Processo nº 1002002-79.2021.8.11.0042
ID: 324392079
Tribunal: TJMT
Órgão: Primeira Câmara Criminal
Classe: APELAçãO CRIMINAL
Nº Processo: 1002002-79.2021.8.11.0042
Data de Disponibilização:
14/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
DIANA ALVES RIBEIRO
OAB/MT XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1002002-79.2021.8.11.0042 Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Assunto: [Tráfico de Drogas e Condutas Afins] Relator: Des(a). …
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1002002-79.2021.8.11.0042 Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Assunto: [Tráfico de Drogas e Condutas Afins] Relator: Des(a). MARCOS MACHADO Turma Julgadora: [DES(A). MARCOS MACHADO, DES(A). WESLEY SANCHEZ LACERDA, DES(A). ORLANDO DE ALMEIDA PERRI] Parte(s): [POLÍCIA JUDICIÁRIA CIVIL DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0029-45 (APELADO), EDUARDO JUNIOR DUARTE DA SILVA - CPF: 089.300.691-26 (APELANTE), DIANA ALVES RIBEIRO - CPF: 740.210.441-91 (ADVOGADO), KAUE NOGUEIRA DA SILVA - CPF: 048.831.571-99 (APELANTE), ROBSON DOS SANTOS - CPF: 693.416.721-04 (TERCEIRO INTERESSADO), JEVERSON AGUIAR DE FRANCA - CPF: 033.364.751-39 (TERCEIRO INTERESSADO), A INCOLUMIDADE PÚBLICA (ASSISTENTE), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (APELADO), KAUE NOGUEIRA DA SILVA - CPF: 048.831.571-99 (TERCEIRO INTERESSADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). WESLEY SANCHEZ LACERDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. Ementa. Direito penal e processual penal. Apelação criminal. Tráfico de drogas. Nulidade por ilegalidade na busca pessoal e veicular. Rejeição da preliminar. Condenação mantida. Restituição de veículo. Impossibilidade. Recurso desprovido. I. Caso em exame Apelação criminal interposta contra sentença que condenou o apelante por tráfico de drogas privilegiado a 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de reclusão e 250 (duzentos e cinquenta) dias-multa, em regime aberto, substituída por duas restritivas de direito, visando a nulidade das provas decorrentes da busca pessoal/veicular ou absolvição. Subsidiariamente, restituição do automóvel. II. Questão em discussão Há três questões: 1) ilegalidade de provas decorrentes da busca pessoal/veicular; 2) provas insuficientes para a condenação; 3) restituição do veículo apreendido. III. Razões de decidir 1. Os policiais militares atuaram por dever funcional, no desempenho do policiamento ostensivo e preventivo. 2. A abordagem policial se revela legítima quando amparada em fundadas suspeitas, corroboradas pela conduta do apelante, que, ao perceber a presença policial, destruiu seu aparelho celular, gerando indicativo de ocultação de fatos e justificando a busca pessoal e veicular. 3. Os depoimentos seguros e coerentes dos agentes policiais, prestados sob o crivo do contraditório, somados a apreensão de maconha e dinheiro em espécie são idôneos para sustentar a condenação criminal por tráfico de drogas, o qual classifica-se como crime de ação múltipla ou misto alternativo e, portanto, consuma-se com a prática de qualquer das condutas nele descritas. 4. A expropriação do veículo utilizado em tráfico de drogas decorre de responsabilidade objetiva, prevista expressamente na CF/88, ao dispor que “todo e qualquer bem de valor econômico apreendido em decorrência do tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins [...] será confiscado e reverterá a fundo especial com destinação específica, na forma da lei” [art. 243, parágrafo único]. 5. Se o veículo apreendido pertence a terceiro, o apelante não tem legitimidade recursal para postular sua restituição, conforme pacífica posição jurisprudencial deste e. Tribunal. IV. Dispositivo e tese Recurso desprovido. Tese de julgamento: 1. A busca pessoal e veicular é válida quando amparada em fundadas suspeitas, corroboradas por atos concretos que indiquem possível prática criminosa. 2. Impõe-se manter a condenação por tráfico de drogas quando comprovadas a materialidade e a autoria. 3. O perdimento do veículo utilizado na traficância é medida obrigatória, decorrente da responsabilidade objetiva prevista no art. 243, parágrafo único, da CF/88, e no art. 63 da Lei nº 11.343/2006, sendo inviável sua restituição, mesmo quando registrado em nome de terceiro. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 243, parágrafo único; Lei nº 11.343/2006, arts. 33, caput e § 4º, e 63; CPP, arts. 244 e 593, I; CP, art. 107. Jurisprudência relevante citada: STF, HC 253.675 AgR/SP, Rel. Min. Gilmar Mendes, Segunda Turma, j. 13.05.2025; STF, RHC 1.349.297, Rel. Min. Alexandre de Moraes, j. 13.10.2021; TJMT, AP nº 1000183-39.2023.8.11.0042, Rel. Des. Rondon Bassil Dower Filho, j. 12.09.2024; TJMT, AP nº 0019358-17.2015.8.11.0042, Rel. Des. Orlando de Almeida Perri, j. 10.10.2019; TJMT, AP nº 1030914-72.2022.8.11.0003, Rel. Des. Rondon Bassil Dower Filho, j. 01.09.2023; STJ, AgRg no AREsp nº 1.147.673/PR; STJ, HC nº 774.140/SP, Rel. Min. Rogério Schietti Cruz, j. 28.10.2022. R E L A T Ó R I O PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL APELAÇÃO Nº 1002002-79.2021.8.11.0042 - COMARCA DE CUIABÁ APELANTE(S): EDUARDO JUNIOR DUARTE DA SILVA APELADOS(S): MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL RELATÓRIO Apelação criminal interposta por EDUARDO JUNIOR DUARTE DA SILVA contra sentença proferida pelo Juízo da 13ª Vara Criminal da Comarca de Cuiabá, nos autos de ação penal (PJe nº 1002002-79.2021.8.11.0042), que o condenou por tráfico de drogas privilegiado a 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de reclusão e 250 (duzentos e cinquenta) dias-multa, em regime aberto, substituída por duas restritivas de direito - art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/2006 - (ID 285693918). O apelante suscita a ilegalidade de provas decorrentes da busca pessoal/veicular sob assertiva de que teria sido realizada sem autorização e/ou fundadas suspeitas. No mérito, sustenta que: 1) as provas seriam insuficientes para a condenação; 2) “sequer foi realizada perícia no veículo para averiguar se ele teve sua estrutura alterada para a prática do crime de tráfico de drogas, ou se nele havia vestígios/resquícios de entorpecentes”. Requer o provimento para que sejam anuladas as provas decorrentes da busca pessoal/veicular e, por conseguinte, absolvido. Subsidiariamente, restituído o veículo apreendido (ID 285693920). A 23ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA CRIMINAL CUIABÁ pugna pelo desprovimento do apelo (ID 285693930). A i. 10ª Procuradoria de Justiça Criminal opina pelo provimento do recurso, em parecer assim sintetizado: “Recurso de Apelação – Recurso da defesa. Preliminar – Nulidade – Busca pessoal e veicular realizada sem fundadas suspeitas. Ausência de elementos objetivo para a motivação da busca. Preliminar merece acolhimento. Abordagem do veículo conduzido pelo sentenciado Kauê e pelo Apelante Eduardo em via pública, ronda ostensiva da polícia não permite a busca pessoal ou veicular sem que haja demonstração de elementos objetivos para caracterizar a fundada suspeita. Fundada suspeita não demonstrada nos autos. Nulidade absoluta. Alegação genérica pelos policiais acerca da fundada suspeita, por si só, não pode servir como fundamento para motivar a busca (Informativo 735 STJ). 1) Possibilidade de desclassificação da conduta para o ilícito administrativo previsto no artigo 28 da Lei 11.343/2006. Ausência de prova nos autos, no sentido de comprovar o tráfico ilícito de drogas. Droga apreendida, ainda que a quantidade esteja acima daquela preconizada pelo STF, diante das circunstâncias especificas do caso em tela, é possível deslocar o tipo penal do artigo 33 da lei de drogas para o ilícito previsto no artigo 28 do mesmo diploma penal, de acordo com o TEMA 506 do Supremo Tribunal Federal. 2) Restituição do veículo apreendido. Possibilidade. Havendo acolhimento das teses anteriores, torna-se cabível a restituição do veículo apreendido. Parecer é pelo provimento do recurso interposto, com fito de acolher a preliminar de nulidade, absolvendo os sentenciados e, caso não haja o seu devido acolhimento, o parecer é pela desclassificação da conduta dos condenados para o artigo 28 da Lei 11.343/2006 e a restituição do veículo ao seu legítimo proprietário.” (Esther Louise Asvolinsque Peixoto, procuradora de Justiça - ID 287520382) É o relatório. V O T O R E L A T O R VOTO PRELIMINAR - (NULIDADE DO FLAGRANTE E DAS PROVAS - BUSCA E APREENSÃO VEICULAR) EXMO. SR. DES. MARCOS MACHADO (RELATOR) Egrégia Câmara: O apelante suscita a ilegalidade de provas decorrentes da busca pessoal/veicular sob assertiva de que teria sido realizada sem autorização e/ou fundadas suspeitas. Vejamos. Extraem-se das narrativas dos policiais militares [Robson dos Santos e Jeverson Aguiar de França], nas duas fases da persecução penal, que, no dia 15.12.2020, por volta das 19h15min, estavam “em patrulhamento ostensivo” pelo bairro Doutor Fábio, em Cuiabá/MT, quando visualizaram o veículo Toyota Corolla [cor branca e placa QBN0D83], na rua Comodoro, quadra 42, conduzido por Kaue Nogueira da Silva [corréu], tendo como passageiro o apelante EDUARDO JUNIOR DUARTE DA SILVA, ambos em “atitudes suspeitas” (ID’s 285693865 / 285694397 / 285694399), segundo interpretação dos agentes de segurança pública. Frise-se que, realizada a abordagem, o apelante EDUARDO JUNIOR DUARTE DA SILVA “destruiu um aparelho de telefone celular”, jogando-o ao solo, “o qual se quebrou em diversas partes” (ID 285693865). Durante a busca pessoal, os agentes policiais localizaram, com o apelante, 2 (duas) porções de maconha e a quantia de R$ 50,00 (cinquenta reais) em espécie (ID 285693865) e na busca veicular, foram apreendidas 28 (vinte e oito) porções de maconha no console do automóvel (ID 285693865). No caso, os policiais militares atuaram por dever funcional, no desempenho do policiamento ostensivo e preventivo (STF, AgRg no RHC nº 229514/PE - Relator: Min. Gilmar Mendes - 2.10.2023). Atente-se que o c. STF firmou diretriz jurisprudencial que os agentes estatais devem permear suas ações com base em elementos probatórios mínimos que indiquem a ocorrência de situação flagrante, cabendo ao Poder Judiciário aferir a presença de justa causa dessa diligência. Em outras palavras, “não exige a certeza da ocorrência de delito, mas, sim, fundadas razões a respeito, como na hipótese” (STF, RHC 1.349.297 - Relator: Min. Alexandre de Moraes - 13.10.2021). Isso porque, a “intuição policial é construída a partir de treinamento que tem como fundamento a ciência aplicada à atividade policial” (STF, HC 253675 AgR / SP - Relator: Min. Gilmar Mendes – Segunda Turma – j. 13.5.2025 – p. 16.5.2025). Noutro giro, em entrevista à Revista Consultor Jurídico, na data de 8.5.2022 [Disponível em: www.conjur.com.br], o i. ministro Rogerio Schietti Cruz pontuou ser “legítima a ação do Estado” de impor sacrifício às liberdades individuais na hipótese de cometimento de crimes (Disponível em: www.conjur.com.br), notadamente porque a investigação envolve direito público que deve prevalecer sobre o direito individual, desde que sem abuso de autoridade e constrangimento ilegal, acrescenta-se. Por isso, cabem às instâncias ordinárias adotarem juízos críticos e valorativos nos casos concretos para não transformar a residência e/ou o veículo em local de salvo-conduto e impunidade, na hipótese de crimes permanentes - tráfico de drogas e porte ilegal de arma de fogo de uso permitido - (STF, HC nº 192.110 - Relator: Min. Alexandre de Moraes - 25.11.2020). Nesse sentido, decidiu este e. Tribunal: “Se a atuação policial seguiu as determinações do art. 244 do Código de Processo Penal, diante da existência de fundada suspeita da prática de crime e do comportamento suspeito do apelante e do corréu que estavam dentro de um veículo estacionado [...] e na sequência, com a aproximação dos agentes de segurança, destruíram um aparelho celular, tal atitude incomum e estranha não poderia ser ignorada e, por óbvio, gerou a fundada suspeita capaz de legitimar a abordagem pessoal e a busca veicular.” (AP nº 1000183-39.2023.8.11.0042 - Relator: Des. Rondon Bassil Dower Filho – j. 12.9.2024) Enfim, não se ignora a jurisprudência do c. STJ sobre o tema, no sentido de identificar ilicitude da diligência em veículo (STJ, HC nº 774.140/SP – Relator: Min. Rogerio Schietti Cruz – 28.10.2022), todavia é preciso distinguir caso a caso para que a casa não sirva e nem se preste a ser objeto/local de impunidade (STJ, AgRg no HC 656.042/SP - Relator: Min. Felix Fischer - 4.6.2021; HC 538832/MA - Relator: Min. Ribeiro Dantas - 21.5.2021; AgRg no Resp 1921191/MG - Relator: Min. Reynaldo Soares da Fonseca - 7.5.2021). Nesse quadro fático-probatório, não se identifica ilegalidade no flagrante e/ou na busca veicular. Com essas considerações, REJEITA-SE a preliminar. VOTO (MÉRITO) EXMO. SR. DES. MARCOS MACHADO (RELATOR) Egrégia Câmara: O recurso é cabível (CPP, art. 593, I), manejado por quem tem interesse (CPP, art. 577) e não se verifica hipótese de extinção de punibilidade (CP, art. 107). Consta da denúncia que: “[...] no dia 15 de dezembro de 2020, às 19h15min, no cruzamento da Rua Comodoro, s/n, Quadra 42, Bairro Dr. Fábio, nesta cidade, os denunciados Kauê Nogueira da Silva e Eduardo Júnior Duarte da Silva, traziam consigo e transportavam, 30 (trinta) porções de maconha, com massa total de 72,64 g (setenta e dois gramas e sessenta e quatro centigramas), para outros fins que não o consumo pessoal, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar (laudo definitivo nº 3.14.2020.71742-01). [...] Diante do exposto, o Ministério Público Estadual DENUNCIA Kauê Nogueira da Silva e Eduardo Júnior Duarte da Silva como incursos no art. 33, caput, da Lei 11.343/06 c/c arts. 29 e 61, inciso II, “j”, do Código Penal. [...]” (Ricardo Alexandre Soares Vieira Marques, promotor de Justiça – ID 285693895) O Juízo singular reconheceu a responsabilidade penal nos seguintes termos: “[...] A materialidade do crime tipificado na Lei de Tóxicos (art. 33, “caput”) encontra-se comprovada, inicialmente, pelo auto de apreensão (Id. 48345545) e em seguida, pelos laudos de constatação preliminar e toxicológico definitivo n. 3.14.2020.71742-01 (Id. 48345557), não restando dúvidas que as substâncias apreendidas se tratavam de MACONHA, a qual era ao tempo do fato e ainda são de uso, porte e comercialização proibida no Brasil, em conformidade com RDC n° 13 de 26.03.2010, o qual regulamenta a Portaria n° 344/98, da Secretaria de Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde, sendo inclusa na lista “E”/“F2” de substâncias proscritas. [...] Em juízo, o policial militar JEVERSON ratificou sua declaração prestada em fase policial, ressaltando que ao notar a fundada suspeita no veículo, realizaram abordagem do veículo, acrescentou que deram ordem de parada e fez abordagem padrão, momento esse que fizeram a busca pessoal, onde foi localizado o entorpecente com um dos réus e na busca veicular, encontrado no console do veículo outras 28 porções de maconha. Frise-se que o termo de apreensão de Id. 48345545 e o Laudo Pericial n. 3.14.2020.71742-01 (Id. 48345557) confirmaram a apreensão de 30 (trinta) porções de substâncias, sendo duas encontradas em posse do réu EDUARDO e 28 (vinte oito) porções encontradas no console do veículo, onde todas apresentaram resultado positivo para MACONHA e juntas apresentaram massa total de 72,64g (setenta e duas gramas e sessenta e quatro centigramas). [...] Por outro lado, os depoimentos dos policiais colhidos na fase judicial são firmes, coerentes e seguros, tanto é assim que se ajustam, sem qualquer contradição, com as declarações colhidas na fase inquisitorial e com as demais provas produzidas nos autos, inclusive, com as investigações posteriores realizadas pela equipe da polícia civil que confirmou o tráfico de drogas realizado pelos réus. Acerca da versão dos réus EDUARDO e KAUE de que nada de ilícito foi apreendido no dia da ocorrência policial e que não teriam nada de ilícito e ainda, a versão do acusado EDUARDO que os policiais estão perseguindo lhe imputando a propriedade do entorpecente em razão de sua condição financeira, nada mais é que tentar afastar os indícios de suas autorias delitivas que, no entanto, restaram isoladas nos autos e desprovidas de qualquer elemento probatório. Vale registrar que as versões dos réus KAUE e EDUARDO em juízo sobre os fatos, como dito acima sequer são consonante entre si, anotando que especialmente sobre a versão de Eduardo de que o acusado KAUE estaria levando ele para o trabalho na pizzaria, enquanto o acusado KAUE iria para o seu trabalho na Avenida do CPA, bem constou do relatório realizado pelos investigadores que o acusado KAUE teria sido demitido do emprego e que o EDUARDO não era visto na pizzaria e nem em borracharia há muito tempo, ou seja, a versão dos acusados além de incoerentes entre si, são rechaçadas pelas investigações realizadas posteriormente. O que percebe das versões antagônicas apresentadas pelos réus EDUARDO e KAUE é de que foram criadas com único intuito, o de afastar os indícios de suas autorias delitivas que, no entanto, como já dito, restaram isoladas nos autos e desprovidas de qualquer elemento probatório. [...] Diante de todo o exposto e não havendo informações de que os policiais militares que participaram do flagrante fossem desafetos dos acusados, tivessem hostil prevenção contra eles ou quisessem indevidamente prejudicá-los, a eficácia probatória dos seus testemunhos não pode ser desconsideradas. [...] ISTO POSTO e por tudo mais que dos autos consta, com as fundamentações necessárias, nos moldes do art. 5º, inciso IX, da Constituição Federal, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE A DENÚNCIA para CONDENAR os réus KAUE NOGUEIRA DA SILVA [...] e EDUARDO JÚNIOR DUARTE DA SILVA, [...], nas sanções do artigo 33, “caput”, da Lei 11.343/06. [...]” (Francisco Alexandre Ferreira Mendes Neto, juiz de Direito – ID 285693918) Pois bem. A materialidade está comprovada pelo Termo de Exibição e Apreensão (fls. 20 - ID 285693865) e Laudo Pericial nº 3.14.2020.71742-01 (fls. 23 - ID 285693865), os quais não sofreram qualquer impugnação. Na fase policial, foram ouvidos Robson dos Santos, policial militar (fls. 15 - ID 285693865), Jeverson Aguiar de França, policial militar (fls. 18 - ID 285693865), Kaue Nogueira da Silva, corréu (fls. 28 - ID 285693865), e EDUARDO JUNIOR DUARTE DA SILVA, apelante (fls. 35 - ID 285693865). Em Juízo, colheram-se as declarações de Robson dos Santos, policial militar, Jeverson Aguiar de França, policial militar, bem como os interrogatórios do corréu e do apelante (Relatório de Mídias – ID’s 285694392/ 285694394/ 285694397/ 285694399). Dito isso, vejamos. Os policiais militares responsáveis pelo flagrante [Robson dos Santos e Jeverson Aguiar de França] descreveram coerentemente, em ambas as fases da persecução penal, a apreensão de 30 (trinta) porções de maconha, com peso de 72,64 g (setenta e duas gramas e sessenta e quatro centigramas) e R$ 50,00 (cinquenta reais) em espécie, no dia 15.12.2020, por volta das 19h15min, no cruzamento da rua Comodoro, quadra 42, bairro Doutor Fábio, Cuiabá/MT. Essas narrativas revelam que: 1) durante patrulhamento ostensivo pelo bairro Doutor Fábio, os policiais visualizaram o apelante e o corréu Kaue Nogueira da Silva em “fundadas suspeitas” no interior do veículo [Toyota Corolla, cor branca, placa QBN0D83]; 2) realizada a abordagem e a busca pessoal, foram localizadas com o apelante EDUARDO JUNIOR DUARTE DA SILVA duas porções de maconha e R$ 50,00 (cinquenta reais) em espécie; 3) na busca veicular, foram apreendidas, no console do automóvel, vinte e oito porções de maconha; 4) o apelante “jogou no chão um aparelho celular” que estava em sua posse, tendo o referido dispositivo se quebrado em diversas partes (ID’s 285693865 / 285694397 / 285694399). No Relatório de Investigação [nº 109/2021], subscrito pelos investigadores de Polícia [Túlio Lima de Arruda e Flávia Alessandra de Faria Pouso], na Delegacia Especializada de Repressão a Entorpecentes, foram colhidos elementos que indicam a atuação do apelante e de Kaue Nogueira da Silva [corréu] no tráfico de drogas, com uso de veículo em sistema de entrega [“delivery”]: 1) há registros de ocorrências anteriores contra o apelante por tráfico de drogas desde a adolescência, sendo sua companheira [Jéssica] presa por fato similar, envolvendo o mesmo veículo Corolla; 2) após a prisão da companheira, o apelante permaneceu na atividade ilícita, utilizando o veículo para entregas e com o auxílio de Kaue Nogueira da Silva [corréu], que possuía CNH (fls. 112/113 - ID 285693865). Com efeito, os depoimentos seguros e coerentes dos agentes policiais, prestados sob o crivo do contraditório, somados a apreensão de maconha e dinheiro em espécie “são idôneos para sustentar a condenação criminal” (TJMT, Enunciado Criminal 8) por tráfico de drogas, o qual “classifica-se como crime de ação múltipla ou misto alternativo e, portanto, consuma-se com a prática de qualquer das condutas nele descritas” (TJMT, Enunciado Criminal 7). Frise-se que a quantidade [72,64 g], a forma de acondicionamento das substâncias entorpecentes [“embalagens do tipo trouxa”] e apreensão de quantia em dinheiro sem origem lícita comprovada permitem aferir a destinação mercantil do entorpecente apreendido (TJMT, AP nº 1001001-20.2021.8.11.0055, Rel. Des. Rui Ramos Ribeiro, Segunda Câmara Criminal, 28.3.2022). Essa quantidade de maconha permitiria a confecção de aproximadamente 73 (setenta e três) cigarros, sopesados estudos empíricos que indicam a utilização de 1g (um grama), em média, por baseado (TJRS, HC nº 70081969909 – Rel. Des. Diogenes Vicente Hassan Ribeiro, 31.7.2019; HC nº 5003759-42.2021.8.21.7000/RS, Rel. Des. Ivan Leomar Bruxel, 8.4.2021), podendo chegar ao dobro e/ou triplo dessa quantidade de cigarros (https://maryjuana.com.br/2016/07/estudo-revela-peso-medio-cigarro-de-maconha). Nesse tipo de comercialização ilícita, a movimentação financeira pode ser significativa após a fragmentação em porções individuais, visto que a maconha “pode render até 500% de lucro em comparação ao preço pelo qual os traficantes adquirem a droga” (FERNANDES, Liva. A problemática da droga no telejornalismo brasileiro - uma análise da série de reportagens “O avanço da maconha” do Jornal da Band. Disponível em: portalintercom.org.brf). Noutro giro, as assertivas do apelante no sentido de que “o flagrante teria sido forjado” e “que a droga foi plantada” não se revelam suficientes para enfraquecer os elementos de convicção reunidos pelos policiais militares (TJMT, AP nº 0002935-50.2013.8.11.0042 - Relator: Des. Orlando de Almeida Perri - Primeira Câmara Criminal – j. 10.10.2019), notadamente diante das incongruências em suas declarações prestadas em Juízo, no qual afirmou que estava “indo ao trabalho”, ao passo que Kaue Nogueira da Silva [corréu e condutor do veículo] declarou que se dirigiam ao local “para levar umas cartas” para a esposa presa do apelante. Na essência, o apelante não desincumbiu de provar, por qualquer meio, sua afirmação, mesmo porque, no conflito exercício de autodefesa, não se pode superestimar a versão dos infratores, em desprestígio/relativização à narrativa dos agentes de segurança pública, de modo a inverter os valores de fé pública e idoneidade inerente a nobre função policial (TJMT, AP nº 0019358-17.2015.8.11.0042 - Primeira Câmara Criminal - 17.12.2019). Aplicáveis julgados deste e. Tribunal: “Impõe-se manter a condenação dos Apelantes pelo delito de Tráfico de droga [...] se comprovadas a materialidade do delito de Tráfico e sua autoria, por meio de robusto acervo probatório que contemple prova testemunhal e pericial quanto à apreensão de seis porções de maconha (89,14g), encontradas com os apelantes, aliadas à falta de prova acerca da alegação de que os agentes policiais teriam “plantado” os entorpecentes para incriminá-los.”(AP nº 1030914-72.2022.8.11.0003 – Relator: Des. Rondon Bassil Dower Filho - Terceira Câmara Criminal – j. 1º.9.2023) “[...] A mera alegação defensiva, por si só, não é suficiente para considerar que a droga foi "plantada" pelos policiais. Também não é suficiente para demonstrar quaisquer ilegalidades na conduta dos agentes públicos. Na hipótese, a defesa não produziu nenhuma prova capaz de elidir as declarações prestadas pelos referidos policiais militares, ficando restrita a meras e inférteis alegações. Isto posto, não há motivos para se desconsiderar o testemunho por eles prestados. [...]” (AP nº 0019060-83.2015.8.11.0055 – Relator: Des. Rui Ramos Ribeiro – j. 14.4.2021) Sendo assim, a responsabilidade penal do apelante pelo tráfico de drogas privilegiado deve ser mantida. No tocante ao pedido de restituição deduzido pelo apelante, o Juízo singular decretou o perdimento do veículo [Toyota Corolla, cor branca, placa QBN0D83 e Chassi nº 9BRBDWHE5H0313193]. O apelante alega que esse automóvel [Toyota Corolla, cor branca, placa QBN0D83 e Chassi nº 9BRBDWHE5H0313193] possui origem lícita e não há provas de que foi utilizado para traficância. Ocorre que, foram apreendidas 28 (vinte e oito) porções de maconha, pesando aproximadamente 72g (setenta e duas gramas), acondicionadas no “console” do veículo e, após a abordagem policial, o apelante “destruiu um aparelho de telefone celular, jogando-o ao solo o qual quebrou em diversas partes” (Robson dos Santos, policial militar – Pje nº 1002002-79.2021.8.11.0042 - ID 285693865). Além disso, em 24.9.2020, o apelante estava na companhia de sua esposa [Jessica Aparecida Correia da Costa Faria], quando ela foi presa por tráfico de drogas, utilizando o mesmo automóvel [Toyota Corolla, cor branca, placa QBN0D83 - fls. 256 - ID 285693898 - PJe nº 1002844-93.2020.8.11.0042]. A expropriação do veículo utilizado em tráfico de drogas decorre de responsabilidade objetiva, prevista expressamente na CF/88, ao dispor que “todo e qualquer bem de valor econômico apreendido em decorrência do tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins [...] será confiscado e reverterá a fundo especial com destinação específica, na forma da lei” [art. 243, parágrafo único]. O perdimento de bens em favor da União pela prática de tráfico ilícito de entorpecentes constitui efeito da condenação, conforme disposto na Lei de Drogas [art. 63], “in verbis”: “Ao proferir a sentença, o juiz decidirá sobre: I - o perdimento do produto, bem, direito ou valor apreendido ou objeto de medidas assecuratórias”, de modo que não reconhece a figura do terceiro prejudicado, nem disciplina ressalva de restituição (STJ, AgRg no AREsp nº 1147673/PR; TJMT, NU 0001700-32.2013.8.11.0015; AP NU 0030931-42.2017.8.11.0055 – 26.10.2018; AP NU 0016302-52.2018.8.11.0015 - 20.12.2019). Note-se que, nas apreensões de veículos, em tráfico de drogas, apresenta-se comum o uso de automóveis ou motocicletas pertencentes a terceiros, inclusive alienados fiduciariamente ou adquiridos em arrendamento mercantil/leasing, seja como forma de não ocorrer perdimento de bem em nome do condenado/responsabilizado, seja como estratégia para burlar a persecução penal e, assim, frustrar a responsabilização penal (TJMT, AP NU 1016656-71.2019.8.11.0000 - Primeira Câmara Criminal - 21.2.2020). Se o veículo [Toyota Corolla, cor branca, placa QBN0D83 e Chassi nº 9BRBDWHE5H0313193] apreendido pertence a terceiro [Jessica Aparecida Correia da Costa Faria], o apelante não tem legitimidade recursal para postular sua restituição, conforme pacífica posição jurisprudencial deste e. Tribunal (TJMT, NU 0001932-43.2016.8.11.0046, Rel. Des. Gilberto Giraldelli, Terceira Câmara Criminal, 20.7.2018; AP NU 0011590-03.2017.8.11.0064, Rel. Des. Alberto Ferreira de Souza, Segunda Câmara Criminal, 26.3.2019; AP NU 0002724-19.2019.8.11.0037, Rel. Des. Pedro Sakamoto, Segunda Câmara Criminal, 3.3.2023; AP NU 1000009-23.2023.8.11.0012, Primeira Câmara Criminal, 15.4.2024). Portanto, a restituição afigura-se impertinente. Com essas considerações, recurso conhecido, mas DESPROVIDO. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 08/07/2025
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