Processo nº 5000867-36.2025.4.03.6005
ID: 337111986
Tribunal: TRF3
Órgão: 2ª Vara Federal de Ponta Porã
Classe: MANDADO DE SEGURANçA CíVEL
Nº Processo: 5000867-36.2025.4.03.6005
Data de Disponibilização:
29/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
LUIZ HENRIQUE PABLINO BRANDAO
OAB/MS XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO 2ª Vara Federal de Ponta Porã Rua Baltazar Saldanha, 1917, Jardim Ipanema, Ponta Porã - MS - CEP: 79904-202 https://www.trf3.jus.br/balcao-virtual MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL (120) Nº…
PODER JUDICIÁRIO 2ª Vara Federal de Ponta Porã Rua Baltazar Saldanha, 1917, Jardim Ipanema, Ponta Porã - MS - CEP: 79904-202 https://www.trf3.jus.br/balcao-virtual MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL (120) Nº 5000867-36.2025.4.03.6005 IMPETRANTE: MARIO FERREIRA LIMA ADVOGADO do(a) IMPETRANTE: LUIZ HENRIQUE PABLINO BRANDAO IMPETRADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS e outros SENTENÇA I - RELATÓRIO Trata-se de MANDADO DE SEGURANÇA INDIVIDUAL, com pedido de liminar, impetrado por MARIO FERREIRA LIMA contra contra suposto ato ilegal ou abusivo praticado pelo GERENTE DA AGÊNCIA DO INSS. Alega a parte impetrante, em síntese, que ingressou com pedido administrativo para concessão de BPC-LOAS, em 21.11.2024, sem que, até a presente data, haja decisão conclusiva, requerendo, portanto, a concessão da segurança nos termos do art. 5º, inciso LXIX, da Constituição Federal e na Lei nº 12.016/2009. A inicial foi instruída com os documentos anexos ao ID 364155190. Devidamente notificada, a autoridade apontada como coatora prestou informações juntadas no ID 367007389, nas quais esclareceu que o requerimento do Benefício Assistencial à Pessoa com Deficiência feito pelo impetrante ainda segue aguardando a análise administrativa. O órgão de representação judicial da pessoa jurídica interessada também foi regularmente intimado, entretanto, quedou-se inerte. Instado a se manifestar, o Ministério Público Federal apresentou parecer no ID 369259367, manifestando-se no sentido da inexistência de interesse que justifique sua intervenção na causa. É o relatório. Passo a decidir. II - DO MANDADO DE SEGURANÇA INDIVIDUAL O Mandado de Segurança individual (MS) é um instrumento constitucional previsto no artigo 5º, inciso LXIX, da Constituição Federal, que estabelece expressamente: "conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por "habeas-corpus" ou "habeas-data", quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público". Sua finalidade é resguardar direitos subjetivos contra atos ilegais ou abusivos praticados por autoridade pública ou agente equiparado, quando tais direitos se apresentem de forma evidente, clara e objetiva, aptos a serem prontamente reconhecidos pela via judicial, sem necessidade de maior aprofundamento probatório. Regulamentado pela Lei nº 12.016/2009, são requisitos constitucionais e legais essenciais para sua concessão: a) existência de direito líquido e certo; b) ocorrência de ilegalidade ou abuso de poder praticado por autoridade pública ou equiparada; c) inexistência de outro meio processual eficaz disponível (subsidiariedade); d) observância do prazo decadencial de 120 dias. Direito líquido e certo O direito líquido e certo consiste naquele direito do impetrante que pode ser comprovado de plano, de forma inequívoca, dispensando dilação probatória. Trata-se de um direito subjetivo evidenciado por prova documental pré-constituída, apresentada já com a petição inicial. Assim, exige-se que os fatos alegados e o próprio direito sejam demonstrados de imediato por documentos inequívocos; caso a situação reclamada dependa de instrução probatória complexa (por exemplo, produção de prova testemunhal ou pericial), então não há direito líquido e certo, inviabilizando o MS. Essa característica reflete a natureza célere do writ, que não comporta fase instrutória ampla - a Lei 12.016/09 veda expressamente a dilação probatória no MS, razão pela qual a ausência de comprovação documental imediata do direito implica a ausência de direito líquido e certo a amparar a ordem. Assim, deve o impetrante apresentar prova documental cabal de seu direito já na inicial; não o fazendo, ou dependendo este de maior elucidação fática, faltará o pressuposto constitucional do mandamus, sendo caso de denegar a segurança. Ilegalidade ou abuso de poder Para a concessão da segurança, o ato impugnado deve estar eivado de ilegalidade ou abuso de poder praticado por autoridade pública (ou equiparada) competente, conforme exige a Constituição (art. 5º, LXIX) e repete a Lei 12.016/09. É imprescindível, portanto, especificar com clareza o ato coator - isto é, o ato administrativo ou omissão apontado como ilegal ou abusivo - e demonstrar juridicamente em que consiste sua desconformidade com o ordenamento. A ilegalidade resta configurada quando o ato contraria o ordenamento jurídico, seja por infringência direta a alguma norma, seja por vício de competência, forma ou finalidade. O abuso de poder, por sua vez, abrange tanto o excesso de poder (ato praticado além ou fora dos limites da competência da autoridade) quanto o desvio de finalidade (ato aparentemente dentro da competência, mas voltado a finalidade diversa do interesse público ou que importe arbitrariedade flagrante). Em ambos os casos, há violação de normas jurídicas que deve ser apontada pelo impetrante - por exemplo, demonstrando que o ato contrariou determinado artigo de lei, deixou de observar garantia ou princípio constitucional, ou extrapolou limites regulamentares. Ademais, a natureza do MS requer um ato concreto lesivo ao direito do impetrante. Não cabe MS contra lei em tese, desacompanhada de lesão concreta e específica. Essa vedação (consolidada na Súmula 266 do STF) decorre justamente do escopo do writ, voltado a controlar atos ou omissões in concreto praticados pela autoridade. Portanto, deve-se demonstrar que o ato impugnado, emanado de autoridade pública ou de agente no exercício de função pública, violou diretamente o direito do impetrante, seja por contrariar a ordem jurídica (ilegalidade), seja por constituir exercício abusivo do poder que lhe foi conferido. Autoridade coatora No MS, a autoridade coatora é aquela que praticou (ou ordenou praticar, ou mantém a omissão de praticar) o ato impugnado como ilegal ou abusivo. A correta identificação dessa autoridade na petição inicial é obrigatória (Lei 12.016/09, art. 6º), devendo constar sua qualificação e endereço funcional, sob pena de inépcia. Em teoria, tradicionalmente exigia-se apontar como coatora a autoridade hierarquicamente superior com poder de corrigir ou desfazer o ato - não bastando indicar um agente subordinado que executou materialmente a ordem. Esse entendimento clássico visava garantir a eficácia do MS (já que um mero executor não poderia anular ato determinado por seu superior). Contudo, o formalismo excessivo nessa seara podia levar a extinções prematuras por ilegitimidade passiva, diante de dúvidas sobre quem exatamente seria a autoridade competente em estruturas complexas. Para mitigar esse problema, a jurisprudência desenvolveu a teoria da encampação. Por tal teoria, admite-se que, se o impetrante indicou equivocadamente como coatora uma autoridade de escalão inferior àquela que realmente detém competência para corrigir o ato, o writ ainda pode ser conhecido (evitando-se a extinção sem mérito) desde que três requisitos estejam presentes: (i) a autoridade apontada integra o mesmo órgão ou pessoa jurídica da autoridade efetivamente competente (há vínculo hierárquico funcional entre elas); (ii) essa autoridade apontada apresenta informações defendendo o ato no mérito, sem alegar ilegitimidade passiva; e (iii) não há alteração de competência jurisdicional em razão do erro na indicação (ou seja, o equívoco não deslocou o julgamento para órgão jurisdicional diverso do competente). Nesses casos, entende-se que a autoridade superior "encampou" o ato praticado pelo subordinado ao defender-lhe o mérito, suprindo o vício formal de indicação e passando a figurar, ela própria, no polo passivo. Essa construção pretoriana evita que meros equívocos de indicação sacrifiquem a tutela jurisdicional, privilegiando o princípio da efetividade. Importa ressaltar, entretanto, que a teoria da encampação não torna irrelevante a indicação correta da autoridade. A Lei 12.016/09 trouxe inovações para ampliar as opções do impetrante e reduzir o rigorismo anterior: por exemplo, hoje admite-se como coatora tanto a autoridade que praticou diretamente o ato quanto a autoridade superior que detenha poderes para cumprir a ordem em caso de concessão. O STJ destacou que a nova Lei do MS "tentou solucionar a questão" ao prever essa possibilidade. Contudo, persiste a exigência de pertinência: se o impetrante nomeia autoridade que nenhuma relação tem com o ato impugnado, faltará legitimidade passiva. Subsidiariedade O MS possui caráter subsidiário, somente sendo cabível quando inexistir outro meio processual eficaz à disposição do impetrante para proteção imediata de seu direito. Tal princípio da subsidiariedade está expresso no art. 5º, incisos II e III, da Lei 12.016/09, o qual veda a concessão de MS nas hipóteses em que haja recurso próprio ou outra ação cabível para corrigir a ilegalidade apontada. Dessa forma, o writ não pode ser utilizado como atalho ou substitutivo de procedimentos ordinários e recursais disponíveis. O Supremo Tribunal Federal consolidou essa diretriz nas Súmulas nº 267 ("não cabe MS contra ato judicial passível de recurso") e nº 268 ("não cabe MS contra decisão judicial transitada em julgado"). Portanto, regra geral, se o ordenamento disponibiliza ao interessado um recurso ou meio específico para impugnar o ato ou proteger seu direito, deve ele utilizar esse meio ordinário, sendo incabível recorrer diretamente ao MS, sob pena de burla ao sistema recursal e à coisa julgada. No caso de atos administrativos, isso significa, por exemplo, que não se admite MS se ainda houver recurso administrativo com efeito suspensivo cabível contra o ato impugnado, ou se existir outra ação judicial adequada (como uma ação ordinária com tutela de urgência) apta a resolver a questão em tempo hábil. No campo judicial, conforme mencionado, não cabe MS contra decisões judiciais recorríveis ou já definitivas, reforçando que o writ não pode servir de sucedâneo recursal. Essa limitação garante a estabilidade das decisões e o respeito aos prazos e competências estabelecidos, evitando que o MS se transforme em via paralela de impugnação a qualquer momento. Excepcionalmente, a jurisprudência admite temperamentos a essa regra estrita de subsidiariedade, desde que presentes circunstâncias anômalas que tornem inócua ou inexistente a via recursal ordinária. São hipóteses reconhecidas, em especial no tocante a atos de natureza judicial, nas quais o MS é tido por cabível contra atos judiciais, a saber: (i) Quando se trata de decisão judicial manifestamente teratológica ou contrária ao ordenamento, configurando flagrante abuso de poder. Nesses casos de gravíssima ilegalidade (decisão aberrante), permite-se o MS para coibir a lesão, mesmo havendo recurso, pois o recurso usual não conseguiria remediar de pronto a situação excepcional. (ii) Quando não existe recurso cabível contra o ato judicial atacado. Se a decisão for irrecorrível pelas vias ordinárias, o MS pode surgir como único meio para evitar um dano irreparável. Aqui inclui-se a situação em que há dúvida razoável sobre a existência ou adequação de recurso: o STJ já assentou que, se nem sequer é seguro que exista recurso disponível, não se deve tachar liminarmente o MS de substitutivo recursal. Nessa toada, citou-se no RMS 58.578/STJ ser legítima a impetração do MS quando houver fundada dúvida sobre a recorribilidade do ato impugnado. (iii) Quando se pretende obter efeito suspensivo a um recurso desprovido desse efeito por previsão legal. É clássica a hipótese de decisões interlocutórias que, embora recorríveis por agravo, não possuem efeito suspensivo ex lege e cuja imediata execução pode gerar dano grave ao interessado. Nessa situação, a jurisprudência passou a admitir o MS com o propósito específico de suspender os efeitos da decisão até o julgamento do recurso, suprindo a lacuna de tutela urgente. Trata-se de medida excepcional e condicionada: espera-se que o impetrante tenha, primeiro, buscado o efeito suspensivo pelos meios normais (por exemplo, requerendo ao relator do recurso, conforme permite o CPC/2015) e que demonstre concretamente o risco de dano irreparável caso a decisão permaneça eficaz. Somente diante da negativa ou da não cabimento da tutela recursal ordinária é que o MS ganha vez, evitando que a parte fique sem proteção imediata. (iv) Quando o MS é impetrado por terceiro prejudicado por decisão judicial da qual não pôde recorrer. Se um ato judicial causa efeitos gravosos a alguém que não integrou originalmente o processo (terceiro estranho à lide), esse sujeito não dispõe de recurso próprio naquele processo. Nesses casos, admite-se o MS para resguardar o direito do terceiro prejudicado, já que ele não teve oportunidade de recorrer na via ordinária. É também exemplo de utilização excepcional do mandamus, reconhecido pela doutrina e jurisprudência como cabível para evitar danos a direitos de terceiros alheios à relação processual que gerou o ato impugnado. Essas exceções visam assegurar a justiça em situações limites, nas quais a aplicação literal da regra de subsidiariedade poderia chancelar ilegalidades sem a existência de um instrumento processual útil. Tempestividade e prazo decadencial O MS deve ser impetrado tempestivamente, dentro do prazo decadencial de 120 dias contados da ciência inequívoca do ato coator pelo interessado, nos termos do art. 23 da Lei 12.016/09. Trata-se de prazo decadencial (peremptório), e não meramente prescricional, de modo que seu transcurso acarreta a perda do direito de ajuizar o MS, extinguindo o direito de ação correspondente. Essa limitação temporal foi julgada constitucional pelo STF (Súmula 632 do STF), entendimento consolidado também no julgamento da ADI 4.296/DF, que confirmou a validade do art. 23 da Lei do MS. Assim, caso o impetrante deixe escoar 120 dias desde que teve conhecimento oficial do ato ilegal/omissivo, opera-se a decadência, impedindo o conhecimento do mandamus - embora, frise-se, não extinga o direito material em si, que ainda poderá ser pleiteado por meios ordinários (como ação de rito comum). É fundamental definir corretamente o termo inicial da contagem do prazo. Em regra, considera-se como termo inicial a data em que o interessado teve ciência formal do ato impugnado. No caso de atos publicados em diário oficial (como portarias, demissões, resultados de concurso, etc.), conta-se desde a publicação, pois esta torna o ato acessível e presume-se conhecido. Em situações de notificação pessoal, conta-se do recebimento da notificação. Pedidos de reconsideração ou recursos administrativos internos não interrompem nem suspendem o prazo decadencial do MS (Súmula 430, STF). No caso da omissão administrativa, a jurisprudência admite nuances na contagem do prazo em hipóteses de ilegalidade permanente ou de efeitos continuados. Em casos de omissão continuada da Administração (situações em que a autoridade se mantém inerte diante de um dever de agir, renovando-se diariamente a violação), ou de relações de trato sucessivo (obrigações de execução continuada, como pagamentos mensais a servidor), prevalece o entendimento de que, enquanto perdurar a omissão ou se renovar periodicamente a lesão, o prazo decadencial não corre de forma simples a partir do primeiro ato. Fora dessa situação de continuidade, considera-se que o prazo começa quando a omissão se torna definitiva e consolidada (v.g. preterição em concurso público no ato de nomeação). A Lei 12.016/09 impõe o dever de indeferir liminarmente a inicial se o MS for apresentado extemporaneamente, após expirado o prazo legal (art. 10, caput). Esse controle deve ser feito já no juízo de admissibilidade. Havendo dúvida razoável sobre o termo inicial, a orientação dos tribunais é interpretar em favor do exame de mérito (pró actione), para evitar que formalidades excessivas impeçam a justiça no caso concreto. Porém, ausente qualquer justificativa plausível e constatado objetivamente o decurso de prazo superior a 120 dias, não há alternativa senão reconhecer a decadência e extinguir o feito. Efeitos da decisão A decisão proferida no MS (seja sentença concessiva ou denegatória, seja acórdão em instância superior) produz, via de regra, efeitos inter partes. Isso significa que seu alcance jurídico fica restrito às partes envolvidas naquele processo específico: de um lado, o impetrante (e eventuais litisconsortes que tenham ingressado ao seu lado); de outro, a autoridade coatora e a pessoa jurídica interessada (isto é, o órgão ou entidade à qual a autoridade se vincula). Não há, no MS individual, eficácia erga omnes ou efeito vinculante geral da decisão, mesmo que a matéria discutida seja constitucional. Trata-se de consequência natural do caráter subjetivo do writ, voltado à tutela de um direito concreto do impetrante na relação jurídica específica que ele mantém com o Poder Público. É pacífico e consolidado na Súmula 271 do STF, que a concessão de MS não produz automaticamente efeitos patrimoniais em relação a período pretérito. A decisão favorável em MS tem, por padrão, efeito ex nunc (não retroativo): ela resguarda o direito do impetrante dali em diante, mas não gera, de imediato, condenação a pagamentos ou ressarcimentos referentes a datas anteriores à impetração. Ressalte-se que a denegação desse efeito retroativo automático não impede que, posteriormente, em ação própria, o interessado pleiteie os montantes correspondentes ao período anterior. Assim, evita-se que, por meio do rito sumário do MS, o impetrante obtenha vantagem econômica pretérita sem passar pelo devido processo cognitivo quanto a esses valores. Por fim, registre-se que a decisão em MS transita em julgado e faz coisa julgada material nos limites em que apreciou o mérito. Se a segurança for concedida ou denegada com análise de mérito (v.g., reconhecendo existente ou inexistente o direito líquido e certo), forma-se coisa julgada que impede nova discussão do mesmo objeto em outro MS ou ação (salvo eventual reforma via recurso ou ação rescisória, nos termos tradicionais). Por outro lado, se o MS for extinto sem resolução de mérito ou denegado por questão processual (falta de liquidez e certeza, ilegitimidade, decadência etc.), não há coisa julgada material contra o impetrante, podendo ele ajuizar ação ordinária ou até outro MS para discutir o direito, desde que suprido o vício que impediu o mérito na primeira impetração (art. 19 da Lei 12.016/09). Medida liminar A possibilidade de concessão de medida liminar em MS é prevista no art. 7º, inciso III, da Lei 12.016/09, e sujeita-se ao preenchimento dos requisitos clássicos do provimento cautelar: o fumus boni iuris e o periculum in mora. O fumus boni iuris diz respeito à plausibilidade do direito invocado - no contexto do MS, está intimamente ligado à demonstração do direito líquido e certo, ou seja, à existência de fundamentos relevantes que evidenciem, de plano, a probabilidade de direito do impetrante. Já o periculum in mora refere-se ao perigo da demora - isto é, o risco de que a continuidade ou a demora na cessação do ato coator cause dano irreparável ou de difícil reparação ao impetrante antes do julgamento final. Presentes ambos os requisitos (fumus e periculum), pode o magistrado conceder liminarmente a suspensão do ato impugnado ou a providência requerida, conforme autoriza expressamente o art. 7º, III da Lei 12.016/09. Tal concessão pode ou não ocorrer inaudita altera parte - isto é, antes de ouvida a autoridade coatora, nos casos de justo receio de ineficácia da medida caso se aguarde as informações. Recomenda-se, entretanto, solicitar primeiro as informações da autoridade e, depois de recebê-las (ou decorrido o prazo legal sem resposta), decidir sobre a liminar. Originariamente, a Lei 12.016/09 estabelecia, em seu art. 7º, §2º (redação original), algumas vedações materiais à concessão de liminar em MS. Eram listadas hipóteses em que ficava proibido deferir liminar, tais como: compensação de créditos tributários, entrega de mercadorias e bens provenientes do exterior, reclassificação ou equiparação de servidores públicos, concessão de aumento ou extensão de vantagens a servidores, pagamento de vencimentos e outras vantagens pecuniárias retroativas, etc. Entretanto, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ADI 4.296/DF, declarou a inconstitucionalidade dessas vedações genéricas, removendo-as do ordenamento. Entendeu o STF que tal proibição absoluta de concessão de liminares afrontava a garantia constitucional do MS, pois privava o Poder Judiciário de apreciar caso a caso o periculum in mora, engessando a tutela de urgência mesmo diante de situações de evidente necessidade. Com isso, atualmente, não há vedação absoluta à concessão de liminares em MS nas matérias antes elencadas - todas as questões podem, em tese, ser objeto de liminar, desde que presentes os requisitos da cautelaridade. III - DO CASO CONCRETO Sem preliminares, passo à análise do mérito. Segundo a Lei nº 9.784/99, que regula o processo administrativo no âmbito da Administração Federal, por meio de seu art. 49, concluída a instrução de processo administrativo, a Administração tem o prazo de até trinta dias para decidir, salvo prorrogação por igual período expressamente motivada. Destaque-se que o Supremo Tribunal Federal (STF), no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 631240, por meio do voto do Relator, Ministro Luís Roberto Barroso, manifestou-se no sentido de que, nos requerimentos administrativos ao INSS, em que não houver resposta no prazo de quarenta e cinco dias, previsto no art. 41-A, § 5º, da Lei nº 8.213/1991, fica caracterizada ameaça a direito. Diante de tal quadro, necessário o entendimento de que os prazos acima debatidos não deveriam ser absolutamente rígidos, mas apenas utilizados como parâmetros objetivos, não se podendo desconsiderar o fato de que, muitas vezes, a movimentação dos processos administrativos depende de ato das partes. Assim, o entendimento mais plausível seria aquele em que o processo não poderia permanecer sem movimentação por mais de quarenta e cinco dias, sem impulso da administração. No entanto, em 10/2018 foi interposto perante o STF o Recurso Extraordinário de nº1171152. Tal recurso tramitava no curso de ação civil pública movida pelo Ministério Público Federal contra o Instituto Nacional do Seguro Social perante a Justiça Federal de Santa Catarina e o objeto dessa ação coletiva era, em síntese, a pretensão de que o INSS fosse condenado a realizar perícias médicas para a concessão de benefícios previdenciários e assistenciais no prazo máximo de 15 (quinze) dias e, se extrapolado tal prazo, fosse imediatamente concedido o benefício provisório. O Supremo Tribunal Federal recebeu o RE sob a sistemática da repercussão geral, atribuindo-lhe o número temático 1.066, com a seguinte tese a ser debatida: "Possibilidade de o Poder Judiciário (i) estabelecer prazo para o Instituto Nacional do Seguro Social realizar perícia médica nos segurados da Previdência Social e (ii) determinar a implantação do benefício previdenciário postulado, caso o exame não ocorra no prazo". Antes do julgamento desse Tema, entretanto, as partes (MPF e INSS) juntaram acordo celebrado extrajudicialmente, o qual foi homologado pelo STF no bojo do sobredito RE. O acordo celebrado possui objeto mais abrangente que o do pedido original da ACP, uma vez que não trata apenas dos prazos para a realização de perícias, mas aborda, outrossim, prazos também concessórios e revisionais. O Ministro Relator, Alexandre de Moraes, em seu voto pela homologação do acordo, frisou a legitimidade desse aumento do objeto transacionado em relação ao objeto da ação coletiva original, bem como reputou que, embora o Juízo de primeiro grau tenha limitado territorialmente os efeitos da ACP ao Estado de Santa Catarina, a abrangência do acordo é nacional e, por conseguinte, induz efeito vinculante sobre outras ações coletivas já ajuizadas, versando sobre o mesmo tema. O preceito do art. 16 da Lei nº 7.347/85, disciplina que a sentença da ação civil pública fará coisa julgada erga omnes, cabendo destacar, portanto, que a coisa julga, no caso presente, tem eficácia nacional. Assim, deve ser adotado, para efeitos de conclusão dos processos referentes à concessão de benefícios previdenciários, bem como para a realização de perícias médicas, os prazos objeto do acordo homologado pelo STF na referida ACP, conforme abaixo transcrito: CLÁUSULA PRIMEIRA O INSS compromete-se a concluir o processo administrativo de reconhecimento inicial de direitos previdenciários e assistenciais, operacionalizados pelo órgão, nos prazos máximos a seguir fixados, de acordo com a espécie e o grau de complexidade do beneficio: Espécie - Prazo para Conclusão Benefício assistencial à Pessoa com deficiência - 90 dias Benefício assistencial ao idoso - 90 dias Aposentadorias, salvo por invalidez - 90 dias Aposentadoria por invalidez comum e acidentária (aposentadoria por incapacidade permanente) - 45 dias Salário maternidade - 30 dias Pensão por morte - 60 dias Auxílio reclusão - 60 dias Auxílio doença comum e por acidente do trabalho (auxílio temporário por incapacidade) - 45 dias Auxílio acidente - 60 dias CLÁUSULA SEGUNDA 2.1. O início do prazo estabelecido na Cláusula Primeira ocorrerá após o encerramento da instrução do requerimento administrativo. 2.2. Para os fins deste acordo, considera-se encerrada a instrução do requerimento administrativo a partir da data: I - da realização da perícia médica e avaliação social, quando necessária, para a concessão inicial dos benefícios de: a) prestação continuada da assistência social à pessoa com deficiência; b) prestação continuada da assistência social ao idoso; c) aposentadoria por invalidez (aposentadoria por incapacidade permanente), acidentária ou comum; d) auxílio-doença (auxílio por incapacidade temporária), acidentário ou comum; e) auxílio-acidente; e f) pensão por morte, nos casos de dependente inválido. II - do requerimento para a concessão inicial dos demais benefícios, observada a Cláusula Quinta. CLÁUSULA TERCEIRA 3.1. A União compromete-se a promover a realização da perícia médica necessária à instrução e análise do processo administrativo de reconhecimento inicial de direitos previdenciários e assistenciais operacionalizados pelo INSS, no prazo máximo de até 45 (quarenta e cinco) dias após o seu agendamento. 3.1.1. O prazo de realização da perícia médica será ampliado para 90 (noventa) dias, nas unidades da Perícia Médica Federal classificadas como de difícil provimento, para as quais se exige o deslocamento de servidores de outras unidades para o auxílio no atendimento. 3.1.1.1. A Subsecretaria da Perícia Médica Federal (SPMF) divulgará trimestralmente as unidades que estejam com limitação operacional de atendimento, não podendo superar o percentual de 10% das unidades em nível nacional. CLÁSULA QUARTA 4.1. A realização da avaliação social, nos benefícios previdenciários e assistenciais, em que a aferição da deficiência for requisito à concessão do beneficio, dar-se-á no prazo de até 45 (quarenta e cinco) dias após agendamento. 4.1.1. O prazo de realização da avaliação social será ampliado para 90 (noventa) dias nas unidades classificadas como de difícil provimento, exigindo o deslocamento de servidores de outras unidades para auxiliar no atendimento. 4.1.1.1. O INSS divulgará trimestralmente as unidades que estejam com limitação operacional de atendimento, não podendo superar o percentual de 10% das unidades em nível nacional. Observe-se, ainda, que a transação prevê o prazo de seis meses a partir de sua homologação para aplicação dos novos prazos, a fim de que a Autarquia e a Subsecretaria de Perícia Médica Federal (SPMF) construam os fluxos operacionais que viabilizem o cumprimento dos prazos neste instrumento. Considerando que o acórdão de homologação foi publicado no DJE de 17/02/2021, os prazos previstos no debatido acordo serão aplicados a partir de 17/08/2021, não sendo, portanto, os novos prazos acordados aplicáveis aos requerimentos administrativos anteriores a tal data. Verifico do caso em concreto, que o impetrante instruiu o requerimento de forma correta, colacionando as provas necessárias. Noutro giro, segundo informações prestadas pelo próprio INSS no 367007389, o pedido segue aguardando análise administrativa. Assim, extrapolado o prazo legalmente previsto, reputo comprovada a ilegalidade por omissão administrativa. Por fim, considerando a demora na resposta da autoridade administrativa, por mais de 180 dias, a contar da data da realização da perícia médica, a concessão da segurança, nos termos do art. 487, I, do Código de Processo Civil (CPC), é medida que ora se impõe. IV - DISPOSITIVO Ante o exposto, resolvo CONCEDO A SEGURANÇA para determinar ao INSS que, no prazo de 30 (trinta) dias, a contar da intimação, aprecie e conclua o requerimento administrativo formulado pela parte impetrante. Presentes os requisitos previstos no art. 7º, inciso III, da Lei nº 12.016/2009, quais sejam, a relevância do fundamento (fumus boni iuris), claramente demonstrado pela concessão da segurança, e o risco de ineficácia da medida final (periculum in mora), que decorre da natureza eminentemente alimentar do benefício pleiteado, DEFIRO A MEDIDA LIMINAR para antecipar os efeitos da tutela mandamental, determinando à autoridade coatora, que conclua o referido processo administrativo no prazo máximo de 30 (trinta) dias, incluindo, nesse lapso, eventual realização de avaliação social, se imprescindível ao deferimento do pedido. Custas pela parte impetrada, que delas é isenta (art. 4º da Lei nº 9.289/96). Sem condenação em honorários advocatícios sucumbenciais (art. 25 da Lei nº 12.016/2009). Intimem-se: (a) autoridade coatora para cumprimento integral da decisão; (b) o órgão de representação judicial da pessoa jurídica interessada; (c) a parte impetrante, por meio de seu advogado. Fica dispensada nova intimação do Ministério Público Federal, em razão do teor de sua manifestação já constante nos autos. Sentença sujeita ao duplo grau de jurisdição obrigatório, nos termos do art. 14, §1º, da Lei nº 12.016/2009. Em caso de interposição de recurso de apelação, intime-se o recorrido para apresentação de contrarrazões no prazo de 15 dias, conforme art. 1.010, §1º do CPC. Após o decurso do prazo, encaminhem-se os autos ao Tribunal Regional Federal da 2ª Região, para apreciação conjunta do recurso voluntário e da remessa necessária. Transitada em julgado a presente decisão, adotem-se as providências necessárias e arquivem-se os autos. Ponta Porã/MS, na data registrada em assinatura eletrônica. Observação: a integralidade do processo poderá ser acessáda por meio do link abaixo, mediante preenchimento do número do processo e do código a seguir (campo CÓDIGO PARA CONSULTA DE DOCUMENTOS): link: https://pje1g.trf3.jus.br/pje/ConsultaPublica/consultaPublicaDocumento.seam. Código: 23086e06-6e10-4bdd-9554-a7fbb06248ab RAFAEL FIGUEIREDO BRAZ SPIRLANDELLI Juiz Federal Substituto
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