Yasmim Munik De Araujo Costa x Uber Do Brasil Tecnologia Ltda.
ID: 258835032
Tribunal: TRT21
Órgão: Primeira Turma de Julgamento
Classe: RECURSO ORDINáRIO - RITO SUMARíSSIMO
Nº Processo: 0000028-66.2025.5.21.0006
Data de Disponibilização:
23/04/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
PEDRO ZATTAR EUGENIO
OAB/MG XXXXXX
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PEDRO PAULO POLASTRI DE CASTRO E ALMEIDA
OAB/MG XXXXXX
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RAFAEL ALFREDI DE MATOS
OAB/BA XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 21ª REGIÃO PRIMEIRA TURMA DE JULGAMENTO Relator: BENTO HERCULANO DUARTE NETO 0000028-66.2025.5.21.0006 : YASMIM MUNIK DE A…
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 21ª REGIÃO PRIMEIRA TURMA DE JULGAMENTO Relator: BENTO HERCULANO DUARTE NETO 0000028-66.2025.5.21.0006 : YASMIM MUNIK DE ARAUJO COSTA : UBER DO BRASIL TECNOLOGIA LTDA. Acórdão Recurso Ordinário em Procedimento Sumaríssimo nº 0000028-66.2025.5.21.0006 Desembargador Relator: Bento Herculano Duarte Neto Recorrente: Yasmim Munik de Araújo Costa Advogado: Pedro Zattar Eugenio Advogado: Pedro Paulo Polastri de Castro e Almeida Recorrida: Uber do Brasil Tecnologia LTDA Advogado: Rafael Alfredi de Matos Origem: 6ª Vara do Trabalho de Natal/RN Ementa DIREITO DO TRABALHO. RECURSO ORDINÁRIO. VÍNCULO EMPREGATÍCIO. MOTORISTA UBER. NÃO CONFIGURAÇÃO. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS DO ART. 3º DA CLT. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. I. Caso em exame 1. Trata-se de recurso ordinário interposto pela reclamante contra sentença que rejeitou a preliminar suscitada e, no mérito, julgou improcedentes os pedidos formulados na reclamação trabalhista, não reconhecendo o vínculo empregatício entre as partes. II. Questões em discussão 2. Em discussão: (i) verificar se estão presentes os requisitos que configuram o vínculo empregatício entre as partes; (ii) analisar se a reclamante faz jus à indenização por danos morais em razão da dispensa arbitrária e da ausência de cobertura previdenciária; e (iii) examinar o pedido de nulidade da dispensa, com a consequente determinação de reintegração imediata ao emprego. III. Razões de decidir 3. Restou caracterizada a ausência de subordinação jurídica entre a reclamante, motorista, e a empresa reclamada Uber do Brasil Tecnologia Ltda. Desse modo, ausentes os requisitos necessários à configuração da relação de emprego, à luz do disposto nos artigos 2º e 3º da CLT, deve-se manter o não reconhecimento do vínculo empregatício pretendido pela autora. Precedentes deste Tribunal e do C. TST. 4. Diante do não reconhecimento do vínculo empregatício pleiteado, resta prejudicada a análise dos pedidos de nulidade da dispensa, reintegração ao emprego e indenização por danos morais em razão da ausência de cobertura previdenciária. IV. Dispositivo 5. Recurso ordinário conhecido e desprovido. _________ Dispositivos relevantes citados: CLT: art. 2º, art. 3º, art. 791-A. Jurisprudência relevante citada: TRT 21 - 1ª Turma; RORSum 0000796-83.2022.5.21.0042; Relator: José Barbosa Filho; Data do Julgamento:29/08/2023; TRT 21 - 1ª Turma; Recurso Ordinário n. 0000333-37.2022.5.21.0012; Relatora: Auxiliadora Rodrigues; Data do Julgamento: 07/03/2023; DEJT: 10/03/2023; AIRR: 00003313520205100015, Relator: Alexandre Luiz Ramos, Data de Julgamento: 14/12/2022, 4ª Turma, Data de Publicação: 19/12/2022; AIRR-10575-88.2019.5.03.0003, 4ª Turma, Relator Ministro Alexandre Luiz Ramos, DEJT 11/09/2020; RR-1000123-89.2017.5.02.0038, 5ª Turma, Relator Ministro Breno Medeiros, DEJT 07/02/2020. 1. RELATÓRIO Trata-se de recurso ordinário em procedimento sumaríssimo interposto por Yasmim Munik de Araujo Costa contra a sentença proferida pelo juízo da 6ª Vara do Trabalho de Natal/RN (ID 00cb185), que rejeitou a preliminar suscitada e, no mérito, julgou improcedentes os pedidos formulados na reclamação trabalhista ajuizada em desfavor de Uber do Brasil Tecnologia LTDA. Além disso, condenou a reclamante ao pagamento de honorários sucumbenciais no importe de 10% (cinco por cento) sobre o valor da causa, ficando a obrigação sob condição suspensiva de exigibilidade. Em razões recursais (ID 6720de4), a reclamante sustenta que a Uber exerce controle rigoroso sobre seus motoristas por meio de sua plataforma tecnológica, possibilitando o acompanhamento contínuo da prestação do trabalho e a vigilância efetiva da atividade laboral. Diante disso, requer a reforma da sentença para o reconhecimento do vínculo empregatício entre as partes, com a consequente condenação da reclamada ao pagamento de todas as verbas trabalhistas devidas, conforme pleiteado na exordial. Em seguida, postula a declaração de nulidade de sua dispensa, com a determinação de sua imediata reintegração à plataforma da ré, incluindo a reativação irrestrita de sua conta. Subsidiariamente, requer o pagamento de indenização compensatória pelos danos materiais e morais decorrentes do ato ilícito praticado pela recorrida. Ademais, pleiteia a condenação da reclamada ao pagamento de indenização por danos morais, sob a alegação de que o bloqueio imotivado de sua conta lhe causou grave abalo psicológico e a privou de sua principal fonte de renda. Por fim, requer a reforma da sentença para condenar a recorrida ao pagamento de indenização por danos morais em razão da ausência de cobertura previdenciária, em valor a ser arbitrado por este Egrégio Tribunal, considerando a gravidade da conduta da empresa, a duração da relação de trabalho e a capacidade econômica das partes. Proferida decisão de admissibilidade recursal pelo juízo de origem (ID c491bf7). Instada a se manifestar, a reclamada apresentou contrarrazões (ID 9303f8d). É o que importa relatar. 2. VOTO 2.1. Admissibilidade. Recurso tempestivo (a reclamante tomou ciência da sentença em 07/03/2025 e interpôs o recurso ordinário em 17/03/2025). Representação regular (ID 95fadfc). Depósito recursal inexigível e custas processuais dispensadas. Recurso ordinário conhecido. 2.2. Preliminar de incompetência material, suscitada em contrarrazões. Em sede de contrarrazões (ID 9303f8d), a parte recorrida pleiteia o reconhecimento da incompetência da Justiça do Trabalho para apreciar a lide, sob o argumento de que a pretensão em exame decorre de contrato de natureza eminentemente civil. Sem razão. A definição da competência material decorre da análise da causa de pedir e do pedido. Assim, considerando que, nos presentes autos, se discute a existência de vínculo empregatício, bem como que compete à Justiça do Trabalho a apreciação das demandas relativas às relações de trabalho (art. 114, I, da Constituição Federal), impõe-se o reconhecimento da competência desta Justiça Especializada. Pelo exposto, rejeita-se a preliminar. 2.3. Mérito. A reclamante sustenta que a Uber exerce controle rigoroso sobre seus motoristas por meio de sua plataforma tecnológica, possibilitando o acompanhamento contínuo da prestação do trabalho e a vigilância efetiva da atividade laboral. Diante disso, requer a reforma da sentença para o reconhecimento do vínculo empregatício entre as partes, com a consequente condenação da reclamada ao pagamento de todas as verbas trabalhistas devidas, conforme pleiteado na exordial. Em seguida, postula a declaração de nulidade de sua dispensa, com a determinação de sua imediata reintegração à plataforma da ré, incluindo a reativação irrestrita de sua conta. Subsidiariamente, requer o pagamento de indenização compensatória pelos danos materiais e morais decorrentes do ato ilícito praticado pela recorrida. Ademais, pleiteia a condenação da reclamada ao pagamento de indenização por danos morais, sob a alegação de que o bloqueio imotivado de sua conta lhe causou grave abalo psicológico e a privou de sua principal fonte de renda. Por fim, requer a reforma da sentença para condenar a ré ao pagamento de indenização por danos morais em razão da ausência de cobertura previdenciária, em valor a ser arbitrado por este Egrégio Tribunal, considerando a gravidade da conduta da empresa, a duração da relação de trabalho e a capacidade econômica das partes. Examina-se. Quanto ao reconhecimento de vínculo, assim fundamentou o juízo de origem (ID 00cb185): "(...) É de se verificar que os motoristas cadastrados na plataforma possuem autonomia para escolher a frequência, os dias de labor e folga, os horários e as rotas em que desejam executar a sua atividade. Verifica-se, ainda, que os motoristas possuem autonomia para escolher as corridas que farão dentro do tempo em que estão laborando, de acordo com a sua conveniência. Por fim, verifica-se: os motoristas só recebem pagamento quanto executam efetivamente o serviço, sendo aquele pagamento proporcional às chamadas realizadas. Além disso, podem receber o valor diretamente dos passageiros. No mais, cabe aos mesmos suportarem as despesas decorrentes desta atividade, tais como seguro, combustível, fornecimento de agua e bala aos passageiros. Dito isso, não vislumbra este juízo a existência de subordinação do motorista à demandada, tendo o primeiro a liberdade para executar o serviço segundo o seu interesse. No mais, o valor pago pelo serviço não possui caráter forfetário: ele só ocorrerá se houver a prestação efetiva do serviço. O motorista assume, pois, o risco de sua atividade. Ora, não existem elementos que possam indicar que houve fraude da anuência do motorista quanto à adesão às cláusulas apresentadas pela demandada quando da formalização da relação entre as partes , ou ainda, que houve desvirtuamento do serviço que foi contratado entre as partes. Feitas essas considerações, é de se concluir que estão ausentes requisitos essenciais ao reconhecimento de um contrato de trabalho entre as partes, na forma narrada na petição inicial, a saber: a subordinação do trabalho e o caráter forfetário da remuneração. Deve prevalecer, portanto, a tese exposta na defesa pela demandada." Trata-se, em síntese, da análise do reconhecimento de vínculo empregatício dos chamados "entregadores de aplicativo", no caso, da empresa Uber do Brasil Tecnologia LTDA. Efetivamente, a matéria em análise é de amplo conhecimento deste Tribunal - ambas as turmas já tiveram a oportunidade de se manifestar a respeito, a saber: RELAÇÃO DE EMPREGO - CLT, ART. 2º E 3º - MOTORISTA/ENTREGADOR DA UBER - REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS - Nos termos dos artigos 2º e 3º da CLT, o reconhecimento da relação de emprego depende do preenchimento cumulativo dos requisitos de pessoalidade, não eventualidade, subordinação e onerosidade. In casu, o acervo probatório evidenciou que a relação entre as partes não possuía subordinação, pessoalidade, nem pode ser considerada não eventual, requisitos imprescindíveis para o reconhecimento do vínculo de emprego. Assim, deve ser reformada a sentença para julgar improcedentes os pedidos formulados na reclamação trabalhista. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - CLT, ART. 791-A - SUCUMBÊNCIA DO TRABALHADOR - BENEFICIÁRIO DA JUSTIÇA GRATUITA - ADI 5766 - INCONSTITUCIONALIDADE PARCIAL DO § 4º - SUSPENSÃO DE EXIGIBILIDADE - Diante da inconstitucionalidade parcial do § 4º do art. 791-A da CLT, especificamente quanto à expressão "desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa", declarada pelo c. STF na ADI 5766, é devida a condenação do beneficiário da justiça gratuita em honorários advocatícios sucumbenciais, devendo a obrigação permanecer sob condição suspensiva de exigibilidade até prova, pelo credor, de que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos, observado o prazo de dois anos contados do trânsito em julgado deste acórdão. Recurso conhecido e provido. (TRT 21 - 1ª Turma; RORSum 0000796-83.2022.5.21.0042; Relator: José Barbosa Filho; Data do Julgamento: 29/08/2023) 1. MOTORISTA QUE ATUA POR INTERMÉDIO DE APLICATIVOS. VÍNCULO EMPREGATÍCIO. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS DO ARTIGO 3o DA CLT. EFEITOS. Não caracterizados os elementos descritos no art. 3o da CLT, não há como se reconhecer a existência de vínculo empregatício entre as partes. Sentença reformada.2. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS CONTRATUAIS. INDENIZAÇÃO POR PERDAS E DANOS. INDEFERIMENTO. São indevidos, nesta Justiça especializada, os honorários advocatícios contratuais, estranhos àqueles reconhecidos por esta Justiça Trabalhista como honorários sucumbenciais, considerando que o advogado particular na Justiça do Trabalho é mera liberalidade da parte, face o princípio do jus postulandi, competindo a esta, portanto, arcar com a verba honorária contratual correspondente.3. Recurso conhecido e desprovido. (TRT da 21ª Região; Processo: 0000021-34.2023.5.21.0042; Data de assinatura: 02-10-2023; Órgão Julgador: Gabinete do Desembargador Carlos Newton Pinto - Segunda Turma de Julgamento; Relator(a): CARLOS NEWTON DE SOUZA PINTO) Entregador. Aplicativo Ifood. Vínculo empregatício não configurado. Considerando os contornos fáticos apresentados nas declarações do autor e na prova dos autos, delineando a autonomia dele na prestação dos serviços, a opção de aceitar ou rejeitar as entregas que lhe são direcionadas, bem como a possibilidade de permanecer desconectado do aplicativo de entregas conforme o seu interesse, além do uso de veículo próprio para o desempenho de seu mister, verifica-se inexistir, na espécie, contrato de trabalho nos termos da CLT. Mantida a sentença que rechaçou o vínculo empregatício. Recurso ordinário conhecido e não provido. (TRT 21 - 1ª Turma; Recurso Ordinário n. 0000251-27.2022.5.21.0005; Relator: Ricardo Luís Espíndola Borges; Data do Julgamento: 04/10/2022; DEJT: 06/10/2022) RECURSO ORDINÁRIO DO RECLAMANTE. ENTREGADOR DE APLICATIVO IFOOD. VÍNCULO EMPREGATÍCIO COM A EMPRESA INTERMEDIÁRIA. OPERADORA LOGÍSTICA. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS CARACTERIZADORES. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. A parte recorrente não conseguiu desconstituir as provas constantes nos autos, que deixam claro que não havia relação empregatícia, mas mera prestação de serviços autônomos de entregador de aplicativo IFOOD, que tomou a iniciativa de fazer entregas pela plataforma digital, com utilização de veículo próprio, sem subordinação jurídica com a reclamada principal, operadora logística, devendo ser mantida a sentença que não reconheceu o vínculo de emprego perseguido. Há precedentes, de ambas as Turmas deste egrégio Regional, envolvendo as mesmas funções e reclamadas (ROT nº 0000515-57.2021.5.21.0012, DEJT 25.08.2022; e ROT nº 0000522-52.2021.5.21.0011, DEJT 28.06.2022). Recurso ordinário conhecido e não provido. (TRT 21 - 1ª Turma; Recurso Ordinário n. 0000333-37.2022.5.21.0012; Relatora: Auxiliadora Rodrigues; Data do Julgamento: 07/03/2023; DEJT: 10/03/2023) A análise do presente feito cinge-se em averiguar a existência dos requisitos previstos na legislação para o reconhecimento do vínculo empregatício entre as partes. Nos termos do art. 3º da CLT, para que seja configurada a relação empregatícia, faz-se necessária a coexistência dos seguintes elementos: prestação pessoal de serviços, onerosidade, habitualidade e subordinação. Ausente, portanto, um desses requisitos, deve ser julgada improcedente a ação que pretende o reconhecimento da relação de emprego. Em matéria de reconhecimento de vínculo de emprego, quando negada a prestação de serviços, incumbe à parte autora o ônus de demonstrar os elementos caracterizadores da relação de emprego, fatos constitutivos do seu direito. A contrario sensu, admitida a prestação de serviço, mas negada a relação jurídica de emprego, inverte-se o ônus, que passa a ser da parte ré, a teor do art. 818 da CLT. Há de se registrar que a relação de emprego se configura sempre que estiverem reunidos os pressupostos dos artigos 2º e 3º da CLT - independente do nome jurídico dado ao ajuste e até contrariamente à intenção inicial das partes, o vínculo de emprego surge sempre que uma pessoa, de forma pessoal e subordinada, presta serviço de natureza não eventual a outrem, que assume os riscos da atividade econômica. Desta forma, o que tem relevância na espécie é a realidade do contrato e não a forma adotada para perfectibilizá-lo, atendendo aos preceitos do princípio da primazia da realidade, que norteia o Direito do Trabalho. A base desse princípio encontra-se em fatos reais, sendo relevante apenas a existência de prestação de trabalho em caráter pessoal, contínuo e mediante subordinação econômica, com a intenção de atingir os objetivos empresariais. Da análise da ata de audiência de ID 6ef3c2d, observam-se como incontroversas as seguintes características da relação entre a Uber e os motoristas: 1. ficava a critério do motorista o início e término do horário de utilização da plataforma; 2. o motorista poderia alterar a rota definida pelo aplicativo em comum acordo com o passageiro, o que pode ou não gerar alteração de valor; 3. não havia exigência quanto ao número mínimo de viagens diárias; 4. ficava a critério do motorista a participação ou não em promoções; 5. o motorista apenas fez o cadastro por meio do aplicativo, não sendo realizado nenhum processo seletivo; 6. é critério do motorista utilizar outras plataformas; 7. o motorista decide os dias de folga e nos dias de folga, não era necessário justificar a ausência na plataforma; 8. poderia receber o valor da viagem diretamente do passageiro, quando pago em dinheiro; 9. o motorista arca com as despesas do veículo, inclusive seguro; 10. a reclamada não garante remuneração mínima ao final do dia/mês; 11. a reclamada aceita que dois motoristas usem o mesmo carro; 12. não é obrigatório o fornecimento de água e bala, ficando a critério do motorista. A análise dos elementos constantes nos autos evidencia a ausência de subordinação, conforme concebida pela legislação trabalhista. Considerada pela doutrina como o elemento qualificador essencial da relação de emprego, a subordinação caracteriza-se pela sujeição do empregado ao poder diretivo empresarial, que estabelece o modo de prestação dos serviços. No caso em tela, a reclamante, na condição de motorista, agia com independência, prestando serviços de forma liberal a diversos clientes passageiros, por intermédio da plataforma tecnológica fornecida pela reclamada, sem estar sujeito a horário ou exclusividade. A subordinação necessária para o reconhecimento de vínculo empregatício refere-se à subordinação jurídica - não à subordinação econômica, técnica, social, pessoal, tecnológica, algorítmica ou qualquer outra. Cabe pontuar que a subordinação jurídica é refletida na intensidade, repetição e continuidade de ordens do tomador em direção ao prestador de serviços. Não se pode deixar de registrar que, mesmo nas relações de trabalho autônomo, há um mínimo de obediência às diretrizes traçadas pelo tomador de serviços, pois é um pressuposto da organização de atividades econômicas. Desse modo, a presença de requisitos mínimos para garantir a qualidade dos serviços e o incentivo à prestação de serviços em determinados horários, bem como a avaliação do atendimento por meio dos clientes, não faz caracterizar a subordinação. Destaca-se que a Resolução n. 148 da CGSN incluiu a ocupação de motorista de aplicativo independente no anexo XI da Resolução n. 140 da CGSN, entre aquelas que podem ser exercidas pelo MEI. Em verdade, partilha-se do entendimento de que, diante da ampla relevância social da categoria, deveriam ser implantadas regulamentações para garantir condições de vida e de trabalho mais dignas para a categoria dos profissionais que prestam seus serviços pelo intermédio de sistemas informatizados, sujeitos a alterações de algoritmos e a diversos riscos do negócio, em especial com o recente e infeliz crescimento da informalidade. Todavia, o que não se pode é descaracterizar o instituto jurídico do contrato de trabalho para abarcar situações que são relações de serviço autônomo - a integridade da ordem jurídica e do direito do trabalho é o maior garantidor dos direitos sociais. Segue-se, aqui, na linha do posicionamento expresso pelas seguintes decisões do C. TST: AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO PELO RECLAMANTE. ACÓRDÃO REGIONAL PUBLICADO NA VIGÊNCIA DAS LEIS Nºs 13.015/2014 E 13.467/2017. RELAÇÃO DE EMPREGO. RECONHECIMENTO DE VÍNCULO. TRABALHADOR AUTÔNOMO. MOTORISTA ENTREGADOR DE APLICATIVO. IFOOD. IMPOSSIBILIDADE. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA. NÃO PROVIMENTO. I. Discute-se a possibilidade de reconhecimento de vínculo de emprego entre motorista entregador profissional que desenvolve suas atividades com utilização do aplicativo de tecnologia "Ifood" com o seu criador IFOOD.COM AGENCIA DE RESTAURANTES ONLINE S.A. e o operador logístico LOG CITY EXPRESS LTDA. II. Pelo prisma da transcendência, trata-se de questão jurídica nova, uma vez que se refere à interpretação da legislação trabalhista (arts. 2º, 3º, e 6º, da CLT), sob enfoque em relação ao qual ainda não há jurisprudência consolidada no âmbito do Tribunal Superior do Trabalho ou em decisão de efeito vinculante no Supremo Tribunal Federal. Logo, reconhece-se a transcendência jurídica da causa (art. 896-A, § 1º, IV, da CLT). III. Na hipótese, o Tribunal Regional manteve a sentença em que se reconheceu a condição de trabalhador autônomo do Reclamante. No particular, na instância ordinária, houve o reconhecimento de que o Reclamante ostentava ampla autonomia na prestação de serviços, sendo dele o ônus da atividade econômica. Registrou-se, no acórdão recorrido, que as provas e os fatos constantes dos autos comprovaram a ausência de subordinação do trabalhador para com as Reclamadas. Tais premissas são insuscetíveis de revisão ou alteração nessa instância extraordinária, conforme entendimento consagrado na Súmula nº 126 do TST. IV. A relação de emprego definida pela CLT tem como padrão a relação clássica de trabalho industrial, comercial e de serviços. As novas formas de trabalho devem ser reguladas por lei própria e, enquanto o legislador não a edita, não pode o julgador aplicar indiscriminadamente o padrão da relação de emprego. O contrato regido pela CLT exige a convergência de quatro elementos configuradores: pessoalidade, onerosidade, não eventualidade e subordinação jurídica. Esta decorre do poder hierárquico da empresa e se desdobra nos poderes diretivo, fiscalizador, regulamentar e disciplinar (punitivo). O enquadramento da relação estabelecida entre o motorista entregador de aplicativo e a respectiva plataforma deve se dar com aquela prevista no ordenamento jurídico com maior afinidade, como é o caso da definida pela Lei nº 11.442/2007, do transportador autônomo, assim configurado aquele que é proprietário do veículo e tem relação de natureza comercial. O STF já declarou constitucional tal enquadramento jurídico de trabalho autônomo (ADC 48, Rel. Min. Roberto Barroso, DJE nº 123, de 18/05/2020), a evidenciar a possibilidade de que nem todo o trabalho pessoal e oneroso deve ser regido pela CLT. V. O trabalho pela plataforma tecnológica - e não para ela -, não atende aos critérios definidos nos artigos 2º e 3º da CLT, pois o usuário-motorista pode dispor livremente quando se disponibilizará seu serviço de transporte/entrega para os usuários-clientes, sem qualquer exigência de trabalho mínimo, de número mínimo de entregas por período, de faturamento mínimo, sem qualquer fiscalização ou punição por esta decisão do motorista, como constou das premissas fáticas incorporadas pelo acórdão Regional. VI. Sob esse enfoque, fixa-se o seguinte entendimento: o trabalho prestado com a utilização de plataforma tecnológica de gestão de oferta de motoristas entregadores-usuários e demanda de clientes-usuários, não se dá para a plataforma e não atende aos elementos configuradores da relação de emprego previstos nos artigos 2º e 3º da CLT, inexistindo, por isso, relação de emprego entre o motorista entregador profissional e a desenvolvedora e gestora logística do aplicativo. VII. Agravo de instrumento de que se conhece e a que se nega provimento. (TST - AIRR: 00003313520205100015, Relator: Alexandre Luiz Ramos, Data de Julgamento: 14/12/2022, 4ª Turma, Data de Publicação: 19/12/2022) AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO PELA RECLAMANTE. ACÓRDÃO REGIONAL PUBLICADO NA VIGÊNCIA DAS LEIS Nºs 13.015/2014 E 13.467/2017. PROCEDIMENTO SUMARÍSSIMO. RELAÇÃO DE EMPREGO. RECONHECIMENTO DE VÍNCULO. TRABALHADOR AUTÔNOMO. MOTORISTA. APLICATIVO. UBER. IMPOSSIBILIDADE. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA. NÃO PROVIMENTO. I. Discute-se a possibilidade de reconhecimento de vínculo de emprego entre motorista profissional que desenvolve suas atividades com utilização do aplicativo de tecnologia "Uber" e a sua criadora, Uber do Brasil Tecnologia Ltda. II. Pelo prisma da transcendência, trata-se de questão jurídica nova, uma vez que se refere à interpretação da legislação trabalhista (arts. 2º, 3º, e 6º, da CLT) , sob enfoque em relação ao qual ainda não há jurisprudência consolidada no âmbito do Tribunal Superior do Trabalho ou em decisão de efeito vinculante no Supremo Tribunal Federal. Logo, reconhece-se a transcendência jurídica da causa (art. 896-A, § 1º, IV, da CLT). III. Na hipótese, o Tribunal Regional manteve, pelos próprios fundamentos, a sentença em que se reconheceu a condição de trabalhador autônomo do Reclamante . No particular, houve reconhecimento na instância ordinária de que o Reclamante ostentava ampla autonomia na prestação de serviços, sendo dele o ônus da atividade econômica. Registrou-se, ainda, a ausência de subordinação do trabalhador para com a Reclamada, visto que "o autor não estava sujeito ao poder diretivo, fiscalizador e punitivo da ré". Tais premissas são insusceptíveis de revisão ou alteração nessa instância extraordinária, conforme entendimento consagrado na Súmula nº 126 do TST. IV. A relação de emprego definida pela CLT (1943) tem como padrão a relação clássica de trabalho industrial, comercial e de serviços. As novas formas de trabalho devem ser reguladas por lei própria e, enquanto o legislador não a edita, não pode o julgador aplicar indiscriminadamente o padrão da relação de emprego. O contrato regido pela CLT exige a convergência de quatro elementos configuradores: pessoalidade, onerosidade, não eventualidade e subordinação jurídica. Esta decorre do poder hierárquico da empresa e se desdobra nos poderes diretivo, fiscalizador, regulamentar e disciplinar (punitivo) . O enquadramento da relação estabelecida entre o motorista de aplicativo e a respectiva plataforma deve se dar com aquela prevista no ordenamento jurídico com maior afinidade, como é o caso da definida pela Lei nº 11.442/2007, do transportador autônomo, assim configurado aquele que é proprietário do veículo e tem relação de natureza comercial. O STF já declarou constitucional tal enquadramento jurídico de trabalho autônomo (ADC 48, Rel. Min. Roberto Barroso, DJE nº 123, de 18/05/2020), a evidenciar a possibilidade de que nem todo o trabalho pessoal e oneroso deve ser regido pela CLT. V. O trabalho pela plataforma tecnológica - e não para ela -, não atende aos critérios definidos nos artigos 2º e 3º da CLT, pois o usuário-motorista pode dispor livremente quando e se disponibilizará seu serviço de transporte para os usuários-clientes, sem qualquer exigência de trabalho mínimo, de número mínimo de viagens por período, de faturamento mínimo, sem qualquer fiscalização ou punição por esta decisão do motorista, como constou das premissas fáticas incorporadas pelo acórdão Regional, ao manter a sentença de primeiro grau por seus próprios fundamentos, em procedimento sumaríssimo. VI. Sob esse enfoque, fixa-se o seguinte entendimento: o trabalho prestado com a utilização de plataforma tecnológica de gestão de oferta de motoristas-usuários e demanda de clientes-usuários, não se dá para a plataforma e não atende aos elementos configuradores da relação de emprego previstos nos artigos 2º e 3º da CLT, inexistindo, por isso, relação de emprego entre o motorista profissional e a desenvolvedora do aplicativo, o que não acarreta violação do disposto no art. 1º, III e IV, da Constituição Federal . VII . Agravo de instrumento de que se conhece e a que se nega provimento (AIRR-10575-88.2019.5.03.0003, 4ª Turma, Relator Ministro Alexandre Luiz Ramos, DEJT 11/09/2020) AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. VÍNCULO DE EMPREGO. MOTORISTA. UBER. AUSÊNCIA DE SUBORDINAÇÃO. Em razão de provável caracterização de ofensa ao art. 3º, da CLT, dá-se provimento ao agravo de instrumento para determinar o prosseguimento do recurso de revista. Agravo de instrumento provido. RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. VÍNCULO DE EMPREGO. MOTORISTA. UBER. AUSÊNCIA DE SUBORDINAÇÃO. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA. Destaque-se, de início, que o reexame do caso não demanda o revolvimento de fatos e provas dos autos, isso porque a transcrição do depoimento pessoal do autor no acórdão recorrido contempla elemento fático hábil ao reconhecimento da confissão quanto à autonomia na prestação de serviços. Com efeito, o reclamante admite expressamente a possibilidade de ficar " off line" , sem delimitação de tempo, circunstância que indica a ausência completa e voluntária da prestação dos serviços em exame, que só ocorre em ambiente virtual. Tal fato traduz, na prática, a ampla flexibilidade do autor em determinar sua rotina, seus horários de trabalho, locais que deseja atuar e quantidade de clientes que pretende atender por dia. Tal auto-determinação é incompatível com o reconhecimento da relação de emprego, que tem como pressuposto básico a subordinação, elemento no qual se funda a distinção com o trabalho autônomo. Não bastasse a confissão do reclamante quanto à autonomia para o desempenho de suas atividades, é fato incontroverso nos autos que o reclamante aderiu aos serviços de intermediação digital prestados pela reclamada, utilizando-se de aplicativo que oferece interface entre motoristas previamente cadastrados e usuários dos serviços. Dentre os termos e condições relacionados aos referidos serviços, está a reserva ao motorista do equivalente a 75% a 80% do valor pago pelo usuário , conforme consignado pelo e. TRT. O referido percentual revela-se superior ao que esta Corte vem admitindo como bastante à caracterização da relação de parceria entre os envolvidos, uma vez que o rateio do valor do serviço em alto percentual a uma das partes evidencia vantagem remuneratória não condizente com o liame de emprego. Precedentes. Recurso de revista conhecido e provido (RR-1000123-89.2017.5.02.0038, 5ª Turma, Relator Ministro Breno Medeiros, DEJT 07/02/2020) Diante do não reconhecimento do vínculo empregatício pleiteado, resta prejudicada a análise dos pedidos de nulidade da dispensa, reintegração ao emprego e indenização por danos morais em razão da ausência de cobertura previdenciária. Recurso ordinário desprovido. 3. CONCLUSÃO Ante o exposto, conheço do recurso ordinário. Rejeito a preliminar de incompetência material suscitada pela recorrida em contrarrazões. No mérito, nego provimento ao apelo. É como voto. Acórdão Isto posto, em Sessão Ordinária de Julgamento realizada nesta data, sob a Presidência da Excelentíssima Senhora Desembargadora Maria Auxiliadora Barros de Medeiros Rodrigues, com a presença dos Excelentíssimos Senhores Desembargadores Ricardo Luís Espíndola Borges, Bento Herculano Duarte Neto (Relator), do Excelentíssimo Senhor Juiz Convocado Manoel Medeiros Soares de Sousa e do(a) Representante da Procuradoria Regional do Trabalho da 21ª Região, Dra. Maria Edlene Lins Felizardo, ACORDAM os Excelentíssimos Senhores Desembargadores Federais e o Juiz Convocado da Primeira Turma de Julgamento do Tribunal Regional do Trabalho da Vigésima Primeira Região, por unanimidade, conhecer do recurso ordinário. Por unanimidade, rejeitar a preliminar de incompetência material suscitada pela recorrida em contrarrazões. Mérito: por maioria, negar provimento ao recurso ordinário; vencido o Juiz Convocado Manoel Medeiros Soares de Sousa que dava provimento ao recurso ordinário entendendo que encontram-se, no âmbito das plataformas digitais, presentes todos os requisitos caracterizadores do vínculo empregatício. Obs.: Ausente, justificadamente, o Excelentíssimo Senhor Desembargador Eridson João Fernandes Medeiros, por se encontrar em gozo de férias regulamentares. Convocado o Excelentíssimo Senhor Juiz Manoel Medeiros Soares de Sousa (RA 007/2025). Sustentação oral pelo advogado da UBER DO BRASIL TECNOLOGIA LTDA., DR. FELIPE MAIA CORREIA. Juntada de voto divergente pelo Juiz Convocado Manoel Medeiros Soares de Sousa. Natal/RN, 15 de abril de 2025. BENTO HERCULANO DUARTE NETO Desembargador Relator Voto do(a) Des(a). MANOEL MEDEIROS SOARES DE SOUSA / Gabinete do Desembargador Eridson João Fernandes Medeiros JUSTIFICATIVA DE VOTO VENCIDO Trata-se de recurso ordinário em procedimento sumaríssimo interposto por Yasmim Munik de Araujo Costa contra a sentença proferida pelo juízo da 6ª Vara do Trabalho de Natal/RN (ID 00cb185), que rejeitou a preliminar suscitada e, no mérito, julgou improcedentes os pedidos formulados na reclamação trabalhista ajuizada em desfavor de Uber do Brasil Tecnologia LTDA. Além disso, condenou a reclamante ao pagamento de honorários sucumbenciais no importe de 10% (cinco por cento) sobre o valor da causa, ficando a obrigação sob condição suspensiva de exigibilidade. Em que pese o entendimento do d. Desembargador Relator, dele divirjo, entendendo pela reforma da sentença, porquanto vislumbro presentes os elementos caracterizadores do vínculo empregatício, em especial a subordinação digital. Considerando que a prestação de serviços foi, de toda sorte, admitida pela reclamada, sobre ela recai o ônus de comprovar a alegada autonomia da relação de trabalho. Na verdade, os fatos não estão firmemente controversos e são de domínio público as circunstâncias específicas às quais se submetem o autor e reclamada dentro da relação jurídica estabelecida. Com efeito. A relação de emprego resta configurada quando presentes os requisitos previstos nos artigos 2º e 3º da CLT, quais sejam: subordinação, continuidade ou não eventualidade, riscos da atividade econômica pelo empregador (alteridade), pessoalidade e onerosidade. No caso, encontram-se presentes todos os requisitos caracterizadores do vínculo empregatício. Destaco inicialmente que, ao contrário do que tenta fazer crer a empresa reclamada, seu fim social é a prestação de serviços de transporte de passageiros/entregas, e não a mera conexão digital entre prestador e tomador dentro de uma economia dita compartilhada. Isso ocorre porque as regras que regulam a relação, especialmente o termo de uso, permitem à reclamada um domínio absoluto sobre o modo e a forma de se prestar o serviço, pelo motorista, para o tomador (passageiro), além da definição do valor a ser cobrado por cada tarefa executada, em um enquadramento inequívoco do fato ao conceito de subordinação. No caso, subordinação digital. Se o objeto social da empresa fosse tão somente a conexão digital entre o prestador do serviço de transporte e o tomador de serviço, a ela não caberia adentrar e regular tão incisivamente a relação entre eles e o modo de se prestar o serviço. O domínio, repito, é todo da reclamada, a quem cabe ditar as regras. E dominado é o prestador de serviço. Se há uma relação de domínio, o autor é o subordinado. Os próprios "TERMOS E CONDIÇÕES GERAIS DOS SERVIÇOS DE INTERMEDIAÇÃO DIGITAL" evidenciam a atividade principal da empresa como transporte de passageiros, ainda que sob a roupagem das novas tecnologias. Parece lógico que, se o transporte de passageiros fosse realmente realizado a cargo exclusivo do motorista, o pagamento das corridas seria feito diretamente àquele, sem intermediação da empresa nem tarifação por ela. E ao encargo do motorista ficaria o dever de pagar apenas pelo uso do aplicativo. Isso, contudo, não é o que ocorre no caso. A empresa reclamada inquestionavelmente presta serviço de transporte de passageiros aos clientes do aplicativo, recebe pagamento deles e realiza um repasse ao motorista, o qual é denominado ''parceiro". É bem verdade que realiza sua atividade com amparo na tecnologia, viabilizada por software por ela desenvolvido, mas não está no fomento da tecnologia a sua atividade principal. A tecnologia é tão só o meio para facilitar a realização do transporte de passageiros e dar cumprimento ao seu fim social. Prova maior é que o usuário do aplicativo não é cliente do motorista, mas, sim, da empresa reclamada. O serviço de transporte não é ofertado pelo motorista, mas pela empresa. Consequência lógica é que o usuário do transporte é cliente da empresa, e não do motorista. E este, por sua vez, não é cliente da empresa de transporte, mas verdadeiro trabalhador dela. Acrescento ainda que as reclamações e questionamentos travados pelos usuários do transporte são dirigidos diretamente à empresa, com canal próprio para tanto - que providencia as adequações necessárias, inclusive descredenciamento do trabalhador -, não sendo endereçadas especificamente ao motorista. Na verdade, este fica sujeito a eventual poder punitivo que sabidamente a reclamada detém sobre eles, a exemplo da suspensão ou mesmo, dependendo da falta, o cancelamento do acesso do motorista à plataforma. Uma justa causa digital. E sem suportar ela qualquer penalidade pelo ato, se indevido. De fato, o trabalho prestado pelo motorista é compreensivelmente monitorado pela empresa reclamada, já que, como todo e bom capitalista, precisa assegurar a excelência do serviço à sua clientela, como em toda e boa relação pessoal e profissional diretamente do chão da fábrica. Não só se monitora a prestação de serviços, mas também a sua exposição às orientações da empresa, ainda que através de inteligência artificial. O sistema interage com o motorista para adverti-lo sobre as deficiências e atitudes adversas identificadas, algumas, inclusive, na avaliação da reclamada, passíveis de punição, sendo a pena máxima o descadastramento - uma espécie de dispensa com justa causa -, como é notório e de domínio público. Aqui fica evidente o requisito da subordinação, exigido nas relações de emprego e antagônica à propalada autonomia defendida na defesa. Uma subordinação ambientada nos bits e bytes, em sistemas informacionais complexos viabilizados por um alto nível de automação das rotinas de trabalho, inclusive em nível de aprendizado profundo de máquina (deep learning) - autoaprendizado de máquina, muitas vezes não auditáveis -, chegando a um patamar extremamente requintado com o desenvolvimento dos sistemas digitais, quer na área de hardware (nanotecnologia e processadores octa-core, com oito núcleos, 16 threads e clock se aproximando de 5GHz, sem overclock), quer na de software (inteligência artificial - IA). Tudo resumido em uma subordinação digital. É certo. Mas tão - ou, quiçá, mais - efetiva do que a presencial. Não é só o que dizem os autos. Os depoimentos utilizados como prova emprestada pela defesa (anexos do Id. 66374eb) revelam que havia um código interno imposto na atitude que espera daqueles com quem mantém relação, consolidando, inequivocamente, uma ascendência típica das relações jurídicas com forte traço de subordinação. Pior, em nível de verdadeira sujeição. Exemplo disso era o descadastramento em caso de inatividade do aplicativo ou por avaliação dos usuários. Tal cenário representa uma verdadeira apropriação do trabalho alheio na consecução dos regulares, legais, lícitos e constitucionais fins capitalistas da empresa. O que muda e pode maquiar uma relação de emprego é tão somente o modo como se apropria desse trabalho, representando elemento histórico novo na relação de trabalho. O avanço tecnológico chegou e vem ganhando cada vez mais espaço nas relações de trabalho. O formato tradicional de emprego, em que o trabalhador se apresenta diariamente no mesmo horário, bate o ponto, cumpre sua jornada naquele mesmo local, registra o fim de sua jornada e vai embora, não mais se adequa a muitos segmentos. As novas tecnologias do processamento de informações, sobretudo por meio da criação de diversos aplicativos digitais, exemplo dos aplicativos de motoristas e entrega de alimentos, não mais necessitam da presença física do trabalhador em determinado local e por hora certa. O trabalhador, nessa nova era, nem mesmo conhece seu empregador. Não sabe seu nome e nunca o viu. Pode parecer estranho, mas é assim que caminham as novas relações do comércio e, por conseguinte, do trabalho. E é o avanço tecnológico que permite isso. Permite economizar tempo na prestação dos serviços e dinheiro nos gastos/custeios tradicionais com o trabalhador (energia e espaço físico). Mas não autorizam, de outra banda, a exclusão desses mesmos trabalhadores do sistema jurídico protetivo das relações de trabalho. Convém elucidar que o fato de o trabalho do reclamante ser controlado à distância, por meios informatizados, não retira o caráter da relação de emprego, consoante estabelece o comando contido no art. 6º, da CLT, verbis: "Art. 6º. Não se distingue entre o trabalho realizado no estabelecimento do empregador, o executado no domicílio do empregado e o realizado a distância, desde que estejam caracterizados os pressupostos da relação de emprego. Parágrafo único. Os meios telemáticos e informatizados de comando, controle e supervisão se equiparam, para fins de subordinação jurídica, aos meios pessoais e diretos de comando, controle e supervisão do trabalho alheio". Em apoio à tese ora exposta, trago à colação recente decisão do c. TST, que firma entendimento segundo o qual a relação jurídica em casos tais é de emprego. O acórdão da 3ª Turma, exarado nos autos do recurso de revista tombado sob o número 100353-02.2017.5.01.0066, da lavra do eminente Ministro Maurício Godinho Delgado, vem em momento oportuno para definição jurisprudencial do tema. Segue abaixo excertos do magnífico - e de fôlego - trabalho que Sua Excelência concebeu: EMENTA: RECURSO DE REVISTA. PROCESSO SOB A ÉGIDE DA LEI 13.015/2014 E ANTERIOR À LEI 13.467/2017. UBER DO BRASIL TECNOLOGIA LTDA. NATUREZA JURÍDICA DA RELAÇÃO MANTIDA ENTRE OS TRABALHADORES PRESTADORES DE SERVIÇOS E EMPRESAS QUE ORGANIZAM, OFERTAM E EFETIVAM A GESTÃO DE PLATAFORMAS DIGITAIS DE DISPONIBILIZAÇÃO DE SERVIÇOS DE TRANSPORTE AO PÚBLICO, NO CASO, O TRANSPORTE DE PESSOAS E MERCADORIAS. NOVAS FORMAS DE ORGANIZAÇÃO E GESTÃO DA FORÇA DE TRABALHO HUMANA NO SISTEMA CAPITALISTA E NA LÓGICA DO MERCADO ECONÔMICO. ESSENCIALIDADE DO LABOR DA PESSOA HUMANA PARA A CONCRETIZAÇÃO DOS OBJETIVOS DA EMPRESA. PROJEÇÃO DAS REGRAS CIVILIZATÓRIAS DO DIREITO DO TRABALHO SOBRE O LABOR DAS PESSOAS NATURAIS. INCIDÊNCIA DAS NORMAS QUE REGULAM O TRABALHO SUBORDINADO DESDE QUE NÃO DEMONSTRADA A REAL AUTONOMIA NA OFERTA E UTILIZAÇÃO DA MÃO DE OBRA DO TRABALHADOR (ART. 818, II, DA CLT). CONFLUÊNCIA DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS HUMANISTAS E SOCIAIS QUE ORIENTAM A MATÉRIA (PREÂMBULO DA CF/88; ART. 1º, III E IV; ART. 3º, I, II, III E IV; ART. 5º, CAPUT; ART. 6º; ART. 7º, CAPUT E SEUS INCISOS E PARÁGRAFO ÚNICO; ARTS. 8º ATÉ 11; ART. 170, CAPUT E INCISOS III, VII E VIII; ART. 193, TODOS DA CONSTITUIÇÃO DE 1988). VÍNCULO DE EMPREGO. DADOS FÁTICOS CONSTANTES DO ACÓRDÃO REGIONAL REFERINDO-SE A RELAÇÃO SOCIOECONÔMICA ABRANGENTE DE PERÍODO DE QUASE DOIS MESES. PRESENÇA DOS ELEMENTOS INTEGRANTES DA RELAÇÃO EMPREGATÍCIA. INCIDÊNCIA, ENTRE OUTROS PRECEITOS, TAMBÉM DA REGRA DISPOSTA NO PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 6º DA CLT (INSERIDA PELA LEI n. 12.551/2011), A QUAL ESTABELECE QUE "OS MEIOS TELEMÁTICOS E INFORMATIZADOS DE COMANDO, CONTROLE E SUPERVISÃO SE EQUIPARAM, PARA FINS DE SUBORDINAÇÃO JURÍDICA, AOS MEIOS PESSOAIS E DIRETOS DE COMANDO, CONTROLE E SUPERVISÃO DO TRABALHO ALHEIO". PRESENÇA, POIS, DOS CINCO ELEMENTOS DA RELAÇÃO DE EMPREGO, OU SEJA: PESSOA HUMANA PRESTANDO TRABALHO; COM PESSOALIDADE; COM ONEROSIDADE; COM NÃO EVENTUALIDADE; COM SUBORDINAÇÃO. ÔNUS DA PROVA DO TRABALHO AUTÔNOMO NÃO CUMPRIDO, PROCESSUALMENTE (ART 818, CLT), PELA EMPRESA DE PLATAFORMA DIGITAL QUE ARREGIMENTA, ORGANIZA, DIRIGE E FISCALIZA A PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS ESPECIALIZADOS DE SERVIÇOS DE TRANSPORTE. Cinge-se a controvérsia do presente processo em definir se a relação jurídica havida entre o Reclamante e a Reclamada - Uber do Brasil Tecnologia Ltda. - configurou-se como vínculo de emprego (ou não). A solução da demanda exige o exame e a reflexão sobre as novas e complexas fórmulas de contratação da prestação laborativa, algo distintas do tradicional sistema de pactuação e controle empregatícios, e que ora se desenvolvem por meio da utilização de plataformas e aplicativos digitais, softwares e mecanismos informatizados semelhantes, todos cuidadosamente instituídos, preservados e geridos por sofisticadas (e, às vezes, gigantescas) empresas multinacionais e, até mesmo, nacionais. É importante perceber que tais sistemas e ferramentas computadorizados surgem no contexto do aprofundamento da revolução tecnológica despontada na segunda metade do século XX (ou, um pouco à frente, no início do século XXI), a partir da informática e da internet, propiciando a geração de um sistema empresarial de plataformas digitais, de amplo acesso ao público, as quais permitem um novo meio de arregimentação de mão de obra, diretamente por intermédio desses aplicativos digitais, que têm o condão de organizar, direcionar, fiscalizar e zelar pela hígida prestação de serviços realizada ao cliente final. A modificação tecnológica e organizacional ocorrida nas duas últimas décadas tem sido tão intensa que há, inclusive, autores e correntes de pensamento que falam na existência de uma quarta revolução tecnológica no sistema capitalista. Evidentemente que essa nova estrutura de organização empresarial e de prestação de serviços facilita a aproximação e a comunicação na sociedade e no âmbito da prestação de serviços ao público alvo, seja este formado por pessoas físicas ou por instituições. Porém a lógica de sua estruturação e funcionamento também tem sido apreendida por grandes corporações empresariais como oportunidade ímpar para reduzirem suas estruturas produtivas e, especialmente, o custo do trabalho utilizado e imprescindível para o bom funcionamento econômico da entidade empresarial. De nenhuma valia econômica teria este sistema organizacional e tecnológico, conforme se percebe, se não houvesse, é claro, a prestação laborativa por ele propiciada ao público alvo objetivado - neste caso, se não existissem motoristas e carros organizadamente postos à disposição das pessoas físicas e jurídicas. Realmente, os impactos dessa nova modalidade empresarial e de organização do trabalho têm sido diversos: de um lado, potenciam, fortemente, a um custo mais baixo do que o precedente, a oferta do trabalho de transporte de pessoas e coisas no âmbito da sociedade; de outro lado, propiciam a possibilidade de realização de trabalho por pessoas desempregadas, no contexto de um desemprego agudo criado pelas políticas públicas e por outros fatores inerentes à dinâmica da economia; mas, em terceiro lugar, pela desregulamentação amplamente praticada por este sistema, gerando uma inegável deterioração do trabalho humano, uma lancinante desigualdade no poder de negociação entre as partes, uma ausência de regras de higiene e saúde do trabalho, uma clara falta de proteção contra acidentes ou doenças profissionais, uma impressionante inexistência de quaisquer direitos individuais e sociais trabalhistas, a significativa ausência de proteções sindicais e, se não bastasse, a grave e recorrente exclusão previdenciária. O argumento empresarial, em tal quadro, segue no sentido de ser o novo sistema organizacional e tecnológico tão disruptivo perante a sistemática de contratação anterior que não se fazem presentes, em sua estrutura e dinâmica, os elementos da relação empregatícia. E, efetivamente, é o que cabe examinar, afinal, no presente processo. Passa-se, dessa maneira, ao exame da relação socioeconômica e jurídica entre as partes do presente processo, respeitados os aspectos fáticos lançados pelo próprio acórdão regional, como determina a Súmula 126 do TST. Nesse exame, sem negligenciar a complexidade das questões que envolvem a discussão dos autos, o eventual enquadramento como vínculo empregatício da relação jurídica entre o prestador de serviços e as plataformas digitais, pelo Poder Judiciário Trabalhista no Brasil, vai depender das situações fáticas efetivamente demonstradas, as quais, por sua própria complexidade, podem abarcar inúmeras e múltiplas hipóteses. A propósito, no Direito brasileiro existe sedimentada presunção de ser empregatício o vínculo jurídico formado - regido pela Constituição da República (art. 7º) e pela CLT, portanto -, desde que seja incontroversa a prestação de serviços por uma pessoa natural a alguém (Súmula 212, TST). Essa presunção jurídica relativa (não absoluta, esclareça-se) é clássica ao Direito do Trabalho, em geral, resultando de dois fatores historicamente incontestáveis: a circunstância de ser a relação de emprego a regra geral de conexão dos trabalhadores ao sistema socioeconômico capitalista; a circunstância de a relação de emprego, desde o surgimento do Direito do Trabalho, ter se tornado a fórmula mais favorável e protegida de inserção da pessoa humana trabalhadora na competitiva e excludente economia contemporânea. No Brasil, desponta a singularidade de esta antiga presunção jurídica ter sido incorporada, de certo modo, até mesmo pela Constituição da República de 1988, ao reconhecer, no vínculo empregatício, um dos principais e mais eficazes instrumentos de realização de notável bloco de seus princípios cardeais, tais como o da dignidade do ser humano, o da centralidade da pessoa humana na ordem jurídica e na vida socioeconômica, o da valorização do trabalho e do emprego, o da inviolabilidade física e psíquica da pessoa humana, o da igualdade em sentido substancial, o da justiça social, o do bem-estar individual e social, o da segurança e o da subordinação da propriedade à sua função socioambiental. Com sabedoria, a Constituição percebeu que não se criou, na História do Capitalismo, nessa direção inclusiva, fórmula tão eficaz, larga, abrangente e democrática quanto a estruturada na relação de emprego. Convergindo inúmeros preceitos constitucionais para o estímulo, proteção e elogio à relação de emprego (ilustrativamente: Preâmbulo da CF/88; art. 1º, III e IV; art. 3º, I, II, III e IV; art. 5º, caput; art. 6º; art. 7º, caput e seus incisos e parágrafo único; arts. 8º até 11; art. 170, caput e incisos III, VII e VIII; art. 193, todos do Texto Máximo de 1988), emerge clara a presunção também constitucional em favor do vínculo empregatício no contexto de existência de incontroversa prestação de trabalho na vida social e econômica. De par com isso, a ordem jurídica não permite a contratação do trabalho por pessoa natural, com os intensos elementos da relação de emprego, sem a incidência do manto mínimo assecuratório da dignidade básica do ser humano nessa seara da vida individual e socioeconômica. Em consequência, possuem caráter manifestamente excetivo fórmulas alternativas de prestação de serviços a alguém, por pessoas naturais, como, ilustrativamente, contratos de estágio, vínculos autônomos ou eventuais, relações cooperativadas e as fórmulas intituladas de "pejotização" e, mais recentemente, o trabalho de transporte de pessoas e coisas via arregimentação e organização realizadas por empresas de plataformas digitais. Em qualquer desses casos, estando presentes os elementos da relação de emprego, esta prepondera e deve ser reconhecida, uma vez que a verificação desses pressupostos, muitas vezes, demonstra que a adoção de tais práticas se dá, essencialmente, como meio de precarizar as relações empregatícias (art. 9º, da CLT). Nesse aspecto, cumpre enfatizar que o fenômeno sóciojurídico da relação empregatícia emerge quando reunidos os seus cinco elementos fático-jurídicos constitutivos: prestação de trabalho por pessoa física a outrem, com pessoalidade, não eventualidade, onerosidade e sob subordinação. Observe-se que, no âmbito processual, uma vez admitida a prestação de serviços pelo suposto empregador/tomador de serviços, a ele compete demonstrar que o labor se desenvolveu sob modalidade diversa da relação de emprego, considerando a presunção (relativa) do vínculo empregatício sedimentada há várias décadas no Direito do Trabalho, conforme exaustivamente exposto. A análise casual das hipóteses discutidas em Juízo, portanto, deve sempre se pautar no critério do ônus da prova - definido no art. 818 da CLT -, competindo ao obreiro demonstrar a prestação de serviços (inciso I do art. 818 da CLT); e à Reclamada, provar eventual autonomia na relação jurídica (inciso II do art. 818 da CLT). No caso dos autos, a prova coligida no processo e referenciada pelo acórdão recorrido demonstrou que a Reclamada administra um empreendimento relacionado ao transporte de pessoas - e não mera interligação entre usuários do serviço e os motoristas cadastrados no aplicativo - e que o Reclamante lhe prestou serviços como motorista do aplicativo digital. Assim, ficaram firmemente demonstrados os elementos integrantes da relação de emprego, conforme descrito imediatamente a seguir. Em primeiro lugar, é inegável (e fato incontroverso) de que o trabalho de dirigir o veículo e prestar o serviço de transporte, em conformidade com as regras estabelecidas pela empresa de plataforma digital, foi realizado, sim, por uma pessoa humana - no caso, o Reclamante. Em segundo lugar, a pessoalidade também está comprovada, pois o Obreiro precisou efetivar um cadastro individual na Reclamada, fornecendo dados pessoais e bancários, bem como, no decorrer da execução do trabalho, foi submetido a um sistema de avaliação individualizada, a partir de notas atribuídas pelos clientes e pelo qual a Reclamada controlava a qualidade dos serviços prestados. É também incontroverso de que todas as inúmeras e incessantes avaliações feitas pela clientela final referem-se à pessoa física do motorista uberizado, emergindo, assim, a presença óbvia do elemento fático e jurídico da pessoalidade. O caráter oneroso do trabalho executado é também incontroverso, pois a clientela faz o pagamento ao sistema virtual da empresa, em geral por meio de cartão de crédito (podendo haver também, mais raramente, pagamento em dinheiro) e, posteriormente, a empresa gestora do sistema informatizado credita parte do valor apurado na conta corrente do motorista. Ora, o trabalhador somente adere a esse sistema empresarial e de prestação laborativa porque ele lhe assegura retribuição financeira em decorrência de sua prestação de trabalho e em conformidade com um determinado percentual dos valores apurados no exercício desse trabalho. Sobre a não eventualidade, o labor do Reclamante estava inserido na dinâmica intrínseca da atividade econômica da Reclamada e inexistia qualquer traço de transitoriedade na prestação do serviço. Não era eventual, também, sob a perspectiva da teoria do evento, na medida em que não se tratava de labor desempenhado para certa obra ou serviço, decorrente de algum acontecimento fortuito ou casual. De todo modo, é também incontroverso de que se trata de labor inerente à rotina fundamental da empresa digital de transporte de pessoas humanas, sem o qual tal empresa sequer existiria. Por fim, a subordinação jurídica foi efetivamente demonstrada, destacando-se as seguintes premissas que se extraem do acórdão regional, incompatíveis com a suposta autonomia do trabalhador na execução do trabalho: 1) a Reclamada organizava unilateralmente as chamadas dos seus clientes/passageiros e indicava o motorista para prestar o serviço; 2) a empresa exigia a permanência do Reclamante conectado à plataforma digital para prestar os serviços, sob risco de descredenciamento da plataforma digital (perda do trabalho); 3) a empresa avaliava continuamente a performance dos motoristas, por meio de um controle telemático e pulverizado da qualidade dos serviços, a partir da tecnologia da plataforma digital e das notas atribuídas pelos clientes/passageiros ao trabalhador. Tal sistemática servia, inclusive, de parâmetro para o descredenciamento do motorista em face da plataforma digital - perda do trabalho -, caso o obreiro não alcançasse uma média mínima; 4) a prestação de serviços se desenvolvia diariamente, durante o período da relação de trabalho - ou, pelo menos, com significativa intensidade durante os dias das semanas -, com minucioso e telemático controle da Reclamada sobre o trabalho e relativamente à estrita observância de suas diretrizes organizacionais pelo trabalhador, tudo efetivado, aliás, com muita eficiência, por intermédio da plataforma digital (meio telemático) e mediante a ativa e intensa, embora difusa, participação dos seus clientes/passageiros. Saliente-se ser fato notório (art. 337, I, do CPC/15) que a Reclamada é quem estabelece unilateralmente os parâmetros mais essenciais da forma de prestação dos serviços e da dinâmica de funcionamento da atividade econômica, como, por exemplo, a definição do preço da corrida e do quilômetro rodado no âmbito de sua plataforma digital. Desse quadro, se percebe a configuração da subordinação jurídica nas diversas dimensões: a) clássica, em face da existência de incessantes ordens diretas da Reclamada promovidas por meios remotos e digitais (art. 6º, parágrafo primeiro, da CLT), demonstrando a existência da assimetria poder de direção/subordinação e, ainda, os aspectos diretivo, regulamentar, fiscalizatório e disciplinar do poder empregatício; b) objetiva, tendo em vista o trabalho executado estritamente alinhado aos objetivos empresariais; c) estrutural, mediante a inteira inserção do profissional contratado na organização da atividade econômica desempenhada pela Reclamada, em sua dinâmica de funcionamento e na cultura jurídica e organizacional nela preponderante; d) por fim, a subordinação algorítima, que consiste naquela efetivada por intermédio de aferições, acompanhamentos, comandos, diretrizes e avaliações concretizadas pelo computador empresarial, no denominado algoritmo digital típico de tais empresas da Tecnologia 4.0. Saliente-se, por oportuno, que a suposta liberdade do profissional para definir seus horários de trabalho e de folgas, para manter-se ligado, ou não, à plataforma digital, bem como o fato de o Reclamante ser detentor e mantenedor de uma ferramenta de trabalho - no caso, o automóvel utilizado para o transporte de pessoas - são circunstâncias que não têm o condão de definir o trabalho como autônomo e afastar a configuração do vínculo de emprego. Reitere-se: a prestação de serviços ocorria diariamente, com sujeição do Autor às ordens emanadas da Reclamada por meio remoto e telemático (art. 6º, parágrafo único, da CLT); havia risco de sanção disciplinar (exclusão da plataforma) em face da falta de assiduidade na conexão à plataforma e das notas atribuídas pelos clientes/passageiros da Reclamada; inexistia liberdade ou autonomia do Reclamante para definir os preços das corridas e dos seus serviços prestados, bem como escolher os seus passageiros (ou até mesmo criar uma carteira própria de clientes); não se verificou o mínimo de domínio do trabalhador sobre a organização da atividade empresarial, que era centralizada, metodicamente, no algoritmo da empresa digital; ficou incontroversa a incidência das manifestações fiscalizatórias, regulamentares e disciplinares do poder empregatício na relação de trabalho analisada. Enfim, o trabalho foi prestado pelo Reclamante à Reclamada, mediante remuneração, com subordinação, e de forma não eventual. Cabe reiterar que, embora, neste caso concreto, tenham sido comprovados os elementos da relação empregatícia, deve ser considerado que o ônus da prova da autonomia recai sobre a defesa, ou seja, o ente empresarial, já que inequívoca a prestação de trabalho (art. 818, II, da CLT), sendo forçoso reconhecer, também, que a Reclamada não se desvencilhou satisfatoriamente de seu encargo probatório. Dessa forma, deve ser reformado o acórdão regional para se declarar a existência do vínculo de emprego entre as Partes, nos termos da fundamentação. Recurso de revista conhecido e provido. (TST-3ª Turma; RR 100353-02.2017.5.01.0066; Relator Ministro Maurício Godinho Delgado; Publicado em 11/04/2022) Ainda, ressalto que a fixação do preço do serviço era feita pelo reclamado, o que também afasta a tese de autonomia do motorista. Os termos de uso da empresa demonstram que havia sistema de recompensas aos motoristas. Provada a onerosidade da relação. A continuidade e pessoalidade, por sua vez, são reveladas pelo período em que o reclamante está atuando como motorista, sem se fazer substituir, desde 04/06/2021. Ainda que não tenha existido dias determinados ou jornada pré-fixada, tal fato, no entanto, não pode ser condição para a relação de emprego, sobretudo nos tempos atuais, em que a fixação do trabalhador a horário ou jornada pré-determinados está sendo substituída pelo trabalho remoto, até porque pode-se cumprir jornada bem superior à limitação legal, dado o interesse do trabalhador em assegurar um mínimo financeiro para garantir um mínimo existencial. Por fim, registro que a exclusividade não é requisito ao reconhecimento da relação de emprego. O que se exige é compatibilidade de horário, o que, no caso, é absolutamente aplicável. De tudo exposto, resta plenamente comprovado que o reclamado, embora se apresente como uma empresa de tecnologia, tem como objetivo final e principal o transporte de passageiros, haja vista que seu lucro não advém do pagamento pela utilização da plataforma, mas, sim, pelos serviços efetivamente prestados pelos motoristas. Não há como aceitar qualquer argumento no sentido de que o motorista assume os riscos da atividade, na medida em que escolhe as corridas que irá realizar, o período laborado, e que tem ciência prévia dos termos e condições do trabalho. Assumir o risco da atividade econômica está atrelado ao auferimento total dos resultados, responsabilidade e em benefício da empresa, o que não ocorre com os motoristas. O risco da atividade sempre foi da empresa reclamada. E a relação de emprego entre ela e o autor está cabalmente provada e inequivocamente consolidada, diante de tudo que já foi exposto. Destarte, não acato a preliminar de incompetência material, e divirjo, no mérito, do voto do Exmo. Desembargador Relator, de modo a reconhecer a relação de emprego, nos moldes especificados no recurso ordinário, dando-lhe provimento para determinar a anotação da CTPS no período de 01/11/2022 a 20/12/2024, com o pagamento de um salário-mínimo mensal, além de férias, 13ºs salários e reflexos, mais recolhimento de FGTS por todo o período contratual. Manoel Medeiros Soares de Sousa Juiz Convocado NATAL/RN, 22 de abril de 2025. ROBERTO DE BRITO CALABRIA Diretor de Secretaria
Intimado(s) / Citado(s)
- YASMIM MUNIK DE ARAUJO COSTA
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