parêntese, neste ponto, para registrar que foram identificados, ao menos, outros 18 (dezoito) procedimentos investigatórios perante a Polícia Federal no Estado de São Paulo instaurados para apurar crimes de estelionato envolvendo algum ou alguns dos membros da ORCRIM aqui desvendada (ID 321348441 - Pág. 32/33 – 5000466-05.2024.4.03.6124), o que demonstra a amplitude de sua atuação e sua estruturação ordenada para a prática de infrações penais. Alguns dos atingidos pelos ilícitos, todos aposentadas e/ou pensionistas, em sua maioria idosos e hipossuficientes, foram ouvidos e confirmaram as fraudes perpetradas contra eles (ID 321348441 - Pág. 76 e ss. – 5000466-05.2024.4.03.6124). [...] No curso das investigações ficou comprovada a existência de uma Organização Criminosa bem estruturada e articulada, especializada em perpetrar fraudes contra instituições financeiras, incluindo a Caixa Econômica Federal (CEF), em vários municípios do país, em sua maioria no Estado de São Paulo. O grupo criminoso opera por meio da utilização de documentos falsificados emitidos em nome de terceiros, geralmente beneficiários de algum tipo de prestação previdenciária, predominantemente idosos, os quais se encontram em condições de saúde debilitadas e são economicamente dependentes das pensões que recebem. Essa vulnerabilidade os torna alvos preferenciais e expõe a gravidade do impacto social dessas fraudes. Diante de todos os elementos apurados, foi possível dividir os membros da ORCRIM nos chamados “núcleos” de atuação, evidenciando a divisão de tarefas e a estrutura funcional do grupo, que se distribui da seguinte forma: [...] 2.2. NÚCLEO INTERMEDIÁRIO ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA WESLEY SILVIO BESSA VINICIUS GABRIEL VIEIRA DA ROCHA MARIA TAINARA SANTOS DE SOUSA TAINA CRISTINA DA SILVA CAIO DE JESUS CARDOSO ROSANA SANTOS DE JESUS O segundo núcleo, considerado intermediário, é integrado por aqueles que oferecem suas contas-correntes como de “contas de passagem”, para recebimento direto dos valores advindos dos empréstimos fraudulentos, depositados nas contas fraudulentas criadas pelos membros do primeiro núcleo, e posterior transferência para os membros de comando do grupo, integrantes do núcleo avançado. Os intermediários têm plena consciência da origem ilícita dos valores recebidos em suas contas, participando, assim, de forma direta e ativa no esquema criminoso. A presente denúncia se refere especificamente às condutas de parte dos membros deste núcleo criminoso, sendo outra parte denunciada em apartado (DENÚNCIA 04). [...] 3. OBJETO DA PRESENTE DENÚNCIA: NÚCLEO INTERMEDIÁRIO Feitas as considerações acima, passa-se a individualizar as condutas das pessoas que compõem o núcleo intermediário de atuação do grupo criminoso ora desvendado, demonstrando-se, de maneira individual e específica, a autoria de cada uma em relação ao crime previsto no artigo 2º da Lei nº 12.850/2013 (organização criminosa). [...) ] 3.1. ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS é integrante do núcleo intermediário da ORCRIM e atua, de forma consciente, fornecendo suas contas bancárias para movimentação dos valores advindos dos crimes e auxiliando na abertura de contas em agências bancárias mediante uso de documentos falsos. ANDREA é irmã de VANESSA DEMETRIO DE SÁ MACEDO, uma das integrantes de comando do grupo, com quem mantém proximidade. A denunciada também é mãe de EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ e sogra de TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA (ID 321346669 - Pág. 93/94 – 5000466-05.2024.4.03.6124), que serão tratados nos tópicos seguintes dessa peça. Conversa interceptada após autorização judicial reforça a autoria desta denunciada no esquema criminoso. Trata-se do registro 1733861996, em que EVELYN mantém conversa com interlocutora que a chama de filha, indicando se tratar da denunciada ANDREA, a respeito da prática de nova fraude para “levantar um dinheiro”, relacionada à abertura de conta em agência da CEF de Porto Ferreira/SP, sugerindo se tratar de “bom” lugar para a fraude. Trata-se de ação típica do modo de operação da organização criminosa, consistente na abertura de contas fraudulentas em agências da Caixa localizadas no interior do Estado de São Paulo. EVELYN afirma à mãe que, posteriormente, ela deveria retirar o “cartão de INSS” na residência de algum conhecido, especificamente com caixa de correio de modelo antigo apresentando documento (provavelmente falso), citando que fraude parecida teria sido praticada anteriormente por alguém denominado “VITOR”. Por fim, ANDREA menciona a EVELYN que tentou realizar “uns dez” (provavelmente outras dez fraudes) com outra mulher, mas apenas um deu certo. Assim como sua irmã VANESSA, a denunciada ANDREA recebeu da conta fraudulentamente criada em nome de Antonio Fernando Berardo, em 6 (seis) transações ocorridas entre 29/10/2021 e 25/11/2021, o total de R$ 13.165,00 (ID 322134126 - Pág. 3/4 – 5000466-05.2024.4.03.6124), sendo, portanto, também beneficiária direta do esquema criminoso desvendado. No mais, ANDREA foi presa em flagrante anteriormente, em 24/08/2014, ao tentar obter empréstimo consignado junto à CEF utilizando documentos falsos em nome de uma beneficiária do INSS, o que originou o IPL 680/2015-DELEFAZ/SR/RF/SP (ID 321350442 - Pág. 30/31 – 5000466-05.2024.4.03.6124), demonstrando que se dedica, ao menos há uma década, à prática de “golpes” dessa natureza. O procedimento citado deu origem à Ação Penal nº 0012278-07.2014.403.6181, em trâmite perante a 9ª Vara Criminal Federal de São Paulo, em que ANDREA foi condenada à pena de 03 (três) anos, 06 (seis) meses e 20 dias de reclusão, em regime aberto, por sentença proferida em 2018, já transitada em julgado, junto a outros dois indivíduos, como incursa nos artigos 171, §3° e caput e 171, §3° e caput c.c. art. 14, II, na forma do artigo 71, todos do Código Penal c.c. artigo 297, caput, na forma do artigo 69, ambos do Código Penal, pela utilização de documento falso e obtenção de empréstimos consignados na agência da CEF em Caieiras, em 28 e 29/08/2014, em nome de três beneficiários do INSS (ID 322891125 – 5000466-05.2024.4.03.6124). Portanto, os elementos de prova acima apontados demonstram que a denunciada ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS, de data inicial desconhecida, mas ao menos a partir do ano de 2021 até o dia 25/06/2024 (deflagração da fase ostensiva da operação), integrou pessoalmente organização criminosa voltada para a prática de reiterados crimes de estelionato contra instituições financeiras, incluindo a CEF, e inúmeros aposentados e pensionistas, auferindo elevadas quantias advindas das fraudes, praticando o crime do artigo 2º, caput, da Lei 12.850/2013. 3.2. EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ, filha da codenunciada ANDREA e sobrinha de VANESSA DEMETRIO DE SÁ MACEDO, também integra o núcleo intermediário do grupo criminoso. EVELYN também é parceira do codenunciado TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA e, junto a este e sua genitora ANDREA, atua em favor do esquema criminoso de forma consciente, fornecendo suas contas bancárias para movimentação dos valores advindos dos crimes e auxiliando na abertura de contas em agências bancárias mediante uso de documentos falsos. Neste sentido, na conversa interceptada sob registro de ID 173386199, EVELYN mantém conversa com interlocutora que a chama de filha, indicando se tratar de ANDREA, a respeito da prática de nova fraude para “levantar um dinheiro”, relacionada à abertura de conta em agência da CEF de Porto Ferreira/SP, sugerindo se tratar de “bom” lugar para a fraude. EVELYN afirma à mãe que, posteriormente, ela deveria retirar o “cartão de INSS” na residência de algum conhecido, especificamente com caixa de correio de modelo antigo apresentando documento (provavelmente falso), citando que fraude parecida teria sido praticada anteriormente por alguém denominado “VITOR”. Por fim, ANDREA menciona à EVELYN que tentou realizar “uns dez” (provavelmente outras dez fraudes) com outra mulher, mas apenas um deu certo. No mesmo contexto, dois dias antes do registro acima, foi captada conversa (ID 173030474) em que o denunciado TIAGO, parceiro de EVELYN, planeja junto a uma mulher não identificada a prática de fraude envolvendo benefício previdenciário e documento falso (“estudar RG”), possivelmente concretizada no dia 13/06/2024 em local próximo à Porto Ferreira/SP (ID 328852963 - Pág. 16/21 – 5000607-24.2024.4.03.6124), mesmo município citado por EVELYN na ligação citada anteriormente. EVELYN recebeu de THALITA MIRANDA ALCARAZ (núcleo avançado), aproximadamente, R$ 22.700,00, entre 26/08/2022 e 01/06/2023. A denunciada também recebeu da conta de Terezinha Demetrio de Sá, genitora de ANDREA e VANESSA, de 11/10/2022 a 13/06/2023, aproximadamente R$ 66.560,00, transferindo a ela o total de R$ 50.142,00 (ID 321346669 - Pág. 95/96 – 5000466-05.2024.4.03.6124). Ainda, na busca e apreensão judicialmente deferida na residência desta denunciada e seu esposo TIAGO (DOC. 4 anexo) foram arrecadados dois Iphones Pro Max (modelo 14 e 15), outros 2 (dois) telefones celulares e um veículo Audi Q3, ano 2016/2017, em nome de TIAGO. As diligências revelaram, ainda, que o imóvel, apesar de localizado em bairro de classe média baixa, foi recentemente reformado, contando com duas suítes grandes, área de lazer, sala de TV, cozinha ampla com armários planejados, TV 50" e eletrodomésticos de bom padrão, como geladeira duplex. Esse fato demonstra que a atividade ilícita dos denunciados tem se mostrado rentável. Nesse contexto, o padrão das movimentações bancárias e dos bens apreendidos é totalmente incompatível com as informações de renda de EVELYN, considerando que não foram localizados vínculos empregatícios em seu nome, bem como que a investigada consta como beneficiária de auxílio emergencial (ID 321346669 - Pág. 97 – 5000466- 05.2024.4.03.6124). Tratam-se, portanto, de produtos advindos dos crimes praticados. Desta forma, os elementos de prova acima apontados demonstram que a denunciada EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ, de data inicial desconhecida, mas ao menos a partir do ano de 2021 até o dia 25/06/2024 (deflagração da fase ostensiva da operação), integrou pessoalmente organização criminosa voltada para a prática de reiterados crimes de estelionato contra instituições financeiras, incluindo a CEF, e diversos aposentados e pensionistas, auferindo elevadas quantias advindas das fraudes, incorrendo, portanto, na conduta típica descrita no artigo 2º, caput, da Lei 12.850/2013. 3.3. TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA, conforme citado, atua junto à sua parceira EVELYN em favor do esquema criminoso, de forma consciente, fornecendo suas contas bancárias para movimentação dos valores advindos dos crimes e auxiliando na abertura de contas em agências bancárias mediante uso de documentos falsos. Conversas interceptadas após autorização judicial apontam que TIAGO e EVELYN planejaram a prática de fraude envolvendo abertura de conta e benefício previdenciário, possivelmente concretizada em agência bancária da CEF na cidade de Porto Ferreira/SP (ID 328852963 - Pág. 16/21 e 24/27 – 5000607-24.2024.4.03.6124). Cite-se, neste sentido, a ligação de registro 17303047410, por meio da qual o denunciado TIAGO conversa com interlocutora que chama de “tia”,11 planejando encontrá-la na manhã do dia seguinte em local referenciado como “Dom Bosco” para entregá-la uma colinha relacionada à “benefício”, mencionando que ela deveria “estudar” o “RG” e o “comprovante” pessoalmente. Na manhã do dia seguinte à ligação (13/06/2024), a ERB do celular de TIAGO estava próxima à localização da estação de metrô Dom Bosco, em São Paulo/SP (ID 328852963 - Pág. 6). Em paralelo, no mesmo dia 13/06/2024, o terminal que manteve a citada conversa com TIAGO registrou localizações de ERB, a partir das 10h, em Limeira/SP, se deslocando próximo a Porto Ferreira/SP (mesma cidade citada por EVELYN em conversa captada um dia depois – ligação de ID 173386199) perto das 12h e retornando à São Paulo/SP por volta das 15h (ID 329260116 - Pág. 17/19 – 5000607-24.2024.4.03.6124). Poucos dias após, TIAGO manteve conversa com a mesma interlocutora (registro 17442357412) informando que conseguiu desbloquear determinado cartão e que até as oito horas da manhã chegaria uma senha para “tia”. Ainda, foram identificadas diversas transações bancárias de altos valores, sem origem comprovada, entre o denunciado TIAGO e outras integrantes ligadas ao comando/topo da organização criminosa. Neste sentido, entre 19/08/2022 e 12/06/2023, TIAGO recebeu das contas de THALITA MIRANDA ALCARAZ, aproximadamente, R$ 230.830,00, enviando àquela investigada a quantia aproximada de R$ 81.900,00. O denunciado também recebeu de Terezinha Demetrio de Sá, genitora de ANDREA E VANESSA, entre 01/08/2022 e 27/04/2023, aproximadamente R$ 100.600,00, enviando a ela o total de R$ 53.948,93 (ID 321346669 - Pág. 88/93 e 96 – 5000466-05.2024.4.03.6124). Tratam-se de valores advindos dos crimes praticados. [...] Nesse contexto, o padrão das movimentações bancárias e dos bens apreendidos é totalmente incompatível com as informações de renda de TIAGO, considerando que ele não declarou receitas ao Fisco nos anos de 2022, 2023 e 2024 (DOC. 5 anexo), além de que não foram localizados vínculos empregatícios recentes ou empresas em seu nome e que ele consta como beneficiário de auxílio emergencial (DOC. 6 anexo). Vale destacar que o denunciado possuía dois veículos simples (GM Corsa antigo e VW Gol) e, exatamente no período de operação da ORCRIM, adquiriu um Audi Q3. Tratam-se, portanto, de produtos advindos dos ilícitos praticados. Desta forma, os elementos de prova acima apontados demonstram que o denunciado TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA, de data inicial desconhecida, mas ao menos a partir do ano de 2021 até o dia 25/06/2024 (deflagração da fase ostensiva da operação), integrou pessoalmente organização criminosa voltada para a prática de reiterados crimes de estelionato contra instituições financeiras, incluindo a CEF, e diversos aposentados e pensionistas, auferindo elevadas quantias advindas das fraudes, incorrendo, portanto, na conduta típica descrita no artigo 2º, caput, da Lei 12.850/2013. 3.4. WESLEY SILVIO BESSA WESLEY SILVIO BESSA é sobrinho de RITA DE CASSIA BESSA (núcleo avançado), com quem reside, e atua no esquema criminoso desenvolvido fornecendo suas contas-correntes para os membros de alto escalão para recebimento e repasse de valores advindos dos ilícitos praticados. Este denunciado figura como investigado/envolvido em, ao menos, 7 (sete) inquéritos policiais com a finalidade de apurar crimes de estelionato qualificados contra a CEF, praticados com o mesmo modus operandi dos narrados anteriormente. Em todos os procedimentos, WESLEY foi identificado como beneficiário de parte dos valores provenientes dos empréstimos consignados realizados mediante uso de documentos falsos em nome das vítimas (ID 321346669 - Pág. 111/114 – 5000466-05.2024.4.03.6124). São eles: a) 2022.0016203 – DPF/CAS/SP (PJe 5001339-76.2022.4.03.6123): investiga a abertura de conta mediante documentos falsos em nome de Renato Brandão Cruz Filho e contratação de empréstimo no valor de R$ 35.144,50, no dia 16/12/2021. Após, foram realizadas transferências para vários destinatários, dentre eles WESLEY; b) 2022.0073401 – DPF/SJK/SP (PJe 5000218-39.2023.4.03.6103): apura a abertura de conta em nome de diversos beneficiários do INSS mediante uso de documento falso. WESLEY foi beneficiário de transferências advindas de algumas dessas contas; c) 2022.0037704 – DPF/RPO/SP (PJe 5004041-58.2022.4.03.6102): apura a abertura de conta com documento falso em nome de Juliana Bongiovani Diniz Chiga e contratação de empréstimos consignados com posterior transferência de valores para vários destinatários, dentre eles WESLEY e sua tia RAMISSAYANE STHEFANY DA SILVA BESSA (irmã de RITA DE CASSIA BESSA). A advogada Neusa Schneider14 (OAB/SP 149.438) atua na defesa desses investigados neste procedimento; d) 2022.0026091 – DPF/AQA/SP (PJe 5000987-45.2022.4.03.6115): apura a abertura de conta-corrente mediante uso de documento falso em nome da aposentada Célia Isabel Gardim Ghizzi e obtenção de empréstimo fraudulento. Novamente, WESLEY consta como beneficiário de parte dos valores depositados nessa conta; e) 2022.0069677 – DPF/BRU/SP: investiga a abertura de conta mediante de documento falso em nome de beneficiário do INSS e contratação de empréstimo consignado. WESLEY foi beneficiário de parte dos valores desviados. A advogada Neusa Schneider atuou neste procedimento em defesa de SABRINA BESSA DOS SANTOS, parente daquele denunciado e também beneficiária de parte dos valores obtidos com o ilícito. f) 2022.0062902 – DPF/RPO/SP: investiga a abertura de conta em nome da vítima Jeanne Batista Pinheiro para transferência de recebimento do benefício previdenciário para essa conta e contratação de dois empréstimos consignados fraudulentos. WESLEY também foi destinatário de parte dos valores advindos desta fraude. g) 2022.0066518 – DPF/AQA/SP: apura a abertura de conta em nome da vítima Denise Mecunhe Rosa para transferência de recebimento do benefício previdenciário para essa conta e contratação de dois empréstimos consignados fraudulentos. WESLEY recebeu R$ 79.321,22 em sua conta, advindos desta fraude. Somente em decorrência das fraudes contra aposentados/pensionistas identificadas e levantadas pela CEF, a conta de WESLEY recebeu o total de R$ 211.097,02 (Ofício nº 38/2023/CEFRA/DF - ID 322134146 - Pág. 28 – 5000466-05.2024.4.03.6124). As diligências obtidas após o cumprimento das buscas e apreensões revelaram que WESLEY reside no mesmo imóvel que RITA DE CÁSSIA BESSA, uma das chefes da ORCRIM, onde foram localizados e apreendidos diversos documentos relacionados as práticas delitivas narradas (DOC. 7 anexo)15. Portanto, os elementos de prova acima apontados demonstram que o denunciado WESLEY SILVIO BESSA, de data inicial desconhecida, mas ao menos a partir do ano de 2021 até o dia 25/06/2024 (deflagração da fase ostensiva da operação), integrou pessoalmente organização criminosa voltada para a prática de reiterados crimes de estelionato contra instituições financeiras, incluindo a CEF, e diversos aposentados e pensionistas, auferindo elevadas quantias advindas das fraudes, incorrendo, assim, na conduta típica descrita no artigo 2º, caput, da Lei 12.850/2013. Em 04.11.2024 o juízo de origem revogou a prisão preventiva de EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SA e WESLEY SILVIO BESSA, fixando, em substituição, outras medidas cautelares (ID 312634346). A sentença foi publicada em 17.12.2024. (ID 312634364) Em seu recurso (ID 312634374), a defesa de WELSEY pede a sua absolvição com base no art. 386, VII, do Código de Processo Penal, argumentando que a condenação foi baseada unicamente em prova colhida na fase investigatória, em ofensa ao disposto no art. 155 do Código de Processo Penal. Caso mantida a condenação pede: i) a fixação da pena-base no mínimo legal; ii) o reconhecimento da circunstância atenuante da confissão espontânea (CP, art. 65, III, “d”) ; iii) o reconhecimento da circunstância atenuante da menoridade (CP, art. 65, I – nascido em 15.05.2002); iv) a fixação do regime inicial aberto para cumprimento da pena privativa de liberdade. Foram apresentadas contrarrazões (ID 312634383). Ao interpor o recurso de apelação, a defesa de ANDREA requereu a apresentação das suas razões nos termos do art. 600, § 4º, do Código de Processo Penal. Nestas (ID 312772705), pede, preliminarmente, a revogação do mandado de prisão expedido. No mérito, pede a sua absolvição pela aplicação do princípio da insignificância e por não haver prova da existência de vínculo com a organização criminosa. Caso mantida a condenação, pede: i) a fixação da pena-base no mínimo legal; ii) a fixação do regime semiaberto para início do cumprimento da pena privativa de liberdade; iii) a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita. Em cumprimento à decisão proferida no Habeas Corpus nº 5033888-10.2024.4.02.0000, de minha relatoria, foi expedido alvará de soltura em favor de TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA, o qual foi cumprido em 06.02.2025 (ID 314391770). A defesa conjunta de EVELYN e TIAGO ao interpor o recurso de apelação requereu a apresentação das suas razões nos termos do art. 600, § 4º, do Código de Processo Penal. Nestas (ID 314391769), pede, preliminarmente, seja decretada a nulidade da sentença em razão da incompetência do juízo ou, se afastada, que seja reconhecida a nulidade das provas produzidas por meio do afastamento do sigilo das comunicações telefônicas e telemáticas ou, ainda, que seja oferecido ANPP. Quanto ao mérito das imputações, pede que os apelantes sejam absolvidos (i) por inexistência de prova do crime de participação em organização criminosa; (ii) não comprovação de dolo e (iii) atipicidade das condutas. Subsidiariamente, pede a fixação da pena-base no mínimo legal; sejam suas participações nos crimes consideradas de menor importância; o desconto do tempo de prisão provisória e a fixação do regime inicial aberto para cumprimento da pena privativa de liberdade e a substituição desta por penas restritivas de direitos, mantendo-se a liberdade provisória. Pedem, ainda, a concessão da gratuidade de justiça com a isenção no pagamento da multa. A Procuradoria Regional da República opinou pelo desprovimento dos recursos (ID 315062861). É o relatório. À revisão. PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 11ª Turma APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 5000872-26.2024.4.03.6124 RELATOR: Gab. 40 - DES. FED. NINO TOLDO APELANTE: ANDREA DEMETRIO DE SA SANTOS, EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SA, TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA, WESLEY SILVIO BESSA Advogado do(a) APELANTE: CLEMERSON MISAEL DOS SANTOS - SP317298-A Advogado do(a) APELANTE: WELLINGTON SILVA CAMPOS - SP438093-A Advogado do(a) APELANTE: CESAR RENATO FLORINDO - SP405260-A APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NINO TOLDO (Relator): Trata-se de apelações interpostas por ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS, EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ, TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA e WESLEY SILVIO BESSA em face da sentença que, no âmbito da denominada Operação Anonymous, os condenou pela prática do crime de organização criminosa (art. 2º, caput, da Lei 12.850/2013). Inicialmente, anoto que a ausência de contrarrazões pela acusação não implica nulidade (CPP, art. 565), conforme pacífico entendimento desta Turma: ApCrim nº 001596-27.2016.4.03.6102, Rel. Des. Federal Nino Toldo, j. 28.7.2023, Publicação 02.8.2023; ApCrim nº 0004816-12.2009.4.03.6104, Rel. Des. Federal Nino Toldo, j. 31.3.2023, Publicação 10.4.2023; ApCrim nº 0003067-39.2018.4.03.6105, Rel. Des. Federal José Lunardelli, j. 09.02.2024, Publicação 15.02.2024; ApCrim nº 0003067-39.2018.4.03.6105, Rel. Des. Federal José Lunardelli, j. 09.02.2024, Publicação 15.02.2024. Incompetência do juízo A defesa comum de EVELYN e TIAGO alega, preliminarmente, a incompetência da 1ª Vara Federal de Jales para processar e julgar o feito, argumentando que a competência deve ser definida pelo local de domicílio da vítima, nos termos do art. 70, § 4º do Código de Processo Penal. Por isso, pede seja reconhecida a nulidade da sentença, remetendo-se os autos ao "Juízo Federal da Comarca de Guarujá" [sic]. Sem razão. O art. 70, § 4º, do Código de Processo Penal (CPP) dispõe: Art. 70. A competência será, de regra, determinada pelo lugar em que se consumar a infração, ou, no caso de tentativa, pelo lugar em que for praticado o último ato de execução. [...] § 4º Nos crimes previstos no art. 171 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal ), quando praticados mediante depósito, mediante emissão de cheques sem suficiente provisão de fundos em poder do sacado ou com o pagamento frustrado ou mediante transferência de valores, a competência será definida pelo local do domicílio da vítima, e, em caso de pluralidade de vítimas, a competência firmar-se-á pela prevenção. (Incluído pela Lei nº 14.155, de 2021) A Justiça Federal de Jales era competente para processar e julgar a ação penal, pois não se trata, no caso da hipótese prevista no § 4º do art. 70 do CPP. A propósito, destaco o seguinte trecho do parecer da Procuradoria Regional da República (ID 315062861): Todavia, deve ser rejeitada a alegação de incompetência da Justiça Federal, pois a investigação se iniciou para apurar notícia encaminhada pela agência da CEF de Auriflama, no sentido de que um terceiro então não identificado, no dia 13/07/2022, promoveu a abertura de conta-corrente naquela agência em nome de Antônio Carlos dos Santos (CPF nº 038.607.988-98), residente em Guarujá/SP, efetuando a transferência fraudulenta do benefício previdenciário da vítima e a contratação de empréstimos consignados para desconto no referido benefício, sendo que a conduta investigada configura estelionato qualificado contra a Caixa Econômica Federal. Assim, aplicando a regra prevista no caput do artigo 70 do Código Penal, tem-se que o Juízo da 1ª Vara Federal de Jales é o competente para o processamento do feito, visto que o crime foi consumado no momento da obtenção da vantagem ilícita, que ocorreu na cidade de Auriflama/SP. Portanto, tendo se consumado o crime no momento da obtenção da vantagem ilícita, a regra aplicável é a do do art. 70, caput, do CPP. Observo, por oportuno e para fins didáticos, que não existem comarcas na Justiça Federal e a cidade de Guarujá encontra-se na jurisdição da Subseção Judiciária de Santos. Rejeito, enfim, a preliminar de incompetência da 1ª Vara Federal de Jales. Nulidade das provas: afastamento do sigilo das comunicações telefônicas A defesa comum de EVELYN e TIAGO também pede a declaração de nulidade das provas obtidas por meio do afastamento do sigilo das comunicações telefônicas e telemáticas. Sem razão. O caso concreto em exame reflete, de forma clássica, aquelas situações em que a medida excepcional da interceptação das comunicações telefônicas mostra-se imprescindível para a obtenção da prova. No curso das investigações ficou comprovada a existência de uma organização criminosa estruturada e articulada, especializada em efetuar fraudes contra instituições financeiras, inclusive a Caixa Econômica Federal (CEF), em vários municípios do país, em sua maioria no estado de São Paulo, tendo sido deferido pelo juízo competente o afastamento do sigilo das comunicações telefônicas e telemáticas, bem como a interceptação telefônica dos terminais relacionados às pessoas investigados identificadas, nos autos de Interceptação Telefônica nº 5000607-24.2024.4.03.6124, com observância de todas as garantias constitucionais (princípios do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório). Portanto, rejeito a alegação de nulidade. Princípio da insignificância A defesa de ANDREA pede a sua absolvição pela aplicação do princípio da insignificância, argumentando que os valores movimentados na sua conta são ínfimos quando comparados às quantias movimentadas pelos demais envolvidos (R$ 13.165,00). Sem razão. Não é aplicável o princípio da insignificância em crime de organização criminosa, pois o bem jurídico tutelado é a fé pública e, segundo jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça (STJ), esse princípio não se aplica a crimes dessa natureza. Nesse sentido: PENAL E PROCESSO PENAL. ESTELIONATO PREVIDENCIÁRIO. ARTIGO 171, §3º, DO CP. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. TESE DE QUE A NATUREZA PERMANENTE DO DELITO IMPEDE O RECONHECIMENTO DA CONTINUIDADE DELITIVA. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. Na hipótese dos autos, não é possível o reconhecimento do princípio da insignificância, já que o acórdão impugnado encontra-se em consonância com o entendimento desta Corte Superior, consolidado no sentido de que, no delito tipificado no art. 171, § 3º, do Código Penal, não se aplica o princípio da insignificância, "uma vez que a conduta ofende o patrimônio público, a moral administrativa e a fé pública, bem como é altamente reprovável" (RHC n. 61.931/RS, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, Quinta Turma, DJe 15/2/2016) (AgRg no HC n. 913.137/DF, de minha relatoria, Quinta Turma, julgado em 16/9/2024, DJe de 18/9/2024.). 2. A tese de que a natureza permanente do crime de Estelionato Previdenciário obsta o reconhecimento da continuidade delitiva não foi objeto de debate pela instância ordinária, o que inviabiliza o conhecimento do recurso especial por ausência de prequestionamento. Incide ao caso a Súmula n. 282/STF. 3. Agravo regimental não provido. (AgRg no AgRg no AREsp n. 2.747.808/MG, Quinta Turma, Relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, j. 27.11.2024, DJEN de 04.12.2024) PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. INSERÇÃO DE ASSINATURA FALSA EM DOCUMENTO PÚBLICO CARACTERIZA O DELITO DO ART. 297 DO CP. NÃO CABIMENTO DA DESCLASSIFICAÇÃO PARA FALSIDADE IDEOLÓGICA. NÃO INCIDÊNCIA DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA EM CRIMES CONTRA A FÉ PÚBLICA. PRECEDENTE. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. A inserção de assinatura falsa em documento público ou particular caracteriza ilícito material de perigo abstrato e prescinde de resultado concreto ou de finalidade específica (dolo). Precedente. 2. O princípio da insignificância não é aplicado aos delitos cujo bem tutelado seja a fé pública. Precedente. 3. Agravo regimental não provido. (AgRg no AREsp 1134866/SP, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 10/08/2021, DJe 16/08/2021) Portanto, rejeito a pretensão de aplicação do princípio da insignificância ao caso. Acordo de não persecução penal (ANPP) A defesa comum de EVELYN e TIAGO, em suas razões de apelação, alega que o não oferecimento de ANPP, desacompanhado de motivação idônea, constitui nulidade absoluta e, em razão disso, pede a declaração de nulidade processual desde a negativa do Ministério Público Federal (MPF) em oferecê-lo. Pois bem. O ANPP pode ser celebrado entre o Ministério Público e o autor do delito desde que atendidos os requisitos expressamente previstos no art. 28-A, caput, do Código de Processo Penal, ou seja, (i) confissão formal e circunstanciada por parte do acusado, (ii) infração penal cometida sem violência ou grave ameaça, (iii) com pena mínima inferior a 4 (quatro) anos e (iv) que a medida a ser aplicada seja necessária e suficiente para reprovação e prevenção do crime. Trata-se de instituto resultante de acordo de vontades entre o Ministério Público e o imputado e sua defesa, objetivando dar solução negociada a casos cuja origem sejam crimes de menor gravidade. No caso, o MPF, ao oferecer a denúncia, deixou de propor ANPP pelos seguintes motivos (ID 312633703): Deixo de propor o benefício do Acordo de Não Persecução Penal – ANPP (artigo 28-A, do Código de Processo Penal) aos denunciados, uma vez que o acordo não afigura-se suficiente à reprovação e prevenção do crime. Tratase de infração penal altamente gravosa – Organização Criminosa – prevista em tratados e convenções internacionais como infração a que o Brasil se comprometeu a punir de maneira efetiva. Além disso, foi cometida em concurso com inúmeros estelionatos qualificados (art. 171, § 3º, do Código Penal), o que suplantaria o requisito de pena mínima de 4 (quatro) anos, e que causou prejuízos milionários, em especial a idosos e pessoas vulneráveis. A defesa requereu a intimação do MPF para oferecer proposta de ANPP (ID 312633782) e o MPF reiterou sua manifestação pelo não cabimento do benefício (ID 312633791). Ante essa recusa em oferecer (de forma motivada) o ANPP, os acusados (por sua defesa técnica) tinham o direito de requerer a remessa dos autos ao órgão superior do Ministério Público, nos termos do § 14 do art. 28-A do Código de Processo Penal. Todavia, não o fizeram, conforme se depreende do exame dos autos, tendo ocorrido a preclusão. Além disso, a jurisprudência firmou-se no sentido de que o ANPP não constitui direito subjetivo do acusado, podendo ser proposto pelo Ministério Público quando considerar necessário e suficiente à reprovação e prevenção da infração penal, o que não se verificou no caso. Nesse sentido: STF, HC nº 195.725/SP, Rel. Ministro Alexandre de Moraes, decisão monocrática proferida em 28.01.2021, publicada em 01.02.2021 e transitada em julgado em 12.02.2021. Portanto, a pretensão ao ANPP foi alcançada pela preclusão, razão pela qual não acolho o pedido. Mérito da imputação ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS A defesa de ANDREA pede a sua absolvição, argumentando que foram realizados apenas alguns depósitos em sua conta, em curto intervalo de tempo, o que não configura a estabilidade e a permanência exigidas para a tipificação do crime de organização criminosa. Sem razão. ANDREA é irmã de Vanessa Demetrio de Sá Macedo (apontada como integrante do núcleo avançado, alto escalão da organização criminosa), mãe de EVELYN e sogra de TIAGO. Integrava o núcleo intermediário da organização criminosa, fornecendo sua conta bancária para a movimentação de valores obtidos a partir da abertura de contas com uso de documentos falsos e tendo, desse modo, plena consciência da origem ilícita dos valores que passavam na sua conta. Nas alegações finais que apresentou ao juízo, o MPF transcreveu trechos de uma conversa interceptada (com autorização judicial) que reforçam a participação da acusada na prática criminosa. Além disso, em seu interrogatório em juízo, ela declarou apenas que desconhecia essas conversas, mas confirmou que Elcio Gonçalves dos Santos é seu esposo e o terminal de onde partiram essas conversas está registrado em seu nome. Destaco, sobre isso, o seguinte trecho das alegações finais (ID 312634358): Conversa interceptada após autorização judicial reforça participação desta acusada no esquema criminoso. Trata-se do registro 1733861992 , mantido entre as corrés EVELYN (TMC 11 96970-0480) e ANDREA (TMC 11 96070-2799). Abre-se um parêntese para registrar que o terminal 11 96070-2799 está registrado em nome de Elcio Goncalves dos Santos (CPF 308.118.578-59), esposo de ANDR EA , conforme confirmado por ela em interrogatório nesta ação (ID 343998818 - aos 00m55s), o que corrobora por definitivo que era utilizado por esta acusada na oportunidade do registro. O assunto da citada conversa refere-se à prática de nova fraude para “levantar um dinheiro”, relacionada à abertura de conta em agência da CEF de Porto Ferreira/SP, que EVELYN sugere se tratar de “bom” lugar para a fraude. Trata-se, como visto, de ação típica do modo de operação da organização criminosa, consistente na abertura de contas fraudulentas em agências da Caixa localizadas no interior do Estado de São Paulo. No registro, ainda, EVELYN afirma à mãe que, posteriormente, ela deveria retirar o “cartão de INSS” na residência de algum conhecido, especificamente com caixa de correio de modelo antigo apresentando documento (provavelmente falso), citando que fraude parecida teria sido praticada anteriormente por alguém denominado “VITOR”. Por fim, ANDREA menciona a EVELYN que tentou realizar “uns dez” (provavelmente outras dez fraudes) com outra mulher, mas apenas um deu certo. Segue o registro captado, na íntegra: Alvo: EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ Nº Interceptado: (11)96970-0480 Assunto: Evelyn X MNI Mãe (Andrea) - Conversa sobre possível fraude na Caixa Nº Contato: (11) 96070-2799 ID: 173386199 Data: 14/06/2024 18:30:18 Duração: 00:15:0 Arquivo: 01_19_173386199_20240614183018_20366507 Tipo: Áudio Degravação: MNI: Oi agora posso falar, Não, é porque assim, eu uso o aplicativo, está no meu celular. Aí eu falo com vocês pelo do Kinder. Mas aí quando a gente chega no lugar que a gente dispensa a abertadoria, aí eu pego o celular do Kinder, põe no GPS para até encontrar um produto para a gente pegar novamente, entendeu? Ai eu não posso usar nenhum dos dois… EVELYN: Então.. (inaudível) para falar com o povo MNI: Não, é então, eu estou com o telefone lá para me passar o meu zap para o outro telefone... é, porque eu tenho que andar com três telefones, não tem jeito. (…) [00:11:07:138] Evelyn: Por falar nisso, não tem nenhum documento do velho pronto que você possa levar? MNI: Não ele foi viajar e ele não quer trabalhar mais né filha EVELYN: Porque tem um caixa boa em Porto Feliz.. Em Porto Ferreira.. Pra senhora levantar hoje, só pra levantar um dinheiro.. você faz no caixa aqui, depois vai na agência MNI: Ah, nem precisa abrir conta? EVELYN: Não, você abre a conta no caixa aqui, aí depois de três dias chega a mensagem, você vai na agência e pode assinar e põe a senha. MNI: Aham. E está dando dinheiro isso aí? EVELYN: Tá, e o cartão tem que chegar em qualquer endereço da cidade, você não pode pegar no correio nem no banco. Aí você pega, aí tem que você olha no Google Maps, uma casa que tem aquele carteiro antigo, um correio antigo, sabe, colocar a carta? mas aqueles antigos que você consiga abrir. Aí põe lá dentro e você passa e pega na casa da pessoa mesmo MNI: Aham, ave essa parte é arriscada EVELYN: Mas aí você geralmente faz amizades com as pessoas, eu nunca peguei, quem pegou foi VITOR, ai ele fez a amizade com uma mulher lá e a mulher lá foi e entregou para ele MNI: Tem que ter sangue, porque eu não tenho. EVELYN:É o funcionário que faz isso doida, não é você não tem que ir para o documento, tipo se a pessoa perguntar " Ah, mas e seu nome?", ai "Tá aqui meu documento para você ver que sou eu mesmo, é porque meu cartão (inaudível), acabei de me aposentar, então pensa, eu to sem cartão e até eles trocar eles falaram que demora até trinta dias para chegar... que foi um erro de digitação dele", ai o velho que fala, não é você... MNI: Ata, que susto EVELYN: Ai como geralmente os velhos fazem amizade com outros velhos ai acaba dando.. você sabe que é cartão de INSS ta no nome da pessoa, mostra o documento, entendeu? MNI: Então não, é se voce ta com o documento e prova para pessoa que você é você, não tem problema EVELYN: Então se a senhora tivesse a senhora poderia fazer MNI: É mas não tenho e ele foi viajar EVELYN: Até aquela sua velha burra daria para fazer MNI: Ah deus me livre... não tenho paciência para ela não EVELYN: Não faz nada, ela só senta na mesa a mulher faz tudo lá, espera chega a mensagem, com três dias chega, vai na agência, só assina e pronto… MNI: Ah não, mas ela é uma pessoa muito negativa... No entanto que eu fiz uns dez com ela deu um só. ANDREA recebeu R$ 13.165,00 (treze mil cento e sessenta e cinco reais) de uma conta fraudulenta criada por Daniel Marcelino (integrante do núcleo base) e VANESSA, sua irmã, também recebeu dinheiro dessa conta. Declarou em juízo que esse dinheiro havia sido pagamento pela venda de mercadorias do seu restaurante, que encerrou as atividades durante a pandemia de Covid-19, mas não soube explicar por que sua irmã também recebera dinheiro da mesma pessoa. Consta dos autos a transcrição de uma conversa com uma mulher não identificada, que a orientou a “não sair do buraco”, ou seja, para que permanecesse foragida. Destaco da sentença o seguinte trecho (ID 312634364): A conversa interceptada nos autos nº 5000607-24.2024.403.6124, referente à conversa mantida após a deflagração da operação entre ANDREA e a interlocutora que a orienta a “não sair do buraco”, corrobora os indícios de que ANDREA é integrante da organização criminosa e mantém relação com os demais membros da organização, como se observa na íntegra do registro, extraído do Auto Circunstanciado 02 (ID 339389916): Alvo: ANDREA DEMETRIO DE SA Nº Interceptado: (11)96070-2799 Assunto: Andrea X MNI - Ta tudo com prova / Vanessa entra com pedido que ela tá grávida / Ta todo mundo na mesma cela Nº Contato: (11)97340-8340 ID: 174759445 Data: 25/06/2024 16:18:46 Duração: 00:03:43 Arquivo: 01_125_174759445_20240625161846_20367982 Tipo: Áudio Degravação: MNI: Ai então amiga, tá assim né, o que eu te relatei é o que é, é a sua mãe, você, a talita e a vanessa ai tem os intermediarios que é o gabriel a milena, tem esse menino da caixa e é isso Andrea: E esse negócio de conta ai é, foi a movimentação de transferências MNI: Tudo com prova, tudo com provas... As fotos em rede social... É melhor você ficar no buraco mesmo Andrea: Meu deus do céu e ninguém vai ter audiência hoje né? MNI: Então pode ser que já esteja até tendo… Interrogada em Juízo, ANDREA negou os fatos imputados na denúncia (cf. ID 343998815), que não integra nenhum esquema para a prática de crimes e não possui proximidade com sua irmã VANESSA. Indagada sobre os valores recebidos em sua conta-corrente, entre 29/10/2021 e 25/11/2021, alegou que foram decorrentes da venda das “coisas” que guarneciam o restaurante da interrogada, que faliu na pandemia, para um “rapaz”; não soube explicar, contudo, porque sua irmã VANESSA também recebeu valores daquela conta. Confirmou que é casada com Elcio Gonçalves dos Santos. Sobre a conversa com EVELYN, para levantar dinheiro, afirmou que desconhece a conversa e que não mantém proximidade com EVELYN e nem com TIAGO. A versão apresentada pela ré de que não mantém proximidade com EVELYN e TIAGO se infirma diante da conversa interceptada, na qual restou demonstrado que tratavam de novo esquema fraudulento, a ser praticado em face da agência da CEF de Porto Ferreira/SP. Restou comprovado ainda que entre os membros do grupo criminoso havia uma divisão de tarefas, sendo que a ré, membro do núcleo intermediário, fornecia suas contas como “contas de passagem”, além de receber os valores advindos das fraudes e repassava-os para o comando da organização. A ciência a respeito da prática de atos ilícitos também é inequívoca, consoante o teor das conversas interceptadas. Por conseguinte, diante de todo o explanado, entendo que houve in casu a incidência da norma penal incriminadora aventada na denúncia, pois a ré, de data inicial desconhecida, mas ao menos a partir do ano de 2021 até o dia 25/06/2024 (deflagração da fase ostensiva da operação), integrou pessoalmente organização criminosa voltada para a prática de reiterados crimes de estelionato em face de instituições financeiras, notadamente a CEF. Portanto, tenho por provado que a apelante integrava organização criminosa voltada à prática de crimes de estelionato contra instituições financeiras, dentre as quais a CEF, e, por isso, mantenho a condenação de ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS pela prática do crime previsto no art. 2º, caput, da Lei nº 12.850/2013, nos termos da denúncia. EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ e TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA Examino em conjunto a situação desses dois apelantes, que têm defesa comum, a qual pede sejam eles absolvidos porque, segundo alega, “em nenhum momento ficou comprovado que os valores movimentados nas contas dos apelantes foram originários das contas abertas de forma ilegal” e não estão presentes os requisitos necessários para caracterização de organização criminosa, principalmente pela ausência de estabilidade e permanência. Sem razão, contudo. EVELYN é filha da corré ANDREA e parceira do corréu TIAGO, bem como sobrinha de Vanessa Demétrio de Sá Macedo, tendo fornecido conscientemente suas contas bancárias para movimentação de valores obtidos por meio de fraudes. Ouvida em juízo, ela declarou que não tinha muito contato com a sua mãe, pois fora criada por sua tia (Vanessa), e que os valores que recebia da sua tia referiam-se ao seu trabalho como cuidadora do seu bisavô. Em relação à conversa sobre a fraude na agência da CEF em Porto Ferreira, simplesmente alegou que desconhecia isso. Contudo, destaco da sentença o seguinte trecho (ID 31263434364): A materialidade restou comprovada pelas conversas interceptadas nos autos nº 5000607-24.2024.403.6124, registro nº 173386199, dando conta de que EVELYN mantém conversa com sua mãe ANDREA, a respeito de uma nova fraude, para “levantar um dinheiro”, com a abertura de conta na agência da CEF de Porto Ferreira/SP. Pelo teor da conversa, percebe-se que EVELYN orienta ANDREA como deveria proceder para retirada do cartão do INSS, citando que a fraude teria sido praticada antes por uma pessoa de nome “VITOR”. Apurou-se, ainda, que EVELYN recebeu de THALITA MIRANDA ALCARAZ (núcleo avançado), aproximadamente, R$ 22.700,00, entre 26/08/2022 e 01/06/2023. A acusada também recebeu da conta de Terezinha Demetrio de Sá, movimentada por VANESSA, de 11/10/2022 a 13/06/2023, aproximadamente R$ 66.560,00, transferindo a ela o total de R$ 50.142,00 (ID 321346669 - p. 95/96 – 5000466-05.2024.4.03.6124). No cumprimento do mandado de busca e apreensão deferido pelo Juízo, nos autos nº 5000466-05.2024.4.03.6124, foram apreendidos dois Iphones Pro Max (modelo 14 e 15), outros 2 (dois) telefones celulares e um veículo Audi Q3, ano 2016/2017, em nome de TIAGO, esposo de EVELYN. As diligências realizadas na residência revelaram que o imóvel onde EVELYN reside com seu esposo foi recentemente reformado e possui móveis de alto padrão. Além disso, como destacou o MPF, o padrão das movimentações bancárias de EVELYN e dos bens apreendidos destoam das informações de sua renda, pois não foram encontrados vínculos empregatícios em seu nome, tão somente que fora beneficiária de auxílio emergencial (cf. ID 321346669, p. 97 dos autos nº 5000466-05.2024.4.03.6124). A Ré EVELYN, interrogada em Juízo, negou a imputação, afirmou que não mantém contato com sua mãe ANDREA e desconhece a conversa sobre nova fraude na agência da CEF em Porto Ferreira. Alegou que foi criada por sua tia VANESSA e era quem ajudava financeiramente a ré e seu bisavô. Que o dinheiro enviado para sua conta era porque cuidava de seu bisavô. Sobre o dinheiro recebido de THALITA declarou que, como VANESSA e THALITA eram sócias, recebeu o dinheiro de THALITA como ajuda de VANESSA. Indagada sobre o padrão de vida identificado, informou que ela e o marido TIAGO recebiam ajuda financeira da família do marido. Não é crível a versão apresentada por EVELYN de que recebia ajuda financeira de VANESSA para cuidar de seu bisavô, pois os registros das conversas interceptadas demonstram que a ré atuava conscientemente na organização criminosa, ciente das estratégias do esquema e fornecendo suas contas para movimentação de valores obtidos dos crimes. A defesa não apresentou novos elementos ou provas que pudessem comprovar que os valores recebidos eram destinados para os cuidados do bisavô e do filho de VANESSA. Como visto, observa-se que as escusas apresentadas pela acusada com o intuito de afastar sua autoria não se coadunam com os robustos elementos coligidos nos autos. Em relação a TIAGO, o MPF, em suas alegações finais, transcreveu trechos de uma conversa interceptada (com autorização judicial) que mostra a sua participação na atividade criminosa. Destaco dessa peça o seguinte trecho (ID 312634358): Conversas interceptadas após autorização judicial apontam que TIAGO e EVELYN planejaram a prática de fraude envolvendo abertura de conta e benefício previdenciário, provavelmente concretizada em agência bancária da CEF na cidade de Porto Ferreira/SP (ID 328852963 - Pág. 16/21 e 24/27 – 5000607-24.2024.4.03.6124). Cite-se, neste sentido, a ligação de registro 1730304746 , por meio da qual TIAGO (TMC 11 96818-0464) conversa com interlocutora que chama de “tia” (TMC 11 95883- 8983), planejando encontrá-la na manhã do dia seguinte em local referenciado como “Dom Bosco” para entregá-la uma colinha relacionada à “benefício”, mencionando que ela deveria “estudar” o “RG” e o “comprovante” pessoalmente. Segue a íntegra do diálogo: Alvo: TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA Nº Interceptado: (11) 96818-0464 Assunto: Tiago x MNI Tia - - Colinha no papel do benefício Nº Contato: (11) 95883-8983 ID: 173030474 Data: 12/06/2024 20:42:51 Duração: 00:02:16 Arquivo: 01_12_173030474_20240612204251_20364915 Tipo: Áudio Degravação: Tiago: Oi tia, tudo bem?... Tia deixa eu te falar para a senhora, amanhã, a senhora tem dinheiro no bilhete ai né? Tia: Tenho, dez reais Tiago: Amanhã a senhora consegue… ***Tiago fala fora da ligação*** Tiago: O vida, marca com ela seis e meia, sete horas, o Evelyn Tiago: Tia que horas a senhora chega lá? Seis e meia ou sete horas? Tia: Ah sete horas então… Tiago: Que amanhã eu vou acordar cedo também a sonsinha vai te levar , to indo buscar o carro com ela agora, consegui desbloquear esse inferno aqui… A senhora acha que vai precisar de colinha? Tia: É bom usar né, não tem como não usar, manda aquela colinha lá é rapidinho.. Não não precisa, pelos documentos eu já estudo, viu Tiago: Vou fazer a colinha pra senhora e mandar no papel do beneficio e ai o RG e o comprovante a senhora estuda pessoalmente Tia: Ta joia... Na dom bosco né? Tiago: Isso na dom bosco, ta bom? Sete horas Tia: Ta bom fio, ta marcado, sete horas eu to lá Tiago: Sete horas... dez pra sete eu já ligo pra senhora Na manhã do dia seguinte à ligação (13/06/2024), a ERB do celular de TIAGO estava próxima à localização da estação de metrô Dom Bosco, em São Paulo/SP (ID 328852963 - Pág. 6). Em paralelo, no mesmo dia 13/06/2024, o terminal que manteve a citada conversa com TIAGO registrou localizações de ERB, a partir das 10h00min, em Limeira/SP, se deslocando próximo a Porto Ferreira/SP (mesma cidade citada por EVELYN em conversa captada um dia depois – ligação de ID 173386199) perto das 12h00min e retornando à São Paulo/SP por volta das 15h00min (ID 329260116 - Pág. 17/19 – 5000607-24.2024.4.03.6124). Poucos dias depois, TIAGO manteve conversa com a mesma interlocutora (registro 1744235747) informando que conseguiu desbloquear determinado cartão e que até as oito horas da manhã chegaria uma senha para “tia”, indicando que a fraude combinada dias antes teria se concretizado efetivamente, conforme registro reproduzido abaixo: Alvo: TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA Nº Interceptado: (11)96818-0464 Assunto: Tiago X MNI "Tia" - liberando o aplicativo até umas oito horas sua senha chega Nº Contato: (11)95883-8983 ID: 174423574 Data: 20/06/2024 07:25:05 Duração: 00:01:15 Arquivo: 01_10_174423574_20240620072505_20364915 Tipo: Áudio Degravação: Tiago: Tia, bom dia, tudo bom? Já chegou? MNI Tia: Já, to aqui já Tiago: Tá, deixa eu te falar, to aqui em Itaquera aqui que eu vim desbloquear o cartão..consegui, ta bom? MNI Tia: Ah, ta joia Tiago: Ontem tava dando invalido ontem.. Ai to liberando o aplicativo tem que esperar trinta minutos ta bom? MNI: Ta joia, to aqui, vou sentar aqui no ponto de onibus Tiago: Ta bom, espera ai que até umas oito horas sua senha chega No mais, foram identificadas diversas transações bancárias de altos valores, sem origem comprovada, entre o corréu TIAGO e integrantes ligadas ao comando/topo da organização criminosa. Neste sentido, entre 19/08/2022 e 12/06/2023, TIAGO recebeu das contas de THALITA MIRANDA ALCARAZ, aproximadamente, R$ 230.830,00, enviando àquela acusada a quantia aproximada de R$ 81.900,00. O acusado também recebeu da conta de Terezinha Demetrio de Sá, administrada por VANESSA DEMÉTRIO DE SÁ MACEDO, entre 01/08/2022 e 27/04/2023, aproximadamente R$ 100.600,00, enviando a ela o total de R$ 53.948,93 (ID 321346669 - Pág. 88/93 e 96 – 5000466-05.2024.4.03.6124). Tratam-se de valores advindos dos crimes praticados. Ouvido em juízo, esse apelante negou a prática delitiva e declarou que os valores que recebera em sua conta corrente referiam-se à reforma na casa em que residia com sua esposa (EVELYN), que cuidava do bisavô dela. Quanto aos valores que enviou para Vanessa e Thalita Miranda Alcaraz (integrante do núcleo avançado da organização criminosa), disse que seriam devoluções por serviços não executados na reforma, mas sua defesa não apresentou nenhuma prova de que os valores recebidos na sua conta referiam-se a essa reforma. Ainda sobre o envolvimento do apelante na organização criminosa, constam da Informação de Polícia Judiciária nº 3287723/2024 (ID 312633828, pp. 65/79) as informações extraídas do celular de Vinicius Gabriel Vieira da Rocha (integrante do núcleo intermediário da organização criminosa), segundo as quais ele mantinha conversa com TIAGO no aplicativo Whatsapp, indicando que fornecia informações e dados sobre potenciais vítimas de fraudes bancárias ao apelante. Seguem trechos da IPJ que destacam as principais conversas: No dia 22/01/2024, TIAGO chama VINICIUS GABRIEL e pergunta “meu tá fluindo?”. VINICIUS GABRIEL responde que sim, que quando chegar em casa vai dar uma atenção “no dele” e que na semana anterior VANESSA pesou. Entende-se aqui que VINICIUS GABRIEL estaria também trabalhando para TIAGO realizando buscas e captando nomes de vítimas. TIAGO envia um áudio dizendo que "é foda trabalhar pra mais de uma pessoa" e enfatiza que VANESSA paga VINICIUS GABRIEL semanalmente. TIAGO pede para VINICIUS GABRIEL dar uma atenção para ele naquela semana, pois ele está arrumando outra "funcionária", possivelmente uma mulher para atuar abrindo as contas bancárias em nome das vítimas. TIAGO diz que também arrumou um homem, irmão dessa funcionária, e que vai precisar também de nomes de homens. Ele pede para VINICIUS GABRIEL focar primeiro em nomes femininos.(...) No dia 24/01/2024, TIAGO pergunta se VINICIUS GABRIEL tem novidades. VINICIUS GABRIEL responde que não efetuou buscas por nomes no dia anterior, pois ficou sem energia e quando foi "puxar" os nomes já estava sem limites. Ele diz que falou com uma mulher e que ela ia arrumar. VINICIUS GABRIEL comenta que o dia anterior foi perdido "por conta da senha do INSS". TIAGO pergunta se ele já está procurando por nomes naquele dia e diz que está precisando de pelo menos 20 nomes femininos, pois na segunda-feira vai pedir nomes masculinos, dando a entender que TIAGO estaria se preparando para abrir 20 contas bancárias em nome de vítimas mulheres e depois abrir contas bancárias em nome de vítimas do sexo masculino. (...) No dia 25/01/2024, TIAGO envia mensagens para VINICIUS GABRIEL, porém apaga essas mensagens. VINICIUS GABRIEL diz que conseguiu 11 nomes, mas ainda não consultou se os nomes estão limpos pois está sem senha e pede para TIAGO já ver uma senha para consultar o SCORE. VINICIUS GABRIEL reclama que consultou 27 nomes para conseguir encontrar 1 que está "ok". TIAGO envia diversas mensagens e as apaga. VINICIUS GABRIEL diz que vai tentar entregar todos os nomes até o dia seguinte. (...) No dia 26/01/2024, VINICIUS GABRIEL fiz que "mandou lá", fazendo referência à lista de nomes das vítimas. TIAGO pergunta quantos nomes VINICIUS GABRIEL enviou. VINICIUS GABRIEL responde que conseguiu "puxar" 16 nomes, mas que o último estava sujo e que não tinha mais nomes de mulher na idade estipulada. Mais uma vez, entende-se que VINICIUS GABRIEL estaria não só trabalhando para VANESSA DEMÉTRIO na busca de nomes de vítimas, mas também para TIAGO. Ao ser ouvido em juízo, o apelante declarou que desconhecia essas as ligações. Contudo, conforme consta da sentença, foram apreendidos (no cumprimento de mandado de busca e apreensão realizados no imóvel onde ele reside com EVELYN) dois Iphones Pro Max (modelos 14 e 15), dois telefones celulares e um veículo Audi Q3, ano 2016/2017 (avaliado em R$ 101.279,00 – ID 312633712, p. 19), em seu nome (TIAGO), incompatíveis com a sua renda declarada, pois ele foi beneficiário de auxílio emergencial e não foram localizados vínculos empregatícios em seu nome. Destaco da sentença (ID 31263434364): No cumprimento do mandado de busca e apreensão deferido pelo Juízo, nos autos nº 5000466-05.2024.4.03.6124, foram apreendidos dois Iphones Pro Max (modelo 14 e 15), outros 2 (dois) telefones celulares e um veículo Audi Q3, ano 2016/2017, em nome de TIAGO. As diligências realizadas na residência revelaram que o imóvel onde reside com EVELYN foi recentemente reformado e possui móveis de alto padrão. Além disso, como bem destacou o MPF, o padrão das movimentações bancárias de TIAGO e dos bens apreendidos destoam das informações de sua renda, pois não foram encontrados vínculos empregatícios em seu nome, tão somente que fora beneficiário de auxílio emergencial (cf. ID 333179332). Somado a isso, o conteúdo extraído do aparelho celular de VINICIUS GABRIEL VIEIRA DA ROCHA (IPJ nº 3287723/2024 - ID 336725649) confirma a participação ativa de TIAGO no esquema criminoso desenvolvido pela organização, pois nas conversas entre os dois ficou evidente que VINICIUS fornecia informações e dados sobre potenciais vítimas de fraudes bancárias ao acusado TIAGO. O réu, interrogado em Juízo, negou a prática delitiva, declarando que os valores recebidos de VANESSA em sua conta-corrente, cuja origem o acusado não tinha conhecimento, teriam sido exclusivamente para fazer uma reforma na casa onde sua esposa EVELYN residia e cuidava do bisavô dela e afilhado Davi (filho de VANESSA). Questionado sobre os valores recebidos de THALITA, afirma que também teriam sido enviados por VANESSA, visto que aquela era sócia desta. Questionado sobre os valores enviados para VANESSA e THALITA, respectivamente, nos montantes totais de R$ 81.900,00 e R$ 53.948,93, o acusado alega que seriam referentes à devolução por serviços não prestados quanto à citada reforma. Indagado sobre as ligações com a pessoa “tia”, afirmou desconhecer a ligação, afirmando que reside perto da estação Dom Bosco. A defesa não apresentou novos elementos ou provas que pudessem comprovar que os valores recebidos eram destinados para a referida reforma. Nesse contexto, a testemunha arrolada pela defesa de TIAGO, Bruno Santos da Silva, informou que o réu presta serviço para sua empresa, de forma esporádica e terceirizada, ganhando, dependendo do serviço que presta, de R$500,00 a R$1.000,00 por semana, reforçando que os bens e o padrão de vida de TIAGO é incompatível com a renda que recebe como técnico de refrigeração. Como visto, observa-se que a escusa apresentada pelo acusado com o intuito de afastar sua autoria não se coaduna com os robustos elementos coligidos nos autos. Restou comprovado ainda que entre os membros do grupo criminoso havia uma divisão de tarefas, sendo que o réu, membro do núcleo intermediário, fornecia suas contas como “contas de passagem”, além de receber os valores advindos das fraudes e repassar para o comando da organização, também organizava suas próprias fraudes. Por conseguinte, diante de todo o explanado, entendo que houve in casu a incidência da norma penal incriminadora aventada na denúncia, pois o réu, de data inicial desconhecida, mas ao menos a partir do ano de 2021 até o dia 25/06/2024 (deflagração da fase ostensiva da operação), integrou pessoalmente organização criminosa voltada para a prática de reiterados crimes de estelionato em face de instituições financeiras, notadamente a CEF. Portanto, estando devidamente comprovado que os apelantes integraram organização criminosa voltada à prática de crimes de estelionato contra instituições financeiras, dentre as quais a CEF, mantenho as condenações de EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ e TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA pela prática do crime previsto no art. 2º, caput, da Lei nº 12.850/2013, nos termos da denúncia. WESLEY SILVIO BESSA A defesa de WELSEY pede a sua absolvição, com base no inciso VII do art. 386 do Código de Processo Penal, pois, segundo alega, sua condenação fundamentou-se unicamente em prova colhida na fase investigatória, o que ofende o disposto no art. 155 do Código de Processo Penal. Sem razão. O art. 155 do Código de Processo Penal dispõe que o juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas. O caso em exame entra no rol dessas exceções. Com efeito, foram obtidas várias provas em razão de cumprimento de mandado de busca e apreensão expedido por ordem judicial no Inquérito Policial nº 5000079-24.2023.4.03.6124 e a obtenção dessa prova é cautelar e irrepetível, de modo que está amparada na legislação processual penal. Nesse sentido: AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PLEITO DE NULIDADE DA CITAÇÃO POR EDITAL. TODOS OS MEIOS PARA A LOCALIZAÇÃO ESGOTADOS. SÚMULA 7/STJ. CONDENAÇÃO COM PROVAS COLHIDAS NA FASE INVESTIGATIVA. PROVAS IRREPETÍVEIS E ANTECIPADAS. POSSIBILIDADE. SÚMULA 83/STJ. AGRAVO IMPROVIDO. 1. A reversão da premissa fática de que esgotados todos os meios para localização da ré, a justificar a citação por edital, encontra óbice na Súmula 7/STJ. 2. As provas irrepetíveis e antecipadas, como o laudo pericial e o mandado de busca e apreensão, produzidos nos autos do inquérito policial, podem servir como base para condenação. 3. Agravo regimental improvido. (STJ, AgRg no AREsp nº 1.439.910/SC, Quinta Turma, Rel. Ministro Nefi Cordeiro, J. 08.10.2019, DJe 17.10.2019) Consta das alegações finais do MPF que existem inúmeras provas de que esse apelante participou ativamente do esquema criminoso. Destaco dessa peça o seguinte trecho (ID 312634358): WESLEY SILVIO BESSA é sobrinho de RITA DE CASSIA BESSA (núcleo avançado), com quem residia, e atuou no esquema criminoso desenvolvido fornecendo suas contas-correntes para os membros de alto escalão para recebimento e repasse de valores advindos dos ilícitos praticados. Este acusado figura como investigado/envolvido em, ao menos, 7 (sete) inquéritos policiais com a finalidade de apurar crimes de estelionato qualificados contra a CEF, praticados com o mesmo modus operandi dos narrados anteriormente. Em todos os procedimentos, WESLEY foi identificado como beneficiário de parte dos valores provenientes dos empréstimos consignados realizados mediante uso de documentos falsos em nome das vítimas (ID 321346669 - Pág. 111/114 – 5000466-05.2024.4.03.6124). São eles: [...] Somente em decorrência das fraudes contra aposentados/pensionistas identificadas e levantadas pela CEF, a conta de WESLEY recebeu o total de R$ 211.097,02 (Ofício nº 38/2023/CEFRA/DF - ID 322134146 - Pág. 28 – 5000466-05.2024.4.03.6124) As diligências obtidas após o cumprimento das buscas e apreensões revelaram que WESLEY residia no mesmo imóvel que RITA DE CÁSSIA BESSA, uma das chefes da ORCRIM, onde foram localizados e apreendidos diversos documentos relacionados as práticas delitivas narradas (ID’s 333179336 e 333179340) . Interrogado em juízo, o apelante negou fazer parte da organização criminosa. Alegou que apenas aceitara a proposta de uma pessoa (que conhecia como “Bil”) para receber dinheiro em sua conta e repassá-lo para outras contas, recebendo cem reais a cada mil reais transferidos. Disse que não tinha conhecimento de que os valores eram provenientes de estelionato. Contudo, não é crível que não tivesse conhecimento da origem criminosa dos valores depositados na sua conta, conforme destacado no seguinte trecho da sentença: Interrogado em Juízo, o réu negou a prática do crime imputado. Alegou, em síntese, que aceitou uma proposta para receber valores em sua conta e repassá-los a troco de um percentual, sem saber que os valores eram de estelionato. A proposta foi feita por uma pessoa que se apresentava como “Bil”, que era de fora do convívio do acusado, e o acusado recebia cerca de 20 a 30 mil reais na conta e enviava para outras contas, recebendo cem reais a cada mil reais transferidos. Questionado do porquê outras duas pessoas ligadas a ele e sua tia RITA DE CÁSSIA BESSA (Ramissayane Sthefany da Silva Bessa e Sabrina Bessa dos Santos) também receberam valores provenientes das fraudes praticadas contra os beneficiários do INSS, o réu alegou que ele quem pediu a conta para elas. Por fim, confessou que fazia parte desse esquema de fornecimento de contas. Ainda que alegue que desconhecia a origem do dinheiro que recebia em sua conta, não é crível que não tinha conhecimento das fraudes praticadas pela organização criminosa, sendo que residia com uma das integrantes do núcleo avançado e havia na residência diversos documentos relacionados às fraudes. Como destacou o MPF, o réu não declinou nenhuma outra informação a respeito da pessoa que supostamente o teria proposto o esquema de contas de passagem (“Bil”), o que descredibiliza suas alegações. Como visto, observa-se que as escusas apresentadas pelo acusado com o intuito de afastar sua participação não se coadunam com os robustos elementos coligidos nos autos. Restou comprovado ainda que entre os membros do grupo criminoso havia uma divisão de tarefas, sendo que o réu, membro do núcleo intermediário, fornecia suas contas como “contas de passagem”, além de receber os valores advindos das fraudes, também os repassava para o comando da organização. Por conseguinte, diante de todo o explanado, entendo que houve in casu a incidência da norma penal incriminadora aventada na denúncia, pois o réu, de data inicial desconhecida, mas ao menos a partir do ano de 2021 até o dia 25/06/2024 (deflagração da fase ostensiva da operação), integrou pessoalmente organização criminosa voltada para a prática de reiterados crimes de estelionato em face de instituições financeiras, notadamente a CEF. Portanto, comprovado que o apelante integrou organização criminosa voltada à prática de crimes de estelionato contra instituições financeiras, dentre as quais a CEF, mantenho a condenação de WESLEY SILVIO BESSA pela prática do crime previsto no art. 2º, caput, da Lei nº 12.850/2013, nos termos da denúncia. Dosimetria das penas Passo ao reexame da dosimetria das penas. ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS Na primeira fase, o juízo a quo fixou a pena-base em 4 (quatro) anos e 3 (três) meses de reclusão e 98 (noventa e oito) dias-multa, com base nos seguintes fundamentos: Atento aos critérios constantes no artigo 59 do Código Penal, verifico que ultrapassaram os limites do tipo as circunstâncias do delito, pois a organização criminosa se valia do uso de inúmeros documentos falsificados para a prática das fraudes delitivas apuradas, bem como fazia uso de contas-correntes de interpostas pessoas para dificultar o rastreamento dos valores indevidos obtidos com os crimes; e as consequências do delito, pois a CEF apontou 124 contas abertas por meio de documentação falsa de beneficiários do INSS relacionados ao grupo criminoso, cujas operações de crédito somam a quantia de R$ 5.122.654,48, o que revela a gravidade do impacto social das fraudes. A defesa pede a redução da pena-base ao mínimo legal. Com parcial razão. As circunstâncias e consequências do delito são negativas, porém a elevação feita pelo juízo de primeiro grau merece pequeno ajuste, especialmente em relação à pena de multa. Ocorre que esta Turma tem entendimento de que a quantificação da pena de multa deve dar-se de forma proporcional à pena privativa de liberdade, seguindo o mesmo critério trifásico de dosimetria da pena privativa de liberdade (ApCrim nº 0002526-47.2011.4.03.6106/SP, Rel. Des. Federal Nino Toldo, j. 01.9.2015, e-DJF3 Judicial 1 03.9.2015). Por isso, acolho em parte o recurso nesse ponto e reduzo a pena-base para 4 (quatro) anos de reclusão e 13 (treze) dias-multa. Na segunda fase, o juízo não reconheceu nenhuma circunstância atenuante e reconheceu a circunstância agravante da reincidência (CP, art. 61, I - Ação Penal nº 0012278-07.2014.4.03.6181 – trânsito em julgado em 09.06.2020), na fração de 1/6 (um sexto), o que confirmo. Assim, a pena intermediária fica em 4 (quatro) anos e 8 (oito) meses de reclusão e 15 (quinze) dias-multa. Na terceira fase, o juízo não aplicou nenhuma causa de aumento ou de diminuição de pena, o que confirmo, ficando a pena definitiva estabelecida em 4 (quatro) anos e 8 (oito) meses de reclusão e 15 (quinze) dias-multa, mantido o valor unitário do dia-multa no mínimo legal. EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ e TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA Analiso simultaneamente as penas fixadas para EVELYN e TIAGO porque são semelhantes as circunstâncias de fato a eles relativas. Eventuais situações específicas serão destacadas a fim de se observar estritamente o princípio da individualização da pena. Na primeira fase, o juízo a quo fixou a pena-base em 4 (quatro) anos e 3 (três) meses de reclusão e 98 (noventa e oito) dias-multa, com base nos seguintes fundamentos: Atento aos critérios constantes no artigo 59 do Código Penal, verifico que ultrapassaram os limites do tipo as circunstâncias do crime, pois a organização criminosa se valia do uso de inúmeros documentos falsificados para a prática das fraudes delitivas apuradas, bem como fazia uso de contas-correntes de interpostas pessoas para dificultar o rastreamento dos valores indevidos obtidos com os crimes; e as consequências do delito, pois a CEF apontou 124 contas abertas por meio de documentação falsa de beneficiários do INSS relacionados ao grupo criminoso, cujas operações de crédito somam a quantia de R$ 5.122.654,48, além das vítimas serem idosos, com saúde debilitada e dependentes economicamente dos benefícios, o que revela a gravidade do impacto social das fraudes. A defesa pede a redução da pena-base ao mínimo legal. Com parcial razão. As circunstâncias e consequências do delito são negativas, porém a elevação feita pelo juízo de primeiro grau merece pequeno ajuste, especialmente em relação à pena de multa. Ocorre que esta Turma tem entendimento de que a quantificação da pena de multa deve dar-se de forma proporcional à pena privativa de liberdade, seguindo o mesmo critério trifásico de dosimetria da pena privativa de liberdade (ApCrim nº 0002526-47.2011.4.03.6106/SP, Rel. Des. Federal Nino Toldo, j. 01.9.2015, e-DJF3 Judicial 1 03.9.2015). Por isso, acolho em parte o recurso nesse ponto e reduzo a pena-base para 4 (quatro) anos de reclusão e 13 (treze) dias-multa para cada réu. Na segunda fase, o juízo não reconheceu circunstâncias agravantes nem atenuantes, o que confirmo, não se alterando a pena intermediária em relação à pena-base. Na terceira fase, o juízo não aplicou nenhuma causa de aumento ou de diminuição de pena, porém a defesa pede a aplicação da causa de diminuição prevista no art. 29, § 1º, do Código Penal (participação de menor importância), porém sem razão porque foi comprovado que a atuação dos apelantes não foi menor, mas de ativa participação na organização criminosa pelo fornecimento de contas de passagem, que se mostraram indispensáveis para o seu funcionamento. Assim, a pena definitiva para cada um desses réus fica estabelecida em 4 (quatro) anos de reclusão e 13 (treze) dias-multa, mantido o valor unitário do dia-multa no mínimo legal. WESLEY SILVIO BESSA Na primeira fase, o juízo a quo fixou a pena-base em 4 (quatro) anos e 3 (três) meses de reclusão e 98 (noventa e oito) dias-multa, com base nos mesmos fundamentos acima transcritos. A defesa pede a redução da pena-base ao mínimo legal. Com parcial razão. Conforme dito acima, as circunstâncias e consequências do delito são negativas, porém a elevação feita pelo juízo de primeiro grau merece pequeno ajuste, especialmente em relação à pena de multa, na linha de entendimento da Turma já exposto. Por isso, acolho em parte o recurso nesse ponto e reduzo a pena-base para 4 (quatro) anos de reclusão e 13 (treze) dias-multa. Na segunda fase, o juízo não reconheceu circunstâncias agravantes nem atenuantes, o que confirmo, não se alterando a pena intermediária em relação à pena-base. A defesa pede sejam reconhecidas as circunstâncias atenuantes da confissão espontânea (CP, art. 65, III, “d”) e da menoridade relativa (CP, art. 65, I). Sem razão, porém. Ocorre que o apelante negou a prática do crime, tendo admitido apenas que emprestara sua conta para um indivíduo conhecido, sem saber que os valores eram provenientes de estelionato. Isso, todavia, não configura confissão. Além disso, nascido no dia 15.5.2002, tinha 22 anos completos na data da deflagração da fase ostensiva da Operação Anonymous (em 25.6.2024). Portanto, não ocorre nenhuma das hipóteses atenuantes mencionadas. Na terceira fase, o juízo não aplicou nenhuma causa de aumento ou de diminuição de pena, o que confirmo ficando a pena definitiva estabelecida em 4 (quatro) anos de reclusão e 13 (treze) dias-multa, mantido o valor unitário do dia-multa no mínimo legal. Regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade Mantenho o regime fechado para início do cumprimento da pena privativa de liberdade (CP, art. 33, § 2º, "a") fixada para a corré ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS porque, apesar de o total da pena fixada não ser superior a oito anos de reclusão, ela é reincidente (CP, art. 33, § 2º, "b"), não sendo cabível a substituição dessa pena por restritivas de direitos (CP, art. 44, I e II). Observo que essa apelante não chegou a ser presa preventivamente, razão pela qual não há desconto a ser feito a título de tempo de prisão provisória. Em relação aos corréus EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ, TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA e WESLEY SILVIO BESSA, o juízo havia fixado o regime semiaberto para início do cumprimento de suas respectivas penas privativas de liberdade, considerando que as penas que fixara eram superiores quatro anos de reclusão. Contudo, ante o redimensionamento das penas, que não ultrapassaram quatro anos de reclusão para nenhum deles, e que as circunstâncias judiciais não são negativas (CP, art. 59), dou provimento aos recursos das defesas desses réus nesse ponto para fixar o regime aberto para início do cumprimento das respectivas penas privativas de liberdade (CP, art. 33, § 2º, "c"), observando que, em relação ao corréu TIAGO, a Décima Primeira Turma, por unanimidade, na sessão de 13.3.2025, concedeu ordem de habeas corpus para garantir a esse réu “que o regime adequado para o início do cumprimento da [sua] pena é o aberto”. O acórdão do Habeas Corpus nº 5033888-10.2024.4.02.0000 tem a seguinte ementa: PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. DETRAÇÃO. 1. O art. 387, § 1º, do Código de Processo Penal dispõe que o juiz, na sentença, decidirá, fundamentadamente, sobre a manutenção ou, se for o caso, a imposição de prisão preventiva ou de outra medida cautelar, sem prejuízo do conhecimento de apelação que vier a ser interposta. 2. O regime inicial de cumprimento da pena fixado na sentença (semiaberto) deverá ser objeto de oportuno exame pela Turma no julgamento da apelação criminal interposta pela defesa do paciente. No entanto, considerando a pena fixada na condenação, o tempo de prisão já cumprido pelo paciente, suas condições subjetivas favoráveis e que o MPF não recorreu da sentença, é possível afirmar, desde logo, que o regime adequado para o início do cumprimento da pena é o aberto, que é incompatível com a manutenção da prisão do paciente, cuja liberdade não pode aguardar os trâmites ordinários da expedição e processamento da guia de execução provisória. 3. Ordem concedida. Além disso, presentes os requisitos do art. 44 do Código Penal, substituo as penas privativas de liberdade de cada réu por duas penas restritivas de direitos para cada um, consistentes em: i) prestação de serviços à comunidade ou a entidade pública, pelo período das penas substituídas, em local e modo a serem indicados pelo juízo da execução penal; ii) prestação pecuniária, no valor de 3 (três) salários mínimos, em favor de entidade pública ou privada com destinação social a ser indicada pelo juízo da execução penal. Prisão preventiva A defesa de ANDREA pede a revogação da sua prisão preventiva e o o recolhimento do mandado de prisão expedido em seu desfavor. Sem razão. O juízo de origem manteve a decretação da sua prisão preventiva pelos seguintes fundamentos: Mantendo-se integras as razões cautelares que justificaram a decretação da prisão preventiva da ré, e tendo ela permanecido foragida durante todo o processo, mantenho a sua prisão preventiva decretada (art. 387, §1º, do Código de Processo Penal). Mantenho a prisão preventiva porque ainda estão presentes os motivos que levaram à sua decretação (garantia da ordem pública e da aplicação da lei penal) e a apelante encontra-se foragida desde então, situação que se estendeu ao longo de todo o processo e demonstra não só o descaso da apelante como também a necessidade da sua prisão para garantia da ordem da pública e da aplicação da lei penal. Assistência judiciária gratuita Defiro aos apelantes os benefícios da assistência judiciária gratuita. Contudo, esse deferimento não impede a condenação ao pagamento das custas processuais, sendo sua isenção matéria a ser examinada em sede de execução do julgado (STJ, AgRg no Ag 1.377.544/MG, Quinta Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 31.05.2011, DJe 14.06.2011), tampouco implica provimento de qualquer parte do recurso, pois não foi demonstrado que a gratuidade tenha sido requerida ao juízo de primeiro grau e por ele tenha sido indeferida. Conclusão Posto isso, DOU PARCIAL PROVIMENTO às apelações, para reduzir a pena-base de todos os apelantes e fixar o regime aberto para início de cumprimento das penas privativas de liberdade de EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ, TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA e WESLEY SILVIO BESSA, substituindo-as por penas restritivas de direitos, ficando as penas definitivas estabelecidas em 4 (quatro) anos e 8 (oito) meses de reclusão, em regime inicial fechado, e 15 (quinze) dias-multa, para ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS, e em 4 (quatro) anos de reclusão, em regime inicial aberto, e 13 (treze) dias-multa, para EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ, TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA e WESLEY SILVIO BESSA, nos termos da fundamentação supra. É o voto. Autos: APELAÇÃO CRIMINAL - 5000872-26.2024.4.03.6124 Requerente: ANDREA DEMETRIO DE SA SANTOS e outros Requerido: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP Ementa: Direito penal e processual penal. Apelação criminal. Organização Criminosa. Fraudes bancárias. Operação Anonymous. Nulidades. Competência. Princípio da insignificância. Dosimetria da pena. Pena-base. Recursos parcialmente providos. I. Caso em exame 1. Trata-se de apelações interpostas em face da sentença, no âmbito da denominada Operação Anonymous, que condenou os réus pela prática do crime de organização criminosa (art. 2º, caput, § 3º, da Lei 12.850/2013), na transferência de valores obtidos mediante empréstimos em instituições financeiras com uso de documentos falsos. II. Questão em discussão 2. As questões em discussão consistem em saber se: (i) o juízo de Jales é competente para processar e julgar o feito; (ii) houve nulidade na obtenção das provas mediante interceptação de comunicações telefônicas; (iii) é cabível a aplicação ao caso do princípio da insignificância; (iv) se o não oferecimento de ANPP constitui nulidade; (v) há provas suficientes para a condenação; (vi) está correta a dosimetria das penas. III. Razões de decidir 3. Tendo se consumado o crime no momento da obtenção da vantagem ilícita, a regra aplicável é a do do art. 70, caput, do Código de Processo Penal. A Justiça Federal de Jales era competente para processar e julgar a ação penal. 4. O caso concreto em exame reflete, de forma clássica, aquelas situações em que a medida excepcional da interceptação das comunicações telefônicas mostra-se imprescindível para a obtenção da prova. Nulidade inexistente. 5. Não é aplicável o princípio da insignificância em crime de organização criminosa, pois o bem jurídico tutelado é a fé pública e, segundo jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça (STJ), esse princípio não se aplica a crimes dessa natureza. 6. Ante a recusa do MPF em oferecer (de forma motivada) o ANPP, os acusados (por sua defesa técnica) tinham o direito de requerer a remessa dos autos ao órgão superior do Ministério Público, nos termos do § 14 do art. 28-A do Código de Processo Penal. Todavia, não o fizeram, tendo ocorrido a preclusão. Além disso, a jurisprudência firmou-se no sentido de que o ANPP não constitui direito subjetivo do acusado, podendo ser proposto pelo Ministério Público quando considerar necessário e suficiente à reprovação e prevenção da infração penal, o que não se verificou no caso. 7. Materialidade, autoria e dolo comprovados em relação a todos os réus. São suficientes as provas da participação dos réus na organização criminosa, com base nas conversas telefônicas interceptadas, nos depoimentos e nas movimentações financeiras ilícitas. 8. Dosimetria das penas. Penas-bases redimensionadas e alterado, em relação a três deles, o regime inicial de cumprimento com a possibilidade de substituição por penas restritivas de direitos. IV. Dispositivo e tese 9. Recursos parcialmente providos. Tese de julgamento: “1. Tendo se consumado o crime no momento da obtenção da vantagem ilícita, a regra aplicável é a do do art. 70, caput, do Código de Processo Penal. 2. Interceptações telefônicas autorizadas judicialmente e devidamente fundamentadas são válidas e podem embasar a condenação. 3. O princípio da insignificância não é aplicável ao crime de organização criminosa, dada a tutela da fé pública. 4. O acordo de não persecução penal não constitui direito subjetivo do réu, podendo o Ministério Público recusar o seu oferecimento motivadamente.” _________ Dispositivos relevantes citados: CP, arts. 59, 65, 61, I; CPP, arts. 70, 155, 226, 28-A; Lei nº 12.850/2013, art. 2º, caput e § 3º. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgRg no AREsp nº 2.747.808/MG, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, 5ª Turma, j. 27.11.2024, DJEN 4.12.2024; STF, HC nº 195.725/SP, Rel. Min. Alexandre de Moraes, j. 28.01.2021. ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Primeira Turma, por unanimidade, decidiu DAR PARCIAL PROVIMENTO às apelações, para reduzir a pena-base de todos os apelantes e fixar o regime aberto para início de cumprimento das penas privativas de liberdade de EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ, TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA e WESLEY SILVIO BESSA, substituindo-as por penas restritivas de direitos, ficando as penas definitivas estabelecidas em 4 (quatro) anos e 8 (oito) meses de reclusão, em regime inicial fechado, e 15 (quinze) dias-multa, para ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS, e em 4 (quatro) anos de reclusão, em regime inicial aberto, e 13 (treze) dias-multa, para EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ, TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA e WESLEY SILVIO BESSA, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. NINO TOLDO Desembargador Federal

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Processo nº 5000872-26.2024.4.03.6124

ID: 300544621

Tribunal: TRF3 Órgão: Gab. 40 - DES. FED. NINO TOLDO Classe: APELAçãO CRIMINAL Nº Processo: 5000872-26.2024.4.03.6124

Data de Disponibilização: 17/06/2025

Polo Ativo:

WESLEY SILVIO BESSA

Polo Passivo:

Intimação

Advogados:

WELLINGTON SILVA CAMPOS

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

CLEMERSON MISAEL DOS SANTOS

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

CESAR RENATO FLORINDO

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 11ª Turma APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 5000872-26.2024.4.03.6124 RELATOR: Gab. 40 - DES. FED. NINO TOLDO APELANTE: ANDREA DEMETRIO DE SA SANTOS, … PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 11ª Turma APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 5000872-26.2024.4.03.6124 RELATOR: Gab. 40 - DES. FED. NINO TOLDO APELANTE: ANDREA DEMETRIO DE SA SANTOS, EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SA, TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA, WESLEY SILVIO BESSA Advogado do(a) APELANTE: CLEMERSON MISAEL DOS SANTOS - SP317298-A Advogado do(a) APELANTE: WELLINGTON SILVA CAMPOS - SP438093-A Advogado do(a) APELANTE: CESAR RENATO FLORINDO - SP405260-A APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP OUTROS PARTICIPANTES: PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 11ª Turma APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 5000872-26.2024.4.03.6124 RELATOR: Gab. 40 - DES. FED. NINO TOLDO APELANTE: ANDREA DEMETRIO DE SA SANTOS, EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SA, TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA, WESLEY SILVIO BESSA Advogado do(a) APELANTE: CLEMERSON MISAEL DOS SANTOS - SP317298-A Advogado do(a) APELANTE: WELLINGTON SILVA CAMPOS - SP438093-A Advogado do(a) APELANTE: CESAR RENATO FLORINDO - SP405260-A APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NINO TOLDO (Relator): Trata-se de apelações interpostas por ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS, EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ, TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA e WESLEY SILVIO BESSA em face da sentença proferida pela 1ª Vara Federal de Jales (SP), no âmbito da denominada Operação Anonymous, que os condenou pela prática do crime de organização criminosa (art. 2º, caput, § 3º, da Lei 12.850/2013) às seguintes penas: i) ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS - 4 (quatro) anos, 11 (onze) meses e 15 (quinze) dias de reclusão, em regime inicial fechado, e 114 (cento e quatorze) dias-multa, no valor unitário mínimo legal; ii) EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ - 4 (quatro) anos e 3 (três) meses de reclusão, em regime inicial semiaberto, e 98 (noventa e oito) dias-multa, no valor unitário mínimo legal; iii) TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA - 4 (quatro) anos e 3 (três) meses de reclusão, em regime inicial semiaberto, e 98 (noventa e oito) dias-multa, no valor unitário mínimo legal; e iv) WESLEY SILVIO BESSA - 4 (quatro) anos e 3 (três) meses de reclusão, em regime inicial semiaberto, e 98 (noventa e oito) dias-multa, no valor unitário mínimo legal. O Ministério Público Federal (MPF) deixou de propor acordo de não persecução penal (ANPP) sob o argumento de que o acordo não se afigura suficiente à reprovação e prevenção do crime (ID 312633703, p. 2), não tendo havido manifestação das defesas de ANDREA, TIAGO e WESLEY sobre isso (ID 312633790, 312633808 e 312633810). A defesa de EVELYN requereu a intimação do MPF para oferecer proposta de ANPP (ID 312633782), mas o MPF reiterou o não cabimento do benefício (ID 312633791) e não houve pedido de envio dos autos ao órgão superior do MPF. A denúncia (ID 312633703), recebida em 29.7.2024 (ID 312633750), narra: Os fatos a seguir expostos surgiram das investigações conduzidas no Inquérito Policial nº 5000079-24.2023.4.03.6124, instaurado para apurar, inicialmente, a prática de crime previsto no artigo 171, §3º, do Código Penal. A agência da Caixa Econômica Federal (CEF) de Auriflama/SP (ID 273316977 - Pág. 5/34 – IPL 5000079-24.2023.4.03.6124) informou que indivíduo até então não identificado, no dia 13/07/2022, utilizando documentação falsa em nome de Antônio Carlos dos Santos, abriu conta-corrente naquela agência, transferindo o pagamento de benefício previdenciário de aposentadoria recebido pela vítima para a conta fraudulenta. [...] Analisados os dados bancários e realizadas pesquisas, foi possível identificar outros envolvidos – em especial THALITA MIRANDA ALCARAZ, VANESSA DEMETRIO DE SÁ MACEDO, ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS e HERIBERTO DOS SANTOS CANDIDO – além de novas práticas de estelionato contra a CEF, conforme detalhado no Relatório de Análise de Polícia Judiciária (RAPJ) nº 2291253/2023 (DOC. 1 anexo)1. Havia, nesse momento, fortes indícios da existência de uma Organização Criminosa – doravante referida como ORCRIM – voltada à prática reiterada de crimes de estelionato. Realizada a quebra do sigilo bancário das pessoas identificadas nesse momento, conforme autorização judicial nos autos 5000201-37.2023.4.03.6124, os dados, em especial as movimentações das contas-correntes de THALITA MIRANDA ALCARAZ, foram analisados no Relatório de Análise de Polícia Judiciária (RAPJ) nº 492587/2024 (DOC. 2 anexo)2. A partir dessas informações, foi possível obter mais detalhes sobre o funcionamento da ORCRIM, além de apontada a participação de outros integrantes e novas vítimas dos crimes. Também foram solicitadas ao Setor de Segurança da CEF informações de outras contas objeto de fraude pelo mesmo grupo, sendo encaminhado, em resposta, o Ofício nº 38/2023/CEFRA/DF (DOC. 3 anexo)3. Ali, foram relacionadas diversas contas que foram abertas por meio de documentação falsa de beneficiários do INSS e identificados alguns envolvidos diretamente na abertura dessas contas. Segundo estimativa realizada pela CEF, “as operações de crédito nas modalidades Crédito Consignado, Antecipação de Crédito FGTS, Crédito CDC [...], vinculadas às 124 contas abertas com documentos falsos, somam aquantia de R$ 5.122.654,48”. Abre-se um parêntese, neste ponto, para registrar que foram identificados, ao menos, outros 18 (dezoito) procedimentos investigatórios perante a Polícia Federal no Estado de São Paulo instaurados para apurar crimes de estelionato envolvendo algum ou alguns dos membros da ORCRIM aqui desvendada (ID 321348441 - Pág. 32/33 – 5000466-05.2024.4.03.6124), o que demonstra a amplitude de sua atuação e sua estruturação ordenada para a prática de infrações penais. Alguns dos atingidos pelos ilícitos, todos aposentadas e/ou pensionistas, em sua maioria idosos e hipossuficientes, foram ouvidos e confirmaram as fraudes perpetradas contra eles (ID 321348441 - Pág. 76 e ss. – 5000466-05.2024.4.03.6124). [...] No curso das investigações ficou comprovada a existência de uma Organização Criminosa bem estruturada e articulada, especializada em perpetrar fraudes contra instituições financeiras, incluindo a Caixa Econômica Federal (CEF), em vários municípios do país, em sua maioria no Estado de São Paulo. O grupo criminoso opera por meio da utilização de documentos falsificados emitidos em nome de terceiros, geralmente beneficiários de algum tipo de prestação previdenciária, predominantemente idosos, os quais se encontram em condições de saúde debilitadas e são economicamente dependentes das pensões que recebem. Essa vulnerabilidade os torna alvos preferenciais e expõe a gravidade do impacto social dessas fraudes. Diante de todos os elementos apurados, foi possível dividir os membros da ORCRIM nos chamados “núcleos” de atuação, evidenciando a divisão de tarefas e a estrutura funcional do grupo, que se distribui da seguinte forma: [...] 2.2. NÚCLEO INTERMEDIÁRIO ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA WESLEY SILVIO BESSA VINICIUS GABRIEL VIEIRA DA ROCHA MARIA TAINARA SANTOS DE SOUSA TAINA CRISTINA DA SILVA CAIO DE JESUS CARDOSO ROSANA SANTOS DE JESUS O segundo núcleo, considerado intermediário, é integrado por aqueles que oferecem suas contas-correntes como de “contas de passagem”, para recebimento direto dos valores advindos dos empréstimos fraudulentos, depositados nas contas fraudulentas criadas pelos membros do primeiro núcleo, e posterior transferência para os membros de comando do grupo, integrantes do núcleo avançado. Os intermediários têm plena consciência da origem ilícita dos valores recebidos em suas contas, participando, assim, de forma direta e ativa no esquema criminoso. A presente denúncia se refere especificamente às condutas de parte dos membros deste núcleo criminoso, sendo outra parte denunciada em apartado (DENÚNCIA 04). [...] 3. OBJETO DA PRESENTE DENÚNCIA: NÚCLEO INTERMEDIÁRIO Feitas as considerações acima, passa-se a individualizar as condutas das pessoas que compõem o núcleo intermediário de atuação do grupo criminoso ora desvendado, demonstrando-se, de maneira individual e específica, a autoria de cada uma em relação ao crime previsto no artigo 2º da Lei nº 12.850/2013 (organização criminosa). [...) ] 3.1. ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS é integrante do núcleo intermediário da ORCRIM e atua, de forma consciente, fornecendo suas contas bancárias para movimentação dos valores advindos dos crimes e auxiliando na abertura de contas em agências bancárias mediante uso de documentos falsos. ANDREA é irmã de VANESSA DEMETRIO DE SÁ MACEDO, uma das integrantes de comando do grupo, com quem mantém proximidade. A denunciada também é mãe de EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ e sogra de TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA (ID 321346669 - Pág. 93/94 – 5000466-05.2024.4.03.6124), que serão tratados nos tópicos seguintes dessa peça. Conversa interceptada após autorização judicial reforça a autoria desta denunciada no esquema criminoso. Trata-se do registro 1733861996, em que EVELYN mantém conversa com interlocutora que a chama de filha, indicando se tratar da denunciada ANDREA, a respeito da prática de nova fraude para “levantar um dinheiro”, relacionada à abertura de conta em agência da CEF de Porto Ferreira/SP, sugerindo se tratar de “bom” lugar para a fraude. Trata-se de ação típica do modo de operação da organização criminosa, consistente na abertura de contas fraudulentas em agências da Caixa localizadas no interior do Estado de São Paulo. EVELYN afirma à mãe que, posteriormente, ela deveria retirar o “cartão de INSS” na residência de algum conhecido, especificamente com caixa de correio de modelo antigo apresentando documento (provavelmente falso), citando que fraude parecida teria sido praticada anteriormente por alguém denominado “VITOR”. Por fim, ANDREA menciona a EVELYN que tentou realizar “uns dez” (provavelmente outras dez fraudes) com outra mulher, mas apenas um deu certo. Assim como sua irmã VANESSA, a denunciada ANDREA recebeu da conta fraudulentamente criada em nome de Antonio Fernando Berardo, em 6 (seis) transações ocorridas entre 29/10/2021 e 25/11/2021, o total de R$ 13.165,00 (ID 322134126 - Pág. 3/4 – 5000466-05.2024.4.03.6124), sendo, portanto, também beneficiária direta do esquema criminoso desvendado. No mais, ANDREA foi presa em flagrante anteriormente, em 24/08/2014, ao tentar obter empréstimo consignado junto à CEF utilizando documentos falsos em nome de uma beneficiária do INSS, o que originou o IPL 680/2015-DELEFAZ/SR/RF/SP (ID 321350442 - Pág. 30/31 – 5000466-05.2024.4.03.6124), demonstrando que se dedica, ao menos há uma década, à prática de “golpes” dessa natureza. O procedimento citado deu origem à Ação Penal nº 0012278-07.2014.403.6181, em trâmite perante a 9ª Vara Criminal Federal de São Paulo, em que ANDREA foi condenada à pena de 03 (três) anos, 06 (seis) meses e 20 dias de reclusão, em regime aberto, por sentença proferida em 2018, já transitada em julgado, junto a outros dois indivíduos, como incursa nos artigos 171, §3° e caput e 171, §3° e caput c.c. art. 14, II, na forma do artigo 71, todos do Código Penal c.c. artigo 297, caput, na forma do artigo 69, ambos do Código Penal, pela utilização de documento falso e obtenção de empréstimos consignados na agência da CEF em Caieiras, em 28 e 29/08/2014, em nome de três beneficiários do INSS (ID 322891125 – 5000466-05.2024.4.03.6124). Portanto, os elementos de prova acima apontados demonstram que a denunciada ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS, de data inicial desconhecida, mas ao menos a partir do ano de 2021 até o dia 25/06/2024 (deflagração da fase ostensiva da operação), integrou pessoalmente organização criminosa voltada para a prática de reiterados crimes de estelionato contra instituições financeiras, incluindo a CEF, e inúmeros aposentados e pensionistas, auferindo elevadas quantias advindas das fraudes, praticando o crime do artigo 2º, caput, da Lei 12.850/2013. 3.2. EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ, filha da codenunciada ANDREA e sobrinha de VANESSA DEMETRIO DE SÁ MACEDO, também integra o núcleo intermediário do grupo criminoso. EVELYN também é parceira do codenunciado TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA e, junto a este e sua genitora ANDREA, atua em favor do esquema criminoso de forma consciente, fornecendo suas contas bancárias para movimentação dos valores advindos dos crimes e auxiliando na abertura de contas em agências bancárias mediante uso de documentos falsos. Neste sentido, na conversa interceptada sob registro de ID 173386199, EVELYN mantém conversa com interlocutora que a chama de filha, indicando se tratar de ANDREA, a respeito da prática de nova fraude para “levantar um dinheiro”, relacionada à abertura de conta em agência da CEF de Porto Ferreira/SP, sugerindo se tratar de “bom” lugar para a fraude. EVELYN afirma à mãe que, posteriormente, ela deveria retirar o “cartão de INSS” na residência de algum conhecido, especificamente com caixa de correio de modelo antigo apresentando documento (provavelmente falso), citando que fraude parecida teria sido praticada anteriormente por alguém denominado “VITOR”. Por fim, ANDREA menciona à EVELYN que tentou realizar “uns dez” (provavelmente outras dez fraudes) com outra mulher, mas apenas um deu certo. No mesmo contexto, dois dias antes do registro acima, foi captada conversa (ID 173030474) em que o denunciado TIAGO, parceiro de EVELYN, planeja junto a uma mulher não identificada a prática de fraude envolvendo benefício previdenciário e documento falso (“estudar RG”), possivelmente concretizada no dia 13/06/2024 em local próximo à Porto Ferreira/SP (ID 328852963 - Pág. 16/21 – 5000607-24.2024.4.03.6124), mesmo município citado por EVELYN na ligação citada anteriormente. EVELYN recebeu de THALITA MIRANDA ALCARAZ (núcleo avançado), aproximadamente, R$ 22.700,00, entre 26/08/2022 e 01/06/2023. A denunciada também recebeu da conta de Terezinha Demetrio de Sá, genitora de ANDREA e VANESSA, de 11/10/2022 a 13/06/2023, aproximadamente R$ 66.560,00, transferindo a ela o total de R$ 50.142,00 (ID 321346669 - Pág. 95/96 – 5000466-05.2024.4.03.6124). Ainda, na busca e apreensão judicialmente deferida na residência desta denunciada e seu esposo TIAGO (DOC. 4 anexo) foram arrecadados dois Iphones Pro Max (modelo 14 e 15), outros 2 (dois) telefones celulares e um veículo Audi Q3, ano 2016/2017, em nome de TIAGO. As diligências revelaram, ainda, que o imóvel, apesar de localizado em bairro de classe média baixa, foi recentemente reformado, contando com duas suítes grandes, área de lazer, sala de TV, cozinha ampla com armários planejados, TV 50" e eletrodomésticos de bom padrão, como geladeira duplex. Esse fato demonstra que a atividade ilícita dos denunciados tem se mostrado rentável. Nesse contexto, o padrão das movimentações bancárias e dos bens apreendidos é totalmente incompatível com as informações de renda de EVELYN, considerando que não foram localizados vínculos empregatícios em seu nome, bem como que a investigada consta como beneficiária de auxílio emergencial (ID 321346669 - Pág. 97 – 5000466- 05.2024.4.03.6124). Tratam-se, portanto, de produtos advindos dos crimes praticados. Desta forma, os elementos de prova acima apontados demonstram que a denunciada EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ, de data inicial desconhecida, mas ao menos a partir do ano de 2021 até o dia 25/06/2024 (deflagração da fase ostensiva da operação), integrou pessoalmente organização criminosa voltada para a prática de reiterados crimes de estelionato contra instituições financeiras, incluindo a CEF, e diversos aposentados e pensionistas, auferindo elevadas quantias advindas das fraudes, incorrendo, portanto, na conduta típica descrita no artigo 2º, caput, da Lei 12.850/2013. 3.3. TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA, conforme citado, atua junto à sua parceira EVELYN em favor do esquema criminoso, de forma consciente, fornecendo suas contas bancárias para movimentação dos valores advindos dos crimes e auxiliando na abertura de contas em agências bancárias mediante uso de documentos falsos. Conversas interceptadas após autorização judicial apontam que TIAGO e EVELYN planejaram a prática de fraude envolvendo abertura de conta e benefício previdenciário, possivelmente concretizada em agência bancária da CEF na cidade de Porto Ferreira/SP (ID 328852963 - Pág. 16/21 e 24/27 – 5000607-24.2024.4.03.6124). Cite-se, neste sentido, a ligação de registro 17303047410, por meio da qual o denunciado TIAGO conversa com interlocutora que chama de “tia”,11 planejando encontrá-la na manhã do dia seguinte em local referenciado como “Dom Bosco” para entregá-la uma colinha relacionada à “benefício”, mencionando que ela deveria “estudar” o “RG” e o “comprovante” pessoalmente. Na manhã do dia seguinte à ligação (13/06/2024), a ERB do celular de TIAGO estava próxima à localização da estação de metrô Dom Bosco, em São Paulo/SP (ID 328852963 - Pág. 6). Em paralelo, no mesmo dia 13/06/2024, o terminal que manteve a citada conversa com TIAGO registrou localizações de ERB, a partir das 10h, em Limeira/SP, se deslocando próximo a Porto Ferreira/SP (mesma cidade citada por EVELYN em conversa captada um dia depois – ligação de ID 173386199) perto das 12h e retornando à São Paulo/SP por volta das 15h (ID 329260116 - Pág. 17/19 – 5000607-24.2024.4.03.6124). Poucos dias após, TIAGO manteve conversa com a mesma interlocutora (registro 17442357412) informando que conseguiu desbloquear determinado cartão e que até as oito horas da manhã chegaria uma senha para “tia”. Ainda, foram identificadas diversas transações bancárias de altos valores, sem origem comprovada, entre o denunciado TIAGO e outras integrantes ligadas ao comando/topo da organização criminosa. Neste sentido, entre 19/08/2022 e 12/06/2023, TIAGO recebeu das contas de THALITA MIRANDA ALCARAZ, aproximadamente, R$ 230.830,00, enviando àquela investigada a quantia aproximada de R$ 81.900,00. O denunciado também recebeu de Terezinha Demetrio de Sá, genitora de ANDREA E VANESSA, entre 01/08/2022 e 27/04/2023, aproximadamente R$ 100.600,00, enviando a ela o total de R$ 53.948,93 (ID 321346669 - Pág. 88/93 e 96 – 5000466-05.2024.4.03.6124). Tratam-se de valores advindos dos crimes praticados. [...] Nesse contexto, o padrão das movimentações bancárias e dos bens apreendidos é totalmente incompatível com as informações de renda de TIAGO, considerando que ele não declarou receitas ao Fisco nos anos de 2022, 2023 e 2024 (DOC. 5 anexo), além de que não foram localizados vínculos empregatícios recentes ou empresas em seu nome e que ele consta como beneficiário de auxílio emergencial (DOC. 6 anexo). Vale destacar que o denunciado possuía dois veículos simples (GM Corsa antigo e VW Gol) e, exatamente no período de operação da ORCRIM, adquiriu um Audi Q3. Tratam-se, portanto, de produtos advindos dos ilícitos praticados. Desta forma, os elementos de prova acima apontados demonstram que o denunciado TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA, de data inicial desconhecida, mas ao menos a partir do ano de 2021 até o dia 25/06/2024 (deflagração da fase ostensiva da operação), integrou pessoalmente organização criminosa voltada para a prática de reiterados crimes de estelionato contra instituições financeiras, incluindo a CEF, e diversos aposentados e pensionistas, auferindo elevadas quantias advindas das fraudes, incorrendo, portanto, na conduta típica descrita no artigo 2º, caput, da Lei 12.850/2013. 3.4. WESLEY SILVIO BESSA WESLEY SILVIO BESSA é sobrinho de RITA DE CASSIA BESSA (núcleo avançado), com quem reside, e atua no esquema criminoso desenvolvido fornecendo suas contas-correntes para os membros de alto escalão para recebimento e repasse de valores advindos dos ilícitos praticados. Este denunciado figura como investigado/envolvido em, ao menos, 7 (sete) inquéritos policiais com a finalidade de apurar crimes de estelionato qualificados contra a CEF, praticados com o mesmo modus operandi dos narrados anteriormente. Em todos os procedimentos, WESLEY foi identificado como beneficiário de parte dos valores provenientes dos empréstimos consignados realizados mediante uso de documentos falsos em nome das vítimas (ID 321346669 - Pág. 111/114 – 5000466-05.2024.4.03.6124). São eles: a) 2022.0016203 – DPF/CAS/SP (PJe 5001339-76.2022.4.03.6123): investiga a abertura de conta mediante documentos falsos em nome de Renato Brandão Cruz Filho e contratação de empréstimo no valor de R$ 35.144,50, no dia 16/12/2021. Após, foram realizadas transferências para vários destinatários, dentre eles WESLEY; b) 2022.0073401 – DPF/SJK/SP (PJe 5000218-39.2023.4.03.6103): apura a abertura de conta em nome de diversos beneficiários do INSS mediante uso de documento falso. WESLEY foi beneficiário de transferências advindas de algumas dessas contas; c) 2022.0037704 – DPF/RPO/SP (PJe 5004041-58.2022.4.03.6102): apura a abertura de conta com documento falso em nome de Juliana Bongiovani Diniz Chiga e contratação de empréstimos consignados com posterior transferência de valores para vários destinatários, dentre eles WESLEY e sua tia RAMISSAYANE STHEFANY DA SILVA BESSA (irmã de RITA DE CASSIA BESSA). A advogada Neusa Schneider14 (OAB/SP 149.438) atua na defesa desses investigados neste procedimento; d) 2022.0026091 – DPF/AQA/SP (PJe 5000987-45.2022.4.03.6115): apura a abertura de conta-corrente mediante uso de documento falso em nome da aposentada Célia Isabel Gardim Ghizzi e obtenção de empréstimo fraudulento. Novamente, WESLEY consta como beneficiário de parte dos valores depositados nessa conta; e) 2022.0069677 – DPF/BRU/SP: investiga a abertura de conta mediante de documento falso em nome de beneficiário do INSS e contratação de empréstimo consignado. WESLEY foi beneficiário de parte dos valores desviados. A advogada Neusa Schneider atuou neste procedimento em defesa de SABRINA BESSA DOS SANTOS, parente daquele denunciado e também beneficiária de parte dos valores obtidos com o ilícito. f) 2022.0062902 – DPF/RPO/SP: investiga a abertura de conta em nome da vítima Jeanne Batista Pinheiro para transferência de recebimento do benefício previdenciário para essa conta e contratação de dois empréstimos consignados fraudulentos. WESLEY também foi destinatário de parte dos valores advindos desta fraude. g) 2022.0066518 – DPF/AQA/SP: apura a abertura de conta em nome da vítima Denise Mecunhe Rosa para transferência de recebimento do benefício previdenciário para essa conta e contratação de dois empréstimos consignados fraudulentos. WESLEY recebeu R$ 79.321,22 em sua conta, advindos desta fraude. Somente em decorrência das fraudes contra aposentados/pensionistas identificadas e levantadas pela CEF, a conta de WESLEY recebeu o total de R$ 211.097,02 (Ofício nº 38/2023/CEFRA/DF - ID 322134146 - Pág. 28 – 5000466-05.2024.4.03.6124). As diligências obtidas após o cumprimento das buscas e apreensões revelaram que WESLEY reside no mesmo imóvel que RITA DE CÁSSIA BESSA, uma das chefes da ORCRIM, onde foram localizados e apreendidos diversos documentos relacionados as práticas delitivas narradas (DOC. 7 anexo)15. Portanto, os elementos de prova acima apontados demonstram que o denunciado WESLEY SILVIO BESSA, de data inicial desconhecida, mas ao menos a partir do ano de 2021 até o dia 25/06/2024 (deflagração da fase ostensiva da operação), integrou pessoalmente organização criminosa voltada para a prática de reiterados crimes de estelionato contra instituições financeiras, incluindo a CEF, e diversos aposentados e pensionistas, auferindo elevadas quantias advindas das fraudes, incorrendo, assim, na conduta típica descrita no artigo 2º, caput, da Lei 12.850/2013. Em 04.11.2024 o juízo de origem revogou a prisão preventiva de EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SA e WESLEY SILVIO BESSA, fixando, em substituição, outras medidas cautelares (ID 312634346). A sentença foi publicada em 17.12.2024. (ID 312634364) Em seu recurso (ID 312634374), a defesa de WELSEY pede a sua absolvição com base no art. 386, VII, do Código de Processo Penal, argumentando que a condenação foi baseada unicamente em prova colhida na fase investigatória, em ofensa ao disposto no art. 155 do Código de Processo Penal. Caso mantida a condenação pede: i) a fixação da pena-base no mínimo legal; ii) o reconhecimento da circunstância atenuante da confissão espontânea (CP, art. 65, III, “d”) ; iii) o reconhecimento da circunstância atenuante da menoridade (CP, art. 65, I – nascido em 15.05.2002); iv) a fixação do regime inicial aberto para cumprimento da pena privativa de liberdade. Foram apresentadas contrarrazões (ID 312634383). Ao interpor o recurso de apelação, a defesa de ANDREA requereu a apresentação das suas razões nos termos do art. 600, § 4º, do Código de Processo Penal. Nestas (ID 312772705), pede, preliminarmente, a revogação do mandado de prisão expedido. No mérito, pede a sua absolvição pela aplicação do princípio da insignificância e por não haver prova da existência de vínculo com a organização criminosa. Caso mantida a condenação, pede: i) a fixação da pena-base no mínimo legal; ii) a fixação do regime semiaberto para início do cumprimento da pena privativa de liberdade; iii) a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita. Em cumprimento à decisão proferida no Habeas Corpus nº 5033888-10.2024.4.02.0000, de minha relatoria, foi expedido alvará de soltura em favor de TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA, o qual foi cumprido em 06.02.2025 (ID 314391770). A defesa conjunta de EVELYN e TIAGO ao interpor o recurso de apelação requereu a apresentação das suas razões nos termos do art. 600, § 4º, do Código de Processo Penal. Nestas (ID 314391769), pede, preliminarmente, seja decretada a nulidade da sentença em razão da incompetência do juízo ou, se afastada, que seja reconhecida a nulidade das provas produzidas por meio do afastamento do sigilo das comunicações telefônicas e telemáticas ou, ainda, que seja oferecido ANPP. Quanto ao mérito das imputações, pede que os apelantes sejam absolvidos (i) por inexistência de prova do crime de participação em organização criminosa; (ii) não comprovação de dolo e (iii) atipicidade das condutas. Subsidiariamente, pede a fixação da pena-base no mínimo legal; sejam suas participações nos crimes consideradas de menor importância; o desconto do tempo de prisão provisória e a fixação do regime inicial aberto para cumprimento da pena privativa de liberdade e a substituição desta por penas restritivas de direitos, mantendo-se a liberdade provisória. Pedem, ainda, a concessão da gratuidade de justiça com a isenção no pagamento da multa. A Procuradoria Regional da República opinou pelo desprovimento dos recursos (ID 315062861). É o relatório. À revisão. PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 11ª Turma APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 5000872-26.2024.4.03.6124 RELATOR: Gab. 40 - DES. FED. NINO TOLDO APELANTE: ANDREA DEMETRIO DE SA SANTOS, EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SA, TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA, WESLEY SILVIO BESSA Advogado do(a) APELANTE: CLEMERSON MISAEL DOS SANTOS - SP317298-A Advogado do(a) APELANTE: WELLINGTON SILVA CAMPOS - SP438093-A Advogado do(a) APELANTE: CESAR RENATO FLORINDO - SP405260-A APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NINO TOLDO (Relator): Trata-se de apelações interpostas por ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS, EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ, TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA e WESLEY SILVIO BESSA em face da sentença que, no âmbito da denominada Operação Anonymous, os condenou pela prática do crime de organização criminosa (art. 2º, caput, da Lei 12.850/2013). Inicialmente, anoto que a ausência de contrarrazões pela acusação não implica nulidade (CPP, art. 565), conforme pacífico entendimento desta Turma: ApCrim nº 001596-27.2016.4.03.6102, Rel. Des. Federal Nino Toldo, j. 28.7.2023, Publicação 02.8.2023; ApCrim nº 0004816-12.2009.4.03.6104, Rel. Des. Federal Nino Toldo, j. 31.3.2023, Publicação 10.4.2023; ApCrim nº 0003067-39.2018.4.03.6105, Rel. Des. Federal José Lunardelli, j. 09.02.2024, Publicação 15.02.2024; ApCrim nº 0003067-39.2018.4.03.6105, Rel. Des. Federal José Lunardelli, j. 09.02.2024, Publicação 15.02.2024. Incompetência do juízo A defesa comum de EVELYN e TIAGO alega, preliminarmente, a incompetência da 1ª Vara Federal de Jales para processar e julgar o feito, argumentando que a competência deve ser definida pelo local de domicílio da vítima, nos termos do art. 70, § 4º do Código de Processo Penal. Por isso, pede seja reconhecida a nulidade da sentença, remetendo-se os autos ao "Juízo Federal da Comarca de Guarujá" [sic]. Sem razão. O art. 70, § 4º, do Código de Processo Penal (CPP) dispõe: Art. 70. A competência será, de regra, determinada pelo lugar em que se consumar a infração, ou, no caso de tentativa, pelo lugar em que for praticado o último ato de execução. [...] § 4º Nos crimes previstos no art. 171 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal ), quando praticados mediante depósito, mediante emissão de cheques sem suficiente provisão de fundos em poder do sacado ou com o pagamento frustrado ou mediante transferência de valores, a competência será definida pelo local do domicílio da vítima, e, em caso de pluralidade de vítimas, a competência firmar-se-á pela prevenção. (Incluído pela Lei nº 14.155, de 2021) A Justiça Federal de Jales era competente para processar e julgar a ação penal, pois não se trata, no caso da hipótese prevista no § 4º do art. 70 do CPP. A propósito, destaco o seguinte trecho do parecer da Procuradoria Regional da República (ID 315062861): Todavia, deve ser rejeitada a alegação de incompetência da Justiça Federal, pois a investigação se iniciou para apurar notícia encaminhada pela agência da CEF de Auriflama, no sentido de que um terceiro então não identificado, no dia 13/07/2022, promoveu a abertura de conta-corrente naquela agência em nome de Antônio Carlos dos Santos (CPF nº 038.607.988-98), residente em Guarujá/SP, efetuando a transferência fraudulenta do benefício previdenciário da vítima e a contratação de empréstimos consignados para desconto no referido benefício, sendo que a conduta investigada configura estelionato qualificado contra a Caixa Econômica Federal. Assim, aplicando a regra prevista no caput do artigo 70 do Código Penal, tem-se que o Juízo da 1ª Vara Federal de Jales é o competente para o processamento do feito, visto que o crime foi consumado no momento da obtenção da vantagem ilícita, que ocorreu na cidade de Auriflama/SP. Portanto, tendo se consumado o crime no momento da obtenção da vantagem ilícita, a regra aplicável é a do do art. 70, caput, do CPP. Observo, por oportuno e para fins didáticos, que não existem comarcas na Justiça Federal e a cidade de Guarujá encontra-se na jurisdição da Subseção Judiciária de Santos. Rejeito, enfim, a preliminar de incompetência da 1ª Vara Federal de Jales. Nulidade das provas: afastamento do sigilo das comunicações telefônicas A defesa comum de EVELYN e TIAGO também pede a declaração de nulidade das provas obtidas por meio do afastamento do sigilo das comunicações telefônicas e telemáticas. Sem razão. O caso concreto em exame reflete, de forma clássica, aquelas situações em que a medida excepcional da interceptação das comunicações telefônicas mostra-se imprescindível para a obtenção da prova. No curso das investigações ficou comprovada a existência de uma organização criminosa estruturada e articulada, especializada em efetuar fraudes contra instituições financeiras, inclusive a Caixa Econômica Federal (CEF), em vários municípios do país, em sua maioria no estado de São Paulo, tendo sido deferido pelo juízo competente o afastamento do sigilo das comunicações telefônicas e telemáticas, bem como a interceptação telefônica dos terminais relacionados às pessoas investigados identificadas, nos autos de Interceptação Telefônica nº 5000607-24.2024.4.03.6124, com observância de todas as garantias constitucionais (princípios do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório). Portanto, rejeito a alegação de nulidade. Princípio da insignificância A defesa de ANDREA pede a sua absolvição pela aplicação do princípio da insignificância, argumentando que os valores movimentados na sua conta são ínfimos quando comparados às quantias movimentadas pelos demais envolvidos (R$ 13.165,00). Sem razão. Não é aplicável o princípio da insignificância em crime de organização criminosa, pois o bem jurídico tutelado é a fé pública e, segundo jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça (STJ), esse princípio não se aplica a crimes dessa natureza. Nesse sentido: PENAL E PROCESSO PENAL. ESTELIONATO PREVIDENCIÁRIO. ARTIGO 171, §3º, DO CP. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. TESE DE QUE A NATUREZA PERMANENTE DO DELITO IMPEDE O RECONHECIMENTO DA CONTINUIDADE DELITIVA. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. Na hipótese dos autos, não é possível o reconhecimento do princípio da insignificância, já que o acórdão impugnado encontra-se em consonância com o entendimento desta Corte Superior, consolidado no sentido de que, no delito tipificado no art. 171, § 3º, do Código Penal, não se aplica o princípio da insignificância, "uma vez que a conduta ofende o patrimônio público, a moral administrativa e a fé pública, bem como é altamente reprovável" (RHC n. 61.931/RS, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, Quinta Turma, DJe 15/2/2016) (AgRg no HC n. 913.137/DF, de minha relatoria, Quinta Turma, julgado em 16/9/2024, DJe de 18/9/2024.). 2. A tese de que a natureza permanente do crime de Estelionato Previdenciário obsta o reconhecimento da continuidade delitiva não foi objeto de debate pela instância ordinária, o que inviabiliza o conhecimento do recurso especial por ausência de prequestionamento. Incide ao caso a Súmula n. 282/STF. 3. Agravo regimental não provido. (AgRg no AgRg no AREsp n. 2.747.808/MG, Quinta Turma, Relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, j. 27.11.2024, DJEN de 04.12.2024) PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. INSERÇÃO DE ASSINATURA FALSA EM DOCUMENTO PÚBLICO CARACTERIZA O DELITO DO ART. 297 DO CP. NÃO CABIMENTO DA DESCLASSIFICAÇÃO PARA FALSIDADE IDEOLÓGICA. NÃO INCIDÊNCIA DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA EM CRIMES CONTRA A FÉ PÚBLICA. PRECEDENTE. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. A inserção de assinatura falsa em documento público ou particular caracteriza ilícito material de perigo abstrato e prescinde de resultado concreto ou de finalidade específica (dolo). Precedente. 2. O princípio da insignificância não é aplicado aos delitos cujo bem tutelado seja a fé pública. Precedente. 3. Agravo regimental não provido. (AgRg no AREsp 1134866/SP, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 10/08/2021, DJe 16/08/2021) Portanto, rejeito a pretensão de aplicação do princípio da insignificância ao caso. Acordo de não persecução penal (ANPP) A defesa comum de EVELYN e TIAGO, em suas razões de apelação, alega que o não oferecimento de ANPP, desacompanhado de motivação idônea, constitui nulidade absoluta e, em razão disso, pede a declaração de nulidade processual desde a negativa do Ministério Público Federal (MPF) em oferecê-lo. Pois bem. O ANPP pode ser celebrado entre o Ministério Público e o autor do delito desde que atendidos os requisitos expressamente previstos no art. 28-A, caput, do Código de Processo Penal, ou seja, (i) confissão formal e circunstanciada por parte do acusado, (ii) infração penal cometida sem violência ou grave ameaça, (iii) com pena mínima inferior a 4 (quatro) anos e (iv) que a medida a ser aplicada seja necessária e suficiente para reprovação e prevenção do crime. Trata-se de instituto resultante de acordo de vontades entre o Ministério Público e o imputado e sua defesa, objetivando dar solução negociada a casos cuja origem sejam crimes de menor gravidade. No caso, o MPF, ao oferecer a denúncia, deixou de propor ANPP pelos seguintes motivos (ID 312633703): Deixo de propor o benefício do Acordo de Não Persecução Penal – ANPP (artigo 28-A, do Código de Processo Penal) aos denunciados, uma vez que o acordo não afigura-se suficiente à reprovação e prevenção do crime. Tratase de infração penal altamente gravosa – Organização Criminosa – prevista em tratados e convenções internacionais como infração a que o Brasil se comprometeu a punir de maneira efetiva. Além disso, foi cometida em concurso com inúmeros estelionatos qualificados (art. 171, § 3º, do Código Penal), o que suplantaria o requisito de pena mínima de 4 (quatro) anos, e que causou prejuízos milionários, em especial a idosos e pessoas vulneráveis. A defesa requereu a intimação do MPF para oferecer proposta de ANPP (ID 312633782) e o MPF reiterou sua manifestação pelo não cabimento do benefício (ID 312633791). Ante essa recusa em oferecer (de forma motivada) o ANPP, os acusados (por sua defesa técnica) tinham o direito de requerer a remessa dos autos ao órgão superior do Ministério Público, nos termos do § 14 do art. 28-A do Código de Processo Penal. Todavia, não o fizeram, conforme se depreende do exame dos autos, tendo ocorrido a preclusão. Além disso, a jurisprudência firmou-se no sentido de que o ANPP não constitui direito subjetivo do acusado, podendo ser proposto pelo Ministério Público quando considerar necessário e suficiente à reprovação e prevenção da infração penal, o que não se verificou no caso. Nesse sentido: STF, HC nº 195.725/SP, Rel. Ministro Alexandre de Moraes, decisão monocrática proferida em 28.01.2021, publicada em 01.02.2021 e transitada em julgado em 12.02.2021. Portanto, a pretensão ao ANPP foi alcançada pela preclusão, razão pela qual não acolho o pedido. Mérito da imputação ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS A defesa de ANDREA pede a sua absolvição, argumentando que foram realizados apenas alguns depósitos em sua conta, em curto intervalo de tempo, o que não configura a estabilidade e a permanência exigidas para a tipificação do crime de organização criminosa. Sem razão. ANDREA é irmã de Vanessa Demetrio de Sá Macedo (apontada como integrante do núcleo avançado, alto escalão da organização criminosa), mãe de EVELYN e sogra de TIAGO. Integrava o núcleo intermediário da organização criminosa, fornecendo sua conta bancária para a movimentação de valores obtidos a partir da abertura de contas com uso de documentos falsos e tendo, desse modo, plena consciência da origem ilícita dos valores que passavam na sua conta. Nas alegações finais que apresentou ao juízo, o MPF transcreveu trechos de uma conversa interceptada (com autorização judicial) que reforçam a participação da acusada na prática criminosa. Além disso, em seu interrogatório em juízo, ela declarou apenas que desconhecia essas conversas, mas confirmou que Elcio Gonçalves dos Santos é seu esposo e o terminal de onde partiram essas conversas está registrado em seu nome. Destaco, sobre isso, o seguinte trecho das alegações finais (ID 312634358): Conversa interceptada após autorização judicial reforça participação desta acusada no esquema criminoso. Trata-se do registro 1733861992 , mantido entre as corrés EVELYN (TMC 11 96970-0480) e ANDREA (TMC 11 96070-2799). Abre-se um parêntese para registrar que o terminal 11 96070-2799 está registrado em nome de Elcio Goncalves dos Santos (CPF 308.118.578-59), esposo de ANDR EA , conforme confirmado por ela em interrogatório nesta ação (ID 343998818 - aos 00m55s), o que corrobora por definitivo que era utilizado por esta acusada na oportunidade do registro. O assunto da citada conversa refere-se à prática de nova fraude para “levantar um dinheiro”, relacionada à abertura de conta em agência da CEF de Porto Ferreira/SP, que EVELYN sugere se tratar de “bom” lugar para a fraude. Trata-se, como visto, de ação típica do modo de operação da organização criminosa, consistente na abertura de contas fraudulentas em agências da Caixa localizadas no interior do Estado de São Paulo. No registro, ainda, EVELYN afirma à mãe que, posteriormente, ela deveria retirar o “cartão de INSS” na residência de algum conhecido, especificamente com caixa de correio de modelo antigo apresentando documento (provavelmente falso), citando que fraude parecida teria sido praticada anteriormente por alguém denominado “VITOR”. Por fim, ANDREA menciona a EVELYN que tentou realizar “uns dez” (provavelmente outras dez fraudes) com outra mulher, mas apenas um deu certo. Segue o registro captado, na íntegra: Alvo: EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ Nº Interceptado: (11)96970-0480 Assunto: Evelyn X MNI Mãe (Andrea) - Conversa sobre possível fraude na Caixa Nº Contato: (11) 96070-2799 ID: 173386199 Data: 14/06/2024 18:30:18 Duração: 00:15:0 Arquivo: 01_19_173386199_20240614183018_20366507 Tipo: Áudio Degravação: MNI: Oi agora posso falar, Não, é porque assim, eu uso o aplicativo, está no meu celular. Aí eu falo com vocês pelo do Kinder. Mas aí quando a gente chega no lugar que a gente dispensa a abertadoria, aí eu pego o celular do Kinder, põe no GPS para até encontrar um produto para a gente pegar novamente, entendeu? Ai eu não posso usar nenhum dos dois… EVELYN: Então.. (inaudível) para falar com o povo MNI: Não, é então, eu estou com o telefone lá para me passar o meu zap para o outro telefone... é, porque eu tenho que andar com três telefones, não tem jeito. (…) [00:11:07:138] Evelyn: Por falar nisso, não tem nenhum documento do velho pronto que você possa levar? MNI: Não ele foi viajar e ele não quer trabalhar mais né filha EVELYN: Porque tem um caixa boa em Porto Feliz.. Em Porto Ferreira.. Pra senhora levantar hoje, só pra levantar um dinheiro.. você faz no caixa aqui, depois vai na agência MNI: Ah, nem precisa abrir conta? EVELYN: Não, você abre a conta no caixa aqui, aí depois de três dias chega a mensagem, você vai na agência e pode assinar e põe a senha. MNI: Aham. E está dando dinheiro isso aí? EVELYN: Tá, e o cartão tem que chegar em qualquer endereço da cidade, você não pode pegar no correio nem no banco. Aí você pega, aí tem que você olha no Google Maps, uma casa que tem aquele carteiro antigo, um correio antigo, sabe, colocar a carta? mas aqueles antigos que você consiga abrir. Aí põe lá dentro e você passa e pega na casa da pessoa mesmo MNI: Aham, ave essa parte é arriscada EVELYN: Mas aí você geralmente faz amizades com as pessoas, eu nunca peguei, quem pegou foi VITOR, ai ele fez a amizade com uma mulher lá e a mulher lá foi e entregou para ele MNI: Tem que ter sangue, porque eu não tenho. EVELYN:É o funcionário que faz isso doida, não é você não tem que ir para o documento, tipo se a pessoa perguntar " Ah, mas e seu nome?", ai "Tá aqui meu documento para você ver que sou eu mesmo, é porque meu cartão (inaudível), acabei de me aposentar, então pensa, eu to sem cartão e até eles trocar eles falaram que demora até trinta dias para chegar... que foi um erro de digitação dele", ai o velho que fala, não é você... MNI: Ata, que susto EVELYN: Ai como geralmente os velhos fazem amizade com outros velhos ai acaba dando.. você sabe que é cartão de INSS ta no nome da pessoa, mostra o documento, entendeu? MNI: Então não, é se voce ta com o documento e prova para pessoa que você é você, não tem problema EVELYN: Então se a senhora tivesse a senhora poderia fazer MNI: É mas não tenho e ele foi viajar EVELYN: Até aquela sua velha burra daria para fazer MNI: Ah deus me livre... não tenho paciência para ela não EVELYN: Não faz nada, ela só senta na mesa a mulher faz tudo lá, espera chega a mensagem, com três dias chega, vai na agência, só assina e pronto… MNI: Ah não, mas ela é uma pessoa muito negativa... No entanto que eu fiz uns dez com ela deu um só. ANDREA recebeu R$ 13.165,00 (treze mil cento e sessenta e cinco reais) de uma conta fraudulenta criada por Daniel Marcelino (integrante do núcleo base) e VANESSA, sua irmã, também recebeu dinheiro dessa conta. Declarou em juízo que esse dinheiro havia sido pagamento pela venda de mercadorias do seu restaurante, que encerrou as atividades durante a pandemia de Covid-19, mas não soube explicar por que sua irmã também recebera dinheiro da mesma pessoa. Consta dos autos a transcrição de uma conversa com uma mulher não identificada, que a orientou a “não sair do buraco”, ou seja, para que permanecesse foragida. Destaco da sentença o seguinte trecho (ID 312634364): A conversa interceptada nos autos nº 5000607-24.2024.403.6124, referente à conversa mantida após a deflagração da operação entre ANDREA e a interlocutora que a orienta a “não sair do buraco”, corrobora os indícios de que ANDREA é integrante da organização criminosa e mantém relação com os demais membros da organização, como se observa na íntegra do registro, extraído do Auto Circunstanciado 02 (ID 339389916): Alvo: ANDREA DEMETRIO DE SA Nº Interceptado: (11)96070-2799 Assunto: Andrea X MNI - Ta tudo com prova / Vanessa entra com pedido que ela tá grávida / Ta todo mundo na mesma cela Nº Contato: (11)97340-8340 ID: 174759445 Data: 25/06/2024 16:18:46 Duração: 00:03:43 Arquivo: 01_125_174759445_20240625161846_20367982 Tipo: Áudio Degravação: MNI: Ai então amiga, tá assim né, o que eu te relatei é o que é, é a sua mãe, você, a talita e a vanessa ai tem os intermediarios que é o gabriel a milena, tem esse menino da caixa e é isso Andrea: E esse negócio de conta ai é, foi a movimentação de transferências MNI: Tudo com prova, tudo com provas... As fotos em rede social... É melhor você ficar no buraco mesmo Andrea: Meu deus do céu e ninguém vai ter audiência hoje né? MNI: Então pode ser que já esteja até tendo… Interrogada em Juízo, ANDREA negou os fatos imputados na denúncia (cf. ID 343998815), que não integra nenhum esquema para a prática de crimes e não possui proximidade com sua irmã VANESSA. Indagada sobre os valores recebidos em sua conta-corrente, entre 29/10/2021 e 25/11/2021, alegou que foram decorrentes da venda das “coisas” que guarneciam o restaurante da interrogada, que faliu na pandemia, para um “rapaz”; não soube explicar, contudo, porque sua irmã VANESSA também recebeu valores daquela conta. Confirmou que é casada com Elcio Gonçalves dos Santos. Sobre a conversa com EVELYN, para levantar dinheiro, afirmou que desconhece a conversa e que não mantém proximidade com EVELYN e nem com TIAGO. A versão apresentada pela ré de que não mantém proximidade com EVELYN e TIAGO se infirma diante da conversa interceptada, na qual restou demonstrado que tratavam de novo esquema fraudulento, a ser praticado em face da agência da CEF de Porto Ferreira/SP. Restou comprovado ainda que entre os membros do grupo criminoso havia uma divisão de tarefas, sendo que a ré, membro do núcleo intermediário, fornecia suas contas como “contas de passagem”, além de receber os valores advindos das fraudes e repassava-os para o comando da organização. A ciência a respeito da prática de atos ilícitos também é inequívoca, consoante o teor das conversas interceptadas. Por conseguinte, diante de todo o explanado, entendo que houve in casu a incidência da norma penal incriminadora aventada na denúncia, pois a ré, de data inicial desconhecida, mas ao menos a partir do ano de 2021 até o dia 25/06/2024 (deflagração da fase ostensiva da operação), integrou pessoalmente organização criminosa voltada para a prática de reiterados crimes de estelionato em face de instituições financeiras, notadamente a CEF. Portanto, tenho por provado que a apelante integrava organização criminosa voltada à prática de crimes de estelionato contra instituições financeiras, dentre as quais a CEF, e, por isso, mantenho a condenação de ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS pela prática do crime previsto no art. 2º, caput, da Lei nº 12.850/2013, nos termos da denúncia. EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ e TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA Examino em conjunto a situação desses dois apelantes, que têm defesa comum, a qual pede sejam eles absolvidos porque, segundo alega, “em nenhum momento ficou comprovado que os valores movimentados nas contas dos apelantes foram originários das contas abertas de forma ilegal” e não estão presentes os requisitos necessários para caracterização de organização criminosa, principalmente pela ausência de estabilidade e permanência. Sem razão, contudo. EVELYN é filha da corré ANDREA e parceira do corréu TIAGO, bem como sobrinha de Vanessa Demétrio de Sá Macedo, tendo fornecido conscientemente suas contas bancárias para movimentação de valores obtidos por meio de fraudes. Ouvida em juízo, ela declarou que não tinha muito contato com a sua mãe, pois fora criada por sua tia (Vanessa), e que os valores que recebia da sua tia referiam-se ao seu trabalho como cuidadora do seu bisavô. Em relação à conversa sobre a fraude na agência da CEF em Porto Ferreira, simplesmente alegou que desconhecia isso. Contudo, destaco da sentença o seguinte trecho (ID 31263434364): A materialidade restou comprovada pelas conversas interceptadas nos autos nº 5000607-24.2024.403.6124, registro nº 173386199, dando conta de que EVELYN mantém conversa com sua mãe ANDREA, a respeito de uma nova fraude, para “levantar um dinheiro”, com a abertura de conta na agência da CEF de Porto Ferreira/SP. Pelo teor da conversa, percebe-se que EVELYN orienta ANDREA como deveria proceder para retirada do cartão do INSS, citando que a fraude teria sido praticada antes por uma pessoa de nome “VITOR”. Apurou-se, ainda, que EVELYN recebeu de THALITA MIRANDA ALCARAZ (núcleo avançado), aproximadamente, R$ 22.700,00, entre 26/08/2022 e 01/06/2023. A acusada também recebeu da conta de Terezinha Demetrio de Sá, movimentada por VANESSA, de 11/10/2022 a 13/06/2023, aproximadamente R$ 66.560,00, transferindo a ela o total de R$ 50.142,00 (ID 321346669 - p. 95/96 – 5000466-05.2024.4.03.6124). No cumprimento do mandado de busca e apreensão deferido pelo Juízo, nos autos nº 5000466-05.2024.4.03.6124, foram apreendidos dois Iphones Pro Max (modelo 14 e 15), outros 2 (dois) telefones celulares e um veículo Audi Q3, ano 2016/2017, em nome de TIAGO, esposo de EVELYN. As diligências realizadas na residência revelaram que o imóvel onde EVELYN reside com seu esposo foi recentemente reformado e possui móveis de alto padrão. Além disso, como destacou o MPF, o padrão das movimentações bancárias de EVELYN e dos bens apreendidos destoam das informações de sua renda, pois não foram encontrados vínculos empregatícios em seu nome, tão somente que fora beneficiária de auxílio emergencial (cf. ID 321346669, p. 97 dos autos nº 5000466-05.2024.4.03.6124). A Ré EVELYN, interrogada em Juízo, negou a imputação, afirmou que não mantém contato com sua mãe ANDREA e desconhece a conversa sobre nova fraude na agência da CEF em Porto Ferreira. Alegou que foi criada por sua tia VANESSA e era quem ajudava financeiramente a ré e seu bisavô. Que o dinheiro enviado para sua conta era porque cuidava de seu bisavô. Sobre o dinheiro recebido de THALITA declarou que, como VANESSA e THALITA eram sócias, recebeu o dinheiro de THALITA como ajuda de VANESSA. Indagada sobre o padrão de vida identificado, informou que ela e o marido TIAGO recebiam ajuda financeira da família do marido. Não é crível a versão apresentada por EVELYN de que recebia ajuda financeira de VANESSA para cuidar de seu bisavô, pois os registros das conversas interceptadas demonstram que a ré atuava conscientemente na organização criminosa, ciente das estratégias do esquema e fornecendo suas contas para movimentação de valores obtidos dos crimes. A defesa não apresentou novos elementos ou provas que pudessem comprovar que os valores recebidos eram destinados para os cuidados do bisavô e do filho de VANESSA. Como visto, observa-se que as escusas apresentadas pela acusada com o intuito de afastar sua autoria não se coadunam com os robustos elementos coligidos nos autos. Em relação a TIAGO, o MPF, em suas alegações finais, transcreveu trechos de uma conversa interceptada (com autorização judicial) que mostra a sua participação na atividade criminosa. Destaco dessa peça o seguinte trecho (ID 312634358): Conversas interceptadas após autorização judicial apontam que TIAGO e EVELYN planejaram a prática de fraude envolvendo abertura de conta e benefício previdenciário, provavelmente concretizada em agência bancária da CEF na cidade de Porto Ferreira/SP (ID 328852963 - Pág. 16/21 e 24/27 – 5000607-24.2024.4.03.6124). Cite-se, neste sentido, a ligação de registro 1730304746 , por meio da qual TIAGO (TMC 11 96818-0464) conversa com interlocutora que chama de “tia” (TMC 11 95883- 8983), planejando encontrá-la na manhã do dia seguinte em local referenciado como “Dom Bosco” para entregá-la uma colinha relacionada à “benefício”, mencionando que ela deveria “estudar” o “RG” e o “comprovante” pessoalmente. Segue a íntegra do diálogo: Alvo: TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA Nº Interceptado: (11) 96818-0464 Assunto: Tiago x MNI Tia - - Colinha no papel do benefício Nº Contato: (11) 95883-8983 ID: 173030474 Data: 12/06/2024 20:42:51 Duração: 00:02:16 Arquivo: 01_12_173030474_20240612204251_20364915 Tipo: Áudio Degravação: Tiago: Oi tia, tudo bem?... Tia deixa eu te falar para a senhora, amanhã, a senhora tem dinheiro no bilhete ai né? Tia: Tenho, dez reais Tiago: Amanhã a senhora consegue… ***Tiago fala fora da ligação*** Tiago: O vida, marca com ela seis e meia, sete horas, o Evelyn Tiago: Tia que horas a senhora chega lá? Seis e meia ou sete horas? Tia: Ah sete horas então… Tiago: Que amanhã eu vou acordar cedo também a sonsinha vai te levar , to indo buscar o carro com ela agora, consegui desbloquear esse inferno aqui… A senhora acha que vai precisar de colinha? Tia: É bom usar né, não tem como não usar, manda aquela colinha lá é rapidinho.. Não não precisa, pelos documentos eu já estudo, viu Tiago: Vou fazer a colinha pra senhora e mandar no papel do beneficio e ai o RG e o comprovante a senhora estuda pessoalmente Tia: Ta joia... Na dom bosco né? Tiago: Isso na dom bosco, ta bom? Sete horas Tia: Ta bom fio, ta marcado, sete horas eu to lá Tiago: Sete horas... dez pra sete eu já ligo pra senhora Na manhã do dia seguinte à ligação (13/06/2024), a ERB do celular de TIAGO estava próxima à localização da estação de metrô Dom Bosco, em São Paulo/SP (ID 328852963 - Pág. 6). Em paralelo, no mesmo dia 13/06/2024, o terminal que manteve a citada conversa com TIAGO registrou localizações de ERB, a partir das 10h00min, em Limeira/SP, se deslocando próximo a Porto Ferreira/SP (mesma cidade citada por EVELYN em conversa captada um dia depois – ligação de ID 173386199) perto das 12h00min e retornando à São Paulo/SP por volta das 15h00min (ID 329260116 - Pág. 17/19 – 5000607-24.2024.4.03.6124). Poucos dias depois, TIAGO manteve conversa com a mesma interlocutora (registro 1744235747) informando que conseguiu desbloquear determinado cartão e que até as oito horas da manhã chegaria uma senha para “tia”, indicando que a fraude combinada dias antes teria se concretizado efetivamente, conforme registro reproduzido abaixo: Alvo: TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA Nº Interceptado: (11)96818-0464 Assunto: Tiago X MNI "Tia" - liberando o aplicativo até umas oito horas sua senha chega Nº Contato: (11)95883-8983 ID: 174423574 Data: 20/06/2024 07:25:05 Duração: 00:01:15 Arquivo: 01_10_174423574_20240620072505_20364915 Tipo: Áudio Degravação: Tiago: Tia, bom dia, tudo bom? Já chegou? MNI Tia: Já, to aqui já Tiago: Tá, deixa eu te falar, to aqui em Itaquera aqui que eu vim desbloquear o cartão..consegui, ta bom? MNI Tia: Ah, ta joia Tiago: Ontem tava dando invalido ontem.. Ai to liberando o aplicativo tem que esperar trinta minutos ta bom? MNI: Ta joia, to aqui, vou sentar aqui no ponto de onibus Tiago: Ta bom, espera ai que até umas oito horas sua senha chega No mais, foram identificadas diversas transações bancárias de altos valores, sem origem comprovada, entre o corréu TIAGO e integrantes ligadas ao comando/topo da organização criminosa. Neste sentido, entre 19/08/2022 e 12/06/2023, TIAGO recebeu das contas de THALITA MIRANDA ALCARAZ, aproximadamente, R$ 230.830,00, enviando àquela acusada a quantia aproximada de R$ 81.900,00. O acusado também recebeu da conta de Terezinha Demetrio de Sá, administrada por VANESSA DEMÉTRIO DE SÁ MACEDO, entre 01/08/2022 e 27/04/2023, aproximadamente R$ 100.600,00, enviando a ela o total de R$ 53.948,93 (ID 321346669 - Pág. 88/93 e 96 – 5000466-05.2024.4.03.6124). Tratam-se de valores advindos dos crimes praticados. Ouvido em juízo, esse apelante negou a prática delitiva e declarou que os valores que recebera em sua conta corrente referiam-se à reforma na casa em que residia com sua esposa (EVELYN), que cuidava do bisavô dela. Quanto aos valores que enviou para Vanessa e Thalita Miranda Alcaraz (integrante do núcleo avançado da organização criminosa), disse que seriam devoluções por serviços não executados na reforma, mas sua defesa não apresentou nenhuma prova de que os valores recebidos na sua conta referiam-se a essa reforma. Ainda sobre o envolvimento do apelante na organização criminosa, constam da Informação de Polícia Judiciária nº 3287723/2024 (ID 312633828, pp. 65/79) as informações extraídas do celular de Vinicius Gabriel Vieira da Rocha (integrante do núcleo intermediário da organização criminosa), segundo as quais ele mantinha conversa com TIAGO no aplicativo Whatsapp, indicando que fornecia informações e dados sobre potenciais vítimas de fraudes bancárias ao apelante. Seguem trechos da IPJ que destacam as principais conversas: No dia 22/01/2024, TIAGO chama VINICIUS GABRIEL e pergunta “meu tá fluindo?”. VINICIUS GABRIEL responde que sim, que quando chegar em casa vai dar uma atenção “no dele” e que na semana anterior VANESSA pesou. Entende-se aqui que VINICIUS GABRIEL estaria também trabalhando para TIAGO realizando buscas e captando nomes de vítimas. TIAGO envia um áudio dizendo que "é foda trabalhar pra mais de uma pessoa" e enfatiza que VANESSA paga VINICIUS GABRIEL semanalmente. TIAGO pede para VINICIUS GABRIEL dar uma atenção para ele naquela semana, pois ele está arrumando outra "funcionária", possivelmente uma mulher para atuar abrindo as contas bancárias em nome das vítimas. TIAGO diz que também arrumou um homem, irmão dessa funcionária, e que vai precisar também de nomes de homens. Ele pede para VINICIUS GABRIEL focar primeiro em nomes femininos.(...) No dia 24/01/2024, TIAGO pergunta se VINICIUS GABRIEL tem novidades. VINICIUS GABRIEL responde que não efetuou buscas por nomes no dia anterior, pois ficou sem energia e quando foi "puxar" os nomes já estava sem limites. Ele diz que falou com uma mulher e que ela ia arrumar. VINICIUS GABRIEL comenta que o dia anterior foi perdido "por conta da senha do INSS". TIAGO pergunta se ele já está procurando por nomes naquele dia e diz que está precisando de pelo menos 20 nomes femininos, pois na segunda-feira vai pedir nomes masculinos, dando a entender que TIAGO estaria se preparando para abrir 20 contas bancárias em nome de vítimas mulheres e depois abrir contas bancárias em nome de vítimas do sexo masculino. (...) No dia 25/01/2024, TIAGO envia mensagens para VINICIUS GABRIEL, porém apaga essas mensagens. VINICIUS GABRIEL diz que conseguiu 11 nomes, mas ainda não consultou se os nomes estão limpos pois está sem senha e pede para TIAGO já ver uma senha para consultar o SCORE. VINICIUS GABRIEL reclama que consultou 27 nomes para conseguir encontrar 1 que está "ok". TIAGO envia diversas mensagens e as apaga. VINICIUS GABRIEL diz que vai tentar entregar todos os nomes até o dia seguinte. (...) No dia 26/01/2024, VINICIUS GABRIEL fiz que "mandou lá", fazendo referência à lista de nomes das vítimas. TIAGO pergunta quantos nomes VINICIUS GABRIEL enviou. VINICIUS GABRIEL responde que conseguiu "puxar" 16 nomes, mas que o último estava sujo e que não tinha mais nomes de mulher na idade estipulada. Mais uma vez, entende-se que VINICIUS GABRIEL estaria não só trabalhando para VANESSA DEMÉTRIO na busca de nomes de vítimas, mas também para TIAGO. Ao ser ouvido em juízo, o apelante declarou que desconhecia essas as ligações. Contudo, conforme consta da sentença, foram apreendidos (no cumprimento de mandado de busca e apreensão realizados no imóvel onde ele reside com EVELYN) dois Iphones Pro Max (modelos 14 e 15), dois telefones celulares e um veículo Audi Q3, ano 2016/2017 (avaliado em R$ 101.279,00 – ID 312633712, p. 19), em seu nome (TIAGO), incompatíveis com a sua renda declarada, pois ele foi beneficiário de auxílio emergencial e não foram localizados vínculos empregatícios em seu nome. Destaco da sentença (ID 31263434364): No cumprimento do mandado de busca e apreensão deferido pelo Juízo, nos autos nº 5000466-05.2024.4.03.6124, foram apreendidos dois Iphones Pro Max (modelo 14 e 15), outros 2 (dois) telefones celulares e um veículo Audi Q3, ano 2016/2017, em nome de TIAGO. As diligências realizadas na residência revelaram que o imóvel onde reside com EVELYN foi recentemente reformado e possui móveis de alto padrão. Além disso, como bem destacou o MPF, o padrão das movimentações bancárias de TIAGO e dos bens apreendidos destoam das informações de sua renda, pois não foram encontrados vínculos empregatícios em seu nome, tão somente que fora beneficiário de auxílio emergencial (cf. ID 333179332). Somado a isso, o conteúdo extraído do aparelho celular de VINICIUS GABRIEL VIEIRA DA ROCHA (IPJ nº 3287723/2024 - ID 336725649) confirma a participação ativa de TIAGO no esquema criminoso desenvolvido pela organização, pois nas conversas entre os dois ficou evidente que VINICIUS fornecia informações e dados sobre potenciais vítimas de fraudes bancárias ao acusado TIAGO. O réu, interrogado em Juízo, negou a prática delitiva, declarando que os valores recebidos de VANESSA em sua conta-corrente, cuja origem o acusado não tinha conhecimento, teriam sido exclusivamente para fazer uma reforma na casa onde sua esposa EVELYN residia e cuidava do bisavô dela e afilhado Davi (filho de VANESSA). Questionado sobre os valores recebidos de THALITA, afirma que também teriam sido enviados por VANESSA, visto que aquela era sócia desta. Questionado sobre os valores enviados para VANESSA e THALITA, respectivamente, nos montantes totais de R$ 81.900,00 e R$ 53.948,93, o acusado alega que seriam referentes à devolução por serviços não prestados quanto à citada reforma. Indagado sobre as ligações com a pessoa “tia”, afirmou desconhecer a ligação, afirmando que reside perto da estação Dom Bosco. A defesa não apresentou novos elementos ou provas que pudessem comprovar que os valores recebidos eram destinados para a referida reforma. Nesse contexto, a testemunha arrolada pela defesa de TIAGO, Bruno Santos da Silva, informou que o réu presta serviço para sua empresa, de forma esporádica e terceirizada, ganhando, dependendo do serviço que presta, de R$500,00 a R$1.000,00 por semana, reforçando que os bens e o padrão de vida de TIAGO é incompatível com a renda que recebe como técnico de refrigeração. Como visto, observa-se que a escusa apresentada pelo acusado com o intuito de afastar sua autoria não se coaduna com os robustos elementos coligidos nos autos. Restou comprovado ainda que entre os membros do grupo criminoso havia uma divisão de tarefas, sendo que o réu, membro do núcleo intermediário, fornecia suas contas como “contas de passagem”, além de receber os valores advindos das fraudes e repassar para o comando da organização, também organizava suas próprias fraudes. Por conseguinte, diante de todo o explanado, entendo que houve in casu a incidência da norma penal incriminadora aventada na denúncia, pois o réu, de data inicial desconhecida, mas ao menos a partir do ano de 2021 até o dia 25/06/2024 (deflagração da fase ostensiva da operação), integrou pessoalmente organização criminosa voltada para a prática de reiterados crimes de estelionato em face de instituições financeiras, notadamente a CEF. Portanto, estando devidamente comprovado que os apelantes integraram organização criminosa voltada à prática de crimes de estelionato contra instituições financeiras, dentre as quais a CEF, mantenho as condenações de EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ e TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA pela prática do crime previsto no art. 2º, caput, da Lei nº 12.850/2013, nos termos da denúncia. WESLEY SILVIO BESSA A defesa de WELSEY pede a sua absolvição, com base no inciso VII do art. 386 do Código de Processo Penal, pois, segundo alega, sua condenação fundamentou-se unicamente em prova colhida na fase investigatória, o que ofende o disposto no art. 155 do Código de Processo Penal. Sem razão. O art. 155 do Código de Processo Penal dispõe que o juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas. O caso em exame entra no rol dessas exceções. Com efeito, foram obtidas várias provas em razão de cumprimento de mandado de busca e apreensão expedido por ordem judicial no Inquérito Policial nº 5000079-24.2023.4.03.6124 e a obtenção dessa prova é cautelar e irrepetível, de modo que está amparada na legislação processual penal. Nesse sentido: AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PLEITO DE NULIDADE DA CITAÇÃO POR EDITAL. TODOS OS MEIOS PARA A LOCALIZAÇÃO ESGOTADOS. SÚMULA 7/STJ. CONDENAÇÃO COM PROVAS COLHIDAS NA FASE INVESTIGATIVA. PROVAS IRREPETÍVEIS E ANTECIPADAS. POSSIBILIDADE. SÚMULA 83/STJ. AGRAVO IMPROVIDO. 1. A reversão da premissa fática de que esgotados todos os meios para localização da ré, a justificar a citação por edital, encontra óbice na Súmula 7/STJ. 2. As provas irrepetíveis e antecipadas, como o laudo pericial e o mandado de busca e apreensão, produzidos nos autos do inquérito policial, podem servir como base para condenação. 3. Agravo regimental improvido. (STJ, AgRg no AREsp nº 1.439.910/SC, Quinta Turma, Rel. Ministro Nefi Cordeiro, J. 08.10.2019, DJe 17.10.2019) Consta das alegações finais do MPF que existem inúmeras provas de que esse apelante participou ativamente do esquema criminoso. Destaco dessa peça o seguinte trecho (ID 312634358): WESLEY SILVIO BESSA é sobrinho de RITA DE CASSIA BESSA (núcleo avançado), com quem residia, e atuou no esquema criminoso desenvolvido fornecendo suas contas-correntes para os membros de alto escalão para recebimento e repasse de valores advindos dos ilícitos praticados. Este acusado figura como investigado/envolvido em, ao menos, 7 (sete) inquéritos policiais com a finalidade de apurar crimes de estelionato qualificados contra a CEF, praticados com o mesmo modus operandi dos narrados anteriormente. Em todos os procedimentos, WESLEY foi identificado como beneficiário de parte dos valores provenientes dos empréstimos consignados realizados mediante uso de documentos falsos em nome das vítimas (ID 321346669 - Pág. 111/114 – 5000466-05.2024.4.03.6124). São eles: [...] Somente em decorrência das fraudes contra aposentados/pensionistas identificadas e levantadas pela CEF, a conta de WESLEY recebeu o total de R$ 211.097,02 (Ofício nº 38/2023/CEFRA/DF - ID 322134146 - Pág. 28 – 5000466-05.2024.4.03.6124) As diligências obtidas após o cumprimento das buscas e apreensões revelaram que WESLEY residia no mesmo imóvel que RITA DE CÁSSIA BESSA, uma das chefes da ORCRIM, onde foram localizados e apreendidos diversos documentos relacionados as práticas delitivas narradas (ID’s 333179336 e 333179340) . Interrogado em juízo, o apelante negou fazer parte da organização criminosa. Alegou que apenas aceitara a proposta de uma pessoa (que conhecia como “Bil”) para receber dinheiro em sua conta e repassá-lo para outras contas, recebendo cem reais a cada mil reais transferidos. Disse que não tinha conhecimento de que os valores eram provenientes de estelionato. Contudo, não é crível que não tivesse conhecimento da origem criminosa dos valores depositados na sua conta, conforme destacado no seguinte trecho da sentença: Interrogado em Juízo, o réu negou a prática do crime imputado. Alegou, em síntese, que aceitou uma proposta para receber valores em sua conta e repassá-los a troco de um percentual, sem saber que os valores eram de estelionato. A proposta foi feita por uma pessoa que se apresentava como “Bil”, que era de fora do convívio do acusado, e o acusado recebia cerca de 20 a 30 mil reais na conta e enviava para outras contas, recebendo cem reais a cada mil reais transferidos. Questionado do porquê outras duas pessoas ligadas a ele e sua tia RITA DE CÁSSIA BESSA (Ramissayane Sthefany da Silva Bessa e Sabrina Bessa dos Santos) também receberam valores provenientes das fraudes praticadas contra os beneficiários do INSS, o réu alegou que ele quem pediu a conta para elas. Por fim, confessou que fazia parte desse esquema de fornecimento de contas. Ainda que alegue que desconhecia a origem do dinheiro que recebia em sua conta, não é crível que não tinha conhecimento das fraudes praticadas pela organização criminosa, sendo que residia com uma das integrantes do núcleo avançado e havia na residência diversos documentos relacionados às fraudes. Como destacou o MPF, o réu não declinou nenhuma outra informação a respeito da pessoa que supostamente o teria proposto o esquema de contas de passagem (“Bil”), o que descredibiliza suas alegações. Como visto, observa-se que as escusas apresentadas pelo acusado com o intuito de afastar sua participação não se coadunam com os robustos elementos coligidos nos autos. Restou comprovado ainda que entre os membros do grupo criminoso havia uma divisão de tarefas, sendo que o réu, membro do núcleo intermediário, fornecia suas contas como “contas de passagem”, além de receber os valores advindos das fraudes, também os repassava para o comando da organização. Por conseguinte, diante de todo o explanado, entendo que houve in casu a incidência da norma penal incriminadora aventada na denúncia, pois o réu, de data inicial desconhecida, mas ao menos a partir do ano de 2021 até o dia 25/06/2024 (deflagração da fase ostensiva da operação), integrou pessoalmente organização criminosa voltada para a prática de reiterados crimes de estelionato em face de instituições financeiras, notadamente a CEF. Portanto, comprovado que o apelante integrou organização criminosa voltada à prática de crimes de estelionato contra instituições financeiras, dentre as quais a CEF, mantenho a condenação de WESLEY SILVIO BESSA pela prática do crime previsto no art. 2º, caput, da Lei nº 12.850/2013, nos termos da denúncia. Dosimetria das penas Passo ao reexame da dosimetria das penas. ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS Na primeira fase, o juízo a quo fixou a pena-base em 4 (quatro) anos e 3 (três) meses de reclusão e 98 (noventa e oito) dias-multa, com base nos seguintes fundamentos: Atento aos critérios constantes no artigo 59 do Código Penal, verifico que ultrapassaram os limites do tipo as circunstâncias do delito, pois a organização criminosa se valia do uso de inúmeros documentos falsificados para a prática das fraudes delitivas apuradas, bem como fazia uso de contas-correntes de interpostas pessoas para dificultar o rastreamento dos valores indevidos obtidos com os crimes; e as consequências do delito, pois a CEF apontou 124 contas abertas por meio de documentação falsa de beneficiários do INSS relacionados ao grupo criminoso, cujas operações de crédito somam a quantia de R$ 5.122.654,48, o que revela a gravidade do impacto social das fraudes. A defesa pede a redução da pena-base ao mínimo legal. Com parcial razão. As circunstâncias e consequências do delito são negativas, porém a elevação feita pelo juízo de primeiro grau merece pequeno ajuste, especialmente em relação à pena de multa. Ocorre que esta Turma tem entendimento de que a quantificação da pena de multa deve dar-se de forma proporcional à pena privativa de liberdade, seguindo o mesmo critério trifásico de dosimetria da pena privativa de liberdade (ApCrim nº 0002526-47.2011.4.03.6106/SP, Rel. Des. Federal Nino Toldo, j. 01.9.2015, e-DJF3 Judicial 1 03.9.2015). Por isso, acolho em parte o recurso nesse ponto e reduzo a pena-base para 4 (quatro) anos de reclusão e 13 (treze) dias-multa. Na segunda fase, o juízo não reconheceu nenhuma circunstância atenuante e reconheceu a circunstância agravante da reincidência (CP, art. 61, I - Ação Penal nº 0012278-07.2014.4.03.6181 – trânsito em julgado em 09.06.2020), na fração de 1/6 (um sexto), o que confirmo. Assim, a pena intermediária fica em 4 (quatro) anos e 8 (oito) meses de reclusão e 15 (quinze) dias-multa. Na terceira fase, o juízo não aplicou nenhuma causa de aumento ou de diminuição de pena, o que confirmo, ficando a pena definitiva estabelecida em 4 (quatro) anos e 8 (oito) meses de reclusão e 15 (quinze) dias-multa, mantido o valor unitário do dia-multa no mínimo legal. EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ e TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA Analiso simultaneamente as penas fixadas para EVELYN e TIAGO porque são semelhantes as circunstâncias de fato a eles relativas. Eventuais situações específicas serão destacadas a fim de se observar estritamente o princípio da individualização da pena. Na primeira fase, o juízo a quo fixou a pena-base em 4 (quatro) anos e 3 (três) meses de reclusão e 98 (noventa e oito) dias-multa, com base nos seguintes fundamentos: Atento aos critérios constantes no artigo 59 do Código Penal, verifico que ultrapassaram os limites do tipo as circunstâncias do crime, pois a organização criminosa se valia do uso de inúmeros documentos falsificados para a prática das fraudes delitivas apuradas, bem como fazia uso de contas-correntes de interpostas pessoas para dificultar o rastreamento dos valores indevidos obtidos com os crimes; e as consequências do delito, pois a CEF apontou 124 contas abertas por meio de documentação falsa de beneficiários do INSS relacionados ao grupo criminoso, cujas operações de crédito somam a quantia de R$ 5.122.654,48, além das vítimas serem idosos, com saúde debilitada e dependentes economicamente dos benefícios, o que revela a gravidade do impacto social das fraudes. A defesa pede a redução da pena-base ao mínimo legal. Com parcial razão. As circunstâncias e consequências do delito são negativas, porém a elevação feita pelo juízo de primeiro grau merece pequeno ajuste, especialmente em relação à pena de multa. Ocorre que esta Turma tem entendimento de que a quantificação da pena de multa deve dar-se de forma proporcional à pena privativa de liberdade, seguindo o mesmo critério trifásico de dosimetria da pena privativa de liberdade (ApCrim nº 0002526-47.2011.4.03.6106/SP, Rel. Des. Federal Nino Toldo, j. 01.9.2015, e-DJF3 Judicial 1 03.9.2015). Por isso, acolho em parte o recurso nesse ponto e reduzo a pena-base para 4 (quatro) anos de reclusão e 13 (treze) dias-multa para cada réu. Na segunda fase, o juízo não reconheceu circunstâncias agravantes nem atenuantes, o que confirmo, não se alterando a pena intermediária em relação à pena-base. Na terceira fase, o juízo não aplicou nenhuma causa de aumento ou de diminuição de pena, porém a defesa pede a aplicação da causa de diminuição prevista no art. 29, § 1º, do Código Penal (participação de menor importância), porém sem razão porque foi comprovado que a atuação dos apelantes não foi menor, mas de ativa participação na organização criminosa pelo fornecimento de contas de passagem, que se mostraram indispensáveis para o seu funcionamento. Assim, a pena definitiva para cada um desses réus fica estabelecida em 4 (quatro) anos de reclusão e 13 (treze) dias-multa, mantido o valor unitário do dia-multa no mínimo legal. WESLEY SILVIO BESSA Na primeira fase, o juízo a quo fixou a pena-base em 4 (quatro) anos e 3 (três) meses de reclusão e 98 (noventa e oito) dias-multa, com base nos mesmos fundamentos acima transcritos. A defesa pede a redução da pena-base ao mínimo legal. Com parcial razão. Conforme dito acima, as circunstâncias e consequências do delito são negativas, porém a elevação feita pelo juízo de primeiro grau merece pequeno ajuste, especialmente em relação à pena de multa, na linha de entendimento da Turma já exposto. Por isso, acolho em parte o recurso nesse ponto e reduzo a pena-base para 4 (quatro) anos de reclusão e 13 (treze) dias-multa. Na segunda fase, o juízo não reconheceu circunstâncias agravantes nem atenuantes, o que confirmo, não se alterando a pena intermediária em relação à pena-base. A defesa pede sejam reconhecidas as circunstâncias atenuantes da confissão espontânea (CP, art. 65, III, “d”) e da menoridade relativa (CP, art. 65, I). Sem razão, porém. Ocorre que o apelante negou a prática do crime, tendo admitido apenas que emprestara sua conta para um indivíduo conhecido, sem saber que os valores eram provenientes de estelionato. Isso, todavia, não configura confissão. Além disso, nascido no dia 15.5.2002, tinha 22 anos completos na data da deflagração da fase ostensiva da Operação Anonymous (em 25.6.2024). Portanto, não ocorre nenhuma das hipóteses atenuantes mencionadas. Na terceira fase, o juízo não aplicou nenhuma causa de aumento ou de diminuição de pena, o que confirmo ficando a pena definitiva estabelecida em 4 (quatro) anos de reclusão e 13 (treze) dias-multa, mantido o valor unitário do dia-multa no mínimo legal. Regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade Mantenho o regime fechado para início do cumprimento da pena privativa de liberdade (CP, art. 33, § 2º, "a") fixada para a corré ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS porque, apesar de o total da pena fixada não ser superior a oito anos de reclusão, ela é reincidente (CP, art. 33, § 2º, "b"), não sendo cabível a substituição dessa pena por restritivas de direitos (CP, art. 44, I e II). Observo que essa apelante não chegou a ser presa preventivamente, razão pela qual não há desconto a ser feito a título de tempo de prisão provisória. Em relação aos corréus EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ, TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA e WESLEY SILVIO BESSA, o juízo havia fixado o regime semiaberto para início do cumprimento de suas respectivas penas privativas de liberdade, considerando que as penas que fixara eram superiores quatro anos de reclusão. Contudo, ante o redimensionamento das penas, que não ultrapassaram quatro anos de reclusão para nenhum deles, e que as circunstâncias judiciais não são negativas (CP, art. 59), dou provimento aos recursos das defesas desses réus nesse ponto para fixar o regime aberto para início do cumprimento das respectivas penas privativas de liberdade (CP, art. 33, § 2º, "c"), observando que, em relação ao corréu TIAGO, a Décima Primeira Turma, por unanimidade, na sessão de 13.3.2025, concedeu ordem de habeas corpus para garantir a esse réu “que o regime adequado para o início do cumprimento da [sua] pena é o aberto”. O acórdão do Habeas Corpus nº 5033888-10.2024.4.02.0000 tem a seguinte ementa: PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. DETRAÇÃO. 1. O art. 387, § 1º, do Código de Processo Penal dispõe que o juiz, na sentença, decidirá, fundamentadamente, sobre a manutenção ou, se for o caso, a imposição de prisão preventiva ou de outra medida cautelar, sem prejuízo do conhecimento de apelação que vier a ser interposta. 2. O regime inicial de cumprimento da pena fixado na sentença (semiaberto) deverá ser objeto de oportuno exame pela Turma no julgamento da apelação criminal interposta pela defesa do paciente. No entanto, considerando a pena fixada na condenação, o tempo de prisão já cumprido pelo paciente, suas condições subjetivas favoráveis e que o MPF não recorreu da sentença, é possível afirmar, desde logo, que o regime adequado para o início do cumprimento da pena é o aberto, que é incompatível com a manutenção da prisão do paciente, cuja liberdade não pode aguardar os trâmites ordinários da expedição e processamento da guia de execução provisória. 3. Ordem concedida. Além disso, presentes os requisitos do art. 44 do Código Penal, substituo as penas privativas de liberdade de cada réu por duas penas restritivas de direitos para cada um, consistentes em: i) prestação de serviços à comunidade ou a entidade pública, pelo período das penas substituídas, em local e modo a serem indicados pelo juízo da execução penal; ii) prestação pecuniária, no valor de 3 (três) salários mínimos, em favor de entidade pública ou privada com destinação social a ser indicada pelo juízo da execução penal. Prisão preventiva A defesa de ANDREA pede a revogação da sua prisão preventiva e o o recolhimento do mandado de prisão expedido em seu desfavor. Sem razão. O juízo de origem manteve a decretação da sua prisão preventiva pelos seguintes fundamentos: Mantendo-se integras as razões cautelares que justificaram a decretação da prisão preventiva da ré, e tendo ela permanecido foragida durante todo o processo, mantenho a sua prisão preventiva decretada (art. 387, §1º, do Código de Processo Penal). Mantenho a prisão preventiva porque ainda estão presentes os motivos que levaram à sua decretação (garantia da ordem pública e da aplicação da lei penal) e a apelante encontra-se foragida desde então, situação que se estendeu ao longo de todo o processo e demonstra não só o descaso da apelante como também a necessidade da sua prisão para garantia da ordem da pública e da aplicação da lei penal. Assistência judiciária gratuita Defiro aos apelantes os benefícios da assistência judiciária gratuita. Contudo, esse deferimento não impede a condenação ao pagamento das custas processuais, sendo sua isenção matéria a ser examinada em sede de execução do julgado (STJ, AgRg no Ag 1.377.544/MG, Quinta Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 31.05.2011, DJe 14.06.2011), tampouco implica provimento de qualquer parte do recurso, pois não foi demonstrado que a gratuidade tenha sido requerida ao juízo de primeiro grau e por ele tenha sido indeferida. Conclusão Posto isso, DOU PARCIAL PROVIMENTO às apelações, para reduzir a pena-base de todos os apelantes e fixar o regime aberto para início de cumprimento das penas privativas de liberdade de EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ, TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA e WESLEY SILVIO BESSA, substituindo-as por penas restritivas de direitos, ficando as penas definitivas estabelecidas em 4 (quatro) anos e 8 (oito) meses de reclusão, em regime inicial fechado, e 15 (quinze) dias-multa, para ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS, e em 4 (quatro) anos de reclusão, em regime inicial aberto, e 13 (treze) dias-multa, para EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ, TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA e WESLEY SILVIO BESSA, nos termos da fundamentação supra. É o voto. Autos: APELAÇÃO CRIMINAL - 5000872-26.2024.4.03.6124 Requerente: ANDREA DEMETRIO DE SA SANTOS e outros Requerido: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP Ementa: Direito penal e processual penal. Apelação criminal. Organização Criminosa. Fraudes bancárias. Operação Anonymous. Nulidades. Competência. Princípio da insignificância. Dosimetria da pena. Pena-base. Recursos parcialmente providos. I. Caso em exame 1. Trata-se de apelações interpostas em face da sentença, no âmbito da denominada Operação Anonymous, que condenou os réus pela prática do crime de organização criminosa (art. 2º, caput, § 3º, da Lei 12.850/2013), na transferência de valores obtidos mediante empréstimos em instituições financeiras com uso de documentos falsos. II. Questão em discussão 2. As questões em discussão consistem em saber se: (i) o juízo de Jales é competente para processar e julgar o feito; (ii) houve nulidade na obtenção das provas mediante interceptação de comunicações telefônicas; (iii) é cabível a aplicação ao caso do princípio da insignificância; (iv) se o não oferecimento de ANPP constitui nulidade; (v) há provas suficientes para a condenação; (vi) está correta a dosimetria das penas. III. Razões de decidir 3. Tendo se consumado o crime no momento da obtenção da vantagem ilícita, a regra aplicável é a do do art. 70, caput, do Código de Processo Penal. A Justiça Federal de Jales era competente para processar e julgar a ação penal. 4. O caso concreto em exame reflete, de forma clássica, aquelas situações em que a medida excepcional da interceptação das comunicações telefônicas mostra-se imprescindível para a obtenção da prova. Nulidade inexistente. 5. Não é aplicável o princípio da insignificância em crime de organização criminosa, pois o bem jurídico tutelado é a fé pública e, segundo jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça (STJ), esse princípio não se aplica a crimes dessa natureza. 6. Ante a recusa do MPF em oferecer (de forma motivada) o ANPP, os acusados (por sua defesa técnica) tinham o direito de requerer a remessa dos autos ao órgão superior do Ministério Público, nos termos do § 14 do art. 28-A do Código de Processo Penal. Todavia, não o fizeram, tendo ocorrido a preclusão. Além disso, a jurisprudência firmou-se no sentido de que o ANPP não constitui direito subjetivo do acusado, podendo ser proposto pelo Ministério Público quando considerar necessário e suficiente à reprovação e prevenção da infração penal, o que não se verificou no caso. 7. Materialidade, autoria e dolo comprovados em relação a todos os réus. São suficientes as provas da participação dos réus na organização criminosa, com base nas conversas telefônicas interceptadas, nos depoimentos e nas movimentações financeiras ilícitas. 8. Dosimetria das penas. Penas-bases redimensionadas e alterado, em relação a três deles, o regime inicial de cumprimento com a possibilidade de substituição por penas restritivas de direitos. IV. Dispositivo e tese 9. Recursos parcialmente providos. Tese de julgamento: “1. Tendo se consumado o crime no momento da obtenção da vantagem ilícita, a regra aplicável é a do do art. 70, caput, do Código de Processo Penal. 2. Interceptações telefônicas autorizadas judicialmente e devidamente fundamentadas são válidas e podem embasar a condenação. 3. O princípio da insignificância não é aplicável ao crime de organização criminosa, dada a tutela da fé pública. 4. O acordo de não persecução penal não constitui direito subjetivo do réu, podendo o Ministério Público recusar o seu oferecimento motivadamente.” _________ Dispositivos relevantes citados: CP, arts. 59, 65, 61, I; CPP, arts. 70, 155, 226, 28-A; Lei nº 12.850/2013, art. 2º, caput e § 3º. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgRg no AREsp nº 2.747.808/MG, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, 5ª Turma, j. 27.11.2024, DJEN 4.12.2024; STF, HC nº 195.725/SP, Rel. Min. Alexandre de Moraes, j. 28.01.2021. ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Primeira Turma, por unanimidade, decidiu DAR PARCIAL PROVIMENTO às apelações, para reduzir a pena-base de todos os apelantes e fixar o regime aberto para início de cumprimento das penas privativas de liberdade de EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ, TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA e WESLEY SILVIO BESSA, substituindo-as por penas restritivas de direitos, ficando as penas definitivas estabelecidas em 4 (quatro) anos e 8 (oito) meses de reclusão, em regime inicial fechado, e 15 (quinze) dias-multa, para ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS, e em 4 (quatro) anos de reclusão, em regime inicial aberto, e 13 (treze) dias-multa, para EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ, TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA e WESLEY SILVIO BESSA, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. NINO TOLDO Desembargador Federal

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Processo nº 5000872-26.2024.4.03.6124

ID: 300544642

Tribunal: TRF3 Órgão: Gab. 40 - DES. FED. NINO TOLDO Classe: APELAçãO CRIMINAL Nº Processo: 5000872-26.2024.4.03.6124

Data de Disponibilização: 17/06/2025

Polo Ativo:

TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA

Polo Passivo:

Intimação

Advogados:

WELLINGTON SILVA CAMPOS

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

CLEMERSON MISAEL DOS SANTOS

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

CESAR RENATO FLORINDO

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 11ª Turma APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 5000872-26.2024.4.03.6124 RELATOR: Gab. 40 - DES. FED. NINO TOLDO APELANTE: ANDREA DEMETRIO DE SA SANTOS, … PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 11ª Turma APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 5000872-26.2024.4.03.6124 RELATOR: Gab. 40 - DES. FED. NINO TOLDO APELANTE: ANDREA DEMETRIO DE SA SANTOS, EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SA, TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA, WESLEY SILVIO BESSA Advogado do(a) APELANTE: CLEMERSON MISAEL DOS SANTOS - SP317298-A Advogado do(a) APELANTE: WELLINGTON SILVA CAMPOS - SP438093-A Advogado do(a) APELANTE: CESAR RENATO FLORINDO - SP405260-A APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP OUTROS PARTICIPANTES: PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 11ª Turma APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 5000872-26.2024.4.03.6124 RELATOR: Gab. 40 - DES. FED. NINO TOLDO APELANTE: ANDREA DEMETRIO DE SA SANTOS, EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SA, TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA, WESLEY SILVIO BESSA Advogado do(a) APELANTE: CLEMERSON MISAEL DOS SANTOS - SP317298-A Advogado do(a) APELANTE: WELLINGTON SILVA CAMPOS - SP438093-A Advogado do(a) APELANTE: CESAR RENATO FLORINDO - SP405260-A APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NINO TOLDO (Relator): Trata-se de apelações interpostas por ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS, EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ, TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA e WESLEY SILVIO BESSA em face da sentença proferida pela 1ª Vara Federal de Jales (SP), no âmbito da denominada Operação Anonymous, que os condenou pela prática do crime de organização criminosa (art. 2º, caput, § 3º, da Lei 12.850/2013) às seguintes penas: i) ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS - 4 (quatro) anos, 11 (onze) meses e 15 (quinze) dias de reclusão, em regime inicial fechado, e 114 (cento e quatorze) dias-multa, no valor unitário mínimo legal; ii) EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ - 4 (quatro) anos e 3 (três) meses de reclusão, em regime inicial semiaberto, e 98 (noventa e oito) dias-multa, no valor unitário mínimo legal; iii) TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA - 4 (quatro) anos e 3 (três) meses de reclusão, em regime inicial semiaberto, e 98 (noventa e oito) dias-multa, no valor unitário mínimo legal; e iv) WESLEY SILVIO BESSA - 4 (quatro) anos e 3 (três) meses de reclusão, em regime inicial semiaberto, e 98 (noventa e oito) dias-multa, no valor unitário mínimo legal. O Ministério Público Federal (MPF) deixou de propor acordo de não persecução penal (ANPP) sob o argumento de que o acordo não se afigura suficiente à reprovação e prevenção do crime (ID 312633703, p. 2), não tendo havido manifestação das defesas de ANDREA, TIAGO e WESLEY sobre isso (ID 312633790, 312633808 e 312633810). A defesa de EVELYN requereu a intimação do MPF para oferecer proposta de ANPP (ID 312633782), mas o MPF reiterou o não cabimento do benefício (ID 312633791) e não houve pedido de envio dos autos ao órgão superior do MPF. A denúncia (ID 312633703), recebida em 29.7.2024 (ID 312633750), narra: Os fatos a seguir expostos surgiram das investigações conduzidas no Inquérito Policial nº 5000079-24.2023.4.03.6124, instaurado para apurar, inicialmente, a prática de crime previsto no artigo 171, §3º, do Código Penal. A agência da Caixa Econômica Federal (CEF) de Auriflama/SP (ID 273316977 - Pág. 5/34 – IPL 5000079-24.2023.4.03.6124) informou que indivíduo até então não identificado, no dia 13/07/2022, utilizando documentação falsa em nome de Antônio Carlos dos Santos, abriu conta-corrente naquela agência, transferindo o pagamento de benefício previdenciário de aposentadoria recebido pela vítima para a conta fraudulenta. [...] Analisados os dados bancários e realizadas pesquisas, foi possível identificar outros envolvidos – em especial THALITA MIRANDA ALCARAZ, VANESSA DEMETRIO DE SÁ MACEDO, ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS e HERIBERTO DOS SANTOS CANDIDO – além de novas práticas de estelionato contra a CEF, conforme detalhado no Relatório de Análise de Polícia Judiciária (RAPJ) nº 2291253/2023 (DOC. 1 anexo)1. Havia, nesse momento, fortes indícios da existência de uma Organização Criminosa – doravante referida como ORCRIM – voltada à prática reiterada de crimes de estelionato. Realizada a quebra do sigilo bancário das pessoas identificadas nesse momento, conforme autorização judicial nos autos 5000201-37.2023.4.03.6124, os dados, em especial as movimentações das contas-correntes de THALITA MIRANDA ALCARAZ, foram analisados no Relatório de Análise de Polícia Judiciária (RAPJ) nº 492587/2024 (DOC. 2 anexo)2. A partir dessas informações, foi possível obter mais detalhes sobre o funcionamento da ORCRIM, além de apontada a participação de outros integrantes e novas vítimas dos crimes. Também foram solicitadas ao Setor de Segurança da CEF informações de outras contas objeto de fraude pelo mesmo grupo, sendo encaminhado, em resposta, o Ofício nº 38/2023/CEFRA/DF (DOC. 3 anexo)3. Ali, foram relacionadas diversas contas que foram abertas por meio de documentação falsa de beneficiários do INSS e identificados alguns envolvidos diretamente na abertura dessas contas. Segundo estimativa realizada pela CEF, “as operações de crédito nas modalidades Crédito Consignado, Antecipação de Crédito FGTS, Crédito CDC [...], vinculadas às 124 contas abertas com documentos falsos, somam aquantia de R$ 5.122.654,48”. Abre-se um parêntese, neste ponto, para registrar que foram identificados, ao menos, outros 18 (dezoito) procedimentos investigatórios perante a Polícia Federal no Estado de São Paulo instaurados para apurar crimes de estelionato envolvendo algum ou alguns dos membros da ORCRIM aqui desvendada (ID 321348441 - Pág. 32/33 – 5000466-05.2024.4.03.6124), o que demonstra a amplitude de sua atuação e sua estruturação ordenada para a prática de infrações penais. Alguns dos atingidos pelos ilícitos, todos aposentadas e/ou pensionistas, em sua maioria idosos e hipossuficientes, foram ouvidos e confirmaram as fraudes perpetradas contra eles (ID 321348441 - Pág. 76 e ss. – 5000466-05.2024.4.03.6124). [...] No curso das investigações ficou comprovada a existência de uma Organização Criminosa bem estruturada e articulada, especializada em perpetrar fraudes contra instituições financeiras, incluindo a Caixa Econômica Federal (CEF), em vários municípios do país, em sua maioria no Estado de São Paulo. O grupo criminoso opera por meio da utilização de documentos falsificados emitidos em nome de terceiros, geralmente beneficiários de algum tipo de prestação previdenciária, predominantemente idosos, os quais se encontram em condições de saúde debilitadas e são economicamente dependentes das pensões que recebem. Essa vulnerabilidade os torna alvos preferenciais e expõe a gravidade do impacto social dessas fraudes. Diante de todos os elementos apurados, foi possível dividir os membros da ORCRIM nos chamados “núcleos” de atuação, evidenciando a divisão de tarefas e a estrutura funcional do grupo, que se distribui da seguinte forma: [...] 2.2. NÚCLEO INTERMEDIÁRIO ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA WESLEY SILVIO BESSA VINICIUS GABRIEL VIEIRA DA ROCHA MARIA TAINARA SANTOS DE SOUSA TAINA CRISTINA DA SILVA CAIO DE JESUS CARDOSO ROSANA SANTOS DE JESUS O segundo núcleo, considerado intermediário, é integrado por aqueles que oferecem suas contas-correntes como de “contas de passagem”, para recebimento direto dos valores advindos dos empréstimos fraudulentos, depositados nas contas fraudulentas criadas pelos membros do primeiro núcleo, e posterior transferência para os membros de comando do grupo, integrantes do núcleo avançado. Os intermediários têm plena consciência da origem ilícita dos valores recebidos em suas contas, participando, assim, de forma direta e ativa no esquema criminoso. A presente denúncia se refere especificamente às condutas de parte dos membros deste núcleo criminoso, sendo outra parte denunciada em apartado (DENÚNCIA 04). [...] 3. OBJETO DA PRESENTE DENÚNCIA: NÚCLEO INTERMEDIÁRIO Feitas as considerações acima, passa-se a individualizar as condutas das pessoas que compõem o núcleo intermediário de atuação do grupo criminoso ora desvendado, demonstrando-se, de maneira individual e específica, a autoria de cada uma em relação ao crime previsto no artigo 2º da Lei nº 12.850/2013 (organização criminosa). [...) ] 3.1. ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS é integrante do núcleo intermediário da ORCRIM e atua, de forma consciente, fornecendo suas contas bancárias para movimentação dos valores advindos dos crimes e auxiliando na abertura de contas em agências bancárias mediante uso de documentos falsos. ANDREA é irmã de VANESSA DEMETRIO DE SÁ MACEDO, uma das integrantes de comando do grupo, com quem mantém proximidade. A denunciada também é mãe de EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ e sogra de TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA (ID 321346669 - Pág. 93/94 – 5000466-05.2024.4.03.6124), que serão tratados nos tópicos seguintes dessa peça. Conversa interceptada após autorização judicial reforça a autoria desta denunciada no esquema criminoso. Trata-se do registro 1733861996, em que EVELYN mantém conversa com interlocutora que a chama de filha, indicando se tratar da denunciada ANDREA, a respeito da prática de nova fraude para “levantar um dinheiro”, relacionada à abertura de conta em agência da CEF de Porto Ferreira/SP, sugerindo se tratar de “bom” lugar para a fraude. Trata-se de ação típica do modo de operação da organização criminosa, consistente na abertura de contas fraudulentas em agências da Caixa localizadas no interior do Estado de São Paulo. EVELYN afirma à mãe que, posteriormente, ela deveria retirar o “cartão de INSS” na residência de algum conhecido, especificamente com caixa de correio de modelo antigo apresentando documento (provavelmente falso), citando que fraude parecida teria sido praticada anteriormente por alguém denominado “VITOR”. Por fim, ANDREA menciona a EVELYN que tentou realizar “uns dez” (provavelmente outras dez fraudes) com outra mulher, mas apenas um deu certo. Assim como sua irmã VANESSA, a denunciada ANDREA recebeu da conta fraudulentamente criada em nome de Antonio Fernando Berardo, em 6 (seis) transações ocorridas entre 29/10/2021 e 25/11/2021, o total de R$ 13.165,00 (ID 322134126 - Pág. 3/4 – 5000466-05.2024.4.03.6124), sendo, portanto, também beneficiária direta do esquema criminoso desvendado. No mais, ANDREA foi presa em flagrante anteriormente, em 24/08/2014, ao tentar obter empréstimo consignado junto à CEF utilizando documentos falsos em nome de uma beneficiária do INSS, o que originou o IPL 680/2015-DELEFAZ/SR/RF/SP (ID 321350442 - Pág. 30/31 – 5000466-05.2024.4.03.6124), demonstrando que se dedica, ao menos há uma década, à prática de “golpes” dessa natureza. O procedimento citado deu origem à Ação Penal nº 0012278-07.2014.403.6181, em trâmite perante a 9ª Vara Criminal Federal de São Paulo, em que ANDREA foi condenada à pena de 03 (três) anos, 06 (seis) meses e 20 dias de reclusão, em regime aberto, por sentença proferida em 2018, já transitada em julgado, junto a outros dois indivíduos, como incursa nos artigos 171, §3° e caput e 171, §3° e caput c.c. art. 14, II, na forma do artigo 71, todos do Código Penal c.c. artigo 297, caput, na forma do artigo 69, ambos do Código Penal, pela utilização de documento falso e obtenção de empréstimos consignados na agência da CEF em Caieiras, em 28 e 29/08/2014, em nome de três beneficiários do INSS (ID 322891125 – 5000466-05.2024.4.03.6124). Portanto, os elementos de prova acima apontados demonstram que a denunciada ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS, de data inicial desconhecida, mas ao menos a partir do ano de 2021 até o dia 25/06/2024 (deflagração da fase ostensiva da operação), integrou pessoalmente organização criminosa voltada para a prática de reiterados crimes de estelionato contra instituições financeiras, incluindo a CEF, e inúmeros aposentados e pensionistas, auferindo elevadas quantias advindas das fraudes, praticando o crime do artigo 2º, caput, da Lei 12.850/2013. 3.2. EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ, filha da codenunciada ANDREA e sobrinha de VANESSA DEMETRIO DE SÁ MACEDO, também integra o núcleo intermediário do grupo criminoso. EVELYN também é parceira do codenunciado TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA e, junto a este e sua genitora ANDREA, atua em favor do esquema criminoso de forma consciente, fornecendo suas contas bancárias para movimentação dos valores advindos dos crimes e auxiliando na abertura de contas em agências bancárias mediante uso de documentos falsos. Neste sentido, na conversa interceptada sob registro de ID 173386199, EVELYN mantém conversa com interlocutora que a chama de filha, indicando se tratar de ANDREA, a respeito da prática de nova fraude para “levantar um dinheiro”, relacionada à abertura de conta em agência da CEF de Porto Ferreira/SP, sugerindo se tratar de “bom” lugar para a fraude. EVELYN afirma à mãe que, posteriormente, ela deveria retirar o “cartão de INSS” na residência de algum conhecido, especificamente com caixa de correio de modelo antigo apresentando documento (provavelmente falso), citando que fraude parecida teria sido praticada anteriormente por alguém denominado “VITOR”. Por fim, ANDREA menciona à EVELYN que tentou realizar “uns dez” (provavelmente outras dez fraudes) com outra mulher, mas apenas um deu certo. No mesmo contexto, dois dias antes do registro acima, foi captada conversa (ID 173030474) em que o denunciado TIAGO, parceiro de EVELYN, planeja junto a uma mulher não identificada a prática de fraude envolvendo benefício previdenciário e documento falso (“estudar RG”), possivelmente concretizada no dia 13/06/2024 em local próximo à Porto Ferreira/SP (ID 328852963 - Pág. 16/21 – 5000607-24.2024.4.03.6124), mesmo município citado por EVELYN na ligação citada anteriormente. EVELYN recebeu de THALITA MIRANDA ALCARAZ (núcleo avançado), aproximadamente, R$ 22.700,00, entre 26/08/2022 e 01/06/2023. A denunciada também recebeu da conta de Terezinha Demetrio de Sá, genitora de ANDREA e VANESSA, de 11/10/2022 a 13/06/2023, aproximadamente R$ 66.560,00, transferindo a ela o total de R$ 50.142,00 (ID 321346669 - Pág. 95/96 – 5000466-05.2024.4.03.6124). Ainda, na busca e apreensão judicialmente deferida na residência desta denunciada e seu esposo TIAGO (DOC. 4 anexo) foram arrecadados dois Iphones Pro Max (modelo 14 e 15), outros 2 (dois) telefones celulares e um veículo Audi Q3, ano 2016/2017, em nome de TIAGO. As diligências revelaram, ainda, que o imóvel, apesar de localizado em bairro de classe média baixa, foi recentemente reformado, contando com duas suítes grandes, área de lazer, sala de TV, cozinha ampla com armários planejados, TV 50" e eletrodomésticos de bom padrão, como geladeira duplex. Esse fato demonstra que a atividade ilícita dos denunciados tem se mostrado rentável. Nesse contexto, o padrão das movimentações bancárias e dos bens apreendidos é totalmente incompatível com as informações de renda de EVELYN, considerando que não foram localizados vínculos empregatícios em seu nome, bem como que a investigada consta como beneficiária de auxílio emergencial (ID 321346669 - Pág. 97 – 5000466- 05.2024.4.03.6124). Tratam-se, portanto, de produtos advindos dos crimes praticados. Desta forma, os elementos de prova acima apontados demonstram que a denunciada EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ, de data inicial desconhecida, mas ao menos a partir do ano de 2021 até o dia 25/06/2024 (deflagração da fase ostensiva da operação), integrou pessoalmente organização criminosa voltada para a prática de reiterados crimes de estelionato contra instituições financeiras, incluindo a CEF, e diversos aposentados e pensionistas, auferindo elevadas quantias advindas das fraudes, incorrendo, portanto, na conduta típica descrita no artigo 2º, caput, da Lei 12.850/2013. 3.3. TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA, conforme citado, atua junto à sua parceira EVELYN em favor do esquema criminoso, de forma consciente, fornecendo suas contas bancárias para movimentação dos valores advindos dos crimes e auxiliando na abertura de contas em agências bancárias mediante uso de documentos falsos. Conversas interceptadas após autorização judicial apontam que TIAGO e EVELYN planejaram a prática de fraude envolvendo abertura de conta e benefício previdenciário, possivelmente concretizada em agência bancária da CEF na cidade de Porto Ferreira/SP (ID 328852963 - Pág. 16/21 e 24/27 – 5000607-24.2024.4.03.6124). Cite-se, neste sentido, a ligação de registro 17303047410, por meio da qual o denunciado TIAGO conversa com interlocutora que chama de “tia”,11 planejando encontrá-la na manhã do dia seguinte em local referenciado como “Dom Bosco” para entregá-la uma colinha relacionada à “benefício”, mencionando que ela deveria “estudar” o “RG” e o “comprovante” pessoalmente. Na manhã do dia seguinte à ligação (13/06/2024), a ERB do celular de TIAGO estava próxima à localização da estação de metrô Dom Bosco, em São Paulo/SP (ID 328852963 - Pág. 6). Em paralelo, no mesmo dia 13/06/2024, o terminal que manteve a citada conversa com TIAGO registrou localizações de ERB, a partir das 10h, em Limeira/SP, se deslocando próximo a Porto Ferreira/SP (mesma cidade citada por EVELYN em conversa captada um dia depois – ligação de ID 173386199) perto das 12h e retornando à São Paulo/SP por volta das 15h (ID 329260116 - Pág. 17/19 – 5000607-24.2024.4.03.6124). Poucos dias após, TIAGO manteve conversa com a mesma interlocutora (registro 17442357412) informando que conseguiu desbloquear determinado cartão e que até as oito horas da manhã chegaria uma senha para “tia”. Ainda, foram identificadas diversas transações bancárias de altos valores, sem origem comprovada, entre o denunciado TIAGO e outras integrantes ligadas ao comando/topo da organização criminosa. Neste sentido, entre 19/08/2022 e 12/06/2023, TIAGO recebeu das contas de THALITA MIRANDA ALCARAZ, aproximadamente, R$ 230.830,00, enviando àquela investigada a quantia aproximada de R$ 81.900,00. O denunciado também recebeu de Terezinha Demetrio de Sá, genitora de ANDREA E VANESSA, entre 01/08/2022 e 27/04/2023, aproximadamente R$ 100.600,00, enviando a ela o total de R$ 53.948,93 (ID 321346669 - Pág. 88/93 e 96 – 5000466-05.2024.4.03.6124). Tratam-se de valores advindos dos crimes praticados. [...] Nesse contexto, o padrão das movimentações bancárias e dos bens apreendidos é totalmente incompatível com as informações de renda de TIAGO, considerando que ele não declarou receitas ao Fisco nos anos de 2022, 2023 e 2024 (DOC. 5 anexo), além de que não foram localizados vínculos empregatícios recentes ou empresas em seu nome e que ele consta como beneficiário de auxílio emergencial (DOC. 6 anexo). Vale destacar que o denunciado possuía dois veículos simples (GM Corsa antigo e VW Gol) e, exatamente no período de operação da ORCRIM, adquiriu um Audi Q3. Tratam-se, portanto, de produtos advindos dos ilícitos praticados. Desta forma, os elementos de prova acima apontados demonstram que o denunciado TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA, de data inicial desconhecida, mas ao menos a partir do ano de 2021 até o dia 25/06/2024 (deflagração da fase ostensiva da operação), integrou pessoalmente organização criminosa voltada para a prática de reiterados crimes de estelionato contra instituições financeiras, incluindo a CEF, e diversos aposentados e pensionistas, auferindo elevadas quantias advindas das fraudes, incorrendo, portanto, na conduta típica descrita no artigo 2º, caput, da Lei 12.850/2013. 3.4. WESLEY SILVIO BESSA WESLEY SILVIO BESSA é sobrinho de RITA DE CASSIA BESSA (núcleo avançado), com quem reside, e atua no esquema criminoso desenvolvido fornecendo suas contas-correntes para os membros de alto escalão para recebimento e repasse de valores advindos dos ilícitos praticados. Este denunciado figura como investigado/envolvido em, ao menos, 7 (sete) inquéritos policiais com a finalidade de apurar crimes de estelionato qualificados contra a CEF, praticados com o mesmo modus operandi dos narrados anteriormente. Em todos os procedimentos, WESLEY foi identificado como beneficiário de parte dos valores provenientes dos empréstimos consignados realizados mediante uso de documentos falsos em nome das vítimas (ID 321346669 - Pág. 111/114 – 5000466-05.2024.4.03.6124). São eles: a) 2022.0016203 – DPF/CAS/SP (PJe 5001339-76.2022.4.03.6123): investiga a abertura de conta mediante documentos falsos em nome de Renato Brandão Cruz Filho e contratação de empréstimo no valor de R$ 35.144,50, no dia 16/12/2021. Após, foram realizadas transferências para vários destinatários, dentre eles WESLEY; b) 2022.0073401 – DPF/SJK/SP (PJe 5000218-39.2023.4.03.6103): apura a abertura de conta em nome de diversos beneficiários do INSS mediante uso de documento falso. WESLEY foi beneficiário de transferências advindas de algumas dessas contas; c) 2022.0037704 – DPF/RPO/SP (PJe 5004041-58.2022.4.03.6102): apura a abertura de conta com documento falso em nome de Juliana Bongiovani Diniz Chiga e contratação de empréstimos consignados com posterior transferência de valores para vários destinatários, dentre eles WESLEY e sua tia RAMISSAYANE STHEFANY DA SILVA BESSA (irmã de RITA DE CASSIA BESSA). A advogada Neusa Schneider14 (OAB/SP 149.438) atua na defesa desses investigados neste procedimento; d) 2022.0026091 – DPF/AQA/SP (PJe 5000987-45.2022.4.03.6115): apura a abertura de conta-corrente mediante uso de documento falso em nome da aposentada Célia Isabel Gardim Ghizzi e obtenção de empréstimo fraudulento. Novamente, WESLEY consta como beneficiário de parte dos valores depositados nessa conta; e) 2022.0069677 – DPF/BRU/SP: investiga a abertura de conta mediante de documento falso em nome de beneficiário do INSS e contratação de empréstimo consignado. WESLEY foi beneficiário de parte dos valores desviados. A advogada Neusa Schneider atuou neste procedimento em defesa de SABRINA BESSA DOS SANTOS, parente daquele denunciado e também beneficiária de parte dos valores obtidos com o ilícito. f) 2022.0062902 – DPF/RPO/SP: investiga a abertura de conta em nome da vítima Jeanne Batista Pinheiro para transferência de recebimento do benefício previdenciário para essa conta e contratação de dois empréstimos consignados fraudulentos. WESLEY também foi destinatário de parte dos valores advindos desta fraude. g) 2022.0066518 – DPF/AQA/SP: apura a abertura de conta em nome da vítima Denise Mecunhe Rosa para transferência de recebimento do benefício previdenciário para essa conta e contratação de dois empréstimos consignados fraudulentos. WESLEY recebeu R$ 79.321,22 em sua conta, advindos desta fraude. Somente em decorrência das fraudes contra aposentados/pensionistas identificadas e levantadas pela CEF, a conta de WESLEY recebeu o total de R$ 211.097,02 (Ofício nº 38/2023/CEFRA/DF - ID 322134146 - Pág. 28 – 5000466-05.2024.4.03.6124). As diligências obtidas após o cumprimento das buscas e apreensões revelaram que WESLEY reside no mesmo imóvel que RITA DE CÁSSIA BESSA, uma das chefes da ORCRIM, onde foram localizados e apreendidos diversos documentos relacionados as práticas delitivas narradas (DOC. 7 anexo)15. Portanto, os elementos de prova acima apontados demonstram que o denunciado WESLEY SILVIO BESSA, de data inicial desconhecida, mas ao menos a partir do ano de 2021 até o dia 25/06/2024 (deflagração da fase ostensiva da operação), integrou pessoalmente organização criminosa voltada para a prática de reiterados crimes de estelionato contra instituições financeiras, incluindo a CEF, e diversos aposentados e pensionistas, auferindo elevadas quantias advindas das fraudes, incorrendo, assim, na conduta típica descrita no artigo 2º, caput, da Lei 12.850/2013. Em 04.11.2024 o juízo de origem revogou a prisão preventiva de EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SA e WESLEY SILVIO BESSA, fixando, em substituição, outras medidas cautelares (ID 312634346). A sentença foi publicada em 17.12.2024. (ID 312634364) Em seu recurso (ID 312634374), a defesa de WELSEY pede a sua absolvição com base no art. 386, VII, do Código de Processo Penal, argumentando que a condenação foi baseada unicamente em prova colhida na fase investigatória, em ofensa ao disposto no art. 155 do Código de Processo Penal. Caso mantida a condenação pede: i) a fixação da pena-base no mínimo legal; ii) o reconhecimento da circunstância atenuante da confissão espontânea (CP, art. 65, III, “d”) ; iii) o reconhecimento da circunstância atenuante da menoridade (CP, art. 65, I – nascido em 15.05.2002); iv) a fixação do regime inicial aberto para cumprimento da pena privativa de liberdade. Foram apresentadas contrarrazões (ID 312634383). Ao interpor o recurso de apelação, a defesa de ANDREA requereu a apresentação das suas razões nos termos do art. 600, § 4º, do Código de Processo Penal. Nestas (ID 312772705), pede, preliminarmente, a revogação do mandado de prisão expedido. No mérito, pede a sua absolvição pela aplicação do princípio da insignificância e por não haver prova da existência de vínculo com a organização criminosa. Caso mantida a condenação, pede: i) a fixação da pena-base no mínimo legal; ii) a fixação do regime semiaberto para início do cumprimento da pena privativa de liberdade; iii) a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita. Em cumprimento à decisão proferida no Habeas Corpus nº 5033888-10.2024.4.02.0000, de minha relatoria, foi expedido alvará de soltura em favor de TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA, o qual foi cumprido em 06.02.2025 (ID 314391770). A defesa conjunta de EVELYN e TIAGO ao interpor o recurso de apelação requereu a apresentação das suas razões nos termos do art. 600, § 4º, do Código de Processo Penal. Nestas (ID 314391769), pede, preliminarmente, seja decretada a nulidade da sentença em razão da incompetência do juízo ou, se afastada, que seja reconhecida a nulidade das provas produzidas por meio do afastamento do sigilo das comunicações telefônicas e telemáticas ou, ainda, que seja oferecido ANPP. Quanto ao mérito das imputações, pede que os apelantes sejam absolvidos (i) por inexistência de prova do crime de participação em organização criminosa; (ii) não comprovação de dolo e (iii) atipicidade das condutas. Subsidiariamente, pede a fixação da pena-base no mínimo legal; sejam suas participações nos crimes consideradas de menor importância; o desconto do tempo de prisão provisória e a fixação do regime inicial aberto para cumprimento da pena privativa de liberdade e a substituição desta por penas restritivas de direitos, mantendo-se a liberdade provisória. Pedem, ainda, a concessão da gratuidade de justiça com a isenção no pagamento da multa. A Procuradoria Regional da República opinou pelo desprovimento dos recursos (ID 315062861). É o relatório. À revisão. PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 11ª Turma APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 5000872-26.2024.4.03.6124 RELATOR: Gab. 40 - DES. FED. NINO TOLDO APELANTE: ANDREA DEMETRIO DE SA SANTOS, EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SA, TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA, WESLEY SILVIO BESSA Advogado do(a) APELANTE: CLEMERSON MISAEL DOS SANTOS - SP317298-A Advogado do(a) APELANTE: WELLINGTON SILVA CAMPOS - SP438093-A Advogado do(a) APELANTE: CESAR RENATO FLORINDO - SP405260-A APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NINO TOLDO (Relator): Trata-se de apelações interpostas por ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS, EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ, TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA e WESLEY SILVIO BESSA em face da sentença que, no âmbito da denominada Operação Anonymous, os condenou pela prática do crime de organização criminosa (art. 2º, caput, da Lei 12.850/2013). Inicialmente, anoto que a ausência de contrarrazões pela acusação não implica nulidade (CPP, art. 565), conforme pacífico entendimento desta Turma: ApCrim nº 001596-27.2016.4.03.6102, Rel. Des. Federal Nino Toldo, j. 28.7.2023, Publicação 02.8.2023; ApCrim nº 0004816-12.2009.4.03.6104, Rel. Des. Federal Nino Toldo, j. 31.3.2023, Publicação 10.4.2023; ApCrim nº 0003067-39.2018.4.03.6105, Rel. Des. Federal José Lunardelli, j. 09.02.2024, Publicação 15.02.2024; ApCrim nº 0003067-39.2018.4.03.6105, Rel. Des. Federal José Lunardelli, j. 09.02.2024, Publicação 15.02.2024. Incompetência do juízo A defesa comum de EVELYN e TIAGO alega, preliminarmente, a incompetência da 1ª Vara Federal de Jales para processar e julgar o feito, argumentando que a competência deve ser definida pelo local de domicílio da vítima, nos termos do art. 70, § 4º do Código de Processo Penal. Por isso, pede seja reconhecida a nulidade da sentença, remetendo-se os autos ao "Juízo Federal da Comarca de Guarujá" [sic]. Sem razão. O art. 70, § 4º, do Código de Processo Penal (CPP) dispõe: Art. 70. A competência será, de regra, determinada pelo lugar em que se consumar a infração, ou, no caso de tentativa, pelo lugar em que for praticado o último ato de execução. [...] § 4º Nos crimes previstos no art. 171 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal ), quando praticados mediante depósito, mediante emissão de cheques sem suficiente provisão de fundos em poder do sacado ou com o pagamento frustrado ou mediante transferência de valores, a competência será definida pelo local do domicílio da vítima, e, em caso de pluralidade de vítimas, a competência firmar-se-á pela prevenção. (Incluído pela Lei nº 14.155, de 2021) A Justiça Federal de Jales era competente para processar e julgar a ação penal, pois não se trata, no caso da hipótese prevista no § 4º do art. 70 do CPP. A propósito, destaco o seguinte trecho do parecer da Procuradoria Regional da República (ID 315062861): Todavia, deve ser rejeitada a alegação de incompetência da Justiça Federal, pois a investigação se iniciou para apurar notícia encaminhada pela agência da CEF de Auriflama, no sentido de que um terceiro então não identificado, no dia 13/07/2022, promoveu a abertura de conta-corrente naquela agência em nome de Antônio Carlos dos Santos (CPF nº 038.607.988-98), residente em Guarujá/SP, efetuando a transferência fraudulenta do benefício previdenciário da vítima e a contratação de empréstimos consignados para desconto no referido benefício, sendo que a conduta investigada configura estelionato qualificado contra a Caixa Econômica Federal. Assim, aplicando a regra prevista no caput do artigo 70 do Código Penal, tem-se que o Juízo da 1ª Vara Federal de Jales é o competente para o processamento do feito, visto que o crime foi consumado no momento da obtenção da vantagem ilícita, que ocorreu na cidade de Auriflama/SP. Portanto, tendo se consumado o crime no momento da obtenção da vantagem ilícita, a regra aplicável é a do do art. 70, caput, do CPP. Observo, por oportuno e para fins didáticos, que não existem comarcas na Justiça Federal e a cidade de Guarujá encontra-se na jurisdição da Subseção Judiciária de Santos. Rejeito, enfim, a preliminar de incompetência da 1ª Vara Federal de Jales. Nulidade das provas: afastamento do sigilo das comunicações telefônicas A defesa comum de EVELYN e TIAGO também pede a declaração de nulidade das provas obtidas por meio do afastamento do sigilo das comunicações telefônicas e telemáticas. Sem razão. O caso concreto em exame reflete, de forma clássica, aquelas situações em que a medida excepcional da interceptação das comunicações telefônicas mostra-se imprescindível para a obtenção da prova. No curso das investigações ficou comprovada a existência de uma organização criminosa estruturada e articulada, especializada em efetuar fraudes contra instituições financeiras, inclusive a Caixa Econômica Federal (CEF), em vários municípios do país, em sua maioria no estado de São Paulo, tendo sido deferido pelo juízo competente o afastamento do sigilo das comunicações telefônicas e telemáticas, bem como a interceptação telefônica dos terminais relacionados às pessoas investigados identificadas, nos autos de Interceptação Telefônica nº 5000607-24.2024.4.03.6124, com observância de todas as garantias constitucionais (princípios do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório). Portanto, rejeito a alegação de nulidade. Princípio da insignificância A defesa de ANDREA pede a sua absolvição pela aplicação do princípio da insignificância, argumentando que os valores movimentados na sua conta são ínfimos quando comparados às quantias movimentadas pelos demais envolvidos (R$ 13.165,00). Sem razão. Não é aplicável o princípio da insignificância em crime de organização criminosa, pois o bem jurídico tutelado é a fé pública e, segundo jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça (STJ), esse princípio não se aplica a crimes dessa natureza. Nesse sentido: PENAL E PROCESSO PENAL. ESTELIONATO PREVIDENCIÁRIO. ARTIGO 171, §3º, DO CP. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. TESE DE QUE A NATUREZA PERMANENTE DO DELITO IMPEDE O RECONHECIMENTO DA CONTINUIDADE DELITIVA. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. Na hipótese dos autos, não é possível o reconhecimento do princípio da insignificância, já que o acórdão impugnado encontra-se em consonância com o entendimento desta Corte Superior, consolidado no sentido de que, no delito tipificado no art. 171, § 3º, do Código Penal, não se aplica o princípio da insignificância, "uma vez que a conduta ofende o patrimônio público, a moral administrativa e a fé pública, bem como é altamente reprovável" (RHC n. 61.931/RS, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, Quinta Turma, DJe 15/2/2016) (AgRg no HC n. 913.137/DF, de minha relatoria, Quinta Turma, julgado em 16/9/2024, DJe de 18/9/2024.). 2. A tese de que a natureza permanente do crime de Estelionato Previdenciário obsta o reconhecimento da continuidade delitiva não foi objeto de debate pela instância ordinária, o que inviabiliza o conhecimento do recurso especial por ausência de prequestionamento. Incide ao caso a Súmula n. 282/STF. 3. Agravo regimental não provido. (AgRg no AgRg no AREsp n. 2.747.808/MG, Quinta Turma, Relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, j. 27.11.2024, DJEN de 04.12.2024) PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. INSERÇÃO DE ASSINATURA FALSA EM DOCUMENTO PÚBLICO CARACTERIZA O DELITO DO ART. 297 DO CP. NÃO CABIMENTO DA DESCLASSIFICAÇÃO PARA FALSIDADE IDEOLÓGICA. NÃO INCIDÊNCIA DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA EM CRIMES CONTRA A FÉ PÚBLICA. PRECEDENTE. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. A inserção de assinatura falsa em documento público ou particular caracteriza ilícito material de perigo abstrato e prescinde de resultado concreto ou de finalidade específica (dolo). Precedente. 2. O princípio da insignificância não é aplicado aos delitos cujo bem tutelado seja a fé pública. Precedente. 3. Agravo regimental não provido. (AgRg no AREsp 1134866/SP, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 10/08/2021, DJe 16/08/2021) Portanto, rejeito a pretensão de aplicação do princípio da insignificância ao caso. Acordo de não persecução penal (ANPP) A defesa comum de EVELYN e TIAGO, em suas razões de apelação, alega que o não oferecimento de ANPP, desacompanhado de motivação idônea, constitui nulidade absoluta e, em razão disso, pede a declaração de nulidade processual desde a negativa do Ministério Público Federal (MPF) em oferecê-lo. Pois bem. O ANPP pode ser celebrado entre o Ministério Público e o autor do delito desde que atendidos os requisitos expressamente previstos no art. 28-A, caput, do Código de Processo Penal, ou seja, (i) confissão formal e circunstanciada por parte do acusado, (ii) infração penal cometida sem violência ou grave ameaça, (iii) com pena mínima inferior a 4 (quatro) anos e (iv) que a medida a ser aplicada seja necessária e suficiente para reprovação e prevenção do crime. Trata-se de instituto resultante de acordo de vontades entre o Ministério Público e o imputado e sua defesa, objetivando dar solução negociada a casos cuja origem sejam crimes de menor gravidade. No caso, o MPF, ao oferecer a denúncia, deixou de propor ANPP pelos seguintes motivos (ID 312633703): Deixo de propor o benefício do Acordo de Não Persecução Penal – ANPP (artigo 28-A, do Código de Processo Penal) aos denunciados, uma vez que o acordo não afigura-se suficiente à reprovação e prevenção do crime. Tratase de infração penal altamente gravosa – Organização Criminosa – prevista em tratados e convenções internacionais como infração a que o Brasil se comprometeu a punir de maneira efetiva. Além disso, foi cometida em concurso com inúmeros estelionatos qualificados (art. 171, § 3º, do Código Penal), o que suplantaria o requisito de pena mínima de 4 (quatro) anos, e que causou prejuízos milionários, em especial a idosos e pessoas vulneráveis. A defesa requereu a intimação do MPF para oferecer proposta de ANPP (ID 312633782) e o MPF reiterou sua manifestação pelo não cabimento do benefício (ID 312633791). Ante essa recusa em oferecer (de forma motivada) o ANPP, os acusados (por sua defesa técnica) tinham o direito de requerer a remessa dos autos ao órgão superior do Ministério Público, nos termos do § 14 do art. 28-A do Código de Processo Penal. Todavia, não o fizeram, conforme se depreende do exame dos autos, tendo ocorrido a preclusão. Além disso, a jurisprudência firmou-se no sentido de que o ANPP não constitui direito subjetivo do acusado, podendo ser proposto pelo Ministério Público quando considerar necessário e suficiente à reprovação e prevenção da infração penal, o que não se verificou no caso. Nesse sentido: STF, HC nº 195.725/SP, Rel. Ministro Alexandre de Moraes, decisão monocrática proferida em 28.01.2021, publicada em 01.02.2021 e transitada em julgado em 12.02.2021. Portanto, a pretensão ao ANPP foi alcançada pela preclusão, razão pela qual não acolho o pedido. Mérito da imputação ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS A defesa de ANDREA pede a sua absolvição, argumentando que foram realizados apenas alguns depósitos em sua conta, em curto intervalo de tempo, o que não configura a estabilidade e a permanência exigidas para a tipificação do crime de organização criminosa. Sem razão. ANDREA é irmã de Vanessa Demetrio de Sá Macedo (apontada como integrante do núcleo avançado, alto escalão da organização criminosa), mãe de EVELYN e sogra de TIAGO. Integrava o núcleo intermediário da organização criminosa, fornecendo sua conta bancária para a movimentação de valores obtidos a partir da abertura de contas com uso de documentos falsos e tendo, desse modo, plena consciência da origem ilícita dos valores que passavam na sua conta. Nas alegações finais que apresentou ao juízo, o MPF transcreveu trechos de uma conversa interceptada (com autorização judicial) que reforçam a participação da acusada na prática criminosa. Além disso, em seu interrogatório em juízo, ela declarou apenas que desconhecia essas conversas, mas confirmou que Elcio Gonçalves dos Santos é seu esposo e o terminal de onde partiram essas conversas está registrado em seu nome. Destaco, sobre isso, o seguinte trecho das alegações finais (ID 312634358): Conversa interceptada após autorização judicial reforça participação desta acusada no esquema criminoso. Trata-se do registro 1733861992 , mantido entre as corrés EVELYN (TMC 11 96970-0480) e ANDREA (TMC 11 96070-2799). Abre-se um parêntese para registrar que o terminal 11 96070-2799 está registrado em nome de Elcio Goncalves dos Santos (CPF 308.118.578-59), esposo de ANDR EA , conforme confirmado por ela em interrogatório nesta ação (ID 343998818 - aos 00m55s), o que corrobora por definitivo que era utilizado por esta acusada na oportunidade do registro. O assunto da citada conversa refere-se à prática de nova fraude para “levantar um dinheiro”, relacionada à abertura de conta em agência da CEF de Porto Ferreira/SP, que EVELYN sugere se tratar de “bom” lugar para a fraude. Trata-se, como visto, de ação típica do modo de operação da organização criminosa, consistente na abertura de contas fraudulentas em agências da Caixa localizadas no interior do Estado de São Paulo. No registro, ainda, EVELYN afirma à mãe que, posteriormente, ela deveria retirar o “cartão de INSS” na residência de algum conhecido, especificamente com caixa de correio de modelo antigo apresentando documento (provavelmente falso), citando que fraude parecida teria sido praticada anteriormente por alguém denominado “VITOR”. Por fim, ANDREA menciona a EVELYN que tentou realizar “uns dez” (provavelmente outras dez fraudes) com outra mulher, mas apenas um deu certo. Segue o registro captado, na íntegra: Alvo: EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ Nº Interceptado: (11)96970-0480 Assunto: Evelyn X MNI Mãe (Andrea) - Conversa sobre possível fraude na Caixa Nº Contato: (11) 96070-2799 ID: 173386199 Data: 14/06/2024 18:30:18 Duração: 00:15:0 Arquivo: 01_19_173386199_20240614183018_20366507 Tipo: Áudio Degravação: MNI: Oi agora posso falar, Não, é porque assim, eu uso o aplicativo, está no meu celular. Aí eu falo com vocês pelo do Kinder. Mas aí quando a gente chega no lugar que a gente dispensa a abertadoria, aí eu pego o celular do Kinder, põe no GPS para até encontrar um produto para a gente pegar novamente, entendeu? Ai eu não posso usar nenhum dos dois… EVELYN: Então.. (inaudível) para falar com o povo MNI: Não, é então, eu estou com o telefone lá para me passar o meu zap para o outro telefone... é, porque eu tenho que andar com três telefones, não tem jeito. (…) [00:11:07:138] Evelyn: Por falar nisso, não tem nenhum documento do velho pronto que você possa levar? MNI: Não ele foi viajar e ele não quer trabalhar mais né filha EVELYN: Porque tem um caixa boa em Porto Feliz.. Em Porto Ferreira.. Pra senhora levantar hoje, só pra levantar um dinheiro.. você faz no caixa aqui, depois vai na agência MNI: Ah, nem precisa abrir conta? EVELYN: Não, você abre a conta no caixa aqui, aí depois de três dias chega a mensagem, você vai na agência e pode assinar e põe a senha. MNI: Aham. E está dando dinheiro isso aí? EVELYN: Tá, e o cartão tem que chegar em qualquer endereço da cidade, você não pode pegar no correio nem no banco. Aí você pega, aí tem que você olha no Google Maps, uma casa que tem aquele carteiro antigo, um correio antigo, sabe, colocar a carta? mas aqueles antigos que você consiga abrir. Aí põe lá dentro e você passa e pega na casa da pessoa mesmo MNI: Aham, ave essa parte é arriscada EVELYN: Mas aí você geralmente faz amizades com as pessoas, eu nunca peguei, quem pegou foi VITOR, ai ele fez a amizade com uma mulher lá e a mulher lá foi e entregou para ele MNI: Tem que ter sangue, porque eu não tenho. EVELYN:É o funcionário que faz isso doida, não é você não tem que ir para o documento, tipo se a pessoa perguntar " Ah, mas e seu nome?", ai "Tá aqui meu documento para você ver que sou eu mesmo, é porque meu cartão (inaudível), acabei de me aposentar, então pensa, eu to sem cartão e até eles trocar eles falaram que demora até trinta dias para chegar... que foi um erro de digitação dele", ai o velho que fala, não é você... MNI: Ata, que susto EVELYN: Ai como geralmente os velhos fazem amizade com outros velhos ai acaba dando.. você sabe que é cartão de INSS ta no nome da pessoa, mostra o documento, entendeu? MNI: Então não, é se voce ta com o documento e prova para pessoa que você é você, não tem problema EVELYN: Então se a senhora tivesse a senhora poderia fazer MNI: É mas não tenho e ele foi viajar EVELYN: Até aquela sua velha burra daria para fazer MNI: Ah deus me livre... não tenho paciência para ela não EVELYN: Não faz nada, ela só senta na mesa a mulher faz tudo lá, espera chega a mensagem, com três dias chega, vai na agência, só assina e pronto… MNI: Ah não, mas ela é uma pessoa muito negativa... No entanto que eu fiz uns dez com ela deu um só. ANDREA recebeu R$ 13.165,00 (treze mil cento e sessenta e cinco reais) de uma conta fraudulenta criada por Daniel Marcelino (integrante do núcleo base) e VANESSA, sua irmã, também recebeu dinheiro dessa conta. Declarou em juízo que esse dinheiro havia sido pagamento pela venda de mercadorias do seu restaurante, que encerrou as atividades durante a pandemia de Covid-19, mas não soube explicar por que sua irmã também recebera dinheiro da mesma pessoa. Consta dos autos a transcrição de uma conversa com uma mulher não identificada, que a orientou a “não sair do buraco”, ou seja, para que permanecesse foragida. Destaco da sentença o seguinte trecho (ID 312634364): A conversa interceptada nos autos nº 5000607-24.2024.403.6124, referente à conversa mantida após a deflagração da operação entre ANDREA e a interlocutora que a orienta a “não sair do buraco”, corrobora os indícios de que ANDREA é integrante da organização criminosa e mantém relação com os demais membros da organização, como se observa na íntegra do registro, extraído do Auto Circunstanciado 02 (ID 339389916): Alvo: ANDREA DEMETRIO DE SA Nº Interceptado: (11)96070-2799 Assunto: Andrea X MNI - Ta tudo com prova / Vanessa entra com pedido que ela tá grávida / Ta todo mundo na mesma cela Nº Contato: (11)97340-8340 ID: 174759445 Data: 25/06/2024 16:18:46 Duração: 00:03:43 Arquivo: 01_125_174759445_20240625161846_20367982 Tipo: Áudio Degravação: MNI: Ai então amiga, tá assim né, o que eu te relatei é o que é, é a sua mãe, você, a talita e a vanessa ai tem os intermediarios que é o gabriel a milena, tem esse menino da caixa e é isso Andrea: E esse negócio de conta ai é, foi a movimentação de transferências MNI: Tudo com prova, tudo com provas... As fotos em rede social... É melhor você ficar no buraco mesmo Andrea: Meu deus do céu e ninguém vai ter audiência hoje né? MNI: Então pode ser que já esteja até tendo… Interrogada em Juízo, ANDREA negou os fatos imputados na denúncia (cf. ID 343998815), que não integra nenhum esquema para a prática de crimes e não possui proximidade com sua irmã VANESSA. Indagada sobre os valores recebidos em sua conta-corrente, entre 29/10/2021 e 25/11/2021, alegou que foram decorrentes da venda das “coisas” que guarneciam o restaurante da interrogada, que faliu na pandemia, para um “rapaz”; não soube explicar, contudo, porque sua irmã VANESSA também recebeu valores daquela conta. Confirmou que é casada com Elcio Gonçalves dos Santos. Sobre a conversa com EVELYN, para levantar dinheiro, afirmou que desconhece a conversa e que não mantém proximidade com EVELYN e nem com TIAGO. A versão apresentada pela ré de que não mantém proximidade com EVELYN e TIAGO se infirma diante da conversa interceptada, na qual restou demonstrado que tratavam de novo esquema fraudulento, a ser praticado em face da agência da CEF de Porto Ferreira/SP. Restou comprovado ainda que entre os membros do grupo criminoso havia uma divisão de tarefas, sendo que a ré, membro do núcleo intermediário, fornecia suas contas como “contas de passagem”, além de receber os valores advindos das fraudes e repassava-os para o comando da organização. A ciência a respeito da prática de atos ilícitos também é inequívoca, consoante o teor das conversas interceptadas. Por conseguinte, diante de todo o explanado, entendo que houve in casu a incidência da norma penal incriminadora aventada na denúncia, pois a ré, de data inicial desconhecida, mas ao menos a partir do ano de 2021 até o dia 25/06/2024 (deflagração da fase ostensiva da operação), integrou pessoalmente organização criminosa voltada para a prática de reiterados crimes de estelionato em face de instituições financeiras, notadamente a CEF. Portanto, tenho por provado que a apelante integrava organização criminosa voltada à prática de crimes de estelionato contra instituições financeiras, dentre as quais a CEF, e, por isso, mantenho a condenação de ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS pela prática do crime previsto no art. 2º, caput, da Lei nº 12.850/2013, nos termos da denúncia. EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ e TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA Examino em conjunto a situação desses dois apelantes, que têm defesa comum, a qual pede sejam eles absolvidos porque, segundo alega, “em nenhum momento ficou comprovado que os valores movimentados nas contas dos apelantes foram originários das contas abertas de forma ilegal” e não estão presentes os requisitos necessários para caracterização de organização criminosa, principalmente pela ausência de estabilidade e permanência. Sem razão, contudo. EVELYN é filha da corré ANDREA e parceira do corréu TIAGO, bem como sobrinha de Vanessa Demétrio de Sá Macedo, tendo fornecido conscientemente suas contas bancárias para movimentação de valores obtidos por meio de fraudes. Ouvida em juízo, ela declarou que não tinha muito contato com a sua mãe, pois fora criada por sua tia (Vanessa), e que os valores que recebia da sua tia referiam-se ao seu trabalho como cuidadora do seu bisavô. Em relação à conversa sobre a fraude na agência da CEF em Porto Ferreira, simplesmente alegou que desconhecia isso. Contudo, destaco da sentença o seguinte trecho (ID 31263434364): A materialidade restou comprovada pelas conversas interceptadas nos autos nº 5000607-24.2024.403.6124, registro nº 173386199, dando conta de que EVELYN mantém conversa com sua mãe ANDREA, a respeito de uma nova fraude, para “levantar um dinheiro”, com a abertura de conta na agência da CEF de Porto Ferreira/SP. Pelo teor da conversa, percebe-se que EVELYN orienta ANDREA como deveria proceder para retirada do cartão do INSS, citando que a fraude teria sido praticada antes por uma pessoa de nome “VITOR”. Apurou-se, ainda, que EVELYN recebeu de THALITA MIRANDA ALCARAZ (núcleo avançado), aproximadamente, R$ 22.700,00, entre 26/08/2022 e 01/06/2023. A acusada também recebeu da conta de Terezinha Demetrio de Sá, movimentada por VANESSA, de 11/10/2022 a 13/06/2023, aproximadamente R$ 66.560,00, transferindo a ela o total de R$ 50.142,00 (ID 321346669 - p. 95/96 – 5000466-05.2024.4.03.6124). No cumprimento do mandado de busca e apreensão deferido pelo Juízo, nos autos nº 5000466-05.2024.4.03.6124, foram apreendidos dois Iphones Pro Max (modelo 14 e 15), outros 2 (dois) telefones celulares e um veículo Audi Q3, ano 2016/2017, em nome de TIAGO, esposo de EVELYN. As diligências realizadas na residência revelaram que o imóvel onde EVELYN reside com seu esposo foi recentemente reformado e possui móveis de alto padrão. Além disso, como destacou o MPF, o padrão das movimentações bancárias de EVELYN e dos bens apreendidos destoam das informações de sua renda, pois não foram encontrados vínculos empregatícios em seu nome, tão somente que fora beneficiária de auxílio emergencial (cf. ID 321346669, p. 97 dos autos nº 5000466-05.2024.4.03.6124). A Ré EVELYN, interrogada em Juízo, negou a imputação, afirmou que não mantém contato com sua mãe ANDREA e desconhece a conversa sobre nova fraude na agência da CEF em Porto Ferreira. Alegou que foi criada por sua tia VANESSA e era quem ajudava financeiramente a ré e seu bisavô. Que o dinheiro enviado para sua conta era porque cuidava de seu bisavô. Sobre o dinheiro recebido de THALITA declarou que, como VANESSA e THALITA eram sócias, recebeu o dinheiro de THALITA como ajuda de VANESSA. Indagada sobre o padrão de vida identificado, informou que ela e o marido TIAGO recebiam ajuda financeira da família do marido. Não é crível a versão apresentada por EVELYN de que recebia ajuda financeira de VANESSA para cuidar de seu bisavô, pois os registros das conversas interceptadas demonstram que a ré atuava conscientemente na organização criminosa, ciente das estratégias do esquema e fornecendo suas contas para movimentação de valores obtidos dos crimes. A defesa não apresentou novos elementos ou provas que pudessem comprovar que os valores recebidos eram destinados para os cuidados do bisavô e do filho de VANESSA. Como visto, observa-se que as escusas apresentadas pela acusada com o intuito de afastar sua autoria não se coadunam com os robustos elementos coligidos nos autos. Em relação a TIAGO, o MPF, em suas alegações finais, transcreveu trechos de uma conversa interceptada (com autorização judicial) que mostra a sua participação na atividade criminosa. Destaco dessa peça o seguinte trecho (ID 312634358): Conversas interceptadas após autorização judicial apontam que TIAGO e EVELYN planejaram a prática de fraude envolvendo abertura de conta e benefício previdenciário, provavelmente concretizada em agência bancária da CEF na cidade de Porto Ferreira/SP (ID 328852963 - Pág. 16/21 e 24/27 – 5000607-24.2024.4.03.6124). Cite-se, neste sentido, a ligação de registro 1730304746 , por meio da qual TIAGO (TMC 11 96818-0464) conversa com interlocutora que chama de “tia” (TMC 11 95883- 8983), planejando encontrá-la na manhã do dia seguinte em local referenciado como “Dom Bosco” para entregá-la uma colinha relacionada à “benefício”, mencionando que ela deveria “estudar” o “RG” e o “comprovante” pessoalmente. Segue a íntegra do diálogo: Alvo: TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA Nº Interceptado: (11) 96818-0464 Assunto: Tiago x MNI Tia - - Colinha no papel do benefício Nº Contato: (11) 95883-8983 ID: 173030474 Data: 12/06/2024 20:42:51 Duração: 00:02:16 Arquivo: 01_12_173030474_20240612204251_20364915 Tipo: Áudio Degravação: Tiago: Oi tia, tudo bem?... Tia deixa eu te falar para a senhora, amanhã, a senhora tem dinheiro no bilhete ai né? Tia: Tenho, dez reais Tiago: Amanhã a senhora consegue… ***Tiago fala fora da ligação*** Tiago: O vida, marca com ela seis e meia, sete horas, o Evelyn Tiago: Tia que horas a senhora chega lá? Seis e meia ou sete horas? Tia: Ah sete horas então… Tiago: Que amanhã eu vou acordar cedo também a sonsinha vai te levar , to indo buscar o carro com ela agora, consegui desbloquear esse inferno aqui… A senhora acha que vai precisar de colinha? Tia: É bom usar né, não tem como não usar, manda aquela colinha lá é rapidinho.. Não não precisa, pelos documentos eu já estudo, viu Tiago: Vou fazer a colinha pra senhora e mandar no papel do beneficio e ai o RG e o comprovante a senhora estuda pessoalmente Tia: Ta joia... Na dom bosco né? Tiago: Isso na dom bosco, ta bom? Sete horas Tia: Ta bom fio, ta marcado, sete horas eu to lá Tiago: Sete horas... dez pra sete eu já ligo pra senhora Na manhã do dia seguinte à ligação (13/06/2024), a ERB do celular de TIAGO estava próxima à localização da estação de metrô Dom Bosco, em São Paulo/SP (ID 328852963 - Pág. 6). Em paralelo, no mesmo dia 13/06/2024, o terminal que manteve a citada conversa com TIAGO registrou localizações de ERB, a partir das 10h00min, em Limeira/SP, se deslocando próximo a Porto Ferreira/SP (mesma cidade citada por EVELYN em conversa captada um dia depois – ligação de ID 173386199) perto das 12h00min e retornando à São Paulo/SP por volta das 15h00min (ID 329260116 - Pág. 17/19 – 5000607-24.2024.4.03.6124). Poucos dias depois, TIAGO manteve conversa com a mesma interlocutora (registro 1744235747) informando que conseguiu desbloquear determinado cartão e que até as oito horas da manhã chegaria uma senha para “tia”, indicando que a fraude combinada dias antes teria se concretizado efetivamente, conforme registro reproduzido abaixo: Alvo: TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA Nº Interceptado: (11)96818-0464 Assunto: Tiago X MNI "Tia" - liberando o aplicativo até umas oito horas sua senha chega Nº Contato: (11)95883-8983 ID: 174423574 Data: 20/06/2024 07:25:05 Duração: 00:01:15 Arquivo: 01_10_174423574_20240620072505_20364915 Tipo: Áudio Degravação: Tiago: Tia, bom dia, tudo bom? Já chegou? MNI Tia: Já, to aqui já Tiago: Tá, deixa eu te falar, to aqui em Itaquera aqui que eu vim desbloquear o cartão..consegui, ta bom? MNI Tia: Ah, ta joia Tiago: Ontem tava dando invalido ontem.. Ai to liberando o aplicativo tem que esperar trinta minutos ta bom? MNI: Ta joia, to aqui, vou sentar aqui no ponto de onibus Tiago: Ta bom, espera ai que até umas oito horas sua senha chega No mais, foram identificadas diversas transações bancárias de altos valores, sem origem comprovada, entre o corréu TIAGO e integrantes ligadas ao comando/topo da organização criminosa. Neste sentido, entre 19/08/2022 e 12/06/2023, TIAGO recebeu das contas de THALITA MIRANDA ALCARAZ, aproximadamente, R$ 230.830,00, enviando àquela acusada a quantia aproximada de R$ 81.900,00. O acusado também recebeu da conta de Terezinha Demetrio de Sá, administrada por VANESSA DEMÉTRIO DE SÁ MACEDO, entre 01/08/2022 e 27/04/2023, aproximadamente R$ 100.600,00, enviando a ela o total de R$ 53.948,93 (ID 321346669 - Pág. 88/93 e 96 – 5000466-05.2024.4.03.6124). Tratam-se de valores advindos dos crimes praticados. Ouvido em juízo, esse apelante negou a prática delitiva e declarou que os valores que recebera em sua conta corrente referiam-se à reforma na casa em que residia com sua esposa (EVELYN), que cuidava do bisavô dela. Quanto aos valores que enviou para Vanessa e Thalita Miranda Alcaraz (integrante do núcleo avançado da organização criminosa), disse que seriam devoluções por serviços não executados na reforma, mas sua defesa não apresentou nenhuma prova de que os valores recebidos na sua conta referiam-se a essa reforma. Ainda sobre o envolvimento do apelante na organização criminosa, constam da Informação de Polícia Judiciária nº 3287723/2024 (ID 312633828, pp. 65/79) as informações extraídas do celular de Vinicius Gabriel Vieira da Rocha (integrante do núcleo intermediário da organização criminosa), segundo as quais ele mantinha conversa com TIAGO no aplicativo Whatsapp, indicando que fornecia informações e dados sobre potenciais vítimas de fraudes bancárias ao apelante. Seguem trechos da IPJ que destacam as principais conversas: No dia 22/01/2024, TIAGO chama VINICIUS GABRIEL e pergunta “meu tá fluindo?”. VINICIUS GABRIEL responde que sim, que quando chegar em casa vai dar uma atenção “no dele” e que na semana anterior VANESSA pesou. Entende-se aqui que VINICIUS GABRIEL estaria também trabalhando para TIAGO realizando buscas e captando nomes de vítimas. TIAGO envia um áudio dizendo que "é foda trabalhar pra mais de uma pessoa" e enfatiza que VANESSA paga VINICIUS GABRIEL semanalmente. TIAGO pede para VINICIUS GABRIEL dar uma atenção para ele naquela semana, pois ele está arrumando outra "funcionária", possivelmente uma mulher para atuar abrindo as contas bancárias em nome das vítimas. TIAGO diz que também arrumou um homem, irmão dessa funcionária, e que vai precisar também de nomes de homens. Ele pede para VINICIUS GABRIEL focar primeiro em nomes femininos.(...) No dia 24/01/2024, TIAGO pergunta se VINICIUS GABRIEL tem novidades. VINICIUS GABRIEL responde que não efetuou buscas por nomes no dia anterior, pois ficou sem energia e quando foi "puxar" os nomes já estava sem limites. Ele diz que falou com uma mulher e que ela ia arrumar. VINICIUS GABRIEL comenta que o dia anterior foi perdido "por conta da senha do INSS". TIAGO pergunta se ele já está procurando por nomes naquele dia e diz que está precisando de pelo menos 20 nomes femininos, pois na segunda-feira vai pedir nomes masculinos, dando a entender que TIAGO estaria se preparando para abrir 20 contas bancárias em nome de vítimas mulheres e depois abrir contas bancárias em nome de vítimas do sexo masculino. (...) No dia 25/01/2024, TIAGO envia mensagens para VINICIUS GABRIEL, porém apaga essas mensagens. VINICIUS GABRIEL diz que conseguiu 11 nomes, mas ainda não consultou se os nomes estão limpos pois está sem senha e pede para TIAGO já ver uma senha para consultar o SCORE. VINICIUS GABRIEL reclama que consultou 27 nomes para conseguir encontrar 1 que está "ok". TIAGO envia diversas mensagens e as apaga. VINICIUS GABRIEL diz que vai tentar entregar todos os nomes até o dia seguinte. (...) No dia 26/01/2024, VINICIUS GABRIEL fiz que "mandou lá", fazendo referência à lista de nomes das vítimas. TIAGO pergunta quantos nomes VINICIUS GABRIEL enviou. VINICIUS GABRIEL responde que conseguiu "puxar" 16 nomes, mas que o último estava sujo e que não tinha mais nomes de mulher na idade estipulada. Mais uma vez, entende-se que VINICIUS GABRIEL estaria não só trabalhando para VANESSA DEMÉTRIO na busca de nomes de vítimas, mas também para TIAGO. Ao ser ouvido em juízo, o apelante declarou que desconhecia essas as ligações. Contudo, conforme consta da sentença, foram apreendidos (no cumprimento de mandado de busca e apreensão realizados no imóvel onde ele reside com EVELYN) dois Iphones Pro Max (modelos 14 e 15), dois telefones celulares e um veículo Audi Q3, ano 2016/2017 (avaliado em R$ 101.279,00 – ID 312633712, p. 19), em seu nome (TIAGO), incompatíveis com a sua renda declarada, pois ele foi beneficiário de auxílio emergencial e não foram localizados vínculos empregatícios em seu nome. Destaco da sentença (ID 31263434364): No cumprimento do mandado de busca e apreensão deferido pelo Juízo, nos autos nº 5000466-05.2024.4.03.6124, foram apreendidos dois Iphones Pro Max (modelo 14 e 15), outros 2 (dois) telefones celulares e um veículo Audi Q3, ano 2016/2017, em nome de TIAGO. As diligências realizadas na residência revelaram que o imóvel onde reside com EVELYN foi recentemente reformado e possui móveis de alto padrão. Além disso, como bem destacou o MPF, o padrão das movimentações bancárias de TIAGO e dos bens apreendidos destoam das informações de sua renda, pois não foram encontrados vínculos empregatícios em seu nome, tão somente que fora beneficiário de auxílio emergencial (cf. ID 333179332). Somado a isso, o conteúdo extraído do aparelho celular de VINICIUS GABRIEL VIEIRA DA ROCHA (IPJ nº 3287723/2024 - ID 336725649) confirma a participação ativa de TIAGO no esquema criminoso desenvolvido pela organização, pois nas conversas entre os dois ficou evidente que VINICIUS fornecia informações e dados sobre potenciais vítimas de fraudes bancárias ao acusado TIAGO. O réu, interrogado em Juízo, negou a prática delitiva, declarando que os valores recebidos de VANESSA em sua conta-corrente, cuja origem o acusado não tinha conhecimento, teriam sido exclusivamente para fazer uma reforma na casa onde sua esposa EVELYN residia e cuidava do bisavô dela e afilhado Davi (filho de VANESSA). Questionado sobre os valores recebidos de THALITA, afirma que também teriam sido enviados por VANESSA, visto que aquela era sócia desta. Questionado sobre os valores enviados para VANESSA e THALITA, respectivamente, nos montantes totais de R$ 81.900,00 e R$ 53.948,93, o acusado alega que seriam referentes à devolução por serviços não prestados quanto à citada reforma. Indagado sobre as ligações com a pessoa “tia”, afirmou desconhecer a ligação, afirmando que reside perto da estação Dom Bosco. A defesa não apresentou novos elementos ou provas que pudessem comprovar que os valores recebidos eram destinados para a referida reforma. Nesse contexto, a testemunha arrolada pela defesa de TIAGO, Bruno Santos da Silva, informou que o réu presta serviço para sua empresa, de forma esporádica e terceirizada, ganhando, dependendo do serviço que presta, de R$500,00 a R$1.000,00 por semana, reforçando que os bens e o padrão de vida de TIAGO é incompatível com a renda que recebe como técnico de refrigeração. Como visto, observa-se que a escusa apresentada pelo acusado com o intuito de afastar sua autoria não se coaduna com os robustos elementos coligidos nos autos. Restou comprovado ainda que entre os membros do grupo criminoso havia uma divisão de tarefas, sendo que o réu, membro do núcleo intermediário, fornecia suas contas como “contas de passagem”, além de receber os valores advindos das fraudes e repassar para o comando da organização, também organizava suas próprias fraudes. Por conseguinte, diante de todo o explanado, entendo que houve in casu a incidência da norma penal incriminadora aventada na denúncia, pois o réu, de data inicial desconhecida, mas ao menos a partir do ano de 2021 até o dia 25/06/2024 (deflagração da fase ostensiva da operação), integrou pessoalmente organização criminosa voltada para a prática de reiterados crimes de estelionato em face de instituições financeiras, notadamente a CEF. Portanto, estando devidamente comprovado que os apelantes integraram organização criminosa voltada à prática de crimes de estelionato contra instituições financeiras, dentre as quais a CEF, mantenho as condenações de EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ e TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA pela prática do crime previsto no art. 2º, caput, da Lei nº 12.850/2013, nos termos da denúncia. WESLEY SILVIO BESSA A defesa de WELSEY pede a sua absolvição, com base no inciso VII do art. 386 do Código de Processo Penal, pois, segundo alega, sua condenação fundamentou-se unicamente em prova colhida na fase investigatória, o que ofende o disposto no art. 155 do Código de Processo Penal. Sem razão. O art. 155 do Código de Processo Penal dispõe que o juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas. O caso em exame entra no rol dessas exceções. Com efeito, foram obtidas várias provas em razão de cumprimento de mandado de busca e apreensão expedido por ordem judicial no Inquérito Policial nº 5000079-24.2023.4.03.6124 e a obtenção dessa prova é cautelar e irrepetível, de modo que está amparada na legislação processual penal. Nesse sentido: AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PLEITO DE NULIDADE DA CITAÇÃO POR EDITAL. TODOS OS MEIOS PARA A LOCALIZAÇÃO ESGOTADOS. SÚMULA 7/STJ. CONDENAÇÃO COM PROVAS COLHIDAS NA FASE INVESTIGATIVA. PROVAS IRREPETÍVEIS E ANTECIPADAS. POSSIBILIDADE. SÚMULA 83/STJ. AGRAVO IMPROVIDO. 1. A reversão da premissa fática de que esgotados todos os meios para localização da ré, a justificar a citação por edital, encontra óbice na Súmula 7/STJ. 2. As provas irrepetíveis e antecipadas, como o laudo pericial e o mandado de busca e apreensão, produzidos nos autos do inquérito policial, podem servir como base para condenação. 3. Agravo regimental improvido. (STJ, AgRg no AREsp nº 1.439.910/SC, Quinta Turma, Rel. Ministro Nefi Cordeiro, J. 08.10.2019, DJe 17.10.2019) Consta das alegações finais do MPF que existem inúmeras provas de que esse apelante participou ativamente do esquema criminoso. Destaco dessa peça o seguinte trecho (ID 312634358): WESLEY SILVIO BESSA é sobrinho de RITA DE CASSIA BESSA (núcleo avançado), com quem residia, e atuou no esquema criminoso desenvolvido fornecendo suas contas-correntes para os membros de alto escalão para recebimento e repasse de valores advindos dos ilícitos praticados. Este acusado figura como investigado/envolvido em, ao menos, 7 (sete) inquéritos policiais com a finalidade de apurar crimes de estelionato qualificados contra a CEF, praticados com o mesmo modus operandi dos narrados anteriormente. Em todos os procedimentos, WESLEY foi identificado como beneficiário de parte dos valores provenientes dos empréstimos consignados realizados mediante uso de documentos falsos em nome das vítimas (ID 321346669 - Pág. 111/114 – 5000466-05.2024.4.03.6124). São eles: [...] Somente em decorrência das fraudes contra aposentados/pensionistas identificadas e levantadas pela CEF, a conta de WESLEY recebeu o total de R$ 211.097,02 (Ofício nº 38/2023/CEFRA/DF - ID 322134146 - Pág. 28 – 5000466-05.2024.4.03.6124) As diligências obtidas após o cumprimento das buscas e apreensões revelaram que WESLEY residia no mesmo imóvel que RITA DE CÁSSIA BESSA, uma das chefes da ORCRIM, onde foram localizados e apreendidos diversos documentos relacionados as práticas delitivas narradas (ID’s 333179336 e 333179340) . Interrogado em juízo, o apelante negou fazer parte da organização criminosa. Alegou que apenas aceitara a proposta de uma pessoa (que conhecia como “Bil”) para receber dinheiro em sua conta e repassá-lo para outras contas, recebendo cem reais a cada mil reais transferidos. Disse que não tinha conhecimento de que os valores eram provenientes de estelionato. Contudo, não é crível que não tivesse conhecimento da origem criminosa dos valores depositados na sua conta, conforme destacado no seguinte trecho da sentença: Interrogado em Juízo, o réu negou a prática do crime imputado. Alegou, em síntese, que aceitou uma proposta para receber valores em sua conta e repassá-los a troco de um percentual, sem saber que os valores eram de estelionato. A proposta foi feita por uma pessoa que se apresentava como “Bil”, que era de fora do convívio do acusado, e o acusado recebia cerca de 20 a 30 mil reais na conta e enviava para outras contas, recebendo cem reais a cada mil reais transferidos. Questionado do porquê outras duas pessoas ligadas a ele e sua tia RITA DE CÁSSIA BESSA (Ramissayane Sthefany da Silva Bessa e Sabrina Bessa dos Santos) também receberam valores provenientes das fraudes praticadas contra os beneficiários do INSS, o réu alegou que ele quem pediu a conta para elas. Por fim, confessou que fazia parte desse esquema de fornecimento de contas. Ainda que alegue que desconhecia a origem do dinheiro que recebia em sua conta, não é crível que não tinha conhecimento das fraudes praticadas pela organização criminosa, sendo que residia com uma das integrantes do núcleo avançado e havia na residência diversos documentos relacionados às fraudes. Como destacou o MPF, o réu não declinou nenhuma outra informação a respeito da pessoa que supostamente o teria proposto o esquema de contas de passagem (“Bil”), o que descredibiliza suas alegações. Como visto, observa-se que as escusas apresentadas pelo acusado com o intuito de afastar sua participação não se coadunam com os robustos elementos coligidos nos autos. Restou comprovado ainda que entre os membros do grupo criminoso havia uma divisão de tarefas, sendo que o réu, membro do núcleo intermediário, fornecia suas contas como “contas de passagem”, além de receber os valores advindos das fraudes, também os repassava para o comando da organização. Por conseguinte, diante de todo o explanado, entendo que houve in casu a incidência da norma penal incriminadora aventada na denúncia, pois o réu, de data inicial desconhecida, mas ao menos a partir do ano de 2021 até o dia 25/06/2024 (deflagração da fase ostensiva da operação), integrou pessoalmente organização criminosa voltada para a prática de reiterados crimes de estelionato em face de instituições financeiras, notadamente a CEF. Portanto, comprovado que o apelante integrou organização criminosa voltada à prática de crimes de estelionato contra instituições financeiras, dentre as quais a CEF, mantenho a condenação de WESLEY SILVIO BESSA pela prática do crime previsto no art. 2º, caput, da Lei nº 12.850/2013, nos termos da denúncia. Dosimetria das penas Passo ao reexame da dosimetria das penas. ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS Na primeira fase, o juízo a quo fixou a pena-base em 4 (quatro) anos e 3 (três) meses de reclusão e 98 (noventa e oito) dias-multa, com base nos seguintes fundamentos: Atento aos critérios constantes no artigo 59 do Código Penal, verifico que ultrapassaram os limites do tipo as circunstâncias do delito, pois a organização criminosa se valia do uso de inúmeros documentos falsificados para a prática das fraudes delitivas apuradas, bem como fazia uso de contas-correntes de interpostas pessoas para dificultar o rastreamento dos valores indevidos obtidos com os crimes; e as consequências do delito, pois a CEF apontou 124 contas abertas por meio de documentação falsa de beneficiários do INSS relacionados ao grupo criminoso, cujas operações de crédito somam a quantia de R$ 5.122.654,48, o que revela a gravidade do impacto social das fraudes. A defesa pede a redução da pena-base ao mínimo legal. Com parcial razão. As circunstâncias e consequências do delito são negativas, porém a elevação feita pelo juízo de primeiro grau merece pequeno ajuste, especialmente em relação à pena de multa. Ocorre que esta Turma tem entendimento de que a quantificação da pena de multa deve dar-se de forma proporcional à pena privativa de liberdade, seguindo o mesmo critério trifásico de dosimetria da pena privativa de liberdade (ApCrim nº 0002526-47.2011.4.03.6106/SP, Rel. Des. Federal Nino Toldo, j. 01.9.2015, e-DJF3 Judicial 1 03.9.2015). Por isso, acolho em parte o recurso nesse ponto e reduzo a pena-base para 4 (quatro) anos de reclusão e 13 (treze) dias-multa. Na segunda fase, o juízo não reconheceu nenhuma circunstância atenuante e reconheceu a circunstância agravante da reincidência (CP, art. 61, I - Ação Penal nº 0012278-07.2014.4.03.6181 – trânsito em julgado em 09.06.2020), na fração de 1/6 (um sexto), o que confirmo. Assim, a pena intermediária fica em 4 (quatro) anos e 8 (oito) meses de reclusão e 15 (quinze) dias-multa. Na terceira fase, o juízo não aplicou nenhuma causa de aumento ou de diminuição de pena, o que confirmo, ficando a pena definitiva estabelecida em 4 (quatro) anos e 8 (oito) meses de reclusão e 15 (quinze) dias-multa, mantido o valor unitário do dia-multa no mínimo legal. EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ e TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA Analiso simultaneamente as penas fixadas para EVELYN e TIAGO porque são semelhantes as circunstâncias de fato a eles relativas. Eventuais situações específicas serão destacadas a fim de se observar estritamente o princípio da individualização da pena. Na primeira fase, o juízo a quo fixou a pena-base em 4 (quatro) anos e 3 (três) meses de reclusão e 98 (noventa e oito) dias-multa, com base nos seguintes fundamentos: Atento aos critérios constantes no artigo 59 do Código Penal, verifico que ultrapassaram os limites do tipo as circunstâncias do crime, pois a organização criminosa se valia do uso de inúmeros documentos falsificados para a prática das fraudes delitivas apuradas, bem como fazia uso de contas-correntes de interpostas pessoas para dificultar o rastreamento dos valores indevidos obtidos com os crimes; e as consequências do delito, pois a CEF apontou 124 contas abertas por meio de documentação falsa de beneficiários do INSS relacionados ao grupo criminoso, cujas operações de crédito somam a quantia de R$ 5.122.654,48, além das vítimas serem idosos, com saúde debilitada e dependentes economicamente dos benefícios, o que revela a gravidade do impacto social das fraudes. A defesa pede a redução da pena-base ao mínimo legal. Com parcial razão. As circunstâncias e consequências do delito são negativas, porém a elevação feita pelo juízo de primeiro grau merece pequeno ajuste, especialmente em relação à pena de multa. Ocorre que esta Turma tem entendimento de que a quantificação da pena de multa deve dar-se de forma proporcional à pena privativa de liberdade, seguindo o mesmo critério trifásico de dosimetria da pena privativa de liberdade (ApCrim nº 0002526-47.2011.4.03.6106/SP, Rel. Des. Federal Nino Toldo, j. 01.9.2015, e-DJF3 Judicial 1 03.9.2015). Por isso, acolho em parte o recurso nesse ponto e reduzo a pena-base para 4 (quatro) anos de reclusão e 13 (treze) dias-multa para cada réu. Na segunda fase, o juízo não reconheceu circunstâncias agravantes nem atenuantes, o que confirmo, não se alterando a pena intermediária em relação à pena-base. Na terceira fase, o juízo não aplicou nenhuma causa de aumento ou de diminuição de pena, porém a defesa pede a aplicação da causa de diminuição prevista no art. 29, § 1º, do Código Penal (participação de menor importância), porém sem razão porque foi comprovado que a atuação dos apelantes não foi menor, mas de ativa participação na organização criminosa pelo fornecimento de contas de passagem, que se mostraram indispensáveis para o seu funcionamento. Assim, a pena definitiva para cada um desses réus fica estabelecida em 4 (quatro) anos de reclusão e 13 (treze) dias-multa, mantido o valor unitário do dia-multa no mínimo legal. WESLEY SILVIO BESSA Na primeira fase, o juízo a quo fixou a pena-base em 4 (quatro) anos e 3 (três) meses de reclusão e 98 (noventa e oito) dias-multa, com base nos mesmos fundamentos acima transcritos. A defesa pede a redução da pena-base ao mínimo legal. Com parcial razão. Conforme dito acima, as circunstâncias e consequências do delito são negativas, porém a elevação feita pelo juízo de primeiro grau merece pequeno ajuste, especialmente em relação à pena de multa, na linha de entendimento da Turma já exposto. Por isso, acolho em parte o recurso nesse ponto e reduzo a pena-base para 4 (quatro) anos de reclusão e 13 (treze) dias-multa. Na segunda fase, o juízo não reconheceu circunstâncias agravantes nem atenuantes, o que confirmo, não se alterando a pena intermediária em relação à pena-base. A defesa pede sejam reconhecidas as circunstâncias atenuantes da confissão espontânea (CP, art. 65, III, “d”) e da menoridade relativa (CP, art. 65, I). Sem razão, porém. Ocorre que o apelante negou a prática do crime, tendo admitido apenas que emprestara sua conta para um indivíduo conhecido, sem saber que os valores eram provenientes de estelionato. Isso, todavia, não configura confissão. Além disso, nascido no dia 15.5.2002, tinha 22 anos completos na data da deflagração da fase ostensiva da Operação Anonymous (em 25.6.2024). Portanto, não ocorre nenhuma das hipóteses atenuantes mencionadas. Na terceira fase, o juízo não aplicou nenhuma causa de aumento ou de diminuição de pena, o que confirmo ficando a pena definitiva estabelecida em 4 (quatro) anos de reclusão e 13 (treze) dias-multa, mantido o valor unitário do dia-multa no mínimo legal. Regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade Mantenho o regime fechado para início do cumprimento da pena privativa de liberdade (CP, art. 33, § 2º, "a") fixada para a corré ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS porque, apesar de o total da pena fixada não ser superior a oito anos de reclusão, ela é reincidente (CP, art. 33, § 2º, "b"), não sendo cabível a substituição dessa pena por restritivas de direitos (CP, art. 44, I e II). Observo que essa apelante não chegou a ser presa preventivamente, razão pela qual não há desconto a ser feito a título de tempo de prisão provisória. Em relação aos corréus EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ, TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA e WESLEY SILVIO BESSA, o juízo havia fixado o regime semiaberto para início do cumprimento de suas respectivas penas privativas de liberdade, considerando que as penas que fixara eram superiores quatro anos de reclusão. Contudo, ante o redimensionamento das penas, que não ultrapassaram quatro anos de reclusão para nenhum deles, e que as circunstâncias judiciais não são negativas (CP, art. 59), dou provimento aos recursos das defesas desses réus nesse ponto para fixar o regime aberto para início do cumprimento das respectivas penas privativas de liberdade (CP, art. 33, § 2º, "c"), observando que, em relação ao corréu TIAGO, a Décima Primeira Turma, por unanimidade, na sessão de 13.3.2025, concedeu ordem de habeas corpus para garantir a esse réu “que o regime adequado para o início do cumprimento da [sua] pena é o aberto”. O acórdão do Habeas Corpus nº 5033888-10.2024.4.02.0000 tem a seguinte ementa: PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. DETRAÇÃO. 1. O art. 387, § 1º, do Código de Processo Penal dispõe que o juiz, na sentença, decidirá, fundamentadamente, sobre a manutenção ou, se for o caso, a imposição de prisão preventiva ou de outra medida cautelar, sem prejuízo do conhecimento de apelação que vier a ser interposta. 2. O regime inicial de cumprimento da pena fixado na sentença (semiaberto) deverá ser objeto de oportuno exame pela Turma no julgamento da apelação criminal interposta pela defesa do paciente. No entanto, considerando a pena fixada na condenação, o tempo de prisão já cumprido pelo paciente, suas condições subjetivas favoráveis e que o MPF não recorreu da sentença, é possível afirmar, desde logo, que o regime adequado para o início do cumprimento da pena é o aberto, que é incompatível com a manutenção da prisão do paciente, cuja liberdade não pode aguardar os trâmites ordinários da expedição e processamento da guia de execução provisória. 3. Ordem concedida. Além disso, presentes os requisitos do art. 44 do Código Penal, substituo as penas privativas de liberdade de cada réu por duas penas restritivas de direitos para cada um, consistentes em: i) prestação de serviços à comunidade ou a entidade pública, pelo período das penas substituídas, em local e modo a serem indicados pelo juízo da execução penal; ii) prestação pecuniária, no valor de 3 (três) salários mínimos, em favor de entidade pública ou privada com destinação social a ser indicada pelo juízo da execução penal. Prisão preventiva A defesa de ANDREA pede a revogação da sua prisão preventiva e o o recolhimento do mandado de prisão expedido em seu desfavor. Sem razão. O juízo de origem manteve a decretação da sua prisão preventiva pelos seguintes fundamentos: Mantendo-se integras as razões cautelares que justificaram a decretação da prisão preventiva da ré, e tendo ela permanecido foragida durante todo o processo, mantenho a sua prisão preventiva decretada (art. 387, §1º, do Código de Processo Penal). Mantenho a prisão preventiva porque ainda estão presentes os motivos que levaram à sua decretação (garantia da ordem pública e da aplicação da lei penal) e a apelante encontra-se foragida desde então, situação que se estendeu ao longo de todo o processo e demonstra não só o descaso da apelante como também a necessidade da sua prisão para garantia da ordem da pública e da aplicação da lei penal. Assistência judiciária gratuita Defiro aos apelantes os benefícios da assistência judiciária gratuita. Contudo, esse deferimento não impede a condenação ao pagamento das custas processuais, sendo sua isenção matéria a ser examinada em sede de execução do julgado (STJ, AgRg no Ag 1.377.544/MG, Quinta Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 31.05.2011, DJe 14.06.2011), tampouco implica provimento de qualquer parte do recurso, pois não foi demonstrado que a gratuidade tenha sido requerida ao juízo de primeiro grau e por ele tenha sido indeferida. Conclusão Posto isso, DOU PARCIAL PROVIMENTO às apelações, para reduzir a pena-base de todos os apelantes e fixar o regime aberto para início de cumprimento das penas privativas de liberdade de EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ, TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA e WESLEY SILVIO BESSA, substituindo-as por penas restritivas de direitos, ficando as penas definitivas estabelecidas em 4 (quatro) anos e 8 (oito) meses de reclusão, em regime inicial fechado, e 15 (quinze) dias-multa, para ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS, e em 4 (quatro) anos de reclusão, em regime inicial aberto, e 13 (treze) dias-multa, para EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ, TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA e WESLEY SILVIO BESSA, nos termos da fundamentação supra. É o voto. Autos: APELAÇÃO CRIMINAL - 5000872-26.2024.4.03.6124 Requerente: ANDREA DEMETRIO DE SA SANTOS e outros Requerido: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP Ementa: Direito penal e processual penal. Apelação criminal. Organização Criminosa. Fraudes bancárias. Operação Anonymous. Nulidades. Competência. Princípio da insignificância. Dosimetria da pena. Pena-base. Recursos parcialmente providos. I. Caso em exame 1. Trata-se de apelações interpostas em face da sentença, no âmbito da denominada Operação Anonymous, que condenou os réus pela prática do crime de organização criminosa (art. 2º, caput, § 3º, da Lei 12.850/2013), na transferência de valores obtidos mediante empréstimos em instituições financeiras com uso de documentos falsos. II. Questão em discussão 2. As questões em discussão consistem em saber se: (i) o juízo de Jales é competente para processar e julgar o feito; (ii) houve nulidade na obtenção das provas mediante interceptação de comunicações telefônicas; (iii) é cabível a aplicação ao caso do princípio da insignificância; (iv) se o não oferecimento de ANPP constitui nulidade; (v) há provas suficientes para a condenação; (vi) está correta a dosimetria das penas. III. Razões de decidir 3. Tendo se consumado o crime no momento da obtenção da vantagem ilícita, a regra aplicável é a do do art. 70, caput, do Código de Processo Penal. A Justiça Federal de Jales era competente para processar e julgar a ação penal. 4. O caso concreto em exame reflete, de forma clássica, aquelas situações em que a medida excepcional da interceptação das comunicações telefônicas mostra-se imprescindível para a obtenção da prova. Nulidade inexistente. 5. Não é aplicável o princípio da insignificância em crime de organização criminosa, pois o bem jurídico tutelado é a fé pública e, segundo jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça (STJ), esse princípio não se aplica a crimes dessa natureza. 6. Ante a recusa do MPF em oferecer (de forma motivada) o ANPP, os acusados (por sua defesa técnica) tinham o direito de requerer a remessa dos autos ao órgão superior do Ministério Público, nos termos do § 14 do art. 28-A do Código de Processo Penal. Todavia, não o fizeram, tendo ocorrido a preclusão. Além disso, a jurisprudência firmou-se no sentido de que o ANPP não constitui direito subjetivo do acusado, podendo ser proposto pelo Ministério Público quando considerar necessário e suficiente à reprovação e prevenção da infração penal, o que não se verificou no caso. 7. Materialidade, autoria e dolo comprovados em relação a todos os réus. São suficientes as provas da participação dos réus na organização criminosa, com base nas conversas telefônicas interceptadas, nos depoimentos e nas movimentações financeiras ilícitas. 8. Dosimetria das penas. Penas-bases redimensionadas e alterado, em relação a três deles, o regime inicial de cumprimento com a possibilidade de substituição por penas restritivas de direitos. IV. Dispositivo e tese 9. Recursos parcialmente providos. Tese de julgamento: “1. Tendo se consumado o crime no momento da obtenção da vantagem ilícita, a regra aplicável é a do do art. 70, caput, do Código de Processo Penal. 2. Interceptações telefônicas autorizadas judicialmente e devidamente fundamentadas são válidas e podem embasar a condenação. 3. O princípio da insignificância não é aplicável ao crime de organização criminosa, dada a tutela da fé pública. 4. O acordo de não persecução penal não constitui direito subjetivo do réu, podendo o Ministério Público recusar o seu oferecimento motivadamente.” _________ Dispositivos relevantes citados: CP, arts. 59, 65, 61, I; CPP, arts. 70, 155, 226, 28-A; Lei nº 12.850/2013, art. 2º, caput e § 3º. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgRg no AREsp nº 2.747.808/MG, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, 5ª Turma, j. 27.11.2024, DJEN 4.12.2024; STF, HC nº 195.725/SP, Rel. Min. Alexandre de Moraes, j. 28.01.2021. ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Primeira Turma, por unanimidade, decidiu DAR PARCIAL PROVIMENTO às apelações, para reduzir a pena-base de todos os apelantes e fixar o regime aberto para início de cumprimento das penas privativas de liberdade de EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ, TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA e WESLEY SILVIO BESSA, substituindo-as por penas restritivas de direitos, ficando as penas definitivas estabelecidas em 4 (quatro) anos e 8 (oito) meses de reclusão, em regime inicial fechado, e 15 (quinze) dias-multa, para ANDREA DEMETRIO DE SÁ SANTOS, e em 4 (quatro) anos de reclusão, em regime inicial aberto, e 13 (treze) dias-multa, para EVELYN CRISTINA DEMETRIO DE SÁ, TIAGO PEREIRA DE OLIVEIRA e WESLEY SILVIO BESSA, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. NINO TOLDO Desembargador Federal

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