Processo nº 0001103-28.2015.8.11.0101
ID: 296022727
Tribunal: TJMT
Órgão: VARA ÚNICA DE CLÁUDIA
Classe: AçãO CIVIL PúBLICA CíVEL
Nº Processo: 0001103-28.2015.8.11.0101
Data de Disponibilização:
11/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
MARIANGELY MENEGAZZO MEDEIROS
OAB/MT XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO VARA ÚNICA DE CLÁUDIA Autos nº 0001103-28.2015.8.11.0101 Ação Civil Pública Ambiental Autor: MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL Requeridos: SANTINA NEGRI DALLA LIBERA …
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO VARA ÚNICA DE CLÁUDIA Autos nº 0001103-28.2015.8.11.0101 Ação Civil Pública Ambiental Autor: MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL Requeridos: SANTINA NEGRI DALLA LIBERA e outros Vistos. SENTENÇA I – RELATÓRIO Trata-se de ação civil pública promovida pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO MATO GROSSO em face de SANTINA NEGRI DALLA LIBEIRA, DIRCEU OSVALDO RODRIGUES e SANTINA NEGRI DALLA LIBERA & CIA LTDA, alegando em síntese, que os Agentes Fiscais do IBAMA em conjunto com uma empresa especializada e uma Rede de Televisão, constataram que os Requeridos não possuíam documentos a fim de comprovar a origem lícita da madeira que venderam, qual seja, 28,9557 m³ de madeiras em toros de diversas essências conforme auto de infração n° 597492-D. Salientou que a parte Requerida possui legitimidade passiva, eis que é responsável pelo dano ambiental, objetivando garantir na tutela ambiental a reparação integral do dano causado. Em sede de antecipação de tutela, requereu a indisponibilidade dos bens da parte Requerida a fim de reparar o dano ambiental causado pela sua conduta. Ao final da demanda, requereu ainda a condenação da parte Requerida para o fim de impor: a) obrigação de fazer consistente no pagamento de R$ 8.686,71, bem como na b) obrigação de não fazer, consistente em abster-se de explorar áreas de floresta nativa e reservas florestais legais, sem a licença ambiental competente, além da condenação no dano moral difuso. Juntou documentos à inicial. A inicial foi recebida em 24.08.2015, tendo sido determinada a citação da parte Requerida e indeferido o pedido de indisponibilidade dos bens (id nº 73888117 – pág. 181/183 – 19.01.2022). Foi realizada a citação do requerido Dirceu Osvaldo Rodrigues. No entanto, parte requerida, Sra. Santina Negri Dalla Libera e a empresa Negri Dalla Libera & CIA LTDA, não foram citadas devido ao fato de estar em viagem para tratamento de saúde (id n° 73888117 – pág. 188 – 19.01.2022). O feito foi suspenso por 60 (sessenta) dias (pág. 196/197). Com vistas, ao id n° o parquet manifestou-se pelo prosseguimento da ação, reiterando os argumentos apresentados na inicial. Destacou que as ofensas ao meio ambiente devem ser recuperadas, que deve haver inversão do ônus da prova em favor da coletividade (pág. 201/206). O ministério Público apresentou novo endereço para citação da parte requerida Santina Negri Dalla Libera e da empresa, e solicitou a expedição de carta precatória com destino a Lagoa Vermelha/RS. Ademais, embora o requerido Dirceu tenha sido citado, deixou de apresentar contestação no prazo legal. Diante disso, solicitou-se que seja decretada a sua revelia (pág. 211). A parte requerida Santina Negri Dalla Libera, apresentou contestação pugnando preliminarmente a ilegitimidade passiva, indicando o novo proprietário. No mérito, requereu a improcedência dos pedidos feitos pelo Ministério Público, conforme id n° 73888119 – pág. 09/31 (19.01.2022). Juntou documentos. O Ministério Público apresentou impugnação à contestação ao id n° 96626632 – 30.09.2022. As partes apresentaram as provas que pretendiam produzir aos ids n° 131959323 (17.10.2022) e 133119318 (30.10.2023). O feito foi saneado ao id n° 169468142 (27.09.2024), sendo decretada a revelia do requerido Dirceu Osvaldo Rodrigues, postergada a análise da preliminar de ilegitimidade passiva, bem como deferido a inversão do ônus da prova apresentado pelo Ministério Público e designada audiência de instrução e julgamento. Realizada audiência de instrução e julgamento (id n° 176114014 – 21.11.2024). O Ministério Público apresentou alegações finais pugnando para que fosse decretado a revelia da empresa Santina Negri Dalla Libera & CIA LTDA, pelo não acolhimento da preliminar de ilegitimidade passiva, eis que o selo da Junta Comercial do Estado de Mato Grosso traz a data de registro somente em 17.12.2012, com protocolo de 13.12.2012, dando a entender que a efetiva saída do quadro societário da empresa teria acontecido somente após autuação da empresa em 27.06.2012, bem como que seja julgada procedente a ação (id n° 183538395 – 11.02.2025). Com vista, a parte requerida Santina Negri Dalla Libera apresentou alegações finais requerendo que seja reconhecida a ilegitimidade passiva, ou a ausência de responsabilidade por quebra de nexo causal (id n° 184889162 – 21.02.2025). É, em síntese, o Relatório. II- FUNDAMENTAÇÃO Cuida-se de ação civil pública ambiental com reparação por dano sofrido e a obrigação de não fazer pelo fato da parte requerida ter documentos que comprovassem a origem lícita das madeiras de diversas essências que venderam, sem licença válida outorgada por órgão ambiental competente. Primeiramente, embora a revelia tenha sido aplicado em decisão saneadora de id n° 169468142 (27.09.2024), deixo de atribuir seus efeitos, visto que a requerida Santina apresentou contestação, não se aplicando, assim, os efeitos da revelia, conforme artigo 345, I, do CPC “art. 345. A revelia não produz o efeito mencionado no art. 344 se: I - havendo pluralidade de réus, algum deles contestar a ação”. Nesse sentido, segue jurisprudência: “RECURSO ORDINÁRIO. PLURALIDADE DE RÉUS. EFEITOS DA REVELIA. ARTIGO 345 DO CPC. A revelia não induz à presunção de veracidade das alegações de fato formuladas pelo autor quando, havendo pluralidade de réus, algum deles contestar a ação a respeito do fato que envolve o revel. Aplicação do artigo 345 do CPC/2015. (TRT-1 - RO: 01008113720205010026 RJ, Relator: CLAUDIA MARIA SAMY PEREIRA DA SILVA, Data de Julgamento: 30/06/2021, Segunda Turma, Data de Publicação: 03/08/2021)” g. n. E “RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – ATO ADMINISTRATIVO – REVELIA – PLURALIDADE DE RÉUS – APRESENTAÇÃO DE CONTESTAÇÃO POR OUTRA PARTE REQUERIDA – EFEITOS – INCABÍVEIS – ARTIGO 345 DO CPC – RECURSO PROVIDO – SENTENÇA ANULADA. 1. A revelia não induz à presunção de veracidade das alegações de fato formuladas pelo autor quando, havendo pluralidade de réus, algum deles contestar a ação a respeito do fato que envolve o revel. Aplicação do artigo 345 do CPC. 2. Recurso provido. Sentença anulada. (TJ-MT 10000340920198110034 MT, Relator: ANTONIO VELOSO PELEJA JUNIOR, Data de Julgamento: 13/12/2022, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, Data de Publicação: 18/12/2022)” g. n. Primeiramente, embora a revelia tenha sido aplicado em decisão saneadora de id n° 152896857 (19.04.2024), deixo de atribuir seus efeitos, visto que a requerida Santina apresentou contestação, não se aplicando, assim, os efeitos da revelia, conforme artigo 345, I, do CPC “art. 345. A revelia não produz o efeito mencionado no art. 344 se: I - havendo pluralidade de réus, algum deles contestar a ação”. Nesse sentido, segue jurisprudência: “RECURSO ORDINÁRIO. PLURALIDADE DE RÉUS. EFEITOS DA REVELIA. ARTIGO 345 DO CPC. A revelia não induz à presunção de veracidade das alegações de fato formuladas pelo autor quando, havendo pluralidade de réus, algum deles contestar a ação a respeito do fato que envolve o revel. Aplicação do artigo 345 do CPC/2015. (TRT-1 - RO: 01008113720205010026 RJ, Relator: CLAUDIA MARIA SAMY PEREIRA DA SILVA, Data de Julgamento: 30/06/2021, Segunda Turma, Data de Publicação: 03/08/2021)” g. n. E “RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – ATO ADMINISTRATIVO – REVELIA – PLURALIDADE DE RÉUS – APRESENTAÇÃO DE CONTESTAÇÃO POR OUTRA PARTE REQUERIDA – EFEITOS – INCABÍVEIS – ARTIGO 345 DO CPC – RECURSO PROVIDO – SENTENÇA ANULADA. 1. A revelia não induz à presunção de veracidade das alegações de fato formuladas pelo autor quando, havendo pluralidade de réus, algum deles contestar a ação a respeito do fato que envolve o revel. Aplicação do artigo 345 do CPC. 2. Recurso provido. Sentença anulada. (TJ-MT 10000340920198110034 MT, Relator: ANTONIO VELOSO PELEJA JUNIOR, Data de Julgamento: 13/12/2022, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, Data de Publicação: 18/12/2022)” g. n. Ademais, no que tange à pessoa jurídica INDUSTRIAL MADEIREIRA NATURAL LTDA (antiga SANTINA NEGRI DALLA LIBERA & CIA LTDA), igualmente não há que se falar em revelia, uma vez que, consoante certidão do oficial de justiça, não foi possível a sua citação no primeiro mandado, tendo a parte sido posteriormente citada por carta precatória, em data posterior à apresentação da contestação por Santina. Não se verifica, pois, inércia processual apta a justificar a aplicação do artigo 344 do CPC. De mais a mais, a contestação apresentada por Santina — sócia da empresa — também alcança, ao menos em parte, os interesses da pessoa jurídica, notadamente porque sua defesa foi formulada por procuradora habilitada que atua em nome de ambos os réus. Portanto, não havendo ausência injustificada de resposta à demanda por parte dos réus e, sobretudo, existindo defesa técnica apresentada nos autos, afasto os efeitos materiais da revelia, mantendo o regular prosseguimento do feito. No que concerne à preliminar de ilegitimidade passiva suscitada pela requerida Santina Negri Dalla Libera, entendo que não merece ser acolhida. Conforme os documentos anexados aos autos, a sua saída ocorreu após a autuação da empresa em 27.06.2012, comprovando assim, que era sócia da empresa na época dos fatos. Ademais, a parte não apresentou provas suficientes para corroborar as alegações feitas. Perante os órgãos oficiais, a requerida saiu da empresa na data indicada, ou seja, 27.06.2012, embora o contrato apresentado tenha uma data 17.05.2012, o registro do contrato na junta comercial está datado de 17.12.2012, com seu reconhecimento em 13.12.2012. Diante disso, rejeito a preliminar arguida e passo a análise do mérito. A controvérsia cinge-se exatamente em verificar a ocorrência de danos ambientais consistentes no fato da empresa ter vendido madeiras de diversas essências sem documentação que comprovasse a sua origem lícita e sem licença válida outorgada por órgão ambiental competente. Extrai-se dos autos que os agentes ambientais autuaram a empresa requerida no dia 27.06.2012 por ter vendido 28,9557 m³ de madeiras em toros de espécies nativas sem cobertura de guias florestais e outros documentos outorgados pela autoridade competente que comprovem a sua origem legal no SISFLORA (SIMP 000236-053/2015 - RELATÓRIO DE FISCALIZAÇÃO NOT 504723B e Autos de Infração nº 597487-D, 597488-D, 597490-D, 597492-D e 597493-D). Durante a audiência de instrução e julgamento foram feitas as seguintes provas: A testemunha de defesa João Batista Borelli, afirmou não se recordar da época, mas que foi transferido bem antes dos fatos, mencionando que havia certa morosidade nos processos nas Juntas Comerciais de Cuiabá e Sinop. Narrou não se recordar da data exata, pois os acontecimentos são antigos. Informou que Santina não praticava mais atos relacionados à empresa, e que, inclusive, Dirceu já possuía procuração, sendo ela (Santina) alheia à prática desses atos àquela altura. A conduta de vender ou manter em deposito madeiras incompatíveis com dados constantes no sistema SISFLORA acarreta a responsabilidade por dano ambiental, já que há participação na cadeia de atividades relativas a degradação ambiental. Os danos ambientais decorrentes dos desmatamentos ilegais cabem também contra aqueles que estimulam a cadeia produtiva, fomentando o comércio ilegal de madeira, o que implica em afirmar que vender ilegalmente as madeiras oriundas de tal prática também merece ser responsabilizado civilmente, o que configurou o caso. Acerca da proteção ao meio ambiente, a Constituição Federal, em seu artigo 225, §3° disciplina: “Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. § 3º As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.” Nesse sentido, é inquestionável a existência de nexo de causalidade entre a venda e o desflorestamento ilegal, conforme dispõe o artigo 46 da Lei n° 9.605/98, vejamos: “Art. 46. Receber ou adquirir, para fins comerciais ou industriais, madeira, lenha, carvão e outros produtos de origem vegetal, sem exigir a exibição de licença do vendedor, outorgada pela autoridade competente, e sem munir-se da via que deverá acompanhar o produto até final beneficiamento: Pena - detenção, de seis meses a um ano, e multa. Parágrafo único. Incorre nas mesmas penas quem vende, expõe à venda, tem em depósito, transporta ou guarda madeira, lenha, carvão e outros produtos de origem vegetal, sem licença válida para todo o tempo da viagem ou do armazenamento, outorgada pela autoridade competente.” Portanto, quem vende madeira oriunda de desmate ilegal, contribui efetivamente para que ele ocorra, havendo nexo causal entre a conduta dos requeridos e o desmate. Nesse seguimento, a falta de regularização da madeira da empresa requerida leva a presunção da extração ilegal, caso contrário não haveria necessidade de manter o material nessa condição. A exigência de licença/cadastro no SISFLORA é a forma encontrada pelo Poder Público para fiscalizar de maneira ordenada as ações dos particulares, sendo o meio para verificar se a extração da madeira foi feita nos ditames da lei. Nesse sentido, segue jurisprudência: “(...) 1. A responsabilidade civil ambiental é objetiva e solidária. 2. "Para o fim de apuração do nexo de causalidade no dano ambiental, equiparam-se quem faz, quem não faz quando deveria fazer, quem deixa fazer, quem não se importa que façam, quem financia para que façam, e quem se beneficia quando outros fazem." (cf. REsp 650.728/SC, Rel. Ministro Antonio Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 02/12/2009); 3. Incontroverso que a destruição da floresta nativa, que deu origem as multas por dano ambiental, ocorreu durante a vigência do contrato de arrendamento rural (2004-2009), ou seja, quando a arrendatária tinha posse do imóvel. 4. A arrendatária deve responder pela falta do dever de cuidado com a área arrendada e o consequente dano ambiental causado. Não tendo a arrendatária alegado ou provado qualquer causa excludente de responsabilidade, deve responder pelos danos ambientais causados na propriedade. 5. Com a reforma da sentença e parcial procedência dos pedidos da autora, os ônus sucumbenciais devem ser redistribuídos e arbitrados de acordo com as regras do CPC/2015, conforme requer o recurso de apelação 01, e redistribuídos. I - RELATÓRIO (TJPR - 11ª C.Cível - 0024229-88.2009.8.16.0001 - Curitiba - Rel.: Desembargador Sigurd Roberto Bengtsson - J. 29.08.2019) (TJ-PR - APL: 00242298820098160001 PR 0024229-88.2009.8.16.0001 (Acórdão), Relator: Desembargador Sigurd Roberto Bengtsson, Data de Julgamento: 29/08/2019, 11ª Câmara Cível, Data de Publicação: 02/09/2019) Cíveis / 12ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 19/03/2021)” (grifei) Do mesmo modo, como é cedido em matéria ambiental cabe ao requerido demonstrar que não concorreu para o ilícito ambiental, o que não ocorreu na hipótese sob análise, tendo em vista que a parte requerida proferiu somente argumentos meramente declaratórios, não trazendo provas desconstituídas no que concerne aos documentos comprobatórios juntados pelo parquet, que, frisa-se, possuem presunção de legitimidade e veracidade, diante da fé pública existente dos atos lavrados. No caso, a parte requerida é empresa que atua no ramo de exploração de madeiras, o que demonstra que possui vasto conhecimento sobre a necessidade de autorização do órgão ambiental para a manutenção e venda de madeira, devendo, portanto ser responsável pelos danos causados ao meio ambiente. No tocante a obrigação de não fazer, consistente em abster-se de produzir danos ambientais sem aprovação do órgão ambiental competente, tenho que merece guarida. Com efeito, o artigo 225 da Constituição Federal impõe ao Poder Público e à coletividade o dever de defender e preservar o meio ambiente para as presentes e futuras gerações. Ainda, o parágrafo 3° do citado artigo 225 da nossa Lei Maior dita que “as condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados”. De acordo com Édis Milaré, “[o] dano ambiental mede-se por sua extensão, impondo a reparação integral a teor do que estabelecem os arts. 14, § 1°, da Lei n° 6.938/1981 e 225, § 3°, da CF, os quais não fazem qualquer referência a uma indenização tarifária. A teoria da reparação integral do dano ambiental, adotada no Brasil significa que a lesão causada ao meio ambiente há de ser recuperada em sua integridade e qualquer norma jurídica que disponha em sentido contrário ou que pretenda limitar o montante indenizatório a um teto máximo será inconstitucional; (...)” (in Direito do Ambiente, Revista dos Tribunais, 8ª edição, p. 426). A responsabilidade daquele que infringe as normas ambientais, portanto, é objetiva, impondo-se a reparação integral. Ainda, nos termos do artigo 2º, parágrafo 2º, do novo Código Florestal, “[a]s obrigações previstas nesta Lei têm natureza real e são transmitidas ao sucessor, de qualquer natureza, no caso de transferência de domínio ou posse do imóvel rural”. Desta feita, extrai-se que as obrigações derivadas da legislação ambiental são intrínsecas à coisa, ou seja, possuem natureza propter rem, transmitindo-se ao sucessor e, inclusive, àquele que frui do imóvel. Conforme fundamentado acima os requeridos possuem responsabilidade ambiental pelos danos causados ao meio ambiente, mesmo que indiretamente e independentemente da área em que a madeira foi extraída, contribuiu para o fomento da extração ilegal ao vender quantidades de madeiras “torras” sem a autorização do órgão ambiental. Por esta razão, é seu dever abster-se de explorar, de qualquer forma, áreas de floresta nativa e reservas florestais legais sem autorização do órgão ambiental competente. Embora o parquet não tenha indicado qual imóvel os requeridos devem se abster de explorar, tal medida deve ser aplicada a todos os imóveis, pois os requeridos devem contribuir para que a cadeia que gira desde a plantação de arvores, extração de madeiras até colocação para a venda desses produtos deve ser integralmente ilícita. Portanto, a obrigação das requeridas se baseia na cautelar de adquirir, vender e manter em deposito madeiras, evitando àquelas oriundas de desmate ilegal, para então não contribuir com o dano ambiental. No que pertine a obrigação de fazer, consiste no pagamento de R$ 8.686,71 (oito mil, seiscentos e oitenta e seis reais e setenta e um centavos) para compensação pelos danos ambientais causados, entendo ser cabível. Explico. A responsabilidade civil contra o degradador ambiental tem como objetivo a reparação integral dos danos, em consonância do princípio da máxima reparação do dano ambiental, amplamente aceito atualmente em nível doutrinário e jurisprudencial. Assim, o ressarcimento ambiental com aptidão a recompor o prejuízo deve atender não só a condição de fazer com que o meio ambiente degenerado seja restaurado in natura, isto é, que as coisas retornem ao "status quo ante", mas também que o estrago seja indenizado pelo seu equivalente em pecúnia, quando o dano puder ser assim estimado. Isso porque, de regra, o dano ambiental provoca uma ruptura no equilíbrio ecológico como um todo, desencadeando uma série de efeitos, que não se limitam apenas à área de vegetação nativa impactada, havendo também prejuízo ao solo, à atmosfera, à fauna que habita aquele ecossistema, às águas etc. In casu, o cálculo apresentado pelo Ministério Público utilizou-se o método do valor de uso direto da madeira extraída sem autorização do órgão ambiental competente, aplicando a importância de R$ 300,00 (trezentos reais) por metro cúbico. Verifica-se que o valor da multa aplicada pelo Parquet foi R$ 8.686,71 (oito mil, seiscentos e oitenta e seis reais e setenta e um centavos). Em que pese a parte requerida não ter feito prova das suas alegações, entendo que reduzir o valor mencionado pelo parquet, a meu sentir, seria desproporcional, levando-se em conta o fato de não ser possível mensurar o real dado causado na área degradada, pois desconhecida a origem das madeiras irregulares. Diante do exposto, considerando a gravidade da conduta e a necessidade de desestimular práticas lesivas ao meio ambiente, entendo por razoável e proporcional manter o valor de R$ 8.686,71 (oito mil, seiscentos e oitenta e seis reais e setenta e um centavos), conforme arbitrado pelo Ministério Público, a título de indenização pelos danos ambientais causados. No tocante ao dano moral difuso, tendo por base geral a responsabilidade civil, prevista no artigo 927 do Código Civil e aliado o caso concreto ao Princípio da Precaução em matéria ambiental, consubstanciado no pressuposto de que compete a quem supostamente promoveu o dano ambiental comprovar que não o causou ou que a substância lançada ao meio ambiente não lhe é potencialmente lesiva (REsp 1.060.753/SP), tenho que restou configurada tal responsabilidade pela parte Requerida, posto que compete ao infrator comprovar que sua atividade não era potencialmente lesiva. Ainda que se admitisse que à parte Requerida competia a produção de prova negativa, ausente essa prova, o benefício da dúvida deve prevalecer em favor do meio ambiente (in dúbio pro ambiente). Isso porque considerando o decurso temporal, não há mais como se realizar prova pericial a fim de avaliar os danos sofridos pelo meio ambiente. O fundamento para existência do dano moral coletivo é a lesão a um conjunto de pessoas reunidas por valores que são atingidos pelo ato do poluidor. Esta lesão deve atingir sentimentos, ideias, emoções de uma coletividade, cujo dano daí decorrente também merece reparação. Afinal, não é apenas a dimensão econômica do ato lesivo que deve ser prestigiada, mas também a qualidade de vida, o sossego, o senso estético, os valores culturais, históricos e paisagísticos. Estes elementos, ainda que não quantificáveis economicamente, não podem ser violados impunemente, devendo o poluidor responder por eles. No caso vertente, tenho que restou comprovado o dano moral ambiental em razão dos requeridos terem vendido 28,9557 m³ de madeiras em toros de espécies nativas, sem a devida licença expedida por órgão ambiental competente, conforme apurado em vistorias técnicas realizadas pelo IBAMA e formalizado no Auto de Infração nº 597492-D. Trata-se de conduta que contribui diretamente para o fomento da exploração ilegal de recursos florestais, integrando-se à cadeia de degradação ambiental e comprometendo o controle e a rastreabilidade da origem dos produtos madeireiros. A produção de prova pericial mostra-se desnecessária, diante da natureza objetiva da responsabilidade ambiental e da documentação técnica já constante nos autos, sendo suficiente para evidenciar o impacto social e ambiental da prática ilícita. Tal conduta, além de configurar violação às normas ambientais, atinge o direito fundamental das presentes e futuras gerações ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, nos termos do artigo 225 da Constituição Federal. Nesse sentido, informa a jurisprudência, in verbis: "(...) A prova da existência de atividade nociva ao meio ambiente também pode acarretar indenização por dano moral coletivo e difuso (art. 1º, IV, da Lein. 7.347/85), já que o meio ambiente ecologicamente equilibrado é direito de todos, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida (art. 225, caput, CF), o que quer dizer que o direito à integridade do meio ambiente constitui prerrogativa jurídica de titularidade coletiva.(...) (TRF 1ª Região; AC 200137000060576/MA; SEXTA TURMA; Relator(a) DESEMBARGADORA FEDERAL MARIA ISABEL GALLOTTI RODRIGUES; DJ DATA: 15/10/2007 PAGINA: 78)” (grifei). “APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA – DIREITO AMBIENTAL – PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA – REJEITADA – MÉRITO - DESMATAMENTO ILEGAL – ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE (APP) - PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL – DANO AMBIENTAL CONFIGURADO – DANO MORAL COLETIVO – POSSIBILIDADE - RECURSO DESPROVIDO. Em vista da natureza propter rem das obrigações relativas à reparação de danos ambientais, o proprietário do imóvel deve figurar no polo passivo do processo, ainda que o dano tenha sido provocado pelo anterior. A responsabilidade civil por danos praticados contra o meio ambiente é objetiva, ou seja, o autor do dano ambiental está obrigado a repará-lo independente de culpa, sendo dispensado do pagamento apenas se provar que o prejuízo ocorreu por caso fortuito ou força maior, bem como por culpa exclusiva dos prejudicados, o que não ocorreu. O dano moral coletivo, compreendido como o resultado de uma lesão à esfera extrapatrimonial de determinada comunidade, se dá quando a conduta agride, de modo totalmente injusto e intolerável, o ordenamento jurídico e os valores éticos fundamentais da sociedade em si considerada, a provocar repulsa e indignação na consciência coletiva (arts . 1º da Lei nº 7.347/1985, 6º, VI, do CDC e 944 do CC, bem como Enunciado nº 456 da V Jornada de Direito Civil)”. (REsp n. 1726270/BA, Rel . Ministra Nancy Andrighi, Rel. p/ Acórdão Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 27/11/2018, DJe 07/02/2019). Sendo as provas dos autos suficientes para se reconhecer a responsabilidade do apelante pelo dano ambiental, decorrente do desmatamento sem autorização legal, correta a sentença que o condenou à reparação, dentre outras medidas de proteção ao meio ambiente. (TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 0001054-72 .2016.8.11.0029, Relator.: MARIA APARECIDA RIBEIRO, Data de Julgamento: 25/03/2024, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, Data de Publicação: 10/04/2024)” (grifei) Ainda, consigne-se ser correto afirmar que a reparação por danos morais difusos ou coletivos, originários do fluid recovery norte-americano, é cabível nas ações que versem sobre direitos indivisíveis (difusos ou coletivos), como ocorre na espécie, já que faticamente impossível, nesses casos, repartir o produto da indenização entre pessoas indetermináveis. Nessa hipótese, a reparação deve ser destinada ao fundo previsto no art. 13 da Lei n.º 7.347/85. Entretanto, não se pode perder de vista que a objetividade jurídica do dano moral coletivo (que se constitui em um alargamento da conceituação do dano moral puro) esteia-se na prática de uma injusta lesão (do ponto de vista jurídico) da qual resulte abalo ao sentido de dignidade, falta de apreço e consideração, a ser alcançado por toda a coletividade, de grandeza tal que lhe gere graves prejuízos, no seu aspecto imaterial. Sobre o tema, é a lição de Edis Milaré e a orientação jurisprudencial: “A doutrina leciona que os danos ambientais coletivos ‘dizem respeito aos sinistros causados ao meio ambiente lato sensu, repercutindo em interesses difusos, pois lesam diretamente uma coletividade indeterminada ou indeterminável de titulares. Os direitos decorrentes dessas agressões caracterizam-se pela inexistência de uma relação jurídica base, no aspecto subjetivo, e pela indivisibilidade (ao contrário dos danos ambientais pessoais) do bem jurídico, diante do aspecto objetivo.” (in: Direito do Ambiente. 5ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007, p. 812). “(...) 9. O dano moral coletivo/difuso é fruto da prática de conduta antijurídica, omissiva ou comissiva, que atinge bens considerados de grande relevância e estima para a sociedade, tais como os direitos do consumidor e do meio ambiente, conforme prevê o art. 1º da Lei 7.347-85 e o art. 6º da Lei 8.078-90 (CDC). (...)” (TRF4, AC 5002685-22.2010.404.7104, Quarta Turma, Relator p/ Acórdão Jorge Antonio Maurique, D.E. 21/08/2012). Quanto ao arbitramento do valor da indenização, tenho que este deve levar em consideração o atendimento do binômio: compensação à vítima e punição ao ofensor, devendo, ainda, ser consideradas as condições econômicas e sociais do agressor, bem como a gravidade da falta cometida. De outro lado, proporcionar à vítima uma compensação pelo dano sofrido, sem causar enriquecimento sem causa. Relativamente aos critérios para o arbitramento do dano moral, Rui Stoco ensina: “Para a composição do dano moral exige-se um nexo de coerência. Impõe esse nexo uma correlação entre o que se pede e aquilo que se necessita e, ainda, entre o que se necessita e o que se pode efetivamente pagar. É na fixação de valor para efeito de compensação do dano moral que a eqüidade mostra adequada pertinência e transita com maior desenvoltura. Ou seja, a causa que permite o estabelecimento de determinado quantum é a necessidade e a proporcionalidade entre o mal e aquilo que pode aplacá-lo, e o efeito será a prevenção, a repressão e o desestímulo”. (in: Tratado de Responsabilidade Civil, 6ª ed., Editora Revista dos Tribunais, p. 1707). O entendimento da doutrina pátria, quanto ao arbitramento do dano moral, expõe: “... E tal é o caso do dano moral. Não há, realmente, outro meio mais eficiente para se fixar o dano moral a não ser pelo arbitramento judicial. Cabe ao juiz, de acordo com seu prudente arbítrio, atentando para a repercussão do dano e a possibilidade econômica do ofensor, estimar uma quantia a título de reparação pelo dano moral.” (CAVALIERI FILHO, Sérgio. PROGRAMA DE RESPONSABILIDADE CIVIL. 2ª ed. São Paulo: Malheiros, 1998, p. 80.) Maria Amália de Figueiredo Pereira Alvarenga, tecendo comentários acerca do quantum da indenização do dano moral, assim argumenta: “Na reparação do dano moral, o juiz determina, por eqüidade, levando em conta as circunstâncias de cada caso, o quantum da indenização devida, que deverá corresponder à lesão e não ser equivalente, por ser impossível tal equivalência. A reparação pecuniária do dano moral é um misto de pena e satisfação compensatória. Não se pode negar sua função: penal, constituindo uma sanção imposta ao ofensor; e compensatória, sendo uma satisfação que atenue a ofensa causada, proporcionando uma vantagem ao ofendido, que poderá, com a soma de dinheiro recebida, procurar atender às satisfações materiais ou ideais que repute convenientes, diminuindo assim, em parte, seu sofrimento. (O Quantum da Indenização do Dano Moral, Revista Jurídica da Universidade de França,1999, p.123-126)” Maria Helena Diniz, ao lecionar sobre o dano moral, refere que: “Na avaliação do dano moral, o órgão judicante deverá estabelecer uma reparação equitativa, baseada na culpa do agente, na extensão do prejuízo causado e na capacidade econômica do responsável. Na reparação do dano moral, o magistrado determina, por equidade levando em conta as circunstâncias de cada caso, o quantum da indenização devida, que deverá corresponder à lesão e não ser equivalente por ser impossível tal equivalência”. (Indenização por Dano Moral. A problemática jurídica da fixação do quantum, Revista Consulex, março, 1997, p.29-32) No caso dos autos, considerando que a verba fixada a título de reparação por dano moral não deve surgir como um prêmio à sociedade, dando margem ao enriquecimento sem causa e tendo em conta as condições econômicas da parte Requerida, a natureza do litígio, a extensão do dano e a gravidade da conduta e sua perduração no tempo, já que data do ano de 2012, tenho que a indenização deve ser arbitrada na quantia relativa a R$ 20.000,00 (vinte mil reais). Trago a pertinente doutrina de Antônio Jeová Santos, na obra Dano Moral Indenizável, no sentido de que o dinheiro que a vítima do dano moral recebe não serve para apagar, nem borrar o dano causado. Ensina o referido autor que: “o mal perdura ainda que o dinheiro recebido seja suficiente para aquisição de bens materiais que podem trazer algum conforto para o ofendido. (...) O montante que serve ao ressarcimento do dano moral situa-se no plano satisfativo. A vítima receberá uma quantia com o intuito de que o emprego do dinheiro possa proporcionar alguma satisfação que mitigue, de algum modo, a dor causada pelo ato ilícito contra ela cometido. A reparação, neste caso, deverá compreender todas as conseqüências dolorosas imediatas e mediatas do ato que as causou. Sob esse prisma, assume relevo o desequilíbrio espiritual padecido.” Acerca da possibilidade de reconhecimento de dano moral ambiental, o STJ assim se posicionou: ADMINISTRATIVO. AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DESMATAMENTO EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE (MATA CILIAR). DANOS CAUSADOS AO MEIO AMBIENTE. BIOMA DO CERRADO. ARTS. 4º, VII, E 14, § 1º, DA LEI 6.938/1981, E ART. 3º DA LEI 7.347/1985. PRINCÍPIOS DO POLUIDOR-PAGADOR E DA REPARAÇÃO INTEGRAL. REDUCTIO AD PRISTINUM STATUM. FUNÇÃO DE PREVENÇÃO ESPECIAL E GERAL DA RESPONSABILIDADE CIVIL. CUMULAÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER (RESTAURAÇÃO DA ÁREA DEGRADADA) E DE PAGAR QUANTIA CERTA (INDENIZAÇÃO). POSSIBILIDADE. DANO AMBIENTAL REMANESCENTE OU REFLEXO. ART. 5º DA LEI DE INTRODUÇÃO ÀS NORMAS DO DIREITO BRASILEIRO. INTERPRETAÇÃO IN DUBIO PRO NATURA. 1. Cuidam os autos de Ação Civil Pública proposta com o fito de obter responsabilização por danos ambientais causados por desmatamento de vegetação nativa (Bioma do Cerrado) em Área de Preservação Permanente. O Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais considerou provado o dano ambiental e condenou o réu a repará-lo, porém julgou improcedente o pedido indenizatório cumulativo. 2. A legislação de amparo dos sujeitos vulneráveis e dos interesses difusos e coletivos deve ser interpretada da maneira que lhes seja mais favorável e melhor possa viabilizar, no plano da eficácia, a prestação jurisdicional e a ratio essendi da norma de fundo e processual. A hermenêutica jurídico-ambiental rege-se pelo princípio in dubio pro natura. 3. A jurisprudência do STJ está firmada no sentido de que, nas demandas ambientais, por força dos princípios do poluidor-pagador e da reparação in integrum, admite-se a condenação, simultânea e cumulativa, em obrigação de fazer, não fazer e indenizar. Assim, na interpretação do art. 3º da Lei 7.347/1985, a conjunção "ou" opera com valor aditivo, não introduz alternativa excludente. Precedentes da Primeira e Segunda Turmas do STJ. 4. A recusa de aplicação, ou aplicação truncada, pelo juiz, dos princípios do poluidor-pagador e da reparação in integrum arrisca projetar, moral e socialmente, a nociva impressão de que o ilícito ambiental compensa, daí a resposta administrativa e judicial não passar de aceitável e gerenciável "risco ou custo normal do negócio". Saem debilitados, assim, o caráter dissuasório, a força pedagógica e o objetivo profilático da responsabilidade civil ambiental (= prevenção geral e especial), verdadeiro estímulo para que outros, inspirados no exemplo de impunidade de fato, mesmo que não de direito, do degradador premiado, imitem ou repitam seu comportamento deletério. 5. Se o meio ambiente lesado for imediata e completamente restaurado ao seu estado original (reductio ad pristinum statum), não há falar, como regra, em indenização. Contudo, a possibilidade técnica e futura de restabelecimento in natura (= juízo prospectivo) nem sempre se mostra suficiente para, no terreno da responsabilidade civil, reverter ou recompor por inteiro as várias dimensões da degradação ambiental causada, mormente quanto ao chamado dano ecológico puro, caracterizado por afligir a Natureza em si mesma, como bem inapropriado ou inapropriável. Por isso, a simples restauração futura - mais ainda se a perder de vista - do recurso ou elemento natural prejudicado não exaure os deveres associados aos princípios do poluidor-pagador e da reparação in integrum. 6. A responsabilidade civil, se realmente aspira a adequadamente confrontar o caráter expansivo e difuso do dano ambiental, deve ser compreendida o mais amplamente possível, de modo que a condenação a recuperar a área prejudicada não exclua o dever de indenizar - juízos retrospectivo e prospectivo. A cumulação de obrigação de fazer, não fazer e pagar não configura bis in idem, tanto por serem distintos os fundamentos das prestações, como pelo fato de que eventual indenização não advém de lesão em si já restaurada, mas relaciona-se à degradação remanescente ou reflexa. 7. Na vasta e complexa categoria da degradação remanescente ou reflexa, incluem-se tanto a que temporalmente medeia a conduta infesta e o pleno restabelecimento ou recomposição da biota, vale dizer, a privação temporária da fruição do bem de uso comum do povo (= dano interino, intermediário, momentâneo, transitório ou de interregno), quanto o dano residual (= deterioração ambiental irreversível, que subsiste ou perdura, não obstante todos os esforços de restauração) e o dano moral coletivo. Também deve ser restituído ao patrimônio público o proveito econômico do agente com a atividade ou empreendimento degradador, a mais-valia ecológica que indevidamente auferiu (p. ex., madeira ou minério retirados ao arrepio da lei do imóvel degradado ou, ainda, o benefício com o uso ilícito da área para fim agrossilvopastoril, turístico, comercial). 8. Recurso Especial parcialmente provido para reconhecer a possibilidade, em tese, de cumulação da indenização pecuniária com as obrigações de fazer voltadas à recomposição in natura do bem lesado, devolvendo-se os autos ao Tribunal de origem para que verifique se, na hipótese, há dano indenizável e fixe eventual quantum debeatur. (REsp 1145083/MG, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 27/09/2011, DJe 04/09/2012). E também a jurisprudência do TRF1: “CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. MEIO AMBIENTE. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL . IBAMA. DEGRADAÇÃO AMBIENTAL. AMAZÔNIA PROTEGE. RESPONSABILIZAÇÃO . INDENIZAÇÃO POR DANO MATERIAL. VALOR A SER ARBITRADO EM LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA. PRECEDENTE. RESPONSABILIDADE OBJETIVA . TEORIA DO RISCO INTEGRAL. DANO MORAL FIXADO. MANTIDO. HONORÁRIOS EM AÇÃO CIVIL PÚBLICA . NÃO CABIMENTO, SALVO MÁ FÉ. PRINCÍPIO DA SIMETRIA. APELAÇÃO DA PARTE NÃO PROVIDA. SENTENÇA REFORMADA . 1. Recursos de apelação interpostos pelo IBAMA contra sentença na qual foram julgados parcialmente procedentes os pedidos da inicial, com a condenação dos réus à recomposição da área desmatada. 2. Ação civil pública fundamentada em levantamentos de fiscalização realizados no âmbito do Projeto Amazônia Protege, com uso de mapeamento por imagens de satélite e cruzamento de dados públicos, com inequívoca demonstração do dano ambiental e da área degradada . 3. A Súmula n. 629 do STJ é inequívoca ao dispor que "quanto ao dano ambiental, é admitida a condenação do réu à obrigação de fazer ou à de não fazer cumulada com a de indenizar". As obrigações de reparar os danos ambientais, que obedecem ao regime da responsabilidade civil objetiva, têm natureza propter rem, "sendo admissível cobrá-las do proprietário ou possuidor atual e/ou dos anteriores, à escolha do credor" (Súmula 623 do STJ) . 4. Em matéria de danos ambientais, para os quais os requeridos não fizeram prova de pronta recuperação ou reparação, tem-se como cabível a cumulação dos deveres de reparar e de indenizar. A fixação dos danos materiais deve dar-se na fase de liquidação de sentença. 5 . "O dano moral coletivo ambiental atinge direitos de personalidade do grupo massificado, sendo desnecessária a demonstração de que a coletividade sinta a dor, a repulsa, a indignação, tal qual fosse um indivíduo isolado" (STJ, REsp n.º 1269494/MG). 6. Não há falar-se em honorários advocatícios em Ação Civil Pública à parte autora, salvo má-fé, com base no art . 18 da Lei n. 7.347/8, e nem cabe à parte ré o recebimento pelo princípio da simetria, conforme jurisprudência deste Tribunal em consonância com o informativo 404 do STJ. 7 . Apelação do IBAMA parcialmente provida. Sentença reformada. (TRF-1 - (AC): 10047236920184014100, Relator.: DESEMBARGADORA FEDERAL ANA CAROLINA ROMAN, Data de Julgamento: 10/06/2024, DÉCIMA-SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: PJe 10/06/2024 PAG PJe 10/06/2024 PAG)” (grifei) Com relação ao pedido de condenação dos danos materiais, entendo que não são devidos, pois não restaram devidamente comprovados, consoante exigência do artigo 373, inciso I do Código de Processo Civil, não havendo nos autos provas suficientes a demonstrar sua ocorrência. III- DISPOSITIVO Ante o exposto, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido, com resolução de mérito, nos termos do artigo 487, I do Código de Processo Civil para o fim de: a) DETERMINAR a abstenção de explorar, de qualquer forma, áreas de floresta nativa e reservas florestais legais do imóvel rural, sem autorização do órgão ambiental competente, salvo com licença ambiental; b) CONDENAR a parte Requerida solidariamente ao pagamento de R$ 8.686,71 (oito mil, seiscentos e oitenta e seis reais e setenta e um centavos) em prol do Fundo Municipal do Meio Ambiente –FEMAM de União do Sul/MT, a título de reparação dos danos ambientais, no prazo de 60 (sessenta) dias, com juros de mora de 1% ao mês a contar da citação e correção monetária desde o ajuizamento da ação, pelo IPCA-E; c) CONDENAR a parte requerida solidariamente ao pagamento de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) a título de dano moral difuso, em prol do Fundo Estadual de Reparação dos Danos Ambientais, no prazo de 30 (trinta) dias, com juros de mora de 1% ao mês e correção monetária, sendo que os juros incidem a partir do evento danoso, em caso de responsabilidade extracontratual. No tocante a correção monetária, seu termo inicial será a data do efetivo prejuízo (súmula n° 43, do STJ). Custas pela parte requerida de forma pro rata. Sem condenação em honorários advocatícios, por força do artigo 128, §5º, inciso II, alínea ‘a’, da Constituição Federal. Anoto que a oposição de embargos de declaração manifestamente protelatórios (inclusive voltados à mera rediscussão do julgado) poderá dar ensejo à aplicação da multa prevista no artigo 1.026, § 2º, do Código de Processo Civil. Caso interposto recurso de apelação, dê-se vista à parte recorrida para contrarrazões, no prazo legal. Após, independentemente de juízo de admissibilidade, remetam-se os autos ao Egrégio Tribunal de Justiça de Mato Grosso, nos termos do artigo 1.010, § 3º, do Código de Processo Civil, tomando-se as providências necessárias. Ausente recurso, certifique-se o trânsito em julgado, e arquivem-se os autos. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Cláudia, datado eletronicamente. THATIANA DOS SANTOS Juíza de Direito
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