Processo nº 0023708-76.2025.4.05.8100
ID: 329598052
Tribunal: TRF5
Órgão: 26ª Vara Federal CE
Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL
Nº Processo: 0023708-76.2025.4.05.8100
Data de Disponibilização:
21/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
GABRIEL FRANCISCO BORGES MACEDO
OAB/BA XXXXXX
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S E N T E N Ç A I – RELATÓRIO Trata-se de ação proposta em face da Caixa Econômica Federal, em que a parte autora, após contratar financiamento habitacional com a ré, impugna aparente abusividade nos…
S E N T E N Ç A I – RELATÓRIO Trata-se de ação proposta em face da Caixa Econômica Federal, em que a parte autora, após contratar financiamento habitacional com a ré, impugna aparente abusividade nos juros pactuados, venda casa na aquisição no seguro habitacional e ilegalidade na cobrança da taxa de administração, razão pela qual requer a revisão do aludido negócio jurídico com a consequente condenação da promovida a devolver, em dobro, todos os valores pagos indevidamente, com correção monetária e juros de mora, além de pagar indenização por danos morais. Regularmente citada, a CEF sustenta a total improcedência da demanda. É o sucinto relatório. Passo à fundamentação. II – FUNDAMENTAÇÃO Defiro o pedido de justiça gratuita. Registre-se inicialmente ser aplicável às instituições financeiras o Código de Defesa do Consumidor - CDC, conforme, a propósito, entendimento pacificado do Superior Tribunal de Justiça, constante da Súmula 297, abaixo transcrita: Súmula 297. O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras. Destaco, neste ponto, inclusive, julgado proferido pelo Supremo Tribunal Federal, em 22.2.2006, na ADI 2591/DF, cujo relator foi o Ministro Carlos Velloso, por meio do qual se confirmou o entendimento jurisprudencial farto que confere às instituições bancárias a qualidade de fornecedor de serviços, na exata forma descrita pelo CDC. A temática versada na presente demanda é a revisão de cláusulas contratuais na relação consumerista, a qual é regulada pelo Código de Defesa do Consumidor, em seu art. 6º, VI, in verbis: “Art. 6º São direitos básicos do consumidor: (...) V - a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas;”. A revisão contratual surge em razão da possível mutabilidade das relações interpessoais, que podem sofrer impactos decorrentes de todo o contexto social e econômico em que as partes estão inseridas. Reconhece-se a eventualidade de um desequilíbrio superveniente, ou seja, posterior à conclusão do contrato, que torna exageradamente onerosa a prestação de uma das partes. Trata-se da aplicação da teoria da base objetiva do negócio jurídico no Código de Defesa do Consumidor, positivada no art. 6º da Lei nº 8.078/90, que, diferentemente do que preconiza a teoria da imprevisão adotada pelo Código Civil de 2002, não exige a imprevisibilidade do fato para a revisão do contrato. O que interessa saber é se o fato alterou de maneira objetiva as bases nas quais as partes contrataram, de maneira a modificar o ambiente econômico inicialmente existente. Neste sentido, segue julgado do STJ: RECURSO ESPECIAL. CIVIL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO DE COMPRA E VENDA. DÓLAR AMERICANO. MAXIDESVALORIZAÇÃO DO REAL. AQUISIÇÃO DE EQUIPAMENTO PARA ATIVIDADE PROFISSIONAL. AUSÊNCIA DE RELAÇÃO DE CONSUMO. TEORIAS DA IMPREVISÃO. TEORIA DA ONEROSIDADE EXCESSIVA. TEORIA DA BASE OBJETIVA. INAPLICABILIDADE. 1. Ação proposta com a finalidade de, após a maxidesvalorização do real em face do dólar americano, ocorrida a partir de janeiro de 1999, modificar cláusula de contrato de compra e venda, com reserva de domínio, de equipamento médico (ultrassom), utilizado pelo autor no exercício da sua atividade profissional de médico, para que, afastada a indexação prevista, fosse observada a moeda nacional. 2. Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza, como destinatário final, produto ou serviço oriundo de um fornecedor. Por sua vez, destinatário final, segundo a teoria subjetiva ou finalista, adotada pela Segunda Seção desta Corte Superior, é aquele que ultima a atividade econômica, ou seja, que retira de circulação do mercado o bem ou o serviço para consumi-lo, suprindo uma necessidade ou satisfação própria, não havendo, portanto, a reutilização ou o reingresso dele no processo produtivo. Logo, a relação de consumo (consumidor final) não pode ser confundida com relação de insumo (consumidor intermediário). Inaplicabilidade das regras protetivas do Código de Defesa do Consumidor. 3. A intervenção do Poder Judiciário nos contratos, à luz da teoria da imprevisão ou da teoria da onerosidade excessiva, exige a demonstração de mudanças supervenientes das circunstâncias iniciais vigentes à época da realização do negócio, oriundas de evento imprevisível (teoria da imprevisão) e de evento imprevisível e extraordinário (teoria da onerosidade excessiva), que comprometa o valor da prestação, demandando tutela jurisdicional específica. 4. O histórico inflacionário e as sucessivas modificações no padrão monetário experimentados pelo país desde longa data até julho de 1994, quando sobreveio o Plano Real, seguido de período de relativa estabilidade até a maxidesvalorização do real em face do dólar americano, ocorrida a partir de janeiro de 1999, não autorizam concluir pela imprevisibilidade desse fato nos contratos firmados com base na cotação da moeda norte-americana, em se tratando de relação contratual paritária. 5. A teoria da base objetiva, que teria sido introduzida em nosso ordenamento pelo art. 6º, inciso V, do Código de Defesa do Consumidor - CDC, difere da teoria da imprevisão por prescindir da previsibilidade de fato que determine oneração excessiva de um dos contratantes. Tem por pressuposto a premissa de que a celebração de um contrato ocorre mediante consideração de determinadas circunstâncias, as quais, se modificadas no curso da relação contratual, determinam, por sua vez, consequências diversas daquelas inicialmente estabelecidas, com repercussão direta no equilíbrio das obrigações pactuadas. Nesse contexto, a intervenção judicial se daria nos casos em que o contrato fosse atingido por fatos que comprometessem as circunstâncias intrínsecas à formulação do vínculo contratual, ou seja, sua base objetiva. 6. Em que pese sua relevante inovação, tal teoria, ao dispensar, em especial, o requisito de imprevisibilidade, foi acolhida em nosso ordenamento apenas para as relações de consumo, que demandam especial proteção. Não se admite a aplicação da teoria do diálogo das fontes para estender a todo direito das obrigações regra incidente apenas no microssistema do direito do consumidor, mormente com a finalidade de conferir amparo à revisão de contrato livremente pactuado com observância da cotação de moeda estrangeira. 7. Recurso especial não provido. (STJ, RESP 201200888764, TERCEIRA TURMA, DJE 3/3/2015, RELATOR PAULO DE TARSO SANSEVERINO, g.n.). Assim, impõe-se verificar se foi atingida a base do negócio, em outras palavras, se ocorreu situação anômala que exija um esforço sobrecomum para o adimplemento da obrigação; se a situação não foi provocada pelo próprio contratante onerado; se o ônus futuro não é inerente à avença ou se não foi determinado no pacto que o contratante deveria suportá-lo. Pois bem. Da capitalização de juros “A noção jurídica de “capitalização de juros” e de “anatocismo” (...) está ligada à circunstância de serem os juros vencidos e, portanto, devidos, que se incorporam periodicamente ao capital; vale dizer, não é conceito matemático abstrato, divorciado do decurso do tempo contratado para adimplemento da obrigação. O pressuposto da capitalização é que, vencido o período ajustado (mensal, semestral, anual), os juros não pagos sejam incorporados ao capital e sobre eles passem a incidir novos juros.” (excerto do voto vencedor no REsp 973.827/RS, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Rel. p/ Acórdão Ministra Maria Isabel Gallotti, Segunda Seção, julgado em 8/8/2012, DJe 24/9/2012, g.n.). Assim, capitalização de juros, juros frugíferos ou anatocismo é justamente essa capitalização ligada à amortização negativa, ou seja, as parcelas devidas e não pagas de um contrato (sobre as quais já incidiram juros) serão incorporadas ao saldo devedor e sofrerão nova incidência de juros. É esta, inclusive, a definição do termo “anatocismo” no dicionário: “juro cobrado sobre juros vencidos não pagos e que são tidos por incorporados ao capital desde o dia do vencimento”.1[1] É sabido que havia vedação à capitalização de juros na legislação pátria, a teor do disposto na Súmula 121 do STF (“é vedada a capitalização de juros, ainda que expressamente convencionada” – Sessão Plenária de 13/12/1963). A Lei de Usura (Decreto-lei nº 22.626/1933), em seu artigo 4º permitiu a capitalização, mantendo a proibição caso ocorresse em período inferior a um ano (“Art.4º. É proibido contar juros dos juros: esta proibição não compreende a acumulação de juros vencidos aos saldos líquidos em conta corrente de ano a ano”). A interpretação que se dava, portanto, era a de que a capitalização, se houvesse, deveria ser anual, excetuadas as hipóteses especiais legalmente previstas (cédulas de crédito rural, comercial e industrial - Decreto-Lei n. 167/67 e Decreto-Lei n.413/69 e a Lei n. 6.840/80). Nesse sentido, a súmula 93 do STJ: “A legislação sobre cédulas de crédito rural, comercial e industrial admite o pacto de capitalização de juros.”. O STF, ao editar a Súmula n. 596, assentou que a Lei de Usura, que veda a capitalização de juros em periodicidade inferior a um ano, não se aplica às instituições financeiras, por haver legislação específica para regular a atuação dos bancos (Lei n.4.595/64): “As disposições do Decreto-Lei 22.626/33 não se aplicam às taxas de juros e aos outros encargos cobrados nas operações realizadas por instituições públicas ou privadas que integram o sistema financeiro nacional.” (Sessão Plenária de 15/12/1976). O Código Civil Brasileiro (Lei n. 10.406/2002) permite expressamente a capitalização anual de juros, sendo a cobrança feita por instituição financeira ou não: “Art.591. Destinando-se o mútuo a fins econômicos, presumem-se devidos juros, os quais, sob pena de redução, não poderão exceder a taxa a que se refere o art. 406, permitida a capitalização anual.” Com a edição da Medida Provisória nº 1.963-17, publicada em 31/3/2000, revigorada pela MP nº 2.170-36 (D.O.U. De 12/9/2001), passou-se a admitir expressamente a capitalização de juros em período inferior a um ano, nos termos do seu art. 5º, caput, desde que, é claro, esteja prevista no contrato: “Art. 5o Nas operações realizadas pelas instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional, é admissível a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano.” Isso significa que a capitalização de juros, seja qual for a sua periodicidade (anual, semestral, mensal), será considerada válida se estiver expressamente pactuada (prevista) no contrato. O STJ analisou o tema sob a sistemática do recurso repetitivo e manifestou-se adotando o seguinte entendimento: “CIVIL E PROCESSUAL. RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. AÇÕES REVISIONAL E DE BUSCA E APREENSÃO CONVERTIDA EM DEPÓSITO. CONTRATO DE FINANCIAMENTO COM GARANTIA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. JUROS COMPOSTOS. DECRETO 22.626/1933 MEDIDA PROVISÓRIA 2.170-36/2001. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. MORA. CARACTERIZAÇÃO. 1. A capitalização de juros vedada pelo Decreto 22.626/1933 (Lei de Usura) em intervalo inferior a um ano e permitida pela Medida Provisória 2.170-36/2001, desde que expressamente pactuada, tem por pressuposto a circunstância de os juros devidos e já vencidos serem, periodicamente, incorporados ao valor principal. Os juros não pagos são incorporados ao capital e sobre eles passam a incidir novos juros. 2. Por outro lado, há os conceitos abstratos, de matemática financeira, de "taxa de juros simples" e "taxa de juros compostos", métodos usados na formação da taxa de juros contratada, prévios ao início do cumprimento do contrato. A mera circunstância de estar pactuada taxa efetiva e taxa nominal de juros não implica capitalização de juros, mas apenas processo de formação da taxa de juros pelo método composto, o que não é proibido pelo Decreto 22.626/1933. 3. Teses para os efeitos do art. 543-C do CPC: - "É permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano em contratos celebrados após 31.3.2000, data da publicação da Medida Provisória n. 1.963-17/2000 (em vigor como MP 2.170-36/2001), desde que expressamente pactuada." – "A capitalização dos juros em periodicidade inferior à anual deve vir pactuada de forma expressa e clara. A previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada". 4. Segundo o entendimento pacificado na 2ª Seção, a comissão de permanência não pode ser cumulada com quaisquer outros encargos remuneratórios ou moratórios. 5. É lícita a cobrança dos encargos da mora quando caracterizado o estado de inadimplência, que decorre da falta de demonstração da abusividade das cláusulas contratuais questionadas. 6. Recurso especial conhecido em parte e, nessa extensão, provido.” (STJ, REsp 973.827/RS, Segunda Seção, DJe 24/9/2012, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Rel. p/ Acórdão Ministra Maria Isabel Gallotti, por maioria, g.n.). Das referidas teses extraem-se as seguintes conclusões: 1. A partir da Medida Provisória n. 1.963-17/2000 é permitida a capitalização de juros em periodicidade inferior a um ano, desde que haja expressa pactuação, e 2. A pactuação mensal dos juros (simples ou compostos) deve ser expressa e clara. E a previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada (tese do duodécuplo). A primeira tese refere-se à capitalização de juros (juros não pagos que são incorporados ao capital e sobre eles passam a incidir novos juros) em período inferior a um ano e sua necessidade de pactuação expressa. A segunda tese refere-se à necessidade de estipulação expressa dos juros a serem cobrados e à possibilidade de cobrança da taxa de juros anual (efetiva), mesmo sendo superior ao duodécuplo da taxa mensal (nominal). Ou seja, a taxa de juros anual (efetiva) ser superior ao duodécuplo da taxa mensal (nominal) significa que houve a cobrança da taxa capitalizada (taxa de juros compostos, método composto de formação da taxa de juros), o que é permitido. O STJ resumiu o entendimento da corte editando as súmulas n. 539 e n. 541, em seus exatos termos: Súmula n. 539: "É permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior à anual em contratos celebrados com instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional a partir de 31/3/2000 (MP n. 1.963-17/2000, reeditada como MP n. 2.170-36/2001), desde que expressamente pactuada” (g.n.) (DJe em 15/6/2015). Súmula 541-STJ: "A previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada.” (Dje em 15/6/2015). A respeito da capitalização de juros e da taxa capitalizada/ juros capitalizados (taxa de juros compostos, método composto de formação da taxa de juros), preceitua o professor e juiz Márcio André Lopes Cavalcante2: “(...) Na prática, observa-se que os contratos bancários não trazem uma cláusula dizendo: “os juros vencidos e devidos serão capitalizados mensalmente” ou “fica pactuada a capitalização mensal de juros”. O que se verifica, no dia-a-dia, é a previsão das taxas de juros mensal e anual e o contratante, ao assinar o pacto, deverá observar que a taxa de juros anual é superior a 12 vezes a taxa mensal, o que faz com que ela conclua que os juros são capitalizados. A pergunta que surge é: essa forma comum de previsão da taxa de juros dos contratos bancários é válida? O que significa essa terminologia “desde que expressamente pactuada”? De que modo o contrato bancário deverá informar ao contratante que está adotando juros capitalizados com periodicidade inferior a um ano?”. E conforme leciona o renomado jurista: “(...) basta que o contrato preveja que a taxa de juros anual será superior a 12 vezes a taxa mensal para que o contratante possa deduzir que os juros são capitalizados. Na prática, isso significa que os bancos não precisam dizer expressamente no contrato que estão adotando a “capitalização de juros”, bastando explicitar com clareza as taxas cobradas. A cláusula com o termo “capitalização de juros” será necessária apenas para que, após vencida a prestação sem o devido pagamento, o valor dos juros não pagos seja incorporado ao capital para o efeito de incidência de novos juros.” (g.n.). Vale dizer, a previsão contratual de que a taxa de juros anual será superior a 12 vezes a taxa mensal faz concluir que houve a aplicação de juros compostos (ou “juros capitalizados”) na formação da taxa de juros e que a taxa anual efetiva pode ser cobrada, desde que não haja, é claro, abusividade em relação à média de mercado. Destaque-se que a questão da capitalização mensal de juros está pendente de pronunciamento do Supremo Tribunal Federal - STF, em sede de Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 2316/DF), estando os autos atualmente conclusos ao relator (relatoria do Ministro Nunes Marques – conclusos em 30/11/2022). Em epítome, releva consignar que a capitalização de juros deve estar expressamente prevista, sobretudo porque onera o contratante, em caso de inadimplemento, para além da taxa de juros prevista no contrato, assim como a cobrança de taxa anual efetiva superior a 12 vezes a taxa mensal é suficiente para se presumir a cobrança de juros compostos (“taxa capitalizada”). Do caso concreto A parte autora questiona a taxa efetiva de juros aplicada ao contrato, requerendo seja declarada ilegal a forma de cálculo dos juros (juros compostos) e seja aplicado, por conseguinte, o método de cálculo com juros simples, de acordo com o patamar médio do mercado, nos termos da planilha de cálculo anexada aos autos (9661516). O demandante sustenta que não houve pactuação expressa e clara acerca da cobrança dos juros compostos, não obstante estar prevista expressamente a aplicação do método PRICE. O autor requer, nesse sentir, a substituição do método PRICE, previsto no contrato, pela média de juros do mercado, de forma linear e simples. E, analisando detidamente os documentos colacionados aos autos, verifico que não merece prosperar a pretensão autoral. A parte autora financiou um imóvel no valor total de R$ 280.000,00 (contrato no id. 72197183). Na situação concreta, vê-se que foi pactuada a taxa de juros anual, nominal e efetiva, de 9,5598% e 9,9900%, respectivamente. A taxa de juros, ao que consta, foi reduzida porque houve opção pelo desconto das parcelas em conta corrente. Senão vejamos: O(s) DEVEDOR(ES) optou(ram) pela taxa de juros reduzida com a aquisição, até a data de assinatura deste contrato dos produtos/serviços: débito dos encargos do financiamento em conta corrente na CAIXA, que devem ser mantidos durante a vigência do contrato. E, ao contrário, do alegado na inicial, fica clara a aplicação da taxa reduzida ao contrato do promovente, bastando verificar o valor do encargo mensal estabelecido no contrato (item B10.2 do id. 72197183) com aquele constante na planilha de evolução (id. 72197184). E, no caso, não restou demonstrada abusividade no método de cobrança dos juros pactuados. A autora aderiu ao contrato no qual foi utilizado o método PRICE de formação da taxa de juros (compostos), motivo pelo qual não pode pretender substituí-lo por outro que entende mais vantajoso (e utiliza método de formação de taxa de juros simples), pelo simples fato de que a cobrança de juros pelo método composto, ou a “taxa capitalizada”, não é proibida por lei, podendo as instituições financeiras cobrá-la livremente, devendo ser coibido apenas o abuso na sua estipulação. O contrato prevê expressamente as taxas anuais, a nominal e a efetiva. Dispõe sobre o prazo de amortização (360 meses), o sistema de amortização e as parcelas que compõem a prestação (prestação, prêmio de seguro e taxa de administração), de modo que com estas informações a parte autora livremente pactou, mesmo podendo buscar no mercado alternativas que fossem melhores que a apresentada pela Caixa. Em meu sentir, a demandante não pode furtar-se ao cumprimento da obrigação contratual, objetivando que este juízo interfira no método de formação da taxa de juros contratada e aplique tabela que utilize juros simples de mercado. Enfim, não prospera a intenção da parte autora em anular/modificar a forma de juros pactuada (juros compostos), alegando que não houve menção expressa no contrato, apesar de constar a taxa efetivamente contratada e o método PRICE de amortização. Em suma, merecem ser rechaçadas as alegações sobre a existência de ilegalidade na cobrança dos juros, notadamente os juros compostos, primeiro à vista da possibilidade legalmente prevista de sua cobrança, segundo porque, como visto, não há comprovação de abusos ou excessos por parte da CEF. Da aquisição do seguro habitacional e da contratação da taxa de administração A parte autora alega ter sido compelida a contratar o seguro habitacional com a instituição financeira ré, configurando hipótese de venda casada, razão pela qual deve a pactuação ser considerada nula de pleno direito. Porém, analisando detidamente o anexo ao contrato de financiamento habitacional, que trata da aquisição do seguro (id. 72197183, fls. 19 a 23), devidamente assinado pela parte autora, constam cláusulas expressas dispondo que ao devedor foi oferecida a possibilidade de contratação de outra apólice de livre escolha com as coberturas mínimas e indispensáveis, definidas pelo Conselho Monetário Nacional – CMN, e que aquele, por livre escolha, optou pela apólice de seguro oferecida pela instituição financeira. Assim, não há que se falar em vício de manifestação de vontade consubstanciado na configuração de venda casada. O seguro habitacional é vital para a manutenção do SFH, especialmente em casos de morte ou invalidez do mutuário ou danos aos imóveis. O art. 14 da Lei 4.380/64 e o art. 20 do Decreto-Lei 73/66, inclusive, tornaram-no obrigatório. Entretanto, a lei não determina que o segurado deva adquirir o seguro do fornecedor do imóvel. Assim, a autora poderia, de fato, ter contratado outra seguradora. Ocorre que, como dito, a autora não demonstrou o prejuízo, de modo que não se pode afirmar que o contrato de adesão lhe foi prejudicial ou que houve abusividade e/ou onerosidade excessivas. Ao contrário, aceitou o seguro oferecido contratualmente pela ré, não havendo que se falar, assim, em vício de manifestação de vontade consubstanciado na configuração de venda casada. No mesmo sentido: ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL. CEF. FINANCIAMENTO HABITACIONAL. SEGURO DE VIDA. VENDA CASADA NÃO CONFIGURADA. DANO MORAL NÃO DEMONSTRADO. AUSÊNCIA DE ATUAÇÃO ILÍCITA. INDENIZAÇÃO INDEVIDA. HONORÁRIOS. 1. Lide envolvendo a alegada ocorrência de venda casada do seguro de vida e abertura de conta corrente, como condição para a obtenção de financiamento junto à CEF, pelo programa Minha Casa Minha Vida, além da existência de danos morais sofridos pela autora, o dever da CEF em indenizar a demandante e o valor da reparação fixada. 2. Destaca-se que a hipótese não trata de seguro habitacional com cobertura de morte, invalidez permanente ou prejuízos decorrentes de danos físicos ao imóvel financiado, mas sobre a alegada venda casada de seguro de vida, denominado "Seguro Vida Mulher", contratado pela autora com a ré. 3. Aplicável o CDC, que, em seu art. 3º, § 2º, incluiu expressamente a atividade bancária no conceito de serviço, tratando- se de relação de consumo, conforme súmula 297 do Superior Tribunal de Justiça (STJ). O contrato de adesão não implica, necessariamente, a existência de cláusulas leoninas, devendo haver prova mínima da abusividade ou onerosidade excessiva. 4. Observe-se o princípio do pacta sunt servanda, como regra, em razão da natureza jurídica do contrato enquanto fonte obrigacional, devendo ser observados os seus preceitos quando celebrado de modo a atender aos pressupostos e requisitos necessários à sua validade. Nesse sentido: TRF2, 6ª Turma Especializada, AC 200951030021250, Rel. Des. Fed. NIZETE LOBATO CARMO, E-DJF2 19.8.2014. 5. A parte autora firmou contrato de financiamento de imóvel pelo programa Minha Casa Minha Vida em 31.8.2011, data em que foi registrado no sistema da CEF, vencendo a primeira prestação em 30.9.2011. O seguro de vida, por sua vez, no valor de R$ 75.000,00 em casos de morte ou invalidez por acidente, e R$ 37.500,00 em caso de diagnosticado câncer, e prêmio total no valor de R$ 365,23, foi contratado em 6.9.2011. 6. Não há nos autos elementos que denotem a contratação coercitiva de produtos oferecidos pela instituição financeira para a aprovação do financiamento, observando-se, inclusive, que o registro do contrato de financiamento deu-se em data anterior à proposta do seguro de vida. 7. Incumbe à parte autora provar o fato constitutivo de seu direito, nos termos do art. 373, I, CPC/2015 (art. 333, inciso I, do CPC/1973); entretanto, essa não logrou comprovar suas alegações, sequer requerendo a produção de provas além daquelas documentais acostadas à inicial, mesmo devidamente intimada para tanto, não se demonstrando o sustentado vício de consentimento na contratação do seguro. 8. Não configurada a atuação ilícita ou abusiva da ré que justifique a rescisão do contrato e a restituição dos valores pagos a título de prêmio do seguro de vida, tampouco a sua responsabilidade civil. Ausente prova de efetivo abalo moral sofrido pela parte, sem elementos que denotem o constrangimento ou lesões à dignidade que ultrapassem o limite do mero dissabor. 9. Sentença reformada. Inversão do ônus sucumbencial e condenação da autora em honorários advocatícios, diante da 1 improcedência do pedido, observando-se o disposto no art. 12 da Lei nº 1.060/1950. 10. Apelação provida. (TRF 2ª Região, AC 00006159220124025006 ES, Relator MARCELO PEREIRA DA SILVA, Data de Julgamento: 24/05/2017, 8ª TURMA ESPECIALIZADA, g.n.). No que tange à taxa de administração, também encontra previsão no contrato assinado pela parte autora, razão pela qual, não havendo vício de consentimento, não há que se falar em ilegalidade na cobrança. É sabido que os contratos, situados no âmbito dos direitos pessoais, são pautados pela livre manifestação de vontade dos contratantes, observada não apenas no exercício da plena liberdade para a celebração dos pactos e avenças com determinadas pessoas (liberdade de contratar), mas também na escolha do conteúdo do negócio jurídico (liberdade contratual). É o que a doutrina convencionou intitular de autonomia privada, que diz respeito a esta liberdade conferida aos contratantes para regular os seus próprios interesses e as relações que participam, estabelecendo-lhe o conteúdo e a respectiva disciplina jurídica. Contudo, por óbvio, essa autonomia não é absoluta, encontrando limitações em normas de ordem pública, sobretudo àquelas relacionadas com a formação e o reconhecimento da validade dos negócios jurídicos. Afinal, nos termos do Código Civil de 2002, a validade do negócio jurídico requer: (i) agente capaz, (ii) objeto lícito, possível, determinado ou determinável e (iii) forma prescrita ou não defesa em lei. Por conseguinte, não pode haver defeitos nos negócios jurídicos que lhe causem nulidade, devendo a manifestação de vontade ser livre de qualquer vício que possa macular o ato jurídico celebrado (erro, dolo, coação, estado de perigo e lesão). Da mesma forma, há limitações de caráter principiológico, respaldadas, sobretudo, pelos novos paradigmas trazidos pelo Código Civil de 2002 (eticidade e socialidade), com destaque para o princípio da boa-fé objetiva e o princípio da função social do contrato. Não por outra razão, o Código Civil estabelece expressamente que os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé (art. 113), ficando os contratantes obrigados a observá-lo, tanto na conclusão do contrato, como em sua execução (art. 422). Já em relação ao princípio da função social do contrato, também previsto expressamente no diploma civilista (art. 421), exige que o negócio jurídico seja interpretado de acordo com a concepção do meio social onde estão inseridos, respeitando a equidade entre as partes, de forma que se atendam seus interesses de forma justa e equilibrada, vedado o enriquecimento ilícito ou onerosidade excessiva de um dos contratantes, mas também se considerando os interesses de toda a sociedade, incluindo os efeitos gerados perante terceiros e a proteção de direitos metaindividuais e difusos (meio ambiente, economia, etc). E, no caso, não há qualquer vício na formação do contrato, uma vez que a contratante é capaz, o objeto é lícito, possível e determinado, e a forma escolhida para sua exteriorização cumpre todas as formalidades exigidas por lei, sendo claro em relação aos direitos e deveres inerentes a cada uma das partes e não houve alegações acerca de cláusulas ambíguas ou contraditórias. Igualmente, não há que se falar em quaisquer vícios que possam macular a validade do ato jurídico celebrado. Ou seja, a parte autora, ao assinar o pacto, tinha pleno conhecimento dos juros que estavam sendo aplicados naquele momento, como também da contratação do seguro habitacional, sendo informada, inclusive, acerca de todos os valores que compunham o encargo mensal a ser pago. Ademais, não há indícios de ter havido violação à probidade ou à boa-fé esperada no momento da conclusão ou da execução do contrato, uma vez, ao que consta, ocorreu nos estritos limites do que foi pactuado entre as partes. Portanto, estando presentes todos os requisitos de formação e validade de contrato, inexistindo vício de vontade e respeitado o princípio da boa-fé objetiva, deve a avença ser integralmente cumprida pela parte que contratou, em aplicação do princípio do pacta sunt servanda, brocardo latino que, em síntese, significa que os pactos assumidos devem ser cumpridos. Esse é o entendimento de nossos pretórios: PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO ORDINÁRIA. APELAÇÃO. SFH. CONTRATO DE FINANCIAMENTO. PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA REJEITADA. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. CLÁUSULAS ABUSIVAS. TAXA DE JUROS. JUROS COMPOSTOS. PREVISÃO CONTRATUAL. TAXA DE ADMINISTRAÇÃO. LEGALIDADE. SEGURO. VENDA CASADA NÃO CONFIGURADA. AUSÊNCIA DE ABUSIVIDADE. (...) No presente caso, estando expressamente prevista a capitalização mensal no contrato, que fora firmado após a edição da MP 2.170-36, não há impedimento legal à capitalização mensal de juros e nem irregularidade por parte da CEF na cobrança do débito. 6. A cobrança da taxa de administração está contratualmente estipulada como encargo mensal incidente sobre o financiamento, sendo legal a sua cobrança. 7. A contratação de seguro é obrigatória e legítima, no entanto, ausente prova de que a escolha da seguradora tenha sido imposta pela Instituição Financeira, não restando assim comprovada a venda casada. 8. Assim, em matéria contratual, ante a inexistência de cláusulas abusivas, prevalecem as regras livremente pactuadas, em respeito ao princípio expresso no brocardo latino: pacta sunt servanda. 9. Honorários advocatícios nos termos do art. 85, § 11, do CPC, que ora se acrescem em 2% ao valor fixado na sentença para a verba de sucumbência, suspensa a exigibilidade por serem os apelantes beneficiários da assistência judiciária gratuita. 10. Apelação desprovida. (TRF 1ª Região, Quinta Turma, AC 1003135-81.2018.4.01.3500, publicado em 28/9/2021, DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS AUGUSTO PIRES BRANDÃO, unânime); DIREITO CIVIL. SISTEMA DE FINANCIAMENTO IMOBILIÁRIO. LEI 9.514/97. REVISÃO DO CONTRATO DE FINANCIAMENTO. OBSERVÂNCIA DAS CLÁUSULAS CONTRATUAIS. INAPLICABILIDADE DAS REGRAS DO SFH. NÃO LIMITAÇÃO DOS JUROS. POSSIBILIDADE DE CAPITALIZAÇÃO. TAXA DE ADMINISTRAÇÃO. LEGALIDADE. TAXA DE SEGURO. 1. Contrato celebrado fundamentado no Sistema Financeiro Imobiliário - SFI, cuja instituição decorre da Lei nº 9.514/97. Sistema que proporciona maior autonomia às partes na realização do contrato, pois podem pactuar livremente critérios de reajustes, taxa de juros e sistema de amortização, observada a legislação vigente. 2. Respeito às cláusulas contratuais. Ausência de comprovação de ocorrência de ilegalidade ou de abusividade. 3. Possibilidade de Capitalização de juros (art. 5º, inciso III, da Lei n. 9.514/97). Não limitação dos juros. 4. Legalidade da taxa de administração. 5. Taxa de Seguro estipulada pela faixa etária. Apelação não provida. (TRF 5ª Região, Terceira Turma, AC 530295 0003850-50.2011.4.05.8100, publicado em 28/1/2013, Desembargador Federal Geraldo Apoliano, unânime). Ante todo o exposto, não merece prosperar a pretensão autoral. III – DISPOSITIVO Diante desse cenário, defiro o pedido de justiça gratuita e, no mérito, julgo improcedente o pedido, extinguindo feito com exame do mérito, nos termos do art. 487, I, do CPC. Sem custas e honorários advocatícios por força do disposto no art. 1º da Lei nº 10.259/2001, c/c os arts. 54 e 55 da Lei nº 9.099/95. Publique-se, registre-se e intimem-se, observadas as disposições da Lei nº. 10.259/2001. Interposto recurso voluntário, intime-se a parte contrária. Apresentadas as contrarrazões ou certificado o decurso do prazo, movimentem-se os autos para a Turma Recursal do Ceará. Fortaleza/CE, data supra. SÉRGIO FIUZA TAHIM DE SOUSA BRASIL Juiz Federal – 26.ª Vara/CE
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