Processo nº 5000614-05.2022.4.03.6312
ID: 324225155
Tribunal: TRF3
Órgão: 41º Juiz Federal da 14ª TR SP
Classe: RECURSO INOMINADO CíVEL
Nº Processo: 5000614-05.2022.4.03.6312
Data de Disponibilização:
14/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
RODNEY HELDER MIOTTI
OAB/SP XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO Turmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de São Paulo 14ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 5000614-05.2022.4.…
PODER JUDICIÁRIO Turmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de São Paulo 14ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 5000614-05.2022.4.03.6312 RELATOR: 41º Juiz Federal da 14ª TR SP RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS RECORRIDO: DIRCEU ZANELATTO Advogado do(a) RECORRIDO: RODNEY HELDER MIOTTI - SP135966-N OUTROS PARTICIPANTES: PODER JUDICIÁRIO JUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO TURMAS RECURSAIS DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 5000614-05.2022.4.03.6312 RELATOR: 41º Juiz Federal da 14ª TR SP RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS RECORRIDO: DIRCEU ZANELATTO Advogado do(a) RECORRIDO: RODNEY HELDER MIOTTI - SP135966-N OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Relatório dispensado. PODER JUDICIÁRIO JUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO TURMAS RECURSAIS DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 5000614-05.2022.4.03.6312 RELATOR: 41º Juiz Federal da 14ª TR SP RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS RECORRIDO: DIRCEU ZANELATTO Advogado do(a) RECORRIDO: RODNEY HELDER MIOTTI - SP135966-N OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Trata-se de recurso interposto pelo INSS contra sentença que julgou parcialmente procedente o pedido formulado pela autora, para declarar inexigíveis os valores descontados do benefício pela parte ré. Recorrente alega ausência de boa-fé objetiva da parte autora, não podendo a autarquia ser condenada à devolução do valor que foi devidamente descontado. A restituição de valores recebidos indevidamente da autarquia previdenciária encontra amparo no artigo 115, da Lei 8.213/91: Art. 115. Podem ser descontados dos benefícios: I - contribuições devidas pelo segurado à Previdência Social; II - pagamento de benefício além do devido; III - Imposto de Renda retido na fonte; IV - pensão de alimentos decretada em sentença judicial; V - mensalidades de associações e demais entidades de aposentados legalmente reconhecidas, desde que autorizadas por seus filiados. Parágrafo único. Na hipótese do inciso II, o desconto será feito em parcelas, conforme dispuser o regulamento, salvo má-fé. No entanto, a jurisprudência pacífica do E. Superior Tribunal de Justiça havia se firmado no sentido de que as verbas de caráter alimentar (como as previdenciárias), recebidas de boa-fé, são irrepetíveis e vinha aplicando esse entendimento (Ex. STJ - PRIMEIRA TURMA, RESP 201502110854, REGINA HELENA COSTA, DJE: 18/05/2016; STJ - SEGUNDA TURMA, RESP 201502218439, HERMAN BENJAMIN, DJE: 02/02/2016; STJ - SEGUNDA TURMA, AgRg no REsp 1352754/SE, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, julgado em 05/02/2013, DJe 14/02/2013; STJ - SEGUNDA TURMA, AgRg no AREsp 250.894/PR, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, julgado em 04/12/2012, DJe 13/12/2012). Para o STJ esse entendimento não decorria de declaração de inconstitucionalidade do art. 115, da Lei 8.213/91, mas de interpretação sistemática da legislação (Nesse sentido: STJ - SEGUNDA TURMA, AgRg no AREsp 241.163/RS, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, julgado em 13/11/2012, DJe 20/11/2012). Assim, em atenção aos mandamentos da Corte Federal, constatado que se tratava de valores recebidos de boa-fé (no amplo sentido de ausência de dolo ou má-fé que visem fraudar a administração), não era cabível sua cobrança por parte da administração. Porém, posteriormente, no julgamento do Tema 979 o STJ fixou tese em recurso representativo de controvérsia no seguinte sentido: PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. TEMA 979. ARTIGO 1.036 DO CPC/2015. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. ARTIGOS 884 E 885 DO CÓDIGO CIVIL/2002. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211 DO STJ. ART. 115, II, DA LEI N. 8.213/1991. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS POR FORÇA DE INTERPRETAÇÃO ERRÔNEA E MÁ APLICAÇÃO DA LEI. NÃO DEVOLUÇÃO. ERRO MATERIAL DA ADMINISTRAÇÃO. POSSIBILIDADE DE DEVOLUÇÃO SOMENTE NA HIPÓTESE DE ERRO EM QUE OS ELEMENTOS DO CASO CONCRETO NÃO PERMITAM CONCLUIR PELA INEQUÍVOCA PRESENÇA DA BOA-FÉ OBJETIVA. 1. Da admissão do recurso especial: Não se conhece do recurso especial quanto à alegada ofensa aos artigos 884 e 885 do Código Civil, pois não foram prequestionados. Aplica-se à hipótese o disposto no enunciado da Súmula 211 do STJ. O apelo especial que trata do dissídio também não comporta conhecimento, pois não indicou as circunstâncias que identifiquem ou assemelhem os precedentes colacionados e também por ausência de cotejo analítico e similitude entre as hipóteses apresentadas. Contudo, merece conhecimento o recurso quanto à suposta ofensa ao art. 115, II, da lei n. 8.213/1991. 2. Da limitação da tese proposta: A afetação do recurso em abstrato diz respeito à seguinte tese: Devolução ou não de valores recebidos de boa-fé, a título de benefício previdenciário, por força de interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da Administração da Previdência Social. 3. Irrepetibilidade de valores pagos pelo INSS em razão da errônea interpretação e/ou má aplicação da lei: O beneficiário não pode ser penalizado pela interpretação errônea ou má aplicação da lei previdenciária ao receber valor além do devido. Diz-se desse modo porque também é dever-poder da Administração bem interpretar a legislação que deve por ela ser aplicada no pagamento dos benefícios. Dentro dessa perspectiva, esta Corte Superior evoluiu a sua jurisprudência passando a adotar o entendimento no sentido de que, para a não devolução dos valores recebidos indevidamente pelo beneficiário da Previdência Social, é imprescindível que, além do caráter alimentar da verba e do princípio da irrepetibilidade do benefício, a presença da boa-fé objetiva daquele que recebe parcelas tidas por indevidas pela administração. Essas situações não refletem qualquer condição para que o cidadão comum compreenda de forma inequívoca que recebeu a maior o que não lhe era devido. 4. Repetição de valores pagos pelo INSS em razão de erro material da Administração previdenciária: No erro material, é necessário que se averigue em cada caso se os elementos objetivos levam à conclusão de que houve boa-fé do segurado no recebimento da verba. Vale dizer que em situações em que o homem médio consegue constatar a existência de erro, necessário se faz a devolução dos valores ao erário. 5. Do limite mensal para desconto a ser efetuado no benefício: O artigo 154, § 3º, do Decreto n. 3.048/1999 autoriza a Administração Previdenciária a proceder o desconto daquilo que pagou indevidamente; todavia, a dedução no benefício só deverá ocorrer quando se estiver diante de erro da administração. Nesse caso, caberá à Administração Previdenciária, ao instaurar o devido processo administrativo, observar as peculiaridades de cada caso concreto, com desconto no beneficio no percentual de até 30% (trinta por cento). 6. Tese a ser submetida ao Colegiado: Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados decorrentes de erro administrativo (material ou operacional), não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela Administração, são repetíveis os valores, sendo legítimo o seu desconto no percentual de até 30% (trinta por cento) do valor do benefício mensal, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido. 7. Modulação dos efeitos: Tem-se de rigor a modulação dos efeitos definidos neste representativo da controvérsia, em respeito à segurança jurídica e considerando o inafastável interesse social que permeia a questão sub examine, e a repercussão do tema que se amolda a centenas de processos sobrestados no Judiciário. Desse modo somente deve atingir os processos que tenham sido distribuídos, na primeira instância, a partir da publicação deste acórdão. 8. No caso concreto: Há previsão expressa quanto ao momento em que deverá ocorrer a cessação do benefício, não havendo margem para ilações quanto à impossibilidade de se estender o benefício para além da maioridade da beneficiária. Tratou-se, em verdade, de simples erro da administração na continuidade do pagamento da pensão, o que resulta na exigibilidade de tais valores, sob forma de ressarcimento ao erário, com descontos nos benefícios, tendo em vista o princípio da indisponibilidade do patrimônio público e em razão da vedação ao princípio do enriquecimento sem causa. Entretanto, em razão da modulação dos efeitos aqui definidos, deixa-se de efetuar o descontos dos valores recebidos indevidamente pelo segurado. 9. Dispositivo: Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, não provido. Acórdão sujeito ao regime previsto no artigo 1.036 e seguintes do CPC/2015. (STJ - PRIMEIRA SEÇÃO, REsp 1381734/RN, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, julgado em 10/03/2021, DJe 23/04/2021 - destaques nossos) Da leitura do inteiro teor desse julgado, depreende-se que a Corte diferenciou duas situações: a) a primeira de errônea interpretação e/ou má aplicação da lei pelo INSS, situação em que entendeu que não cabe devolução de valores recebidos de boa-fé, pois são situações que “não refletem qualquer condição para que o cidadão compreenda de forma inequívoca que recebeu a maior o que não lhe era devido”, “o elemento objetivo é, por si, suficiente para levar à conclusão de que o segurado recebeu o benefício de boa-fé, assegurando-lhe o direito da não devolução do valor recebido indevidamente”; b) a segunda de erro administrativo (material ou operacional), situação em que entendeu que “deve ser analisado caso a caso, de modo a averiguar se o beneficiário/segurado tinha condições de compreender a respeito do não pertencimento dos valores recebidos, de modo a se lhe exigir comportamento diverso, diante do seu dever de lealdade para coma Administração Previdenciária”, ou seja, deve “averiguar a presença da boa-fé do segurado/beneficiário, concernente na sua aptidão para compreender, de forma inequívoca, a irregularidade do pagamento”, sendo cabível a devolução de valores se o beneficiário tinha condições de saber do erro/equivoco do pagamento (ex. servidor que não tem filhos e que recebeu, por erro da administração, auxílio natalidade, deve devolver os valores). Assim, para as situações de erro material ou operacional a verba é repetível, salvo se comprovada a boa-fé objetiva no sentido de não ser possível constatar/ter conhecimento que o pagamento era indevido (“situações em que o homem médio consegue constatar a existência de erro, necessário se faz a devolução dos valores ao erário”). Note-se, no entanto, que na modulação dos efeitos o STJ admitiu que sua jurisprudência vinha “caminhando no sentido de indeferir a devolução em todas essas hipóteses”, e que a alteração do entendimento impõe a necessidade de modulação dos efeitos. Em razão disso, estabeleceu que o novo entendimento deve atingir “os processos que tenham sido distribuídos, na primeira instância, a partir da publicação deste acórdão”, o que ocorreu apenas em 23/04/2021. Do caso concreto. A presente ação foi proposta em 22/02/2022, após o julgamento do tema repetitivo 979/STJ. A sentença assim decidiu naquilo que importa ao recurso: O cerne da controvérsia versa sobre o reconhecimento da irrepetibilidade dos descontos efetivados no benefício previdenciário da parte autora, em razão do pagamento em duplicidade de benefícios incalculáveis. O procedimento de desconto dos valores pagos indevidamente está previsto na Lei n. 8.213/1991, artigo 115: "Art. 115. Podem ser descontados dos benefícios: (...) II - pagamento administrativo ou judicial de benefício previdenciário ou assistencial indevido, ou além do devido, inclusive na hipótese de cessação do benefício pela revogação de decisão judicial, em valor que não exceda 30% (trinta por cento) da sua importância, nos termos do regulamento; (Redação dada pela Lei nº 13.846, de 2019) (...) § 1o Na hipótese do inciso II, o desconto será feito em parcelas, conforme dispuser o regulamento, salvo má-fé (...)". Sobre a matéria posta, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Tema Repetitivo n. 979, fixou a seguinte tese jurídica: Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados, decorrentes de erro administrativo (material ou operacional) não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela administração, são repetíveis, sendo legítimo o desconto no percentual de até 30% do valor do benefício pago ao segurado/beneficiário, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso concreto, comprove sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido (STJ, REsp 1381734/RN, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Seção, julgado em 10/03/2021, DJe 23/04/2021). Os efeitos desse julgamento foram modulados, restringindo seu alcance aos processos distribuídos a partir de 23/04/2021, data de publicação do acórdão, conforme autoriza o art. 927, §3º, do CPC. Em relação aos processos distribuídos antes de 23/04/2021, aplica-se a jurisprudência anterior do STJ, no sentido de que os pagamentos indevidos realizados decorrentes de erro administrativo são irrepetíveis, independentemente de qualquer exame acerca da boa-fé objetiva do beneficiário (STJ, REsp 1381734/RN, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Seção, julgado em 10/03/2021, DJe 23/04/2021, pp. 28/29 e 32/33). É possível, portanto, extrair as seguintes conclusões do julgamento desse caso repetitivo: - o pagamento decorrente de interpretação errônea da lei não é suscetível de repetição; - o pagamento decorrente de erro material ou operacional é suscetível de repetição, salvo comprovação da boa-fé do segurado; - a exigência de comprovação da boa-fé vale para os processos distribuídos a partir de 23 de abril de 2021; - a repetição, quando admitida, permite o desconto do percentual de até 30% do valor do benefício do segurado. Do Caso Concreto A parte autora obteve na via administrativa a Aposentadoria por Tempo de Contribuição de NB.179.335.798-3. Ato contínuo, o autor também moveu a ação previdenciária judicial de n. 1000205.95.2016.826.0472, ocasião em que o Juízo Estadual cessou aquele benefício e, em seu lugar, determinou a implantação da Aposentadoria por Tempo de Contribuição de NB.192.942.764-3. Posteriormente, em razão de pedido do autor naquela ação, a situação anterior foi restabelecida, também por decisão judicial, isto é, houve a cessação do NB.192.942.764-3 e a reativação do NB.179.335.798-3. Convém esclarecer que na ação judicial n. 1000205.95.2016.826.0472, a Procuradoria informou ao Juízo Estadual em 09/6/2020, que: “Optando a parte autora pelo benefício concedido na via administrativa, requer o arquivamento do feito, pois não pode executar as prestações do benefício judicial e ao mesmo tempo optar pelo recebimento do benefício administrativo. Requer seja expedido ofício à CEAB para o restabelecimento do benefício 42/179.335.798-3”. Ato contínuo, o Juízo Estadual oficiou o INSS em 07/7/2020 para: “Determino providências para que o INSS restabeleça o benefício 42/179.335.798-3 em favor do autor DIRCEU ZANELATTO, CPF 049.637.128-22, RG 16.672.986, por se tratar de benefício mais vantajoso, no prazo de 10 dias úteis, cancelando-se o benefício implantado em razão da presente ação (NB 42/192.942.764-3)”. Pois bem. O processo foi distribuído após 23/04/2021, razão pela qual os valores pagos indevidamente no âmbito administrativo pelo INSS são irrepetíveis, desde que comprovada a boa-fé objetiva da parte autora. Da documentação anexada aos autos, especialmente a contida no id 254556939, observo que houve pagamento em duplicidade no período de 01/07/2020 a 31/08/2020. A parte autora alega que não agiu com má-fé, tampouco induziu o réu em erro, bem como não utilizou qualquer ardil. O INSS, por sua vez, não contesta a boa-fé do demandante, porém alega seu dever de anular ex ofício atos administrativos eivados de vício, bem como o dever de restituição, sob pena de configurar enriquecimento ilícito. Com efeito, a documentação supramencionada demonstrou que não houve ardil, nem má-fé do autor, mas simples concessão da aposentadoria com data retroativa, o que gerou, em certo período, pagamento conjunto com o benefício de aposentadoria ao autor. Assiste razão à parte autora. Primeiramente, verifico que não há nenhum elemento nos autos apto para questionar sua boa-fé. O autor não apresentou informações falsas no processo, não omitiu informação, não induziu a erro o órgão administrativo, o que sequer foi alegado pelo INSS. De outro lado, vale lembrar a natureza alimentar do benefício previdenciário. O pagamento dessas parcelas por longo período gera, para o segurado, o sentimento de que sempre poderá contar com ele, principalmente em se tratando de um benefício de prestação continuada. Nesse contexto, não seria justo exigir restituição de valores que muito provavelmente foram consumidos em prol da sua subsistência. Enfim, em razão da evidente boa-fé da parte autora, aliado ao caráter alimentar do benefício recebido, consideram-se irrepetíveis os valores pagos em excesso. A jurisprudência é farta nesse sentido: PREVIDENCIÁRIO. ADMINISTRATIVO. DECADÊNCIA PARA O INSS REVISAR O ATO DE CONCESSÃO. APOSENTADORIA. REVISÃO. ILEGALIDADE CONSTATADA. MANTIDO O CANCELAMENTO DO BENEFÍCIO. IRREPETIBILIDADE DOS VALORES PERCEBIDOS DE BOA-FÉ. (...) 3. Não restou caracterizada a má-fé da parte autora, pois tanto no processo administrativo quanto no decorrer do trâmite processual, em momento algum falseou as informações prestadas ou os documentos apresentados, nem se utilizou de ardis para induzir a erro os órgãos julgadores. 4. Irrepetibilidade dos valores auferidos, considerando a boa-fé da autora e o caráter alimentar do benefício. (Apelação/Reexame Necessário Nº 5001083- 63.2010.404.7114/RS, Relator Ézio Teixeira, Sexta Turma. D.E. 19/12/2013. PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO CONCEDIDO ADMINISTRATIVAMENTE. DEVOLU ÇÃO DE VALORES RECEBIDOS INDEVIDAMENTE. IMPOSSIBILIDADE. BOA-FÉ. CONSECTÁRIOS. 1. O pagamento originado de decisão administrativa devidamente motivada à luz das razões de fato e de direito apresentadas quanto do requerimento, tem presunção de legitimidade. 2. Evidenciada a boa-fé, o beneficiário não pode ficar jungido à contingência de devolver valores que já foram consumidos, dada a finalidade de prover os meios de subsistência a que se destina o benefício previdenciário. 3.Declarada pelo Supremo Tribunal Federal a inconstitucionalidade do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009, os consectários legais comportam a incidência de juros moratórios equivalentes aos índices oficiais de remuneração básica e juros aplicáveis à caderneta de poupança (STJ, REsp 1.270.439/PR, 1ª Seção, Relator Ministro Castro Meira, 26/06/2013) e correção monetária pelo INPC e demais índices oficiais consagrados pela jurisprudência. 4. Havendo o feito tramitado perante a Justiça Federal, o INSS está isento do pagamento das custas judiciais, a teor do que preceitua o art. 4º da Lei 9.289/96. (APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5010043-58.2012.404.7204/SC, Relator Luiz Carlos de Castro Lugon, D.E. 27/06/2014) Nestes termos, condeno o réu a restituir os valores descontados do atual benefício. Do Dano Moral. Em regra, o indeferimento, cancelamento ou revisão de benefício previdenciário ou assistencial na via administrativa, por si só, não implica direito à indenização por dano moral, na medida em que se trata de ato administrativo passível de correção pelos meios legais cabíveis, tanto na própria Administração Pública, como perante o Judiciário. A exceção se verifica apenas quando demonstrada efetiva violação a direito subjetivo inerente à personalidade, em razão de procedimento abusivo por parte da Administração. Nesse sentido, cito os seguintes precedentes: PREVIDENCIÁRIO. RETIFICAÇÃO DE CERTIDÃO POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TEMPO DE SERVIÇO URBANO COMUM. RECLAMATÓRIA TRABALHISTA. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE INTERCALADO. DANOS MORAIS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. 1. A sentença trabalhista serve como início de prova material do tempo de serviço, desde que fundada em elementos que demonstrem o efetivo exercício da atividade laborativa, ainda que o INSS não tenha integrado a relação processual. 2. Cabível a contagem, para fins de carência, do período no qual o segurado esteve em gozo de benefício por incapacidade apenas se intercalado com períodos contributivos (artigo 55, II, da Lei nº 8.213/1991). 3. O indeferimento da postulação junto ao INSS não enseja indenização alguma por dano, na medida em que se trata o ato administrativo passível de correção pelos meios legais cabíveis, tanto na própria Administração Pública, como perante o Judiciário. 4. Verba honorária majorada em razão do comando inserto no § 11 do art. 85 do CPC/2015. (TRF4, AC 5011371- 05.2016.4.04.7003, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, juntado aos autos em 26/06/2019) PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. ATIVIDADE RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR OU TRABALHADOR "BOIA-FRIA". RESTABELECIMENTO. DANO MORAL. INOCORRÊNCIA. 1. O trabalhador rural que implemente a idade mínima (sessenta anos para o homem e de cinquenta e cinco anos para a mulher) e comprove o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses correspondentes à carência exigida para o benefício, faz jus à concessão do benefício da aposentadoria rural por idade (artigos 11, VII, 48, § 1º, e 142, da Lei n. 8.213/91). 2. A análise de vários elementos (localização e extensão do imóvel, tipo de cultura explorada, quantidade de produção comercializada, número de membros familiares a laborar na atividade rural, utilização ou não de maquinário agrícola e de mão de obra de terceiros de forma não eventual, exercício de atividades urbanas concomitantes e sua importância na renda familiar), é que permitirá um juízo de valor acerca da condição de segurado especial. As circunstâncias de cada caso concreto é que vão determinar se o segurado se enquadra ou não na definição do inc. VII do art. 11 da Lei n. 8.213/91. 3. Os atos administrativos relativos à concessão, manutenção e revisão de benefícios previdenciários, por si só não implicam ao INSS indenização por danos morais. Ausente a comprovação de ofensa ao patrimônio subjetivo do segurado, bem como de o ato administrativo ter sido desproporcionalmente desarrazoado, inexiste direito à indenização por dano moral 4. Determinada a imediata reimplantação do benefício, valendo-se da tutela específica da obrigação de fazer prevista no artigo 461 do CPC (1973), bem como nos artigos 497, 536 e parágrafos e 537, do CPC (2015), independentemente de requerimento expresso por parte do segurado ou beneficiário. (TRF4, AC 5044197-83.2017.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, juntado aos autos em 25/06/2019) No presente caso, não há nos autos prova contundente de que a parte autora tenha sofrido algum abalo psíquico ou moral, passado por situação humilhante, vexatória ou que cause algum distúrbio psíquico mais sério a ponto de gerar o malsinado dano moral em decorrência do ato praticado pela Autarquia, ou mesmo da ocorrência de qualquer abusividade praticada no procedimento administrativo pelo INSS, pelo que rejeito o pleito indenizatório. Diante do exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido para declarar a inexigibilidade do débito apurado pelo INSS, bem como indevida a cobrança realizada por recebimento em período concomitante do benefício de aposentadoria pelo autor e condenar o INSS a restituir os valores indevidamente descontados do benefício da parte autora, extinguindo o feito com resolução do mérito, nos termos do artigo 487, I, do Código de Processo Civil. CONCEDO A TUTELA ANTECIPADA, determinando que o INSS proceda à imediata suspensão dos descontos no benefício da parte autora referentes à cobrança ora discutida, no prazo de 15 (quinze) dias a contar da data de sua ciência. Condeno o(a) vencido(a) ao pagamento das prestações vencidas, calculadas na forma do Manual de Cálculos da Justiça Federal em vigor, observada a prescrição quinquenal, se for o caso. Sem condenação em custas e honorários advocatícios, nos termos do art. 55 da Lei 9.099/95. Não vejo razão para alterar posicionamento do Juízo singular, tal a clareza e suficiência da fundamentação exposta. Da própria narração constante da sentença é possível perceber as “idas e vindas” dos benefícios concedidos judicial e administrativamente ao autor, ora cessados, ora restabelecidos. Como bem destacado pelo Juízo, não se constata má-fé “mas simples concessão da aposentadoria com data retroativa, o que gerou, em certo período, pagamento conjunto com o benefício de aposentadoria ao autor”. Registre-se que o pagamento em duplicidade referiu-se a pequeno período (01/07/2020 a 31/08/2020), o que torna razoável que tenha passado despercebido pela parte autora, especialmente porque se referiam a parcelas pagas retroativamente. Assim, vejo caracterizada boa-fé objetiva no recebimento das verbas por parte do segurado. Diante de erro do INSS e boa-fé objetiva da parte autora, são indevidos os descontos realizados no benefício e, portanto, devem ser restituídos pela autarquia. Disso, observando que os supostos óbices trazidos pela recorrente foram bem analisados pelo julgamento recorrido, mantenho a sentença proferida pelos seus próprios fundamentos, nos termos do art. 46, Lei nº 9.099/95. Diante do exposto, nego provimento ao recurso do INSS. Fixo os honorários advocatícios em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação (ou da causa, na ausência daquela). É como voto. E M E N T A PREVIDENCIÁRIO. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS EM DUPLICIDADE. TEMA 979/STJ. ERRO DO INSS. BOA-FÉ OBJETIVA DO SEGURADO CARACTERIZADA. CESSAÇÃO DOS DESCONTOS E RESTITUIÇÃO DO QUE JÁ FORA DESCONTADO. RECURSO DO INSS DESPROVIDO. ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Quarta Turma Recursal decidiu, por unanimidade, negar provimento ao recurso do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. ROGERIO VOLPATTI POLEZZE Juiz Federal
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