Processo nº 5013719-65.2025.4.03.0000
ID: 329332881
Tribunal: TRF3
Órgão: Gab. 40 - DES. FED. NINO TOLDO
Classe: HABEAS CORPUS CRIMINAL
Nº Processo: 5013719-65.2025.4.03.0000
Data de Disponibilização:
18/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
MICHEL DE OLIVEIRA
OAB/MG XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 11ª Turma HABEAS CORPUS CRIMINAL (307) Nº 5013719-65.2025.4.03.0000 RELATOR: Gab. 40 - DES. FED. NINO TOLDO PACIENTE: ANTONIO MAURO BRAGA IMPET…
PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 11ª Turma HABEAS CORPUS CRIMINAL (307) Nº 5013719-65.2025.4.03.0000 RELATOR: Gab. 40 - DES. FED. NINO TOLDO PACIENTE: ANTONIO MAURO BRAGA IMPETRANTE: MICHEL DE OLIVEIRA Advogado do(a) PACIENTE: MICHEL DE OLIVEIRA - MG192628-A IMPETRADO: SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE SÃO JOSÉ DOS CAMPOS/SP - 1ª VARA FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: FISCAL DA LEI: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 11ª Turma HABEAS CORPUS CRIMINAL (307) Nº 5013719-65.2025.4.03.0000 RELATOR: Gab. 40 - DES. FED. NINO TOLDO PACIENTE: ANTONIO MAURO BRAGA IMPETRANTE: MICHEL DE OLIVEIRA Advogado do(a) PACIENTE: MICHEL DE OLIVEIRA - MG192628-A IMPETRADO: SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE SÃO JOSÉ DOS CAMPOS/SP - 1ª VARA FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: FISCAL DA LEI: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL R E L A T Ó R I O O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NINO TOLDO (Relator): Trata-se de habeas corpus, com pedido de liminar, impetrado pelo advogado Michel de Oliveira Santos, em favor de ANTONIO MAURO BRAGA, contra a decisão da 1ª Vara Federal de São José dos Campos/SP (ID 327294180) que, acolhendo o pedido do Ministério Público Federal (MPF), determinou o desmembramento do Inquérito Policial nº 0000834-46.2016.4.03.6103, para apurar a participação de terceiros, ainda não identificados (ID 327294180, pp. 95/97), nos delitos do art. 313-A do Código Penal, praticados, em tese, pelos denunciados Leandro Ribeiro Martins Alves e Marcelo Luis Machado Quinsan (idem, pp. 98/138). Segundo o impetrante: Em síntese, no final de maio/2025, o Paciente, ANTONIO MAURO BRAGA, foi surpreendido com intimação da Polícia Federal para prestar esclarecimentos em audiência virtual designada para o dia 16/06/2025, às 10h, por meio da plataforma Microsoft Teams. Notadamente, referido inquérito é decorrente do desmembramento da Ação Penal nº 0000834-46.2016.4.03.6103, proposta pelo Ministério Público Federal contra terceiros (Leandro Ribeiro Martins Alves e Marcelo Luiz Machado Quinsan), acusados de forjarem vínculos de empregos falsos e de inserir, no sistema do INSS, tais vínculos empregatícios e remunerações fictícias para viabilizar a concessão indevida de benefícios previdenciários. Ocorre que, no caso do Paciente, os vínculos empregatícios mencionados na peça acusatória (ID 346238693 – Fato 6), ou seja, ANTOINE KHALIL HELOCE e PROMILK INDÚSTRIA DE QUEIJOS LTDA., já foram objeto de análises minuciosas e definitivas pelo próprio INSS em recurso que reconheceu a validade dos vínculos anotados em CTPS, com ressalva de que não houve esclarecimentos a respeito dos exatos termos finais dos referidos vínculos, o que foi devidamente esclarecido nos autos do Proc. nº 1004390-46.2020.4.01.3810, do TRF-6, que culminou no reconhecimento integral dos dois vínculos empregatícios, declarando a nulidade do processo de investigativo que cancelou o benefício concedido anteriormente. Argumenta que o prosseguimento do inquérito reabre "discussão já superada no âmbito judicial, contrariando os princípios da segurança jurídica e do devido processo legal", e que, embora o paciente não tenha sido denunciado na ação penal, "seu nome é indevidamente citado na exordial acusatória de forma reiterada, genérica e sem qualquer individualização de conduta, sendo tratado como um suposto beneficiário de ato ilícito, sem que tenha sido sequer formalmente indiciado" (ID 326678864). E complementa: Mais grave ainda é o fato de que o nome do Paciente aparece na denúncia para sustentar uma tese acusatória contra terceiros, como se fosse parte de um “modus operandi”, o que acarreta reflexos jurídicos e práticos danosos; tais como: estigmatização social, comprometimento de sua imagem funcional e a instauração de investigação criminal derivada — que é, na origem, absolutamente despida de justa causa. Por isso, pede a concessão liminar da ordem para que seja suspenso o andamento do inquérito policial, incluindo-se a audiência virtual designada pela autoridade policial para o dia 16.6.2025, bem como a Ação Penal nº 0000834-46.2016.4.03.6103, relativamente aos fatos relacionados ao paciente, e, ao final, a concessão da ordem em definitivo para que seja trancado o mencionado inquérito e, parcialmente, a ação penal. Antes de apreciar o pedido, determinei a intimação do impetrante para que instruísse adequadamente o habeas corpus, apresentando cópia da decisão impugnada e do inquérito policial referidos na inicial, bem como solicitei informações à autoridade impetrada (ID 326749593), o que foi atendido por ambos (ID 327294179 e seguintes; ID 327325653 e seguintes). Em seguida, indeferi o pedido de concessão liminar da ordem (ID 327352114), o que foi objeto de agravo regimental interposto pelo impetrante (ID 328038979), no qual reiterou os argumentos da impetração. O Ministério Publico Federal opinou pela denegação da ordem (ID 329336631). É o relatório. PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 11ª Turma HABEAS CORPUS CRIMINAL (307) Nº 5013719-65.2025.4.03.0000 RELATOR: Gab. 40 - DES. FED. NINO TOLDO PACIENTE: ANTONIO MAURO BRAGA IMPETRANTE: MICHEL DE OLIVEIRA Advogado do(a) PACIENTE: MICHEL DE OLIVEIRA - MG192628-A IMPETRADO: SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE SÃO JOSÉ DOS CAMPOS/SP - 1ª VARA FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: FISCAL DA LEI: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL V O T O O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NINO TOLDO (Relator): É pacífica a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) no sentido de que o trancamento de ação penal ou inquérito pela via do habeas corpus, dada a sua excepcionalidade, só tem cabimento em situações de manifesta atipicidade da conduta, presença de causa extintiva da punibilidade ou ausência mínima de materialidade e autoria delitivas. A título exemplificativo: AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. CRIMES DE DIVULGAÇÃO DE CENA DE SEXO OU PORNOGRAFIA, SEM O CONSENTIMENTO DA VÍTIMA E DESCUMPRIMENTO DE MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO ESPECÍFICA DE TODOS OS FUNDAMENTOS DA DECISÃO AGRAVADA. WRIT SUCEDÂNEO DE RECURSO OU REVISÃO CRIMINAL. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. INVIABILIDADE. REQUISITOS LEGAIS INDICIARIAMENTE AFERIDOS. JUÍZO PROVISÓRIO DE TIPICIDADE DA CONDUTA. EXCEPCIONALIDADE. NULIDADE. ILICITUDE DAS PROVAS. QUEBRA DA CADEIA DE CUSTÓDIA. REEXAME DE FATOS E PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. INEXISTÊNCIA DE FLAGRANTE ILEGALIDADE OU TERATOLOGIA. 1. Na linha da orientação jurisprudencial desta Suprema Corte, o Agravante tem o dever de impugnar, de forma específica, todos os fundamentos da decisão agravada, sob pena de não provimento do agravo regimental. Precedentes. 2. Inadmissível o emprego do habeas corpus como sucedâneo de recurso ou revisão criminal. Precedentes. 3. O trancamento da ação penal ou de inquérito policial pela via do habeas corpus somente é admitido diante de situações excepcionalíssimas, quando pressupõe a percepção, de plano, da atipicidade da conduta, da incidência da causa de extinção da punibilidade ou a ausência de indícios de autoria e materialidade, hipóteses não evidenciadas no caso. Precedentes. 4. A análise minuciosa para concluir em sentido diverso das instâncias antecedentes, quanto à existência de indícios de autoria e materialidade, demandaria incursão no acervo fático-probatório, inviável em sede de habeas corpus. Precedentes. 5. Para dissentir do fundamento adotado pelas instâncias anteriores e acolher a pretensão defensiva, quanto à ocorrência de quebra de cadeia de custódia da prova, imprescindível o reexame e a valoração de fatos e provas, para o que não se presta a via eleita. Precedentes. 6. Agravo regimental conhecido e não provido. (HC nº 254.134 AgR, Primeira Turma, Rel. Ministro Flávio Dino, j. 07.5.2025, Publicação 12.5.2025; destaquei) Pois bem. O pedido de desmembramento do Inquérito Policial nº 0000834-46.2016.4.03.6103 foi assim motivado pelo MPF (ID 327294180, pp. 95/97): Verifica-se do acervo probatório que em 5 dos 24 fatos narrados na denúncia, há fortes indícios de que o servidor LEANDRO RIBEIRO MARTINS ALVES tenha sido auxiliado na elaboração dos documentos e inserção de informações falsas nos sistemas do INSS por terceiros ainda não identificados. Em tais 5 fatos, ademais da prova da materialidade, há indícios suficientes da autoria de LEANDRO RIBEIRO MARTINS ALVES, mas não de MARCELO LUIS MACHADO QUINSAN (identificados na denúncia como fatos 2,6,7,11 e 12); não obstante, é necessário o aprofundamento das investigações a fim de apurar a participação de terceiros na preparação das anotações falsas constantes nas carteiras de trabalho apresentadas nos requerimentos de benefícios registrados sob os números 41/187.155.158-4, 42/187.495.085, 42/187.495.249- 0, 41/187.495.496- 5 e 42/187.495.511- 0, conforme o quadro a seguir: Nº do BENEFÍCIO BENEFICIÁRIO REFERÊNCIA (ID) 41/187.155. 158-4 MARIA APARECIDA DA SILVA ID's 269464674 a 269467133 42/187.495.085 ANTONIO MAURO BRAGA ID 269598757 a 269621877 42/187.495.249- 0 BENEDITO TOLEDO DE MIRA ID's 269624909 a 269658184 41/187.495.496- 5 CLELIA MARIA TERENTIN ID 269886074 a 269888050 42/187.495.511- 0 ADEMIR DE OLIVEIRA ID 269889258 a 269897115 Assim, requer o desmembramento do inquérito policial com o objetivo de apurar a participação de terceiros, ainda não identificados, na prática do delito tipificado no art. 313-A do Código Penal relativamente aos benefícios indicados no quadro acima. Em razão disso, assim decidiu o juízo das garantias (ID 327294180; pp. 139/141): ID 346238693, p. 01/03: Defiro o pedido ministerial de desmembramento do feito para apuração da participação de terceiros, além do denunciado LEANDRO, na preparação das anotações falsas dos benefícios em favor de MARIA APARECIDA DA SILVA, ANTONIO MAURO BRAGA, BENEDITO TOLEDO DE MIRA, CLELIA MARIA TERENTIN e ADEMIR DE OLIVEIRA. Adote a Secretaria as providências necessárias para o desmembramento, com a utilização do fluxo paralelo de "traslado de documentos". Após o desmembramento: a) certifique-se o número do feito desmembrado neste processo; b) intime-se o membro do Parquet Federal no feito desmembrado, para ciência do novo número; e c) remeta-se o feito desmembrado para tramitação direta. Ainda de acordo com o juízo (ID 327325653): A autoridade policial instaurou o IPL n.º 2025.0014559-DPF/SJK/SP para apurar possível prática dos crimes previstos no artigo 171, § 3º e 313-A, ambos do Código Penal, tendo em vista possível uso de informações falsas para obtenção de benefício previdenciário por MARIA APARECIDA DA SILVA, ANTONIO MAURO BRAGA, BENEDITO TOLEDO DE MIRA, CLELIA MARIA TERENTIN e ADEMIR DE OLIVEIRA, com possível participação de LEANDRO RIBEIRO MARTINS ALVES, então servidor do INSS em São José dos Campos/SP, investigado e preso no curso do IPL 83/2015 (OPERAÇÃO DOUBLE LIFE 2) e denunciado pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (ID 366505044, p. 01/02). Como primeiras diligências, determinou-se a intimação dos beneficiários, inclusive ANTONIO MAURO BRAGA, e solicitou-se cópia integral dos benefícios previdenciários ao INSS (ID 366505551, p. 04). Pois bem. Neste momento, não há motivo para que seja suspenso o desmembramento do Inquérito Policial nº 0000834-46.2016.4.03.6103. Se há indícios da participação de terceiros nas fraudes supostamente praticadas por Leandro Ribeiro Martins Alves, já denunciado (ID 327294180, pp. 98/138), é necessária a continuidade da investigação. O paciente, segundo consta dos autos, não é investigado, tendo sido intimado apenas para prestar esclarecimentos (IDs 327330650 e 327330651), porque supostamente o benefício previdenciário por ele recebido estaria dentre aqueles que foram concedidos por Leandro com algum vício na origem. Por isso, em juízo de cognição sumária, afirmei que, preservado o direito de não falar sobre aquilo que, em seu entender, possa ser-lhe prejudicial (não produzir prova contra si mesmo), ninguém se exime do dever de colaborar para o esclarecimento dos fatos investigados (CPC, arts. 378, 379 e 380; CPP, art. 3º). Assim, o fato de o paciente ser ouvido no curso da investigação não implica nenhum constrangimento ilegal. Tampouco há que falar em trancamento parcial da ação penal ajuizada em desfavor de Leandro Ribeiro Martins Alves e Marcelo Luis Machado Quinsan. Na denúncia que a instrui consta a descrição do seguinte fato (ID 327294180, pp. 109/110): FATO 6 Ref. Requerimento 42/187.495.085 Beneficiário: Antônio Mauro Braga Documentos comprobatórios: ID's 269598757 a 269621877 Nos meses de novembro e dezembro de 2018, LEANDRO RIBEIRO MARTINS ALVES, na qualidade de funcionário autorizado do INSS, inseriu dados falsos nos sistemas informatizados ou bancos de dados da Administração Pública com o fim de obter vantagem indevida para si e para outrem. Segundo consta, no período dos fatos, LEANDRO RIBEIRO MARTINS ALVES inseriu em sistema informatizado do INSS, para instruir o pedido de benefício nº 42/187.495.085, cujo beneficiário era Antônio Mauro Braga, dados falsos consistentes no vínculo de trabalho do beneficiário com as empresas ANTOINE KHALIL HELOCE, no período de 1/3/1981 a 18/9/1984, e PROMILK INDÚSTRIA DE QUEIJOS LTDA., no período de 1/4/1994 a 29/2/1996 (Carteira de Trabalho nº 06250, Serie 009/MG, emitida em 27/7/1981: f. 2, ID 269598757 e f. 2, ID269598764; e falta de registro no CNIS: f. 24- ID 269598799). Apurou-se que LEANDRO RIBEIRO MARTINS ALVES realizou o atendimento inicial em 21/11/2018, e, após, o protocolo, inserção dos dados falsos no sistema, sem qualquer ressalva, habilitação e concessão do benefício requerido por Antônio Mauro Braga (f. 11-12, ID 269621109). LEANDRO RIBEIRO MARTINS ALVES, em 21/11/2018, por meio do equipamento com IP nº 10.18.20.116, procedeu ao agendamento inicial do atendimento às 12 horas e 46 minutos, sem a presença de Antônio Mauro Braga, com indicação de requerimento de aposentadoria por tempo de contribuição. Na data do atendimento, em 7/12/2018, LEANDRO RIBEIRO MARTINS fez o atendimento do interessado de forma a lhe privilegiar, contrariando as normas do INSS (Relatório: f. 14-15, ID 269621109 e f. 2, ID 269621877). A inserção dos dados falsos por LEANDRO RIBEIRO MARTINS ALVES, sem qualquer comprovação e de forma extemporânea, fez com que o beneficiário passasse a atender os requisitos necessários para a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição (cálculo do cômputo gerado no tempo de contribuição: f. 11- 12, ID 269598787, o que gerou o recebimento indevido de R$ 7.963,61 (sete mil, novecentos e sessenta e três reais e sessenta e um centavos), em valores não atualizados (f. 7, ID 269620263). A materialidade e autoria delitiva, demonstradas pelos elementos referenciados, são reforçadas pelas inconsistências e irregularidades identificadas na carteira de trabalho do beneficiário Antônio Mauro Braga relativamente ao vínculo com as empresas ANTOINE KHALIL HELOCE e PROMILK INDÚSTRIA DE QUEIJOS LTDA (itens 3 a 5 do relatório de f. 10-11, ID ID 269617760). Portanto, LEANDRO RIBEIRO MARTINS ALVES praticou o delito tipificado no art. 313-A do Código Penal. No entanto, ao contrário do alegado, a documentação apresentada (ID 326678865) não afasta, de pronto, as inconsistências a que se refere a denúncia e que justifiquem o prosseguimento da investigação. Nesse sentido, transcrevo os motivos que levaram o Juizado Especial Cível e Criminal Adjunto à 2ª Vara Federal de Pouso Alegre (MG) a determinar o restabelecimento da aposentadoria do paciente (idem, pp. 246/248): O benefício do autor foi concedido após regular processo administrativo (id 326316867), no qual foram incluídos os períodos posteriormente desconsiderados em revisão administrativa, sob alegação de que não constam do CNIS. O INSS tem o dever de rever seus atos, todavia, (1) há que se levar em consideração o princípio da boa fé objetiva, segundo o qual o segurado acredita que a concessão operou-se corretamente, (2) a revisão deve se fundar em erro comprovadamente apurado e respeitar os princípios da ampla defesa e contraditório e, por fim, (3) o INSS não deve impor burocracias e formalidades ao segurado já em gozo de benefício, sendo ônus da autarquia demonstrar o erro ocorrido na concessão. Na hipótese dos autos, o INSS validou os períodos no curso do processo administrativo que culminou na concessão do benefício e, sem indicar causa, reviu administrativamente o benefício concedido sob alegação de que "Foram encontradas irregularidades nos períodos de 01/04/1994 a 29/02/1996, 01/03/1981 a 18/09/1984 e 02/01/1985 a 28/02/1985". Ocorre, que tal revisão, sem fato novo, configura revisitação de ato administrativo finalizado e o INSS não demonstrou a correção da revisão, nem mesmo que tenha se desincumbido do ônus de provar que os períodos corretos não são aqueles inicialmente apurados. Ao contrário, pela contestação, que sequer veio acompanhada com a cópia integral do processo administrativo como determinado no despacho inicial, resta comprovado que o INSS delegou seu ônus probatório ao segurado e assim, deixou de atender os requisitos para rever o ato concessório finalizado. Destarte, comprovada a alegada nulidade do processo revisório, a parte autora faz jus ao pretendido restabelecimento de sua aposentadoria, a partir de sua indevida cessação. Como se pode perceber, a questão foi solucionada processualmente segundo o ônus probatório que incumbia às partes e, em linha de princípio, as instâncias civil, administrativa e penal são independentes. Nesse sentido, vale transcrever o que disse o INSS em seu recurso inominado (ID 326678865, pp. 251/261; destaques meus): A autora requereu e obteve junto a APS São José dos Campos o benefício da aposentadoria por /tempo de contribuição, NB 42/187.495.085-4, com data de início do benefício em 21/11/2018. Em razão do indício de irregularidade na contagem do tempo de contribuição fictício, foi dado início ao processo de revisão do benefício, mediante a convocação do autor para prestar esclarecimentos (ID 3266316867 - pág. 74) Segundo apurado pelo Serviço de Monitoramento Operacional de Benefício da GEX de São José dos Campos, houve inserção no cálculo do tempo de contribuição de vínculos empregatícios não constantes do CNIS, bem como a alteração de vínculo no CNIS sem a comprovação das respectivas remunerações (ID 326316867 - pág. 85). Diante da constatação que o benefício fora concedido de forma irregular, dado que foram computados os vínculos /referentes aos períodos de 01/04/1994 a 29/02/1996 (Promilk Indústria de Queijos Ltda), 01/03/1981 a 18/09/1984 (Antoine Khalil Heloce) e 02/01/1984 a 28/02/1985 (Carvalho & Carvalho S/C Ltda) sem que houve a comprovação dos mesmos, foi a parte autora oficiada para apresentar defesa no prazo de 10 dias (ID 326316867 - pág. 88). O ofício contendo a intimação para apresentar defesa foi recebido em 09/05/2019 pelo próprio autor (ID 326316867 - pág. 92), tendo o mesmo apresentado defesa e documentos (ID 326316867 - pág. 93/132) Após a análise da defesa apresentada pelo autor foi considerado como regular o vínculo empregatício junto a empresa Promilk Indústria de Queijos Ltda no período de 01/04/1994 a 01/02/1996 e o vínculo com Carvalho & Carvalho no período de 02/01/1985 a 28/02/1985. Entretanto, com relação ao período de 01/03/1981 a 18/09/1984 não foram apresentados documentos que comprovassem o período efetivamente trabalhado para o empregador Antoine Khalil Heloce. Assim, restaram apurados apenas 34 anos, 10 meses e 29 dias de tempo de contribuição, sendo tal tempo insuficiente para que o autor tivesse direito à aposentadoria por tempo de contribuição em 21/11/2018 (ID 326316867 - pág. 137/140), o que acarretou a suspensão do benefício. Devidamente intimada a suspensão do benefício em03/06/2019 (ID 326316867 - pág. 150), a parte autora não apresentou recurso. Assim, concluindo o processo administrativo que culminou com cessação do benefício, o processo foi remetido para a cobrança dos valores recebidos indevidamente pela autora. Conforme demonstram os documentos apresentados no ID 326316867 foi instaurado o devido processo administrativo, dando-se oportunidade à autora de exercer o contraditório e a ampla defesa. Dessa forma, resta evidente a ausência de qualquer mácula a comprometer o processo administrativo, uma vez que o mesmo manteve estrita observância aos princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa, assegurados pelo art. 5.º, LV, da CF/88. Com isso, não se está afirmando que o benefício do paciente é fraudulento nem que ele esteja envolvido em suposta fraude. O Estado, no exercício de seu poder-dever de autotutela, tem que apurar eventuais irregularidades nos benefícios que concede, notadamente quando há indícios de que um técnico do INSS, no caso, Leandro Ribeiro Martins Alves, valeu-se do cargo e juntamente com um advogado e terceiros ainda não identificados (ID 327294180, pp. 98/138): : (...) efetuou atendimentos, habilitações e concessões de benefícios previdenciários aos segurados, mediante uso de sistemas informatizados do INSS, infringindo diversas normas da autarquia relativas à análise da documentação apresentada pelos segurados, bem como transgredindo o procedimento de trabalho implantado na Agência de Previdência Social de São José dos Campos/SP, conforme a Portaria nº 91/PRES/INSS, de 19 de janeiro de 2017, que estabeleceu diretrizes para a implementação do projeto INSS Digital, que objetivava criar um novo fluxo de atendimento dentro da autarquia, com a melhoria e a padronização do atendimento dos requerimentos apresentados ao INSS pelos segurados e beneficiários. O inquérito foi desmembrado exatamente para apurar a participação de terceiros eventualmente envolvidos no suposto ilícito. Por isso, o paciente foi intimado para ser ouvido, não como investigado, e sim para esclarecer em que contexto se deu a sua aposentadoria. Nenhum constrangimento há nisso. Também não há no fato de o paciente e seu benefício previdenciário serem mencionados na ação penal em que Leandro é réu. Se o impetrante pretende a correção da denúncia neste ponto, que peça ao juízo da instrução, a quem foi encaminhado o feito pelo juízo das garantias (ID 327294181). A propósito, destaco do parecer do Ministério Público Federal (ID 329336631): No ponto, a mera menção ao nome do paciente, seja na denúncia, seja em outras peças processuais que componham ou venham a compor os autos nº 0000834-46.2016.4.03.6103, tão somente como benefíciário do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição nº 1874950854, não consiste, por si só, em constrangimento ilegal – tampouco configura hipótese em que se possa admitir o uso excepcional o habeas corpus para promover o trancamento do inquérito ou da ação penal, ainda que parcial. [...] Conforme se verifica da portaria de instauração do inquérito policial nº 5000394-47.2025.4.03.6103 e do despacho da autoridade policial que se seguiu (Id. 327330650 – págs. 01/03), o objeto do apuratório – nos exatos termos da decisão que determinou o desmembramento do autos de origem – consiste na “apuração da participação de terceiros, além do denunciado LEANDRO, na preparação das anotações falsas dos benefícios em favor de MARIA APARECIDA DA SILVA, ANTONIO MAURO BRAGA, BENEDITO TOLEDO DE MIRA, CLELIA MARIA TERENTIN e ADEMIR DE OLIVEIRA” (Id. 327330650 – pág. 03). Desta forma, também no inquérito policial nº 5000394-47.2025.4.03.6103, por ora, o paciente ANTONIO MAURO BRAGA não figura como investigado, tendo sido intimado apenas para prestar esclarecimentos – o que, novamente, não consiste em constrangimento ilegal, tampouco em hipótese de trancamento do apuratório. [...] A propósito, o fato do paciente ter obtido, na esfera cível, decisão de restabelecimento dos pagamentos do seu benefício previdenciário, não impede a instauração do inquérito policial dedicado ao aprofundamento das investigações sobre a regularidade da concessão do mesmo benefício, dada a notória independência entre as esferas cível, penal e administrativa, e mormente diante dos suficientes indícios de fraude no benefício, reconhecidos pelo Juízo a quo, no ato de recebimento da denúncia que foi oferecida nos autos nº 0000834-46.2016.4.03.6103. Posto isso, DENEGO A ORDEM de habeas corpus, ficando prejudicado o agravo regimental interposto. É o voto. Autos: HABEAS CORPUS CRIMINAL - 5013719-65.2025.4.03.0000 Requerente: ANTONIO MAURO BRAGA e outros Requerido: Subseção Judiciária de São José dos Campos/SP - 1ª Vara Federal Ementa: Direito penal e processual penal. Habeas corpus. Investigação. Inexistência de constrangimento ilegal. Ordem denegada. I. Caso em exame 1. Habeas corpus, com pedido de liminar, impetrado contra a decisão da 1ª Vara Federal de São José dos Campos/SP que, acolhendo pedido do Ministério Público Federal (MPF), determinou o desmembramento de inquérito policial, para apurar a participação de terceiros, ainda não identificados, nos delitos do art. 313-A do Código Penal, praticados, em tese, por dois denunciados. Pede-se o trancamento desse inquérito policial. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em saber se há constrangimento ilegal da instauração de outro inquérito policial para investigar a participação de outras pessoas em crime pelo qual algumas já foram denunciadas. III. Razões de decidir 3. É pacífica a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) no sentido de que o trancamento de ação penal ou inquérito pela via do habeas corpus, dada a sua excepcionalidade, só tem cabimento em situações de manifesta atipicidade da conduta, presença de causa extintiva da punibilidade ou ausência mínima de materialidade e autoria delitivas. 4. No caso, não há motivo para que seja suspenso o desmembramento do inquérito policial. Se há indícios da participação de terceiros nas fraudes supostamente praticadas pelos denunciados, é necessária a continuidade da investigação. 5. O paciente, segundo consta dos autos, não é investigado, tendo sido intimado apenas para prestar esclarecimentos porque supostamente o benefício previdenciário por ele recebido estaria dentre aqueles que foram concedidos com algum vício na origem. Por isso, preservado o direito de não falar sobre aquilo que, em seu entender, possa ser-lhe prejudicial (não produzir prova contra si mesmo), ninguém se exime do dever de colaborar para o esclarecimento dos fatos investigados (CPC, arts. 378, 379 e 380; CPP, art. 3º). Assim, o fato de o paciente ser ouvido no curso da investigação não implica nenhum constrangimento ilegal. IV. Dispositivo e tese 6. Ordem denegada. Tese de julgamento: frases objetivas das conclusões da decisão, ordenadas por numerais cardinais entre aspas e sem itálico. “1. O trancamento de inquérito por habeas corpus é medida excepcional e exige demonstração inequívoca de ausência de justa causa. 2. A intimação para prestar esclarecimentos em inquérito policial, sem a condição de investigado, não configura constrangimento ilegal.” _________ Dispositivos relevantes citados: CPP, arts. 3º, 648, I; CPC, arts. 378, 379 e 380. Jurisprudência relevante citada: STF, HC nº 254.134 AgR, Rel. Min. Flávio Dino, Primeira Turma, j. 07.05.2025, Publicação 12.05.2025. ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Primeira Turma, por unanimidade, decidiu DENEGAR A ORDEM de habeas corpus, ficando prejudicado o agravo regimental interposto, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. NINO TOLDO Desembargador Federal
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