Processo nº 5001120-19.2024.4.03.6115
ID: 317120291
Tribunal: TRF3
Órgão: 2ª Vara Federal de São Carlos
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Nº Processo: 5001120-19.2024.4.03.6115
Data de Disponibilização:
07/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
GUILHERME HENRIQUE VIEIRA JACOBS
OAB/MG XXXXXX
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JUAREZ MONTEIRO DE OLIVEIRA JUNIOR
OAB/MG XXXXXX
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PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) Nº 5001120-19.2024.4.03.6115 / 2ª Vara Federal de São Carlos AUTOR: ASSOCIACAO DE ESCOLAS REUNIDAS LTDA. ASSISTENTE: MUNICIPIO DE SAO CARLOS Advogados do(a) AUTOR: GUILHE…
PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) Nº 5001120-19.2024.4.03.6115 / 2ª Vara Federal de São Carlos AUTOR: ASSOCIACAO DE ESCOLAS REUNIDAS LTDA. ASSISTENTE: MUNICIPIO DE SAO CARLOS Advogados do(a) AUTOR: GUILHERME HENRIQUE VIEIRA JACOBS - MG212808, JUAREZ MONTEIRO DE OLIVEIRA JUNIOR - MG98208 REU: UNIÃO FEDERAL SENTENÇA RELATÓRIO Trata-se de ação ordinária, com pedido de tutela provisória de urgência, ajuizada pela ASSOCIAÇÃO DE ESCOLAS REUNIDAS LTDA. em face da UNIÃO FEDERAL, com o objetivo de obter provimento jurisdicional que declare a nulidade do Parecer Final exarado no processo eMEC nº 202301223 e da Portaria SERES/MEC nº 330, de 11/07/2024, determinando-se ao Ministério da Educação – MEC a reanálise do pedido de autorização de abertura de curso de medicina na cidade de São Carlos/SP sem a aplicação da Nota Técnica nº 81/2023/CGLNRS/GAB/SERES e da Nota Informativa nº 22/2024/CGLNRS/GAB/SERES-MEC. A autora narra que “[...] em 2022 propôs ação judicial e, em função dela, protocolou o pedido de autorização de curso de medicina perante o MEC – processo eMEC nº 202301223. Como o processo havia superado a fase de análise documental, foi beneficiada pela modulação inserida na ação declaratória de constitucionalidade 81/DF, julgada em junho pelo Supremo Tribunal Federal” (id. 332802940, fl. 2). Aduz que “a Nota Informativa nº 22/2024 e a Nota Técnica nº 81/2023 foram usadas como se fossem atos normativos, mesmo não tendo esse caráter. [...] Estas ‘normas’, especialmente a Nota Técnica nº 81/2023/CGLNRS/GAB/SERES /SERES (aqui tratada como NT 81) escondem um padrão de julgamento objetivo que afronta decisão do Supremo Tribunal Federal, além de ser desarrazoado e desproporcional. A proporção de 3,73 médicos por mil habitantes – critério objetivo usado no PARECER FINAL contra a Autora – foi retirado dessas Notas Técnica e Informativa” (id. 332802940, fl. 4). Sustentou que, ao contrário do disposto no art. 3º, § 7º, II, da Lei nº 12.871/2013, “a Nota Técnica nº 81/2023/CGLNRS/GAB/SERES/SERES prevê 1 único indicador: o número de médicos por habitantes, desprezando a análise das redes de educação (2) e saúde e dos programas de extensão que atenderão a população (3) ”. Alega que a Nota Técnica nº 81/2023 “prevê a análise apenas do município sede do curso e, não, a avaliação do indicador ‘nos Municípios de seu entorno’ (Art. 3º, § 7º, II, a), ou seja, para a ‘região em que se localiza’ o curso (Art. 3º, § 7º, II)” (id. 332802940, fl. 7). Defende que a Nota Técnica nº 81/2023 descumpre a decisão do STF na ADC 81-DF, na parte em que determinou que “[...] nas etapas seguintes do processo de credenciamento/autorização, as diversas instâncias técnicas convocadas a se pronunciar devem observar se o Município e o novo curso de medicina atendem integralmente aos critérios previstos nos parágrafos 1º, 2º e 7º do art. 3º da Lei 12.871/2013” (id. 332802940, fl. 8). Assevera que a Nota Técnica nº 81/2023 e a Nota Informativa nº 22/2024 “[...] não podem ser usadas como padrão decisório de regulação na educação, pois a Portaria Normativa 23/2017, que dispõe sobre os fluxos dos processos de autorização de cursos superiores, exige: ‘A SERES editará normativo específico dispondo acerca do padrão decisório para a análise dos processos previstos nesta Portaria’ (Art. 103)” (id. 332802940, fl. 9). Prossegue aduzindo que “[...] No Direito Administrativo, erro de forma é fatal para as normas. Se a Portaria Normativa 23/2017 diz que deve haver ‘ato normativo específico’ para o padrão de decisório, uma Nota Técnica não satisfaz o requisito formal [...] Neste caso, há vício de forma porque o critério do número de médicos por habitantes – parâmetro objetivo, que poderia facilmente ser inserido na Portaria de Padrão decisório – foi incluído em um mero parecer, não em um ato normativo” (id. 332802940, fls. 9/10). Quanto ao critério de definição das localidades aptas a receberem novos cursos de medicina, a autora defende que se deve “evitar a adoção da densidade médica como indicador decisivo para políticas públicas [...] As falhas no indicador se tornam ainda mais evidentes se for considerado que a suposta fonte da proporção escolhida pela União é, justamente, a OCDE” (id. 332802940, fls. 11/12). Aduz que “considerando especialmente o fato de que no Brasil o sistema do SUS é regionalidade (Lei 8.080/1990) e, nesse sentido, integrado por regiões, o uso de dados isolados de um ou outro município gera uma grande distorção” (id. 332802940, fl. 12). Aponta que “apesar da Autora ter seu projeto indeferido por falta de necessidade social em virtude de mais de 3,73 médicos por 1000 habitantes em São Carlos, várias outras cidades relativamente próximas receberão cursos dos chamamentos públicos com proporção maior de profissionais” (id. 332802940, fl. 13). A autora cita dados do Painel da Associação dos Mantenedores Independentes Educadores do Ensino Superior - AMIES a fim de demonstrar “a viabilidade do curso da Autora até mesmo com base no critério criada pela Nota Técnica 81, se, como na Lei 12.871/2013 determina, o critério fosse aplicado à região de saúde, que no caso concreto possui 3,45 médicos por 1.000 habitantes” (id. 332802940, fl. 15). Defende que “é fácil constatar que não há necessidade, pois este critério não é único nem mesmo o mais coerente para medir a necessidade social, além disso, o próprio MEC poderia usar outros parâmetros como o IDH ou as demandas reais e o impacto do curso na região de saúde. Também não há adequação do critério usado, afinal, ao arrepio da lei, ele se volta apenas ao município, desprezando seu entorno. Não há adequação, também, porque o critério é rejeitado pela própria OMS e porque ele não respeita os princípios da regionalização e da integração, tão caros ao Sistema Único de Saúde (conforme Lei 8.080/1990). Por fim, não há também proporcionalidade em sentido estrito, pois o critério, se realmente tivesse de ser usado, deveria ser complementado por outros dados e teria de ser usado uniformemente [...] Enfim, o denominado teste de proporcionalidade das normas indica o excesso do critério incluído na NT 81” (id. 332802940, fl. 16). Alega, ainda, que aplicação da Nota Técnica nº 81/2023 aos processos administrativos em curso “fere o princípio da irretroatividade das normas, a Lei 9.784/1999 e a Lei de Introdução das Normas do Direito Brasileiro [...] não pode haver a retroatividade neste caso, nem do “padrão decisório” estabelecido nem da eventual descaracterização do mesmo para interpretação do vago dispositivo sobre necessidade social da Portaria SERES/MEC 531/2023” (id. 332802940, fl. 18). Colaciona jurisprudência administrativa do Conselho Nacional de Educação e posicionamentos da AGU e da SERES/MEC favoráveis à tese da irretroatividade do padrão decisório ora impugnado (id. 332802940, fls. 18/19). Ao final, requer a procedência dos pedidos deduzidos para que: “Declare nulo o Parecer Final do processo eMEC nº 202301223, bem como a Portaria SERES/MEC nº 330, de 11/07/2024, publicada em 12/07/2024 (Protocolo 000244.0265968/2024), dele decorrente, em face da ilegalidade de seus motivos determinantes; b) Que proceda, em 30 dias, nos termos do Art. 49, da Lei 9.784/19998, nova análise do processo citado no item “a”, abstendo-se de aplicar a Nota Técnica nº 81/2023/CGLNRS/GAB/SERES/SERES e a Nota Informativa nº 22/2024/CGLNRS/GAB/SERES/SERES-MEC e adotando, com razoabilidade e proporcionalidade a análise da necessidade saúde em termos regionais, conforme prevê o Art. 3º, § 2º, I, e § 7º, II, da Lei 12.871/2013” id. 332802940, fls. 23/25). Juntou documentos e recolheu as custas de ingresso (id. 332895153). Por meio da petição id. 332994565, a parte autora noticiou o deferimento de medida liminar em demanda idêntica pela 1ª Vara Federal de Limeira/SP. Decisão desta 2ª Vara Federal de São Carlos/SP indeferiu o pedido de tutela provisória de urgência, ao fundamento de que “nos termos do art. 1º, § 3º, da Lei n. 8.437/92, não é cabível medida liminar contra atos do Poder Público que esgote, no todo ou em qualquer parte, o objeto da ação. Concedida a liminar na forma pleiteada pela parte autora, estar-se-ia descumprindo tal normativo, uma vez que a medida teria caráter satisfativo da pretensão final” (id. 333382085). Por meio da petição id. 334095873, a parte autora juntou aos autos entendimento favorável do Conselho Nacional de Educação sobre o tema deste processo e requereu a sua consideração na análise no pedido de antecipação de tutela. A UNIÃO FEDERAL apresentou a contestação id. 335271353, arguindo, preliminarmente, a litispendência em relação ao processo nº 1046556-91.2022.4.01.3400, que tramita perante a 21ª Vara Federal do Distrito Federal. Defendeu a vedação ao deferimento de tutela antecipada que esgote completamente o objeto da ação. No mérito, pugnou pela improcedência da ação, aduzindo que: (a) “a edição da Portaria nº 531/2023 decorre da decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal no âmbito da Ação Direta de Constitucionalidade 81, que reconheceu a constitucionalidade da previsão contida no art. 3º da Lei nº 12.871/2013, e modulou os efeitos desta decisão”; (b) “A Lei nº 12.871/2013 estabelece que deverão ser instalados cursos em locais em que se constata ‘relevância e necessidade social’. A norma, de natureza genérica, demandou do Ministério da Educação a definição de critérios objetivos que especifiquem o seu sentido, fixando com clareza quais serão as razões pelas quais determinado conjunto de municípios é considerado apto a receber a instalação de novo curso ou aumento de vagas de cursos já instalados. Por esta razão, foi editada a Portaria nº 531/2023”; (c) o art. 2º da Portaria nº 531/2023 “tem como contexto a literalidade da decisão proferida no âmbito da ADC 81, também reproduzida: (...) devendo as diversas instâncias técnicas convocadas a se pronunciar, nas etapas seguintes do processo de credenciamento/autorização, observar se o Município e o novo curso de medicina atendem integralmente aos critérios previstos nos parágrafos 1º, 2º e 7º do art. 3º da Lei 12.871/2013”; (d) “O STF, ao reconhecer a constitucionalidade da Lei, vincula as decisões do Ministério da Educação à consecução dos objetivos do Programa Mais Médicos, e, portanto, à estratégia de distribuição da oferta de cursos de Medicina, a fim de reduzir as desigualdades regionais. A adoção de qualquer critério incapaz de distinguir as desigualdades na distribuição de vagas de medicina, considerando a relação de médicos por habitante, entraria em confronto com os objetivos e metas do Programa”; (e) “Assim, retomando os termos do edital de chamada pública para seleção de propostas para autorização de funcionamento de cursos de medicina no âmbito do programa Mais Médicos (Edital nº 01, de 4 de outubro de 2023), registra-se que ele foi elaborado com o propósito de que os municípios brasileiros alcancem, até 2033, a média observada em 2022 para países da OCDE de 3,73 profissionais de Medicina por mil habitantes”; (f) “Isto posto, para fins de atendimento ao art. 3º, §1º, da Lei nº 12.871/2013, os pedidos de abertura de novos cursos de Medicina e de aumento de vagas poderão ser aprovados se estiverem em regiões de saúde pré-selecionadas no Edital nº 01, de 4 de outubro de 2023 ou em municípios cuja concentração de médico por habitante seja inferior a 3,73”; (g) “Vale registrar que a Nota Técnica nº 22/2024/CGNLRS/GAB/SERES/SERES-MEC visa tão somente esclarece as regras que já estavam explícitas na Portaria nº 531/2023 em seu artigo 2º. Por sua vez, a Nota Técnica nº 81/2023/CGLNRS/GAB/SERES/SERES fundamentou a edição da Portaria nº 531/2023, especificando, igualmente, o sentido atribuído aos critérios definidos na norma”; (h) “a edição de uma Portaria que confira objetividade aos critérios adotados pelo Ministério da Educação para análise dos processos de autorização e aumento de vagas de curso de Medicina abertos por força de decisão judicial é lícita e compatível com as normas jurídicas - afinal, se o STF, guardião da Constituição, reconhece a juridicidade de tal norma, entende-se pela sua plena adequação e aplicabilidade”; (i) “desde o dia 7 de agosto de 2023, data em que foi proferida decisão na Medida Cautelar na Ação Direta de Constitucionalidade 81 reconhecendo a constitucionalidade do artigo 3º da Lei nº 12.871/2013, não foram abertos novos processos de autorização de curso de Medicina ou de aumento de vagas”; e (j) “não há retroação de normas, mas estrito cumprimento à decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal. A aplicação da referida Portaria aos processos submetidos à ADC 81 foi chancelada pelo Min. Gilmar Mendes em decisão proferida em 22/12/2023. Assim, salvo melhor juízo, apenas o Supremo Tribunal Federal poderia afastar a aplicação da Portaria 531/23, não cabendo interpretação diversa ou afastamento da norma, até que sobrevenha decisão diversa”. Em réplica (id. 335487932), a autora se insurgiu contra a preliminar de litispendência e reiterou os fundamentos de mérito da petição inicial. Por meio da petição id. 335611869, a parte autora noticiou o deferimento parcial de liminar pela Vara Federal de São Sebastião do Paraíso/MG. Decisão desta 2ª Vara Federal de São Carlos/SP manteve o indeferimento da medida liminar pleiteada (id. 334984512). Por meio da petição id. 339789478, a parte autora traz reforço de argumentação à inicial mediante a demonstração de diferenças entre a Lei nº 12.871/2013 e a Portaria nº 531/2023 do MEC. Requereu a reconsideração da decisão que indeferiu a tutela provisória de urgência. O MUNICÍPIO DE SÃO CARLOS/SP, por meio da petição id. 340891754, requereu a sua admissão no feito na qualidade de assistente da parte autora. Reiterou os fundamentos da petição inicial, acrescentando que: (a) “a abertura de um novo curso de Medicina é de interesse público não apenas da cidade, mas também da região que é por ele atendida, ao tomar conhecimento de tais fatos não pode ficar inerte diante da ilegalidade que vem sendo praticada pelo Governo Federal. A população local clama por mais médicos na rede pública de saúde, já que existe deficiência de profissionais especialistas, especialmente interessados em trabalhar no SUS. O indeferimento levado a efeito pelo Governo Federal atingirá toda a sociedade são-carlense, da qual o governo local é representante”; (b) “Os dados adotados pelo MEC para negar o pedido da autora são totalmente inverossímeis. O Município de São Carlos, no ano de 2023, segundo o SEADE, que é um banco de dados oficial do Estado, gozando de fé pública, possuía o percentual de 3,11 médicos para cada mil habitantes, ao contrário dos dados do MEC que superavam os 3,73”; (c) “Situação mais grave é se considerada a região de saúde, segundo a qual o percentual médico para cada mil habitantes reduz para 2,70, segundo os dados extraídos do SEADE”; (d) “A cidade de São Carlos, não apenas preenche os requisitos de relevância e necessidade social da oferta de um novo curso de Medicina, mas também, conforme reconhecido pelo próprio Governo Federal, tem capacidade para recebê-lo diante da estrutura da rede pública de saúde hoje existente, podendo propiciar a adequada formação profissional em claro benefício à população local e regional”; (e) “Atualmente, o Município de São Carlos possui 280 vagas do emprego de Médico, contudo apenas 124 estão providas, embora se tenha realizado concursos consecutivos desde o ano de 2019. Para algumas especialidades, inclusive, nem ao menos existem inscritos nos certames”; (f) “as áreas de competência definidas para o Curso de Graduação em Medicina da UFSCar não estão voltadas para a Atenção Especializada, onde a carência de médicos é maior, mas à Atenção Primária”; (g) “A proposta da instalação de um novo curso de medicina na cidade se mostrou tão interessante, que o governo local, inclusive, crente de que haveria autorização do MEC pela fase que se encontrava o pedido de autorização e a decisão proferida pelo STF, não apenas começou a desenvolver estudos com o objetivo de desenvolver programas para fomentá-lo, inclusive com a concessão de bolsas de estudos para estudantes de baixa renda, mas também destinou 3 milhões no orçamento de 2025 para custear, pelo menos, 25 bolsas de estudos integrais”; e (g) “Os dados extraídos do SEADE demonstram que o gestor público de cidades do interior, como a de São Carlos, está de mãos atadas, já que ainda que disponha de orçamento público para contratação de tais profissionais não consegue fazê-lo diante da falta de médicos especialistas na região”. Ao final, requereu, além do deferimento do ingresso na condição de assistente da parte autora, a concessão de tutela de urgência e a posterior confirmação mediante sentença de procedência dos pedidos deduzidos pela parte autora. Decisão id. 341831941 concedeu prazo para manifestação da UNIÃO FEDERAL acerca do pedido de assistência. Por meio da petição id. 343121388, o Município de São Carlos/SP juntou manifestação do Departamento de Gestão da Atenção Especializada da Secretaria Municipal de Saúde ressaltando a imprescindibilidade de formação de médicos especialistas no Município, cujo déficit atual tem impactado de forma direta na prestação do serviço de saúde pública municipal. Decisão id. 343065047 designou a realização de audiência de conciliação entre as partes, a qual restou infrutífera (id. 343601160). Por meio da petição id. 335271389, a UNIÃO FEDERAL apresentou impugnação ao pedido de assistência formulado pelo MUNICÍPIO DE SÃO CARLOS, aduzindo que: (a) “apesar da legitima preocupação do Município de São Carlos quanto a formação médica da região, do acesso dos munícipes a médicos especialistas, não se pode perder de vista que a parte autora é uma instituição privada, que, dentre outros interesses sociais envolvidos, ainda busca o lucro, como atividade privada que é, de forma que eventual assistência jurídica do município poderia desvirtuar a finalidade de busca do interesse público pelo ente federativo, acabando por favorecer uma ou outra instituição privada, o que fere o princípio da impessoalidade, da isonomia e da livre concorrência”; (b) “a problemática relativa a evasão e a falta de especialista está muito mais ligada a falta de um residência médica específica do que a ausência de uma graduação, a evasão também pode estar muito ligada a própria oferta das vagas, da remuneração ofertada, dentre outras variantes, mas não necessariamente a ausência de um novo curso de medicina na região”; (c) “ainda que se possa conceber a preocupação da municipalidade quanto a formação médica na região, o interesse nesse caso é puramente social, o que não caracteriza necessariamente o interesse jurídico a justificar a intervenção”; (d) “conforme expressamente indicado, o cálculo realizado pelo Ministério da Saúde para o cálculo em questão é baseado "nos dados do Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES) e na metodologia de Full Time Equivalente (FTE). Observa-se que, embora o Município apresente números diversos quanto à concentração médica em São Carlos/SP, utiliza-se de metodologias diversas daquele empregada pelo Ministério da Saúde, sem apresentar argumentos convincentes quanto ao desacerto desta”; (e) “Ademais, há de se ter em mente que, como os cálculos relativos a outros pedidos de abertura de cursos/vagas de Medicina observam a mesma metodologia empregada pelo Ministério da Saúde, a aplicação de critério diferenciado apenas para a autora representaria flagrante quebra de isonomia no mercado regulado”. No mais, reiterou argumentos de mérito já explicitados na contestação. Foi proferida a decisão id. 348640808, que (a) deferiu o ingresso do Município de São Carlos/SP no feito na qualidade de assistente simples da parte autora; (b) rejeitou a alegação de litispendência em relação ao processo nº 1046556-91.2022.4.01.3400, em trâmite perante a 21ª Vara Federal do Distrito Federal, bem como afastou a necessidade de suspensão deste processo em razão da relação de prejudicialidade com a ação supracitada, aduzindo que diante do delicado contexto de proliferação de decisões judiciais a respeito do tema, o Supremo Tribunal Federal, no item “ii” da modulação de efeitos promovida na ADC nº 81, procurou dar uma solução definitiva até mesmo para os casos que ainda não foram definitivamente julgados pelas instâncias ordinárias.; (c) determinou a intimação da parte autora para prestar esclarecimentos sobre a propositura da ação nº 1062350-84.2024.4.01.3400 perante a Justiça Federal da 1ª Região; e (d) indeferiu o novo pedido de tutela de urgência. Por meio da petição id. 349531497, a União reiterou os termos da sua contestação. A parte autora prestou esclarecimentos defendendo a ausência de litispendência em relação à ação nº 1062350-84.2024.4.01.3400 ajuizada perante a Justiça Federal da 1ª Região, requerendo, ao final, o regular processamento do feito (Id 350565704). A parte autora apresentou memoriais com a síntese dos argumentos invocados na petição inicial (Id 354811933), juntando documentos. Decisão id. 354902230 acolheu os esclarecimentos da parte autora para afastar a litispendência em relação à ação nº 1062350-84.2024.4.01.3400 e determinou a regular continuidade do feito com a manifestação das partes sobre o interesse em produzir outras provas. A parte autora promoveu a juntada de mais documentos e reiterou os termos do seu pedido inicial (id. 356931695). A União informou não ter interesse em produzir outras provas, reiterando os fundamentos da sua contestação (id. 357295202). O Município de São Carlos/SP requereu a dilação do prazo para apresentar documentos (id. 358263987), o que foi deferido pelo despacho id. 358317443. O Município de São Carlos/SP apresentou manifestação com documentos, sustentando a ocorrência de inconsistência na base de dados do Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES) e reiterando os termos do pedido inicial (id. 360455638). Intimada a se manifestar sobre os documentos apresentados pela parte autora e pelo Município de São Carlos, a União apresentou a manifestação com documentos, reiterando os fundamentos da sua contestação (id. 365579480). Os autos vieram conclusos. É o relatório. DECIDO. FUNDAMENTAÇÃO Não há questões pendentes a serem resolvidas e as preliminares suscitadas já foram apreciadas anteriormente, nos termos das decisões id. 348640808 e id. 354902230. Diante da suficiência dos esclarecimentos e elementos probatórios apresentados pelas partes ao longo da tramitação processual, entendo que o feito está maduro para julgamento, nos termos do artigo 370, caput, do Código de Processo Civil, que dispõe que “caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias ao julgamento do mérito”. Nesse sentido, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça preconiza que “O princípio da livre admissibilidade da prova e o princípio do livre convencimento do juiz, permite ao julgador determinar as provas que entende necessárias à instrução do processo, bem como o indeferimento daquelas que considerar inúteis ou protelatórias, sem que isso importe em cerceamento do direito de defesa” (STJ - AgInt no AREsp: 1047790/RJ, Relator: Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 30/05/2017). Portanto, presente os pressupostos processuais e as condições da ação, e estando o processo devidamente aparelhado para a apreciação exauriente, passo ao exame do mérito. I – Da Política Pública estabelecida pela Lei nº 12.871/2013 - Programa Mais Médicos Dentre as missões constitucionalmente confiadas ao Poder Público nas searas do ensino, da saúde, e, especialmente, do ensino em saúde, destacam-se as seguintes previsões da Constituição Federal de 1988: Art. 174. Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado. (...) Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação. Art. 197. São de relevância pública as ações e serviços de saúde, cabendo ao Poder Público dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle, devendo sua execução ser feita diretamente ou através de terceiros e, também, por pessoa física ou jurídica de direito privado. (...) Art. 200. Ao sistema único de saúde compete, além de outras atribuições, nos termos da lei: (...) III - ordenar a formação de recursos humanos na área de saúde; (...) Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios: I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola; (...) VII - garantia de padrão de qualidade. Art. 209. O ensino é livre à iniciativa privada, atendidas as seguintes condições: I - cumprimento das normas gerais da educação nacional; II - autorização e avaliação de qualidade pelo Poder Público.” Seguindo as balizas constitucionais supracitadas, a Lei nº 12.871/2013, fruto da conversão da Medida Provisória nº 621/2013, instituiu a Política Pública denominada “Programa Mais Médicos”, trazendo na sua exposição de motivos as seguintes justificativas para a expansão da oferta de cursos de graduação em Medicina no Brasil e invocando o papel indutor do Estado: [...] 8. A expansão e a qualificação da atenção básica, organizadas pela estratégia de Saúde da Família, compõem parte do conjunto de prioridades apresentadas pelo Ministério da Saúde e aprovadas pelo Conselho Nacional de Saúde (CNS), sendo possível verificar que o Brasil avançou muito nas últimas décadas nesta área. Entretanto, o país convive com muitos vazios assistenciais, que correspondem a localidades que não conseguiram prover e fixar profissionais de saúde na atenção básica, em especial os médicos, não garantindo acesso aos serviços básicos de saúde por parte da população brasileira. [...] 11. O Brasil possui 359.691 médicos ativos e apresenta uma proporção de 1,8 médicos para cada 1.000 (mil) habitantes, conforme dados primários obtidos no Conselho Federal de Medicina (CFM) e na estimativa populacional do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). 12. A proporção de médico/1.000 habitantes constatada no Brasil é menor do que em outros países latino-americanos com perfil socioeconômico semelhante ou países que têm sistemas universais de saúde, a saber: Canadá 2,0; Reino Unido 2,7; Argentina 3,2; Uruguai 3,7; Portugal 3,9; Espanha 4,0 e Cuba 6,7 (Estadísticas Sanitarias Mundiales de 2011 e 2012 – Organização Mundial da Saúde – OMS). [...] 14. A distribuição dos médicos nas regiões do país demonstra uma grande desigualdade, com boa parte dos estados com uma quantidade de médicos abaixo da média nacional. A tabela abaixo demonstra essa distribuição (IBGE/2012 e CFM/2012): [...] 20. Desse modo, encontramos um quadro de extrema gravidade, no qual alguns estados apresentam um número insuficiente de médicos e de vagas de ingresso na graduação, com ausência de expectativa de reversão desse quadro a curto e médio prazos, caso não haja medidas indutoras implementadas pelo Estado. Nesse cenário, a expansão de 2.415 vagas de cursos de medicina, anunciada pelo MEC em 2012, só contribuiria para atingir o número de 2,7 médicos a cada 1.000 habitantes no ano de 2035. 21. O Ministério da Educação autorizou em 2012 a oferta de cerca de 800 vagas privadas em cursos de medicina. Em que pese o aumento de vagas, o atual momento exige a adoção de iniciativas estatais para criar e ampliar vagas em cursos de medicina nos vazios de formação e de assistência, a partir do papel indutor do Estado na regulação da educação superior. Com isso, incentiva-se a criação de instituições de educação superior voltadas à área da saúde e à oferta de cursos de medicina nessas regiões. A autorização para oferta de cursos de medicina obedecerá a uma regulação educacional específica, com a publicação de chamamentos públicos às instituições de educação superior interessadas em se habilitar para atuação nas regiões que apresentem vulnerabilidade social, conforme critérios a serem estabelecidos pelo Ministério da Educação. Como bem destacou o Eminente Ministro Gilmar Mendes, Relator da Ação Direta de Constitucionalidade (ADC) nº 81, “[...] é inequívoco que a política indutora do Mais Médicos diferencia-se fundamentalmente da sistemática anterior de criação de cursos de medicina, porque direciona a iniciativa privada para localidades especialmente necessitadas, altera o centro gravitacional da interação entre a prestação educacional e os serviços locais de saúde, além de impor contrapartida financeira ao SUS arcada pelo particular”. A propósito, o artigo 2º, inciso I, da mencionada Lei nº 12.871/2013, dispõe que “Para a consecução dos objetivos do Programa Mais Médicos, serão adotadas, entre outras, as seguintes ações: I - reordenação da oferta de cursos de Medicina e de vagas para residência médica, priorizando regiões de saúde com menor relação de vagas e médicos por habitante e com estrutura de serviços de saúde em condições de ofertar campo de prática suficiente e de qualidade para os alunos”. Nessa linha, o artigo 3º da Lei 12.871/2013 estabeleceu que a autorização para o funcionamento de curso de graduação em medicina deve ser precedida de chamamento público, como medida para direcionar os novos cursos para as regiões necessitadas que atendam a critérios estabelecidos pelo Ministério da Educação (caput), ouvido o Ministério da Saúde (inciso I). O Egrégio Supremo Tribunal Federal, no julgamento da já referida ADC nº 81, declarou a constitucionalidade da sistemática do chamamento público como mecanismo de pré-seleção das localidades aptas a receberem novos cursos de medicina, confira-se: AÇÃO DECLARATÓRIA DE CONSTITUCIONALIDADE E AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ART. 3º DA LEI 12.871/2013 (LEI DO MAIS MÉDICOS). MEDIDA CAUTELAR DEFERIDA. REFERENDO DA MEDIDA CAUTELAR CONVERTIDO EM JULGAMENTO DE MÉRITO. PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE ATIVA. REJEIÇÃO. NECESSIDADE DE CHAMAMENTO PÚBLICO PARA ABERTURA DE NOVOS CURSOS DE MEDICINA. ALEGAÇÃO DE OFENSA AOS PRINCÍPIOS DA LIVRE INICIATIVA, ISONOMIA E LIVRE CONCORRÊNCIA. INEXISTÊNCIA. CONSTITUCIONALIDADE DA POLÍTICA PÚBLICA. 1. A questão controvertida nestes processos objetivos concerne à constitucionalidade da política pública instituída pelo art. 3º da Lei 12.871/2013, que condiciona a autorização para o funcionamento de curso de graduação em medicina à realização de chamamento público. 2. A política indutora de instalação de novos cursos de medicina de acordo com a necessidade social dos Municípios, com o incremento dos recursos humanos e financeiros da estrutura de saúde da localidade, mostra-se adequada ao objetivo de melhorar a distribuição dos serviços médicos no território nacional. Da mesma forma, sob a perspectiva do critério da necessidade, não há alternativa menos gravosa e que atenda aos mesmos objetivos propugnados pela Lei 12.871/2013. 3. Ao estruturar o Sistema Único de Saúde, a Constituição prevê, em seu art. 197, que “são de relevância pública as ações e serviços de saúde, cabendo ao Poder Público dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle, devendo sua execução ser feita diretamente ou através de terceiros e, também, por pessoa física ou jurídica de direito privado”. E o inciso III do art. 200 da Constituição prescreve que ao Sistema Único de Saúde compete “ordenar a formação de recursos humanos na área de saúde”. O comando constitucional diferencia, de forma inequívoca, o papel do Estado no controle das instituições de ensino que fornecem recursos humanos ao SUS relativamente às demais. O princípio da livre iniciativa, quando referente à atuação de agentes privados no âmbito do sistema de ensino médico, é restringido pela própria Constituição Federal em relação às demais áreas de ensino. 4. Inexiste contrariedade ao subprincípio da proporcionalidade em sentido estrito. É natural que, em atenção ao desenho constitucional acima exposto, o legislador ordinário construa políticas públicas indutoras e restritivas, voltadas justamente a ordenar e integrar a formação dos recursos humanos ao Sistema Único de Saúde. A política do chamamento público busca concretizar essas finalidades sem aniquilar a livre iniciativa. Os agentes privados podem atuar no mercado, mas a instalação dos cursos está condicionada à necessidade social dos Municípios, de modo que os recursos financeiros e institucionais sejam direcionados ao atendimento das demandas do Sistema Único de Saúde. 5. A sistemática do art. 3º da Lei 12.871/2013 é incompatível com a abertura de novos cursos de medicina fundados na Lei 10.861/2004, bem assim com a autorização de novas vagas em cursos já existentes, sem o prévio chamamento público e a observância dos demais requisitos previstos na Lei 12.871/2013. 6. O condicionamento de novos cursos de medicina à iniciativa do Poder Público – via editais de chamamento – não exclui, mas, sim, reforça a possibilidade de a sociedade civil pleitear o lançamento de editais para instalação de novos cursos em determinadas localidades, cabendo à Administração Pública responder a esses pleitos de forma fundamentada, com publicidade e em prazo razoável. 7. No que concerne aos processos administrativos e judiciais que tratam do tema objeto destas ações: (i) são preservados os novos cursos de medicina instalados – ou seja, contemplados por Portaria de Autorização do Ministério da Educação – por força de decisões judiciais que dispensaram o chamamento público e impuseram a análise do procedimento de abertura do curso de medicina ou de ampliação das vagas em cursos existentes nos termos da Lei 10.861/2004; (ii) têm seguimento os processos administrativos pendentes, previstos na Lei 10.861/2004, instaurados por força de decisão judicial, que ultrapassaram a fase inicial de análise documental a que se referem os arts. 19, § 1º, e 42, ambos do Decreto 9.235/2017, a depender de tratar-se de credenciamento de nova instituição de ensino ou de autorização de novo curso. Nesse cenário, nas etapas seguintes do processo de credenciamento/autorização, as diversas instâncias técnicas convocadas a se pronunciar devem observar se o Município e o novo curso de medicina atendem integralmente aos critérios previstos nos parágrafos 1º, 2º e 7º do art. 3º da Lei 12.871/2013; e (iii) devem ser extintos os processos administrativos que não ultrapassaram a etapa prevista no art. 19, § 1º, ou no art. 42 do Decreto 9.235/2017, nos termos do art. 52 da Lei 9.784/1999. 8. Procedência parcial dos pedidos formulados na ADC 81 e na ADI 7187 para assentar a constitucionalidade do art. 3º da Lei 12.871/2013 e estabelecer que: (i) a sistemática do art. 3º da Lei 12.871/2013 é incompatível com a abertura de novos cursos de medicina com base na Lei 10.861/2004, bem assim com a autorização de novas vagas em cursos já existentes, sem o prévio chamamento público e a observância dos requisitos previstos na Lei 12.871/2013; e (ii) fica ressalvada a possibilidade de a sociedade civil pleitear o lançamento de editais para instalação de novos cursos em determinadas localidades, cabendo à Administração Pública responder a esses pleitos de forma fundamentada, com publicidade e em prazo razoável. (ADC 81 MC-Ref, Relator(a): GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 05-06-2024, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 01-07-2024 PUBLIC 02-07-2024) Como ressaltado pelo Eminente Ministro Gilmar Mendes no voto-condutor do acórdão da ADC nº 81, “[...] O legislador optou pela centralização do papel indutor do Estado como mecanismo de equalização da oferta de médicos”. O referido Ministro prosseguiu aduzindo que “[...] a Lei 12.871/2013 expressamente buscou atender a esses parâmetros. Estabeleceu novos critérios e condicionantes estruturais, instituiu o chamamento público, impôs a integração dos novos cursos ao SUS, bem como exigiu contrapartida financeira destinada aos equipamentos públicos e ao oferecimento de bolsas de estudo. Nesse sentido, a norma controvertida nestes processos consiste em regra posterior e específica, inaugurando novo sistema de autorização dos cursos de medicina. E o fez sem ambiguidades: em nenhum momento sinaliza que haveria outro sistema de autorização de novos cursos”. Para comodidade de exame, vale transcrever a íntegra do Capítulo II da Lei nº 12.871/2013, que trata “Da Autorização para o Funcionamento de Curso de Medicina”: Art. 3º A autorização para o funcionamento de curso de graduação em Medicina, por instituição de educação superior privada, será precedida de chamamento público, e caberá ao Ministro de Estado da Educação dispor sobre: I - pré-seleção dos Municípios para a autorização de funcionamento de cursos de Medicina, ouvido o Ministério da Saúde; II - procedimentos para a celebração do termo de adesão ao chamamento público pelos gestores locais do SUS; III - critérios para a autorização de funcionamento de instituição de educação superior privada especializada em cursos na área de saúde; IV - critérios do edital de seleção de propostas para obtenção de autorização de funcionamento de curso de Medicina; e V - periodicidade e metodologia dos procedimentos avaliatórios necessários ao acompanhamento e monitoramento da execução da proposta vencedora do chamamento público. § 1º Na pré-seleção dos Municípios de que trata o inciso I do caput deste artigo, deverão ser consideradas, no âmbito da região de saúde: I - a relevância e a necessidade social da oferta de curso de Medicina; e II - a existência, nas redes de atenção à saúde do SUS, de equipamentos públicos adequados e suficientes para a oferta do curso de Medicina, incluindo, no mínimo, os seguintes serviços, ações e programas: a) atenção básica; b) urgência e emergência; c) atenção psicossocial; d) atenção ambulatorial especializada e hospitalar; e e) vigilância em saúde. § 2º Por meio do termo de adesão de que trata o inciso II do caput deste artigo, o gestor local do SUS compromete-se a oferecer à instituição de educação superior vencedora do chamamento público, mediante contrapartida a ser disciplinada por ato do Ministro de Estado da Educação, a estrutura de serviços, ações e programas de saúde necessários para a implantação e para o funcionamento do curso de graduação em Medicina. § 3º O edital previsto no inciso IV do caput deste artigo observará, no que couber, a legislação sobre licitações e contratos administrativos e exigirá garantia de proposta do participante e multa por inexecução total ou parcial do contrato, conforme previsto, respectivamente, no art. 56 e no inciso II do caput do art. 87 da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993. § 4º O disposto neste artigo não se aplica aos pedidos de autorização para funcionamento de curso de Medicina protocolados no Ministério da Educação até a data de publicação desta Lei. § 5º O Ministério da Educação, sem prejuízo do atendimento aos requisitos previstos no inciso II do § 1º deste artigo, disporá sobre o processo de autorização de cursos de Medicina em unidades hospitalares que: I - possuam certificação como hospitais de ensino; II - possuam residência médica em no mínimo 10 (dez) especialidades; ou III - mantenham processo permanente de avaliação e certificação da qualidade de seus serviços. § 6º O Ministério da Educação, conforme regulamentação própria, poderá aplicar o procedimento de chamamento público de que trata este artigo aos outros cursos de graduação na área de saúde. § 7º A autorização e a renovação de autorização para funcionamento de cursos de graduação em Medicina deverão considerar, sem prejuízo de outras exigências estabelecidas no Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (Sinaes): I - os seguintes critérios de qualidade: a) exigência de infraestrutura adequada, incluindo bibliotecas, laboratórios, ambulatórios, salas de aula dotadas de recursos didático-pedagógicos e técnicos especializados, equipamentos especiais e de informática e outras instalações indispensáveis à formação dos estudantes de Medicina; b) acesso a serviços de saúde, clínicas ou hospitais com as especialidades básicas indispensáveis à formação dos alunos; c) possuir metas para corpo docente em regime de tempo integral e para corpo docente com titulação acadêmica de mestrado ou doutorado; d) possuir corpo docente e técnico com capacidade para desenvolver pesquisa de boa qualidade, nas áreas curriculares em questão, aferida por publicações científicas; II - a necessidade social do curso para a cidade e para a região em que se localiza, demonstrada por indicadores demográficos, sociais, econômicos e concernentes à oferta de serviços de saúde, incluindo dados relativos à: a) relação número de habitantes por número de profissionais no Município em que é ministrado o curso e nos Municípios de seu entorno; b) descrição da rede de cursos análogos de nível superior, públicos e privados, de serviços de saúde, ambulatoriais e hospitalares e de programas de residência em funcionamento na região; c) inserção do curso em programa de extensão que atenda a população carente da cidade e da região em que a instituição se localiza. Da leitura dos dispositivos acima, verifica-se que o § 1º do artigo 3º da Lei nº 12.871/2013 estabelece dois pilares para a seleção das localidades aptas a receberem novos cursos de medicina: i) a relevância e a necessidade social; e ii) a existência, nas redes de atenção à saúde do SUS, de equipamentos públicos adequados e suficientes para a oferta do curso de medicina. Com isso, o legislador buscou evitar que a criação de novos cursos de medicina ocorra à revelia da necessidade de médicos ou sem a correspondente infraestrutura para a adequada e completa formação dos novos profissionais. A propósito, confira-se trecho do voto do Eminente Ministro André Mendonça na ADC nº 81: “[...] a aferição da conformidade constitucional da sistemática do chamamento público inaugurada pelo art. 3º da Lei nº 12.871, de 2013, como condição limitadora da abertura de novos cursos de Medicina, não está exclusivamente relacionada a aspectos de dimensões quantitativas — no sentido de se verificar se é adequado, necessário e razoável que se restrinjam a abertura de novas vagas no ensino superior desta área de formação específica diante de um eventual risco de saturação do mercado —, mas deve levar em consideração, também, elementos de ordem qualitativa na formação destes profissionais. Penso, inclusive, que a imprescindibilidade em se considerar o referido aspecto resta evidenciada pela posição unânime quanto à absoluta necessidade de se assegurar, no contexto da localidade na qual se pretende abrir novo curso, a ambiência e o aparato instrumental necessário ao aprendizado prático — dimensão fundamental da graduação médica. Trata-se, a toda evidência, de preocupação com a qualidade do curso a ser ministrado. Tal preocupação se revela ainda mais fundamental quando, segundo estudo realizado pelo Instituto de Saúde Suplementar da Universidade Federal de Minas Gerais, dos 19,4 milhões de pessoas tratadas em hospitais no Brasil entre abril de 2017 e março de 2018, 1,3 milhão sofreu ao menos algum efeito colateral por negligência ou imprudência durante o tratamento médico. No mesmo estudo, se verificou que 55 mil pessoas morrem por ano no país por erro médico. Portanto, a qualidade dos cursos de medicina está diretamente relacionada à qualidade do serviço de saúde a ser prestado à população brasileira. Enfim, a adequada ou inadequada regulação do ensino da medicina tem o condão de impactar diretamente na vida ou morte das pessoas. Em definitivo, a medicina por evidência depende, necessariamente, de uma regulação do ensino médico baseada em evidências. Não há espaços para achismos ou visões ideológicas nessa seara”. No que interessa à presente ação (aferição da necessidade social com base na quantidade de médicos por habitantes), verifica-se que no tocante à pré-seleção das localidades para o edital do chamamento, a Lei nº 12.871/2013 preconiza que “deverão ser consideradas, no âmbito da região de saúde: I - a relevância e a necessidade social da oferta de curso de Medicina” (art. 3º, § 1º, inciso I). E mais, no artigo 3º, §7º, inciso II, “a”, da mesma Lei, consta que “A autorização e a renovação de autorização para funcionamento de cursos de graduação em Medicina deverão considerar, sem prejuízo de outras exigências estabelecidas no Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (Sinaes): [...] II - a necessidade social do curso para a cidade e para a região em que se localiza, demonstrada por indicadores demográficos, sociais, econômicos e concernentes à oferta de serviços de saúde, incluindo dados relativos à: a) relação número de habitantes por número de profissionais no Município em que é ministrado o curso e nos Municípios de seu entorno”. Portanto, a sistemática de abertura de novos cursos de medicina inaugurada pela Lei nº 12.871/2013 exige, como via única, o chamamento público, mediante a elaboração de edital pautado em uma pré-seleção que deve considerar a necessidade social no Município e na região. A título de exemplo, confira-se o mais recente Edital nº 01, de 4 de outubro de 2023, que bem delimita a pré-seleção das localidades com base em regiões compostas por conjuntos de Municípios (Id 344732464, fls. 33/34): Ainda com base no Edital nº 01, de 4 de outubro de 2023, vale colacionar as regiões selecionadas no Estado de São Paulo (Id 344732464, fls. 89/93): Detalhando melhor a forma e os critérios da pré-seleção dos Municípios integrantes das regiões de saúde abarcados pelo chamamento público, a Nota Técnica Conjunta nº 3/2023/DPR/SERES, que forneceu subsídios para o lançamento do referido Edital nº 01 de 4 de outubro de 2023, destacou que: “[...] 3.4.9. Seguindo a Lei do Mais Médicos, o edital deve proceder a uma pré-seleção de municípios. Ouvido o Ministério da Saúde, sugere-se que essa pré-seleção parta das 450 regiões de saúde existentes no país e que se dê a partir de três critérios: a) Densidade médica: medida da presença de profissionais de Medicina em cada região de saúde, calculada como a razão do número de tais profissionais por mil habitantes no conjunto de municípios que a compõem. [...] b) Estabelecimentos de saúde: O Ministério da Saúde estabeleceu critérios mínimos de capacidade dos hospitais presentes nas regiões de saúde para que a região fosse habilitada a receber um curso de graduação em Medicina: a região de saúde, além de possuir, no mínimo, um hospital com ao menos 80 leitos SUS deve ter Serviços de Emergência e Urgência, Serviços de Atenção Ambulatorial Especializada, Centro de Atenção Psicossocial e Equipes de Saúde da Família. c) Densidade de leitos: medida da disponibilidade potencial de campo de prática em cada região de saúde, calculada como a razão de leitos por estudante ingressante de faculdades de Medicina – considerando, para fins de cálculo desta medida, como total de estudantes ingressantes os fluxos preexistentes (de cursos porventura já instalados em municípios pré-selecionados) adicionados aos novos fluxos que passariam a existir com a instalação de novos cursos, via edital – valendo lembrar que o Ministério da Saúde considera que o campo de prática para estudantes de Medicina deva assegurar ao menos cinco leitos para cada discente. Fonte: https://www.gov.br/mec/pt-br/media/Nota_Tecnica_Conjunta_n._3_IPEA_PLanejamento_SERES_final.pdf Importante consignar que no tocante ao critério da “Densidade Médica”, a própria Nota Técnica Conjunta nº 3/2023/DPR/SERES, em seu item 3.4.14, reconhece o fato de que “[...] Dentro das regiões de saúde selecionadas existem municípios com elevada necessidade de tais profissionais, mas também existem locais que já possuem uma densidade médica relativamente elevada”. Isso se justifica porque, segundo as conclusões da Nota Técnica Conjunta nº 3/2023/DPR/SERES (item 4.4), serve para “[...] Permitir que as estruturas de saúde de mais de um município de uma mesma região de saúde sejam conjuntamente utilizadas como campo de prática de um mesmo curso (compondo, assim, a capacidade formativa necessária, com ao menos cinco leitos por estudante) ajudará a viabilizar cursos com sede em municípios que, isoladamente, não teriam condições de abrigar um curso de graduação em Medicina”. Portanto, com base nos critérios expressos da Lei nº 12.871/2013, somente os Municípios situados em uma das regiões pré-selecionadas pelo edital de chamamento público podem receber autorização para abertura de novo curso de Medicina, sendo possível que um Município que se encontre inserido em determinada Região selecionada tenha uma densidade médica mais elevada (número de médicos por mil habitantes), o que é admitido como medida de suporte para a respectiva região deficitária. Assim, bem compreendidos os fundamentos centrais e os critérios norteadores da sistemática da pré-seleção preconizada pela Lei nº 12.871/2013, cuja constitucionalidade foi declarada pelo Egrégio Supremo Tribunal Federal, passa-se à análise da modulação de efeitos promovida pela Corte Suprema no tocante aos casos anteriores ao julgamento da ADC nº 81. II – ADC nº 81: validação da Lei nº 12.871/2013 e modulação de efeitos Como já referido, toda a sistemática acima exposta foi validada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento da ADC nº 81, mediante a declaração da constitucionalidade do artigo 3º da Lei nº 12.871/2013, que dispõe sobre a autorização para funcionamento de cursos de medicina por meio da via única do Edital de Chamamento Público. Para o Supremo Tribunal Federal, conforme o voto-condutor do acórdão da ADC nº 81, “[...] a sistemática do chamamento público mostra-se adequada para o objetivo colimado pelo Poder Público. A política estatal indutora faculta a instalação de faculdades de medicina em regiões com reduzida oferta de médicos e serviços de saúde, vinculando a atuação econômica dos agentes privados à finalidade pública de melhoria dos equipamentos públicos do Sistema Único de Saúde”. Portanto, todos os pedidos de abertura de cursos de medicina formulados depois do julgamento da ADC nº 81 devem necessariamente seguir a sistemática do chamamento público implementada pela Lei nº 12.871/2013, conforme o acórdão da ADC nº 81: “[...] Portanto, concluo que a sistemática do art. 3º da Lei 12.871/2013 é incompatível com a abertura de novos cursos de medicina fundados na Lei 10.861/2004, bem assim com a autorização de novas vagas em cursos já existentes, sem o prévio chamamento público e a observância dos demais requisitos previstos na Lei 12.871/2013.” Contudo, o E. Supremo Tribunal Federal não ignorou que “[...] há inegável interesse social na adoção de solução que contemple as faculdades instaladas com base em decisões judiciais que dispensaram o chamamento público e determinaram a análise do procedimento de abertura do curso de medicina”. Assim, com relação às situações pendentes ou já consumadas por força de decisão judicial – situações anteriores ao julgamento da ADC nº 81 -, o E. Supremo Tribunal Federal promoveu a modulação de efeitos com as seguintes balizas: “[...] No que concerne aos processos administrativos e judiciais que tratam do tema objeto destas ações, determino que: (i) sejam mantidos os novos cursos de medicina instalados – ou seja, contemplados por Portaria de Autorização do Ministério da Educação – por força de decisões judiciais que dispensaram o chamamento público e impuseram a análise do procedimento de abertura do curso de medicina ou de ampliação das vagas em cursos existentes nos termos da Lei 10.861/2004; (ii) tenham seguimento os processos administrativos pendentes, previstos na Lei 10.861/2004, instaurados por força de decisão judicial, que ultrapassaram a fase inicial de análise documental a que se referem os arts. 19, § 1º, e 42, ambos do Decreto 9.235/2017, a depender de tratar-se de credenciamento de nova instituição de ensino ou de autorização de novo curso. Nesse cenário, nas etapas seguintes do processo de credenciamento/autorização, as diversas instâncias técnicas convocadas a se pronunciar devem observar se o Município e o novo curso de medicina atendem integralmente aos critérios previstos nos parágrafos 1º, 2º e 7º do art. 3º da Lei 12.871/2013; e (iii) sejam extintos os processos administrativos que não ultrapassaram a etapa prevista no art. 19, § 1º, ou no art. 42 do Decreto 9.235/2017, nos termos do art. 52 da Lei 9.784/1999. Desse modo, no que interessa à presente ação, o E. Supremo Tribunal Federal, no item “ii” da modulação de efeitos, acabou por instituir uma sistemática específica para os processos administrativos pendentes na data do julgamento da ADC nº 81 e que foram instaurados por força de decisão judicial anterior, fundando-se em duas premissas: (a) a dispensa do prévio chamamento público; e (b) a observância dos critérios previstos nos parágrafos 1º, 2º e 7º do art. 3º da Lei 12.871/2013. Inclusive, tal compreensão ficou mais clara quando o E. Supremo Tribunal Federal analisou a validade da Portaria SERES/MEC nº 397/2023, que estabeleceu mecanismo de rejeição sumária de pedidos de abertura de curso de medicina em Municípios não contemplados no Edital de Chamamento Público. Confira-se: AÇÃO DECLARATÓRIA DE CONSTITUCIONALIDADE E AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ART. 3º DA LEI 12.871/2013 (LEI DO MAIS MÉDICOS). ALEGAÇÕES DE DESCUMPRIMENTO DA MEDIDA CAUTELAR CONCEDIDA NESTES AUTOS. ELUCIDADAÇÃO, DENSIFICAÇÃO E DESDOBRAMENTO DA MEDIDA CAUTELAR. 1. A Portaria SERES/MEC 397/2023, com a redação dada pela Portaria SERES/MEC 421/2023, atende às determinações da medida cautelar concedida em 7.8.2023, desde que interpretada de modo a assegurar às instituições de ensino que ultrapassaram a fase inicial de análise documental a que se refere o art. 19, § 1º do Decreto 9.235/2017 a oportunidade de comprovar, no bojo do processo administrativo em que pleiteiam a abertura de vagas em cursos de graduação de medicina, a existência de interesse social em sua pretensão, ainda que localizadas em municipalidades não contempladas por editais de chamamento público. 2. A análise, pelo MEC, da existência de interesse social no âmbito dos processos administrativos de instalação/aumento de vagas cujo trâmite foi assegurado por força de decisão judicial deve ocorrer à luz das características particulares de cada caso concreto, garantido o contraditório, a razoável duração do processo e todos os demais consectários da cláusula do devido processo legal administrativo. 3. A apreciação de demanda judicial relativa a curso de medicina que veio a ser instalado, no curso da tramitação da presente ação direta, por força de decisão judicial precária que determinou ao MEC a análise de requerimento de instalação fora da sistemática do art. 3º da Lei 12.871/2013 deve necessariamente levar em consideração o decidido nestes autos, em especial os termos da medida cautelar concedida em 7.8.2023 e, sobretudo, a decisão final a que chegar este Tribunal na apreciação definitiva das ações. 4. Decisão de integração da medida cautelar deferida em 7.8.2023 referendada pelo Plenário. (ADC 81 MC-Ref-Ref, Relator(a): GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 05-06-2024, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 12-08-2024 PUBLIC 13-08-2024) Assim, de acordo com a Suprema Corte, para os processos administrativos instaurados antes do julgamento da ADC nº 81 e que já tiverem ultrapassado a fase de análise documental, é admissível a instalação de curso de medicina mesmo em Municípios não contemplados nos editais de chamamento público, devendo a análise do MEC – sobre a existência de interesse social - ocorrer à luz das características particulares de cada caso concreto, garantindo-se o devido processo legal administrativo. O caso do Município de São Carlos/SP se enquadrou exatamente na situação prevista no referido item “ii” da modulação de efeitos. Isso porque, antes do julgamento da ADC nº 81, a Associação de Escolas Reunidas Ltda - ora autora - já havia ajuizado a ação nº 1046556-91.2022.4.01.3400 (data de ingresso: 21/02/2022) perante a Justiça Federal da 1ª Região, e lá obteve, por decisão do Eminente Desembargador Federal Carlos Augusto Pires Brandão, nos autos do agravo de instrumento nº 1026514-36.2022.4.01.0000, medida liminar nos seguintes termos: “[...] defiro o pedido de antecipação de tutela para determinar à parte ré que por intermédio da Secretaria de Regulação e Supervisão da Educação Superior do Ministério da Educação - SERS/MEC, proceda à imediata disponibilização de meio hábil à protocolização do pedido de abertura do curso de graduação em Medicina pela parte agravante, bem como o seu regular processamento, no prazo de 90 (noventa) dias, sem prejuízo da observância dos requisitos previstos na legislação de regência"). Comino multa diária de R$ 500,00 (quinhentos reais), por dia de atraso no cumprimento da tutela provisória, a contar do término do prazo acima fixado”. Em cumprimento à referida medida liminar, que permanece vigorando enquanto pendente a apreciação do recurso de apelação interposto perante o E. Tribunal Regional Federal da 1ª Região, o Ministério da Educação viabilizou o trâmite do processo administrativo eMEC nº 202301223, em que a Associação de Escolas Reunidas Ltda – ora autora - formulou pedido de autorização de oferta de curso de Medicina no Município de São Carlos/SP, o qual foi inferido administrativamente, sendo este o motivo da irresignação manifestada na presente ação. Por fim, cumpre ressaltar que este Juízo, por meio da decisão Id 348640808, já enfrentou e rejeitou as alegações de litispendência e de prejudicialidade em relação à ação nº 1046556-91.2022.4.01.3400, que tramita perante a Justiça Federal da 1ª Região. Vale destacar o trecho da decisão que tratou da relação de prejudicialidade entre as demandas e justificou o prosseguimento do julgamento desta ação (Id 348640808): [...] III – Da relação de prejudicialidade: Ação nº 1046556-91.2022.4.01.3400/DF e Agravo de Instrumento nº 1026514-36.2022.4.01.0000/DF A já citada ação nº 1046556-91.2022.4.01.3400, proposta perante a Justiça Federal da 1ª Região, teve início em 21/07/2022 e foi ajuizada com o objetivo de obter provimento jurisdicional determinando que a Secretaria de Regulação e Supervisão da Educação Superior do Ministério da Educação - SERS/MEC viabilizasse o protocolo de requerimento de abertura de curso de medicina na cidade de São Carlos/SP, afastando-se a exigência de prévia seleção em edital de chamamento público (art. 3º da Lei nº 12.871/2013). Em 1º grau de jurisdição, a medida liminar foi negada, porém, em sede de agravo de instrumento (AI nº 1026514-36.2022.4.01.0000), o Eminente Desembargador Federal CARLOS AUGUSTO PIRES BRANDÃO, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, concedeu a tutela de urgência nos seguintes termos: “[...] defiro o pedido de antecipação de tutela para determinar à parte ré que por intermédio da Secretaria de Regulação e Supervisão da Educação Superior do Ministério da Educação - SERS/MEC, proceda à imediata disponibilização de meio hábil à protocolização do pedido de abertura do curso de graduação em Medicina pela parte agravante, bem como o seu regular processamento, no prazo de 90 (noventa) dias, sem prejuízo da observância dos requisitos previstos na legislação de regência"). Comino multa diária de R$ 500,00 (quinhentos reais), por dia de atraso no cumprimento da tutela provisória, a contar do término do prazo acima fixado”. Com base na referida medida liminar, realizou-se a apreciação administrativa impugnada na presente ação, conforme trecho do Parecer Final da SERES/DIREG (id. 332803718): Trata-se da análise do pedido de autorização do curso de Medicina a ser ofertado pelo Centro Universitário Central Paulista - UNICEP, código e-MEC 707, mantido pela Associação de Escolas Reunidas LTDA, código e-MEC 471, protocolado no e-MEC sob o nº 202301223, conforme dados dos processos elencados no tópico acima. A referida análise é realizada estritamente em cumprimento à decisão judicial proferida nos autos nº 1026514-36.2022.4.01.0000, em trâmite no Tribunal Regional Federal da 1ª Região, acompanhada do Parecer de Força Executória nº 00566/2022/CORESPAP/PRU1R/PGU/AGU (SEI nº 3506805, p. 2/42), constante nos autos do processo SEI nº 00732.003671/2022-81, relacionado ao processo SEI nº 00732.003350/2022-87. Posteriormente, naquela ação nº 1046556-91.2022.4.01.3400, o Juízo Federal da 21ª Vara Federal do Distrito Federal proferiu sentença de improcedência do pedido, entretanto, manteve os efeitos da decisão de 2º grau que havia concedido a tutela de urgência. Vale conferir o seguinte trecho da sentença: “Pelo exposto, JULGO IMPROCEDENTES OS PEDIDOS, com fulcro no art. 487, I, do CPC. Mantenho os efeitos já produzidos pela decisão que antecipou a tutela recursal (teoria do fato consumado), salvo deliberação em contrário do próprio TRF1 caso interposta apelação”. Houve a interposição de apelação, que ainda não foi julgada. Como dito, por força da referida liminar, que permanece vigorando enquanto pendente a apreciação do recurso de apelação dirigido ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região, a autora da presente ação obteve o direito de ter seu requerimento de abertura de curso de medicina na cidade de São Carlos/SP iniciado e apreciado perante a SERS/MEC. Ato contínuo, a parte autora desta ação também foi beneficiada pela modulação de efeitos realizada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento da Ação Direta de Constitucionalidade nº 81, pois a Suprema Corte, a despeito ter declarado a constitucionalidade do chamamento público exigido pelo art. 3º da Lei nº 12.871/2013, preservou os processos administrativos pendentes, instaurados por força de decisão judicial, que ultrapassaram a fase inicial de análise documental. Confira-se trecho da deliberação do Supremo Tribunal Federal: [...] 7. No que concerne aos processos administrativos e judiciais que tratam do tema objeto destas ações: (i) são preservados os novos cursos de medicina instalados – ou seja, contemplados por Portaria de Autorização do Ministério da Educação – por força de decisões judiciais que dispensaram o chamamento público e impuseram a análise do procedimento de abertura do curso de medicina ou de ampliação das vagas em cursos existentes nos termos da Lei 10.861/2004; (ii) têm seguimento os processos administrativos pendentes, previstos na Lei 10.861/2004, instaurados por força de decisão judicial, que ultrapassaram a fase inicial de análise documental a que se referem os arts. 19, § 1º, e 42, ambos do Decreto 9.235/2017, a depender de tratar-se de credenciamento de nova instituição de ensino ou de autorização de novo curso. Nesse cenário, nas etapas seguintes do processo de credenciamento/autorização, as diversas instâncias técnicas convocadas a se pronunciar devem observar se o Município e o novo curso de medicina atendem integralmente aos critérios previstos nos parágrafos 1º, 2º e 7º do art. 3º da Lei 12.871/2013; e (iii) devem ser extintos os processos administrativos que não ultrapassaram a etapa prevista no art. 19, § 1º, ou no art. 42 do Decreto 9.235/2017, nos termos do art. 52 da Lei 9.784/1999. 8. Procedência parcial dos pedidos formulados na ADC 81 e na ADI 7187 para assentar a constitucionalidade do art. 3º da Lei 12.871/2013 e estabelecer que: (i) a sistemática do art. 3º da Lei 12.871/2013 é incompatível com a abertura de novos cursos de medicina com base na Lei 10.861/2004, bem assim com a autorização de novas vagas em cursos já existentes, sem o prévio chamamento público e a observância dos requisitos previstos na Lei 12.871/2013; e (ii) fica ressalvada a possibilidade de a sociedade civil pleitear o lançamento de editais para instalação de novos cursos em determinadas localidades, cabendo à Administração Pública responder a esses pleitos de forma fundamentada, com publicidade e em prazo razoável. (ADC 81 MC-Ref, Relator(a): GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 05-06-2024, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 01-07-2024 PUBLIC 02-07-2024) Nesse cenário, o requerimento inaugurado pela parte autora perante a SERS/MEC, por força de decisão judicial, prosseguiu e, finalmente, foi apreciado em sede administrativa, tendo a SERS/MEC deliberado pelo indeferimento da abertura de novo curso de medicina no Município de São Carlos/SP, conforme Parece Final id. 332803718 e Portaria SERES/MEC nº 330, de 11 de julho de 2024 (id. 332803716). Por esta razão, a parte autora ajuizou a presente ação para impugnar os fundamentos do indeferimento administrativo do seu pedido de abertura de novo curso de medicina, aduzindo, em síntese, a ilegalidade da adoção da proporção de 3,73 médicos por mil habitantes (média dos países da OCDE) utilizada pelo MEC como critério objetivo, algo que, no entender da autora, teria desrespeitado a decisão tomada pelo Supremo Tribunal Federal na ADC nº 81, especialmente na parte em que esta determinou que “[...] nas etapas seguintes do processo de credenciamento/autorização, as diversas instâncias técnicas convocadas a se pronunciar devem observar se o Município e o novo curso de medicina atendem integralmente aos critérios previstos nos parágrafos 1º, 2º e 7º do art. 3º da Lei 12.871/2013”. Nota-se, portanto, que, se por um lado não há litispendência entre a presente ação e a ação nº 1046556-91.2022.4.01.3400 ajuizada perante a 21ª Vara Federal do Distrito Federal, há, em última análise, uma certa relação de prejudicialidade entre elas. Com efeito, se o recurso de apelação interposto perante o Tribunal Regional Federal da 1ª Região for desprovido, cairá por terra a própria decisão judicial precária que possibilitou a abertura do procedimento administrativo que culminou na apreciação e no indeferimento do pedido de abertura do novo curso de medicina no Município de São Carlos/SP, restando, ao fim e ao cabo, prejudicado o próprio direito invocado na presente ação pela parte autora. Assim, a consequência lógica desta constatação seria, em tese, a necessidade de suspensão desta ação até o julgamento da apelação pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região, nos termos do art. 313, inciso V, alínea “a”, do Código de Processo Civil. Entendo, contudo, que o caso dos autos é singular, pois o Supremo Tribunal Federal, ao determinar “[...] o seguimento dos processos administrativos pendentes, instaurados por força de decisão judicial, que ultrapassaram a fase inicial de análise documental”, esclareceu que “[...] é necessário que esta decisão, a par de expor a compreensão constitucional da Corte sobre o dispositivo impugnado, encaminhe solução definitiva para os processos judiciais em curso, especialmente no tocante às decisões judiciais liminares proferidas e ainda vigentes.” (Trecho extraído do voto-condutor do acórdão proferido na ADC nº 81 - Relator: Ministro GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 05-06-2024, publicado em 02-07-2024, fl. 74). Com efeito, identifica-se claramente a preocupação da Suprema Corte com o grave cenário de litigiosidade judicial instaurado a partir do deferimento de diversas medidas liminares em favor de instituições de ensino superior para determinar a análise, pela SERS/MEC, de pedidos de abertura de cursos de medicina em várias localidades do país. O Eminente Ministro GILMAR MENDES, relator da ADC nº 81, destacou o seguinte: [...] A ação declaratória de constitucionalidade nº 81 foi deflagrada a partir de cenário de litigiosidade judicial, marcado pelo deferimento de liminares em favor de instituições de ensino superior que determinavam a análise, pelo Ministério da Educação, de pedidos de abertura de cursos de medicina com base na Lei 10.861/2004. Essa situação perdurou por anos, especialmente diante da inércia da Advocacia-Geral da União em combater essas decisões liminares – evidenciada na Audiência Pública – e da própria duração irrazoável da moratória. Correlacionando a situação com o próprio sucesso da política pública voltada à concretização do direito fundamental à saúde, na perspectiva do incremento da qualidade e distribuição da assistência médica no território nacional, o Eminente Ministro GILMAR MENDES ponderou que: [...] esta ação declaratória de constitucionalidade guarda íntima relação com a execução de política pública voltada à concretização do direito fundamental à saúde, na perspectiva do incremento da qualidade e distribuição da assistência médica no território nacional. Nesse sentido, a proliferação de decisões judiciais que excepcionam a regra do art. 3º da Lei 12.871/2011 impacta diretamente no sucesso dessa política pública, criando distorções e enfraquecendo a capacidade de indução do chamamento público. Se durante a vigência da moratória dos novos cursos de Medicina houve verdadeira negação dessa política pública, o cenário agora é diverso, uma vez que o Ministério da Educação editou recentemente Portaria 650, de 5 de abril de 2023, que retoma os chamamentos públicos para novos cursos de Medicina. Todavia, conforme noticiado pela Advocacia-Geral da União no pedido de tutela de urgência, dados colhidos no sistema eletrônico do Ministério da Educação (eMEC) há 223 pedidos judiciais de autorizações de novos cursos de Medicina, totalizando 32.051 novas vagas, além de 22 aumentos de vagas em cursos existentes. Esse cenário de judicialização tem o condão de impactar a retomada da execução de política pública que, conforme demonstrado no tópico anterior, se baseia em dispositivo legal compatível com a Constituição Federal. Na mesma linha, o Eminente Ministro EDSON FACHIN, no seu voto proferido na ADC nº 81, destacou que “Em consulta ao sítio eletrônico do MEC, identifiquei existirem atualmente 391 cursos de bacharelado em medicina no país. De outra face, há 223 pedidos judiciais de autorização de novos cursos, o que significa mais do que o dobro de todos os cursos já implantados nesse interregno”. Compreende-se, portanto, que diante do delicado contexto de proliferação de decisões judiciais a respeito do tema, o Supremo Tribunal Federal procurou dar uma solução definitiva até mesmo para os casos que ainda não foram definitivamente julgados pelas instâncias ordinárias. A solução definitiva determinada pela Corte Suprema, no que importa ao caso dos autos, decorre de dois comandos extraídos do item “ii” da modulação de efeitos operada na ADC nº 81, quais sejam: 1º) “têm seguimento os processos administrativos pendentes, previstos na Lei 10.861/2004, instaurados por força de decisão judicial, que ultrapassaram a fase inicial de análise documental”; e 2º) “nas etapas seguintes do processo de credenciamento/autorização, as diversas instâncias técnicas convocadas a se pronunciar devem observar se o Município e o novo curso de medicina atendem integralmente aos critérios previstos nos parágrafos 1º, 2º e 7º do art. 3º da Lei 12.871/2013”. No caso dos autos, já foi cumprido o primeiro comando da solução definitiva determinada pelo Supremo Tribunal Federal, pois o processo administrativo da autora prosseguiu regularmente perante a SERS/MEC e chegou ao seu termo final com a decisão de “indeferir o pedido de autorização do curso de Medicina 1630617), bacharelado, pleiteado pelo Centro Universitário Central Paulista - UNICEP (707), mantido pela Associação das Escolas Reunidas LTDA (471)” (Portaria SERES/MEC nº 330, de 11 de julho de 2024 - id. 332803716). O próprio Juiz Federal da 21ª Vara Federal do Distrito Federal, que sentenciou a ação nº 1046556-91.2022.4.01.3400, mesmo tendo reconhecido a constitucionalidade do chamamento público exigido pelo art. 3º da Lei nº 12.871/2013, invocou a Teoria do Fato Consumado para manter os efeitos produzidos pela tutela de urgência concedida naqueles autos, confira-se: “Pelo exposto, JULGO IMPROCEDENTES OS PEDIDOS, com fulcro no art. 487, I, do CPC. Mantenho os efeitos já produzidos pela decisão que antecipou a tutela recursal (teoria do fato consumado), salvo deliberação em contrário do próprio TRF1 caso interposta apelação”. Portanto, seria inócuo suspender o curso desta ação para aguardar o julgamento definitivo da apelação interposta perante o Tribunal Regional Federal da 1ª Região, pois (a) o Supremo Tribunal Federal, quando promoveu a modulação de efeitos, já deu solução definitiva para a questão objeto daquele recurso; (b) sob a perspectiva do fato consumado, não haveria possiblidade de alteração da situação já consolidada; e (c) é preciso dar uma solução rápida aos litígios dessa natureza, a fim de evitar o prolongamento da insegurança jurídica e de viabilizar o bom funcionamento da política pública preconizada pela Lei nº 12.871/2013 e demais normativos. Por outro lado, o cumprimento do segundo comando da solução definitiva dada pelo Supremo Tribunal Federal está em debate na presente ação. Para que seja aperfeiçoada, por completo, a referida solução definitiva, é preciso verificar se a SERS/MEC, na apreciação do pedido da autora, respeitou “integralmente aos critérios previstos nos parágrafos 1º, 2º e 7º do art. 3º da Lei 12.871/2013”, conforme determinado pela Corte Suprema. Assim, entendo que é o caso de prosseguir com a presente ação até o seu julgamento exauriente, de modo a reduzir, o quanto possível, o cenário de litigiosidade judicial envolvendo a temática da criação de novos cursos de medicina no Brasil. III – A atuação do Poder Executivo Federal à luz da modulação de efeitos promovida na ADC nº 81 A fim de se adaptar às balizas da medida cautelar e da modulação de efeitos determinadas no bojo da ADC nº 81, o Poder Executivo Federal mobilizou seus setores técnicos e elaborou a Portaria SERES/MEC nº 531, de 23 de dezembro de 2023, que “Dispõe sobre o padrão decisório para o processamento de pedidos de autorização de novos cursos de Medicina e de aumento de vagas em cursos de Medicina já existentes, instaurados por força de decisão judicial, nos termos determinados pela Medida Cautelar na Ação Declaratória de Constitucionalidade 81/DF” (id. 332803729). De acordo com a referida Portaria, o pedido de autorização de curso de Medicina deve atender aos seguintes critérios: (i) relevância e necessidade social da oferta de curso de Medicina; e (ii) existência, nas redes de atenção à saúde do SUS, de equipamentos públicos adequados e suficientes para a oferta do curso de Medicina, conforme descritos no art. 2º da Portaria SERES/MEC nº 531/2023 (Id 332803729): Art. 2º Para o atendimento ao § 1º do art. 3º da Lei nº 12.871, de 2013, será verificado se o município em que se pretende ofertar novo curso de Medicina ou aumentar vaga em curso de Medicina já existente atende aos critérios de: I - relevância e necessidade social da oferta de curso de Medicina; e II - existência, nas redes de atenção à saúde do SUS, de equipamentos públicos adequados e suficientes para a oferta do curso de Medicina, incluindo, no mínimo, os seguintes serviços, ações e programas: a) atenção básica; b) urgência e emergência; c) atenção psicossocial; d) atenção ambulatorial especializada e hospitalar; e e) vigilância em saúde. O inciso I do art. 2º da referida Portaria exige a demonstração da relevância social e necessidade social da oferta de curso de Medicina. Nesse tocante, a Nota Técnica nº 81/2023/CGLNRS/GAB/SERES, que embasou a Portaria SERES/MEC nº 531/2023, consignou que devem ser admitidos os Municípios cuja concentração de médico por mil habitantes seja inferior a 3,73 (média dos países da OCDE), confira-se (Id 332803719): [...] 1. ASSUNTO 1.1. Minuta de portaria que dispõe sobre o padrão decisório para o processamento de pedidos de autorização de novos cursos de Medicina e de aumento de vagas em cursos de Medicina já existentes, instaurados por força de decisão judicial, nos termos determinados pela Medida Cautelar na Ação Declaratória de Constucionalidade 81/DF e revoga a Portaria SERES/MEC nº 397, de 20 de outubro de 2023 e a Portaria SERES/MEC nº 421, de 3 de novembro de 2023. [...] 4. ANÁLISE [...] 4.5. A Lei nº 12.871/2013 estabelece que deverão ser instalados cursos em locais em que se constata "relevância e necessidade social". 4.6. A norma, de natureza genérica, demanda ao Ministério da Educação a definição de critérios objetivos que especifiquem o seu sendo, fixando com clareza quais serão as razões pelas quais determinado conjunto de municípios é considerado apto a receber a instalação de novo curso ou aumento de vagas de cursos já instalados. 4.7. Para isso, e com a finalidade de conferir uniformidade à política pública adotada relava ao programa Mais Médicas, resgata-se a Nota Técnica Conjunta nº 3/2023/DPR/SERES/SERES (Doc. SEI nº 4360961), elaborada em conjunto pelo Ministério da Educação, pelo Ministério do Planejamento e Orçamento e pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicadas relava ao edital de chamamento público para a seleção de propostas para autorização de funcionamento de novos cursos de graduação em Medicina, no âmbito da Lei do Mais Médicos e da Portaria nº 650/2023. 4.8. Na referida Nota Técnica, é evidenciado que o lançado edital de chamada pública para seleção de propostas para autorização de funcionamento de cursos de medicina no âmbito do programa Mais Médicos (Edital nº 01, de 4 de outubro de 2023) foi elaborado com o propósito de que os municípios brasileiros alcancem, até 2033, a média observada em 2022 para países da OCDE de 3,73 profissionais de Medicina por mil habitantes: 3.3.5. Tendo todos esses pontos em perspectiva, buscou-se estimar quantas novas vagas em cursos de graduação em Medicina seriam necessárias nos próximos anos para que o Brasil tendesse a convergir, até por volta de 2033, à média observada em 2022 para a OCDE, que foi de 3,73 profissionais de Medicina por mil habitantes. Para essa simulação projetou-se para o futuro um fluxo base de entrada de novos e novas profissionais de Medicina equivalente à média observada entre 2019 e 2021, segundo esmavas de Scheffer et. al. (2023, p.37) – o que equivale a 21,304 profissionais adicionais por ano. Estimou-se um fluxo base de saída da mesma forma – chegando a uma saída de anual de profissionais equivalente a 1,718. O fluxo base de entrada foi ainda acrescido de: (i) 1.400 profissionais/ano adicionais a partir de 2024, referentes à expansão de cursos dada pelo último edital do Mias Médicos, lançado em 2017); e (ii) 1.100 profissionais/ano adicionais a partir de 2025, referentes a vagas abertas nos últimos anos por meio dos processos de judicialização. 4.9. Diante disso, propõe que sejam pré-selecionados todos os municípios cuja concentração de médico por habitante seja inferior a 3,73, já que esta é a meta do Edital nº 01, de 2023 e, consequentemente, um padrão que pode ser observado também aos pedidos protocolos por decisão judicial em tramitação no MEC, reforçando a coerência com a expansão de vagas de Medicina no sistema da educação superior brasileira. 4.10. Em complemento, e também com a finalidade de preservar a coerência da política, sugere-se a inclusão neste pré-seleção de todos aqueles municípios que integram as regiões de saúde pré-selecionadas no Edital nº 01, de 2023. 4.11. Isto posto, para fins de atendimento ao art. 3º, §1º, da Lei nº 12.871/2013, os pedidos de abertura de novos cursos de Medicina e de aumento de vagas poderão ser aprovados se estiverem em regiões de saúde pré-selecionadas no Edital nº 01, de 4 de outubro de 2023 ou em municípios cuja concentração de médico por habitante seja inferior a 3,73. Ato contínuo, foi editada a Nota Informativa nº 22/2024/CGLNRS/GAB/SERES/MEC para prestar “Esclarecimentos acerca do procedimento e fluxos adotados pelo Ministério da Educação para implementação da Portaria SERES/MEC nº 531, de 22 de dezembro de 2023” (id. 332803720). Confiram-se os trechos que interessam à presente ação (Id 332803720): Portanto, a Nota Informativa nº 22/2024, corroborando a Nota Técnica nº 81/2023, informou aos interessados os critérios adotados pelo MEC para a aferição da relevância e a necessidade social de oferta de curso de medicina, quais sejam: (i) a concentração de médico por habitante no Município inferior à média dos países da OCDE (3,73); e/ou (ii) a inclusão do Município no Edital de Chamamento Público nº 01/2023. Por sua vez, a Nota Técnica elaborada pelo Sistema de Mapeamento em Educação na Saúde (SIMAPES), juntada aos autos pela União no Id 365580054, apresentou “os aspectos metodológicos de construção do indicador de relevância e necessidade social da oferta de curso de Medicina”, nos seguintes termos: “A metodologia mais comum utilizada globalmente é a contagem direta do número de médicos existentes. Entretanto, esta metodologia tem limitações advindas da heterogeneidade no número de horas trabalhadas pelos médicos em atividades assistenciais, o que impede um real dimensionamento sobre a oferta de médicos em efetivo processo de cuidado da população. A metodologia que considera o dimensionamento da força de trabalho com o conceito de “Full Time Equivalent” (FTE) surge como uma alternativa ao método de contagem através do número absoluto, sendo utilizada em diversos estudos e pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). O full time equivalente (FTE) é uma unidade de medida que considera o número de horas trabalhadas. A OCDE preconiza que um FTE de 40 horas em suas publicações, ou seja, cada 40 horas trabalhadas será atribuído um FTE igual a 1. Isto é, o médico que trabalha 60 horas é equivalente a 1,5 FTE, o que atua 40 horas tem um FTE de 1 e um médico que atua 20 horas num determinado município tem um FTE de 0,5. [...] Desta forma, o Ministério da Saúde tem utilizado como referência a metodologia que contempla o conceito de FTE. A OCDE apresenta no seu documento de orientações aos países membros a metodologia de coleta de dados para definir o cálculo do FTE. Assim, o cálculo do FTE baseia-se na Equação I abaixo: Conforme observado o número de horas de trabalho médico e dados populacionais são necessários para o cálculo do FTE, demandando o uso de bases de dados que contemplem tais informações. Há no Brasil, três grandes bases de dados com informações sobre a força de trabalho médico: o estudo da demografia médica, os registros no Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES) e a base de dados Relação Anual de Informações Sociais – RAIS. Os dados da demografia médica baseiam-se na contagem direta de médicos com registro ativo no Conselho Federal de Medicina. Parte destes profissionais atuam em atividades assistenciais e outros estão em atividades não assistenciais. Esta base apresenta como principal limitação não conter informações sobre o número de horas trabalhadas e ausência de informações sobre o local de atuação dos médicos, conforme observa-se em sua metodologia. A base do CNES apresenta informações sobre o local de atuação e carga horária de trabalho dos médicos, sendo base que contempla tanto serviços do SUS quanto do sistema suplementar privado. Em 2018, a base do CNES apresentava dados de cerca de 85,5% de todos os médicos com registros ativos no Brasil. Parte desta diferença, ocorre em virtude de médicos que atuam apenas no sistema privado como autônomos e não acessíveis à população usuária do SUS ou que apesar de estarem com registro ativo no conselho atuam em atividades não assistenciais, tais como atividades gerenciais, docência ou pesquisa. A base da RAIS também apresenta estas informações, entretanto o número de registros é inferior ou do CNES e, portanto, compreende-se que a base do CNES é a mais adequada para o cálculo do FTE em nosso país. [...] Diante dos aspectos supracitados, o Ministério da Saúde utiliza os registros do Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES) como base de dados para o cálculo do FTE 40 horas e os dados de população registrados na base de dados do DATASUS. Ademais, considera que municípios com relação médico por habitante inferior a 3,73 médicos por mil habitantes (média da OCDE) apresentam necessidade social para abertura de cursos de medicina. Este referido método de análise foi utilizado para realização do estudo que gerou os cenários para o Edital SERES/MEC nº 1, de 04 de outubro de 2023. [...] Os dados referentes ao número de médicos são extraídos da base do CNES atualizados mensalmente. A referência para o cálculo do tamanho da população advém dos valores das estimativas populacionais dos municípios brasileiros disponibilizadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU) e que constam na base do Tabnet do Datasus” (Id 365580054). Assim, no âmbito do Ministério da Educação (MEC), a aferição do critério da relevância e necessidade social de oferta de curso de medicina contempla Municípios em que a concentração de médicos por mil habitantes é inferior à média dos países da OCDE (3,73), cujo cálculo é feito com base na metodologia Full Time Equivalente (FTE) - número de horas trabalhadas -, partindo-se de informações extraídas dos registros do Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES). IV – Da oferta de curso de medicina no Município de São Carlos/SP O Centro Universitário Central Paulista e a sua mantenedora Associação de Escolas Reunidas Ltda. formalizaram, em 14 de março de 2023, requerimento junto ao Ministério da Educação (MEC) com o propósito de obterem autorização para oferta de curso de Medicina no Município do São Carlos/SP (processo eMEC nº 202301223). No âmbito do MEC, o processo foi submetido à análise inicial em 14 de março de 2023, tendo como desfecho o resultado “parcialmente favorável” na fase “Despacho Saneador - fase documental”. Tendo em vista que as questões apontadas no Despacho Saneador não impediam o prosseguimento do feito e foram posteriormente saneadas, o processo foi encaminhado ao INEP para realização dos procedimentos de avaliação (Id 332803718, fl. 7). Em seguida, deu-se início à fase “Avaliação do INEP”, em 08 de novembro de 2023, a qual foi concluída em 29 de janeiro de 2024. A visita in loco do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) foi realizada no período de 21 de janeiro a 24 de janeiro de 2024, estando consignado no Relatório de Avaliação nº 213291 os seguintes conceitos e considerações conclusivas (Id 365580057, fls. 2 a 17): Logo depois, foi iniciada, em 30 de janeiro de 2024, a fase de manifestação do Conselho Nacional de Saúde (CNS). Foi aberto prazo de 30 (trinta) dias para o CNS, que não se manifestou (Id 365580058, fl. 6). Em sequência, o processo foi submetido à fase de “Parecer Final”, de competência da Secretaria de Regulação e Supervisão da Educação Superior – SERES/MEC, a qual foi iniciada em 02 de abril de 2024 e finalizada em 11 de julho de 2024. Assim, o processo foi analisado na fase "Secretaria — Parecer Final", na qual a SERES/MEC se manifestou desfavorável à autorização do curso de Medicina, conforme os seguintes fundamentos constantes do Parecer Final (Id 332803718): [...] [...] [...] [...] [...] Nota-se que, a despeito do cumprimento de todos os outros requisitos exigidos para a autorização de oferta do curso de medicina, o parecer final foi desfavorável somente em razão da constatação de que não houve o cumprimento do requisito da relevância e necessidade social, pois se apurou que a relação médico por mil habitantes no Município de São Carlos seria de 4,74, que é superior ao patamar máximo adotado de 3,73 (média dos países da OCDE). Importante destacar que a mencionada aferição da densidade médica no Município de São Carlos/SP foi objeto da Nota Técnica nº 201/2024-CGESC/DEGES/SGTES/MS, juntada às fls. 6/11 do Id 344732464 destes autos, confira-se: Após todas as análises técnicas acima colacionadas, visando garantir o contraditório, foi instaurada diligência junto à Instituição requerente – autora desta ação -, em 29/04/2024, intimando-a para se manifestar acerca da relevância e a necessidade social da oferta de curso de Medicina apurada pela SGTES/MS, bem como manifestação acerca da existência, nas redes de atenção à saúde do SUS, de equipamentos públicos adequados e suficientes para a oferta do curso de Medicina (Id 365580058, fl. 11). Diante disso, o Centro Universitário Central Paulista, em resposta à diligência instaurada em 29/04/2024, encaminhou o Ofício nº 014/2024 (Id 365580058, fls. 15/38), manifestando-se sobre diversos pontos, dentre eles, sobre a densidade/concentração médica do município de São Carlos e relevância e necessidade social da oferta do curso de medicina. Confira-se trecho da manifestação da requerente (Id 365580058, fl. 17): Contudo, a manifestação da parte requerente não foi acatada, motivo pelo qual houve a publicação, no Diário Oficial da União, em 12 de julho de 2024, da Portaria nº 330, de 11 de julho de 2024, indeferindo o pedido de autorização do curso de Medicina pleiteado pelo Centro Universitário Central Paulista - UNICEP e mantenedora Associação das Escolas Reunidas LTDA: Portanto, frise-se, o indeferimento do pedido da autora se deu exclusivamente porque restou apurado no processo administrativo que a relação médico por mil habitantes no Município de São Carlos seria de 4,74, que é superior ao patamar máximo de 3,73 (média dos países da OCDE) adotado pelo MEC. Atualmente, o processo nº 202301223 se encontra em fase recursal junto ao Conselho Nacional de Educação – CNE (Id 365580058, fl. 13). Passo, pois, ao enfrentamento das insurgências manifestadas pela autora ASSOCIAÇÃO DE ESCOLAS REUNIDAS LTDA e pelo seu assistente MUNICÍPIO DE SÃO CARLOS/SP em face do indeferimento administrativo do pedido de autorização de oferta de curso de Medicina, o que farei considerando as razões defensivas da UNIÃO FEDERAL e as balizas estabelecidas pelo Supremo Tribunal Federal no âmbito da ADC nº 81. V – Da (i)legalidade formal decorrente da criação de padrão decisório por meio de Nota Técnica A parte autora sustenta que “a Nota Informativa nº 22/2024 e a Nota Técnica nº 81/2023 foram usadas como se fossem atos normativos, mesmo não tendo esse caráter. [...] A proporção de 3,73 médicos por mil habitantes – critério objetivo usado no PARECER FINAL contra a Autora – foi retirado dessas Notas Técnica e Informativa” (id. 332802940, fl. 4). Prossegue asseverando que a Nota Técnica nº 81/2023 e a Nota Informativa nº 22/2024 “[...] não podem ser usadas como padrão decisório de regulação na educação, pois a Portaria Normativa 23/2017, que dispõe sobre os fluxos dos processos de autorização de cursos superiores, exige: ‘A SERES editará normativo específico dispondo acerca do padrão decisório para a análise dos processos previstos nesta Portaria’ (Art. 103)” (id. 332802940, fl. 9). Em síntese, defende que há vício formal na utilização de Nota Técnica para o estabelecimento da proporção de 3,73 médicos por mil habitantes (média dos países da OCDE) como critério objetivo para a aferição da relevância e necessidade social da oferta de curso de Medicina, notadamente porque, no entender da autora, tal prática contraria o disposto no artigo 103 da Portaria Normativa MEC nº 23/2017. Pois bem. No entender deste Juízo, razão não assiste à parte autora. O artigo 103 da Portaria Normativa MEC nº 23/2017 tem o seguinte teor: Art. 103. A SERES editará normativo específico dispondo acerca do padrão decisório para a análise dos processos previstos nesta Portaria. Em primeiro lugar, ao estabelecer que o padrão decisório será estabelecido em “normativo específico”, a aludida Portaria não especificou o tipo de ato que deveria ser utilizado. Dentro das espécies de atos normativos admitidos no ordenamento jurídico brasileiro, cumpre rememorar que os atos normativos secundários são aqueles que têm a função de buscar uma observância isonômica da aplicação da lei por parte das autoridades administrativas, não podendo inovar, restringir ou ampliar o alcance dos dispositivos legais que lhes dão base, exatamente por conta da sua hierarquia infralegal. Tais atos são oriundos do chamado poder normativo da Administração Pública. Confira-se doutrina tradicional a respeito: "O poder regulamentar não é poder legislativo, por conseguinte não pode criar normatividade que inove a ordem jurídica” (SILVA, José Afonso da. Comentário contextual à Constituição. 7.ed. São Paulo: Malheiros, 2010, p. 490). A Nota Técnica, segundo definição contida no sítio eletrônico do Governo Federal, “é um documento elaborado por técnicos especializados em determinado assunto e difere do Parecer pela análise completa de todo o contexto, devendo conter histórico e fundamento legal, baseados em informações relevantes” (fonte: https://www.gov.br/mj/pt-br/assuntos/seus-direitos/consumidor/notas-tecnicas/notas-tecnicas). Ademais, dentre as suas aplicações, as Notas Técnicas podem servir como espécie de “considerandos” integrantes de outro ato normativo-administrativo de maior densidade, assumindo a mesma força normativa deste exatamente porque o integra como elemento determinante da sua interpretação e aplicação. O Egrégio Superior Tribunal de Justiça tem diversos julgados que elencam exemplificativamente as espécies de atos normativos secundários, incluindo dentre eles as Notas Técnicas, confira-se: CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. COMPETÊNCIA. CONEXÃO. ANÁLISE DE NORMAS DO REGIMENTO INTERNO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO. IMPOSSIBILIDADE, EM RECURSO ESPECIAL. AGRAVO INTERNO IMPROVIDO. 1. O Recurso Especial não constitui, como regra, via adequada para julgamento de ofensa a atos normativos secundários produzidos por autoridades administrativas, quando analisados isoladamente - sem vinculação direta ou indireta a dispositivos legais federais -, tais como resoluções, circulares, portarias, instruções normativas, atos declaratórios da SRF, provimentos das autarquias, regimentos internos de Tribunais, enunciado de súmula (cf. Súmula 518/STJ) ou notas técnicas. 2. Não apresentação pela parte agravante de argumentos novos capazes de infirmar os fundamentos que alicerçaram a decisão agravada. 3. AGRAVO INTERNO IMPROVIDO. (STJ - AgInt no AREsp: 1827564 SP 2021/0021154-1, Relator.: Ministro AFRÂNIO VILELA, Data de Julgamento: 26/02/2024, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 29/02/2024) PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. ATO INFRALEGAL. DESCABIMENTO. 1. O apelo nobre não constitui, como regra, via adequada para julgamento de ofensa a atos normativos secundários produzidos por autoridades administrativas, quando analisados isoladamente - sem vinculação direta ou indireta a dispositivos legais federais -, tais como resoluções, circulares, portarias, instruções normativas, atos declaratórios da SRF, provimentos das autarquias, regimentos internos de Tribunais, enunciado de súmula ou notas técnicas. 2. Agravo interno desprovido. (STJ - AgInt no REsp: 1925292 RS 2021/0061129-3, Relator.: Ministro GURGEL DE FARIA, Data de Julgamento: 08/09/2021, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 14/09/2021) Portanto, em tese, as Notas Técnicas podem ser admitidas como espécie de ato normativo secundário, atendendo ao comando genérico - “normativo específico” – contido no artigo 103 da Portaria Normativa MEC nº 23/2017. Registre-se que a Nota Informativa nº 22/2024, por sua vez, somente reproduz o teor da Nota Técnica nº 81/2023, servindo apenas para informar os critérios aos pretensos postulantes da oferta de curso de medicina, motivo pelo qual o reconhecimento da regularidade formal da Nota Técnica nº 81/2023 é suficiente para afastar a alegação de vício formal suscitada pela parte autora. Em segundo lugar, quando o artigo 103 da Portaria Normativa MEC nº 23/2017 assevera que “A SERES editará normativo específico dispondo acerca do padrão decisório para a análise dos processos previstos nesta Portaria”, percebe-se que o seu alcance é limitado. Em relação à regulamentação dos processos administrativos instaurados por força de decisão judicial e decorrentes da modulação de efeitos, a decisão tomada pelo Supremo Tribunal Federal na ADC nº 81 forneceu diretamente o fundamento de validade e o substrato jurídico para a produção dos atos normativos e administrativos na seara específica da oferta de curso de medicina. Nesse sentido, confira-se ilustrativo trecho do voto do Eminente Ministro Gilmar Mendes, relator da ADC nº 81, proferido no julgamento virtual dos embargos declaratórios iniciado em 21/03/2025 (Id 365580053): [...] Fixadas essas premissas, tenho que, a despeito das alegações veiculadas, o Ministério da Educação tem se atido ao comando contido na medida cautelar referendado pelo Plenário em sede de apreciação meritória. No particular, registro que, após a decisão que densificou as determinações do provimento acautelatório, o Ministério da Educação erigiu novo padrão decisório para dar efetividade aos comandos provenientes das decisões proferidas nestes autos, o que se consubstanciou na edição da Portaria 531/2023. Nas palavras da própria União: “antes da decisão cautelar na ADC 81, a administração pública encontrava dificuldade na apreciação e julgamento porquanto não existia claramente identificado o padrão legal a ser observado pelo administrador para a apreciação e julgamento desses casos, haja vista que as decisões judiciais das instâncias inferiores, seja parcialmente ou não, afastavam as normas da política pública em vigor. O padrão de atuação somente foi passível de clara identificação após a decisão cautelar na ADC 81. Isso porque, conforme referido, além de se declarar a constitucionalidade da política pública, especialmente do artigo 3º da Lei 12.871/2013, impôs-se a observância das disposições contidas nos §§ 1º, 2º e 7º da Lei 12.871/2013 e, portanto, estabeleceu-se o padrão de legalidade necessário para a atuação do administrador.” (eDOC 501, p. 11) Por meio da Portaria 531/2023, restou estabelecido procedimento administrativo voltado a propiciar o exame, em cada caso concreto, do preenchimento dos requisitos contidos nos §§ 1º, 2º e 7º do art. 3º da Lei 12.871/2013, assegurados mecanismos de observância ao contraditório e à razoável duração do processo. Prosseguindo no seu voto, o Eminente Ministro Relator fez expressa menção à Nota Técnica nº 81/2023 sem atribuir-lhe nenhuma mácula, reconhecendo a legitimidade da adoção do parâmetro da média de médicos por mil habitantes nos países da OCDE (3,73), confira-se (Id 365580053): “[...] Além disso, a própria Nota Técnica 81/2023, que acompanha a notificação remetida às instituições de ensino e efetivamente prevê o critério da concentração, no âmbito do município, de médico por habitante inferior à média dos países da OCDE, é clara ao preceituar que igualmente deveriam ser pré-selecionados “todos aqueles municípios que integram as regiões de saúde pré-selecionadas no Edital nº 01, de 2023”, de modo que “os pedidos de abertura de novos cursos de Medicina e de aumento de vagas poderão ser aprovados se estiverem em regiões de saúde pré-selecionadas no Edital nº 01, de 4 de outubro de 2023 ou em municípios cuja concentração de médico por habitante” (grifo nosso). Ou seja, não procedem as alegações de que o MEC estaria desconsiderando o critério da região de saúde no momento de aferição de interesse social na oferta de novas vagas em cursos de medicina. Como revela o exame da Nota Técnica 81/2023, a concentração, no âmbito do município, de médico por habitante inferior à média dos países da OCDE é critério de pré-seleção que somente é utilizado quando a pretensão de abertura de novas vagas não se encontra em “ regiões de saúde pré-selecionadas no Edital nº 01, de 2023”. Isto é, o critério primário considerado pelo MEC para estruturação da política pública é mesmo o da região de saúde. A concentração de médico por habitante inferior à média dos países da OCDE surge somente como critério se a pretensão de abertura de novas vagas não estiver localizada em qualquer das regiões de saúde contempladas pelo Edital 1/2023 – possibilidade, aliás, que somente é facultada às instituições de ensinos abarcadas pelo Item 2 da parte final da deliberação embargada. Nada obstante, ressalto que a utilização da concentração, no âmbito do município, de médico por habitante inferior à média dos países da OCDE como critério auxiliar para fins de aferição de relevância e necessidade social na oferta de novas vagas em cursos de medicina não configura comportamento a priori inadequado por parte do Ministério da Educação. Pelo contrário, trata-se de índice, ao que tudo indica, apropriado para ser utilizado a título de parâmetro. É certo que os atos normativos administrativos podem encontrar seu fundamento de validade diretamente nas decisões da Corte Suprema dotadas de eficácia vinculativa erga omnes, conforme dispõe o § 2º do artigo 102 da Constituição Federal: Art. 102. [...] § 2º As decisões definitivas de mérito, proferidas pelo Supremo Tribunal Federal, nas ações diretas de inconstitucionalidade e nas ações declaratórias de constitucionalidade produzirão eficácia contra todos e efeito vinculante, relativamente aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal. Bem por isso, no caso dos autos, conforme reconhecido no supracitado voto do Eminente Ministro Relator, a fim de dar efetividade à Lei 12.871/2013 e às determinações oriundas da medida cautelar e da modulação de efeitos determinadas pelo Supremo Tribunal Federal no bojo da ADC nº 81, o Poder Executivo Federal editou a Portaria SERES/MEC nº 531, de 23 de dezembro de 2023, que “Dispõe sobre o padrão decisório para o processamento de pedidos de autorização de novos cursos de Medicina e de aumento de vagas em cursos de Medicina já existentes, instaurados por força de decisão judicial, nos termos determinados pela Medida Cautelar na Ação Declaratória de Constitucionalidade 81/DF” (id. 332803729). O inciso I do art. 2º da referida Portaria exige a demonstração da relevância social e necessidade social da oferta de curso de Medicina. Nesse tocante, a Nota Técnica nº 81/2023/CGLNRS/GAB/SERES, que embasou e integrou a minuta da Portaria SERES/MEC nº 531/2023, consignou que devem ser admitidos os Municípios cuja concentração de médico por mil habitantes seja inferior a 3,73 (média dos países da OCDE), confira-se (Id 332803719): [...] 1. ASSUNTO 1.1. Minuta de portaria que dispõe sobre o padrão decisório para o processamento de pedidos de autorização de novos cursos de Medicina e de aumento de vagas em cursos de Medicina já existentes, instaurados por força de decisão judicial, nos termos determinados pela Medida Cautelar na Ação Declaratória de Constitucionalidade 81/DF e revoga a Portaria SERES/MEC nº 397, de 20 de outubro de 2023 e a Portaria SERES/MEC nº 421, de 3 de novembro de 2023. [...] 4. ANÁLISE [...] 4.5. A Lei nº 12.871/2013 estabelece que deverão ser instalados cursos em locais em que se constata "relevância e necessidade social". 4.6. A norma, de natureza genérica, demanda ao Ministério da Educação a definição de critérios objetivos que especifiquem o seu sendo, fixando com clareza quais serão as razões pelas quais determinado conjunto de municípios é considerado apto a receber a instalação de novo curso ou aumento de vagas de cursos já instalados. 4.7. Para isso, e com a finalidade de conferir uniformidade à política pública adotada relava ao programa Mais Médicas, resgata-se a Nota Técnica Conjunta nº 3/2023/DPR/SERES/SERES (Doc. SEI nº 4360961), elaborada em conjunto pelo Ministério da Educação, pelo Ministério do Planejamento e Orçamento e pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicadas relava ao edital de chamamento público para a seleção de propostas para autorização de funcionamento de novos cursos de graduação em Medicina, no âmbito da Lei do Mais Médicos e da Portaria nº 650/2023. 4.8. Na referida Nota Técnica, é evidenciado que o lançado edital de chamada pública para seleção de propostas para autorização de funcionamento de cursos de medicina no âmbito do programa Mais Médicos (Edital nº 01, de 4 de outubro de 2023) foi elaborado com o propósito de que os municípios brasileiros alcancem, até 2033, a média observada em 2022 para países da OCDE de 3,73 profissionais de Medicina por mil habitantes: 3.3.5. Tendo todos esses pontos em perspectiva, buscou-se estimar quantas novas vagas em cursos de graduação em Medicina seriam necessárias nos próximos anos para que o Brasil tendesse a convergir, até por volta de 2033, à média observada em 2022 para a OCDE, que foi de 3,73 profissionais de Medicina por mil habitantes. Para essa simulação projetou-se para o futuro um fluxo base de entrada de novos e novas profissionais de Medicina equivalente à média observada entre 2019 e 2021, segundo esmavas de Scheffer et. al. (2023, p.37) – o que equivale a 21,304 profissionais adicionais por ano. Estimou-se um fluxo base de saída da mesma forma – chegando a uma saída de anual de profissionais equivalente a 1,718. O fluxo base de entrada foi ainda acrescido de: (i) 1.400 profissionais/ano adicionais a partir de 2024, referentes à expansão de cursos dada pelo último edital do Mias Médicos, lançado em 2017); e (ii) 1.100 profissionais/ano adicionais a partir de 2025, referentes a vagas abertas nos últimos anos por meio dos processos de judicialização. 4.9. Diante disso, propõe que sejam pré-selecionados todos os municípios cuja concentração de médico por habitante seja inferior a 3,73, já que esta é a meta do Edital nº 01, de 2023 e, consequentemente, um padrão que pode ser observado também aos pedidos protocolos por decisão judicial em tramitação no MEC, reforçando a coerência com a expansão de vagas de Medicina no sistema da educação superior brasileira. 4.10. Em complemento, e também com a finalidade de preservar a coerência da política, sugere-se a inclusão neste pré-seleção de todos aqueles municípios que integram as regiões de saúde pré-selecionadas no Edital nº 01, de 2023. 4.11. Isto posto, para fins de atendimento ao art. 3º, §1º, da Lei nº 12.871/2013, os pedidos de abertura de novos cursos de Medicina e de aumento de vagas poderão ser aprovados se estiverem em regiões de saúde pré-selecionadas no Edital nº 01, de 4 de outubro de 2023 ou em municípios cuja concentração de médico por habitante seja inferior a 3,73. Ato contínuo, foi editada a Nota Informativa nº 22/2024/CGLNRS/GAB/SERES/MEC para prestar “Esclarecimentos acerca do procedimento e fluxos adotados pelo Ministério da Educação para implementação da Portaria SERES/MEC nº 531, de 22 de dezembro de 2023” (id. 332803720). Confiram-se os trechos que interessam à presente ação (Id 332803720): Da evolução normativa acima destacada e da leitura do voto Eminente Ministro Gilmar Mendes (Relator da ADC nº 81), resta evidente que a fixação do parâmetro de aferição da relevância e necessidade social da oferta de curso de medicina - concentração de médico por mil habitantes inferior à média dos países da OCDE (3,73) -, não foi fruto de inovação no ordenamento jurídico, tampouco contrariou ou suprimiu o alcance dos atos normativos primários ou da decisão do Supremo Tribunal Federal que lhe deram base. Com efeito, a Nota Técnica nº 81/2023, que amparou a minuta da Portaria SERES/MEC nº 531/2023 e que foi reproduzida pela Nota Informativa nº 22/2024, adotou a mesma linha jurídica que foi (i) utilizada na exposição de motivos da Medida Provisória nº 621/2013, posteriormente convertida na Lei nº 12.871/2013; (ii) validada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento da ADC nº 81; e (iii) adotada pelo Edital de Chamamento Público nº 01/2023 para oferta de cursos de medicina no Brasil. A exposição de motivos da Medida Provisória nº 621/2013, posteriormente convertida na Lei nº 12.871/2013, embora sem cravar uma proporção específica de densidade médica ideal (há 10 anos vivíamos outro contexto fático), fundou-se essencialmente no comparativo da realidade brasileira com a situação de diversos países, vários deles integrantes da OCDE, tomando-os como parâmetro para a formulação da política pública de equalização do quantitativo de médicos no Brasil, confira-se: 11. O Brasil possui 359.691 médicos ativos e apresenta uma proporção de 1,8 médicos para cada 1.000 (mil) habitantes, conforme dados primários obtidos no Conselho Federal de Medicina (CFM) e na estimativa populacional do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). 12. A proporção de médico/1.000 habitantes constatada no Brasil é menor do que em outros países latino-americanos com perfil socioeconômico semelhante ou países que têm sistemas universais de saúde, a saber: Canadá 2,0; Reino Unido 2,7; Argentina 3,2; Uruguai 3,7; Portugal 3,9; Espanha 4,0 e Cuba 6,7 (Estadísticas Sanitarias Mundiales de 2011 e 2012 – Organização Mundial da Saúde – OMS). [...] 37. Ressalte-se que tais medidas não são dotadas de ineditismo, pois diversos países já as adotaram, a exemplo de Reino Unido, Canadá e Austrália. 38. Mesmo países com indicadores de relação médico/habitante superiores a do Brasil recorreram a programas de recrutamento de médicos estrangeiros para garantir o acesso ao sistema de saúde, geralmente com enfoque em áreas remotas. Dados apresentados pela Organisation for Economic Co-operation and Development – OECD, em 2009, e pelo General Medical Council do Reino Unido, em 2011, demonstram as seguintes proporções de médicos estrangeiros nos respectivos países: 37% no Reino Unido; 25,9% nos Estados Unidos; 22,8% na Austrália e 17,9% no Canadá. Por sua vez, mais recentemente, o próprio Supremo Tribunal Federal se baseou em diversas estudos e dados envolvendo os países da OCDE para, no julgamento da ADC nº 81, declarar a constitucionalidade do art. 3º da Lei nº 12.871/2013. A título de ilustração, confira-se o voto-condutor elaborado pelo Eminente Ministro Gilmar Mendes na ADC nº 81: [...] 52. No contexto mundial, o relatório “Health at a Glance 2023: OECD Indicators” (em tradução livre: Saúde em resumo 2023: indicadores da OCDE) expõe o cenário atual do problema da seguinte forma: “O acesso aos cuidados médicos requer um número suficiente e adequadamente distribuído de médicos em todas as partes do país. Uma escassez de médicos em algumas regiões pode levar a desigualdades no acesso a cuidados e necessidades não satisfeitas. Dificuldades em recrutar e reter médicos em certas regiões tem sido uma questão política importante em muitos países da OCDE há muito tempo, especialmente em países com áreas remotas e escassamente povoadas. O número total de médicos por 1 000 habitantes varia amplamente nos países da OCDE, de 2,5 ou menos na Turquia, Colômbia e México para mais de 5 na Grécia, Portugal, Áustria e Noruega (ver secção ‘Médicos (número global)’). Além destas diferenças entre países, o número de médicos por 1000 habitantes também varia frequentemente muito entre regiões dentro de cada país. A densidade de médicos é geralmente maior nas regiões metropolitanas, refletindo a concentração de serviços especializados, como cirurgia e médicos preferências para praticar em áreas densamente povoadas. Em 2021, disparidades na densidade de médicos entre regiões metropolitanas e regiões remotas foram mais elevados na Lituânia, na Letônia e no República Eslovaca. A distribuição foi mais igualitária na Noruega e Suécia. No Japão, havia mais médicos por população fora das áreas metropolitanas, embora o número de médicos em todas as regiões foi inferior à média da OCDE (Figura 8.9). Em muitos países, existe uma concentração particularmente elevada de médicos nas regiões das capitais nacionais (Figura 8.10). Isto é o caso, nomeadamente na Áustria, na República Checa, na Dinamarca, Grécia, Hungria, Portugal, República Eslovaca e Estados Unidos. Os médicos podem relutar em exercer a profissão em regiões rurais devido a preocupações sobre sua vida profissional (incluindo sua renda, jornada de trabalho, oportunidades de desenvolvimento de carreira e isolamento dos colegas) e comodidades sociais (como educação opções para seus filhos e oportunidades profissionais para seus parceiros). Uma série de alavancas políticas podem ser usadas para influenciar a escolha do local de prática dos médicos, incluindo: 1) fornecer incentivos financeiros para os médicos trabalharem em áreas mal servidas; 2) aumentar as matrículas em medicina programas de educação de estudantes de áreas carentes ou caso contrário, descentralizar a localização das escolas médicas; 3) regulamentar a escolha do local de atuação dos médicos (para novos graduados em medicina ou médicos com formação estrangeira que chegam ao país); e 4) reorganizar a prestação de serviços para melhorar a condições de trabalho dos médicos em áreas desfavorecidas (OCDE, 2016[1]). Os desenvolvimentos na telemedicina também podem ajudar superar barreiras geográficas entre pacientes e médicos (ver seção sobre ‘Saúde digital’ no Capítulo 5). [...] 53. Retornando ao contexto nacional, é pertinente observar as seguintes considerações feitas no bojo do já citado Estudo da OCDE da Atenção Primária à Saúde no Brasil acerca da necessidade de realização de ajustes especificamente no Programa Mais Médicos: “Pode ser necessário melhorar os métodos de direcionamento da comunidade utilizados pelo PMM para maximizar os benefícios potenciais do Programa. Conforme experimentado por outros países da OCDE (Estados Unidos, Austrália e Canadá), o método de focalização na comunidade tem grandes implicações para o planejamento de recursos humanos, e isso pode não ser suficientemente reconhecido no Brasil. Na Austrália, por exemplo, comunidades com escassez de médicos são designadas como ‘Áreas Prioritárias de Distribuição’ (em inglês, Distribution Priority Areas, ou DPA) com base em seu status demográfico, socioeconômico, tamanho da população e medidas de distância geográfica. Os médicos de clínica geral formados no estrangeiro têm de trabalhar pelo menos 10 anos em comunidades com a designação DPA. No Canadá, os critérios usados para definir comunidades carentes de serviços consideram as relações entre médicos e população, status demográfico e socioeconômico e acessibilidade geográfica. Nos Estados Unidos, a designação da área de escassez de profissionais de saúde é determinada com base em pontuação composta, calculada a partir da combinação da densidade de prestadores de serviços de saúde, nível de pobreza, taxa de mortalidade infantil e a estrutura de idade de cada comunidade.” Também compondo as razões do acórdão da ADC nº 81, confira-se a manifestação categórica do Eminente Ministro Alexandre de Moraes no sentido de que “A média de médicos por habitantes registrada nos países da OCDE se mostra adequada à formatação de uma política pública que visa a enfrentar um cenário de escassez de profissionais disponíveis”. Leia-se trecho do voto: [...] Cenários complexos e multicausais reclamam abordagens estruturadas no enfrentamento de um problema não elimina a necessidade de soluções alternativas e/ou complementares. O oferecimento de novas vagas de ensino superior, direcionadas a municípios com maior necessidade, ainda que não seja uma solução decisiva para a oferta de serviços de saúde, coopera positivamente para a melhora do quadro de desigualdade geográfica. A média de médicos por habitantes registrada nos países da OCDE se mostra adequada à formatação de uma política pública que visa a enfrentar um cenário de escassez de profissionais disponíveis. O Estudo da OCDE sobre política de saúde pública no Brasil (OECD, 2021, Estudo da OCDE da Atenção Primária à Saúde no Brasil, OECD Publishing), já referido pelos votos que me antecederam, expressamente refere a um problema de escassez de médicos, sem ignorar a questão da distribuição geográfica. Portanto, não há dúvida de que tanto a edição da Lei nº 12.871/2013 como a sua posterior validação pelo Supremo Tribunal Federal se deram essencialmente com base na análise comparativa de estudos e dados envolvendo países da OCDE, especialmente no tocante à avaliação do contexto de escassez e má distribuição de médicos no país, de modo a permitir a elaboração e execução de uma política pública de direcionamento dos novos cursos de medicina para localidades realmente necessitadas, mediante aplicação do critério da relevância e necessidade social. Portanto, os atos normativos e administrativos editados pelo Poder Executivo Federal logo depois do deferimento da medida liminar (07/08/2023), pelo Ministro Relator Gilmar Mendes, nos autos do julgamento da ADC nº 81, não poderiam se distanciar – e efetivamente não se distanciaram - dessas premissas que embasaram a edição da Lei nº 12.871/2013 e a sua posterior validação pelo Supremo Tribunal Federal. Nesse contexto, logo após a decisão do Ministro Gilmar Mendes, que concedeu a medida liminar em 07/08/2023, sobrevieram, no que importa à presente ação, os seguintes atos do Poder Executivo: I) Lançamento do Edital nº 01 de 04/10/2023 (Chamada Pública para seleção de propostas para autorização de funcionamento de cursos de medicina no âmbito do programa mais médicos), embasado nos subsídios da Nota Técnica Conjunta nº 3/2023/DPR/SERES de 03/10/2023; e II) Edição da Portaria SERES/MEC nº 531 de 22/12/2023, embasada nos subsídios da Nota Técnica nº 81 CGLNRS/GAB/SERES de 22/12/2023, com posteriores esclarecimentos prestados pela Nota Informativa nº 22 CGLNRS/GAB/SERES de 07/06/2024. O Edital nº 01/2013, com base nos subsídios da Nota Técnica Conjunta nº 3/2023/DPR/SERES de 03/10/2023, aderiu à média de médicos por mil habitantes dos países da OCDE (3,73), confira-se: [...] 3.3.1. O primeiro parâmetro acordado para a definição de novas vagas a serem distribuídas por editais de chamamento público e por pedidos de aumento de vagas para cursos de graduação em Medicina foi a média observada nos países-membros da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico – OCDE para a quantidade de profissionais de Medicina para cada mil habitantes. 3.3.2. O entendimento conjunto da Seres/MEC e dos órgãos do Ministério do Planejamento e Orçamento envolvidos neste trabalho foi que a convergência para a média da OCDE nesse quesito era uma meta plausível e pertinente de ser perseguida no horizonte de aproximadamente uma década. 3.3.3. Estabeleceu-se, então, a média verificada em 2022 para países-membros da OCDE como algo a ser almejado pelo Brasil para 2033 (dez anos após a retomada que ora se inicia da política guiada pela Lei do Mais Médicos), embora os dados disponíveis apontem para cautela no ritmo de expansão do sistema de formação médica no Brasil, particularmente devido a três pontos: [...] 3.3.5. Tendo todos esses pontos em perspectiva, buscou-se estimar quantas novas vagas em cursos de graduação em Medicina seriam necessárias nos próximos anos para que o Brasil tendesse a convergir, até por volta de 2033, à média observada em 2022 para a OCDE, que foi de 3,73 profissionais de Medicina por mil habitantes. Para essa simulação projetou-se para o futuro um fluxo base de entrada de novos e novas profissionais de Medicina equivalente à média observada entre 2019 e 2021, segundo estimativas de Scheffer et. al. (2023, p.37) – o que equivale a 21,304 profissionais adicionais por ano. Estimou-se um fluxo base de saída da mesma forma – chegando a uma saída de anual de profissionais equivalente a 1,718. O fluxo base de entrada foi ainda acrescido de: (i) 1.400 profissionais/ano adicionais a partir de 2024, referentes à expansão de cursos dada pelo último edital do Mias Médicos, lançado em 2017); e (ii) 1.100 profissionais/ano adicionais a partir de 2025, referentes a vagas abertas nos últimos anos por meio dos processos de judicialização. Assim, está evidenciado que a Portaria SERES/MEC nº 531 de 22/12/2023, a Nota Técnica nº 81 CGLNRS/GAB/SERES de 22/12/2023 e a Nota Informativa nº 22 CGLNRS/GAB/SERES de 07/06/2024, no que tange à adoção da média de médicos por mil habitantes registrada nos países da OCDE (3,73) para a aferição do critério da relevância e necessidade social, não promoveram nenhuma inovação no ordenamento jurídico, funcionando, em verdade, como mecanismos de elucidação e especificação dos parâmetros normativos já conhecidos e validados pela Corte Suprema em sede de controle concentrado de constitucionalidade, tudo com o objetivo de nortear a atuação das autoridades administrativas e de conferir maior transparência e segurança jurídica em favor das Instituições interessadas em pleitear autorização de oferta de curso de medicina. Em termos de organicidade e coerência da política pública em debate, soaria estranho admitir que, para os processos administrativos que prosseguiram por força decisão judicial e em razão da modulação de efeitos operada na ADC nº 81, houvesse a fixação de um parâmetro distinto daquele que vem norteando a oferta de cursos de medicina no Brasil. Nesse contexto, rejeito a alegação de ocorrência de vício formal na fixação do parâmetro de aferição da relevância e necessidade social da oferta de curso de Medicina. VI – Da (i)legalidade material do parâmetro adotado para a aferição da relevância e necessidade social da oferta de curso de Medicina (a) Da alegada desconsideração dos dados mínimos de avaliação da necessidade social De acordo com a parte autora, a Lei nº 12.871/2013 “[...] evidencia que a análise não é simples, pois no Art. 3º, § 7º, II, estabelece uma lista de 3 dados mínimos a serem avaliados: [...] a) relação número de habitantes por número de profissionais no Município em que é ministrado o curso e nos Municípios de seu entorno; b) descrição da rede de cursos análogos de nível superior, públicos e privados, de serviços de saúde, ambulatoriais e hospitalares e de programas de residência em funcionamento na região; c) inserção do curso em programa de extensão que atenda a população carente da cidade e da região em que a instituição se localiza. Ao contrário que a Lei acima prevê, a Nota Técnica nº 81/2023/CGLNRS/GAB/SERES/SERES prevê 1 único indicador: o número de médicos por habitantes, desprezando a análise das redes de educação (2) e saúde e dos programas de extensão que atenderão a população (3)” (Id 332802940, fl. 7). Sem razão à parte autora. Os parágrafos § 1º e § 7º, inciso II, do artigo 3º da Lei nº 12.871/2013, preconizam os seguintes indicadores atinentes à verificação da necessidade social da oferta do curso de medicina: Art. 3º [...] I - pré-seleção dos Municípios para a autorização de funcionamento de cursos de Medicina, ouvido o Ministério da Saúde; [...] § 1º Na pré-seleção dos Municípios de que trata o inciso I do caput deste artigo, deverão ser consideradas, no âmbito da região de saúde: I - a relevância e a necessidade social da oferta de curso de Medicina; e II - a existência, nas redes de atenção à saúde do SUS, de equipamentos públicos adequados e suficientes para a oferta do curso de Medicina, incluindo, no mínimo, os seguintes serviços, ações e programas: a) atenção básica; b) urgência e emergência; c) atenção psicossocial; d) atenção ambulatorial especializada e hospitalar; e e) vigilância em saúde. [...] § 7º A autorização e a renovação de autorização para funcionamento de cursos de graduação em Medicina deverão considerar, sem prejuízo de outras exigências estabelecidas no Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (Sinaes): [...] II - a necessidade social do curso para a cidade e para a região em que se localiza, demonstrada por indicadores demográficos, sociais, econômicos e concernentes à oferta de serviços de saúde, incluindo dados relativos à: a) relação número de habitantes por número de profissionais no Município em que é ministrado o curso e nos Municípios de seu entorno; b) descrição da rede de cursos análogos de nível superior, públicos e privados, de serviços de saúde, ambulatoriais e hospitalares e de programas de residência em funcionamento na região; c) inserção do curso em programa de extensão que atenda a população carente da cidade e da região em que a instituição se localiza. Note-se que o § 1º e o § 7º regulam situações distintas. Enquanto § 1º estabelece os critérios para a pré-seleção dos Municípios que poderão ser contemplados com a oferta de curso de medicina, o § 7º, por sua vez, trata de fase posterior, passando a fixar os requisitos necessários para a própria autorização pleiteada por Instituição de Ensino para oferta de curso de Medicina em determinado Município contemplado na fase anterior da pré-seleção. A Nota Técnica nº 81/2023 diz respeito somente aos critérios para pré-seleção de Municípios, em atenção ao disposto no § 1º do art. 3º da Lei nº 12.871/2013, não mencionando o § 7º, confira-se o teor do seu item 4.11: 4.11. Isto posto, para fins de atendimento ao art. 3º, §1º, da Lei nº 12.871/2013, os pedidos de abertura de novos cursos de Medicina e de aumento de vagas poderão ser aprovados se estiverem em regiões de saúde pré-selecionadas no Edital nº 01, de 4 de outubro de 2023 ou em municípios cuja concentração de médico por habitante seja inferior a 3,73. Por outro lado, os indicadores que a parte autora alegou que foram desconsiderados pela referida Nota Técnica estão previstos apenas no § 7º do art. 3º da Lei nº 12.871/2013, confira-se novamente a exordial: “[...] Esta Lei evidencia que a análise não é simples, no Art. 3º, § 7º, II, estabelece uma lista de 3 dados mínimos a serem avaliados: [...] a) relação número de habitantes por número de profissionais no Município em que é ministrado o curso e nos Municípios de seu entorno; b) descrição da rede de cursos análogos de nível superior, públicos e privados, de serviços de saúde, ambulatoriais e hospitalares e de programas de residência em funcionamento na região; c) inserção do curso em programa de extensão que atenda a população carente da cidade e da região em que a instituição se localiza. Ao contrário que a Lei acima prevê, a Nota Técnica nº 81/2023/CGLNRS/GAB/SERES/SERES prevê 1 único indicador: o número de médicos por habitantes, desprezando a análise das redes de educação (2) e saúde e dos programas de extensão que atenderão a população (3)” (Id 332802940, fl. 7). Nesse contexto, considerando que a Nota Técnica nº 81 CGLNRS/GAB/SERES se propôs a tratar somente da fase da pré-seleção de Municípios estabelecida no § 1º do art. 3º da Lei nº 12.871/2013, afigura-se descabido exigir que a Nota Técnica incorporasse também os indicadores do § 7º (que trata da fase posterior à pré-seleção), sendo, portanto, infundada a pretensão da parte autora nesse sentido. Registre-se, por oportuno, que os indicadores previstos no § 7º, embora não tenham sido objeto da Nota Técnica nº 81 CGLNRS/GAB/SERES – que só se referia ao § 1º -, são tratados no bojo da própria Portaria SERES/MEC nº 531/2023, e, no caso dos autos, foram devidamente considerados pelo MEC no processo administrativo instaurado pela parte autora, tendo havido análise favorável neste tocante, conforme se infere do Parecer Final da SERES/MEC (Id 332803718), já transcrito anteriormente nesta sentença. Por fim, cumpre esclarecer que a pré-seleção estipulada na Nota Técnica nº 81 CGLNRS/GAB/SERES é diferente da pré-seleção destinada à elaboração do Edital de chamamento público, pois, conforme o item “ii” da modulação de efeitos, instituiu-se uma sistemática específica para os processos administrativos pendentes na data do julgamento da ADC nº 81 e que foram instaurados por força de decisão judicial anterior, autorizando-se a dispensa do prévio chamamento público. (b) Da alegada desconsideração da situação dos “municípios de seu entorno” e da “região em que se localiza” Segundo a parte autora, a Nota Técnica nº 81 CGLNRS/GAB/SERES “[...] prevê a análise apenas do município sede do curso e, não, a avaliação do indicador ‘nos Municípios de seu entorno’ (Art. 3º, § 7º, II, a), ou seja, para a ‘região em que se localiza’ o curso (Art. 3º, § 7º, II)” (Id 332802940, fl. 7). Novamente, sem razão à autora. Essa questão foi devidamente enfrentada no voto do Eminente Ministro Gilmar Mendes, Relator da ADC nº 81, proferido no julgamento virtual dos embargos declaratórios iniciado em 21/03/2025 (Id 365580053), confira-se: [...] Quanto à irresignação acerca de uma suposta consideração, no momento da análise de interesse social na abertura de novas vagas em cursos de medicina, da concentração de médico por habitante no âmbito do município, em detrimento da concentração de médico por habitante no âmbito da região de saúde, na forma do § 1º do art. 3º da Lei 12.871/2013, também aqui não assiste razão às entidades. Sustenta-se, no particular, que o Ministério da Educação teria estabelecido “como critério para a deferimento do pedido administrativo[,] a concentração de médico por habitante NO MUNICÍPIO inferior à média dos países da OCDE (3,73) e/ou a inclusão daquele município no Edital de Chamamento Público nº 1, de 2023”, ao passo que a análise – segundo defendem as entidades – deveria se pautar na referida concentração no âmbito territorial da respectiva região de saúde, conforme estabelecido no §1º do art. 3º da Lei 12.871/2013. Sobre o tema, a Lei do Mais Médicos de fato preceitua que, na pré-seleção dos municípios que serão contemplados pelo chamamento público, deve ser considerada, “no âmbito da região de saúde”, a relevância e necessidade social da oferta de curso de medicina, (Lei 12.871/2013, art. 3º, § 1º, I). A opção legislativa se justifica pois, na maioria dos casos, a estrutura de saúde de um determinado município atende não apenas aos cidadãos da respectiva municipalidade, como também pacientes de uma área que engloba outros municípios. Nesse contexto, a opção por estruturar os serviços e ações de saúde em torno de regiões de saúde confere à administração pública o instrumental necessário para melhor orientar a tomada de decisão, considerado, sobretudo, o caráter interfederativo que orienta a gestão do SUS (Lei 8.080/1990, art. 14-A). Há de se considerar, entretanto, que o § 1º do art. 3º da Lei 12.871/2013 se refere à pré-seleção de municípios que serão contemplados por edital de chamamento público no âmbito da política pública do Mais Médicos – situação inequivocamente distinta daquela em que estão inseridas as instituições de ensinos abrangidas pela medida cautelar, cuja pretensão de oferta de novas vagas em cursos de medicina teve seu prosseguimento administrativo determinado por força de decisão judicial, a despeito da inexistência de prévio chamamento público. Para essa hipótese, como já mencionado acima, decidiu-se que “nas etapas seguintes do processo de credenciamento, as diversas instâncias técnicas convocadas a se pronunciar devem observar se o Município e o novo curso de medicina atendem integralmente aos critérios previstos nos parágrafos 1º, 2º e 7º do art. 3º da Lei 12.871/2013” (eDOC 306, p. 53 – grifo nosso). De fato, para fins de estruturação das políticas relacionadas às ações do Sistema Único de Saúde (SUS) – como é o caso da instalação de cursos de medicina –, deve ser considerado, idealmente, o critério das regiões de saúde. Nada obstante, não é possível afirmar, como fazem as entidades, que o MEC tenha deixado de considerar o critério da região de saúde no momento de aferição do interesse social na abertura/expansão de vagas pretendidas pelas instituições enquadradas no item (ii) da parte final da deliberação embargada. No ponto, as entidades se insurgem contra notificação encaminhada pela Secretaria de Regulação e Supervisão da Educação Superior (SERES/MEC) a parte das instituições de ensino abarcadas pela medida cautelar, com processo administrativo já em tramitação avançada, por meio da qual se concede o prazo de 45 (quarenta e cinco) dias para comprovação de relevância e necessidade social da pretensão de criação/ampliação de vagas em curso de medicina (eDOC 488). A notificação aludida concede à instituição de ensino a oportunidade de, in verbis: “apreciação e manifestação dessa instituição acerca da relevância e a necessidade social da oferta de curso de Medicina considerando a concentração de médico por habitante inferior à média dos países da OCDE (3,73) e/ou a inclusão daquele município no Edital de Chamamento Público nº 1, de 2023” (eDOC 489, p. 2). A notificação enviada, ao invés de descumprir, efetivamente confere execução às deliberações desta Corte, na medida em que densifica o contraditório no processo administrativo e confere à instituição de ensino a oportunidade de comprovar, por quaisquer meios de prova em direito admitidos, a relevância e a necessidade social da oferta de cursos de medicina. Não diviso, nos termos em que redigida a notificação impugnada, qualquer ofensa à sistemática da Lei 12.871/2013. O § 1º do art. 3º da Lei do Mais Médicos, como já mencionado, refere-se à pré-seleção de municípios a serem contemplados em edital de chamamento público – situação distinta da discutida pelas entidades requerentes. Além disso, a própria Nota Técnica 81/2023, que acompanha a notificação remetida às instituições de ensino e efetivamente prevê o critério da concentração, no âmbito do município, de médico por habitante inferior à média dos países da OCDE, é clara ao preceituar que igualmente deveriam ser pré-selecionados “todos aqueles municípios que integram as regiões de saúde pré-selecionadas no Edital nº 01, de 2023”, de modo que “os pedidos de abertura de novos cursos de Medicina e de aumento de vagas poderão ser aprovados se estiverem em regiões de saúde pré-selecionadas no Edital nº 01, de 4 de outubro de 2023 ou em municípios cuja concentração de médico por habitante” (grifo nosso). Ou seja, não procedem as alegações de que o MEC estaria desconsiderando o critério da região de saúde no momento de aferição de interesse social na oferta de novas vagas em cursos de medicina. Como revela o exame da Nota Técnica 81/2023, a concentração, no âmbito do município, de médico por habitante inferior à média dos países da OCDE é critério de pré-seleção que somente é utilizado quando a pretensão de abertura de novas vagas não se encontra em “regiões de saúde pré-selecionadas no Edital nº 01, de 2023”. Isto é, o critério primário considerado pelo MEC para estruturação da política pública é mesmo o da região de saúde. A concentração de médico por habitante inferior à média dos países da OCDE surge somente como critério se a pretensão de abertura de novas vagas não estiver localizada em qualquer das regiões de saúde contempladas pelo Edital 1/2023 – possibilidade, aliás, que somente é facultada às instituições de ensinos abarcadas pelo Item 2 da parte final da deliberação embargada. Nada obstante, ressalto que a utilização da concentração, no âmbito do município, de médico por habitante inferior à média dos países da OCDE como critério auxiliar para fins de aferição de relevância e necessidade social na oferta de novas vagas em cursos de medicina não configura comportamento a priori inadequado por parte do Ministério da Educação. Pelo contrário, trata-se de índice, ao que tudo indica, apropriado para ser utilizado a título de parâmetro. [...] Assim sendo, uma vez que a concentração de médico por habitante do Brasil como um todo (2,41 em 2022; 2,60 em 2023) é consideravelmente inferior à média dos países da OCDE (3,73), e considerada igualmente a notória desigualdade na distribuição geográfica desses profissionais, com grande concentração nas capitais e grandes centros, pode-se afirmar que a maioria dos municípios brasileiros atenderá ao critério aludido, de modo que a metodologia auxiliar adotada pelo Ministério da Educação, longe de excessivamente restritiva, se mostra proporcional e razoável, não se justificando a realização de qualquer reprimenda ou reparo a nível de controle objetivo de constitucionalidade da política pública. Eventual acolhimento da pretensão das entidades requerentes, por outro lado, é que se mostra potencialmente atentatório aos propósitos da Lei 12.871/2013 e das deliberações emanadas destes autos. Isso porque, considerada a baixa concentração de médico por habitante a nível nacional, é razoável supor que pouquíssimas regiões de saúde (em número ainda menor que os municípios), apresentarão concentração superior à média dos países da OCDE, o que faria letra morta da determinação contida no provimento acautelatório de aferição concreta de eventual relevância e necessidade social na oferta de novas vagas em cursos de medicina (praticamente todos os pedidos atenderiam ao parâmetro pretendido). Adoto integralmente as razões supratranscritas, pois, de fato, não há qualquer ilegalidade material na sistemática adotada pelo MEC. Cumpre enfatizar que a Nota Técnica nº 81/2023, ao prever a verificação do número de médicos por mil habitantes pela média da OCDE no âmbito do Município, não deixou de preceituar que igualmente deveriam ser pré-selecionados “todos aqueles municípios que integram as regiões de saúde pré-selecionadas no Edital nº 01, de 2023”, de modo que “os pedidos de abertura de novos cursos de Medicina e de aumento de vagas poderão ser aprovados se estiverem em regiões de saúde pré-selecionadas no Edital nº 01, de 4 de outubro de 2023 ou em municípios cuja concentração de médico por habitante”. No caso, considerando as regiões de saúde contempladas no Edital de Chamamento nº 01/2023, o Parecer Final da SERES/MEC atestou que “[...] São Carlos/SP, não está inserida nos municípios constantes no Edital de Chamamento Público nº 1, de 2023” (Id 332803718, fl. 17). De fato, é o que se extrai do anexo I do Edital nº 01/2023, já colacionado anteriormente, que informa as regiões selecionadas no Estado de São Paulo e revela que o Município de São Carlos/SP não foi contemplado em nenhuma delas (Id 344732464, fl. 89 a 93). Portanto, pelos critérios de avaliação da região de saúde que embasaram a confecção do Edital nº 01/2023, o Município de São Carlos/SP não foi qualificado como apto para a oferta de curso de medicina. Conclui-se, portanto, que não houve desconsideração da “região de saúde” e dos “municípios do entorno” no momento da estipulação dos critérios de aferição da relevância e do interesse social na oferta de cursos de medicina (Portaria MEC 531/2023 e Nota Técnica nº 81/2023), não havendo que se falar em afronta à Lei nº 12.871/2013 e nem à decisão do Supremo Tribunal Federal na ADC nº 81. VII – Da alegada falta de razoabilidade e proporcionalidade da densidade médica como critério único A parte autora defende que é equivocada a adoção da densidade médica (número de médicos por mil habitantes) como indicador decisivo para políticas públicas. Aponta também que inexiste uma proporção ideal validada internacionalmente e que é indevida a utilização do valor de referência baseado na média dos países da OCDE – 3,73. Por fim, aduz que o sistema do SUS é pautado na regionalidade (integrado por regiões), motivo pelo qual o uso de dados isolados de um Município gera uma grande distorção, exemplificando que muitas cidades com mais de 3,73 médicos por mil habitantes estão incluídas no edital de chamamento. Mais uma vez, sem razão à autora. Sobre a utilização da densidade médica como elemento indutor da política pública de distribuição de médicos no país, trata-se de uma opção adotada pelo próprio Legislador – e não de uma criação exclusiva do MEC -, conforme se infere do artigo 2º, inciso I (“priorizando regiões de saúde com menor relação de vagas e médicos por habitante”) e do artigo 3º, § 7º, inciso II, “a” (“relação número de habitantes por número de profissionais”), ambos da Lei nº 12.871/2013. A Lei nº 12.871/2013, que fez essa opção, foi integralmente validada pelo Supremo Tribunal Federal, inclusive no que tange à adoção de parâmetros comparativos em relação aos países da OCDE, conforme amplamente demonstrado nesta sentença. Como destacou o Eminente Ministro Cristiano Zanin, no voto proferido na ADC nº 81, “[...] Trata-se, portanto, de política pública estabelecida pelo legislador a partir de uma prognose realizada sobre as particularidades do ensino brasileiro e da demanda de médicos no país, impondo-se deferência à escolha legislativa, que não revela desproporcionalidade no modelo adotado”. No mesmo sentido, o voto do Eminente Ministro Alexandre de Moraes asseverando que “[...] as escolhas do formulador de políticas públicas, no caso, situaram-se dentro de alternativas válidas e legítimas, e, assim sendo, não desafia o sempre excepcional controle pelo Poder Judiciário”. Por sua vez, o Eminente Ministro André Mendonça destacou que “[...] faz-se necessário salvaguardar o espaço de deliberação constitucionalmente confiado aos poderes eleitos e aos órgãos administrativos, que, em verdade, dispõem de maior legitimidade e expertise institucional para definir sobre as políticas públicas de educação e saúde, que possuem impacto em todo a sociedade, inclusive considerando as atuais e futuras gerações”. Ainda, o Eminente Ministro Gilmar Mendes, Relator da ADC nº 81, consignou que “[...] Cabe ao Poder Executivo regular e distribuir adequadamente as novas vagas em curso de graduação, conforme a necessidade social e a capacidade estrutural de absorção pelos equipamentos públicos existentes”. De fato, a escolha do legislador e a implementação da política pelo Poder Executivo parecem acertadas, o que não excluiu a possibilidade de reavaliações futuras pela própria Administração Pública. O estudo Demografia Médica no Brasil 2023, realizado pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP) e pela Associação Médica Brasileira (AMB), assevera que o Brasil acompanhou o movimento mundial de expansão do número de médicos em relação à população em geral, embora ainda esteja atualmente abaixo da proporção média verificada nos países integrantes da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Confira-se: “A densidade de médicos dobrou no Brasil, de 1,29 em 2000 para 2,60 em 2023. A China passou de 1,24 médicos por 1.000 habitantes, em 2000, para 2,24 em 2020, embora ainda mantenha taxa menor do que a média dos países analisados. Já a Austrália ultrapassou a média da OCDE, saindo de uma taxa de 2,49 no ano 2000, quando a média entre os países era 2,74, para os atuais 3,83. [...] Entre os países com taxa inferior à média da OCDE, nos últimos dez anos, Brasil e Reino Unido registraram maior crescimento do indicador do que Estados Unidos, Coreia do Sul e Japão. A França teve crescimento mais modesto e o México apresentou leve queda no ritmo de crescimento nos últimos anos”. (SCHEFFER, M. et al. Demografia Médica no Brasil 2023. São Paulo, SP: FMUSP, AMB, 2023, p. 64-65; grifos acrescidos) O Estudo da OCDE da Atenção Primária à Saúde no Brasil, divulgado em 2021, advertiu para a necessidade da formulação de políticas públicas em saúde a partir das necessidades presentes e futuras de médicos e outros profissionais de atenção à saúde da população geral: “[...] As experiências dos países da OCDE podem ser úteis para o Brasil em seus esforços para definir política de gestão da força de trabalho mais clara para gerir os recursos humanos da saúde. O Brasil já coleta dados de nível municipal com frequência mensal, o que significa que os dados de pré-requisitos já se encontram disponíveis para melhor informar a gestão da força de trabalho. O uso mais inteligente desses dados é recomendado para entender melhor os desafios da força de trabalho no Brasil, incluindo, por exemplo, a escassez e distribuição geográfica desigual de médicos. Maior coordenação entre os municípios e o nível federal poderia ajudar nessa direção” (OECD (2021), Estudo da OCDE da Atenção Primária à Saúde no Brasil, OECD Publishing, Paris, p. 151-152; grifos acrescidos) Especificamente sobre o Brasil, o mesmo estudo prossegue tecendo importantes considerações: “[...] As diferenças regionais na distribuição de todos os médicos é uma preocupação importante no Brasil. Como em muitos países da OCDE, o número de médicos per capita varia consideravelmente entre as regiões. Ao todo, são 2,3 médicos por mil habitantes, mas há capitais com mais de 12 médicos por mil habitantes - como Vitória, no Espírito Santo - e regiões com valores abaixo de um médico por mil habitantes (como a região amazônica no Norte, por exemplo) (Scheffer et al., 2018[1]). As diferenças entre municípios pequenos e grandes no Brasil são comparáveis às de outros países da OCDE. [...] Os desequilíbrios geográficos em diferentes regiões do Brasil refletem a concentração de serviços especializados e as preferências dos médicos pela prática em ambientes urbanos. Como em muitos outros países da OCDE, os médicos brasileiros podem relutar em praticar em regiões rurais ou áreas urbanas com problemas socioeconômicos devido a preocupações com sua vida profissional (incluindo renda, jornada de trabalho, oportunidades de desenvolvimento de carreira, isolamento de colegas) e aspectos da vida social e familiar (como opções educacionais para seus filhos e oportunidades profissionais para seus cônjuges) (OCDE, 2019[3])” (OECD (2021), Estudo da OCDE da Atenção Primária à Saúde no Brasil, OECD Publishing, Paris, p. 146-147; grifos acrescidos) Sobre o tema, confira-se o voto-condutor do Eminente Ministro Gilmar Mendes na ADC nº 81: [...] 53. Retornando ao contexto nacional, é pertinente observar as seguintes considerações feitas no bojo do já citado Estudo da OCDE da Atenção Primária à Saúde no Brasil acerca da necessidade de realização de ajustes especificamente no Programa Mais Médicos: “Pode ser necessário melhorar os métodos de direcionamento da comunidade utilizados pelo PMM para maximizar os benefícios potenciais do Programa. Conforme experimentado por outros países da OCDE (Estados Unidos, Austrália e Canadá), o método de focalização na comunidade tem grandes implicações para o planejamento de recursos humanos, e isso pode não ser suficientemente reconhecido no Brasil. Na Austrália, por exemplo, comunidades com escassez de médicos são designadas como ‘Áreas Prioritárias de Distribuição’ (em inglês, Distribution Priority Areas, ou DPA) com base em seu status demográfico, socioeconômico, tamanho da população e medidas de distância geográfica. Os médicos de clínica geral formados no estrangeiro têm de trabalhar pelo menos 10 anos em comunidades com a designação DPA. No Canadá, os critérios usados para definir comunidades carentes de serviços consideram as relações entre médicos e população, status demográfico e socioeconômico e acessibilidade geográfica. Nos Estados Unidos, a designação da área de escassez de profissionais de saúde é determinada com base em pontuação composta, calculada a partir da combinação da densidade de prestadores de serviços de saúde, nível de pobreza, taxa de mortalidade infantil e a estrutura de idade de cada comunidade.” Também compondo as razões do acórdão da ADC nº 81, confira-se a manifestação do Eminente Ministro Alexandre de Moraes: [...] Cenários complexos e multicausais reclamam abordagens estruturadas no enfrentamento de um problema não elimina a necessidade de soluções alternativas e/ou complementares. O oferecimento de novas vagas de ensino superior, direcionadas a municípios com maior necessidade, ainda que não seja uma solução decisiva para a oferta de serviços de saúde, coopera positivamente para a melhora do quadro de desigualdade geográfica. A média de médicos por habitantes registrada nos países da OCDE se mostra adequada à formatação de uma política pública que visa a enfrentar um cenário de escassez de profissionais disponíveis. O Estudo da OCDE sobre política de saúde pública no Brasil (OECD, 2021, Estudo da OCDE da Atenção Primária à Saúde no Brasil, OECD Publishing), já referido pelos votos que me antecederam, expressamente refere a um problema de escassez de médicos, sem ignorar a questão da distribuição geográfica. Nesse contexto, tem-se que o critério da densidade médica baseado na média de médicos por mil habitantes registrada nos países da OCDE se mostra adequado à formatação de uma política pública que visa a enfrentar um cenário de escassez de profissionais em regiões mais necessitadas do Brasil. De fato, na ausência de um índice ideal, a sistemática adotada pelo Executivo Federal revela uma opção administrativa válida e legítima, especialmente porque se pautou em estudos técnicos do Ministério especializado e foi chancelada pelo Supremo Tribunal Federal, mostrando-se potencialmente promissora na atual conjuntura nacional. Nesse sentido, ao analisar os embargos de declaração, o Eminente Ministro Relator da ADC nº 81 aduziu que “Em suma, trata-se, também aqui, de decisão técnico-administrativa de incumbência do Ministério da Educação no âmbito da execução da política pública regulada pela Lei 12.871/2013, não havendo que se cogitar intervenção judicial”. Por fim, quanto à alegação da autora de que muitas cidades com mais de 3,73 médicos por mil habitantes estão incluídas no Edital de Chamamento Público, há efetivamente a possibilidade de ocorrer tal situação. No tocante ao critério da “Densidade Médica”, a própria Nota Técnica Conjunta nº 3/2023/DPR/SERES, em seu item 3.4.14, reconhece o fato de que “[...] Dentro das regiões de saúde selecionadas existem municípios com elevada necessidade de tais profissionais, mas também existem locais que já possuem uma densidade médica relativamente elevada”. Isso se justifica porque, segundo as conclusões da Nota Técnica Conjunta nº 3/2023/DPR/SERES (item 4.4), serve para “[...] Permitir que as estruturas de saúde de mais de um município de uma mesma região de saúde sejam conjuntamente utilizadas como campo de prática de um mesmo curso (compondo, assim, a capacidade formativa necessária, com ao menos cinco leitos por estudante) ajudará a viabilizar cursos com sede em municípios que, isoladamente, não teriam condições de abrigar um curso de graduação em Medicina”. Assim, conclui-se que não estão configuradas as “distorções” apontadas pela parte autora, motivo pelo qual não há que se falar em violação à razoabilidade e proporcionalidade. VIII – Da alegada violação ao princípio da irretroatividade das normas A parte autora, invocando o artigo 2ª, inciso XIII, da Lei nº 9.784/1999 e o artigo 24 da LINDB, assevera que “[...] não pode haver a retroatividade neste caso, nem do ‘padrão decisório’ estabelecido nem da eventual descaracterização do mesmo para interpretação do vago dispositivo sobre necessidade social da Portaria SERES/MEC 531/2023” (Id 332802940, fl. 18). Em suma, defende que a Portaria SERES/MEC nº 531/2023 e a Nota Técnica nº 81/2023 não poderiam ser aplicadas ao caso concreto, por se tratarem de normas posteriores ao protocolo do pedido de autorização de curso, o que representaria retroação indevida de critérios regulamentares, em afronta à segurança jurídica e ao princípio do tempus regit actum. Sem razão à autora. Como já destacado, o Supremo Tribunal Federal, ao julgar a ADC nº 81, deixou claro que os processos administrativos pendentes deveriam ter sua tramitação assegurada, desde que respeitados os critérios legais mencionados, cabendo ao MEC aferi-los no caso concreto e com base em parâmetros técnicos. Assim, a edição da Portaria nº 531/2023 e da Nota Técnica nº 81/2023 atendeu à finalidade de concretizar a decisão da Corte Suprema e de garantir coerência regulatória. É dizer, os parâmetros fixados pelos atos regulamentares não constituem inovação normativa com efeito retroativo, mas sim conferem objetividade, uniformidade e segurança jurídica à aplicação da modulação de efeitos estipulada pelo Supremo Tribunal Federal e dos parâmetros previstos no art. 3º da Lei nº 12.871/2013. Rememore-se que a decisão do Supremo Tribunal Federal na ADC nº 81 forneceu diretamente o fundamento de validade e o substrato jurídico para a produção dos atos normativos e administrativos na seara dos processos administrativos que estavam tramitando, que é o caso da autora. Ademais, não merece prosperar a alegação de que houve violação ao artigo 2º, inciso XIII, da Lei nº 9.784/1999, que dispõe: Art. 2º [...] XIII - interpretação da norma administrativa da forma que melhor garanta o atendimento do fim público a que se dirige, vedada aplicação retroativa de nova interpretação. Com efeito, o critério adotado pelo MEC não caracteriza “nova interpretação administrativa”, pois, conforme já demonstrado nesta sentença, tais parâmetros já eram amplamente conhecidos e utilizados em outros atos normativos, tudo com base na decisão do Supremo Tribunal Federal que declarou a constitucionalidade da Lei n° 12.871/2013. Tampouco merece acolhimento a argumentação de que teria havido violação ao artigo 24 da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro - LNDB, que dispõe: Art. 24. A revisão, nas esferas administrativa, controladora ou judicial, quanto à validade de ato, contrato, ajuste, processo ou norma administrativa cuja produção já se houver completado levará em conta as orientações gerais da época, sendo vedado que, com base em mudança posterior de orientação geral, se declarem inválidas situações plenamente constituídas. No caso dos autos, não houve qualquer “revisão” na seara administrativa, pois não se revisou norma alguma e, ao tempo da edição dos atos normativos questionados, o processo administrativo ainda se encontrava pendente de deliberação final. Portanto, sequer havia processo “já completado”. Bem por isso, também, não se pode dizer que houve “mudança posterior de orientação”, pois não houve qualquer revisão de anterior orientação. Assim, conclui-se que a conduta do MEC não violou os princípios da irretroatividade das normas e do tempus regit actum. IX – Do alegado erro de cálculo da quantidade de médicos por mil habitantes no Município de São Carlos/SP Como visto anteriormente, pela avaliação da “região de saúde”, o Município de São Carlos/SP não faria jus à oferta de novo curso de medicina, pois não foi contemplado na pré-seleção constante do Edital de Chamamento Público nº 01/2023. Esclareça-se que o Edital de Chamamento Público nº 01/2023 não é objeto de irresignação nesta ação. Com efeito, a parte autora concentra a sua demanda na impugnação da conclusão do Parecer Final SERES/MEC de que “[...] a relação médico por habitante no município de São Carlos/SP foi de 4,74 médicos por mil habitantes, ou seja, superior a 3,73” (Id 332803718, fls. 16/17). Rememore-se que a Nota Técnica nº 81/2023 estipulou que “[...] os pedidos de abertura de novos cursos de Medicina e de aumento de vagas poderão ser aprovados se estiverem em regiões de saúde pré-selecionadas no Edital nº 01, de 4 de outubro de 2023 ou em municípios cuja concentração de médico por habitante seja inferior a 3,73”. Portanto, há dois critérios independentes para a aferição da relevância e necessidade social da oferta de curso de medicina, sendo um deles o critério principal e o outro o critério auxiliar, conforme o voto do Eminente Ministro Gilmar Mendes, relator da ADC nº 81, proferido no julgamento virtual dos embargos declaratórios iniciado em 21/03/2025 (Id 365580053), confira-se: [...] Como revela o exame da Nota Técnica 81/2023, a concentração, no âmbito do município, de médico por habitante inferior à média dos países da OCDE é critério de pré-seleção que somente é utilizado quando a pretensão de abertura de novas vagas não se encontra em “regiões de saúde pré-selecionadas no Edital nº 01, de 2023”. Isto é, o critério primário considerado pelo MEC para estruturação da política pública é mesmo o da região de saúde. A concentração de médico por habitante inferior à média dos países da OCDE surge somente como critério se a pretensão de abertura de novas vagas não estiver localizada em qualquer das regiões de saúde contempladas pelo Edital 1/2023 – possibilidade, aliás, que somente é facultada às instituições de ensinos abarcadas pelo Item 2 da parte final da deliberação embargada. Nada obstante, ressalto que a utilização da concentração, no âmbito do município, de médico por habitante inferior à média dos países da OCDE como critério auxiliar para fins de aferição de relevância e necessidade social na oferta de novas vagas em cursos de medicina não configura comportamento a priori inadequado por parte do Ministério da Educação. Pelo contrário, trata-se de índice, ao que tudo indica, apropriado para ser utilizado a título de parâmetro. Assim, com relação ao caso dos autos, tem-se o seguinte cenário: (i) o Município de São Carlos/SP não foi contemplado nas regiões de saúde pré-selecionadas pelo Edital nº 01/2023 – que não é objeto desta ação -, motivo pelo qual não restou preenchido o critério principal; e (ii) remanesce a necessidade de avaliação judicial – por força da provocação feita nesta ação - do critério auxiliar de aferição da relevância e necessidade social, qual seja, a densidade médica no Município de São Carlos/SP, apurando-se se a concentração de médico por mil habitantes. De fato, a questão remanescente (aferição do critério auxiliar em relação ao Município de São Carlos/SP) deve ser apreciada no bojo desta ação individual e perante esta instância ordinária do Poder Judiciário, como destacou o Eminente Ministro Relator da ADC nº 81: “[...] Em caso de eventual equívoco da Administração na condução de um dado processo administrativo ou na apreciação da situação particular de uma determinada instituição de ensino, surgirá questão jurídica a ser solucionada no âmbito de eventual pretensão individual e subjetiva” (Id 365580053). Pois bem. A Nota Informativa nº 22/2024/CGLNRS/GAB/SERES/SERES-MEC, que estabeleceu o fluxo procedimental para o cumprimento da decisão do Supremo Tribunal Federal na ADC nº 81, fixou as seguintes etapas procedimentais no seu item 4.8 (id 332803720 – fl. 2): Seguindo esse fluxo, a SERES/MEC, depois de receber o processo já instruído com a avaliação in loco do INEP – que aprovou a Instituição requerente em todos os critérios -, encaminhou os autos para manifestação do Conselho Nacional de Saúde (CNS), que se quedou inerte (Id 365580058, fl. 6): Em seguida, o processo foi encaminhado pela SERES/MEC ao Ministério da Saúde, conforme o Ofício nº 309/2024/MED/CGAACES/DIREG/SERES-MEC, de 17 de abril de 2024, que foi expedido para a Secretária de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde (SGTES/MS), solicitando a apuração sobre se o Município de São Carlos atenderia ao critério da concentração de médico por mil habitantes inferior a 3,73, nos seguintes termos (Id 344732464, fls. 12/14): [...] Como resposta, a SGTES/MS enviou à SERES/MEC o Ofício nº 491/2024/SGTES/GAB/SGTES/MS, de 25 de abril de 2024, com o seguinte teor: Conforme o documento acima, a manifestação da área técnica da Secretária de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde (SGTES/MS) sobre a concentração de médico por mil habitantes no Município de São Carlos/SP foi consolidada na Nota Técnica nº 201/2024-CGESC/DEGES/SGTES/MS, que tem o seguinte teor na parte que se refere à densidade médica (Id. 344732464, fls. 6/11): [...] Da leitura da referida Nota Técnica, verifica-se que, a despeito da certeza de que foi utilizada a base de dados do CNES e a metodologia Full Time Equivalente (FTE), não foi informado o teor efetivo dos dados extraídos do CNES e aplicados no cálculo, havendo obscuridade até mesmo sobre quais profissionais foram considerados e/ou excluídos desse cálculo, pois no âmbito da saúde atuam diversos profissionais, tais como médicos, residentes, bolsistas, voluntários, estagiários, dentre outros prestadores. Ainda no âmbito do processo administrativo, visando a garantir o contraditório antes da deliberação sobre o pedido, a SERES/MEC instaurou diligência junto à Instituição requerente – autora desta ação - para manifestação da requerente sobre o conteúdo da referida Nota Técnica nº 201/2024-CGESC/DEGES/SGTES/MS, especialmente sobre a conclusão de que o Município de São Carlos não havia atingido densidade médica inferior a 3,73 (Id 356931700, fl. 1): Diante disso, o Centro Universitário Central Paulista, em resposta, encaminhou o Ofício nº 014/2024 (Id 365580058, fls. 15/38), manifestando-se sobre diversos pontos, dentre eles, sobre a densidade médica do município de São Carlos. Confira-se trecho da manifestação da requerente (Id 365580058, fls. 17/20): Ocorre que a impugnação apresentada pela Instituição requerente não foi acatada pelo MEC, que manteve as conclusões da Nota Técnica nº 201/2024-CGESC/DEGES/SGTES/MS (fls. 6/11 do Id 344732464) e exarou o Parecer Final SERES/MEC, que, sem fazer nenhuma especificação dos dados considerados no cálculo da densidade médica no Município de São Carlos, apenas reiterou os termos da supracitada Nota Técnica nº 201/2024-CGESC/DEGES/SGTES/MS, confira-se (Id 332803718): Ao cabo do processo administrativo, foi então exarada a Portaria SERES/MEC nº 330, de 11 de julho de 2024, que indeferiu o pedido de autorização de oferta de curso de Medicina no Município de São Carlos/SP, confira-se (Id 332803716): Algumas questões chamaram a atenção deste Juízo. No bojo deste processo judicial, toda referência da União à relação de médicos por mil habitantes no Município de São Carlos foi diretamente fundada no conteúdo da Nota Técnica nº 201/2024-CGESC/DEGES/SGTES/MS, a qual serviu de base para todas as apreciações na seara administrativa e também para embasar os subsídios prestados à Advocacia-Geral da União. Ocorre que, como dito, a referida Nota Técnica nº 201/2024 - e nenhum outro documento produzido nestes autos - não apresenta os NÚMEROS CONCRETOS de população, de médicos e de horas trabalhadas que foram considerados para se chegar à média de 4,74 médicos por mil habitantes na cidade de São Carlos/SP. A despeito do contraditório garantido no âmbito administrativo, onde a Instituição requerente teve a oportunidade de apresentar impugnação específica ao número de médicos por mil habitantes informado na Nota Técnica nº 201/2024, não houve qualquer documento administrativo divulgando expressamente os dados efetivamente utilizados no cálculo da densidade médica no Município de São Carlos. Nesse cenário, conforme a jurisprudência do E. Tribunal Regional Federal da 3ª Região, “[...] O indeferimento administrativo sem a análise da documentação corrigida viola o direito do impetrante à motivação adequada dos atos administrativos, conforme entendimento consolidado pelo Supremo Tribunal Federal sobre o princípio da motivação dos atos administrativos” (TRF-3 - ApCiv: 50013896220234036125, Relator.: Desembargador Federal JEAN MARCOS FERREIRA, Data de Julgamento: 06/05/2025, 7ª Turma, Data de Publicação: 08/05/2025) Ademais, há comprovação de que a parte autora formalizou solicitação administrativa nesse sentido, conforme o Ofício nº 040/2024 – UNICEP enviado à SGTES/MS, sem êxito. Confira-se o teor do Ofício referido (Id 356932883): Em suma, do teor dos documentos administrativos apresentados e das manifestações da União nestes autos, só se sabe que, na avaliação do MEC, o Município de São Carlos/SP tem 4,74 médicos por mil habitantes, mas esse é o resultado de uma operação matemática pautada em dados desconhecidos. A União promoveu a juntada de vasta documentação nestes autos e teve diversas oportunidades para melhor esclarecer a questão, mas limitou-se a, como ocorreu na via administrativa, invocar o teor de documentos que apenas reproduziram o conteúdo da Nota Técnica nº 201/2024, reproduzindo somente o resultado de que o Município de São Carlos possui 4,74 médicos por mil habitantes. É certo que, nos termos da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, “[...] gozam os atos administrativos de presunção de veracidade, cabendo a quem os contesta o dever de apresentar prova inequívoca da ilicitude alegada” (STJ - RMS: 46006 MG, Relator.: Ministro SÉRGIO KUKINA, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 15/05/2018). No caso dos autos, em sede administrativa, a parte autora apresentou impugnação específica contra o resultado da densidade médica apurada pelo MEC, apontando os números do seu cálculo, confira-se (Id 365580058, fl. 20): No entender deste Juízo, a impugnação acima não seria, por si só, suficiente para desconstituir as conclusões do MEC, pois, como se lê das suas observações, a Instituição requerente promoveu um cálculo utilizando dados populacionais extraídos da base do IBGE, quando, à luz da Nota Técnica elaborada pelo Sistema de Mapeamento em Educação na Saúde (SIMAPES), que apresentou os aspectos metodológicos de construção do indicador de relevância e necessidade social da oferta de curso de Medicina, “[...] a referência para o cálculo do tamanho da população advém dos valores das estimativas populacionais dos municípios brasileiros disponibilizadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU) e que constam na base do Tabnet do Datasus” (Id 365580054). É preciso compreender, contudo, que a Instituição requerente, à época do processo administrativo, tinha uma grande limitação para acessar os dados corretos e necessários para a realização do complexo cálculo da densidade médica. Isso se comprova, inclusive, pelo teor do já referido Ofício nº 040/2024 enviado à SGTES/MS (Id 356932883). A Nota Informativa nº 22/2024/CGLNRS/GAB/SERES/SERES-MEC (id 332803720 – fl. 2), que estabeleceu o fluxo procedimental para o cumprimento da decisão do Supremo Tribunal Federal na ADC nº 81, não previu a participação dos Municípios no processo administrativo, o que limita significativamente a ampla compreensão acerca da real situação da localidade interessada. Nesse contexto, somente no bojo deste processo judicial, com o ingresso do Município de São Carlos/SP, na condição de assistente da parte autora, foi possível verificar que, de fato, o cálculo realizado pelo Ministério da Educação - MEC não condiz com a realidade do Município de São Carlos/SP, o que ocorreu especificamente em razão da discrepância em relação ao número de médicos vinculados aos estabelecimentos de saúde da municipalidade. Explico. Embora não se saiba exatamente os números concretos utilizados pelo MEC para o cálculo da densidade médica no Município de São Carlos/SP, comprovou-se nestes autos que a quantidade de médicos vinculados ao Município de São Carlos/SP, constantes do Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES), estava desatualizada à época do cálculo feito pelo MEC (competência de dezembro de 2023). De acordo com o Ofício nº 019/2019, de 04 de março de 2025, o Provedor da Santa Casa de Misericórdia de São Carlos/SP informou ao Sr. Secretário Municipal de Saúde que identificou “[...] inconsistências relevantes no Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES) relativas à competência de dezembro de 2023” (Id 360456810, fl. 4). Aduziu que “[...] de um total de 931 médicos cadastrados no CNES sob nosso estabelecimento, apenas 222 profissionais possuíam vínculo ativo com esta instituição” e que “[...] os demais 709 médicos constavam indevidamente como vinculados, mesmo não exercendo atividade profissionais nem recebendo qualquer repasse financeiro por parte da Entidade há mais de seis meses, ou seja, desde junho de 2023” (Id 360456810, fl. 4). Frise-se que, conforme a Nota Técnica elaborada pelo Sistema de Mapeamento em Educação na Saúde (SIMAPES), juntada aos autos pela União, “Os dados referentes ao número de médicos são extraídos da base do CNES atualizados mensalmente” (Id 365580054). É dizer, houve uma falha no cumprimento da orientação de atualização mensal dos dados CNES, o que gerou uma defasagem de pelo menos seis meses em relação ao Município de São Carlos/SP. Ainda, o Provedor da Santa Casa de Misericórdia informou que “[...] os 709 médicos sem vínculo representavam, indevidamente, um total de 11.460 horas registradas, de um total geral de 15.623 horas lançadas no sistema CNES, gerando um desequilíbrio na apuração da carga horária e nos indicadores de densidade médica local” (Id 360456810, fl. 4). Para comprovar as informações prestadas, o Provedor da Santa Casa de Misericórdia de São Carlos apresentou Declaração oficial com a relação nominal dos profissionais não vinculados à instituição (fls. 6/30 24/23 do Id 360456810 e fls. 1/11 do Id 360456814), fazendo o cotejo com a base de dados do CNES. Confira-se o teor da declaração – não será transcrita a relação nominal dos profissionais porque é muito extensa: Ademais, ainda a título de comprovação, a Santa Casa de Misericórdia de São Carlos/SP juntou aos autos os Relatórios de Repasses de Prestadores (Id 360456814 - fls. 14/30, Id 360456816, Id 360456820, Id 360456825, Id 360456833, Id 360456835, Id 360456838, Id 360456844, Id 360457951, Id 360457953, Id 360457955, Id 360457957, Id 360457960, Id 360457961, Id 360457968, Id 360457973, Id 360457985, Id 360457990, Id 360457995, Id 360458957, Id 360458961), demonstrando que o último repasse de recurso para os referidos profissionais ocorreu pelo menos seis meses antes da competência 12/2023. Prosseguindo na demonstração das inconsistências na base de dados do CNES, o próprio Secretário Municipal de Saúde, ao receber as informações prestadas pela Santa Casa de Misericórdia de São Carlos/SP, realizou uma checagem em relação aos médicos vinculados ao próprio Município, constando que “[...] do total de 338 profissionais cadastrados em dezembro de 2023, somente possuíam vínculo com o município 312 profissionais. [...] Em relação a carga horária, os 27 profissionais representam um total de 404 horas de um total de 7.095 horas” (Id 360456814, fl. 12). Confira-se o teor do documento: Diante desse cenário, o Sr. Secretário de Saúde do Município de São Carlos/SP enviou o Ofício nº 037/2025/GABINETE–SMS, de 24 de março de 2025, à Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação do Ministério da Saúde, contendo o título “Inconsistência nos dados do CNES – Cadastro de médicos atuantes em São Carlos”, com o objetivo de “[...] trazer evidências de equívoco nos dados da quantidade de médicos por habitante no Município de São Carlos no mês de dezembro de 2023, conforme a metodologia FTE (Full-Time Equivalent)”. Confira-se trecho: O Município de São Carlos/SP, manifestando-se nestes autos, fez uma comparação entre o cálculo feito com base nos dados do CNES e o cálculo com base nos dados extraídos do Sistema Estadual de Análise de Dados (SEADE). Os dados do SEADE, a despeito de não integrarem a formula oficial utilizada pelo MEC para o cálculo da densidade demográfica, servem como um parâmetro auxiliar – não determinante - para a verificação da credibilidade do resultado considerado pelo MEC em relação de São Carlos/SP. Confira-se o comparativo feito na petição Id. 360455638 (fl. 5) e o demonstrativo extraído da base do SEADE (Id 340893118): A União, por sua vez, intimada a se manifestar sobre toda a documentação acima mencionada, apenas aduziu, no que interessa ao tema, que a Instituição requerente teve oportunidade de exercer o contraditório na seara administrativa e reiterou a conclusão administrativa de que o Município de São Carlos/SP teria 4,74 médicos por mil habitantes (Id 365579480). Contudo, nada falou especificamente sobre a documentação acima referida e sobre as inconsistências apontadas, especialmente no que tange à desatualização da base de dados do CNES, tampouco apresentou nestes autos os dados concretos efetivamente utilizados no cálculo realizado pelo MEC. Conclui-se, portanto, que as informações constantes no banco de dados do CNES (competência de dezembro de 2023) estavam defasadas e não demonstravam a realidade do Município de São Carlos/SP, especialmente porque um número expressivo de médicos (mais de 700) informados na base do CNES não possuíam mais nenhum vínculo com os estabelecimentos de saúde da municipalidade, refletindo diretamente na quantidade de horas trabalhadas consideradas no cálculo da densidade médica a partir do método Full Time Equivalent (FTE). Violou-se, com isso, o artigo 2º, parágrafo único, da Portaria nº 1.646, de 2 de outubro de 2015, do Ministério da Saúde, que aponta o CNES “[...] como um cadastro que permita a representação mais fidedigna das realidades locorregionais”. A propósito, confira-se o que dispõe a referida Portaria MS nº 1.646/2015 sobre o CNES: Art. 5º - O CNES é a fonte de informações oficial sobre estabelecimentos de saúde no país, devendo ser adotado por todo e qualquer sistema de informação que utilize dados de seu escopo e ser utilizado como fonte para todas as políticas nacionais de saúde. A mesma Portaria estabelece uma espécie de responsabilidade compartilhada entre os Entes Federativos pelo cadastramento e manutenção da correção da base de dados do CNES, confira-se: Art. 10 - Compete à direção do SUS na esfera federal, em relação ao CNES: [...] V - realizar as ações necessárias para a correção de inconformidades cadastrais detectadas por órgãos de controle ou pelo poder judiciário e cuja correção não fora adotada pelo estabelecimento de saúde ou por outra esfera de direção do SUS; Art. 11 - Compete às direções estaduais do SUS, em relação ao CNES: [...] II - cooperar tecnicamente e ofertar o suporte necessário às direções municipais do SUS em seu território para a correta aplicação e operacionalização do CNES; III - apoiar o cadastramento dos estabelecimentos de saúde de seu território, públicos ou privados, integrantes ou não do SUS, que estejam sob seu comando ou cujo comando seja compartilhado com a esfera municipal; e IV - fiscalizar, auditar, validar ou alterar, quando necessário, o cadastro dos estabelecimentos de saúde integrantes do SUS que estejam sob seu comando ou cujo comando seja compartilhado com a esfera municipal. Art. 12 - São responsabilidades das direções municipais do SUS, em relação ao CNES: [...] II - apoiar o cadastramento dos estabelecimentos de saúde de seu território, públicos ou privados, integrantes ou não do SUS, que estejam sob seu comando ou cujo comando esteja compartilhado com a esfera estadual; e III - fiscalizar, auditar, validar ou alterar, quando necessário, o cadastro dos estabelecimentos de saúde integrantes do SUS que estejam sob seu comando ou cujo comando esteja compartilhado com a esfera estadual. [...] Art. 16 - Em todos os casos, os gestores do SUS poderão desativar cadastros realizados pelos estabelecimentos de saúde no CNES, quando constatadas irregularidades, de acordo com a seguinte hierarquia: I - Secretarias Municipais de Saúde, para os estabelecimentos de saúde que estiverem sob a sua gestão e gerência; II - Secretarias de Estado da Saúde, para os estabelecimentos de saúde que estiverem sob a sua gestão e gerência, ou quando houver omissão do gestor municipal; e III - Ministério da Saúde, para os estabelecimentos de saúde descritos nas alíneas II a V do art. 14, ou quando houver omissão do gestor estadual. Assim, ainda que o Município de São Carlos/SP tenha identificado e comunicado as inconsistências cadastrais ao Ministério da Saúde depois do indeferimento administrativo do pedido, é evidente que mesmo na época da apreciação administrativa a própria União (“direção do SUS na esfera federal”) tinha a obrigação de zelar pela correção dos dados constantes na base do CNES, inclusive com o dever de “[...] realizar as ações necessárias para a correção de inconformidades cadastrais”, nos termos do supracitado artigo 11 da Portaria MS nº 1.646/2015. Importante destacar que o Município de São Carlos/SP já promoveu as devidas correções das inconsistências encontradas na base de dados do CNES, conforme o Ofício nº 54/2025 SMS/EXT, expedido pelo Sr. Secretário Municipal de Saúde Municipal ao Ministério da Saúde (SEGES/MS), em 07 de março de 2025, informando que “medidas corretivas foram implementadas para garantir que as informações registradas reflitam de forma precisa a realidade do município”, confira-se (Id 356934360): Portanto, diante de tudo que foi explanado, é possível concluir que a apuração do MEC acerca do critério da “relevância e necessidade social da oferta do curso de medicina”, com base na média de 3,73 de médicos por mil habitantes (média dos países da OCDE), não foi adequadamente realizada no caso do Município de São Carlos/SP, pois um dos elementos utilizados na fórmula de cálculo - o número de horas trabalhadas pelos médicos vinculados - não refletiu dados fidedignos da realidade da cidade de São Carlos/SP à época da aferição (competência 12/2023). Com efeito, mesmo diante do desconhecimento dos números concretos efetivamente utilizados pelo MEC na apuração da densidade médica, há certeza de que o MEC utilizou a base de dados do CNES e que esta base estava eivada de um significativo equívoco em relação à realidade local (mais de 700 médicos foram indevidamente contabilizados), com evidente capacidade de alteração do resultado apurado pelo MEC, em razão do acréscimo indevido de grande quantidade de “horas trabalhadas” na fórmula de cálculo baseada no método Full Time Equivalent (FTE). Conforme lição de Caio Tácito, “[...] se inexiste o motivo, ou se dele o administrador extraiu consequências incompatíveis como princípio de Direito aplicado, o ato será nulo por violação de legalidade. Não só o erro de direito como o erro de fato autoriza a anulação jurisdicional do ato administrativo” (Ato Administrativo Poder Discricionário, in RDA 38/351). À luz da jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça, “[...] se a Administração Pública norteou sua conduta em função de parâmetro que se revelou inexistente, o ato administrativo não pode ser mantido, e o controle jurisdicional, nesse tocante, é plenamente autorizado pela ordem jurídica, com afastamento da alegação de intocabilidade da discricionariedade administrativa” (STJ - AgRg no AREsp: 500567 CE, Relator.: Ministro HERMAN BENJAMIN, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 18/08/2014). Essa é a essência da teoria dos motivos determinantes, conforme se extrai da jurisprudência do E. Tribunal Regional Federal da 3ª Região, confira-se: APELAÇÃO. ADMINISTRATIVO. CONTROLE DE ATO. MOTIVO E MOTIVAÇÃO. VÍCIO. NULIDADE DO ATO. RECURSO NÃO PROVIDO. - O controle de atos administrativo pelo Poder Judiciário, se dá no aspecto de verificação da legalidade e legitimidade, conforme consolidado entendimento jurisprudencial; o que não viola ao princípio da Separação dos Poderes - Entre os elementos que formam o ato administrativo, tem-se que o motivo é o pressuposto de fato e de direito que serve de fundamento ao ato. Atrelado a esse elemento está a motivação, a qual consiste na exteriorização formal do motivo, visando a propiciar o controle quanto à regularidade do ato - A validade do ato se vincula aos motivos indicados como seu fundamento, de modo que, se inexistente ou falsos, implicam em sua nulidade. É o que denomina por teoria dos motivos determinantes - No presente caso, observa-se incongruência entre motivo e motivação do ato auto de infração - A partir do momento da prática do ato em questão e regular processo administrativo, a Administração tentou convalidar o vício apontado pelo administrado, com emissão de “versões corrigidas”, mas que somente ressaltaram a incongruência da motivação, pois por vezes foi consignado que a infração era “não indicação de informações de SAC” e depois que era “emissão de bilhete sem observância das especificações” - Impugnado o ato administrativo, não é possível o exercício do poder de autotutela pela Administração, para correção do vício insanável e manutenção de penalidade, diante da vinculação aos motivação do ato e incidência direta da teoria dos motivos determinantes - Recurso não provido. (TRF-3 - ApCiv: 50050184020204036128, Relator.: Desembargador Federal MONICA AUTRAN MACHADO NOBRE, Data de Julgamento: 22/05/2023, 4ª Turma, Data de Publicação: Intimação via sistema DATA: 29/05/2023) Por outro lado, embora o Município de São Carlos/SP tenha afirmado que, com os ajustes promovidos, a densidade médica passou a ser de 3,59 na competência de dezembro de 2023, não cabe ao Poder Judiciário se antecipar ao próprio MEC e já determinar a utilização desse número (3,59) para a aferição do critério da “relevância e necessidade social da oferta do curso de medicina”. Muito menos compete à Justiça se sobrepor ao MEC para, desde logo, deferir a autorização para oferta do curso de medicina na cidade de São Carlos/SP. Nesse sentido, a jurisprudência pátria: “[...] Ao Poder Judiciário não compete substituir-se ao administrador e definir o conteúdo final do ato praticado, salvo quando o ato é delimitado por lei, sob pena de violação do princípio da separação dos poderes” (TRF-5 - APELAÇÃO CÍVEL: 0800452-89.2021.4.05.8107, Relator.: SEBASTIÃO JOSÉ VASQUES DE MORAES, Data de Julgamento: 24/01/2023, 6ª TURMA). Assim também já decidiu o E. Tribunal Regional Federal da 3ª Região, confira-se: “[...] não é dado ao Judiciário romper a separação de poderes e substituir a razão administrativa pela razão judicial” (TRF-3 - ApCiv: 50288081720224036182, Relator.: Desembargador Federal LUIZ ALBERTO DE SOUZA RIBEIRO, 6ª Turma, Data de Publicação: 05/12/2024). Em verdade, considerando que as inconsistências constatadas já foram devidamente corrigidas pelo Município de São Carlos/SP, conforme informações constantes do supracitado Ofício nº 54/2025 SMS/EXT, é o caso de se acolher parcialmente o pedido autoral para que seja determinado ao MEC que refaça o cálculo da relação de médicos por mil habitantes no Município de São Carlos/SP, considerando a competência de dezembro de 2023, tudo de acordo com os critérios estabelecidos na Portaria SERES/MEC nº 531 de 22/12/2023, na Nota Técnica nº 81 CGLNRS/GAB/SERES de 22/12/2023, e na Nota Informativa nº 22 CGLNRS/GAB/SERES de 07/06/2024. Esclareça-se que o cálculo da densidade médica deverá considerar a competência de dezembro de 2023 porque o equívoco identificado remonta à referida época, bem como para que seja mantida uma coerência em relação à análise já concluída de outros requisitos, que ocorreu nos termos do § 7º do artigo 8º da Portaria nº 531/2023: Art. 8º [...] § 7º A análise do pedido será baseada na estrutura de equipamentos públicos e nos programas de saúde existentes na localidade de oferta do curso na data da primeira informação prestada pelo Ministério da Saúde, após a publicação desta Portaria, independentemente de suas alterações posteriores. Depois do cálculo, deverá o MEC garantir nova oportunidade de contraditório administrativo à Instituição requerente, prosseguindo, em seguida, com a confecção de novo parecer final e de nova decisão da SERES/MEC acerca do pedido de autorização de oferta de curso de Medicina no Município de São Carlos/SP. Frise-se que o MEC ficará livre para decidir de acordo com a sua convicção técnica, à luz do resultado que for encontrado na nova apuração, cabendo-lhe fundamentar a sua deliberação em números que possam ser conhecidos pela parte requerente, mediante demonstração clara dos dados efetivamente utilizados na elaboração do cálculo da densidade médica no Município de São Carlos/SP. Por fim, diante da constatação da plausibilidade do direito apreciado nesta fase de cognição exauriente e do periculum in mora decorrente dos prejuízos sociais e econômicos causados pela demora na solução da questão, bem como para evitar o risco de defasagem da avaliação já feita no âmbito do MEC sobre os demais requisitos exigidos para a oferta de curso de Medicina no Município de São Carlos/SP, DEFIRO, com base no artigo 300 do Código de Processo Civil, a antecipação dos efeitos da tutela para determinar que a UNIÃO FEDERAL – MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, no prazo global de até 90 (noventa) dias, no âmbito do Processo e-MEC nº 202301223, (i) refaça o cálculo da relação de médicos por mil habitantes no Município de São Carlos/SP, considerando a competência de dezembro de 2023 e apresentando os dados/números efetivamente utilizados no cálculo; (ii) garanta, em seguida, nova oportunidade de contraditório administrativo à Instituição requerente; (iii) confeccione novo parecer final considerando o novo resultado da densidade médica apurada para o Município de São Carlos/SP; e (iv) profira, dentro da sua convicção técnica, nova decisão acerca do pedido de autorização de oferta de curso de Medicina no Município de São Carlos/SP; tudo com base nos critérios estabelecidos na Portaria SERES/MEC nº 531 de 22/12/2023, na Nota Técnica nº 81 CGLNRS/GAB/SERES de 22/12/2023 e na Nota Informativa nº 22 CGLNRS/GAB/SERES de 07/06/2024. DISPOSITIVO Ante o exposto, resolvendo o mérito com base no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido deduzido pela ASSOCIAÇÃO DE ESCOLAS REUNIDAS LTDA., para: (I) ANULAR o Parecer Final do Processo e-MEC nº 202301223 e a Portaria SERES/MEC nº 330, de 11/07/2024, publicada em 12/07/2024; e (II) DETERMINAR que a UNIÃO FEDERAL – MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, por seus setores competentes, no âmbito do Processo e-MEC nº 202301223, (i) refaça o cálculo da relação de médicos por mil habitantes no Município de São Carlos/SP, considerando a competência de dezembro de 2023 e apresentando os dados/números efetivamente utilizados no cálculo; (ii) garanta, em seguida, nova oportunidade de contraditório administrativo à Instituição requerente; (iii) confeccione novo parecer final considerando o novo resultado da densidade médica apurada para o Município de São Carlos/SP; e (iv) profira, dentro da sua convicção técnica, nova decisão acerca do pedido de autorização de oferta de curso de Medicina no Município de São Carlos/SP; tudo com base nos critérios estabelecidos na Portaria SERES/MEC nº 531 de 22/12/2023, na Nota Técnica nº 81 CGLNRS/GAB/SERES de 22/12/2023 e na Nota Informativa nº 22 CGLNRS/GAB/SERES de 07/06/2024. Com base no artigo 300 do Código de Processo Civil, DEFIRO a antecipação dos efeitos da tutela para determinar que a UNIÃO – MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, por seus setores competentes, no prazo global de até 90 (noventa) dias, no âmbito do Processo e-MEC nº 202301223, (i) refaça o cálculo da relação de médicos por mil habitantes no Município de São Carlos/SP, considerando a competência de dezembro de 2023 e apresentando os dados/números efetivamente utilizados no cálculo; (ii) garanta nova oportunidade de contraditório administrativo à Instituição requerente; (iii) confeccione novo parecer final considerando o novo resultado da densidade médica apurada para o Município de São Carlos/SP; e (iv) profira, dentro da sua convicção técnica, nova decisão acerca do pedido de autorização de oferta de curso de Medicina no Município de São Carlos/SP; tudo com base nos critérios estabelecidos na Portaria SERES/MEC nº 531 de 22/12/2023, na Nota Técnica nº 81 CGLNRS/GAB/SERES de 22/12/2023 e na Nota Informativa nº 22 CGLNRS/GAB/SERES de 07/06/2024. Ciente da regra disposta no art. 85, § 14 do CPC, que veda a compensação honorária em caso de sucumbência recíproca, e atentando ao que sucumbiu cada parte, FIXO, com base no art. 85, §§ 2º e 3º, do CPC, os honorários advocatícios no importe de 15% sobre o valor atualizado da causa, cabendo à União o pagamento de 50% desse valor aos advogados da parte autora e, por outro lado, cabendo à parte autora o pagamento de 50% desse valor à Advocacia-Geral da União. Custas processuais finais ex lege, com distribuição dos valores seguindo o raciocínio da condenação honorária, observando-se que a União é isenta (artigo 4º, inciso I, da Lei nº9.289/1996). O Município de São Carlos/SP – assistente simples da parte autora - não deve suportar os ônus da sucumbência, nos termos da jurisprudência do E. Tribunal Regional Federal da 3ª Região: “[...] 1. Consoante estabelece o Código de Processo Civil, não há condenação do assistente simples em honorários advocatícios: ‘Se o assistido ficar vencido, o assistente será condenado ao pagamento das custas em proporção à atividade que houver exercido no processo’. 2. O teor do art. 32 do antigo CPC, mantido pelo artigo 94 do CPC/2015 dispõe expressamente sobre a condenação em custas (despesas), não cabendo interpretação extensiva para abarcar a verba hononária” (TRF-3 - ApCiv: 50064941420184036119 SP, Relator.: Desembargador Federal LUIZ PAULO COTRIM GUIMARAES, 2ª Turma, Data de Publicação: e - DJF3 Judicial 1 DATA: 04/06/2020). Sentença sujeita ao reexame necessário (artigo 496, inciso I, do Código de Processo Civil). Havendo interposição de apelação, intime-se a parte recorrida para contrarrazões, no prazo legal (art. 1010 do CPC). Caso suscitadas questões preliminares em contrarrazões, intime-se a parte contrária para manifestar-se a respeito, nos termos do artigo 1009, parágrafo 2º CPC. Após, remetam-se os autos eletrônicos ao Egrégio Tribunal Regional Federal da 3ª Região. Sentença publicada e registrada eletronicamente. Intimem-se. São Carlos, data registrada no sistema. GUILHERME REGUEIRA PITTA Juiz Federal Substituto (assinado eletronicamente)
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