Processo nº 0010182-11.2020.8.17.2810
ID: 277255444
Tribunal: TJPE
Órgão: Gabinete da 1ª Vice Presidência Segundo Grau
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 0010182-11.2020.8.17.2810
Data de Disponibilização:
23/05/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
GIZA HELENA COELHO
OAB/SP XXXXXX
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Tribunal de Justiça de Pernambuco Poder Judiciário Gabinete da 1ª Vice Presidência RECURSO ESPECIAL NO PROCESSO Nº 0010182-11.2020.8.17.2810 RECORRENTE: BANCO DO BRASIL S/A RECORRIDO: REGINALDO XAVIE…
Tribunal de Justiça de Pernambuco Poder Judiciário Gabinete da 1ª Vice Presidência RECURSO ESPECIAL NO PROCESSO Nº 0010182-11.2020.8.17.2810 RECORRENTE: BANCO DO BRASIL S/A RECORRIDO: REGINALDO XAVIER DA FONSECA EMENTA: DIREITO CIVIL. ADMISSÃO DE RECURSO ESPECIAL COMO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. TERMO INICIAL DA PRESCRIÇÃO NAS AÇÕES QUE DISCUTEM SAQUES INDEVIDOS E DESFALQUES EM CONTAS PASEP. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. DATA DO SAQUE DA APOSENTADORIA OU DATA DE OBTENÇÃO DOS EXTRATOS E MICROFICHAS. TEORIA DA ACTIO NATA. COMPLEMENTAÇÃO DO TEMA 1150/STJ. QUESTÃO IDÊNTICA DE DIREITO REPETIDA EM MÚLTIPLOS PROCESSOS. AFETAÇÃO PELO RITO DOS RECURSOS REPETITIVOS. NECESSIDADE. DECISÃO Recurso especial interposto com fundamento no artigo 105, III, alíneas “a” e “c”, da Constituição Federal contra acórdão proferido em agravo interno na apelação cível (id. 43678404), integrado por embargos de declaração (id. 45807364). Consta na ementa do acórdão recorrido (id. 40414832): DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO EM APELAÇÃO CÍVEL. PROVIMENTO MONOCRÁTICO DO RECURSO. AÇÃO INDENIZATÓRIA. SUPOSTOS DESFALQUES INDEVIDOS EM CONTA VINCULADA AO PASEP. INOCORRÊNCIA DA PRESCRIÇÃO. TEMA 1.150 DO STJ. PRINCÍPIO DO ACTIO NATA. TERMO INICIAL DO PRAZO PRESCRICIONAL. DATA DA CIÊNCIA INEQUÍVOCA DO DANO. ANULAÇÃO DA SENTENÇA. DESPROVIMENTO DO RECURSO. 1. Nos termos do Tema Repetitivo 1.150 do STJ, a pretensão ao ressarcimento dos danos havidos em razão dos desfalques em conta individual vinculada ao PASEP se submete ao prazo prescricional decenal previsto pelo art. 205 do Código Civil. O termo inicial para contagem do prazo prescricional flui a partir do dia em que o titular, comprovadamente, toma ciência dos desfalques realizados na conta individual vinculada ao PASEP, segundo o princípio da actio nata. 2. À míngua de prova em sentido diverso, tem-se que a parte autora teve a inequívoca ciência dos desfalques indevidos na data da obtenção dos extratos e/ou microfilmes da conta PASEP, momento em que teve condições de aferir a totalidade de valores creditados e debitados de sua conta e assim, constatar eventual extensão do suposto dano. Não é possível exigir que o titular comprove que não teve ciência de tais fatos em data anterior, porquanto isso implicaria na imposição do ônus de demonstrar fato negativo (prova “diabólica”). 3. Incumbiria ao Banco do Brasil, ao apontar fato impeditivo/modificativo/extintivo do direito autoral (art. 373, II, do CPC), evidenciar que a ciência ocorreu em data diversa da alegada pelo titular da conta, ônus do qual não se desincumbiu. 4. Agravo interno desprovido. Opostos embargos de declaração pelo recorrente, o entendimento do Colegiado ficou assim ementado (id. 44539560): DIREITO PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM APELAÇÃO CÍVEL. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DE QUALQUER DOS VÍCIOS DO ART. 1.022 DO CPC. INTUITO DE REDISCUSSÃO DA MATÉRIA DE FATO E DE DIREITO JÁ ENFRENTADA NO ACÓRDÃO. NÃO ACOLHIMENTO DOS EMBARGOS. 1. As questões postas na lide foram examinadas e decididas pela câmara julgadora, não havendo vício a ser sanado no julgado, cujo resultado desfavoreceu a posição sustentada pelo embargante, pelo que se percebe que a pretensão é a de reabrir a discussão, com vista à obtenção de novo julgamento, inteiramente descabido no sítio dos embargos de declaração. 3. Embargos de declaração rejeitados. Nas razões do recurso especial (id. 46654309), a parte insurgente alega violação aos arts. 17 e 485, VI, ambos do Código de Processo Civil, sustentando a necessidade de realização de distinguishing no caso concreto para reconhecer a ilegitimidade passiva do Banco do Brasil nas ações que visam substituir os índices oficiais de remuneração do PASEP. Insurge-se contra o afastamento da prescrição, defendendo a aplicação do prazo quinquenal previsto no art. 1º do Decreto-Lei 20.910/32, conforme decidido pelo STJ no Tema nº 545[1]. Aponta, quanto ao termo inicial da prescrição, divergência jurisprudencial e ofensa aos arts. 189[2] e 205[3], do Código Civil, bem como aos arts. 373, I[4], e 487, II[5], do CPC. Nesse ponto, argumenta que, ainda que se considere o prazo prescricional decenal, “a ciência do desfalque foi na data do saque, não podendo considerar o termo a quo somente quando solicitado extrato”. Assevera que o Tribunal de origem adotou equivocada interpretação Tema 1.150/STJ[6], pois a parte autora teve conhecimento do saldo da conta Pasep quando de sua aposentadoria, e, ao sacar montante reputado incompatível, tomou ciência dos alegados desfalques, sendo de rigor o reconhecimento da prescrição, sob pena de afronta ao princípio da segurança jurídica. Colaciona julgados paradigmas do TJ-RJ, do TJ-RS e do TJ-RN, no sentido de que o saque realizado por ocasião da aposentadoria confere ciência ao titular quanto ao valor existente na conta, iniciando-se a contagem da prescrição. Assim, aduz que o beneficiário tomou conhecimento das supostas irregularidades a partir do saque integral do saldo depositado na conta. A parte recorrida apresentou contrarrazões (id. 47570175), defendendo que o TJPE aplicou corretamente o Tema 1.150/STJ, cuja tese não comporta leitura reducionista ou literal, mas sim interpretação teleológica: “proteger o jurisdicionado contra prejuízos decorrentes de atos ilícitos praticados sob aparente regularidade bancária”. Ressalta que o vocábulo “comprovadamente” inserido no item III da tese afasta qualquer presunção genérica de ciência do dano, fixando-se como marco inicial prescricional o momento exato em que o correntista teve condições concretas de aferir os lançamentos irregulares. Argumenta ainda que “no caso concreto, restou devidamente demonstrado que a parte autora apenas tomou ciência dos saques indevidos após requisitar, de forma presencial, os microfilmes e extratos bancários junto à instituição financeira. (...) Somente com esses dados foi possível ao titular da conta identificar a conduta ilícita, circunstância que fundamenta, com exatidão, o afastamento da prescrição, nos moldes definidos pelo STJ”. É o que havia a relatar. Decido. O recurso especial é tempestivo, tendo em vista que a parte tomou ciência do acórdão em 21/02/2025 (certidão id. 46665073) e interpôs o recurso em 20/03/2025, dentro do prazo legal, considerando os feriados locais e suspensões de expediente nos dias 28/02 a 07/03/2025 (Carnaval e Data Magna de Pernambuco), devidamente comprovados por meio da juntada de cópia do Ato Conjunto nº 42/2024, extraído do DJ 228/2024 (id. 46654315). O preparo recursal foi comprovado, conforme guias de recolhimento (ids. 46654313 e 46654314) e comprovantes de pagamento (ids. 46654310 e 46654312). Representação processual regular, conforme instrumento de procuração de id. 39494841. Verifico, igualmente, o atendimento aos requisitos recursais intrínsecos, a saber: (i) legitimação – o recorrente é parte ré na ação; (ii) interesse – há demonstração da utilidade e necessidade do provimento jurisdicional pleiteado; (iii) inexistência de fato impeditivo ou extintivo do poder de recorrer – requisito negativo atendido, uma vez que não vislumbro qualquer destes fatos. Os requisitos especiais do apelo excepcional também restam atendidos: (i) a controvérsia que subsidia a pretensão recursal não configura hipótese que reclama retenção ou sobrestamento do apelo excepcional, ante da inexistência de afetação ao rito dos recursos repetitivos – conforme distinguishing do Tema 1.300/STJ, explanado no tópico seguinte – nem a recurso extraordinário com repercussão; (ii) a análise da controvérsia prescinde de reexame de prova; (iii) a matéria está prequestionada; e (iv) houve o exaurimento das instâncias ordinárias. Distinguishing: diferença entre a situação fática dos autos e o Tema 1.300/STJ De início, é importante ressaltar que a controvérsia objeto da pretensão recursal se distingue do objeto do Tema nº 1.300 do STJ, submetido à sistemática dos recursos repetitivos versada no art. 1.036, CPC, com determinação de suspensão do processamento de todos os processos pendentes, individuais ou coletivos, que versem sobre a mesma matéria e tramitem no território nacional. Os recursos afetados como paradigmas do referido tema repetitivo, fruto de seleção de representativos por iniciativa desta 1ª Vice-Presidência, visam definir “a qual das partes compete o ônus de provar que os lançamentos a débito nas contas individualizadas do PASEP correspondem a pagamentos ao correntista” (REsps 2162222/PE, 2162223/PE, 2162198/PE e 2162323/PE). Todavia, conforme relatado, o acórdão proferido nos presentes autos e o recurso especial interposto não versam sobre ônus da prova, mas sobre o momento de ocorrência da ciência inequívoca do dano, enquanto termo inicial da prescrição nas ações envolvendo saques indevidos e desfalques em contas Pasep. Trata-se, na realidade, de divergência jurisprudencial acerca da interpretação e aplicação das teses fixadas pelo STJ no Tema Repetitivo 1.150. Dessa forma, o sobrestamento de recursos sobre essa questão se revelaria inócuo, na medida em que, após o julgamento do precedente vinculante no Tema 1.300/STJ, uniformizando o entendimento a respeito da distribuição dos encargos probatórios, não será possível aplicá-lo de imediato ao caso em exame. Isto é, não haverá como aferir eventual conformidade do acórdão recorrido com a orientação do tribunal superior, nos termos do art. 1.040, I e II, do CPC (negativa de seguimento ou encaminhamento para juízo de retratação), pois não houve qualquer decisão sobre a qual das partes compete o ônus da prova dos fatos na presente demanda. Demonstrada a distinção entre o caso em análise e as demandas que deverão ser julgadas de acordo com o Tema 1.300/STJ, entendo devido o prosseguimento do feito, nos termos do § 9º do art. 1.037, CPC. Da admissão do recurso especial como representativo da controvérsia: Consoante estabelecem o art. 1.030, IV, do Código de Processo Civil[7], e a Recomendação nº 134/2022 do CNJ (art. 22[8]), o Presidente ou o Vice-Presidente do tribunal recorrido deverá selecionar recurso como representativo de controvérsia constitucional ou infraconstitucional (nos termos do art. 1.036, §§ 1º e 6º do CPC[9] – afetação para julgamento sob o rito dos repetitivos), sempre que houver multiplicidade de recursos extraordinários ou especiais com fundamento em idêntica questão de direito. A providência incumbida pelo Novo CPC aos Tribunais de origem também foi objeto de fomento e estímulo pela Carta do Rio de Janeiro, assinada no III Encontro de Vice-Presidentes, em dezembro de 2024, em que se reafirmou o compromisso com a seleção de temas representativos da controvérsia[10]. Compulsando os autos, observo que o recurso em exame é admissível para figurar como representativo de controvérsia infraconstitucional, visto que, além de preencher os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade recursal, possui abrangente argumentação e discussão a respeito de questões centrais a serem dirimidas pela Corte Superior, nos moldes determinados pelo §6º, do art. 1.036, do CPC. Há nesta 1ª Vice-Presidência reiterados recursos especiais com fundamento em questão de direito idêntica, qual seja: se o termo inicial da prescrição, nas ações envolvendo eventual falha na prestação do serviço de administração das contas Pasep, saques indevidos e desfalques, deve ser fixado na data do saque da aposentadoria ou na data de acesso aos extratos microfilmados da movimentação das contas. Discute-se, em suma, quando se deve considerar que houve a inequívoca ciência dos desfalques, por parte do titular da conta – (i) se no momento em que este sacou os valores, por ocasião de sua aposentadoria, sob o fundamento de que já teria, nesta data, conhecimento dos prejuízos sofridos, em razão do saldo disponibilizado da conta individual do fundo; ou, por outro lado, (ii) se no momento em que obteve os extratos e microfichas fornecidos pela instituição financeira, pois somente então teria tomado efetiva ciência dos danos e da extensão de suas consequências, segundo a teoria da actio nata em seu viés subjetivo. A matéria da presente controvérsia é objeto também de pedidos de instauração de Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas[11], formulados com base no art. 976 do CPC e no art. 433 do Regimento Interno do TJPE, a fim de uniformizar o entendimento dentro do Tribunal de Justiça de Pernambuco. Destaco que se trata de divergência interpretativa acerca de questões remanescentes do Tema 1.150/STJ (REsp 1.895.936/TO, REsp 1.895.941/TO e REsp 1.951.931/DF), julgado sob a sistemática dos recursos repetitivos, no qual restaram assentadas as seguintes teses: Tema 1.150/STJ: i) o Banco do Brasil possui legitimidade passiva ad causam para figurar no polo passivo de demanda na qual se discute eventual falha na prestação do serviço quanto a conta vinculada ao Pasep, saques indevidos e desfalques, além da ausência de aplicação dos rendimentos estabelecidas pelo Conselho Diretor do referido programa; ii) a pretensão ao ressarcimento dos danos havidos em razão dos desfalques em conta individual vinculada ao Pasep se submete ao prazo prescricional decenal previsto pelo artigo 205 do Código Civil e iii) o termo inicial para a contagem do prazo prescricional é o dia em que o titular, comprovadamente, toma ciência dos desfalques realizados na conta individual vinculada ao Pasep. Com efeito, no item III do precedente vinculante, o STJ estabeleceu que o prazo prescricional se inicia somente quando o titular do direito subjetivo violado passa a conhecer o fato e a extensão de suas consequências, conforme o princípio da actio nata. Nesse diapasão, definiu que, em tais demandas, “o termo inicial para a contagem do prazo prescricional é o dia em que o titular toma ciência dos desfalques realizados na conta individual vinculada ao Pasep”. Da leitura do inteiro teor do julgamento proferido nos recursos paradigmas REsp 1.895.936/TO e REsp 1.895.941/TO, extrai-se que o STJ manteve integralmente acórdãos do TJ-TO que, aplicando a teoria da actio nata, assentaram que o conhecimento da suposta lesão e de suas consequências pelo titular “somente podem ser aferíveis a partir do acesso deste ao extrato de movimentação da conta PASEP”, correndo a partir desta data o fluxo prescricional, conforme ementas transcritas no voto do Exmo. Min. Relator. Decidiu-se, na ocasião, que “em relação às Teses aqui fixadas [Tema 1.150], o acórdão de origem decidiu de acordo com o entendimento deste eg. STJ, de modo que não merece reforma”. Conforme relatam Leonardo Carneiro da Cunha e Marcelo Luz Chaves, em texto sobre o assunto[12], a proposta de tese trazida originalmente pelo Relator Min. Herman Benjamin, no julgamento do Tema 1.150, firmava o termo inicial da prescrição no “dia em que o titular toma ciência dos desfalques”. Após sugestão do Exmo. Min. Sérgio Kukina, foi acrescentada a expressão “comprovadamente”, a fim de explicitar a análise do respaldo probatório quanto à ciência dos desfalques, o que indica a adoção da vertente subjetiva da teoria da actio nata em tais hipóteses. A terceira tese recebeu, então, a seguinte redação: “O termo inicial para a contagem do prazo prescricional é o dia em que o titular, comprovadamente, toma ciência dos desfalques realizados na conta individual vinculada ao Pasep”. Contudo, não constou expressamente na formulação da tese a data de obtenção dos extratos como parâmetro, tal como consignavam os arestos do TJ-TO nos casos paradigmas. Assim, na aplicação do referido precedente aos casos concretos, emerge relevante dissonância entre os Tribunais de Justiça de todo país a respeito do momento em que se configura a efetiva ciência do dano pelos titulares e, por conseguinte, o dies a quo para a contagem do lapso prescricional. A dispersão jurisprudencial na interpretação da tese nº III do Tema 1.150 gera insegurança jurídica na aplicação do sistema de precedentes, sobretudo quanto às providências determinadas no art. 1.030, I e II, do CPC. Identifica-se a necessidade de melhor esclarecimento da matéria, inclusive a fim de propiciar a aferição da correta adequação e conformidade dos acórdãos com o precedente fixado, seja por meio da negativa de seguimento aos recursos especiais interpostos, seja por meio do encaminhamento dos autos ao órgão julgador para juízo de retratação. Propõe-se, diante disso, uma afetação complementar ao Tema 1.150/STJ, para que se estabeleça a exata compreensão da tese definida e de suas consequências práticas. Situação fática específica na qual surgiu a controvérsia: O recurso em exame é admissível e há abrangente argumentação e discussão a respeito da questão a ser decidida. Trata-se, na espécie, ação ordinária movida em face do Banco do Brasil visando a reparação de danos morais e materiais em razão de saques indevidos e desfalques em conta individual vinculada ao Pasep, decorrentes de má gestão e falha na prestação do serviço. A sentença proferida pela magistrada de primeiro grau julgou extinta a pretensão pelo advento da prescrição, considerando como termo inicial do prazo a data da aposentadoria e recebimento dos créditos (maio de 1994). A apelação do autor foi provida por decisão monocrática do Des. Relator (id. 35986674), mantida pelo acórdão ora impugnado, que negou provimento ao agravo interno do banco, sob o fundamento de que o início do prazo prescricional, nos termos fixados pelo STJ no Tema 1.150, é a data em que a parte autora teve acesso ao extrato da conta PASEP (09/07/2019). Nesse sentido, confira-se o seguinte trecho extraído do voto condutor do julgamento (id. 40414831): À míngua de prova em sentido diverso, tem-se que a parte autora teve a inequívoca ciência dos desfalques indevidos na data da obtenção dos extratos e/ou microfilmes da conta PASEP, momento em que teve condições de aferir a totalidade de valores creditados e debitados de sua conta ao longo dos anos, e, bem assim, constatar eventual extensão do suposto dano. Não é possível exigir que o titular comprove que não teve ciência de tais fatos em data anterior, porquanto isso implicaria na imposição do ônus de demonstrar fato negativo (prova “diabólica”). Na mão inversa, incumbiria ao Banco do Brasil, ao apontar fato impeditivo/modificativo/extintivo do direito autoral (art. 373, II, do CPC), evidenciar que a ciência ocorreu em data diversa da alegada pelo titular da conta, ônus do qual não se desincumbiu. Tal fato, inclusive, ser-lhe-ia de fácil demonstração, por exemplo, através de prova do encaminhamento ou da disponibilização periódica da conta PASEP à parte autora em momento anterior. Por fim, insta ressaltar, mais uma vez, a existência de relevante quantidade de processos tramitando neste eg. Tribunal sobre a temática em questão, cuja solução apresenta divergência inclusive dentro dos próprios órgãos fracionários. Com efeito, os julgadores das Câmaras com competência cível deste Tribunal estão em dissenso sobre a matéria, o que se verifica também, e com ainda mais relevância, entre outros Tribunais de Justiça do país, que adotam divergentes interpretações sobre o tema. No âmbito desta Corte, é possível observar que a 1ª Turma da Câmara Regional de Caruaru tem se posicionado, via de regra, pela fixação do termo inicial da prescrição na data do saque da aposentadoria, ao passo que a 1ª, 2ª e 3ª Câmaras Cíveis entendem que a ciência inequívoca ocorre com a obtenção dos extratos. A propósito, na 4ª Câmara Cível, verifica-se discrepância inclusive entre os Desembargadores que a compõem, colhendo-se acórdãos ora em um sentido, ora em outro. Ademais, a questão jurídica apresentada encontra ampla dissonância entre os Tribunais de Justiça, como bem ilustram, apenas a título exemplificativo, os seguintes julgados recentes do TJMG, do TJCE e do TJDFT: “O termo inicial para a contagem da prescrição ocorre quando o titular, comprovadamente, toma ciência dos desfalques realizados, o que, em regra, dá-se com o acesso ao extrato completo da conta PASEP”. (TJMG - Apelação Cível 1.0000.25.020765-1/001, Relator(a): Des.(a) Lúcio de Brito, 15ª Câmara Cível, publicação em 15/04/2025) “O termo inicial da contagem do prazo prescricional é o momento em que o titular toma ciência dos desfalques realizados na conta individual, geralmente no ato do saque do benefício”. (TJMG - Apelação Cível 1.0000.25.075755-6/001, Relator(a): Des.(a) Rui de Almeida Magalhães, 11ª Câmara Cível, publicação em 23/04/2025) “O termo inicial do prazo prescricional decenal aplicável às pretensões de ressarcimento por alegados desfalques e ausência de correção monetária adequada em conta vinculada ao PASEP ocorre no momento em que o titular, comprovadamente, toma ciência das irregularidades, o que se configura com o acesso aos extratos microfilmados fornecidos pela instituição financeira administradora, sendo inadmissível presumir tal conhecimento pelo mero saque dos valores disponíveis na conta vinculada ou pela consulta a extratos simplificados”. (TJCE - Apelação Cível 0206319-58.2024.8.06.0117, Rel. Des.(a) DJALMA TEIXEIRA BENEVIDES, 4ª Câmara Direito Privado, publicação em 16/04/2025) “Deste modo, no caso em tela, a contagem do prazo para o exercício do direito de ação, à luz do princípio da actio nata, se inicia na data em que o beneficiário da conta tem ciência do saldo que reputa desfalcado, o que coincide, na maioria dos casos, com o momento em que realiza o saque dos valores que lhe são devidos”. (TJCE - Apelação Cível 0200597-95.2024.8.06.0132, Rel. Des.(a) JOSE EVANDRO NOGUEIRA LIMA FILHO, 4ª Câmara Direito Privado, publicação em 15/04/2025) “Quando realizou o saque, o autor não recebeu qualquer extrato com o demonstrativo de créditos e débitos do período, de modo que não teria como saber a extensão do dano. Por isso, o termo inicial do prazo prescricional deve ser a data de obtenção dos extratos microfilmados”. (TJDFT - Acórdão 1970583, 0737639-07.2021.8.07.0001, Relator(a): LEONOR AGUENA, 5ª Turma Cível, DJe: 27/02/2025) “A ciência inequívoca do saldo da conta PASEP ocorre no momento do saque, sendo este o termo inicial para a contagem do prazo prescricional”. (TJDFT - Acórdão 1979900, 0708021-94.2024.8.07.0006, Relator(a): CARMEN BITTENCOURT, 8ª Turma Cível, DJe: 28/03/2025) No âmbito do Tribunal de Justiça do Acre, o Centro de Inteligência (CIJEAC), também identificando o dissídio jurisprudencial sobre o tema, emitiu nota técnica propondo que o Poder Judiciário local “adote como termo inicial do prazo prescricional a data do saque, pelo titular, do saldo da conta vinculada ao PASEP”[13]. Nesse contexto, a adoção do expediente previsto no art. 1.036, § 1º, do Código de Processo Civil, visa não apenas estancar a proliferação de decisões conflitantes no âmbito desta e de outras Cortes de Justiça do país, mas, sobretudo, evitar a remessa de diversos recursos especiais e respectivos agravos sobre idêntica matéria à Corte da Cidadania. Prestigia-se, assim, a racionalidade na gestão dos casos repetitivos e a segurança jurídica, com reflexo na solução isonômica de situações de direito equivalentes. Desse modo, considerando não só a multiplicidade de recursos especiais com fundamento em idêntica questão de direito, mas também a ausência de uniformidade de entendimento nos próprios órgãos do Poder Judiciário, bem como a abrangência da discussão e da argumentação contida nos autos, seleciono o presente recurso especial como representativo da controvérsia e determino a remessa dos autos ao STJ para que aquela Corte Superior possa deliberar sobre a conveniência de afetar a matéria para julgamento segundo a sistemática dos recursos repetitivos. Delimitação da questão jurídica: A discussão trazida é de inegável importância, revelando-se essencial que o Colendo Superior Tribunal de Justiça aponte a correta interpretação a ser dada aos arts. 189 e 205, do Código Civil, e ao item III da tese firmada no Tema Repetitivo nº 1.150. Assim, o que se pretende afetar à sistemática dos julgamentos repetitivos consiste em uniformizar o entendimento a respeito da controvérsia assim delimitada: Definir se, nas ações envolvendo eventual falha na prestação do serviço de administração das contas Pasep, saques indevidos e desfalques, o termo inicial da prescrição, estabelecido no Tema 1.150/STJ, refere-se à data do saque da aposentadoria ou à data de acesso aos extratos e/ou microfichas da movimentação das contas. Códigos de assunto na Tabela Processual Unificada do Conselho Nacional de Justiça[14] (Versão: 1.21.00 – Atualizada em: 15/04/2025) • 10163 - PIS/PASEP • 5632 - Prescrição e Decadência Quantidade de processos na origem com a mesma questão de direito: É possível encontrar cerca de 45 (quarenta e cinco) processos sobre o tema conclusos nesta 1ª Vice-Presidência, os quais ficarão suspensos na origem, com fulcro no § 1º do art. 1.036, do CPC, e art. 256, § 2º, IV, do RISTJ. Já no que tange ao quantitativo total de processos sobre o assunto no âmbito deste Tribunal, uma breve consulta à base de dados da jurisprudência do TJPE, utilizando expressões relacionadas, reportou 485 (quatrocentos e oitenta e cinco) acórdãos, o que confirma a multiplicidade de demandas envolvendo tal questão. Cumpre ressaltar, por fim, que as atividades de sobrestamento em todo o Estado se iniciarão a partir desta decisão, não havendo como precisar, neste momento e etapa processual, o número exato de processos em trâmite na 1ª e 2ª instâncias. Outros recursos especiais representativos da mesma controvérsia: Nos termos do art. 1.036, § 1º, do CPC, e do art. 256, § 2º, V, do Regimento Interno do STJ, informo que, conjuntamente com o presente processo, estão sendo remetidos como representativos da mesma controvérsia, os recursos especiais interpostos nos seguintes processos: • 0000835-52.2024.8.17.2150 – 1ª Turma da Câmara Regional de Caruaru • 0005147-51.2024.8.17.2480 – 1ª Turma da Câmara Regional de Caruaru • 0000332-14.2021.8.17.3580 – 4ª Câmara Cível Tendo em vista, ainda, o teor do art. 256, § 1º, do RISTJ, destaco que a seleção levou em conta a diversidade de fundamentos adotados por diferentes Desembargadores Relatores – evidenciando a divergência entre órgãos julgadores deste Tribunal – além da pluralidade de argumentos deduzidos nos recursos e a devida representação das teses em confronto. Dispositivos legais em que se fundaram, explícita ou implicitamente, os acórdãos recorridos: • Arts. 189 e 205, do Código Civil. • Art. 487, II, do Código de Processo Civil de 2015. • Art. 373, I e II, do CPC/2015. Dispositivo: Ante o exposto, com fundamento no art. 1.030, IV, c/c art. 1.036, § 1º, do CPC, ADMITO o presente recurso especial como representativo da controvérsia (RRC) a respeito da seguinte questão de direito: Definir se, nas ações envolvendo eventual falha na prestação do serviço de administração das contas Pasep, saques indevidos e desfalques, o termo inicial da prescrição, estabelecido no Tema 1.150/STJ, refere-se à data do saque da aposentadoria ou à data de acesso aos extratos e/ou microfichas da movimentação das contas. Nos termos do art. 1.036, § 1º, CPC, DETERMINO A SUSPENSÃO do trâmite de todos os processos pendentes, individuais ou coletivos, que tramitem no Estado, em todas as instâncias deste Tribunal de Justiça (1º e 2º graus), e que versem acerca da mesma questão de direito, até o pronunciamento da Corte Superior. Ao CARTRIS, para adoção das seguintes providências: 1) Intimem-se as partes; 2) Comunique-se o teor desta decisão aos NUGEPNACs do STJ e do TJPE, bem como à Comissão Gestora de Precedentes do STJ e à Comissão de Precedentes deste TJPE, informando também o encaminhamento dos recursos especiais interpostos nos processos nº 0000835-52.2024.8.17.2150, nº 0005147-51.2024.8.17.2480 e nº 0000332-14.2021.8.17.3580, como candidatos a representativos da mesma controvérsia. 3) Após, remetam-se os presentes autos ao Egrégio STJ. Recife, data da certificação digital. Des. Fausto Campos 1º Vice-Presidente do TJPE [1] Tema Repetitivo nº 545/STJ: É de cinco anos o prazo prescricional da ação promovida contra a União Federal por titulares de contas vinculadas ao PIS/PASEP visando à cobrança de diferenças de correção monetária incidente sobre o saldo das referidas contas, nos termos do art. 1º do Decreto-Lei 20.910/32. [2] Art. 189. Violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue, pela prescrição, nos prazos a que aludem os arts. 205 e 206. [3] Art. 205. A prescrição ocorre em dez anos, quando a lei não lhe haja fixado prazo menor. [4] Art. 373. O ônus da prova incumbe: I - ao autor, quanto ao fato constitutivo de seu direito; [5] Art. 487. Haverá resolução de mérito quando o juiz: [...] II - decidir, de ofício ou a requerimento, sobre a ocorrência de decadência ou prescrição; [6] Tema Repetitivo nº 1.150/STJ: i) o Banco do Brasil possui legitimidade passiva ad causam para figurar no polo passivo de demanda na qual se discute eventual falha na prestação do serviço quanto a conta vinculada ao Pasep, saques indevidos e desfalques, além da ausência de aplicação dos rendimentos estabelecidas pelo Conselho Diretor do referido programa; ii) a pretensão ao ressarcimento dos danos havidos em razão dos desfalques em conta individual vinculada ao Pasep se submete ao prazo prescricional decenal previsto pelo artigo 205 do Código Civil; e iii) o termo inicial para a contagem do prazo prescricional é o dia em que o titular, comprovadamente, toma ciência dos desfalques realizados na conta individual vinculada ao Pasep. [7] Art. 1.030. Recebida a petição do recurso pela secretaria do tribunal, o recorrido será intimado para apresentar contrarrazões no prazo de 15 (quinze) dias, findo o qual os autos serão conclusos ao presidente ou ao vice-presidente do tribunal recorrido, que deverá: (...) IV – selecionar o recurso como representativo de controvérsia constitucional ou infraconstitucional, nos termos do § 6º do art. 1.036; [8] Art. 22. Recomenda-se que seja adotado o procedimento do recurso especial ou extraordinário representativo da controvérsia (CPC/2015, art. 1.036, § 1º) em situações que indiquem distinção ou superação de precedentes. Com isso, haverá a admissão de 2 (dois) ou mais processos e o sobrestamento dos demais feitos com mesma questão jurídica possivelmente distinta ou superada. [9] Art. 1.036. Sempre que houver multiplicidade de recursos extraordinários ou especiais com fundamento em idêntica questão de direito, haverá afetação para julgamento de acordo com as disposições desta Subseção, observado o disposto no Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal e no do Superior Tribunal de Justiça. § 1º O presidente ou o vice-presidente de tribunal de justiça ou de tribunal regional federal selecionará 2 (dois) ou mais recursos representativos da controvérsia, que serão encaminhados ao Supremo Tribunal Federal ou ao Superior Tribunal de Justiça para fins de afetação, determinando a suspensão do trâmite de todos os processos pendentes, individuais ou coletivos, que tramitem no Estado ou na região, conforme o caso. (...) § 6º Somente podem ser selecionados recursos admissíveis que contenham abrangente argumentação e discussão a respeito da questão a ser decidida. [10] “Os Vice-Presidentes de Tribunais de Justiça, reunidos no Rio de Janeiro/RJ, no final do III Encontro de Vice-Presidentes, ocorrido nos dias 12 e 13 de dezembro de 2024, divulgam, para conhecimento público, suas conclusões, aprovadas por unanimidade. [...] 2. RATIFICAR o compromisso de seleção de pelo menos um tema representativo de controvérsia (art. 1.036, § 1º, do CPC) em cada Vice-Presidência, ou Presidência de Seção, por mês, se possível, contendo questão relevante ou repetitiva, com encaminhamento ao Supremo Tribunal Federal e ao Superior Tribunal de Justiça”. [11] Processos nºs. 0014884-78.2024.8.17.2480 e 0017177-21.2024.8.17.2480. [12] Disponível em:
. Acesso em 29/04/2025. [13] Nota Técnica nº 13/2024. Disponível em:
. Acesso em 25/04/2025. [14] Disponível em: https://www.cnj.jus.br/sgt/consulta_publica_assuntos.php
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