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Processo nº 0013038-77.2015.8.13.0273

ID: 321776788

Tribunal: TJMG Órgão: Vara Única da Comarca de Galiléia Classe: AçãO CIVIL PúBLICA CíVEL Nº Processo: 0013038-77.2015.8.13.0273

Data de Disponibilização: 10/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

MUNICIPIO DE DIVINO DAS LARANJEIRAS

Intimação

Advogados:

LADIR FERNANDES JUNIOR

OAB/MG XXXXXX Desbloquear

WESLEY PAULO DE FARIA

OAB/MG XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE MINAS GERAIS Justiça de Primeira Instância Comarca de Galiléia / Vara Única da Comarca de Galiléia Avenida 8 de Dezembro, 849, Fórum Alcebíades Freitas Pinto, Galiléia -… PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE MINAS GERAIS Justiça de Primeira Instância Comarca de Galiléia / Vara Única da Comarca de Galiléia Avenida 8 de Dezembro, 849, Fórum Alcebíades Freitas Pinto, Galiléia - MG - CEP: 35250-000 PROCESSO Nº: 0013038-77.2015.8.13.0273 CLASSE: [CÍVEL] AÇÃO CIVIL PÚBLICA (65) ASSUNTO: [Obrigação de Fazer / Não Fazer] AUTOR: Ministério Público - MPMG CPF: não informado RÉU: MUNICIPIO DE DIVINO DAS LARANJEIRAS CPF: 18.357.079/0001-78 SENTENÇA I - RELATÓRIO Vistos, etc. Trata-se de AÇÃO CIVIL PÚBLICA ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS em face do MUNICÍPIO DE DIVINO DAS LARANJEIRAS, pessoa jurídica de direito público interno, devidamente qualificado nos autos. Aduziu o Autor, em sua petição inicial (ID 4339783019), protocolada em 09 de setembro de 2015, que o Réu não dispõe de sistema adequado para o tratamento de esgoto sanitário, promovendo o lançamento de efluentes in natura diretamente no Rio Doce, bem como nos Córregos Laranjeira, do Divino e Santa Helena, todos integrantes da Bacia Hidrográfica do Rio Doce. Sustentou o Órgão Ministerial que tal conduta omissiva configura severa degradação ambiental e poluição hídrica, acarretando graves riscos à saúde pública da população local, em flagrante desacordo com a legislação ambiental e sanitária vigente. Para corroborar suas alegações, o Autor fundamentou seu pleito, entre outros elementos, no laudo pericial elaborado pelo Instituto Prístino em 28 de março de 2015, constante do Inquérito Civil MPMG-0273.14.000812-2 (ID 4339783022, fls. 109-117 do IC), o qual atestou, de forma inequívoca, a inexistência de redes públicas coletoras de esgoto e de Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) no Município, resultando em um percentual de atendimento à população de 0% (zero por cento) no tocante ao tratamento de esgoto. Requereu o Ministério Público, em sede de tutela de urgência, que o Réu fosse compelido a, no prazo de 90 (noventa) dias: (i) abster-se de lançar efluentes brutos nos corpos hídricos mencionados; e (ii) adotar as providências necessárias para interceptar, coletar e tratar adequadamente os esgotos domésticos, sob pena de imposição de multa diária no valor de R$ 1.000,00 (mil reais). Ao final, pugnou pela integral procedência dos pedidos, com a condenação definitiva do Réu nas obrigações de fazer e não fazer, confirmando-se a tutela de urgência e a cominação da multa por descumprimento. Atribuiu à causa o valor de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais). Acompanharam a inicial os documentos reunidos no Inquérito Civil referenciado. O despacho inicial (ID 4339783024), proferido em 18 de setembro de 2015, postergou a análise do pedido liminar para momento ulterior à manifestação prévia do Réu, determinando sua notificação para tanto, em conformidade com o art. 2º da Lei nº 8.437/92. O Município Réu, devidamente notificado, apresentou sua manifestação escrita em 06 de outubro de 2015 (ID 4339783036), na qual arguiu, em síntese, a aplicabilidade da teoria da "reserva do possível" e a ausência de dotação orçamentária específica para a realização das obras pleiteadas, colacionando aos autos documentos relativos ao Plano Plurianual (PPA) para o quadriênio 2014-2017 e à Lei Orçamentária Anual (LOA) para o exercício de 2016 (IDs 4339783040, 4339882994, 4339882998, 4339883002). Posteriormente, por meio da decisão interlocutória de ID 4339883029, prolatada em 29 de setembro de 2016, este Juízo deferiu a tutela de urgência requestada, determinando ao Réu que, no prazo máximo de 180 (cento e oitenta) dias, providenciasse e comprovasse nos autos a realização de estudos técnicos e o competente procedimento licitatório para a execução das obras de tratamento de esgoto. Findo o referido prazo, o Réu deveria abster-se de lançar esgoto in natura nos corpos hídricos, sob pena de multa diária no valor de R$ 1.000,00 (mil reais), limitada ao montante global de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais). Na mesma oportunidade, foi recebida a petição inicial e determinada a citação do Réu para apresentar sua defesa. Regularmente citado, o Município Réu ofertou contestação (ID 4339883032), protocolada em 11 de novembro de 2016, na qual reiterou os argumentos anteriormente expendidos acerca da impossibilidade financeira e orçamentária para o cumprimento das obrigações, bem como a suposta violação ao princípio da separação dos poderes, pugnando, ao final, pela total improcedência da ação e pela revogação da medida liminar concedida. No curso da instrução processual, o Ministério Público manifestou-se em diversas oportunidades (IDs 4339883011, 4339578107, 9829780418, 10221761887, 10386801831), noticiando o reiterado e contumaz descumprimento da decisão liminar por parte do Réu. Em especial, na petição de ID 10386801831, o Autor informou a lavratura de novo Auto de Fiscalização (nº 353801/2024) e Auto de Infração (nº 377659/2024) pela Superintendência Regional de Meio Ambiente (SUPRAM) Leste de Minas, em 25 e 26 de setembro de 2024, respectivamente (documentos em ID 10386801832), os quais demonstram a persistência do lançamento de esgoto bruto, e requereu o bloqueio da multa consolidada no valor de R$ 50.000,00. O Réu, por sua vez, peticionou nos autos (IDs 4339578122, 9496049754, 10230731672) requerendo dilações de prazo e informando acerca das dificuldades financeiras enfrentadas e das tratativas empreendidas junto à Companhia de Saneamento de Minas Gerais (COPASA) com vistas a encontrar uma solução para a problemática do tratamento de esgoto. Foi realizada audiência de conciliação em 22 de janeiro de 2020 (ID 4339578129), na qual o então Prefeito Municipal informou a inexistência de Estação de Tratamento de Esgoto, o não cumprimento da liminar em razão de indisponibilidade financeira, as tratativas com o Estado de Minas Gerais e o Governo Federal para obtenção de auxílio, e as dificuldades encontradas perante a Câmara Municipal para aprovar a inclusão do tratamento de esgoto no contrato com a COPASA. Naquela assentada, foi concedido ao Município novo prazo de 120 (cento e vinte) dias para apresentar alternativas concretas para o cumprimento da obrigação. Intimadas para especificarem as provas que pretendiam produzir, por meio do despacho de ID 10107165435, ambas as partes manifestaram desinteresse na produção de novas provas, pugnando pelo julgamento antecipado da lide (Manifestação do MP em ID 10221761887 e do Réu em ID 10230731672). O Ministério Público, em sua derradeira manifestação (ID 10386801831), reiterou o pedido de bloqueio da multa e o julgamento de procedência da ação. É o sucinto relatório. Passo a decidir. II - FUNDAMENTAÇÃO O processo encontra-se em ordem, presentes os pressupostos processuais e as condições da ação, inexistindo nulidades a serem sanadas ou preliminares pendentes de apreciação. Passo, pois, à análise do mérito. Da Ausência de Prescrição Intercorrente Preliminarmente, cumpre assentar a inocorrência de prescrição intercorrente no presente feito. Observa-se dos autos que o processo teve tramitação regular, com a prática de diversos atos processuais, incluindo despachos, intimações, manifestações das partes e realização de audiência, não se vislumbrando qualquer período de paralisação imputável exclusivamente à inércia do Autor que pudesse ensejar o reconhecimento da prescrição intercorrente. Ademais, a pretensão deduzida em Ação Civil Pública, que visa à tutela de direitos difusos e coletivos de magnitude constitucional, como o meio ambiente ecologicamente equilibrado e a saúde pública, submete-se a um regime prescricional específico. A jurisprudência e a doutrina majoritárias inclinam-se pela imprescritibilidade da pretensão à reparação integral do dano ambiental. No que tange às obrigações de fazer e não fazer de trato continuado, como as versadas nos presentes autos, a lesão ao bem jurídico tutelado renova-se continuamente no tempo, o que, por si só, obsta a fluência do prazo prescricional enquanto perdurar a conduta omissiva lesiva. Destarte, não há que se falar em prescrição intercorrente. Do Mérito A controvérsia central que se apresenta a este Juízo reside na omissão do Município de Divino das Laranjeiras em implementar um sistema adequado e eficiente de coleta e tratamento de esgoto sanitário em seu território, resultando no lançamento contínuo e sistemático de efluentes in natura em importantes corpos hídricos locais, notadamente o Rio Doce e os Córregos Laranjeira, do Divino e Santa Helena, com graves consequências para o meio ambiente e para a saúde da população. Da Degradação Ambiental e do Risco à Saúde Pública A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, em seu art. 225, erigiu o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado à categoria de direito fundamental, essencial à sadia qualidade de vida, impondo expressamente ao Poder Público e à coletividade o indeclinável dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. Paralelamente, a saúde pública é consagrada como direito fundamental de todos e dever do Estado, conforme se extrai dos arts. 6º e 196 do Texto Magno. A interconexão entre a salubridade ambiental e a saúde pública é inegável, sendo o saneamento básico um dos pilares para a concretização de ambos os direitos. A prova coligida aos autos é farta e inequívoca em demonstrar a conduta lesiva perpetrada pelo Réu. O Laudo Pericial elaborado pelo Instituto Prístino, datado de 28 de março de 2015, que instruiu o Inquérito Civil nº MPMG-0273.14.000812-2 (ID 4339783022, fls. 109-117 do IC), é conclusivo e alarmante ao atestar que: "O Município não possui redes públicas coletoras de esgoto, apresentando assim um percentual de atendimento a população de 0%. Divino Das Laranjeiras tem seu esgoto lançado 'In Natura' diretamente no Rio Doce, Córrego Laranjeira, Córrego do Divino e Córrego Santa Helena. O Município não possui uma Estação de Tratamento de Esgoto – ETE." O referido laudo detalha, ainda, os nefastos impactos decorrentes dessa omissão, incluindo a poluição do solo, a contaminação das águas superficiais e subterrâneas, e o consequente e grave risco de disseminação de diversas doenças de veiculação hídrica, como amebíase, leptospirose, hepatite infecciosa, giardíase, escabiose e esquistossomose, afetando diretamente a saúde e o bem-estar da população. A persistência dessa grave situação é corroborada por documentos mais recentes, como o Auto de Fiscalização nº 353801/2024 e o Auto de Infração nº 377659/2024, lavrados pela Superintendência Regional de Meio Ambiente (SUPRAM) Leste de Minas em 25 e 26 de setembro de 2024, respectivamente (juntados com a petição de ID 10386801831, conforme documentos em ID 10386801832). Tais documentos atestam, de forma irrefutável, a continuidade do lançamento de esgoto bruto no Córrego Central de Santa Helena, impactando Área de Preservação Permanente e configurando flagrante violação à legislação ambiental. O lançamento de esgoto doméstico sem o devido tratamento prévio nos corpos receptores configura, indubitavelmente, poluição ambiental, nos exatos termos do art. 3º, inciso III, da Lei nº 6.938/81 (Política Nacional do Meio Ambiente), uma vez que tal prática prejudica a saúde, a segurança e o bem-estar da população, cria condições adversas às atividades sociais e econômicas, afeta desfavoravelmente a biota aquática e terrestre, e compromete as condições estéticas e sanitárias do meio ambiente. A matéria orgânica presente nos esgotos não tratados consome o oxigênio dissolvido na água, levando à mortandade de peixes e à proliferação de microrganismos patogênicos, além de contribuir para a eutrofização dos corpos hídricos. Da Responsabilidade do Município de Divino das Laranjeiras A responsabilidade pela instituição e prestação dos serviços de saneamento básico, o que inclui, de forma inafastável, a coleta, o transporte, o tratamento e a disposição final adequados dos esgotos sanitários, é primordialmente do Município, conforme estabelece o art. 30, inciso V, da Constituição Federal. Tal competência é detalhada e reforçada pela Lei nº 11.445/2007, que institui as diretrizes nacionais para o saneamento básico. Adicionalmente, o art. 23, incisos VI e IX, da Carta Magna, estabelece a competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios para proteger o meio ambiente, combater a poluição em todas as suas formas e promover programas de construção de moradias e a melhoria das condições habitacionais e de saneamento básico. No âmbito do Estado de Minas Gerais, a Lei Estadual nº 11.720/94 (Política Estadual de Saneamento Básico) e a Lei Estadual nº 13.317/99 (Código de Saúde de Minas Gerais) igualmente impõem ao ente municipal o dever de assegurar a coleta e o tratamento adequado dos esgotos sanitários. O art. 49 da Lei Estadual nº 13.317/99 é particularmente incisivo ao determinar que "O sistema público de coleta de esgoto tratará o esgoto coletado antes de lançá-lo em curso de água." A responsabilidade civil por danos ambientais, como é cediço, ostenta natureza objetiva, fundamentada na teoria do risco integral, conforme preceitua o art. 14, §1º, da Lei nº 6.938/81. Assim, para a sua configuração, basta a demonstração do dano ambiental e do nexo de causalidade entre este e a atividade ou omissão do agente poluidor, prescindindo-se da perquirição de culpa. No caso vertente, a omissão prolongada e injustificada do Município de Divino das Laranjeiras em prover o tratamento adequado do esgoto sanitário gerado em seu território é a causa direta e inequívoca da poluição hídrica e da degradação ambiental fartamente documentadas nos autos. Das Teses Defensivas Apresentadas pelo Réu O Município Réu, em suas manifestações (ID 4339783036 e ID 4339883032), busca eximir-se de sua responsabilidade invocando, precipuamente, a cláusula da "reserva do possível" e a ausência de previsão orçamentária específica para a realização das obras necessárias. Tais argumentos, contudo, não possuem o condão de afastar o indeclinável dever estatal de proteger o meio ambiente e a saúde pública, direitos fundamentais de primeira grandeza. A jurisprudência consolidada dos Tribunais Superiores e desta Corte Estadual é firme no sentido de que a alegação da "reserva do possível" não pode servir de escudo para o descumprimento de deveres estatais mínimos e essenciais, especialmente quando estão em jogo direitos fundamentais como o direito a um meio ambiente sadio e à saúde. A efetivação de tais direitos não pode ser indefinidamente postergada sob a justificativa genérica de limitações financeiras, sobretudo quando a omissão estatal se prolonga por um extenso lapso temporal, como ocorre na presente demanda, ajuizada no ano de 2015, e cujos fatos lesivos remontam a período ainda anterior. Embora o Município tenha acostado aos autos documentos referentes ao Plano Plurianual (PPA) 2014-2017 e à Lei Orçamentária Anual (LOA) 2016 (IDs 4339783040 e seguintes), a mera ausência de dotação orçamentária específica para as obras de saneamento não configura óbice intransponível ao cumprimento das obrigações legais e constitucionais. Compete ao gestor público, no exercício de suas atribuições, promover as adequações orçamentárias necessárias para fazer frente a despesas prioritárias e inadiáveis, como as relacionadas à saúde pública e à proteção ambiental. A Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar nº 101/2000), inclusive, prevê mecanismos para a adequação orçamentária em face de despesas obrigatórias de caráter continuado. Ademais, o Réu não logrou demonstrar, de forma cabal e inequívoca, a absoluta impossibilidade material de alocar recursos para, ao menos, iniciar as medidas mitigadoras e planejar a solução definitiva para o grave problema do lançamento de esgoto in natura. A elaboração de projetos técnicos, a busca por fontes de financiamento junto a outros entes federativos ou organismos de fomento, e a inclusão progressiva das obras nos planejamentos orçamentários subsequentes são deveres que incumbiam ao Município desde muito antes do ajuizamento desta ação. A postura processual do Réu, que mesmo após a concessão da tutela de urgência em 2016 e diversas oportunidades para apresentar soluções concretas – incluindo a dilação de prazo concedida em audiência de conciliação em 2020 (ID 4339578129) –, permaneceu inerte ou apresentou justificativas genéricas, demonstra uma recalcitrância que não se coaduna com a gravidade da situação e com a urgência que o caso requer. No que tange à alegação de violação ao princípio da separação dos poderes, esta também não se sustenta. O Poder Judiciário, ao determinar o cumprimento de obrigações expressamente impostas pela Constituição Federal e pela legislação infraconstitucional, não está a invadir a esfera de discricionariedade do administrador público, mas sim a exercer seu mister constitucional de garantidor da ordem jurídica e dos direitos fundamentais, suprindo omissões ilegais e lesivas perpetradas pelo Poder Executivo. A intervenção judicial, no caso, visa a assegurar a efetividade de normas cogentes e a proteger bens jurídicos de altíssima relevância. Diante de todo o exposto, resta inequivocamente configurada a omissão ilícita e continuada do Município de Divino das Laranjeiras em promover o adequado e necessário tratamento do esgoto sanitário gerado em seu território, resultando em poluição ambiental significativa e em grave risco à saúde pública da população local, em flagrante e persistente afronta à Constituição Federal e à legislação ambiental e sanitária vigente. Impõe-se, por conseguinte, a integral procedência dos pedidos formulados pelo Ministério Público do Estado de Minas Gerais. Das Astreintes Fixadas em Sede Liminar e sua Execução A decisão interlocutória de ID 4339883029, proferida em 29 de setembro de 2016, deferiu a tutela de urgência e fixou multa diária (astreintes) no valor de R$ 1.000,00 (mil reais), limitada ao montante global de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), para a hipótese de descumprimento da obrigação de não lançar esgoto in natura nos corpos hídricos após o transcurso do prazo de 180 (cento e oitenta) dias, o qual foi concedido para que o Réu providenciasse estudos técnicos e o procedimento licitatório para as obras de tratamento de esgoto. As astreintes, atualmente previstas no art. 537 do Código de Processo Civil (correspondente ao art. 461, §§ 4º e 5º, do CPC/1973, vigente à época da decisão liminar), constituem medida coercitiva de natureza patrimonial, legítima e eficaz, destinada a assegurar a efetividade das decisões judiciais que impõem obrigações de fazer ou não fazer. Sua fixação é ato discricionário do magistrado, que deve pautar-se pelos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, considerando a natureza da obrigação, a capacidade econômica do devedor e a necessidade de compelir ao cumprimento. No caso dos autos, o valor arbitrado para a multa diária e o limite global imposto mostram-se adequados e proporcionais à gravidade da omissão do ente municipal e à sua capacidade econômica, não se revelando excessivos, mas, ao contrário, necessários para compelir o Réu ao cumprimento da determinação judicial. Infelizmente, como fartamente demonstrado nos autos pelas reiteradas manifestações do Autor e pelos documentos emitidos pela SUPRAM Leste de Minas (ID 10386801832), o descumprimento da ordem liminar tem sido flagrante e persistente. O prazo de 180 (cento e oitenta) dias para a elaboração dos estudos técnicos e deflagração do procedimento licitatório, concedido em 29 de setembro de 2016, expirou em 28 de março de 2017. Posteriormente, em audiência de conciliação realizada em 22 de janeiro de 2020 (ID 4339578129), foi concedida nova prorrogação de prazo por 120 (cento e vinte) dias, que também transcorreu in albis sem que o Município apresentasse solução efetiva. O descumprimento da obrigação de cessar o lançamento de esgoto não tratado é, portanto, patente e perdura por anos, o que torna a multa cominatória plenamente exigível, tendo atingido o seu teto de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais). Quanto à forma de execução do valor consolidado das astreintes, assiste razão ao Réu em sua manifestação de ID 10230731672 ao sustentar que, tratando-se de condenação imposta à Fazenda Pública, o pagamento deve observar o regime constitucional aplicável. Considerando que o montante da multa (R$ 50.000,00) excede o limite para pagamento por meio de Requisição de Pequeno Valor (RPV) – que, para os Municípios, é de até 30 (trinta) salários mínimos, salvo se lei local dispuser de forma diversa, nos termos do art. 100, §§ 3º e 4º, da Constituição Federal, e do art. 87 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias –, a execução do valor devido a título de astreintes deverá, de fato, observar o regime de precatórios, previsto no art. 100 da Constituição Federal. A destinação dos valores arrecadados a título de astreintes, em ações civis públicas que versam sobre danos ambientais, deve ser revertida ao fundo específico previsto no art. 13 da Lei nº 7.347/85, qual seja, o Fundo de Defesa de Direitos Difusos, ou, na sua ausência em âmbito estadual ou municipal com destinação compatível, ao fundo federal correlato. III - DISPOSITIVO Posto isso, e por tudo mais que dos autos consta, JULGO PROCEDENTES os pedidos formulados na petição inicial, com resolução do mérito, nos termos do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, para: 1. CONDENAR o MUNICÍPIO DE DIVINO DAS LARANJEIRAS na obrigação de fazer consistente em, no prazo máximo de 30 (trinta) meses, a contar da intimação pessoal desta sentença, implantar e colocar em efetivo e integral funcionamento um sistema adequado de coleta, transporte, tratamento e disposição final de todo o esgoto sanitário gerado em sua área urbana e nos distritos, em conformidade com as normas técnicas e ambientais aplicáveis, incluindo a obtenção de todas as licenças e autorizações ambientais necessárias junto aos órgãos competentes, de modo a cessar completamente o lançamento de efluentes in natura ou inadequadamente tratados no Rio Doce, Córrego Laranjeira, Córrego do Divino, Córrego Santa Helena e demais corpos hídricos adjacentes. Para o fiel cumprimento desta obrigação, o Município deverá apresentar a este Juízo, no prazo improrrogável de 180 (cento e oitenta) dias, a contar da intimação pessoal desta sentença, um cronograma físico-financeiro detalhado de todas as etapas de execução das obras e medidas necessárias, incluindo prazos para elaboração/atualização de projetos, licitações, início e conclusão das obras, e obtenção das licenças, sob pena de incidência de multa diária no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais), limitada, inicialmente, ao montante de R$ 200.000,00 (duzentos mil reais), sem prejuízo de sua majoração em caso de recalcitrância ou descumprimento injustificado. 2. CONDENAR o MUNICÍPIO DE DIVINO DAS LARANJEIRAS na obrigação de não fazer consistente em abster-se, imediatamente após a integral implantação e o início da operação do sistema de tratamento de esgoto referido no item anterior, de lançar, sob qualquer forma ou pretexto, esgotos sanitários (urbanos ou rurais) sem o prévio e adequado tratamento, devidamente licenciado pelo órgão ambiental competente, nos corpos hídricos mencionados e em quaisquer outros situados em seu território, sob pena da mesma multa diária de R$ 2.000,00 (dois mil reais), limitada, inicialmente, a R$ 200.000,00 (duzentos mil reais), por cada ponto de lançamento irregular constatado. 3. CONFIRMAR a tutela de urgência anteriormente deferida por meio da decisão interlocutória de ID 4339883029 e, diante do seu incontroverso e reiterado descumprimento, CONDENAR o MUNICÍPIO DE DIVINO DAS LARANJEIRAS ao pagamento da multa cominatória (astreintes) já consolidada no valor de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais). Este valor deverá ser corrigido monetariamente pelos índices divulgados pela Corregedoria-Geral de Justiça do Estado de Minas Gerais, a contar da data em que a multa atingiu o seu teto (a ser precisamente apurado em fase de cumprimento de sentença, considerando-se o termo inicial da exigibilidade após o decurso do prazo de 180 dias da intimação da decisão liminar e o limite então fixado), e acrescido de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, a partir da citação para a fase de cumprimento de sentença. O referido montante deverá ser executado por meio do regime de precatório, nos termos do art. 100 da Constituição Federal, e o produto de sua arrecadação deverá ser revertido ao Fundo de Defesa de Direitos Difusos, previsto no art. 13 da Lei nº 7.347/85, ou a fundo estadual ou municipal equivalente com destinação compatível, a ser indicado pelo Ministério Público em momento oportuno. Condeno o Réu ao pagamento das custas processuais, das quais, contudo, é isento por força do art. 10, inciso I, da Lei Estadual nº 14.939/2003. Deixo de condenar o Réu ao pagamento de honorários advocatícios em favor do Ministério Público, em virtude do disposto no art. 18 da Lei nº 7.347/85 e da Súmula nº 2 do STJ ("Não cabem honorários advocatícios em Ação Civil Pública julgada procedente, salvo comprovada má-fé"). Após o trânsito em julgado, arquivem-se os autos, com baixa no sistema, com as formalidades legais. P. R. I. C. Galiléia, data da assinatura eletrônica. MARCELO CARLOS CANDIDO Juiz de Direito Vara Única da Comarca de Galiléia

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