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Processo nº 0817990-55.2024.8.10.0040

ID: 292190398

Tribunal: TJMA Órgão: Segunda Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 0817990-55.2024.8.10.0040

Data de Disponibilização: 09/06/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

EAGLE INSTITUICAO DE PAGAMENTO LTDA.

Acórdão

Advogados:

SOFIA COELHO ARAUJO

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THAYNARA ROCHA DE SA CHAVES

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JOANA GONCALVES VARGAS

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JANE GRANDO

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DANIEL GERBER

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NELSON WILIANS FRATONI RODRIGUES

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LETICIA DA SILVA CAMPOS LIMA BARROSO

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APELAÇÃO CÍVEL Nº. 0817990-55.2024.8.10.0040 APELANTE: MANUEL LORENÇO DA COSTA ADVOGADO(A): LETICIA DA SILVA CAMPOS LIMA BARROSO OAB/MA 18.293 APELADO: BANCO BRADESCO S.A e EAGLE INSTITUICAO DE PAGAM… APELAÇÃO CÍVEL Nº. 0817990-55.2024.8.10.0040 APELANTE: MANUEL LORENÇO DA COSTA ADVOGADO(A): LETICIA DA SILVA CAMPOS LIMA BARROSO OAB/MA 18.293 APELADO: BANCO BRADESCO S.A e EAGLE INSTITUICAO DE PAGAMENTO LTDA ADVOGADO(A): DANIEL GERBER OAB/RS 39.879 e NELSON WILIANS FRATONI RODRIGUES OAB/SP 128.341 RELATORA: DESEMBARGADORA MARIA FRANCISCA GUALBERTO DE GALIZA EMENTA DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO CUMULADA COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. SEGURO NÃO CONTRATADO. DESCONTOS INDEVIDOS. RECURSO PROVIDO. I. Caso em exame 1. Apelação interposta contra sentença que julgou improcedente o pedido de indenização por danos morais e materiais, diante da cobrança de valores a título de seguro não contratado, por meio de descontos realizados diretamente na conta bancária do autor, idoso, sem sua expressa anuência. II. Questão em discussão 2. Há duas questões em discussão: (i) saber se é legítima a cobrança de prêmio de seguro não contratado com a consumidora; e (ii) saber se há responsabilidade da instituição financeira pelos descontos indevidos e cabimento de indenização por danos morais e materiais. III. Razões de decidir 3. A cobrança de valores sem contrato formal viola o dever de informação previsto no CDC, configurando prática abusiva. 4. A instituição financeira é solidariamente responsável pelos danos decorrentes de descontos indevidos, por integrar a cadeia de fornecimento. 5. O banco não apresentou prova da contratação válida do seguro, nem do consentimento da autora, ônus que lhe incumbia. 6. A conduta gerou prejuízos financeiros ao autor, comprometendo sua subsistência, o que justifica a condenação por danos morais e materiais. 7. Restituição em dobro dos valores indevidamente descontados e indenização por danos morais no valor de R$ 2.000,00. IV. Dispositivo e tese 8. Recurso provido. Tese de julgamento: “1. A cobrança de prêmio de seguro sem a comprovação de contratação válida pelo consumidor configura prática abusiva e enseja restituição em dobro dos valores. 2. A instituição financeira responde solidariamente por danos causados ao consumidor, quando autoriza descontos sem verificar a legalidade da transação. 3. A ocorrência de descontos indevidos em conta de aposentadoria compromete a subsistência da vítima e configura dano moral indenizável.” Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, XXXII; CDC, arts. 6º, III, VII e VIII; 7º, p.u.; 14; 39, III; 42, p.u.; CPC, art. 373, II. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no REsp 1414764/PR, Rel. Min. Raul Araújo, Quarta Turma, j. 21.02.2017; STJ, AgRg no AREsp 510.041/SP, Rel. Min. Sidnei Beneti, Terceira Turma, j. 05.08.2014; TJ-SP, AC 1000553-61.2020.8.26.0638, Rel. Des. Antonio Rigolin, j. 26.10.2021; TJ-SC, APL 5016028-78.2021.8.24.0033, Rel. Des. Marcos Fey Probst, j. 20.06.2023. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os presentes autos, acordam os integrantes da Segunda Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, por votação unânime, em CONHECER E DAR PROVIMENTO ao recurso, nos termos do voto da Desembargadora Relatora. Participaram do julgamento, além da Relatora, os Senhores Desembargadores José Gonçalo de Sousa Filho e Marcelo Carvalho Silva (presidente). Sala Virtual das Sessões da Segunda Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, São Luís, no período de 20 a 27 de maio de 2025. São Luís, data do sistema. Desembargadora MARIA FRANCISCA GUALBERTO DE GALIZA Relatora RELATÓRIO Trata-se de apelação cível interposta por Manuel Lorenço da Costa em face da sentença proferida pela Juíza Cynara Elisa Gama Freire, titular da 1ª Vara Cível da Comarca De Imperatriz, nos autos da Ação Declaratória de Inexistência c/c Indenizatória. O juízo monocrático julgou, da seguinte forma: “Deste modo, em conformidade com os dispositivos já mencionados, na forma do artigo 487, inciso I, do NCPC, JULGO IMPROCEDENTES OS PEDIDOS, ante a inexistência de vício no contrato ora pactuado. Condeno o autor ao pagamento das custas processuais e ao pagamento de honorários advocatícios, os quais, fixo no patamar de 10% sobre o valor da causa, cuja exigibilidade fica suspensa nos termos do artigo 98, §3º, do NCPC (sentença 30981015).” Nas razões recursais, o apelante, alega ter sido surpreendido com descontos mensais no valor de R$ 49,90 em sua conta bancária, vinculada ao recebimento de benefício previdenciário, identificados sob a rubrica “PAGTO COBRANÇA EAGLE SOCIEDADE DE CRÉDITO DIRET”. Afirma que não contratou, tampouco autorizou, qualquer serviço com a empresa ré EAGLE. Ressalta ser aposentado, analfabeto e não possuir telefone, o que, segundo argumenta, inviabiliza a realização de contratação por meio de chamada telefônica, conforme sustentado pelas rés. Por fim, sustenta que o único objetivo das rés foi obter lucro em detrimento do consumidor hipervulnerável. Com isso, pugna pelo conhecimento e provimento do recurso. Contrarrazões no Id. nº. 44413662 e Id. Nº 44413664. Por fim, dispensado o envio dos autos ao Ministério Público, uma vez que o presente litígio não se emoldura nas hipóteses previstas no art. 178 do CPC. Cumpre ressaltar, que o Conselho Nacional de Justiça, no bojo do relatório de Inspeção Ordinária nº 0000561-48.2023.2.00.0000, explicitou que o mencionado órgão, reiteradamente, apresenta manifestação pela falta de interesse ministerial por se tratar de direito privado disponível, sendo essa dispensa a materialização do princípio da economia processual. É o relatório. VOTO Presentes os pressupostos de admissibilidade recursal, conheço da apelação. Dito isto, sigo ao exame do mérito sobrelevando que “é necessária a expressa previsão contratual das tarifas e demais encargos bancários para que possam ser cobrados pela instituição financeira”, de maneira que “não juntados aos autos os contratos, deve a instituição financeira suportar o ônus da prova, afastando-se as respectivas cobranças” (AgInt no REsp 1414764/PR, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 21/02/2017, DJe 13/03/2017). No tocante à legitimidade do Banco apelado para figurar no polo passivo da presente demanda, vislumbro que se trata de responsabilidade solidária, tendo em vista que no caso dos autos, aplica-se o princípio da aparência, no escopo de conferir segurança jurídica as operações pautadas na boa-fé. Nesse trilhar, o fornecedor que integra a cadeia de consumo, ainda que não tenha culpa pelo ato de outro, é solidariamente responsável pelos danos ocasionados ao consumidor por qualquer fornecedor da mesma cadeia de consumo. Logo, o Banco que autorizou os descontos sem se assegurar da legalidade da transação, concorre solidariamente para a ocorrência dos danos causados ao consumidor (art. 14 do Código de Defesa do Consumidor), sendo irrelevante a apuração de sua culpa justamente por se tratar de relação de consumo. In casu, o Banco apelado compõe a cadeia de consumo, é solidariamente responsável perante o consumidor, nos termos do artigo 7º, parágrafo único, do CDC: Art. 7º Os direitos previstos neste código não excluem outros decorrentes de tratados ou convenções internacionais de que o Brasil seja signatário, da legislação interna ordinária, de regulamentos expedidos pelas autoridades administrativas competentes, bem como dos que derivem dos princípios gerais do direito, analogia, costumes e eqüidade. Parágrafo único. Tendo mais de um autor a ofensa, todos responderão solidariamente pela reparação dos danos previstos nas normas de consumo. Nesses termos: SEGURO DE VIDA. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. LEGITIMIDADE PASSIVA DO BANCO CORRÉU RECONHECIDA. INÉPCIA DA INICIAL. REJEIÇÃO. COBRANÇA DE PRÊMIO DE SEGURO SEM AMPARO EM CONTRATO E SEM AUTORIZAÇÃO DA TITULAR DA CONTA BANCÁRIA. DIREITO À RESTITUIÇÃO EM DOBRO DOS VALORES. DANO MORAL. CONFIGURAÇÃO NA HIPÓTESE. ARBITRAMENTO QUE GUARDA RAZOABILIDADE. PREVALECIMENTO. RETIFICAÇÃO, DE OFÍCIO, DO TERMO INICIAL DE CONTAGEM DOS JUROS DE MORA. RECURSO IMPROVIDO, COM OBSERVAÇÃO. 1. Tratando-se de discussão a respeito de lançamentos de descontos indevidos, é inegável a legitimidade passiva da instituição financeira que mantém com o autor contrato de conta corrente. (...) 4. O autor faz jus à restituição em dobro dos respectivos valores descontados, com juros contados a partir de cada lançamento indevido, retificação que se faz de ofício, por se tratar de matéria de ordem pública. Adota-se a orientação da jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça, fixada no julgamento do ERESP 1413542, no sentido de que a repetição em dobro, na forma do artigo 42, parágrafo único, do CDC, requer apenas identificação de ofensa à boa-fé objetiva. 5. Configurada a culpa dos réus, inegável o dever de reparação do dano moral, que se encontra perfeitamente evidenciado, considerando que o autor ficou privado, durante meses, do recebimento integral de sua aposentadoria. 6. Razoável se apresenta o montante fixado para a respectiva indenização (R$ 5.000,00), por identificar a situação de equilíbrio, de modo a guardar relação com o grau da culpa e influenciar no ânimo do ofensor. (TJ-SP - AC: 10005536120208260638 SP 1000553-61.2020.8.26.0638, Relator: Antonio Rigolin, Data de Julgamento: 26/10/2021, 31ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 26/10/2021) (grifo nosso) APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - LEGITIMIDADE PASSIVA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA - CONSTATADA - DESCONTOS INDEVIDOS EM CONTA CORRENTE POR MEIO DE DÉBITO AUTOMÁTICO - DEVER DE RESTITUIR - CONFIGURADO - DANOS MORAIS - INOCORRÊNCIA. - O banco réu ostenta legitimidade para responder por alegada falha na prestação de serviço concernente à contratação/autorização de débito automático na conta bancária de titularidade da autora - A ocorrência de descontos indevidos em conta corrente, promovidos pela instituição financeira, sem que o correntista tenha autorizado o débito automático, demonstra clara falha na prestação do serviço por parte do banco, ensejando o dever de restituir os valores debitados indevidamente - Se a inscrição do nome do autor no cadastro de inadimplentes não se deu exclusivamente pelos descontos indevidos, não se há de reconhecer como irregular essa inscrição, não configurando o dano moral. V .V.- A ocorrência dos descontos efetuados na conta corrente onde o autor recebe o seu salário, em razão do débito automático não autorizado por ele, referente a serviço que ele não contratou, por si só é capaz de trazer sofrimento e angústia, configurando o dano moral - Na fixação do quantum devido a título de danos morais, o Julgador deve pautar-se pelo bom senso, moderação e prudência, sem perder de vista que, por um lado, a indenização deve ser a mais completa possível e, por outro, ela não pode tornar-se fonte de lucro.(TJ-MG - AC: 10000191297357001 MG, Relator: Roberto Apolinário de Castro (JD Convocado), Data de Julgamento: 12/11/2019, Câmaras Cíveis / 10ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 20/11/2019) Desta foma, é inegável a legitimidade do apelado, Banco Bradesco S.A. para figurar no polo passivo do presente feito, uma vez que o próprio banco admite que atua como intermediador dos descontos na conta bancária de titularidade do autor. Assim, cabia à instituição financeira checar rigorosamente as condições de legalidade do seguro antes de realizar os descontos, visto que é ônus inerente a sua atividade. Desse modo, é importante registrar que a inversão do ônus da prova em causas dessa espécie é medida que se impõe (art. 6º, VIII, do CDC) e, no meu entender, a instituição financeira não conseguiu desconstituir as assertivas da parte demandante, no sentido de que não houve ilegalidade na contratação de um produto bancário, tendo em vista que a contratação por telefone não observou os princípios consumeristas, notadamente o direito à informação e a vulnerabilidade da idosa. Logo, entendo que o áudio apresentado pela requerida não é apto a comprovar a contratação válida. Vejamos a previsão do Código de Defesa do Consumidor: Art. 6º São direitos básicos do consumidor: […] III - a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem; VII - o acesso aos órgãos judiciários e administrativos com vistas à prevenção ou reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos ou difusos, assegurada a proteção Jurídica, administrativa e técnica aos necessitados; VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências; Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas: […] III - enviar ou entregar ao consumidor, sem solicitação prévia, qualquer produto, ou fornecer qualquer serviço; (grifei) Destaco, no ponto, julgados que examinam casos semelhantes, ipsis litteris: APELAÇÃO - Responsabilidade civil - Ação declaratória de inexistência de relação contratual cumulada com repetição do indébito e indenização por danos morais - Sentença de parcial procedência, rejeitado apenas o pedido de devolução em dobro dos valores pagos pela autora - Apelo da seguradora ré - Manifestação válida de vontade da autora na contratação do seguro - Não ocorrência - Áudio juntado aos autos que demonstra o desrespeito da ré à condição de hipervulnerável apresentada pela autora no ato da contratação pela via telefônica - Fala da atendente em ritmo acelerado e exigência de respostas de inopino que viciaram a manifestação de vontade da autora - Prática abusiva – Artigo 39, inciso IV, do Código de Defesa do Consumidor- Nulidade do contrato reconhecida, com efeitos retrospectivos ("ex tunc") - Restituição da integralidade do valor pago pela autora que é medida de rigor - Inexistência de benefício obtido pela autora em decorrência do contrato que justifique a retenção do prêmio pago - Dano moral - Configuração - Ato ilícito praticado pela ré que trouxe surpresa indesejável e transtornos à autora e deve ser sancionado pelo ordenamento jurídico - Valor da indenização adequado às circunstâncias do caso concreto - Não cabimento de redução - Majoração dos honorários advocatícios em razão da sucumbência recursal - Sentença mantida - Recurso DESPROVIDO. (TJSP; Apelação Cível 1000839-05.2021.8.26.0347; Relator (a): Luís Roberto Reuter Torro; Órgão Julgador: 27ª Câmara de Direito Privado; Foro de Matão - 2ª Vara Cível; Data do Julgamento: 30/03/2023; Data de Registro: 30/03/2023) (grifei) SEGURO. Ação declaratória de inexistência de relação jurídica, repetição de indébito em dobro e indenização por danos morais. Descontos de parcelas de prêmio de seguro diretamente na conta bancária da autora que se mostraram indevidos. Contratação via telefone realizada de forma enganosa. Relação jurídica não demonstrada. Restituição em dobro. Entendimento do STJ e desta Colenda Câmara. Danos morais configurados. Indenização mantida em R$5.000,00, em atenção aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade. Precedentes. Recurso desprovido. (TJSP; Apelação Cível 1003096-03.2021.8.26.0347; Relator (a): Milton Carvalho; Órgão Julgador: 36a Câmara de Direito Privado; Foro de Matão - 3a Vara Cível; Data do Julgamento: 11/04/2022; Data de Registro: 11/04/2022) (grifei) APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA, RESTITUIÇÃO EM DOBRO E DANOS MORAIS. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. RECURSO DA AUTORA. ALEGADO DESACERTO DA DECISÃO. ARGUMENTAÇÃO DE QUE A APELANTE NUNCA CONTRATOU SEGURO. SUBSISTÊNCIA. CONTRATAÇÃO RESPALDADA UNICAMENTE POR ÁUDIO DE SUPOSTA LIGAÇÃO TELEFÔNICA ENTRE AS PARTES. ATENDENTE DA CENTRAL QUE FALA EM RITMO ACELERADO E SUSCITA QUE A PARTE RESPONDA DE MANEIRA AFIRMATIVA PARA A PERFECTIBILIZAÇÃO DO NEGÓCIO JURÍDICO. AINDA, ÁUDIO INCOMPLETO. VIOLAÇÃO DO DEVER DE TRANSPARÊNCIA E DE INFORMAÇÃO, ESPECIALMENTE POR SE TRATAR DE CONSUMIDORA IDOSA ( CDC, ARTS. 6º, IV, III, 31, 39, IV, E 54-C, IV). NECESSÁRIA DECLARAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA. AINDA, CABÍVEL A DEVOLUÇÃO EM DOBRO DOS VALORES INDEVIDAMENTE DESCONTADOS. COBRANÇA QUE SE REVELA ABUSIVA E INJUSTIFICADA. REPETIÇÃO DOBRADA DEVIDA (ART. 42, PARÁGRAFO ÚNICO DO CDC). JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA. SÚMULAS 43 E 54 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. NECESSIDADE, PORÉM, DE ATENÇÃO À MODULAÇÃO DE EFEITOS DETERMINADA PELO CORTE SUPERIOR. PLEITO DE REPARAÇÃO PELO ABALO ANÍMICO SOFRIDO. IMPROCEDÊNCIA. SITUAÇÃO INCAPAZ, POR SI SÓ, DE CAUSAR ABALO ANÍMICO INDENIZÁVEL. DANO QUE NÃO SE PRESUME. AUSÊNCIA DE PROVAS QUANTO AOS PREJUÍZOS CONCRETOS SUPORTADOS PELA AUTORA, A EXEMPLO DE COMPROMETIMENTO DE PARCELA SIGNIFICATIVA DA RENDA. PARCIAL PROVIMENTO QUE SE IMPÕE. SENTENÇA REFORMADA. SEM FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS RECURSAIS. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (TJ-SC - APL: 50160287820218240033, Relator: Marcos Fey Probst, Data de Julgamento: 20/06/2023, Sexta Câmara de Direito Civil) (grifei) Ademais, os apelados não juntaram aos autos, cópia do contrato firmado entre as partes contendo a autorização para o desconto do valor cobrado relativo à PAGTO COBRANÇA EAGLE SOCIEDADE DE CREDITO DIRET, em sua conta, o que, por certo, configuramos danos indicados. Assim, no caso em apreço, entendo que, não tendo a Instituição Financeira se desincumbido do seu ônus probatório (art. 373, II, CPC) – haja vista que não apresentou cópia do instrumento contratual –, são indevidas as cobranças referentes ao título cobrado e ilícitos os descontos efetivados na conta bancária da autora, pelo que merece ser compensado pelos abalos extrapatrimoniais experimentados. Entendo como adequada a condenação dos apelados em restituir em dobro os valores indevidamente descontados e indenizar a autora pelos danos morais sofridos. No caso sub examine, verifico que a conduta do banco provocou, de fato, abalos morais a autora, visto que, ao descontar indevidamente valores de seus proventos, provocou privações financeiras e comprometeu seu sustento. Presentes, portanto, no meu sentir, os pressupostos da responsabilidade civil: conduta (desconto indevido), dano (desajuste financeiro) e nexo causal. Em verdade, “o desconto realizado por instituição bancária em conta corrente do seu cliente sem autorização expressa deste enseja danos morais” (AgRg no AREsp 510.041/SP, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 05/08/2014, DJe 01/09/2014). No que tange ao quantum indenizatório, recordo que, malgrado a legislação não estabeleça critérios objetivos, a fixação dos danos morais deve sempre observar os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, orientando-se por sua dupla finalidade, já reconhecida pela Suprema Corte (AI 455846 RJ, Rel. Min. Celso de Mello, STF, decisão monocrática de 11/10/2004, DJ 21/10/2004; AgRg no REsp 1171470/SP, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, julgado em 05/02/2015, DJe 19/02/2015): reparadora ou compensatória, referente à compensação financeira atribuída à vítima dos abalos morais; e educativa, pedagógica ou punitiva, dirigida ao agente ofensor, para desencorajar e desestimular a reiteração da conduta lesiva, sem, é claro, implicar em enriquecimento indevido ao ofendido. De outro turno, a doutrina e jurisprudência têm elencado alguns parâmetros para determinação do valor da indenização, entre os quais destaco o porte econômico e o grau de culpa (se houver) do ofensor, gravidade e repercussão da lesão, e nível socioeconômico e o comportamento da vítima. Destaco, no ponto, precedente deste Tribunal que examina caso semelhante, ipsis litteris: PROCESSO CIVIL. CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE CONTRATO C/C PEDIDO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO E REPARAÇÃO POR DANOS MORAIS. SEGURO DE VIDA COLETIVO. ANUÊNCIA NÃO COMPROVADA. DANOS MORAIS E MATERIAIS CONFIGURADOS. APELO CONHECIDO E DESPROVIDO. I - A controvérsia consiste na reparação da apelada por danos morais e materiais em razão do alegado ato ilícito praticado pela apelante que teria efetuado desconto no benefício previdenciário da parte autora a título de “BRADESCO VIDA E PREVIDÊNCIA”, sem a devida anuência. II - Por força do art. 14, da Lei Consumerista, a responsabilidade da instituição apelante é objetiva, tendo em conta que o serviço de seguro de vida em grupo foi prestado de forma desidiosa, tanto que celebrado sem anuência da apelante que, apesar de sequer ter firmado relação contratual, é consumidora por equiparação, nos precisos termos do art. 17 do CDC. III - Forçoso concluir pela nulidade do negócio contratual impugnado, vez que a situação narrada nos autos revela ser extremamente abusiva e desvantajosa para apelada, razão pela qual andou bem o magistrado a quo, em declarar a nulidade do referido contrato, condenando a apelante em restituição em dobro e ao pagamento de indenização por danos morais. IV - A hipótese dos autos configura dano moral in res ipsa, em que a mera conduta ilícita já é suficiente para demonstrar os transtornos e os aborrecimentos sofridos pela apelada, é razoável, na espécie, a fixação da condenação pelos danos morais no patamar de R$ 2.000,00 (dois mil reais), o que compensa adequadamente a apelada, ao tempo em que serve de estímulo para que o apelante evite a reiteração do referido evento danoso. V – Apelo conhecido e desprovido. (TJMA. Processo nº 0801802-73.2021.8.10.0110), 5ª Câmara Cível, Rel. Raimundo José Barros de Sousa. j. sessão virtual 24 a 31.01.2022, DJe 04.02.2022). – (grifei) APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO ANULATÓRIA DE DÉBITO CUMULADA COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE REGULARIDADE DOS DESCONTOS EM CONTA BANCÁRIA. REPETIÇÃO DE INDÉBITO EM DOBRO. DANOS MORAIS QUE ATENDEM AOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. RECURSOS DESPROVIDOS. 1) Pelas regras de distribuição do ônus da prova previstas no art. 373 do CPC, o apelante Bradesco Vida e Previdência S/A não se desincumbiu do ônus de comprovar a regularidade dos descontos efetuados na conta bancária da apelada; 2) Diante da irregularidade verificada, tem-se que os descontos efetuados na conta bancária da apelada são indevidos, pelo que deverão ser devolvidos em dobro, conforme art. 42, parágrafo único do Código de Defesa do Consumidor; 4) A quantia fixada pelo magistrado de base, no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais), atende aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade, pelo que deve ser mantida 5) Recursos desprovidos. (TJMA; AC 0800095-36.2022.8.10.0110; Sétima Câmara Cível; Rel. Des. Tyrone José Silva; DJNMA 28/03/2023) grifei PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. NULIDADE DE COBRANÇA DENOMINADA "BRADESCO VIDA E PREVIDÊNCIA". SERVIÇO NÃO CONTRATADO. REPETIÇÃO DE INDÉBITO EM DOBRO. DANO MORAL CONFIGURADO. QUANTUM MANTIDO. RECURSO DESPROVIDO. I. Na espécie, restou demonstrada a incidência de tarifa denominada BRADESCO VIDA E PREVIDÊNCIA, sem qualquer justificativa idônea por parte da instituição financeira, que cobrou custos da conta de titularidade da consumidora, sem que este tenha sido prévia e efetivamente informada. II- Forçoso concluir pela nulidade do negócio jurídico impugnado, vez que a situação narrada nos autos revela ser extremamente abusiva e desvantajosa para parte autora. III. De acordo com o art. 42, parágrafo único, do CDC, o consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável. lV. Tendo em vista as circunstâncias que norteiam o caso em análise, afigura-se razoável a manutenção da indenização por danos morais no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais), valor que atende os objetivos da condenação, quais sejam, apenar o ofensor e compensar a vítima pelos abalos sofridos. Apelo desprovido. Sem interesse ministerial. (TJMA; AC 0804512-66.2022.8.10.0034; Quinta Câmara Cível; Rel. Des. José de Ribamar Castro; DJNMA 17/03/2023) grifei Desse modo, entendo ser razoável a fixação do quantum indenizatório em R$ 2.000,00 (dois mil reais), considerando, para tanto, os ditames da razoabilidade e da proporcionalidade, considerando, sobretudo sua dupla função (compensatória e pedagógica), o porte econômico e conduta desidiosa do apelante, as características da vítima, bem assim a repercussão do dano. Ante o exposto, DOU PROVIMENTO ao recurso, para condenar o apelado ao pagamento de R$ 2.000,00 (dois mil reais) a título de danos morais, que devem ser aplicados sob os moldes da súmula 362 do STJ. Ao pagamento de repetição de indébito, em dobro, relativo às parcelas adimplidas pela parte apelante referentes as tarifas: PAGTO COBRANÇA EAGLE SOCIEDADE DE CREDITO DIRET, juros de mora de 1% e correção monetária a contar da citação. Determinar retirada do pagamento das tarifas de “ PAGTO COBRANÇA EAGLE SOCIEDADE DE CREDITO DIRET”, sob pena de multa cominatória de R$ 300,00 (trezentos reais), por evento, em caso de descumprimento da decisão, no prazo de 15 (quinze) dias úteis, a qual fica limitada, de forma global, ao teto de R$ 5.000,00 (cinco mil reais). Por fim, inverto o ônus da sucumbência e condeno o apelado ao pagamento das custas processuais e de honorários advocatícios, estes fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação na forma do art. 85, § 2º do CPC. É como voto. Sala Virtual das Sessões da Segunda Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, São Luís, no período de 20 a 27 de maio de 2025. São Luís, data do sistema. Desembargadora MARIA FRANCISCA GUALBERTO DE GALIZA Relatora A-08-14

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Processo nº 1005506-83.2025.8.11.0000

ID: 323025106

Tribunal: TJMT Órgão: Turma de Câmaras Cíveis Reunidas de Direito Público e Coletivo Classe: AçãO RESCISóRIA Nº Processo: 1005506-83.2025.8.11.0000

Data de Disponibilização: 11/07/2025

Polo Ativo:

PREFORMAX TRANSPORTE E INDUSTRIA PLASTICA S.A.

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

MONICA FURTADO DE OLIVEIRA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TURMA DE CÂMARAS CÍVEIS REUNIDAS DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO Número Único: 1005506-83.2025.8.11.0000 Classe: AÇÃO RESCISÓRIA (47) Assunto: [CNPJ/Cadastro Naci… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TURMA DE CÂMARAS CÍVEIS REUNIDAS DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO Número Único: 1005506-83.2025.8.11.0000 Classe: AÇÃO RESCISÓRIA (47) Assunto: [CNPJ/Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas, Extinção do Crédito Tributário, Anulação de Débito Fiscal] Relator: Des(a). MARIA APARECIDA FERREIRA FAGO Turma Julgadora: [DES(A). MARIA APARECIDA FERREIRA FAGO, DES(A). DEOSDETE CRUZ JUNIOR, DES(A). HELENA MARIA BEZERRA RAMOS, DES(A). JONES GATTASS DIAS, DES(A). MARCIO VIDAL, DES(A). MARIA EROTIDES KNEIP, DES(A). MARIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA, DES(A). RODRIGO ROBERTO CURVO, DES(A). VANDYMARA GALVAO RAMOS PAIVA ZANOLO] Parte(s): [MONICA FURTADO DE OLIVEIRA - CPF: 570.194.361-53 (ADVOGADO), PREFORMAX TRANSPORTE E INDUSTRIA PLASTICA S.A. - CNPJ: 01.837.197/0001-80 (AUTOR), ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0001-44 (REU), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (TERCEIRO INTERESSADO), ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0020-07 (REU)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TURMA DE CÂMARAS CÍVEIS REUNIDAS DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). MARCIO VIDAL, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, JULGOU IMPROCEDENTE A AÇÃO, NOS TERMOS DO VOTO DA RELATORA, DESA. MARIA APARECIDA FERREIRA FAGO. EMENTA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO RESCISÓRIA. ALEGAÇÃO DE DOLO PROCESSUAL E PROVA NOVA. ART. 966, INCISO III E VII, DO CPC. HIPÓTESES LEGAIS NÃO CONFIGURADAS. IMPOSSIBILIDADE DE USO DA AÇÃO RESCISÓRIA COMO SUCEDÂNEO RECURSAL. IMPROCEDÊNCIA. I. Caso em exame 1. Trata-se de AÇÃO RESCISÓRIA proposta com base nos incisos III e VII, do art. 966 do CPC, em que a parte autora sustenta que a decisão judicial anterior deve ser desconstituída diante de pronunciamento administrativo posterior que reconheceu a nulidade dos créditos tributários questionados nos autos da ação declaratória. II. Questão em discussão 2. Há duas questões em discussão: (i) o pronunciamento administrativo posterior constitui prova nova apta a autorizar a rescisão do julgado; (ii) a omissão da parte vencedora quanto à apresentação do referido ato administrativo caracteriza dolo processual capaz de viciar a decisão rescindenda. III. Razões de decidir 3. O art. 966, inciso III, do CPC autoriza a rescisão de decisão de mérito quando esta resulta de dolo da parte vencedora, ou seja, de conduta ardilosa que impeça o exercício pleno do contraditório e da ampla defesa pela parte vencida. 4. Já o inciso VII do mesmo artigo admite a ação rescisória com base em prova nova, desde que se trate de elemento probatório já existente à época do julgamento, mas cuja existência era ignorada ou de que não se pôde fazer uso, e que, por si só, tenha potencial de modificar o desfecho da demanda. 5. No caso concreto, a decisão administrativa invocada como “prova nova” é anterior ao trânsito em julgado e era de conhecimento da parte autora, o que descaracteriza o requisito essencial à sua admissibilidade. 6. Também não se constatou dolo processual, uma vez que não se evidenciou conduta maliciosa da parte vencedora capaz de influenciar diretamente o resultado da causa. 7. A ação rescisória não se presta à mera rediscussão do mérito, sendo vedada sua utilização como sucedâneo recursal. IV. Dispositivo e tese 8. Pedido improcedente. Tese de julgamento: “1. A decisão administrativa conhecida antes do trânsito em julgado e acessível à parte autora não configura prova nova, nos termos do art. 966, inciso VII, do CPC”. “2. A ausência de demonstração de dolo com aptidão para influenciar o resultado do julgamento impede a rescisão da decisão com fundamento no art. 966, inciso III, do CPC”. Dispositivos relevantes citados: CPC, arts. 966, incisos III e VII; art. 85; art. 98, § 3º. Jurisprudência relevante citada: STJ, AR 5.696/DF, Rel. Min. João Otávio de Noronha; AR 5.376/RS, Rel. Min. Og Fernandes. RELATÓRIO: Colenda Turma: Trata-se de “AÇÃO RESCISÓRIA COM PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA”, proposta por PREFORMAX INDÚSTRIA PLASTICA S/A contra o ESTADO DE MATO GROSSO, com fundamento no art. 966, incisos III e VII, do CPC, visando rescindir o acórdão proferido pela 1ª Câmara de Direito Público e Coletivo deste eg. Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso que, nos autos da “AÇÃO DECLARATÓRIA COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA INITIO LITIS ET INAUDITA ALTERA PARS C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS” n.º 0047172-07.2015.8.11.0041, por unanimidade, negou provimento ao recurso de apelação, mantendo a sentença que julgou improcedente o feito, e, em consequência, majorou os honorários sucumbências de 10% (dez por cento) para 12% (doze por cento), nos termos do art. 85, § 11, do CPC. Narra que a ação anulatória objetivava a anulação dos créditos tributários constituídos por meio dos Termos de Apreensão e Depósito (TAD) n.º. 1041305-4, 1041320-0, 104330-3 e 1041402-2, lavrados com base na alegação de que o contribuinte possuía débitos de ICMS no sua Conta Corrente Fiscal, o que a enquadraria no Regime Administrativo Cautelar previsto na Resolução n.º 001/2017 SARP. Prossegue, pontuando que teve início a fase de liquidação de sentença, onde, inclusive, já foi exarado despacho e expedido o mandado de intimação para o pagamento dos honorários advocatícios e das despesas judiciais, no prazo de 15 (quinze) dias. Todavia, “somente após o trânsito em julgado na ação originária, a Requerente, PREFORMAX INDÚSTRIA PLÁSTICA S.A, conseguiu obter DECISÃO FAVORÁVEL exarada pela Secretaria de Fazenda do Estado de Mato Grosso nos autos do Pedido de Revisão de Lançamento n. 5083109/2013 de 25/04/2013 (DOC. 18), a qual DECLAROU A NULIDADE dos créditos tributários relativos aos Termos de Apreensão e Depósito n. 1041305-4, 1041320-0, 1041330-3 e 1041402-3 e RECONHECEU QUE CONTRIBUINTE ESTAVA DE FATO REGULAR NAS DATAS DAS LAVRATURAS DOS REFERIDOS TAD’s que lastrearam a sentença rescindenda”. Sustenta que o acordão rescindendo deve ser desconstituído, com fundamento na: a) comprovação de dolo da parte vencedora, ao deixar de informar decisão administrativa que reconheceu a regularidade fiscal da empresa; e b) obtenção de prova nova, consistente na mencionada decisão administrativa, apta a alterar o resultado do julgamento. Em face dessa situação, depois de discorrer sobre os fatos e fundamentos jurídicos que entende cabíveis à espécie, a parte autora, entre outras alegações e providências, requer: “a) Conceder os benefícios da Justiça Gratuita previstos na Lei n. 1.060/50, em razão dos fundamentos acima delineados, observando os documentos comprobatórios da hipossufiencia da Requerente; b) Que seja afastado o requisito de depósito da importância de 5% (cinco por cento) sobre o valor da causa, nos termos do artigo 968, inciso II, do CPC; c) A concessão da tutela provisória de urgência para suspender o cumprimento da decisão rescindenda, impedindo-se a efetivação do mandado de pagamento do cumprimento da sentença exarada no PJE n. 0047172-07.2015.8.11.0041, sob pena de dano irreparável; d) A citação do requerido para, caso queira, contestar a presente ação, sob pena de revelia, conforme artigo 970 do CPC; e) Que a presente demanda seja julgada totalmente procedente, rescindindo-se a sentença prolatada nos autos de origem, PJE n. 0047172-07.2015.8.11.0041 (ID. 120477121), com a prolação de nova sentença, com a consequente condenação do Requerido ao pagamento de danos morais a Requerente fixados por arbitramento, ao prudente arbítrio de Vossa Excelência, nos termos dos artigos 186, 187, 159 e 927 do CPC, bem como determine o cancelamento da condenação da Requerida ao pagamento das custas processuais e de honorários advocatícios, nos termos do artigo 290 do CPC; f) A condenação do Requerido ao pagamento de despesas, custas processuais e honorários advocatícios, na órbita de 20% (vinte por cento) sobre o valor da causa, nos termos do artigo 85, § 3º, inciso I do CPC; g) A intimação do Ministério Público para acompanhamento e apresentação de parecer, no que lhe couber; h) A dispensa da realização de audiência de conciliação, nos termos do artigo 319, VII do CPC; i) Protesta pela produção de todos os meios de provas admitidas em direito; j) Por fim, requer que todas as publicações sejam realizadas EXCLUSIVAMENTE em nome da patrona MÔNICA FURTADO DE OLIVEIRA, inscrita na OAB/MT sob o nº 16.755, sob pena de nulidade.” O pedido liminar foi indeferido e concedido o pedido de assistência judiciária gratuita (ID. 271291396). O ESTADO DE MATO GROSSO apresentou contestação (ID. 271291396), impugnando integralmente os fundamentos da ação rescisória. Alega que a decisão administrativa da SEFAZ/MT utilizada como fundamento da ação rescisória não constitui prova nova, pois data de 02.05.2019, sendo anterior ao julgamento do acórdão rescindendo e ao trânsito em julgado ocorrido em 25.05.2023. Ressalta, ainda, que a parte autora tinha pleno conhecimento do referido documento, o que afasta o requisito previsto no artigo 966, inciso VII, do Código de Processo Civil. Assevera a inexistência de dolo processual, conduta fraudulenta ou ardilosa apta a caracterizar a hipótese do art. 966, inciso III, do CPC, na medida em que a revisão administrativa posterior não revela dolo anterior, mas sim o funcionamento regular da Administração Pública em corrigir eventuais falhas materiais em seus registros. Tendo em vista que a controvérsia versa exclusivamente sobre matéria de direito, e estando os autos devidamente instruídos com provas documentais, é dispensada a instrução processual e a produção de outras provas. Além disso, ausente questão de ordem pública que justifique a intervenção do Ministério Público, excepcionalmente, deixa-se de remeter os autos à Procuradoria-Geral de Justiça, em atenção ao princípio da duração razoável do processo (art. 4.º, do CPC). É o relatório. VOTO DA RELATORA EXMA. SRA. DESA. MARIA APARECIDA FERREIRA FAGO Colenda Turma: Como relatado, trata-se de “AÇÃO RESCISÓRIA COM PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA”, proposta por PREFORMAX INDÚSTRIA PLASTICA S/A contra o ESTADO DE MATO GROSSO, com fundamento no art. 966, incisos III e VII, do CPC, visando rescindir o acórdão proferido pela 1ª Câmara de Direito Público e Coletivo deste eg. Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso que, nos autos do processo n.º 0047172-07.2015.8.11.0041, por unanimidade, negou provimento ao recurso de apelação, mantendo a sentença que julgou improcedente o feito. Extrai-se dos autos que PREFORMAX TRANSPORTE E INDÚSTRIA PLASTICA S.A., em 06.10.2015, ingressou com a “AÇÃO DECLARATÓRIA COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA INITIO LITIS ET INAUDITA ALTERA PARS C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS” n.º 0047172-07.2015.8.11.0041, em desfavor do ESTADO DE MATO GROSSO. Na exordial, noticia que, no dia 28.10.2013, protocolizou o “PEDIDO DE REVISÃO DE LANÇAMENTO” (processo n.º 5083109/2013), solicitando o desenquadramento do Regime Tributário Diferenciado (Resolução 07/2008-SARP) e, como consequência, a extinção dos supostos créditos tributários. Pede, ainda, a condenação em danos morais, nos termos dos artigos 186, 187, 159 e 927, do CC. No dia 04.06.2018, proferida sentença pelo juízo da 4ª Vara Especializada da Fazenda Pública da Comarca de Cuiabá, MT, (Excelentíssimo Juiz de Direito, Dr. Paulo Márcio Soares de Carvalho), que julgou improcedente o feito (ID. 270651360). Inconformada, a empresa interpôs recurso de apelação (29.06.2018), e a 1ª Câmara de Direito Público e Coletivo do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, por unanimidade, negou provimento ao apelo, mantendo a sentença de improcedência e majorando a verba honorária, vide a ementa (ID. 270651361): APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO ANULATÓRIA DE DÉBITOS TRIBUTÁRIOS – ILEGALIDADE E INCONSTITUCIONALIDADE DA RESOLUÇÃO 07/2008-SARP – REGIME CAUTELAR ADMINISTRATIVO – INSUBSISTÊNCIA – ENTENDIMENTO FIRMADO NO ÂMBITO DESTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. 1. “Este Sodalício já tem posicionamento firmado no sentido da legalidade do Regime Cautelar Administrativo, instituído pela Resolução nº. 007/2008/SARP/SEFAZ-MT, haja vista que este não modifica a regra matriz de incidência do ICMS, mas apenas determina o recolhimento antecipado do tributo”. (TJMT, N.U 0017821-28.2011.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, MARIA EROTIDES KNEIP BARANJAK, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 08/03/2021). 2. Recurso conhecido e desprovido. (N.U 0047172-07.2015.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, ANTONIO VELOSO PELEJA JUNIOR, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 05/07/2022, Publicado no DJE 18/07/2022) Contra o v. acórdão, opostos “EMBARGOS DE DECLARAÇÃO COM EFEITOS INFRINGENTES” (27.07.2022), os quais, conhecidos e rejeitados (ID. 270651361): EMBARGOS DE DECLARAÇÃO – APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA – OMISSÃO – INEXISTÊNCIA DE VÍCIO NO JULGADO – REDISCUSSÃO DA MATÉRIA – CLARO INCONFORMISMO – ACLARATÓRIOS CONHECIDOS E REJEITADOS. 1. Os Embargos de Declaração têm por finalidade aclarar obscuridade, resolver eventual contradição, suprir omissão encontrada ou, ainda, corrigir erro material. 2. Alegação de omissão que não se coaduna com a pretensão de rediscutir questões já apreciadas. 3. Ratio decidenci que expressa os elementos conducentes ao pronunciamento jurisdicional. 4. Aclaratórios conhecidos e rejeitados. (N.U 0047172-07.2015.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, ANTONIO VELOSO PELEJA JUNIOR, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 13/09/2022, Publicado no DJE 27/09/2022) Na sequência, interposto Recurso Especial, e, no dia 27.04.2023, foi proferida decisão denegatória de seguimento pela Vice-Presidente do Tribunal de Justiça de Mato Grosso, com fundamento na Súmula 7, do STJ e 280, do STF (ID. 270651365). Por fim, certificado que o v. acórdão transitou em julgado em 25.05.2023, consoante certidão de ID. 270651366. Como cediço, a ação rescisória é medida excepcional, cabível nos limites das hipóteses taxativas de rescindibilidade previstas no artigo 966, do Código de Processo Civil, em razão da proteção constitucional à coisa julgada e do princípio da segurança jurídica: “Art. 966. A decisão de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando: I - se verificar que foi proferida por força de prevaricação, concussão ou corrupção do juiz; II - for proferida por juiz impedido ou por juízo absolutamente incompetente; III - resultar de dolo ou coação da parte vencedora em detrimento da parte vencida ou, ainda, de simulação ou colusão entre as partes, a fim de fraudar a lei; IV - ofender a coisa julgada; V - violar manifestamente norma jurídica; VI - for fundada em prova cuja falsidade tenha sido apurada em processo criminal ou venha a ser demonstrada na própria ação rescisória; VII - obtiver o autor, posteriormente ao trânsito em julgado, prova nova cuja existência ignorava ou de que não pôde fazer uso, capaz, por si só, de lhe assegurar pronunciamento favorável; VIII - for fundada em erro de fato verificável do exame dos autos. § 1º Há erro de fato quando a decisão rescindenda admitir fato inexistente ou quando considerar inexistente fato efetivamente ocorrido, sendo indispensável, em ambos os casos, que o fato não represente ponto controvertido sobre o qual o juiz deveria ter se pronunciado. (...)” Justamente pelo caráter específico e excepcional da medida, o Superior Tribunal de Justiça consolidou o entendimento de que a “ação rescisória não pode ser utilizada como sucedâneo recursal, visando à mera rediscussão do mérito da causa, dado seu caráter excepcional” (STJ, AR n.º 5.696/DF, Relator: Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, CORTE ESPECIAL, julgado em 28.06.2018, DJe 07.08.2018), ou seja, em outros dizeres, a “ação rescisória não é sucedâneo recursal e não se presta a corrigir eventual injustiça da decisão” (STJ, AgRg no REsp n.º 1119541/PI, Relator: Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 05.05.2016, DJe 17.05.2016). Logo, conclui-se que não é possível o manejo da ação rescisória para obter o reexame de prova, sanar a sua má valoração e/ou corrigir eventual injustiça da decisão rescindenda. ALEGAÇÃO DE DOLO DA PARTE VENCEDORA (ART. 966, INCISO III, DO CPC): A respeito do cabimento da ação rescisória, o Superior Tribunal de Justiça consolidou o entendimento no sentido de que: “O dolo, como causa de rescindibilidade da demanda, está relacionado ao descumprimento dos deveres de lealdade e boa-fé processual da parte vencedora, exigindo-se que haja um nexo de causalidade entre a conduta dolosa e o resultado do processo rescindendo, seja por meio do alijamento do juiz da verdade dos fatos, seja quando o ilícito praticado impossibilitou o exercício do direito de defesa da parte vencida na demanda” (STJ, AR n.º 5.376/RS, Relator: Ministro OG FERNANDES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 28.10.2020, DJe de 26.11.2020). Do mesmo modo, “segundo decidido pelo STJ, a pretensão rescisória fundada no dolo exige que a decisão a ser rescindida decorra diretamente da conduta dolosa da parte vencedora, a qual, com sua má-fé, tenha dificultado concretamente a atuação da parte prejudicada, o que não ocorrerá se os demais elementos dos autos confirmarem o acerto da decisão rescindenda. (AR 1.619/MT, Relator Ministro NEFI CORDEIRO, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 25/2/2015, DJe 5/3/2015)” (STJ – AgInt na AR n.º 6.575/DF, Relator: Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 25.11.2020, DJe de 01.12.2020). Já, no plano doutrinário, Nelson Nery Jr. e Rosa Maria de Andrade Nery assim conceituam o dolo rescisório: “O dolo rescisório consiste na prática, pela parte vencedora, além das condutas vedadas pelo CPC 80, de ardis, maquinações e atividades enganosas em geral, capazes de subtrair da parte contrária o direito de produzir atos e provas no processo, reduzindo-lhe a capacidade de defesa e afastando o juiz de uma decisão de acordo com a verdade (Rizzi. Ação rescisória, 74/75).” (Comentários ao Código de Processo Civil. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015, pág. 1.915/1.916) PROVA NOVA (ART. 966, INCISO VII, DO CPC): No tocante à prova nova, o Código de Processo Civil estabelece como requisito essencial que o elemento probatório já existisse à época da decisão impugnada, mas que, por motivo relevante, tenha sido desconhecido pela parte ou de uso inviável naquele momento. Essa prova deve ser suficiente, por si só, para conduzir a um novo pronunciamento judicial favorável ao autor da rescisória. Conforme leciona Nelson Nery Jr.: “(…) Prova nova – O atual CPC é mais abrangente do que CPC/1973, pois admite não só a apresentação de documento novo, mas também de tudo que possa formar prova nova em relação ao que constou da instrução no processo original. Mas, da mesma forma que ocorria em relação ao documento novo, por prova nova deve entender-se aquela que já existia quando da prolação da sentença, mas cuja existência era ignorada pelo autor da rescisória, ou que dele não pôde fazer uso – portanto, não cabe, no caso, dar início a nova perícia judicial, por exemplo. São enquadráveis, portanto, neste dispositivo, apenas os documentos, os depoimentos e os testemunhos. A prova nova deve ser de tal ordem que, sozinha, seja capaz de alterar o resultado da sentença rescindenda, favorecendo o autor da rescisória, sob pena de não ser idônea para decreto de rescisão (…)”. (Comentários ao Código de Processo Civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015, p. 1.922/1.923)(grifo nosso) Ainda sobre o tema, ensinam Fredie Didier Jr. e Leonardo Carneiro da Cunha na obra Curso e Direito Processual Civil: “A prova nova é aquela estranha à causa, ou seja, aquela ainda não pertencente à causa. A prova nova não é aquela constituída, formada ou produzida posteriormente; é a que não foi apresentada no curso do processo originário, destinada a prova fato já ocorrido. Prova nova, em outras palavras, é aquela que já existia antes do trânsito em julgado, mas não foi apresentada ou produzida oportunamente no processo originário. A prova não existente ou que não poderia ser produzida durante o curso do processo originário não possibilita a desconstituição do julgado.” (Curso de Direito Processual Civil, volume 3, Editora JusPodivm, pág. 502) (grifo nosso) Dessa forma, conclui-se que o termo “prova nova” não se refere ao momento de sua formação, mas à impossibilidade de sua produção no processo originário por motivos alheios à vontade da parte. Incumbe ao autor da ação demonstrar tal impedimento, seja por desconhecimento da existência do elemento, seja pela impossibilidade de acessá-lo no momento oportuno. In casu, a decisão administrativa proferida no processo administrativo n.º 5083109/2013, apresentada como “prova nova”, foi exarada em 02.05.2019 (ID. 270651368), ou seja, em momento posterior à sentença (04.06.2018 – ID. 270651360), contudo, anterior ao julgamento do recurso de apelação (julgado em 05.07.2022 e publicado no DJE de 18.07.2022) e ao trânsito em julgado (25.05.2023 – ID. 270651366). Embora a parte autora defenda que: “somente após o trânsito em julgado na ação originária, a Requerente, PREFORMAX INDÚSTRIA PLÁSTICA S.A, conseguiu obter DECISÃO FAVORÁVEL exarada pela Secretaria de Fazenda do Estado de Mato Grosso” ou que foi “fornecida pela Secretaria de Fazenda do Estado de Mato Grosso após o trânsito em julgado da sentença”, não ficou comprovada a impossibilidade de seu acesso em momento anterior, tampouco o desconhecimento de sua existência. Com efeito, a decisão da Coordenadoria de Julgamento de Impugnações da SEFAZ-MT, datada de 02.05.2019, demonstra apenas a morosidade no trâmite do pedido de revisão de lançamento, sem comprovar óbice real ao seu uso anterior. Por essa razão, o referido documento não se qualifica como prova nova para fins do art. 966, inciso VII, do CPC, por não ter sido demonstrada causa legítima para sua apresentação apenas em 2025. Ainda que a decisão tenha sido anterior ao trânsito em julgado do acórdão, o que importa, para fins de ação rescisória, é sua existência antes da sentença, e não apenas antes do esgotamento dos recursos. Não se pode olvidar que a decisão administrativa não possui natureza jurisdicional, tampouco autoridade de coisa julgada material, uma vez que revogável ou anulável no âmbito da própria Administração Pública. Assim, o simples fato de a Fazenda Pública ter se pronunciado favoravelmente à parte autora após a sentença judicial não é suficiente para legitimar a desconstituição da coisa julgada. A prova nova, no contexto da ação rescisória, exige anterioridade, relevância, desconhecimento justificado e, principalmente, capacidade autônoma de modificar o julgamento. Ressalta-se, ainda, que a existência de dolo, para fins de desconstituição da coisa julgada, exige conduta dolosa com aptidão para induzir o juízo em erro e interferir diretamente no resultado do processo. No presente caso, não se vislumbra qualquer comportamento fraudulento que tenha comprometido a formação do convencimento judicial. Embora o processo administrativo n.º 5083109/2013, protocolado em 25.04.2013, anteceda o ajuizamento da ação declaratória e indenizatória n.º 0047172-07.2015.8.11.0041 (em 06.10.2015), sua apreciação ocorreu apenas em 02.05.2019, após a prolação da sentença judicial. Logo, não há que se falar “prova nova” nos termos legais ou no desconhecimento do fato, mas mero fato superveniente. Outrossim, admitir a possibilidade de que pronunciamento administrativo posterior tenha o condão de desconstituir coisa julgada judicial comprometeria a separação de poderes, a estabilidade das decisões judiciais e o princípio da segurança jurídica. Eventual decisão administrativa favorável deveria ter sido levada aos autos em momento oportuno, antes da formação da coisa julgada. Como corretamente destacado pelo ente público, cabia à parte autora, ciente da existência do procedimento administrativo, diligenciar sua conclusão e comunicar tempestivamente o seu resultado ao juízo. Tal ciência é atestada pelo próprio ato administrativo, que registra: “Fica a parte, PREFORMAX INDÚSTRIA PLÁSTICA S.A- Inscrição Estadual: 13.192.165-7, CIENTIFICADA do teor da presente decisão, em atendimento às disposições contidas no art. 17, inciso XVIII c/c art. 39-C, § 1º, ambos da Lei Estadual nº 7.098/98”. Igualmente, não se trata aqui de rediscutir a justiça ou injustiça da decisão rescindenda, mas sim de avaliar a ocorrência de vícios previstos em lei que autorizem sua desconstituição. A reapreciação de provas ou fatos não é admitida na via rescisória, salvo quando configurada violação às normas que regem a admissibilidade, produção ou valoração das provas. A propósito, não destoa a jurisprudência deste Sodalício: AÇÃO RESCISÓRIA – AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL – ACÓRDÃO QUE MANTEVE A SENTENÇA CONDENATÓRIA QUE RECONHECEU A EXISTÊNCIA RESPONSABILIDADE CIIVL POR DANO AMBIENTAL DECORRENTE DE DESMATAMENTO ILEGAL SEM AUTORIZAÇÃO OU LICENÇA DO ÓRGÃO AMBIENTAL COMPETENTE – PRELIMINAR DE INADMISSIBILIDADE DA AÇÃO RESCISÓRIA COM BASE NO ART. 968, III DO CPC – PREJUDICIALIDADE –– EMENDA À INICIAL PARA RETIFICAÇÃO DO VALOR DA CAUSA E RESPECTIVO COMPROVAÇÃO DO PAGAMENTO À TÍTULO DE COMPLEMENTAÇÃO DO DEPÓSITO DE 5% DO VALOR DA CAUSA E DE CUSTAS E DA TAXA JUDICIÁRIA – ARGUIÇÃO DE VIOLAÇÃO AOS INCISOS III, V, VII E VIII DO ART. 966 DO CPC - INOCORRÊNCIA – UTILIZAÇÃO DA RESCISÓRIA COMO SUCEDÂNEO RECURSAL – DESCABIMENTO – IMPROCEDÊNCIA. 1. Considerando a complementação pelo Autor do depósito judicial previsto no art. 968, III, do CPC, a preliminar de inadmissibilidade da rescisória resta prejudicada. 2. O enquadramento de determinado decisum na conduta descrita no art. 966, III, do CPC, depende de prova incontestável do dolo alegado, e ainda de que tal conduta tenha tido consequência direta no resultado da lide; situação não evidenciada no presente caso. 3. É pacífico o entendimento jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça de que é vedada a propositura de Ação Rescisória, com fundamento na manifesta violação da norma jurídica, mediante inovação argumentativa, que fora deixada de ser feita no momento oportuno, pois não se trata de via recursal com prazo de dois anos. 4. Nos termos do art. 966, VII, do CPC, a nova prova que deve ser existente à época da decisão rescindenda e, por algum motivo maior, era ignorada, ou da qual não pôde fazer uso, capaz de assegurar, por si só, a procedência do pronunciamento jurisdicional. 5. In casu, não tendo a nova prova apresentada pelo Autor comprovado a inexistência de dano ambiental na propriedade rural, não há que se falar na incidência da hipótese do inciso VII, do artigo 966, do Código de Processo Civil. 5. Não é possível em sede de ação rescisória a rediscussão de matéria já deduzida e enfrentada pelo Poder Judiciário, por assumir a natureza de recurso, o que não é permitido no ordenamento processual. (N.U 1000839-35.2017.8.11.0000, CÂMARAS CÍVEIS REUNIDAS DE DIREITO PÚBLICO, HELENA MARIA BEZERRA RAMOS, Turma de Câmaras Cíveis Reunidas de Direito Público e Coletivo, Julgado em 01/12/2022, Publicado no DJE 07/12/2022) AÇÃO RESCISÓRIA – REJEITADA PRELIMINAR DE INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA – AUTOR É TERCEIRO – DESCABIDA ALEGAÇÃO DE UTILIZAÇÃO DA RESCISÓRIA COMO SUCEDÂNEO RECURSAL – REJEITADA PRELIMINAR DE INÉPCIA DA INICIAL – BEM DELINEADA A CAUSA DE PEDIR – ARGUMENTO DE CONTRATO SIMULADO/NULO (ART. 167, § 1º, I, CC/02) SUBSTANCIADOR DE ATUAÇÃO DOLOSA (ART. 966, III, DO CPC) – A DESPEITO DE INTEMPESTIVA A CONTESTAÇÃO NÃO SE APLICAM OS EFEITOS MATERIAIS DA REVELIA, PORQUE INDISPONÍVEL O INSTITUTO DA COISA JULGADA – DESPICIENDA EXPEDIÇÃO DE OFÍCIOS FACE AO CONTIDO NA INICIAL E POSSIBILIDADE DE DILIGÊNCIA EXTRAJUDICIAL SEM NECESSIDADE DE INTERVENÇÃO DO JUDICIÁRIO – MÉRITO –ELEMENTOS PROBATÓRIOS COLIGIDOS NÃO COMPROVAM AS ALEGAÇÕES DE SIMULAÇÃO E DOLO PROCESSUAL – FORTE ACERVO PROBATÓRIO DENOTANDO LEGÍTIMO RECONHECIMENTO DA USUCAPIÃO RECONHECIDA POR SENTENÇA EM FAVOR DA REQUERIDA – AÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE – CONSECTÁRIOS PELA PARTE AUTORA – REVERSÃO DO DEPÓSITO. Rejeitada preliminar de inadequação da via eleita aviada apresentada nas alegações finais da parte requerida, porque o autor não participou da demanda de usucapião como parte, sendo descabida o argumento de que utiliza a demanda rescisória como sucedâneo de um recurso de apelação. Não há que se falar em inépcia da inicial, isso porque nela é indicado o fundamento da pretensão rescisória, qual seja, a “simulação da alegação e do “contrato”” contida na demanda de usucapião que a parte requerida alega ter feito, sendo tal indigitado negócio jurídico ensejador da legitimidade da pretensão usucapienda nulo, por simulação, por “conferir ou transmitir direitos a pessoas diversas daquelas às quais realmente se conferem, ou transmitem” (art. 167, § 1º, I, CC/02). Conforme a inicial, tal negócio jurídico simulado legitimador da pretensão usucapienda (simulado e, portanto, nulo), substanciaria evidente dolo processual da parte vencedora em detrimento da parte vencida, o que justificaria a pretensão rescisória na hipótese de cabimento prevista no art. 966, III, do CPC. É manifesta a intempestividade da contestação, eis que a requerida foi pessoalmente citada por carta e não apresentou contestação no prazo disposto no art. 335, III, do CPC, conforme escorreita certidão de decurso de prazo. No entanto, a coisa julgada configura instituto jurídico indisponível, motivo pelo qual não se aplica os efeitos costumeiros da revelia, conforme previsão do art. 345, II, do CPC. Desarrazoado expedir ofícios às concessionárias de energia e água e para a Prefeitura, isso porque poderia a própria parte diligenciar extrajudicialmente para obter tais documentos, coligindo-os diretamente ao processo, o que denota despicienda a atuação do Judiciário neste sentido. Além disso, a expedição de ofícios é irrelevante ao deslinde da causa, na medida em que o próprio autor, desde a inicial, diz expressamente que as contas das despesas do imóvel estavam na titularidade da requerida, a qual, no entanto, estava no imóvel a título precário, por comodato por ele concedido. Rejeitado o pedido da parte requerida neste sentido. Mérito. A ação rescisória é medida excepcionalíssima e a alegação do motivo ensejador da ação deve ficar solidamente comprovada, de modo a se desconstituir a coisa julgada formada, o que não se verifica no caso em apreço, já que, de todos os argumentos e provas coligidas ao feito, conclui-se que o autor não comprovou de forma robusta a sua alegação de que a requerida, sua irmã, tenha empreendido simulação e agido com dolo processual ao ajuizar a demanda de usucapião número 0056668-60.2015.8.11.0041, distribuída em 09/12/2015, a qual foi corretamente proferida reconhecendo a procedência do pedido, mediante forte análise de acervo probatório que corrobora que ela exercia a posse sobre o imóvel com ânimo de dona por mais de vinte anos, sendo neste sentido declarações de vizinhos encartadas à demanda e de depoimento de testemunhas por ela arroladas na audiência de instrução desta rescisória. Por outro lado, a formal aquisição da propriedade do imóvel litigioso, matrícula número 33.994 do CRI da 2ª Circunscrição Imobiliária de Cuiabá (constituído pela casa nº. 61 do Tipo MT 39, situado na rua 205, quadra 58, setor 02, no Conjunto Habitacional Tijucal, em Cuiabá/MT), empreendida pelo autor junto à Iraci Ostelony Alves e filhos, se deu muitos anos depois do ajuizamento e trâmite do processo de usucapião ajuizado pela requerida, mediante escritura pública de compra e venda lavrada em 22/02/2021, nada havendo documentalmente nos autos que remonte a suposta aquisição na década de 1980 por ele. Pedido julgado improcedente. Condenação nos ônus da sucumbência. Reversão do depósito judicial, na forma do art. 974, parágrafo único, do CPC. (N.U 1001316-48.2023.8.11.0000, CÂMARAS CÍVEIS REUNIDAS DE DIREITO PRIVADO, ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Segunda Turma de Câmaras Cíveis Reunidas de Direito Privado, Julgado em 04/07/2024, Publicado no DJE 06/07/2024) Diante do exposto e ante tudo o mais que dos autos consta, JULGO IMPROCEDENTE A AÇÃO RESCISÓRIA. Por fim, deixo de condenar a parte autora nas custas processuais. Contudo, fixo os honorários advocatícios em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, do CPC, cuja exigibilidade deve permanecer suspensa, de acordo com o art. 98, §3.º, do CPC, por ser tratar de parte beneficiária da gratuidade da justiça. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 03/07/2025

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