Processo nº 1000302-38.2024.8.11.0018
ID: 295633626
Tribunal: TJMT
Órgão: Regime de Cooperação da 2ª Câmara de Direito Público
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 1000302-38.2024.8.11.0018
Data de Disponibilização:
11/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO REGIME DE COOPERAÇÃO DA 2ª CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO Número Único: 1000302-38.2024.8.11.0018 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Multas e demais Sanções] Rel…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO REGIME DE COOPERAÇÃO DA 2ª CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO Número Único: 1000302-38.2024.8.11.0018 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Multas e demais Sanções] Relator: Des(a). MARCOS REGENOLD FERNANDES Turma Julgadora: [DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES, DES(A). ANTONIO VELOSO PELEJA JUNIOR, DES(A). MARCOS FALEIROS DA SILVA] Parte(s): [DISNEI ROBERTO DE ALENCAR LTDA - CNPJ: 11.121.722/0001-10 (APELANTE), VICTOR HUGO SENHORINI DE AQUINO - CPF: 009.604.341-51 (ADVOGADO), MUNICIPIO DE JUARA - CNPJ: 15.072.663/0001-99 (APELADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS), THARCILLA PINHEIRO CUSTODIO - CPF: 008.085.052-97 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a REGIME DE COOPERAÇÃO DA 2ª CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). MARCOS REGENOLD FERNANDES, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU O RECURSO. E M E N T A DIREITO ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. PROCESSO ADMINISTRATIVO SANCIONADOR. DEFESA DO CONSUMIDOR. PROCON MUNICIPAL. CITAÇÃO POR EDITAL. AUSÊNCIA DE ESGOTAMENTO DOS MEIOS DE LOCALIZAÇÃO. NULIDADE DAS MULTAS. RECURSO PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Apelação cível interposta contra sentença que julgou improcedente pedido de anulação de multas administrativas impostas pelo PROCON Municipal, decorrentes dos Processos Administrativos nº 136/2017 e nº 055/2017, sob o argumento de ausência de citação válida que inviabilizou o exercício do contraditório e da ampla defesa. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. A questão em discussão consiste em definir se a citação por edital, realizada nos processos administrativos sancionadores, é válida diante da ausência de esgotamento de meios ordinários de localização do autuado. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A citação por edital, nos termos do art. 42 do Decreto Federal nº 2.181/1997 e art. 37, §3º, do Decreto Estadual nº 3.571/2004, somente é admitida após a demonstração de esgotamento dos meios de localização do autuado, o que não ocorreu nos autos. 4. Os autos demonstram que houve apenas uma tentativa de notificação postal, sem nova diligência ou uso de meios alternativos disponíveis como telefone e e-mail constantes do cadastro administrativo. 5. A simples devolução da correspondência com a anotação “não procurado” não satisfaz o requisito legal de esgotamento de meios de localização, especialmente quando o endereço da empresa era conhecido e não havia indícios de estar em local incerto ou inacessível. 6. A ausência de diligência mínima para assegurar a ciência do autuado compromete a validade dos processos administrativos, por afronta aos princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa. IV. DISPOSITIVO E TESE 7. Recurso provido. Tese de julgamento: 1. A citação por edital em processo administrativo sancionador somente é válida quando esgotados todos os meios razoáveis de localização do autuado.2. A devolução de correspondência postal com a anotação “não procurado”, sem nova tentativa ou uso de outros meios de contato disponíveis, torna inválida a citação ficta. 3. A inobservância do contraditório e da ampla defesa compromete a validade do processo administrativo e das sanções dele decorrentes. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, LV; Decreto Federal nº 2.181/1997, art. 42; Decreto Estadual nº 3.571/2004, art. 37, §3º. Jurisprudência relevante citada: TJMT, Ap 1002886-09.2024.8.11.0041, Rel. Des. Maria Aparecida Ribeiro, DJe 09/04/2025; TJMT, AgInst 1010416-27.2023.8.11.0000, Rel. Des. Márcio Vidal, DJe 22/01/2024; TJMT, AgInt 1023295-66.2023.8.11.0000, Rel. Des. Deosdete Crus Júnior, DJe 02/04/2025; STJ, AgInt no AREsp 1369934/MS, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, DJe 06/05/2019. R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR) Egrégia Câmara: Trata-se de apelação interposta por DISNEI ROBERTO DE ALENCAR LTDA., contra a sentença (Id. 248258652) proferida pelo Juiz de Direito Laio Portes Sthel da 1º Vara Cível de Juara/MT, em ação anulatória de multa administrativa com pedido de tutela de urgência proposta por si contra o Município de Juara, que julgou improcedentes os pedidos iniciais. Em suas razões recursais, a apelante alega que não houve notificação válida da empresa em todas as fases do processo administrativo, o que impossibilitou o exercício do contraditório e da ampla defesa. Afirma que, para que a validade da citação por edital, é necessário o esgotamento das tentativas de notificação pessoal, o que não ocorreu. Sustenta que, à época da reclamação, a pessoa jurídica já havia alterado seu objeto social e, portanto, o apelante não possui qualquer vínculo com a empresa e os fatos que ensejaram a multa no valor de R$ 6.000,00 (seis mil reais), relativa ao processo administrativo n. 136/2017. Da mesma forma, assevera que o processo administrativo n. 55/2017 é nulo, porquanto ocorreram as mesmas falhas de notificação do processo administrativo n. 136/2017, sendo a aplicação da multa de R$ 8.810,55 (oito mil, oitocentos e dez reais e cinquenta e cinco centavos), aplicada sem sua ciência ou oportunidade de defesa prévia. Aduz que as vendas contestadas foram realizadas por terceiros, fazendo uso indevido do CNPJ da empresa, além de que os valores pagos pelos consumidores jamais foram recebidos por ela. Requer o provimento do recurso para reformar a sentença, julgando procedentes os pedidos iniciais e declarando a nulidade das multas administrativas relativas aos processos n. 055/2017 e 136/2017, invertendo o ônus da sucumbência. Nas contrarrazões (Id. 248258658), o Município de Juara afirma que em ambos os processos administrativos as tentativas de citação foram encaminhadas ao endereço da empresa constante na certidão emitida pela Receita Federal em 20/03/2017 e 09/05/2017, o mesmo endereço constante no Portal de dados da ACEAJU/JUARA e também informado pelo apelante em sua inicial. Afiança que, “as informações trazidas no feito deixam evidente que as diligências empreendidas pelo apelado culminaram na localização do endereço correto do recorrente, não sendo possível a entrega da correspondência via AR ou sua notificação de forma pessoal e esgotados todos os meios legais para sua notificação/citação, restando apenas a citação por edital”. Aduz que o Decreto Estadual não estabelece que a afixação do Edital deva ocorrer necessariamente na cidade onde a empresa possui sede, “apenas determina que ocorra em uma das dependências do PROCON/MT”, como de fato ocorreu. Assegura que o ente municipal possui legitimidade para a aplicação das sanções administrativas com base no Código de Defesa do Consumidor, sendo as multas fixadas dentro dos parâmetros legais e com observância à proporcionalidade e razoabilidade, além disso, não cabe ao Poder Judiciário reavaliar o mérito do ato administrativo, desde que respeitados os direitos fundamentais do administrado. Requer o desprovimento do recurso e manutenção da sentença. A Procuradoria-Geral de Justiça deixa de manifestar por ausência de interesse público no feito (Id. 250636696). É o relatório. Inclua-se em pauta para julgamento. V O T O R E L A T O R EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR) Colenda Câmara: Conforme relatado, cuida-se de recurso de apelação interposto por DISNEI ROBERTO DE ALENCAR LTDA. contra a sentença que julgou improcedente o pedido de anulação das multas administrativas no valor de R$ 6.000,00 (seis mil reais) e R$ 8.810,55 (oito mil, oitocentos e dez reais e cinquenta e cinco centavos), impostas no bojo dos Processos Administrativos n. 136/2017 e 055/2017 pelo PROCON MUNICIPAL de Juara/MT. Em síntese, a apelante sustenta a nulidade absoluta dos referidos procedimentos por ausência de citação válida, argumentando que não houve esgotamento das tentativas de notificação pessoal antes da citação por edital. Alega, ainda, ausência de responsabilidade pelos fatos que ensejaram as autuações. Pleiteia a anulação das multas e a exclusão de seu nome de cadastros restritivos e da dívida ativa. Eis o teor da sentença objurgada, no que pertine: “[...] Pois bem, em análise ao processo administrativo nº. 055/2017, verifica-se que trata-se de reclamação feita ao PROCON por Aldaira Maria de Assunção, no sentido de que adquiriu um purificador de água – modelo classic em metal polietileno de cor branca – no valor de R$ 1.561,90 (um mil quinhentos e sessenta e um reais e noventa centavos) do vendedor Sr. Marcos, em 17 parcelas, sendo que pagou somente duas parcelas pois não teve condições de quitar as restantes, relata ainda que buscou a empresa requerente diversas vezes para cancelar as parcelas por não ter condições financeiras para pagar, mas nunca conseguiu o cancelamento e, por isso foi teve seu nome inscrito nos órgãos de proteção ao crédito. 3.3. Recebida a reclamação, o órgão protetor designou audiência para a data de 19 de abril 2017. 3.4. Verifica-se das fls. 19/20 do ID. 140554768 que o AR de citação da autora no processo administrativo retornou sem que houvesse sua citação. 3.5. Posteriormente, em razão da não citação pessoal, fora publicado edital de notificação nº. 011/2017, nos termos do artigo 42, do Decreto Federal nº. 2.181/97 e artigo 37, §3º, do Decreto Estadual nº. 3.571/04 (ID. 140554768, fls. 22/25). 3.6. Em razão da não manifestação do autor no processo administrativo, proferiu-se decisão administrativa aplicando multa no valor de R$ 6.000,00 (seis mil reais) (ID. 140554768, fls. 26/33). 3.7. A decisão administrativa foi enviada ao autor no processo administrativo por AR (ID. 140554768, fls. 36/40), todavia, retornou sem que fosse recebido. Posteriormente, enviou-se por meio do e-mail (ID. 140554768, fl.41). 3.2. De outro vértice, em análise ao processo administrativo nº. 136/2017, verificase que trata-se de reclamação feita ao PROCON por Honorita Julia de Souza, no sentido de que adquiriu um purificador de água no valor de R$ 3.145,68 (três mil cento e quarenta e cinco reais e sessenta e oito centavos) parcelado em 18 vezes, todavia, após a compra a filha da reclamante foi até a delegacia para registrar um B.O., devido sua mãe ser idosa e não saber ler e escrever, de modo que acabou assinado algo sem conhecimento, pois segundo ela pagaria somente R$ 500,00 (quinhentos reais) pelo produto. Discorre que devolveu o purificador de água a autora, todavia, a dívida continuou a ser cobrada e seu nome inscrito no cadastro de inadimplentes. 3.3. Recebida a reclamação, o órgão protetor designou audiência para a data de 13 de junho de 2017. 3.4. Verifica-se das fls. 18/20 do ID. 140554769 que o AR de citação da autora no processo administrativo retornou sem que houvesse sua citação 3.5. Posteriormente, em razão da não citação pessoal, fora publicado edital de notificação nº. 016/2017, nos termos do artigo 42, do Decreto Federal nº. 2.181/97 e artigo 37, §3º, do Decreto Estadual nº. 3.571/04 (ID. 140554769, fls. 21/25). 3.6. Em razão da não manifestação do autor no processo administrativo, proferiu-se decisão administrativa aplicando multa no valor de R$ 6.000,00 (seis mil reais) (ID. 140554769, fls. 26/33). 3.7. A decisão administrativa foi enviada ao autor no processo administrativo por AR (ID 140554769, fls. 36/39), todavia, retornou sem que fosse recebido. 3.8. Verifica-se que o processo administrativo ora discutido foi regido pelo Decreto Estadual nº. 3.571/04, o que dispõe em seu artigo 37, §3º, o seguinte: Art. 37. A autoridade competente expedirá notificação ao fornecedor, fixando o prazo de 10 (dez) dias, a contar da data de seu recebimento, para apresentar, na forma do artigo 44 do Decreto Federal nº 2.181/97, sua impugnação. (...) § 3º Quando o fornecedor, seu mandatário ou preposto não puder ser notificado, pessoalmente ou por via postal, será feita a notificação por edital a ser afixado nas dependências do PROCON/MT, em lugar público, pelo prazo de 10 (dez) dias, ou divulgado, pelo menos uma vez, na imprensa oficial ou em jornal de circulação local. 3.9. Outrossim, é possível verificar por meio das notificações com Aviso de Recebimento juntadas nos processos administrativos (ID. 140554768, fls. 19/20; fls. 37/38 e ID. 140554769, fls. 18/19; fls. 37/38) que as intimações/citações foram expedidas ao endereço indicado no Cartão CNPJ da empresa autora (ID. 140554768, fls. 4/5 e ID. 140554769, fl. 11), bem como é o mesmo endereço indicado pela autora quando do protocolo da presente ação (IDS. 140554752 e 140554764), contudo, restaram infrutíferas. Posterior a isto é que foi realizada a citação por edital. 3.10. De mais a mais, diante do que dispõe o artigo 37, §3º, do Decreto Estadual nº. 3.571/04, somado com o conteúdo dos processos administrativos resta evidente que foram empreendidas diligências pelo município para localização da ora autora, todavia, restou infrutífero, não estando, portanto, o processo eivado de nulidade em razão da citação/notificação por edital. 3.11. Nesse sentido, conforme dito, a citação por edital tem previsão no artigo já mencionado e explica que não sendo possível a entrega da notificação via postal ou presencial é admitida que a notificação ocorra por meio do edital, a ser fixado nas dependências do PROCON/MT. 3.12. Vale ressaltar que o Decreto Estadual não prevê o requisito de que a fixação do edital seja na cidade onde a empresa possui a sede, apenas determina que ocorra em uma das dependências do PROCON/MT, sendo que tal providência ocorreu, conforme pode ser verificado ao ID. 140554768, fls. 23/25 e ID. 140554769, fls. 23/25), desta forma, também não há que se falar em nulidade da publicação do edital por não ter sido fixado no local da sede da empresa conforme alegado pela autora. 3.13. Desse modo, nota-se que o PROCON/MT agiu dentro das normalidades previstas no do Decreto Estadual nº. 3.571/04 e Decreto Federal nº. 2.181/97, não havendo o que se falar em nulidade dos processos administrativos e multa. 3.14. Assim, o controle judicial dos atos administrativos está limitado ao exame da legalidade. [...] 3.16. Por isso, não deve ser reconhecido a nulidade do ato administrativo, eis que, pela simples observância dos processos administrativos, é possível notar que o contraditório e a ampla defesa foram respeitados. 3.17. Assim, reputa-se que os processos administrativos oriundos das reclamações dos consumidores não devem ser anulados, sejam em seus aspectos procedimentais ou em decorrência da observância da norma que alicerçou as multas impostas pelo PROCON. 4. DISPOSITIVO 4.1. Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTE os pedidos iniciais e, com isso, EXTINGUE-SE O PROCESSO, COM RESOLUÇÃO DO MÉRITO, nos termos do artigo 487, inciso I, do CPC. 4.2. Condeno a parte autora ao pagamento das custas e despesas processuais, bem como honorários advocatícios em favor do requerido, os quais fixo em 10% sobre o valor atualizado da causa, nos termos do artigo 85, §2º, do CPC. [...]” (Id. 248258653). Inicialmente, observa-se que os processos administrativos questionados decorrem de reclamações de consumidores formalizadas perante o PROCON Municipal de Juara, culminando na aplicação de penalidades pecuniárias por infrações às normas de defesa do consumidor. As sanções foram lançadas contra a então empresa individual "DISNEI ROBERTO ALENCAR – ME", posteriormente transformada em "DISNEI ROBERTO DE ALENCAR LTDA", conforme alterações contratuais anexadas pela parte apelante (Id. 248257673). A controvérsia principal gira em torno da suposta ausência de citação/notificação válida da empresa nos dois procedimentos administrativos n. 136/2017 e 055/2017, o que, segundo a apelante, violaria os princípios do contraditório e da ampla defesa (CF, art. 5º, inc. LV). É sabido que o procedimento administrativo destinado à apuração de infrações às normas consumeristas é disciplinado pelo Decreto Federal n. 2.181/1997. À época dos fatos, a redação do artigo 42 assim dispunha: “Art. 42. A autoridade competente expedirá notificação ao infrator, fixando o prazo de dez dias, a contar da data de seu recebimento, para apresentar defesa, na forma do art. 44 deste Decreto. § 1º - A notificação, acompanhada de cópia da inicial do processo administrativo a que se refere o art. 40, far-se-á: I - pessoalmente ao infrator, seu mandatário ou preposto; II - por carta registrada ao infrator, seu mandatário ou preposto, com Aviso de Recebimento (AR). § 2º - Quando o infrator, seu mandatário ou preposto não puder ser notificado, pessoalmente ou por via postal, será feita a notificação por edital, a ser afixado nas dependências do órgão respectivo, em lugar público, pelo prazo de dez dias, ou divulgado, pelo menos uma vez, na imprensa oficial ou em jornal de circulação local.” Tal normativa explicita que a citação por edital é medida subsidiária, somente cabível após a comprovação da inviabilidade de notificação pessoal ou postal. No caso concreto, como se verá, tal requisito não foi atendido, comprometendo a validade de todo o procedimento sancionatório. Do exame dos autos, verifica-se que, no Processo Administrativo n. 055/2017 (Id. 248257677), houve uma única tentativa de notificação via AR para ciência da reclamação e comparecimento à audiência de conciliação, e o retorno da correspondência se deu com a informação "não procurado" (Id. 248257677, fls. 20). Em seguida, procedeu-se à citação por edital (fls. 24). Certificado o decurso do prazo, prolatou-se a decisão administrativa e imposição da multa (fls. 26/33), sendo as únicas tentativas de notificação para ciência do apelante acerca da decisão administrativa, imposição de multa, e envio à dívida ativa e inclusão no ACEAJU/JUARA-SPC, igualmente infrutíferas, com o mesmo motivo de devolução: “não procurado” (fls. 38, 46 e 49). De modo idêntico, no Processo Administrativo n. 136/2017 (Id. 248257678), após a devolução da primeira tentativa de notificação com a mesma anotação de “não procurado” (fl. 19), o órgão municipal optou pela intimação por edital (fl. 23), e proferiu decisão administrativa com imposição de multa (fls. 33). As notificações subsequentes acerca da inscrição da multa em dívida ativa e ACEAJU/JUARA também retornaram com a mesma anotação (fls. 38). Contudo, vê-se que em ambos os autos administrativos, constava o e-mail e telefone da empresa apelante (Id. 248257678 - fl. 44), não havendo qualquer demonstração de que o órgão administrativo tenha utilizado tais meios de contato ou diligenciado por outros instrumentos para localização efetiva do autuado, como previsto no art. 42 do Decreto Federal n. 2.181/1997, vigente à época. Ademais, cumpre observar que, embora a sentença tenha afirmado a existência de tentativa de localização do autuado por e-mail, não se constata nos autos qualquer comprovação de envio efetivo de mensagem eletrônica ao endereço informado. Há tão somente uma pesquisa administrativa que identifica o endereço, o e-mail e o telefone da empresa autora (Id. 248257678 – fls. 41), mas sem qualquer demonstração de tentativa concreta de contato por esses meios, tampouco nova tentativa de notificação postal. Essa ausência de diligência reforça a inobservância das exigências legais para o uso da citação por edital, tornando o procedimento viciado desde a origem. A jurisprudência deste Sodalício já decidiu no sentido de que a intimação editalícia apenas se legitima quando demonstrado o esgotamento de todos os meios ordinários de localização do destinatário, inclusive por canais alternativos de contato, reconhecendo a nulidade da citação por edital com base em devolução de AR com a simples anotação "não procurado", sem nova tentativa de diligência: “DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO. NULIDADE DE CITAÇÃO POR EDITAL EM PROCESSO ADMINISTRATIVO. AUSÊNCIA DE ESGOTAMENTO DOS MEIOS DE LOCALIZAÇÃO DO DESTINATÁRIO. CERCEAMENTO DE DEFESA. INVALIDADE DA CDA E DO PROTESTO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS FIXADOS NOS TERMOS DA LEI. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Agravo interno interposto pelo Estado de Mato Grosso contra decisão monocrática que negou provimento ao recurso de apelação, mantendo a sentença que reconheceu a nulidade da citação por edital no Processo Administrativo nº 558473/2021 e, por consequência, a invalidade da Certidão de Dívida Ativa nº 2023850150 e do respectivo protesto. O agravante sustenta a regularidade da citação por edital e requer a redução dos honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (i) definir se a citação por edital realizada no Processo Administrativo nº 558473/2021 é válida, considerando a existência de erro no endereço utilizado para a citação postal; (ii) estabelecer se os honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa devem ser reduzidos com base no critério da equidade. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A citação por edital constitui medida excepcional, sendo válida apenas quando esgotadas todas as tentativas de localização do destinatário por meios idôneos, conforme disposto no art. 4º, §9º, do Decreto nº 1.986/2013 e no art. 121 da LC nº 38/95, com redação dada pela LC nº 232/2005. 4. No caso concreto, a tentativa de citação postal foi realizada em endereço incorreto (“Rua Afonso Bonilha, nº 247”, ao invés do correto, “nº 248”), constando este último nos registros da própria Administração, o que evidencia erro essencial que compromete a validade da citação editalícia. 5. O dever do administrado de manter seus dados atualizados não exime a Administração Pública da obrigação de diligenciar adequadamente antes de recorrer à citação por edital, que constitui o meio mais gravoso de comunicação processual. 6. A jurisprudência do Tribunal e do Superior Tribunal de Justiça é pacífica no sentido de que a citação por edital somente é válida quando demonstrado o exaurimento de todos os meios razoáveis de localização do destinatário, o que não ocorreu nos autos. [...] Tese de julgamento: 1. A citação por edital somente é válida quando demonstrado o esgotamento de todos os meios razoáveis de localização do destinatário, sendo inválida quando houver erro essencial no endereço utilizado na tentativa de citação postal. [...]”. (TJ/MT, Terceira Câmara de Direito Público e Coletivo, apelação 1002886-09.2024.8.11.0041, relatora Desembargadora Maria Aparecida Ribeiro, Dje 09/04/2025). “PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO – RECURSO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO ANULATÓRIA – PROCESSO ADMINISTRATIVO – NOTIFICAÇÃO POR EDITAL – FRUSTRAÇÃO DE INTIMAÇÃO PESSOAL DO AUTUADO – NÃO COMPROVADA – EXISTÊNCIA DE ENDEREÇO ELETRÔNICO E NÚMERO DE TELEFONE – ATO REALIZADO EM DESCONFORMIDADE COM O PREVISTO EM LEI – REQUISITOS LEGAIS PARA A CONCESSÃO DO PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA PREENCHIDOS NA AÇÃO DE BASE – DECISAO REFORMADA – PROVIMENTO. O processo administrativo voltado à apuração da infração consumerista deve atender às exigências constitucionais do contraditório e da ampla defesa. O Decreto Federal n. 2.181/97 estabelece que a notificação da parte reclamada, em processo administrativo deflagrado no âmbito do PROCON, ocorrerá pessoalmente ou por correio, sendo a notificação por edital autorizada apenas subsidiariamente. Não demonstrado efetivo óbice à notificação pessoal ou postal da parte autuada acerca do ato administrativo que lavrou ao auto de infração e aplicou multa, a publicação de edital para esse desiderato, aparentemente, não se mostra legal”. (TJ/MT, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, agravo de instrumento n. 1010416-27.2023.8.11.0000, relator Desembargador Márcio Vidal, Dje 22/1/2024). “A controvérsia reside em definir a validade da intimação por edital realizada no âmbito do Processo Administrativo nº 485101/2017 e se esta garantiu o contraditório e a ampla defesa à autuada. III. Razões de decidir 3. Embora a legislação estadual autorize a notificação por edital em casos de destinatário em local incerto ou não sabido, tal medida deve ser adotada apenas quando esgotadas todas as tentativas de intimação pessoal ou por correspondência. 4. No caso concreto, as tentativas de notificação no endereço indicado no relatório técnico e no cadastro da Receita Federal restaram infrutíferas, sendo a notificação realizada por edital, sem demonstração suficiente de que a autuada estava em local incerto e não sabido. [...]. (TJ/MT, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, agravo interno interposto no agravo de instrumento 1023295-66.2023.8.11.0000, relator Desembargador Deosdete Crus Júnior, Dje 02/04/2025) Com efeito, a adoção da citação por edital em tais condições constitui medida precipitada e contrária às garantias constitucionais do devido processo legal, contraditório e ampla defesa, comprometendo a higidez dos processos administrativos e tornando inválidas as sanções deles decorrentes. É imprescindível, antes da realização da citação ficta, que o poder público empregue diligências efetivas para localizar o autuado. A simples devolução da correspondência postal com a anotação “não procurado” não satisfaz o requisito legal de esgotamento dos meios ordinários, sobretudo quando a empresa mantém endereço ativo e contínuo exercício de suas atividades, como se verifica nos documentos dos autos. Omissões como a não utilização de e-mail e telefone, que constam no cadastro administrativo (Id. 248257678 – fls. 44), evidenciam a ausência de esforço mínimo para alcançar a efetiva ciência do interessado. Consoante o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, “A validade da intimação por edital pressupõe o esgotamento das possibilidades de localização do devedor” (STJ, Terceira Turma, AgInt no AREsp 1369934/MS, relator ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Dje 6/5/2019). Deste modo, o uso da citação por edital deve ser medida extrema, reservada aos casos em que se constate, com precisão, que o autuado se encontra em local incerto ou inacessível. Na hipótese, o endereço é conhecido e sequer se tentou mais de uma vez a notificação pessoal, ou mesmo o contato por meios tecnológicos disponíveis, a utilização da intimação ficta se revela prematura e atentatória à regularidade procedimental. Tal conduta não pode ser chancelada pelo Poder Judiciário sob pena de legitimar processos administrativos fundados em vícios insanáveis. Ademais, a atuação do Judiciário em sede de controle de legalidade de atos administrativos limita-se à verificação da conformidade com a legislação e os princípios do devido processo, sendo-lhe vedado adentrar o mérito da conveniência e oportunidade da sanção, nos moldes do art. 2º da LINDB. No caso concreto, a invalidação dos processos administrativos não decorre de juízo de valor sobre a oportunidade ou justiça da penalidade aplicada, mas de constatação de vício insanável na formação do processo, notadamente por inobservância aos preceitos legais que regem a notificação do administrado, ferindo-lhe o direito de defesa. A propósito: “[...] A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é firme no sentido de que só é permitido ao Poder Judiciário a análise de ato administrativo quando tal ato for ilegal ou abusivo. Precedentes. [...]. (STF, Primeira Turma, ARE 682759/PR ED, relator Ministro Roberto Barroso, publicado no Diário da Justiça Eletrônico em 6 de agosto de 2015). O controle jurisdicional, portanto, incide exclusivamente sobre a legalidade do procedimento, que se mostra contrária às garantias constitucionais do devido processo legal, contraditório e ampla defesa, comprometendo a higidez dos processos administrativos e tornando inválidas as sanções deles decorrentes. Ante o exposto, DOU PROVIMENTO ao recurso de apelação para reformar sentença, julgando procedentes os pedidos iniciais, declarando a nulidade das citações por edital realizadas nos Processos Administrativos do PROCON do Município de Juara/MT n. 136/2017 e 055/2017, bem como das respectivas multas administrativas, por vício na citação do autuado, e DETERMINO, por conseguinte, a exclusão das inscrições dos cadastros restritivos de crédito e a desconstituição da inscrição em dívida ativa relativa às multas administrativas ora anuladas. Por consequência, condeno o apelado ao pagamento das custas e honorários advocatícios, que fixo em 10% sobre o valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, §§ 2º e 3º, do Código de Processo Civil. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 09/06/2025
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