Processo nº 1000059-31.2020.8.11.0052
ID: 306377970
Tribunal: TJMT
Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 1000059-31.2020.8.11.0052
Data de Disponibilização:
24/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
MARCOS LOPES DA SILVA
OAB/MT XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1000059-31.2020.8.11.0052 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Reconhecimento / Dissolução, Obrigação de Fazer …
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1000059-31.2020.8.11.0052 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Reconhecimento / Dissolução, Obrigação de Fazer / Não Fazer] Relator: Des(a). MARCOS REGENOLD FERNANDES Turma Julgadora: [DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA] Parte(s): [SARA ALVES ESPINDOLA - CPF: 036.540.021-10 (APELANTE), CHARLES DE PAULA ALMEIDA - CPF: 047.226.001-47 (ADVOGADO), LUIZ PAULO PEREIRA BARRETO - CPF: 042.774.421-02 (APELANTE), MARCOS LOPES DA SILVA - CPF: 025.157.561-66 (ADVOGADO), LUIZ PAULO PEREIRA BARRETO - CPF: 042.774.421-02 (APELADO), MARCOS LOPES DA SILVA - CPF: 025.157.561-66 (ADVOGADO), SARA ALVES ESPINDOLA - CPF: 036.540.021-10 (APELADO), CHARLES DE PAULA ALMEIDA - CPF: 047.226.001-47 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A direito civil. Apelação cível. União estável. Partilha de bens e dívidas. Inclusão de semoventes. Valores investidos após a dissolução. Litigância de má-fé. Sentença mantida. Recurso desprovido. I. Caso em exame 1. Apelação cível interposta contra sentença que reconheceu e dissolveu união estável mantida entre 30/06/2018 e 11/09/2019; determinou a partilha igualitária de bens móveis vendidos, imóvel, dívidas contraídas durante a união (com exclusão das decorrentes de sublocação) e semoventes; condenou o autor à restituição de alianças ou ao pagamento de valor correspondente; fixou multa por litigância de má-fé em 2% sobre o valor da causa; e repartiu honorários e custas processuais entre as partes. II. Questão em discussão 2. Há quatro questões em discussão: (i) definir o termo inicial da união estável entre as partes; (ii) estabelecer se os semoventes vinculados aos cadastros rurais devem integrar a partilha; (iii) determinar a exclusão da quantia de R$ 14.658,53, supostamente investida pelo apelante após o fim da união; e (iv) verificar a legitimidade da condenação por litigância de má-fé. III. Razões de decidir 3. A união estável restou caracterizada desde 30/06/2018, data do noivado celebrado publicamente com troca de alianças, registros fotográficos e compromissos financeiros mútuos, havendo convivência pública, contínua e duradoura com ânimo de constituição familiar, conforme o art. 1.723 do Código Civil. 4. A coabitação não constitui requisito indispensável à configuração da união estável, consoante jurisprudência do STJ e do TJMT, bastando a existência de relação afetiva pública e compromissada. 5. Os semoventes devem ser partilhados igualmente, pois foram adquiridos na constância da união e não há prova de aquisição exclusiva com recursos próprios do apelante, incidindo a presunção de comunicabilidade do art. 1.725 do Código Civil. 6. O valor de R$ 14.658,53 não pode ser excluído da partilha, pois o apelante não comprovou que as benfeitorias foram realizadas após a separação e com recursos próprios, tampouco demonstrou que geraram benefício exclusivo à apelada. 7. A condenação por litigância de má-fé é legítima, diante da conduta do apelante que apresentou documentos imprecisos, omitiu bens e prestou informações contraditórias, violando os deveres de boa-fé e cooperação processual. IV. Dispositivo e tese 8. Recurso desprovido. Tese de julgamento: 1. “A união estável se configura mesmo na ausência de coabitação, desde que presentes os elementos da convivência pública, contínua, duradoura e com objetivo de constituição de família”. 2. “Presumem-se comunicáveis os bens adquiridos onerosamente durante a união estável, cabendo à parte interessada o ônus de provar a incomunicabilidade”. 3. “Valores supostamente investidos após o término da união não são excluídos da partilha sem prova robusta da origem exclusiva e do benefício individual”. 4. “A tentativa de ocultar bens e apresentar informações inverídicas autoriza a condenação por litigância de má-fé”. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 226, § 3º; CC, arts. 1.723, 1.725, 1.659, I; CPC, art. 85, § 11. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no AREsp n. 2.602.699/RS, Rel. Min. Antônio Carlos Ferreira, Quarta Turma, j. 07.04.2025, DJEN 11.04.2025; TJMT, N.U 0000669-67.2018.8.11.0090, Rel. Desa. Anglizey Solivan de Oliveira, j. 08.03.2025, DJE 08.03.2025;TJMT, N.U 0001682-75.2017.8.11.0110, Rel. Desa. Clarice Claudino da Silva, j. 02.05.2025. R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES [RELATOR] Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de apelação interposto por LUIZ PAULO PEREIRA BARRETO contra sentença proferida pela MM Dra. LUCIANA SITTINIERI LEON, Juíza de Direito em substituição legal na Vara Única de Rio Branco/MT que, nos autos da ação de reconhecimento e dissolução de união estável c/c partilha de bens e dívidas c/c obrigação de fazer de entrega de anel de noivado e aliança de matrimônio movida em desfavor de SARA ALVES ESPÍNDOLA, julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na ação e improcedentes os pedidos formulados na reconvenção para: a) reconhecer e dissolver a união estável havida entre as partes de 30/06/2018 a 11/09/2019; b) determinar a partilha igualitária do imóvel, dos bens móveis vendidos, das dívidas contraídas na constância da união (exceto as da sublocação) e dos semoventes em nome do requerente à época da separação; c) condenar o apelante por litigância de má-fé, com multa de 2% sobre o valor da causa; e d) condenar ambas as partes ao pagamento das custas e honorários advocatícios fixados em 10% do valor da causa. Em suas razões recursais (ID 273477498), o apelante sustenta que o relacionamento afetivo com a apelada teve início em 2009, sendo formalizado o noivado em 30/06/2018. Contudo, afirma que a convivência em regime de união estável somente se iniciou em 02/04/2019, quando ambos passaram a coabitar em imóvel locado especificamente para constituição de vida em comum, com aquisição conjunta de móveis e utensílios domésticos. Argumenta que a sentença incorreu em equívoco ao fixar o início da união estável na data do noivado, com base exclusiva em fotografias da cerimônia, as quais não configuram prova suficiente da convivência pública, contínua e com intuito de constituição de família, conforme exige o artigo 1.723 do Código Civil. Quanto à partilha, o apelante contesta a inclusão de semoventes vinculados aos cadastros de atividade rural de n. 5100338104 (Fazenda Onça Pintada), 5100283773 (Sítio Santa Terezinha) e 5100137112 (Sítio Barretão). Aduz que os dois primeiros se referem a propriedades cuja movimentação rural ocorreu após o término da união estável, enquanto o terceiro já integrava seu patrimônio particular antes do início da convivência, o que, segundo ele, afasta qualquer presunção de comunhão. Ressalta, ainda, a ausência de prova de esforço comum para a aquisição ou incremento dos bens em questão. Em suas palavras, “não há fundamento legal para a inclusão de tais bens na comunhão, seja em razão do momento de sua aquisição, seja pela ausência de comprovação de esforço comum na sua obtenção”. O apelante também impugna a inclusão, na partilha, da quantia de R$ 14.658,53 (quatorze mil, seiscentos e cinquenta e oito reais e cinquenta e três centavos), valor que afirma ter sido investido exclusivamente por ele após a dissolução da união, em melhorias realizadas no imóvel objeto da partilha. Assevera que a manutenção deste valor na divisão dos bens resultaria em enriquecimento ilícito da apelada, sendo ilegítima a inclusão de dispêndios posteriores com recursos próprios no patrimônio comum. No tocante à condenação por litigância de má-fé, nega ter atuado de forma desleal, afirmando ter apresentado documentação legítima e procedido de boa-fé. Argumenta que a mera divergência sobre os fatos e sobre a partilha de bens não caracteriza conduta dolosa ou fraudulenta, não sendo suficiente para a imposição da penalidade prevista no artigo 80 do Código de Processo Civil. Com essas considerações, requer o provimento do recurso, para que: (i) seja fixado o início da união estável em 02/04/2019; (ii) sejam excluídos da partilha os semoventes mencionados, ou, alternativamente, que se reconheça a partilha proporcional de apenas 7,5 cabeças de gado, de acordo com eventual incremento patrimonial durante a convivência; (iii) seja excluído da partilha o valor de R$ 14.658,53 (quatorze mil, seiscentos e cinquenta e oito reais e cinquenta e três centavos); e (iv) seja afastada a condenação por litigância de má-fé. O recurso é tempestivo e foi devidamente preparado (ID 273640350). Em contrarrazões (ID 273477857), a parte apelada manifestou-se pelo desprovimento do recurso, defendendo a manutenção da sentença em todos os seus termos. Recebido o recurso de apelação interposto por LUIZ PAULO PEREIRA BARRETO, foi verificada a existência de embargos de declaração opostos por SARA ALVES ESPÍNDOLA, ainda pendentes de apreciação. Por essa razão, os autos retornaram à origem (ID 277176368). Os embargos foram parcialmente acolhidos pelo Juízo a quo, apenas para sanar omissão relativa à penalidade imposta por litigância de má-fé, esclarecendo que a condenação se limitou à multa de 2% sobre o valor da causa, nos termos do artigo 81 do Código de Processo Civil, considerando-se absorvidas as demais penalidades pelo arbitramento dos honorários advocatícios e das custas processuais (ID 284132505). É o relato do necessário. Inclua-se em pauta. V O T O R E L A T O R EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES [RELATOR] Egrégia Câmara: Extrai-se dos autos que LUIZ PAULO PEREIRA BARRETO ajuizou ação de reconhecimento e dissolução de união estável c/c partilha de bens e dívidas c/c obrigação de fazer de entrega de anel de noivado e aliança de matrimônio em face de SARA ALVES ESPÍNDOLA, pretendendo: (i) o reconhecimento da união estável entre as partes, com termo inicial em 02 de abril de 2019 e término em 11 de setembro de 2019; (ii) a partilha dos bens e das dívidas adquiridos durante o período da união, com a exclusão do valor investido pelo requerente após a ruptura; e (iii) a devolução dos anéis de noivado e alianças de matrimônio, ou, alternativamente, a conversão desses itens em perdas e danos (ID. 273476880). A requerida apresentou contestação com reconvenção (ID 273477388), requerendo a expedição de ofícios aos bancos Sicredi e Banco do Brasil, para que fornecessem extratos bancários do autor referentes ao período da união estável, bem como ao Indea-MT, para informações sobre a movimentação de animais adquiridos durante a união, em razão da suspeita de ocultação de bens pelo autor. Pleiteou, ainda, que o requerente fosse condenado por litigância de má-fé, em razão das tentativas de omissão de bens, das falsas alegações e da apresentação de documentos com informações incorretas, como a nota fiscal das alianças. Por fim, se manifestou pela improcedência do pedido formulado na inicial. Regularmente processado o feito, o Juízo a quo prolatou sentença, nos seguintes termos, no que pertine: “[...] II.I – DO PEDIDO PRINCIPAL II.II – DA UNIÃO ESTÁVEL A relação entre as partes iniciou-se em maio de 2009 e evoluiu para uma união estável, formalizada com o noivado em 30 de junho de 2018. Os documentos ID 28992010 e 28992011, anexados pelo próprio autor, comprovam a união estável no período indicado. Ademais, o requerente não nega que noivou com a requerida na data de 30 de junho de 2018. Ainda, denota-se dos autos que é incontroverso que as partes conviveram como se fossem casadas até setembro de 2019, data em que resolveram encerrar a relação. Dessa forma, reconheço a existência da união estável entre as partes, configurada no período de 30/06/2018 a 11/09/2019, conforme dispõe o art. 1.723 do Código Civil: "É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família.", que estabelece os requisitos para a caracterização da união estável, a qual deve ser reconhecida quando há convivência pública, contínua e duradoura, com o objetivo de constituição de família. II.III – DA DISSOLUÇÃO E PARTILHA DE BENS II.IV – SEMOVENTES ADQUIRIDOS Durante a constância da união, as partes também adquiriram semoventes (ID 156917340), os quais devem ser partilhados de acordo com o regime da comunhão parcial de bens. O art. 1.725 do Código Civil estabelece que os bens adquiridos onerosamente durante a união estável devem ser partilhados igualmente, salvo estipulação em contrário. Assim, considerando que os semoventes foram adquiridos com esforço comum e que não há prova de que pertençam exclusivamente a uma das partes, determino que os semoventes sejam partilhados igualmente entre os conviventes. [...]. II.V – DO IMÓVEL ADQUIRIDO Durante a constância da união, as partes adquiriram um imóvel urbano, pelo qual, segundo consta dos autos, a requerida contribuiu com R$ 40.000,00 (quarenta mil reais) e o requerente com R$ 13.000,00 (treze mil reais). A requerida pleiteia que a partilha seja proporcional à contribuição de cada um. Contudo, em conformidade com o regime de comunhão parcial de bens e com base na jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça (STJ), determino que o imóvel seja partilhado igualmente entre as partes. Tal entendimento se fundamenta no princípio da proteção à confiança mútua e no esforço comum para a constituição do patrimônio. II.VI – BENS MÓVEIS E ELETRODOMÉSTICOS A requerida argumenta que os bens móveis foram adquiridos exclusivamente pelo requerente e vendidos sem sua anuência. No entanto, como tais bens foram adquiridos durante a união e não há provas robustas de que tenham sido doados ou pertencentes exclusivamente a uma das partes, aplico o disposto no art. 1.658 do Código Civil: [...].Referido artigo estabelece a comunicação dos bens adquiridos na constância da união estável. Assim, determino que o valor apurado pela venda dos móveis, no montante de R$ 25.000,00, seja igualmente partilhado entre os conviventes, considerando o esforço comum empregado na aquisição e manutenção desses bens. II.VII – ALIANÇAS E ANEL DE NOIVADO O autor pleiteia a restituição do anel de noivado e da aliança de matrimônio, sob o argumento de que foram doados em contemplação ao casamento, nos termos do artigo 546 do Código Civil. Verifico que o autor comprovou a aquisição destes bens, anexando aos autos as respectivas notas fiscais (ID 48655772 e 28992007). A requerida, por sua vez, alegou que as alianças teriam sido adquiridas por seu pai, porém não trouxe aos autos qualquer prova dessa alegação. Desta forma, condeno a requerida a restituir os referidos bens ao autor. Caso não seja possível a devolução, fica a requerida condenada ao pagamento do valor correspondente de R$ 6.390,00 (seis mil, trezentos e noventa reais). II.VIII – DAS DÍVIDAS As dívidas contraídas durante a união estável, incluindo a reforma do imóvel alugado e os custos relativos à obra do imóvel adquirido, deverão ser partilhadas igualmente entre as partes, conforme o regime de comunhão parcial de bens. A requerida contesta a validade de algumas dívidas, alegando que foram contraídas unilateralmente pelo requerente e sem o seu consentimento, não beneficiando o casal. Neste ponto, acolho parcialmente a alegação da requerida, excluindo da partilha as dívidas relacionadas ao contrato de sublocação, uma vez que tais valores não trouxeram benefícios comprovados ao casal, conforme o art. 1.660 do Código Civil: [...]. Ademais, a ausência de provas quanto ao uso dos valores para o benefício comum reforça a exclusão dessas dívidas da partilha. III – DA RECONVENÇÃO A requerida apresentou reconvenção buscando, além da partilha justa do patrimônio comum, a restituição de valores emprestados ao autor e a exclusão de determinadas dívidas da partilha. Passo à análise dos pedidos reconvencionais. III.I – RESTITUIÇÃO DE VALORES EMPRESTADOS No que tange ao pedido de restituição de valores que a requerida alega ter emprestado ao autor, verifico que a requerida não trouxe aos autos provas documentais suficientes que comprovem a existência dos empréstimos, tampouco os valores específicos e as condições pactuadas para tais empréstimos. No entanto, o autor reconheceu, em parte, que recebeu valores da requerida para custear algumas despesas durante a constância da união, sem, contudo, especificar claramente as quantias e os termos do suposto empréstimo. Diante da ausência de comprovação documental específica e da inexistência de elementos que caracterizem um contrato de mútuo, entendo que não restou suficientemente demonstrada a obrigação de restituir os valores alegadamente emprestados. Desta forma, julgo improcedente o pedido reconvencional de restituição dos valores que a requerida afirma ter emprestado ao autor. III.II LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ A requerida pleiteia a condenação do requerente por litigância de má-fé, alegando que este agiu de forma desleal, ocultando bens. A análise dos autos revela que, de fato, o requerente tentou omitir bens passíveis de partilha, apresentando documentos inconsistentes e prestando informações inexatas. Tal conduta fere os princípios da boa-fé e da cooperação processual, previstos no art. 5º do Código de Processo Civil: "Aquele que de qualquer forma participa do processo deve comportar-se de acordo com a boa-fé.". Assim, reconheço a litigância de má-fé do requerente e determino a aplicação de multa de 2% (dois por cento) sobre o valor da causa, conforme disposto no art. 81 do Código de Processo Civil: "De ofício ou a requerimento, o juiz condenará o litigante de má-fé a pagar multa que será fixada entre um e dez por cento do valor corrigido da causa, e a indenizar a parte contrária pelos prejuízos que esta sofreu, mais os honorários advocatícios e todas as despesas que efetuou.". IV – DISPOSITIVO Ante o exposto, nos termos do artigo 487, I, do Código de Processo Civil, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados na ação e IMPROCEDENTES os pedidos formulados na reconvenção para: a)RECONHECER a união estável entre as partes no período de 30/06/2018 a 11/09/2019, nos termos do art. 1.723 do Código Civil; b) DECRETAR a dissolução da referida união; c)DETERMINAR a partilha igualitária do imóvel adquirido durante a união, na proporção de 50% (cinquenta por cento) para cada parte, com base no princípio da proporcionalidade e na jurisprudência do STJ; d)PARTILHAR igualmente o valor da venda dos bens móveis, na proporção de 50% (cinquenta por cento) para cada parte, nos termos do art. 1.658 do Código Civil; e)PARTILHAR igualmente as dívidas contraídas durante a união, excluindo aquelas relacionadas ao contrato de sublocação, por ausência de benefício comprovado ao casal, nos termos do art. 1.660 do Código Civil; f) PARTILHAR igualmente os semoventes existentes na inscrição do requerente, na data da dissolução da união estável, na proporção de 50% (cinquenta por cento) para cada parte; g)CONDENAR o requerente ao pagamento de multa por litigância de má-fé, fixada em 2% (dois por cento) sobre o valor da causa; h)CONDENAR ambas as partes ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios ao patrono da parte adversa, incompensáveis, fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, nos termos do artigo 85, §2º, do Código de Processo Civil. [...]” (ID 273477491). A controvérsia recursal diz respeito ao termo inicial da união estável reconhecida entre as partes, à partilha de semoventes e de valores supostamente investidos após o fim da convivência, bem como à condenação por litigância de má-fé imposta ao apelante. Pois bem. Inicialmente, cumpre destacar que o reconhecimento da união estável encontra amparo no artigo 226, § 3º, da Constituição Federal, que consagra essa forma de entidade familiar, sendo regulamentado, em sede infraconstitucional, pelos artigos 1.723 a 1.727 do Código Civil. Nos termos do artigo 1.723 do referido diploma legal, a união estável é configurada como uma convivência pública, contínua e duradoura, estabelecida com o objetivo de constituição de família. Tais requisitos devem estar presentes de forma concomitante, sendo a ausência de qualquer deles impeditiva do reconhecimento da entidade familiar. No caso concreto, o apelante sustenta que a união estável entre as partes deveria ser reconhecida apenas a partir de abril de 2019, ao argumento de que somente então teria se iniciado a coabitação do casal. Todavia, razão não lhe assiste. Com efeito, os autos revelam que, em 30 de junho de 2018, as partes celebraram publicamente o noivado, em cerimônia realizada no Centro de Geração de Renda do Município de Salto do Céu/MT, com a presença de aproximadamente 100 (cem) convidados, ocasião que houve troca de alianças, devidamente registrada em fotografias (ID 273476899 e 273477350), além da posterior contratação de serviços diretamente ligados à celebração do futuro matrimônio, como produção audiovisual e locação de vestido de noiva (ID 273477391 e 273477393). Ademais, a apelada apresentou diversos comprovantes de transferências bancárias realizadas por ela em favor do apelante (ID 273477388, pp. 6, 8, 13, 14 e 15), que incluem pagamentos de parcelas de móveis, construção de imóvel, reformas, além de empréstimos pessoais, evidenciando que, àquela altura, as partes já haviam consolidado um projeto de vida em comum, assumindo compromissos financeiros e afetivos típicos da constituição de entidade familiar. Embora seja certo que o noivado, isoladamente, não configure automaticamente a união estável, é igualmente verdadeiro que ele pode representar o marco inicial da relação jurídica familiar, desde que estejam presentes os elementos caracterizadores exigidos pelo ordenamento, os quais se manifestam de forma inequívoca na espécie. Aliás, ainda que a coabitação tenha se iniciado em momento posterior, é oportuno destacar que a jurisprudência consolidada, inclusive do Superior Tribunal de Justiça, afasta a exigência da vida em comum sob o mesmo teto como requisito indispensável à configuração da união estável. Veja-se: “DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE RECONHECIMENTO E DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL POST MORTEM. COABITAÇÃO. DISPENSA. REQUISITOS LEGAIS. COMPROVAÇÃO. ACÓRDÃO RECORRIDO EM CONSONÂNCIA COM A JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE. [...] II. Questão em discussão 2. Consiste em analisar se a ausência de coabitação entre as partes impede o reconhecimento da união estável. III. Razões de decidir 3. "É pacífico o entendimento de que a ausência de coabitação entre as partes não descaracteriza a união estável. Incidência da Súmula 382/STF" (REsp n. 1.096.324/RS, Relator Ministro Honildo Amaral de Mello Castro - Desembargador convocado do TJ/AP -, Quarta Turma, julgado em 2/3/2010, DJe de 10/5/2010). Aplicação da Súmula n. 83/STJ. [...] Tese de julgamento: "1. A coabitação não é requisito essencial para a configuração da união estável." [...]” (AgInt no AREsp n. 2.602.699/RS, Rel. Min. Antônio Carlos Ferreira, Quarta Turma, julgado em 7/4/2025, DJEN de 11/4/2025 – grifo nosso). Nesse mesmo sentido, este Egrégio Tribunal já se pronunciou de forma clara e objetiva, ao reconhecer que “A ausência de coabitação não afasta, por si só, o reconhecimento da união estável, conforme entendimento consolidado na jurisprudência” (TJMT, N.U 0000669-67.2018.8.11.0090, Rel. Desa. Anglizey Solivan de Oliveira, Quarta Câmara de Direito Privado, julgado em 08/03/2025, publicado no DJE 08/03/2025 – grifo nosso). Por essas razões, impõe-se reconhecer como marco inicial da união estável a data de 30 de junho de 2018, momento em que se revelaram, de forma clara, pública e contínua, os elementos essenciais à sua configuração jurídica, sendo esta, portanto, a data corretamente fixada na sentença recorrida. Superada essa questão, cumpre analisar a partilha dos bens. Conforme dispõe o artigo 1.725 do Código Civil, salvo contrato escrito em sentido diverso, aplica-se à união estável o regime da comunhão parcial de bens, no qual se presumem comuns os bens adquiridos onerosamente na constância da convivência. In verbis: “Art. 1.725. Na união estável, salvo contrato escrito entre os companheiros, aplica-se às relações patrimoniais, no que couber, o regime da comunhão parcial de bens”. Portanto, o patrimônio constituído durante a união, independentemente de qual dos companheiros tenha contribuído com maior ou menor aporte financeiro, presume-se resultante de esforço comum. Na hipótese, o apelante afirma que os semoventes constantes dos cadastros rurais vinculados às propriedades “Fazenda Onça Pintada”, “Sítio Santa Terezinha” e “Sítio Barretão” não devem ser incluídos na partilha, sob o argumento de que teriam sido adquiridos antes do início da união estável ou após sua dissolução. Aduz, ainda, não ter havido esforço comum da apelada na aquisição dos animais, o que atrairia a regra da incomunicabilidade prevista no artigo 1.659, I, do Código Civil. Contudo, essa alegação não se sustenta diante da documentação constante dos autos, notadamente o Histórico Analítico de Movimentação de Semoventes emitido pelo Indea-MT (ID 273477428, p. 13), o qual demonstra, de forma objetiva e cronológica, as entradas e saídas de bovinos no “Sítio Barretão”, propriedade registrada em nome do apelante. Ressalte-se que esse documento foi obtido por solicitação expressa da apelada, que requereu a expedição de ofício ao Indea-MT para que fosse fornecido o extrato de saldos e movimentações de animais no período correspondente à união estável do casal, compreendido entre 30 de junho de 2018 e 11 de setembro de 2019. O apelante, portanto, não logrou afastar a presunção legal de comunicabilidade, pois não apresentou prova robusta e inequívoca quanto à origem exclusiva dos recursos empregados na aquisição dos semoventes, encargo probatório que competia exclusivamente a ele. A propósito, a jurisprudência deste Egrégio Tribunal de Justiça é firme nesse sentido, reconhecendo a presunção de comunicabilidade dos bens adquiridos onerosamente durante a união estável, cabendo à parte interessada o ônus de ilidir tal presunção. Confira-se: “Direito civil e direito processual civil. Apelação cível. Ação de reconhecimento e dissolução de união estável c/c partilha de bens e danos morais. Regime de comunhão parcial de bens. Veículo automotor (motocicleta). Prova da aquisição durante a convivência. Ameaça à meação afastada. Recurso desprovido. [...] Tese de julgamento: "1. Reconhecida a união estável sob o regime da comunhão parcial de bens, presume-se a comunicação dos bens adquiridos onerosamente durante a convivência, cabendo à parte que pretende afastar essa presunção o ônus da prova. [...]” (TJMT, N.U 0001682-75.2017.8.11.0110, Rel. Desa. Clarice Claudino da Silva, Primeira Câmara de Direito Privado, julgado em 02/05/2025, publicado no DJE 02/05/2025 – grifo nosso). “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE RECONHECIMENTO E DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL C/C PARTILHA DE BENS – UNIÃO RECONHECIDA E DISSOLVIDA – REGIME DE COMUNHÃO PARCIAL DE BENS – ART´S 1.725 C/C 1.658, AMBOS DO CÓDIGO CIVIL DE 2002 – PRESUNÇÃO DO ESFORÇO COMUM – ÔNUS DA PROVA DO EXCLUSIVO DESEMBOLSO – PARTILHA INVIABILIZADA – INEXISTÊNCIA DE PROVA ROBUSTA – DOCUMENTOS QUE INDICAM QUE OS BENS PERTENCEM A TERCEIROS – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. A união estável é reconhecida como entidade familiar, regida pelo regime da comunhão parcial de bens, o que implica a presunção de que os bens adquiridos onerosamente durante a relação pertencem a ambos os conviventes, salvo prova em contrário. O ônus de demonstrar que determinado bem não se comunicaria na relação estável cabe à parte que o alega, mediante documentação idônea [...]” (TJMT, N.U 0000138-11.2016.8.11.0038, Rel. Des. Dirceu dos Santos, Terceira Câmara de Direito Privado, julgado em 29/03/2025, publicado no DJE 29/03/2025 – grifo nosso). Dessa forma, a tese de que esses bens seriam incomunicáveis, à luz do artigo 1.659, I, do Código Civil, revela-se improcedente. Não se sustenta, igualmente, o pedido subsidiário de partilha proporcional a 7,5 cabeças de gado, porquanto a movimentação constante dos semoventes, demonstrada documentalmente, revela não apenas a aquisição durante o período da união, mas também a sua exploração econômica como atividade produtiva geradora de renda, o que reforça sua natureza comunicável. À vista disso, estando demonstrado que os semoventes foram incorporados ao patrimônio do casal durante a união estável e não havendo prova da sua exclusividade patrimonial, correta sentença no ponto em que determinou sua partilha igualitária. No que se refere ao valor de R$ 14.658,53 (quatorze mil, seiscentos e cinquenta e oito reais e cinquenta e três centavos), o apelante sustenta tê-lo despendido, de forma exclusiva, após o término da união, em benfeitorias realizadas no imóvel objeto da partilha. Todavia, referido valor não pode ser automaticamente excluído da partilha sem a devida apuração de sua natureza jurídica. Isso porque eventual direito à indenização por benfeitorias úteis ou necessárias pressupõe a comprovação inequívoca da efetiva realização das obras, do momento em que foram executadas e do benefício concreto delas decorrente ao bem comum, outro ônus do qual o apelante não se desincumbiu. Ademais, não há qualquer indício de que a apelada tenha usufruído das supostas benfeitorias ou delas auferido benefício econômico direto, o que evidencia o caráter unilateral da alegação do apelante e afasta, de forma definitiva, qualquer fundamento de enriquecimento sem causa. Por essas razões, mostra-se acertada a sentença ao manter referido valor no bojo da partilha, diante da ausência de elementos probatórios aptos a infirmar a presunção legal de comunicabilidade. Por fim, quanto à condenação por litigância de má-fé, a sentença também merece confirmação. A conduta do apelante, ao tentar ocultar bens sujeitos à partilha, apresentando documentos imprecisos e prestando informações contraditórias, configura evidente afronta à boa-fé objetiva, que deve nortear o comportamento das partes ao longo do processo. Nesse cenário, a penalidade imposta (multa de 2% sobre o valor da causa) observa os limites legais e se mostra proporcional à gravidade da conduta processual verificada. Não se trata de penalização por mera divergência interpretativa, mas por postura processual contrária à cooperação e à lealdade, elementos essenciais no devido processo legal contemporâneo. Assim, constata-se que a sentença recorrida examinou de forma completa e fundamentada os elementos constantes dos autos, aplicando corretamente o direito ao caso concreto, razão pela qual deve ser mantida. Ante o exposto, conheço e NEGO PROVIMENTO ao recurso de apelação interposto por LUIZ PAULO PEREIRA BARRETO, mantendo, na íntegra, a sentença recorrida. Nos termos do artigo 85, § 11, do Código de Processo Civil, majoro os honorários advocatícios sucumbenciais fixados em favor da parte apelada para 12% (doze por cento) sobre o valor atualizado da causa. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 17/06/2025
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