Processo nº 5675838-57.2023.8.09.0137
ID: 280394537
Tribunal: TJGO
Órgão: Rio Verde - 2º Juizado Especial Cível e Criminal
Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL
Nº Processo: 5675838-57.2023.8.09.0137
Data de Disponibilização:
27/05/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
VICTÃÂRIA DO AMARAL JURKOVICH
OAB/SP XXXXXX
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Estado de GoiásPoder JudiciárioComarca de Rio Verde2º Juizado Especial Cível e CriminalSENTENÇA Processo nº : 5675838-57.2023.8.09.0137 Classe processual : PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO…
Estado de GoiásPoder JudiciárioComarca de Rio Verde2º Juizado Especial Cível e CriminalSENTENÇA Processo nº : 5675838-57.2023.8.09.0137 Classe processual : PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO -> Processo de Conhecimento -> Procedimento de Conhecimento -> Procedimento do Juizado Especial Cível Requerente : Licurgo Araujo Carmo e Outro Requerida : Joao Fausto Munari Filho-cosmeticos e Outros Cuidam os autos em epígrafes de “Ação Indenizatória (Dano Moral e Material)”, ajuizada por LICURGO ARAÚJO DO CARMO e IRENE DO CARMO OLIVEIRA, em desfavor de JOAO FAUSTO MUNARI FILHO COSMETICOS-ME; S&F ENVIO DE ENCOMENDAS NACIONAIS E INTERNA-CIONAIS LTDA (POSTNET) e UPS DO BRASIL REMESSAS EXPRESSAS LTDA, partes devidamente qualificadas (ev. 01).Em consonância com o que se extrai do disposto nos artigos 2º e 38 da Lei n.º 9.099/95, que disciplina a dinâmica processual dos Juizados Especiais, a sentença fica dispensada da presença do relatório circunstanciado, em razão dos princípios basilares da oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade. Em que pese tal faculdade, tenho por proveitosa breve explanação acerca das questões de fato e de direito a serem sopesadas nesta etapa do itinerário procedimental.De conformidade com a narrativa contida na peça de ingresso, bem ainda segundo os documentos que a acompanha, inicialmente os autores alegaram que ingressam com a presente ação corrigindo os defeitos/vícios reconhecidos na ação pretérita ajuizada sob o n. 5167182-71, que foi extinta sem julgamento do mérito.Após, narraram, que o primeiro autor, Licurgo, na qualidade de cabeleireiro, efetuou, em setembro/2022, a compra de produtos capilares junto à primeira requerida, João Fausto Munari Filho Cosmético ME, pelo valor de R$ 8.437,25, que foi pago via PIX pela segunda autora, Irene. Prosseguiram aduzindo que na oportunidade da compra e venda o primeiro autor foi atendido pela funcionária da primeira ré, Sra. Aline Alves Azevedo, pessoa essa que ficaria na posse dos produtos que ele estava adquirindo, pois havia sido contratada por eles para realizar o encaminhamento das mercadorias à segunda ré, Postnet, que por sua vez, possui parceria internacional com a terceira demandada (UPS) que, seria a responsável pelo transporte internacional da mercadoria para o endereço temporário do primeiro autor na Alemanha/DE, onde, à época, ele residia e exercia suas atividades profissionais.Continuaram narrando que, consoante o acordo de transporte (frete) firmado com as 2ª e 3ª requeridas, que gerou o código de rastreio n. 1Z 0V2 364 67 3031 4868, os produtos deveriam ser entregues na Alemanha, à pessoa de Jairton Braga de Castro (destinatário da encomenda), em um prazo de 7 dias úteis, e que embora na nota fiscal do frete tenha constado o valor de R$ 2.300,00, o seu custo real foi de R$ 2.700,00, que foi pago da seguinte forma: R$ 400,00 em espécie e R$ 2.300,00 via PIX, tendo, após, indicado que além desses valores, pagaram também um imposto no valor de EUR 358,09 (aproximadamente R$ 2.060,00).Seguiram aduzindo que mesmo após realizarem o pagamento integral do produto, dos custos de transporte (frete) e dos tributos incidentes, a mercadoria não foi entregue ao destinatário, na Alemanha e, ao diligenciarem junto a 2ª ré (Postnet), foram informados que a encomenda havia retornado ao endereço da remetente, ou seja, à Sra. Aline. Em seguida, alegaram a 2ª requerida (Postnet) lhes prometeu um novo envio, desta vez, com prazo de 9 dias úteis, porém, ao serem informados que teriam que pagar por um novo tributo, e considerando que eles já haviam quitado a despesa anterior sem que a encomenda fosse entregue no destino contratado, eles desistiram da contratação, que deveria ter sido entregue em set/22, e requereram a rescisão da compra e a restituição dos valores pagos integralmente a título da compra e venda das mercadorias e demais custos correlatos (frete e impostos), que segundo defenderam, totalizou o valor de R$ 13.200,00, tendo esses pedidos sido negados pelas rés.A par desses fatos, e invocando a aplicação das normas do Código de Defesa do Consumidor (CDC), requereram a decretação da inversão do ônus da prova, e pugnaram pela condenação das rés, solidariamente, à restituição dos valores pagos pela compra não recebida, bem como pelos custos de frete/transporte e tributos, em dobro (R$ 26.400,00) ou, subsidiariamente, de forma simples (R$ 13.200,00), além de indenização por danos morais (R$ 10.000,00). Juntaram documentos (ev. 01).Percorrido o itinerário procedimental, foi realizada audiência de conciliação (ev. 25), com a presença dos autores e das requeridas João Fausto Munari Filho-Cosméticos e UPS do Brasil Remessas Expressas Ltda, ausente a demandada S & F Envio de Encomendas Nacionais e Internacionais Ltda – Postnet, que não foi citada a tempo para o ato conciliatório.Posteriormente, a requerida João Fausto Munari Filho-Cosméticos apresentou contestação (ev. 32) aduzindo, preliminarmente, a sua ilegitimidade para figurar no polo passivo, sob o argumento de que a nota fiscal da compra em questão foi emitida em loja estabelecida em Goiânia/GO; a ilegitimidade ativa da segunda autora, Irene do Carmo Oliveira, sob o fundamento de que ela não tem nenhuma relação com os fatos narrados e pedidos desta ação; a incompetência territorial, tanto ao argumento de que a loja situada Goiânia não tem vínculo com loja desta Comarca, como que o primeiro autor, reside, em verdade, em Zurique, Suíça; a inépcia da inicial, sob o fundamento de que os valores pleiteados a título de danos materiais divergem do montante descrito na nota fiscal apresentada em juízo (R$ 8.843,55) e a inaplicabilidade do CDC, argumentando que a aquisição dos produtos objeto dos autos se destinava a uso profissional, dado que o autor é cabeleireiro em país estrangeiro. No mérito, alegou a impossibilidade de sua condenação ao pagamento em dobro a título de danos materiais ao argumento de que não possui nenhum vínculo com a pessoa (Aline), contratada diretamente pelos autores para a compra e envido de mercadorias para o exterior. Ato contínuo, alegou que não atua no mercado exterior, tampouco realiza transporte de mercadorias para outro país, sendo apenas comerciante de produtos em território nacional, concluindo que não pode ser responsabilizada por atos de terceiros. Sustentou, também, a inexistência de danos morais e, por fim, requereu a improcedência, in totum, dos pedidos da inicial.Por sua vez, a requerida UPS do Brasil Remessas Expressas Ltda apresentou defesa escrita (ev. 38), aduzindo, em preliminar, a ilegitimidade ativa do autor, sob o argumento de que jamais teve qualquer relação com a pessoa de Licurgo, mormente porque a contratação do transporte do produto em questão foi realizada pela pessoa de “Aline Alves de Azevedo”, que figurou, inclusive, como remetente da mercadoria postada, que é objeto dos autos, e que teve como destinatária, na Europa, a pessoa de “Jairton Braga de Castro”. Em seguida, ainda em preliminar, alegou a incompetência territorial, argumentando que o autor não reside nesta Comarca, pois além de ter indicado, no ato da compra, endereço localizado em Goiânia, a contratação do frete se deu com empresa parceira/intermediária (Postnet) com domicílio em Goiânia e São Paulo, sem qualquer relação com esta Comarca. No mérito, defendeu que não possui responsabilidade nenhuma pela não entrega do produto ao destinatário, no endereço fornecido na Alemanha, pois isso ocorreu por culpa exclusiva de terceiro, isto é, do remetente do pacote postado (Aline Alves Azevedo), que não forneceu adequadamente as informações essenciais para o transporte internacional. Informou, ainda, que, conforme esclarecido pela Receita Federal, o retorno do produto ocorreu em razão do preenchimento incorreto dos documentos indispensáveis à exportação (Declaração Única de Exportação - DU-E), que não foram preenchidos corretamente pelo exportador (Postnet e/ou remetente do pacote, Sra. Aline), concluindo que os seus serviços não abrangem o preenchimento de certidões ou declarações, tampouco a verificação do conteúdo de encomendas transportadas. Na sequência, alegou que, em troca de e-mails com a 2ª corré (Postnet), é possível verificar que ela não sabia como regularizar o envio da remessa internacional, que foi retornada, e sustentou a impossibilidade de ser responsabilizada pelo preenchimento de documentos e pagamento de tributos de encomendas transportadas, cuja competência é do remetente/destinatário. Ao final, pugnou pela inexistência de danos indenizáveis (materiais e morais) e requereu a improcedência dos pedidos iniciais.Sobreveio aos autos a impugnação à contestação (ev. 41), por meio da qual os autores refutaram os argumentos apresentados nas defesas das requeridas João Fausto Munari Filho-Cosméticos e UPS do Brasil Remessas Expressas Ltda, e, por fim, reafirmaram os fatos, fundamentos e pedidos da petição inicial.Após várias intercorrências processuais, foi proferida decisão (ev. 103) determinando a citação e intimação da 2ª promovida (Postnet) para tomar conhecimento dos presentes autos e, querendo, apresentar contestação em 15 dias, uma vez que ela não participou do primeiro ato conciliatório por não ter sido citada a tempo, não tendo corrido, contra ela, o prazo para defesa.Devidamente citada para fins deste processo, a segunda requerida S & F Envio de Encomendas Nacionais e Internacionais Ltda – Postnet apresentou contestação (ev. 114), alegando, em preliminar, a ilegitimidade ativa do autor, sob o argumento de que o contrato de transporte foi firmado pela pessoa de "Aline Alves de Azevedo", que foi a remetente da encomenda e teve como destinatário a pessoa de "Jairton Braga de Castro"; a sua ilegitimidade passiva, sob o fundamento de que o transporte internacional é realizado por sua parceira (UPS), única responsável por eventual dano em razão da não entrega do bem ao destinatário; e, também, a incompetência territorial deste juízo para processamento e julgamento da presente ação, aduzindo que o primeiro autor não comprovou ter domicílio nesta Comarca. No mérito, afirmou ter prestado à pessoa de Aline todas as informações necessárias relativas ao transporte de encomendas, e que se responsabilizou apenas pela remessa dos produtos à transportadora contratada para o transporte internacional (UPS), sendo desta empresa a responsabilidade pelo atraso ou não entrega da mercadoria ao destinatário na Alemanha, concluindo que houve, na situação em análise, a culpa exclusiva de terceiros. Em seguida, repisou não possuir nenhuma relação com os autores (Licurgo e Irene), pois a contratação dos serviços de transporte das mercadorias indicadas neste processo se deu com a pessoa de Aline, tanto que é ela quem consta no cupom fiscal emitido em face da contratação de frete/transporte e, também, como remetente do objeto postado. Após, sustentou a ausência de ato ilícito e, por consequência, do dever de reparar, tendo, ao final, pleiteado a improcedência dos pedidos iniciais. Formulou, também, pedido contraposto de danos morais, argumentando que em ligações e mensagens, o primeiro autor proferiu xingamentos aos seus funcionários, fato esse que, em seu entendimento, ofendeu a sua honra e imagem.Os autores apresentaram nova impugnação à contestação (ev. 118), desta vez refutando os argumentos da defesa apresentada pela 2ª ré (Postnet), e requerendo, quanto a ela, a decretação da revelia sob o argumento de que a defesa foi apresentada intempestivamente. Ao final, ratificaram os pedidos da inicial.Na decisão do ev. 119, foi proferida sentença de improcedência dos pedidos da inicial e do pedido contraposto formulado pela 2ª requerida (Postnet).Inconformado com a senteça proferida, os autores interpuseram Recurso Inominado para a Turma Recursal (ev. 125), almejando a reforma da decisão, isto é, a procedência dos pedidos formulados na inicial ou, a nulidade da sentença, ao argumento de que não foi observado o contraditório; a ampla defesa, e as regras de distribuição do ônus da prova (ev. 125). Após, as requeridas apresentaram contrarrazões nos evs. 137 e 138.Sobreveio decisão da Turma Recursal (ev. 157) cassando a sentença proferida e determinando o retorno dos autos para reabertura da instrução probatória.Retomado os autos, foi determinada a intimação de ambas as partes para especificarem as provas que desejavam produzir (ev. 173), tendo o autor manifestado ev. 179, oportunidade em que repisou o pedido de decretação da revelia da 2ª requerida e pugnou de forma genérica pela produção de todas as provas admitidas em juízo e pela oitiva de testemunhas. Já as 1ª e 3ª requeridas manifestaram nos evs. 180/181, oportunidade em que repisaram os pedidos das defesas apresentadas e requereram a dispensa da dilação probatório e o julgamento antecipado da lide.Determinada a realização de audiência de instrução e juntamento (ev. 183), tendo as mídias com o depoimento pessoal, oitiva de testemunhas, alegações finais orais de ambas as partes, bem como termo do ato realizado sido juntados nos ev.203/205. Ausentes outras intercorrências, vieram-me os autos conclusos.DECIDO.Em proêmio, quanto as preliminares de ilegitimidades ativa (dos dois autores) e passiva (de todas as três demandadas), arguidas nas defesas apresentadas – evs. 32; 28 e 114, esclareço que o artigo 17 do Código de Processo Civil, ao dispor sobre as condições da ação, estabelece que: “Para postular em juízo é necessário ter interesse e legitimidade”.No que toca às condições de ação, aplica-se a denominada Teoria da Asserção, por meio da qual o interesse processual e a legitimidade são apreciados apenas de acordo com as assertivas deduzidas pelo demandante na petição inicial, devendo o juiz analisar preliminarmente a causa, como se admitisse os apontamentos da parte autora como verdadeiros, sem adentrar ao mérito.Nesse sentido, é a posição do C. Superior Tribunal de Justiça: RECURSO ESPECIAL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. DANOS MATERIAIS E MORAIS DECORRENTES DE "ASSÉDIO SEXUAL" SOFRIDO NO INTERIOR DE COMPOSIÇÃO DO METRÔ. ALEGADA RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DA TRANSPORTADORA. INTERESSE DE AGIR E LEGITIMIDADE AD CAUSAM. EXISTÊNCIA. TEORIA DA ASSERÇÃO. 1. A manifesta ilegitimidade ad causam e a falta de interesse processual do autor caracterizam vícios da petição inicial que, uma vez detectados pelo magistrado antes da citação do réu, devem ensejar o indeferimento da exordial e, consequentemente, a extinção do processo sem resolução do mérito (artigos 267, incisos I e VI, 295, incisos II e III, do CPC de 1973; 330 e 485 do CPC de 2015). 2. No âmbito do STJ, prevalece a chamada teoria da asserção ou da prospettazione (em contraposição à teoria da apresentação ou da exposição). Sob essa ótica, o exame da legitimidade ad causam e do interesse processual deve ser realizado in statu assertionis, ou seja, à luz das afirmações do autor constantes na petição inicial, sem qualquer inferência sobre a veracidade das alegações ou a probabilidade de êxito da pretensão deduzida. (...) 9. Recurso especial provido para, cassando a sentença e o acórdão, determinar o retorno dos autos ao juízo de primeiro grau, a fim de que seja dado prosseguimento à demanda, como for de direito. (REsp 1678681/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 07/12/2017, DJe 06/02/2018).APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REPARAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA "AD CAUSAM" DA INSTITUIÇÃO BANCÁRIA. TEORIA DA ASSERÇÃO. REJEIÇÃO. DESCONTOS INDEVIDOS EM PROVENTOS. FRAUDE. EMPRÉSTIMO E CONTA CORRENTE NÃO CONTRATADOS. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. DEVER DE DEVOLUÇÃO. DANO MORAL OCORRENTE. VALOR DA INDENIZAÇÃO. RAZOABILIDADE. MANUTENÇÃO. DESPROVIMENTO. - Pela Teoria da Asserção, a legitimidade passiva deve ser verificada com base na narrativa contida na petição inicial - Se a instituição financeira não procedeu com a cautela necessária na análise dos documentos, quando da realização da abertura de conta-corrente, acarretando o desconto de parcelas indevidas no benefício previdenciário recebido pelo consumidor, deve responder objetivamente e arcar com os danos morais sofridos - Cabe ao fornecedor oferecer segurança na prestação de seu serviço, de forma a proteger o consumidor de possíveis danos - O fato de ter havido fraude de terceiro não exime o fornecedor de sua responsabilidade - A indenização se mede pela extensão do dano, nos termos do art. 944, do CC e deve ser suficiente para a reparação dos prejuízos. (TJPB - ACÓRDÃO/DECISÃO do Processo Nº 00051441120128150011, 3ª Câmara Especializada Cível, Relator DESA. MARIA DAS GRAÇAS MORAIS GUEDES, j. em 27-06-2019) (TJ-PB 00051441120128150011 PB, Relator: DESA. MARIA DAS GRAÇAS MORAIS GUEDES, Data de Julgamento: 27/06/2019, 3ª Câmara Especializada Cível). Isso significa que a legitimidade de parte deve ser analisada sob o enfoque do direito processual, levando-se em consideração, pela narrativa constante da petição inicial, a existência, ao menos em tese, do direito de um (autor) violado por ato de outro (réu).Segundo a doutrina, “a legitimidade passiva advém-lhe da circunstância de estar situada como obrigada, ou seja, no polo passivo da obrigação de direito material que se pretende fazer valer em juízo, ou como integrante da relação jurídica a ser desconstituída ou declarada ou, ainda, como titular do direito a ser declarado inexistente. Em suma, decorre de uma situação criada no processo com a apresentação do pedido do autor, onde um conflito de interesses é suscitado e aí adquire consistência jurídico-processual, mesmo que inexistente o direito nele questionado” (Donaldo Armelin, Legitimidade para Agir no Direito Processual Civil Brasileiro, n. 87, Editora Revista dos Tribunais, p. 102).Com isso, na análise das condições da ação, não importa se o pedido será procedente ou não, e se os fatos narrados são verdadeiros ou não, ou, ainda, se os fundamentos jurídicos deduzidos são pertinentes ou não já que as análises dessas questões deverão ser feitas quando do julgamento do mérito.Feitas essas ponderações, verifico, na espécie, que restou demonstrada a existência de um vínculo subjetivo entre os requeridos e a pretensão deduzida em juízo, eis que o primeiro autor (Licurgo) alegou que apesar de ter realizado a compra de produto de cabelo junto a primeira ré (João Fausto Munari Filho-cosméticos), e de ter contratado e pago o serviço de transporte de encomenda junto a segunda e terceira requeridas (Postnet e UPS) e, também, efetuado o pagamento do tributo relativo ao transporte internacional da mercadoria (para a Europa), cujos pagamentos se deram via pix, por intermédio da conta de sua mãe, segunda autora (Irene), não recebeu a encomenda no destino (Alemanha), fato esse que, segundo defenderam, lhes acarretou danos de ordem material e moral. Ocorre que, caso se comprove as teses defensivas, quais sejam, da alegada ausência de responsabilidade das rés pelos fatos narrados, ao argumento de que elas não possuem relação jurídica com os autores (Licurgo e Irene), tendo a contratação se dado por terceiros (Aline e Jairton) e, também, de excludente de responsabilidade consistente na inexistência de defeito dos serviços comercializados tanto em relação a compra e venda do produto de cabelo, quanto no seu transporte e/ou a culpa de terceiros com relação ao transporte internacional contratado, que não foi entregue ao destinatário, na Alemanha, o pedido da parte autora poderá ser julgado improcedente, de forma que, em face do princípio da primazia do julgamento de mérito, entendo aplicável, à questão, o 488 do CPC. “Art. 488. Desde que possível, o juiz resolverá o mérito sempre que a decisão for favorável à parte a quem aproveitaria eventual pronunciamento nos termos do art. 485.” Logo, reconheço a legitimidade dos autores e das requeridas para figurarem, respectivamente, nos polos ativo e passivo da presente ação, razão pela qual REJEITO as aludidas preliminares invocadas.Prosseguindo, rejeito também a preliminar de incompetência territorial suscitada pelas rés. Ora, ainda que o autor Licurgo não tenha apresentado documento idôneo para comprovar residência nesta Comarca — sendo inservível, para esse fim, o termo de adesão de pessoa física aos planos de serviços pré-pagos (ev. 57), por se tratar de documento sem data ou assinatura —, e embora haja fortes indícios de que o autor resida no exterior (como demonstra seu perfil público no Instagram, no qual afirma exercer a profissão de cabeleireiro em Zurique, com número telefônico com DDI da Suíça [+41 77 999 34 44], e levando em consideração o depoimento da testemunha Fábia), entendo aplicável à hipótese o disposto no art. 488 do CPC. Tal dispositivo, conforme transcrito acima, estabelece a primazia do julgamento de mérito, sempre que possível, em detrimento da extinção do feito sem resolução de mérito prevista no art. 485 do mesmo diploma legal. Da mesma forma, sem razão as alegações das requeridas quanto a preliminar de incompetência territorial ao argumento de que nenhuma delas tem domicílio nesta Comarca, pois, consoante estabelece o art. 4º, III da Lei 9.099/95 é competente o domicílio do autor nas ações de reparação de danos de qualquer natureza. Assim, uma vez que o pedido principal dos autos diz respeito ao pleito indenizatório (material e moral) em razão da compra de produto não entregue no destino internacional, cujo pagamento se deu pela segunda requerente Irene do Carmo Oliveria, via pix, e, considerando que essa autora comprovou ter residência nessa Comarca (ev. 01. arq. 04), resta afastada a preliminar de incompetência territorial invocada.Não merece acolhimento, também, a tese de inépcia da inicial ao argumento de que os valores pretendidos pelos autores se encontram em dissonância com o que foi pago pelos produtos comercializados, pois referida matéria diz respeito ao mérito e com ele será analisado. Ademais disso, verifico que a petição inicial segue escorreita, contendo os requisitos exigidos pelo artigo 319 do Código de Processo Civil, isto é, contém pedido claro, objetivo, causa de pedir e fatos com decorrência lógica, e pedidos compatíveis (restituição de valores, em dobro, cumulada com danos morais), não incidindo qualquer hipótese prevista nos incisos I a IV do §1° do art. 330 do Código de Processo Civil.Por fim, com relação a preliminar de impossibilidade de aplicação da das normas do CDC à situação em análise, ressalto que referida matéria não é classificada como preliminar propriamente dita, pois não se qualifica como matéria relativa a eventuais existências de irregularidade, nulidades ou prejudiciais de mérito, não tendo, portanto, o condão de produzir nenhum efeito prático nessa fase processual, devendo referida matéria ser analisada quando do julgamento do mérito, o que farei oportunamente. Logo, REJEITO a preliminar arguida. Superadas as preliminares invocadas e não havendo outras para serem analisadas, passo ao julgamento do mérito.Observo que no contexto dos autos não há vícios ou nulidades processuais a serem declaradas, nem questões prejudiciais ou outras preliminares ao mérito a serem dirimidas incidentalmente. Desta feita, tendo em conta, ainda, que a matéria prescinde da produção de prova oral, na forma do artigo 355, inciso I, do Código de Processo Civil, passo incontinente, à apreciação meritória da lide em apreço.Quanto à incidência ou não do Código de Defesa do Consumidor (CDC), em regra, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) afirma que o art. 2º da referida lei deve ser interpretado de forma restritiva, devendo ser considerado destinatário final tão somente o destinatário fático e econômico do bem ou serviço, seja ele pessoa física ou jurídica.No entanto, embora consagre o critério finalista para interpretação do conceito de consumidor, a jurisprudência do STJ também reconhece a necessidade de, em situações específicas, abrandar o rigor desse critério para admitir a aplicabilidade do CDC nas relações entre os adquirentes e os fornecedores em que, mesmo o adquirente utilizando os bens ou serviços para suas atividades econômicas, fique evidenciado que ele apresenta vulnerabilidade frente ao fornecedor (CIVIL. RELAÇÃO DE CONSUMO. DESTINATÁRIO FINAL. A expressão destinatário final, de que trata o art. 2º, caput, do Código de Defesa do Consumidor abrange quem adquire mercadorias para fins não econômicos, e também aqueles que, destinando-os a fins econômicos, enfrentam o mercado de consumo em condições de vulnerabilidade (…). (REsp 716.877/SP, Rel. Ministro ARI PARGENDLER, TERCEIRA TURMA, julgado em 22/03/2007, DJ 23/04/2007, p. 257)). Trata-se da teoria finalista mitigada, abrandada ou aprofundado incidente no caso em análise.Nesse sentido é a jurisprudência pátria:AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CAUTELAR ANTECEDENTE DE EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS. DECISÃO QUE INDEFERIU O PEDIDO DE INCIDÊNCIA DAS NORMAS CONSUMERISTAS AO CASO CONCRETO. INSURGÊNCIA DA AUTORA. EMPRESA AUTORA QUE CONTRATOU SOFTWARE E PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DA EMPRESA RÉ PARA IMPLEMENTO DE SUA ATIVIDADE ECONÔMICA. TEORIA FINALISTA MITIGADA. ENTENDIMENTO ATUAL DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. INCIDÊNCIA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. PRECEDENTES DESTA CORTE. PESSOA JURÍDICA AUTORA QUE COMPROVOU SUA VULNERABILIDADE TÉCNICA FRENTE À REQUERIDA. INCIDÊNCIA DO CDC COM A INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. DECISÃO REFORMADA. 1. Esta Corte firmou posicionamento no sentido de que a teoria finalista deve ser mitigada nos casos em que a pessoa física ou jurídica, embora não se enquadre nas categorias de fornecedor ou destinatário final do produto, apresenta-se em estado de vulnerabilidade ou hipossuficiência técnica, autorizando a aplicação das normas previstas no CDC ( AgInt no AREsp 1285559 / MS, rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, j. 28-8-2018). RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (TJ-SC - AI: 50535703520218240000, Data de Julgamento: 08/09/2022).AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL. SERVIÇO DE RASTREAMENTO VEICULAR. VULNERABILIDADE TÉCNICA. TEORIA FINALISTA MITIGADA. POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DA LEGISLAÇÃO CONSUMERISTA. CLÁUSULA DE ELEIÇÃO DE FORO AFASTADA. COMPETÊNCIA DO JUÍZO DO DOMICÍLIO DO CONSUMIDOR. DECISÃO REFORMADA. 1. O Código de Defesa do Consumidor, em regra, não se aplica no caso em que o serviço é contratado para implementação de atividade econômica, já que não estaria configurado o destinatário final da relação de consumo (teoria finalista ou subjetiva). Contudo, na esteira do posicionamento do Superior Tribunal de Justiça, tem-se admitido o abrandamento da regra quando ficar demonstrada a condição de hipossuficiência técnica da pessoa jurídica, autorizando, excepcionalmente, a aplicação das normas do CDC (teoria finalista mitigada). 2. Havendo indicação de que a relação jurídica firmada entre as partes litigantes é de consumo, deve ser reconhecida a nulidade da cláusula de eleição do foro inserida no contrato e reconhecida a competência do juízo do domicílio do consumidor para julgamento da demanda, nos termos do art. 101, I, do CDC. AGRAVO DE INSTRUMENTO CONHECIDO E PROVIDO. (TJ-GO - AI: 01341446220218090000 GOIÂNIA, Relator: Des(a). CARLOS ROBERTO FAVARO, Data de Julgamento: 10/05/2021, 1ª Câmara Cível, Data de Publicação: DJ de 10/05/2021) Diante disso, analisando o arcabouço processual, vislumbro que embora o primeiro autor exerça a atividade profissional de cabeleireiro (autônomo), e, com isso, não se enquadre na condição de destinatário final dos serviços contratados (compra de produto e contratação de transporte de encomenda), ele se apresenta em estado de vulnerabilidade e hipossuficiência técnica, econômica e, também, jurídica em relação às rés. E isso porque, conquanto ele tenha adquirido os produtos/serviços junto as demandadas para fomento de sua atividade profissional, o fez numa condição muito inferior à apresentada pelas outras partes contratantes, ora requeridas, devendo ser utilizada, no caso em apreço, as disposições do CDC como instrumento de equidade contratual, e com o objetivo de equilibrar os termos da avença. Com isso, inconteste que o Código de Defesa do Consumidor torna-se o alicerce para análise da vulnerabilidade do autor em detrimento da conduta do requerido.Nesse prisma destaco que o inciso VI do art. art. 6º estabelece dentre os direitos básicos do consumidor a efetiva prevenção e reparação dos danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos.Já o art. 14 do CDC dispõe que o fornecedor responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação de serviços. Adiante, o art. 35 do CDC estabelece que havendo o descumprimento contratual por parte do fornecedor, o consumidor passa a ter direito a rescindir a negociação, e, consequentemente, o direito à restituição da quantia paga, monetariamente atualizada, além de perdas e danos.Ressalto, contudo, de o caso ser a típica relação de consumo, na qual é possível aplicar a inversão do ônus da prova, consoante previsto no artigo 6º, inciso VIII da Lei Consumerista, o Magistrado também deve observar as regras de distribuição do ônus da prova, conforme o artigo 373 e incisos do Código de Processo Civil, de forma que incumbe à promovente, produzir a prova quanto aos fatos constitutivos do seu direito e à promovida, produzir a prova quanto aos fatos modificativos, impeditivos ou extintivos.Em tempo, registro que, como cediço, o art. 20 da Lei nº 9.099/95 é claro ao dispor que: “Não comparecendo o demandado à sessão de conciliação ou à audiência de instrução e julgamento, reputar-se-ão verdadeiros os fatos alegados no pedido inicial, salvo se o contrário resultar da convicção do juiz”. Dito isso, registro que o comparecimento das partes aos atos processuais, nos prazos estabelecidos, é um aspecto relevante no processo civil. A par do exposto, registro que embora seja cediço que a defesa escrita apresentada pela 2ª requerida Postnet se deu fora do prazo estipulado na decisão do evento 103, não se impõe a ela a aplicação dos efeitos materiais da revelia — ou seja, a presunção de veracidade dos fatos narrados na inicial — conforme pleiteado pela parte autora nas reiteradas manifestações escritas e, também, em sede de alegações finais orais. Isso porque, conforme dispõe a parte final do dispositivo legal aplicável (art. 20, Lei 9.099/95), essa presunção não é absoluta ("... salvo se o contrário resultar da convicção do juiz"). Em outras palavras, o efeito material da revelia não implica o deferimento automático do pedido do autor se existirem outros elementos que indiquem a inveracidade dos fatos ou que apontem para uma conclusão diversa.Outrossim, considerando que a 2ª requerida (Postnet) apresentou defesa escrita, mesmo que fora do prazo assinalado da decião do ev. 103, e, após, participou regularmente da audiência de instrução (evs. 203/205), e que as corrés (primeira e terceira requeridas) igualmente apresentaram defesas tempestivas e participaram da audiência de conciliação e instrução e julgamento, e que, à luz do disposto no art. 345, I do CPC, em especial a defesa da 3ª requerida (UPS) se aproveita à 2ª corré (Postnet), tenho que não há como aplicar o efeito material da revelia à situação em análise, devendo as questões trazidas a juízo serem analisadas com base em todo o conjunto probatório presente nos autos.Feitos esses esclarecimentos, passo a análise de fundo.Pois bem. O cerne da demanda cinge-se em verificar a existência da suposta falha na prestação de serviços das requeridas, isto é, em relação a suposta compra e venda de produtos capilares firmados entre a 1ª requerida, João Fausto Munari Filho Cosmético ME, e o primeiro autor (Licurgo) em setembro/2022, ao preço de R$ 8.437,25, que segundo relatado na inicial, foi pago via PIX pela segunda autora (Irene), e, também, em relação aos serviços de transporte (frete) da mercadoria adquirida pelo primeiro autor à Europa (Alemanha), cujo contrato se deu junto as 2ª e 3ª requeridas (Postnet e UPS) e, em caso positivo, se estes fatos ensejaram aos autores danos de ordem material e extrapatrimonial e se eles fazem jus aos pedidos formulados na inicial. Como, contudo, as contratações de compra e venda de mercadoria (produtos capilares) e de prestação de serviços de transporte (frete) de encomenda ao exterior objeto dos autos são autônomas e independentes entre si, para uma melhor compreensão da presente decisão a análise meritório se dará por capítulos.Capítulo 1. Do contrato de compra e venda de produto capilar supostamente realizada entre os autores (Licurgo e Irene) e a requerida Joao Fausto Munari Filho-cosméticosDa análise dos autos, em especial das notas fiscais acostadas nos evs. 01, arqs. 06 e 32, arq. 07 verifico que é incontroverso que o primeiro autor, Licurgo, mantinha relação comercial com a requerida João Fausto Munari Filho-cosméticos antes mesmo da compra e venda dos produtos objeto dos autos, já que além das 05 notas fiscais acostadas na inicial (nº 000.015.161 SÉRIE 0 no valor de R$ 1.078,80; nº 000.015.162 SÉRIE 0 no valor de R$ 532,35; nº 000.015.163 SÉRIE 0, no valor de R$ 3.572,40; nº 000.015.165 SÉRIE 0, no valor de R$ 823,20; nº 000.015.166 SÉRIE 0, no valor de R$ 1.540,00) dos produtos adquiridos em 12/09/22, que somou a quantia de R$7.546,75, ele já havia realizado, em outras data, a compra de produtos junto a essa ré, consoante nota fiscal (Nº 000.012.698, SÉRIE 0) no valor de R$ 5.527,50, datada de 19/07/21, o que ratifica a relação comercial havia entre eles, que também foi corroborada na audiência de instrução realizada (ev. 203/205), em especial em face do depoimento do preposto da 1ª ré. Além disso, constato que as notas fiscais objeto do pedido de reembolso de produto não teria sido entregue (ev. 01, arq. 06), emitidas em nome do primeiro autor (Licurgo), indicam que em 12/09/2022, a soma dos valores dos produtos totalizou R$ 7.546,75, e não R$ 8.437,25 como alegado na petição inicial; e que não há qualquer prova que conecte o pagamento dessas mercadorias aos comprovantes de PIX apresentados (ev. 01, arq. 05), pois neles constam a realização de transferências, via vários pix, que somaram o total de R$ 11.000,00, e que foi realizada pela segunda autora (Irene do Carmo Oliveira) à pessoa de Aline Alves Azevedo, que não faz parte deste processo.Assim, verifico que tanto a segunda autora Irene quanto a pessoa de Aline são estranhas à relação contratual das notas fiscais objeto do pedido de reembolso. E isso porque além da referida nota ter sido emitida pela requerida João Fausto Munari Filho-Cosméticos ao autor Licurgo, não há correspondência entre os valores da nota e as quantias transferidas, via PIX, por Irene à pessoa de Aline. Soma-se a isso, também, que não apenas no depoimento do representante legal da 1ª ré, como, também, nos depoimentos das testemunhas (Fábia e Andrea), arroladas pelos autores, foi informado em juízo que, ao contrário do indicado pela parte autora, quando da compra e venda de mercadorias pelo televendas o pagamento se dava diretamente à loja (João Fausto Munari Filho-Cosméticos). De igual modo, verifico que, embora o primeiro autor tenha alegado não ter recebido o produto adquirido da 1ª ré no destino internacional (Alemanha), não há nos autos qualquer prova que impute essa falha à requerida João Fausto Munari Filho-Cosméticos. E isso porque além da ausência de tal prova, os próprios autores confessaram que a aquisição dos produtos capilares (da marca Truss) não se deu com a primeira ré, tampouco foi realizado qualquer pagamento a essa empresa pela suposta compra. Pelo contrário, repiso que ficou comprovado em juízo que a compra e venda de produtos capilares objeto dos autos se deu entre o autor e a pessoa de Aline Alves Azevedo, que não só recebeu, em sua conta bancária, os valores relativos as mercadorias pretendidas pelos autores, como também foi contratada por eles para realizar o serviço de frete internacional, isto é, para encaminhar os itens para um país europeu (Alemanha), tendo como destinatário pessoa igualmente estranha aos autos: Jairton Braga de Castro. Dessa forma, resta evidente que as contratações realizadas entre os autores (Licurgo e Irene) e a pessoa de Aline (serviços de compra e venda de mercadorias e serviço de frete internacional – mov. 01, arqs. 07/08) não possuem qualquer relação com a 1ª requerida, João Fausto Munari Filho-Cosméticos. E isso porque não restou comprovado pela mínima prova (documental, oitiva de testemunhas ou mesmo no depoimento do representante legal da requerida) que a pessoa de nome Aline, era funcionária sua da 1ª requerida, tampouco que essa ré tenha assumido a responsabilidade pelo serviço de frete ou pela entrega da mercadoria às transportadoras (segunda e terceiras requeridas), para serem levados até a Alemanha. Ao contrário, conforme fundamentação supra, os documentos constantes dos autos deixam claro que as operações via PIX realizados pela segunda autora (Irene) à pessoa de Aline não tem relação alguma com as notas fiscais colacionadas aos autos e que são objeto de pedido de restituição de numerário por compra e venda de mercadoria, que tem como parte o primeiro autor (Licurgo) e a primeira ré (Joao Fausto Munari Filho-Cosméticos), restando rompido o nexo causal entre a conduta da promovida João Fausto Munari Filho – Cosméticos e o suposto dano alegado.Em tempo, ressalto que, embora os autores tenham defendido que solicitaram a rescisão do contrato de compra e venda de mercadorias junto à requerida João Fausto Munari Filho – Cosméticos e a devolução dos valores pagos, não há qualquer prova nesse sentido. Os documentos juntados à presente ação demonstram que houve apenas pedidos de rescisão dirigidos às corrés Postnet e UPS, contratadas exclusivamente para realizar o transporte da encomenda ao exterior.Ainda sobre a matéria de fundo, destaco que, nos termos do art. 14 do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90), a responsabilidade do fornecedor é, geralmente, objetiva. No entanto, tal responsabilidade pode ser elidida quando demonstrada a ocorrência de excludentes legais, como o caso fortuito, a força maior, a inexistência de defeito na prestação do serviço ou, ainda, a culpa exclusiva do consumidor.A par do exposto, tenho que, à luz das provas documentais e orais colhidas em juízo, os autores não comprovaram a existência de vínculo entre a 1ª ré, João Fausto Munari Filho – Cosméticos e a pessoa de Aline, que teria recebido valores dos autores para realizar a compra de mercadorias para serem transportadas a país estrangeiro. Ademais, ao que se extrai dos fatos comprovados em juizo, a pessoa (Aline), que não figura nos presentes autos, foi contratada diretamente pelos próprios autores para realizar, em nome deles, a compra de mercadorias e posteriormente, para envia-las ao estrangeiro. Logo, concluo que a 1ª requerida não indicou, autorizou ou manteve qualquer vínculo com Aline, inexistindo, assim, responsabilidade por sua conduta.Nesse contexto, tenho que eventuais falhas na aquisição dos produtos ou no envio das mercadorias são de responsabilidade exclusiva de Aline (que foi contratada diretamente pelos autores para ralizar as operações narradas nos autos), e não da 1ª requerida, sendo inviável, portanto, atribuir à essa requerida qualquer obrigação de restituição de valores ou reparação de danos, uma vez, repito, ausente o nexo causal entre sua conduta e os prejuízos alegados em juízo.Diante, portanto, da ausência de comprovação da relação jurídica entre os autores e a 1ª requerida relativo aos valores objeto do pedido de restituição, - sobretudo considerando que os comprovantes de pix realizados pelos autores indicam como beneficiária das transferências a pessoa de Aline, e que não restou comprovado a existência de vinculo dessa pessoa com a 1ª ré, Joào Fausto Munari Filho – Cosméticos, ja que evidenciado que as vendas de televenda tem pagamento diretamente na conta da empresa -, tenho que resta afastada a responsabilidade desta requerida por eventual falha na aquisição (compra e venda de mercadorias) e, também, no envio (frete) dos produtos ao exterior. Por consequência, não há que se falar em restituição de valores ou compensação por danos morais ou materiais, impondo-se, com relação a 1ª requerida, a improcedência dos pedidos formulados, nos termos do art. 485, I, do CPC. Capítulo 2. Do contrato de serviço de transporte (frete) de encomenda para o exterior (Alemanha) firmado com a Postnet e UPS.Com relação à segunda contratação (transporte/frete) objeto dos autos, verifico que embora os autores tenham afirmado que contrataram os serviços das corrés Postnet e UPS para o transporte internacional de mercadorias (produtos capilares) do Brasil para a Alemanha, mediante pagamento de R$ 2.700,00 (sendo R$ 400,00 em espécie e R$ 2.300,00 via Pix), os documentos constantes nos autos (mov. 01, arqs. 06/07; mov. 38, arqs. 04/05; e mov. 118, arq. 15) demonstram que, em verdade:(i) o valor efetivamente contratado para o serviço de transporte foi de R$ 2.300,00, em face do desconto concedido pela segunda ré (Postnet), inexistindo qualquer prova documental ou mesmo início de prova (como mensagens, recibos ou e-mails) que corrobore com a alegação do pagamento adicional de R$ 400,00 em dinheiro;(ii) que a contratação do serviço de transporte de encomenda para o exterior foi realizada, na verdade, pela pessoa de Aline Alves Azevedo, que figura nos documentos da contratação como contratante e remetente da encomenda postada, que foi destinada a Jairton Braga de Castro — ambos estranhos à relação processual em questão. Da mesma forma, verifico que embora os autores tenham sustentado que arcaram com o pagamento de €358,09 (aproximadamente R$ 2.060,00) a título de tributo gerado pela terceira ré (UPS) para o transporte de mercadoria ao exterior, o documento juntado no mov. 01, arq. 08 identifica como responsável pelo pagamento a requerida Postnet, e como remetente da encomenda a pessoa de Aline Alves Azevedo — sem qualquer indicação ou comprovação de que os autores tenham efetivamente suportado esse custo. Nesse particular, registro que mesmo que os autores tivessem comprovado o pagamento do aludido tributo — o que não ocorreu — a restituição pretendida não poderia ser pleiteada contra as corrés, mas sim perante o ente público competente (União), por se tratar de tributo incidente sobre operação de exportação e, portanto, sujeito às normas fiscais específicas, sendo o ente público destinatário legal de tais valores.Não obstante tais conclusões, verifico, ainda, que os comprovantes de pagamento via Pix efetuados pela autora Irene à Aline Alves Azevedo (R$ 4.000,00, R$ 2.000,00 e R$ 5.000,00 — totalizando R$ 11.000,00) não guardam correlação com os valores narrados na inicial a título de contratação do transporte (R$ 2.700,00) e do tributo (€ 358,09), tampouco foram destinados às rés Postnet e UPS, ja que teve como beneficiária a pessoa de Aline. Assim, inexiste nexo causal também entre a conduta das rés e os alegados prejuízos suportados pelos autores.Indo adiante, o histórico de conversas constante no ev. 118, arq. 16, também comprova que o serviço de transporte internacional de mercadoria (frete) foi contratado por intermédio de terceiros (Aline e Jairton), e que, não obstante a tentativa de envio da encomenda, esta não foi entregue ao destinatário por razões alheias à atuação das rés, mas sim pela ausência de regularidade na exportação formal da mercadoria.Aliado a tal fato, ainda restou esclarecido na audiência de instrução (evs. 203 a 2025), em especial pelo depoimento do preposto da segunda ré, que além do preenchimento da documentação da mercadoria a ser transportada para o exterior ser de responsabilidade do emitente da encomenda (Aline), em caso de divergência ou erro nessa documentação, a pessoa contatada para saná-la é o destinatário da encomenda, no caso, Jairton Braga de Castro, que não figura nos autos.Para além disso, das mensagens constantes no mov. 38, arq. 05, verifico que o envio, por pessoa física, de encomenda com valor superior a USD 1.000 exige o registro da DUE (Declaração Única de Exportação), o que não foi providenciado pelos autores nem pelas pessoas de Aline (contratante do frete e remetente da encomenda) ou Jairton (destinatário da encomenda), ante a ausência de prova nesse sentido. E, a própria requerida UPS informou à Postnet que, ausente solução fiscal no prazo de dois dias úteis, os produtos seriam considerados abandonados e poderiam ser destruídos pelo fisco. Diante disso, resta claro que as corrés Postnet e UPS não incorreram em falha na prestação do serviço. Ao contrário do afirmado na inicial, o transporte/frete foi devidamente realizado até o ponto em que foi legalmente possível, não podendo as corrés serem responsabilizadas por exigências legais impostas pela Receita Federal, cuja providência competia exclusivamente ao contratante do serviço (Aline).Repisa-se mais uma vez, que foram os próprios autores que optaram por contratar e efetuar pagamentos diretamente à pessoa de Aline, assumindo, com isso, os riscos dessa escolha. Tal circunstância, conforme acima exposto, rompe o nexo causal entre a conduta das rés e os supostos danos narrados, tornando inviável qualquer responsabilização civil com base nos fatos apresentados.Desta feita, nos termos do art. 373, I, do CPC, incumbia aos autores o ônus da prova quanto aos fatos constitutivos de seu direito, o que, como visto, não ocorreu.Diante, pois, da ausência de prova de qualquer falha na prestação do serviço das requeridas Postnet e UPS, bem como da inexistência de vínculo contratual direto com os autores (Licurgo e Irene), e do não preenchimento dos requisitos legais exigidos para a exportação, não há que se falar em condenação dessas corrés ao pagamento de danos materiais ou morais, sendo a improcedência desses pleitos a medida que se impõe. Capítulo 3. Do pedido contrapostoCom relação ao pedido contraposto formulado pela requerida Postnet, de condenação dos autores ao pagamento de danos morais ao argumento de que teve a sua honra afetada pelos xingamentos realizados pelo primeiro autor, tenho que referido pleito não merece acolhimento algum.Nesse ponto, cumpre registrar que a corré Postnet não demonstrou possuir legitimidade para formular pedidos em seu favor perante o Juizado Especial, nos termos do art. 8º, §1º, da Lei 9.099/95, que impõe restrições à atuação de pessoas jurídicas na condição de requerentes nessa via especializada;Outrossim, é pacífico o entendimento de que a pessoa jurídica somente pode ser indenizada por danos morais quando restar comprovada lesão à sua honra objetiva, ou seja, ao seu bom nome, reputação e imagem perante o público. Assim sendo, in casu, verifico que embora existam registros (áudios) de que o primeiro autor proferiu ofensas e xingamentos à empresa ré e a seus funcionários durante atendimento/reclamação, tais manifestações permaneceram restritas ao âmbito privado da comunicação, sem qualquer divulgação externa ou repercussão pública que pudesse atingir a imagem da empresa no mercado.Dessa forma, tenho que não restou configuradi o dano moral alegado, por ausência de abalo à honra objetiva da pessoa jurídica, conforme entendimento já consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça, inclusive por meio da Súmula 227.Nesse sentido: “"INDENIZAÇÃO. DANO MORAL. PESSOA JURÍDICA. POSSIBILIDADE. VERBETE N. 227, SÚMULA/STJ. PROVA DE PREJUÍZO MATERIAL DESNECESSÁRIA."A pessoa jurídica pode sofrer dano moral"(verbete 227, Súmula/STJ). Na concepção moderna da reparação do dano moral prevalece a orientação de que a responsabilização do agente se opera por força do simples fato da violação, de modo a tornar-se desnecessária a prova do prejuízo em concreto. Recurso especial provido em parte. (REsp 173.124/RS, Rel. Ministro CESAR ASFOR ROCHA, QUARTA TURMA, julgado em 11.09.2001, DJ 19.11.2001 p. 277). No mesmo sentido é o entendimento dos Tribunais pátrios: “APELAÇÃO. DANOS MORAIS. PESSOA JURÍDICA. INOCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DE OFENSA À HONRA OBJETIVA. SENTENÇA MANTIDA. 1. Diferentemente do que ocorre com as pessoas físicas, as pessoas jurídicas não possuem honra subjetiva, apenas honra objetiva, que é o juízo de terceiros sobre os atributos de outrem. 2. Para a configuração de dano moral indenizável à pessoa jurídica é imprescindível que se verifique a ocorrência de fatos que maculem a sua imagem perante os consumidores ou mesmo fornecedores, o que não ocorreu no caso dos autos. 3. Recurso improvido. (TJ-SP - AC: 10016992420208260126 SP 1001699-24.2020.8.26.0126, Relator: Ademir Modesto de Souza, Data de Julgamento: 08/06/2021, 16ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 11/06/2021)”EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA C/C INDENIZAÇÃO. DANO MORAL. PESSOA JURÍDICA. OFENSA À HONRA OBJETIVA NÃO DEMONSTRADA. SENTENÇA MANTIDA. 1. Tratando-se de pessoa jurídica, para a caracterização do dano moral, mister a comprovação do abalo à sua honra objetiva, isto é, ao seu crédito, à sua reputação ou ao seu bom nome, uma vez que ela não pode ser ofendida subjetivamente como a pessoa natural. Súmulas 227/STJ e 20/TJGO. 2. Diante da não comprovação, nos autos, de eventual ofensa à imagem da pessoa jurídica, tampouco desprestígio perante terceiros, notadamente pela ausência de negativação indevida e pela utilização de meio restrito para cobrança (e-mail), impositivo o desacolhimento do pleito indenizatório a título de dano moral. APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDA E DESPROVIDA. (TJ-GO - AC: 51797852220188090051 GOIÂNIA, Relator: Des(a). DESEMBARGADOR FERNANDO DE CASTRO MESQUITA, Goiânia - 2ª UPJ das Varas Cíveis e de Arbitragem, Data de Publicação: (S/R) DJ) Por oportuno, saliento que, diferentemente da hipótese de dano moral subjetivo em que sua ocorrência é presumida (“in re ipsa”), a caracterização do dano moral em favor da pessoa jurídica exige demonstração concreta de prejuízo à sua honra objetiva. Ou seja, é imprescindível a comprovação de que o ato ilícito efetivamente causou abalo à imagem institucional da empresa, à sua reputação no mercado, ou lhe acarretou, por exemplo, restrições de crédito. Na ausência dessa prova específica, não se configura o alegado dano moral.Dessa forma, não vejo possibilidade de acolhimento do pedido contraposto formulado pela corré Postnet, uma vez que não há qualquer elemento nos autos que comprove que os xingamentos proferidos pelo autor, ainda que reprováveis, tenham extrapolado o âmbito privado da conversa e gerado prejuízo à imagem ou reputação da empresa perante terceiros, condição essencial para a configuração de abalo à honra objetiva.Por fim, ressalto que a improcedência dos pedidos em face das três rés não obsta eventual apuração de responsabilidade da pessoa de Aline Alves Azevedo, a depender da comprovação dos fatos e fundamentos pertinentes em ação própria.É o que basta.DISPOSITVOANTE O EXPOSTO, nos termos do art. 485, I do CPC, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados na inicial, extinguindo o feito, com resolução do mérito.Outrossim, JULGO IMPROCEDENTE, também, o pedido contraposto formulado pela corré Postnet, pelas razões acima.Implementado o trânsito em julgado sem que as partes manifestem, no prazo de 10 (dez) dias subsequentes, arquivem-se os autos com as devidas baixas.Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Cumpra-se.Rio Verde-GO, data da assinatura digital. Ana Paula TanoJuíza de Direito03
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