Processo nº 0042685-49.2019.8.11.0042
ID: 261646229
Tribunal: TJMT
Órgão: 4ª VARA CRIMINAL DE CUIABÁ
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Nº Processo: 0042685-49.2019.8.11.0042
Data de Disponibilização:
28/04/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
ANTONIO CEZAR DA SILVA COSTA
OAB/MT XXXXXX
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MARLON ZABLOSKI DAVOGLIO
OAB/MT XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 4ª VARA CRIMINAL DE CUIABÁ SENTENÇA Processo: 0042685-49.2019.8.11.0042. AUTOR(A): MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO REU: YURI RAMIREZ PORTO E SILVA, …
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 4ª VARA CRIMINAL DE CUIABÁ SENTENÇA Processo: 0042685-49.2019.8.11.0042. AUTOR(A): MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO REU: YURI RAMIREZ PORTO E SILVA, HALKER CRISTIAN RODRIGUES SAMPAIO TERMO DE AUDIÊNCIA Número do Processo: 0042685-49.2019.8.11.0042 Espécie: Ação Penal - Procedimento Ordinário. Parte Autora: Ministério Público do Estado de Mato Grosso. Réu(s): Yuri Ramirez Porto e Silva e Halker Cristian Rodrigues Sampaio. Data e horário: 24 de abril de 2025. PRESENTES Juiz: Marcos Faleiros da Silva Promotor de Justiça: Arnaldo Justino da Silva Réus: Yuri Ramirez Porto e Silva e Halker Cristian Rodrigues Sampaio Advogados: Marlon Zabloski Davoglio – OAB/MT 21.143 Antônio Cezar da Silva Costa – OAB/MT 19.190 Testemunhas: Wanker Ferreira Medeiros Acadêmicos: Pedro Paulo de Oliveira – 023.035.641-90 Francielli Souza Lima – CPF 023.478.041-03 OCORRÊNCIAS Aberta a audiência, constatou-se a presença das partes, conforme relação acima. A audiência foi realizada de forma híbrida, presencial e por videoconferência, através do sistema Microsoft Teams, sem objeções das partes. Durante a audiência, a defesa do réu Halker Cristian Rodrigues Sampaio apresentou certidão de óbito (id. 190825194). Diante disso, o Ministério Público requereu o reconhecimento da extinção da punibilidade do réu, com base no artigo 107, inciso I, do Código Penal. O Juiz de Direito, acolhendo o requerimento do Ministério Público, declarou extinta a punibilidade de Halker Cristian Rodrigues Sampaio, em razão do óbito, com base no artigo 107, inciso I, do Código Penal, determinando o registro da decisão escrita, a seguir: “Visto etc. O Ministério Público requereu a extinção da punibilidade do referido réu, em razão de seu óbito, fato devidamente comprovado nos autos por meio de certidão de óbito, regularmente expedida pelo cartório competente. Com efeito, nos termos do artigo 107, inciso I, do Código Penal, a morte do agente constitui causa de extinção da punibilidade. Constatada a ocorrência do falecimento e verificada a autenticidade do documento juntado, não subsiste a possibilidade de prosseguimento da ação penal em relação a Halker Cristian Rodrigues Sampaio. Assim, acolhendo o requerimento ministerial, declaro extinta a punibilidade de Halker Cristian Rodrigues Sampaio, com fundamento no artigo 107, inciso I, do Código Penal. Arquive-se.” O Ministério Público requereu a realização de procedimento de reconhecimento pessoal do réu a ser submetido pela vítima. Os advogados acompanharam o reconhecimento pessoal realizado pela vítima, sem apresentar objeções durante o ato. Encerrado o procedimento de reconhecimento pessoal, o Juiz de Direito deu início à produção de provas orais em audiência, oportunidade em que foram realizados os seguintes atos de instrução: a) oitiva do ofendido: Wagner Rogério Neves de Souza. b) inquirição das testemunhas de acusação: Wanker Ferreira Medeiros e Jasmim Neves Valles. c) inquirição da testemunha de defesa: Maria Laura Berlandi e Silva. d) Interrogatório do réu: Yuri Ramirez Porto. O Ministério Público desistiu da oitiva da testemunha Mário Centoriano Júnior, tendo o Juiz de Direito homologado a referida desistência. Na sequência, a defesa técnica formulou requerimento visando à declaração de nulidade do ato de reconhecimento pessoal realizado pela vítima no início da audiência, sustentando, em síntese, conforme se extrai da mídia audiovisual acostada, que o reconhecimento realizado não observou os parâmetros legais exigidos. Alegou, especialmente, a possibilidade de a vítima ter tido contato prévio com as demais pessoas apresentadas ao lado do réu, bem como o fato de a vítima ter avistado o réu antes da formalização do reconhecimento, o que, segundo a defesa, poderia comprometer a validade do ato. Diante das alegações defensivas, o Juiz de Direito determinou que os servidores certificassem os fatos apontados. A servidora Marilza certificou, oralmente (mídia audiovisual), que a vítima não manteve contato visual com as pessoas a serem reconhecidas antes da realização do ato. O Juiz de Direito, em ato contínuo, indagou à assessoria se havia sido colhida da vítima a descrição escrita do suspeito previamente ao reconhecimento, tendo sido informado que tal procedimento não fora realizado, mas foi gravado em mídia audiovisual. O Ministério Público manifestou-se no sentido da regularidade do ato de reconhecimento, insurgindo-se contra o pedido de declaração de nulidade e desentranhamento da prova dos autos. Justificou que a vítima reconheceu o réu de maneira segura, devendo o ato, segundo sua ótica, ser valorado em conjunto com os demais elementos informativos constantes dos autos. Após análise das manifestações e dos elementos disponíveis, o Juiz de Direito acolheu o pedido defensivo, reconhecendo a nulidade do procedimento de reconhecimento pessoal realizado em audiência, determinando que tal ato não será considerado na formação do convencimento judicial no momento da prolação da sentença, conforme fundamentação oral registrada em mídia audiovisual. Fundamentou de forma escrita em ata: “A Resolução n. 484, de 19 de dezembro de 2022, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), estabelece diretrizes para a realização do reconhecimento de pessoas em procedimentos e processos criminais e sua adequada avaliação no âmbito do Poder Judiciário. De acordo com a normativa, o reconhecimento de pessoas por vítimas ou testemunhas deve ocorrer de forma criteriosa, especialmente em relação a indivíduos desconhecidos antes da prática do fato, mediante a formação de um grupo de pessoas com características semelhantes e a adoção de procedimentos padronizados. No caso em análise, verifica-se que o ato de reconhecimento pessoal foi realizado sem a devida observância das formalidades previstas, notadamente a formação de alinhamento adequado de pessoas e a adoção de procedimentos imparciais. Diante dessas irregularidades, reconhece-se a nulidade do referido ato. Todavia, tal nulidade não compromete a produção da prova testemunhal realizada em juízo, uma vez que os depoimentos prestados pela vítima e pelas testemunhas, bem como o interrogatório do réu, foram produzidos sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, preservando-se a validade desses elementos de prova. Ressalte-se, ainda, que a defesa técnica somente se insurgiu quanto à nulidade do reconhecimento pessoal após o encerramento das oitivas e do interrogatório, o que configura a chamada nulidade de algibeira, repudiada pela jurisprudência pátria. Tal prática, em que a parte guarda a alegação de nulidade para usá-la estrategicamente em momento posterior, viola o princípio da lealdade processual e encontra óbice no art. 571, inciso I, do Código de Processo Penal, que impõe a arguição imediata das nulidades relativas, sob pena de preclusão. Dessa forma, ainda que reconhecida a nulidade do ato de reconhecimento, tal vício não contamina as demais provas regularmente colhidas, as quais serão devidamente analisadas no momento oportuno da formação do convencimento judicial.”. Na sequência, o Juiz de Direito indagou às partes sobre eventuais requerimentos na fase do artigo 402 do Código de Processo Penal. As partes nada requereram. Em seguida, foram oferecidas alegações finais orais por 20 (vinte) minutos, respectivamente, pela acusação e pela defesa, e, em seguida, o juiz proferiu a seguinte sentença: DELIBERAÇÕES Vistos etc. O Ministério Público do Estado de Mato Grosso denunciou HALKER CRISTIAN RODRIGUES SAMPAIO e YURI RAMIREZ PORTO E SILVA como incursos nas sanções do artigo 158, §§ 1º e 3º do Código Penal, porque segundo consta na denúncia: no dia 05 de setembro de 2019, em horário não informado, em uma residência no bairro Campo Velho, nesta Capital, os denunciados, juntamente com um terceiro não identificado, aderindo um à vontade do outro, mediante restrição à liberdade da vítima e grave ameaça exercida com emprego de arma de fogo, com o intuito de obterem, em proveito comum, vantagem econômica indevida, constrangeram a vítima WAGNER NEVES ROGÉRIO DE SOUZA a fazer-lhes uma transferência bancária no valor de R$30.000,00 (trinta mil reais). Apurou-se que, no dia 02/09/2019, a vítima foi contatada por uma pessoa solicitando seus serviços como advogado para defesa de um suposto cliente preso em flagrante. No dia 05/09/2019, ao atender ao chamado acreditando tratar-se de alguém da família do suposto preso, deslocou-se até o local previamente combinado, onde foi rendido, algemado e teve sua liberdade tolhida pelos denunciados, que se apresentaram como policiais civis lotados na GCCO. A restrição à liberdade da vítima era condição essencial para a obtenção da vantagem econômica, sendo essa ação parte do plano criminoso para tornar a vítima vulnerável e impossibilitada de reagir. A vítima, mesmo sob ameaça, conseguiu se libertar após horas de negociação, prometendo aos denunciados que conseguiria levantar a quantia exigida no dia seguinte. Foi instruída a contatar os autores pelo número 65 98403-9096. Como não entrou mais em contato, passou a receber diversas ameaças, como a ligação do número 65 98445-8565 em 07/09/2019, onde um indivíduo que se identificou como FELIPE mencionou o descumprimento de um “compromisso” assumido para o dia anterior. Na segunda-feira seguinte, diversas ligações partiram do número fixo 65 3319-3000, do Hotel Deville, sendo duas atendidas por sua secretária JASMIM, nas quais o interlocutor, que se apresentou como policial, ordenou que ela lembrasse a vítima do combinado. No dia 09/09/2019, a vítima dirigiu-se à Delegacia para relatar os fatos. A equipe policial, diligenciando até o Hotel Deville, descobriu que as ligações ameaçadoras estavam sendo feitas pelo hóspede HALKER CRISTIAN RODRIGUES SAMPAIO, que já havia deixado o local sem quitar a hospedagem. Enquanto colhiam informações no hotel, chegou YURI RAMIREZ PORTO E SILVA procurando por HALKER. Durante entrevista, YURI recebeu mensagem de HALKER revelando que este estava no Hotel Viva Versátil. Os investigadores se dirigiram ao local e encontraram HALKER com KAIRO RODRIGUES PEREIRA e ERLON FABIO CAMPOS JUNIOR. No quarto foram encontrados um simulacro de arma de fogo, drogas e munições. Já na residência de YURI, no Condomínio Shangri-lá, foram localizadas armas de fogo, colete balístico e aparelho de choque. Diante disso, YURI foi preso em flagrante. Inquéritos apartados foram instaurados para apuração dos crimes conexos de porte de armas, drogas e associação criminosa. A denúncia foi recebida em 18 de janeiro de 2024 (id 138776166). Citados, apresentaram resposta à acusação (id 144165164 e id 147737865). A defesa de HALKER CRISTIAN RODRIGUES SAMPAIO apresentou certidão de óbito (id 190825194), razão pela qual foi declarada extinta sua punibilidade. Durante a instrução processual foi inquirida a vítima: Wagner Rogério Neves de Souza; a testemunha: Wanker Ferreira Medeiros; Jasmim Neves Valles e a testemunha de defesa Maria Laura Berlandi e Silva. Ao final, o réu Yuri Ramirez Porto E Silva foi interrogado. Na fase do art. 402, do CPP, as partes nada requereram. Nos debates orais, o Ministério Público, em síntese, manifestou-se no sentido de que restou devidamente comprovada a materialidade e a autoria delitiva em relação ao acusado Yuri Ramires Porto e Silva, pela prática do crime de extorsão qualificada, previsto no art. 158, § 1º e § 3º, do Código Penal. Consignou-se que, durante a audiência, já havia sido declarada a extinção da punibilidade em relação a Halker Christian Rodrigues Sampaio, em razão de seu óbito, fato comprovado por certidão emitida pelo cartório competente. Em relação a Yuri Ramires, o Ministério Público destacou que a vítima, Wagner Rogério Neves de Fogo, prestou depoimento coerente e detalhado, descrevendo que foi atraída até uma residência no bairro Campo Velho, sob a falsa promessa de recebimento de honorários advocatícios. No local, Wagner foi surpreendido por Halker e Yuri, ambos armados e simulando ser policiais. Asseverou-se que a vítima foi ameaçada, agredida com coronhadas e algemada, ficando de joelhos sob vigilância constante. Apontou o réu Yuri, conforme narrado, como responsável por participar da ação delituosa colaborando com o fornecimento de arma e a algema a Halker e que o Yuri era o responsável por manter a postura de vigia armado e reforçou a coação, ainda que não tenha praticado diretamente as agressões físicas. O Ministério Público ressaltou que, apesar de a defesa ter arguido a nulidade do reconhecimento pessoal realizado em audiência, eventuais vícios não anulam o conjunto probatório. O reconhecimento deve ser valorado conforme as demais provas constantes nos autos, conforme já defendido pelo Parquet. Enfatizou-se, ainda, que a participação de Yuri foi confirmada não apenas pela palavra firme da vítima, mas também por provas materiais — como a apreensão de armas de fogo e de colete tático semelhante aos utilizados por forças policiais, encontrados com o acusado. Esses elementos corroboraram o relato da vítima, reforçando a veracidade dos fatos. Por fim, o Ministério Público pontuou que as mensagens de extorsão, enviadas após a liberação da vítima, também comprovaram a continuidade delitiva e a coesão entre os envolvidos. Diante do robusto conjunto probatório, ratificou-se o pedido de condenação do acusado Yuri Ramires Porto e Silva, pela prática do crime de extorsão qualificada pelo concurso de pessoas e pelo emprego de arma de fogo, nos termos do art. 158, §§ 1º e 3º, do Código Penal, tudo isso, conforme manifestação em mídia audiovisual. Por sua vez, em memoriais orais, em resumo, a defesa técnica de Yuri Ramires Porto e Silva, destacou que o acusado ostenta perfil pessoal favorável, sendo réu primário, possuindo bons antecedentes e sem qualquer histórico de envolvimento com organizações criminosas ou prática reiterada de delitos. Ressaltou que este é o único episódio em sua vida que ensejou uma acusação criminal, e que, desde então, o réu manteve comportamento ilibado, afastado de qualquer atividade ilícita. Aduziu que, mesmo que se admitisse alguma forma de participação de Yuri nos fatos narrados, sua atuação teria sido de natureza secundária e de menor relevância, sem protagonismo nas ações delituosas. Destacou que Halker Christian Rodrigues Sampaio, já falecido, foi o autor principal do crime de extorsão em apuração, pessoa que, inclusive, ostentava extenso histórico criminal. No que tange ao acusado, conforme relatado pela própria vítima, não houve qualquer agressão física, envio de mensagens ameaçadoras ou exigência direta de valores, limitando-se sua eventual conduta à mera presença no local, em atitude passiva. A defesa sustentou, ainda, a existência de relevantes contradições e inconsistências nos depoimentos da vítima, Hagner Rogério Neves de Fogo. Apontou que, inicialmente, a vítima descreveu genericamente as características físicas de um dos agentes, sem realizar o reconhecimento imediato de Halker, vindo a alterá-lo posteriormente após outras oitivas. Observou, também, divergências quanto ao número de pessoas envolvidas no crime, ora indicando três, ora quatro indivíduos, além de versões desencontradas acerca do modo como teria solicitado socorro após a liberação, o que comprometeria a credibilidade de sua narrativa. No tocante ao reconhecimento pessoal realizado em audiência, a defesa argumentou que o ato foi realizado de maneira inadequada, sem a devida observância dos procedimentos exigidos pela Resolução n. 484/2022 do Conselho Nacional de Justiça. Assinalou que a vítima não apresentou descrição prévia do suspeito, e que os indivíduos apresentados ao lado do réu possuíam fisionomias incompatíveis, o que poderia ter induzido o reconhecimento de maneira sugestiva, ferindo o devido processo legal e o contraditório. Ademais, salientou-se que não há provas materiais robustas que vinculem diretamente Yuri aos atos de extorsão. Nenhuma mensagem, ligação telefônica, ou outro elemento probatório técnico foi produzido que comprovasse sua participação efetiva. Destacou-se que, conforme pacífico entendimento jurisprudencial, não é suficiente a mera probabilidade ou presunção de culpa para embasar condenação penal, sendo indispensável certeza absoluta acerca da autoria e da materialidade do fato imputado. Diante desse quadro, a defesa pugnou pela absolvição do acusado, com base no princípio do in dubio pro reo, pela insuficiência de provas capazes de sustentar um decreto condenatório. Subsidiariamente, na hipótese de eventual condenação, requereu que fosse reconhecida a participação de menor importância de Yuri Ramires Porto e Silva, com aplicação da pena no patamar mínimo legal, considerando seu comportamento não violento, seu perfil favorável e a ausência de antecedentes criminais. Manifestação em mídia audiovisual. É o relatório. Fundamento e decido. Para o crime imputado ao réu, narrado na denúncia, o Código Penal estabelece: Art. 158 - Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, e com o intuito de obter para si ou para outrem indevida vantagem econômica, a fazer, tolerar que se faça ou deixar de fazer alguma coisa: Pena - reclusão, de quatro a dez anos, e multa. § 1º - Se o crime é cometido por duas ou mais pessoas, ou com emprego de arma, aumenta-se a pena de um terço até metade. § 3º - Se o crime é cometido mediante a restrição da liberdade da vítima, e essa condição é necessária para a obtenção da vantagem econômica, a pena é de reclusão, de 6 (seis) a 12 (doze) anos, além da multa; se resulta lesão corporal grave ou morte, aplicam-se as penas previstas no art. 159, §§ 2o e 3o, respectivamente. Segundo consta no Boletim de Ocorrência nº 2019.271842 (id 68297096, p. 9/11): Na data de hoje, uma equipe de investigadores, por determinação da Delegada Adjunta desta Gerência, diligenciou para localizar os autores de uma extorsão praticada contra Wagner Rogério Neves, crime ocorrido em 05 de setembro de 2019. Segundo a vítima, na ocasião, foi abordada por homens armados que se identificaram como policiais civis da GCCO. A vítima relatou que foi algemada e ameaçada com uma pistola prateada, observando, ainda, que um dos suspeitos utilizava coturno e portava uma arma de cor preta. A vítima informou, adicionalmente, que no dia 09 de setembro de 2019 recebeu ligações ameaçadoras em seu celular, originadas do número (65) 3319-3000. Em razão das ameaças, procurou esta Gerência naquela mesma data, formalizando suas declarações. Nesta data, por volta das 15h, a equipe deslocou-se até o Hotel Deville, local associado ao número informado pela vítima. No hotel, foi confirmado que Halker havia utilizado o telefone para realizar as ligações de ameaça; contudo, ele já não se encontrava mais no local. Foi informado, ainda, que havia uma pessoa na recepção procurando por Halker. Ao ser abordado, foi identificado como Yuri Ramires, amigo de Halker, que prontamente se ofereceu para indicar onde este poderia estar. A equipe então se deslocou até o Hotel Viva Versátil, situado na Rua Presidente Afonso Pena, nº 282, em Cuiabá/MT, CEP 78043-505, onde localizou Halker, Kairo e Erlon. Durante a abordagem, foram encontrados uma porção de substância análoga à maconha, um simulacro de pistola e munições intactas de calibre .38. Na sequência, Yuri informou espontaneamente que possuía duas armas em sua residência. A equipe policial deslocou-se até o local indicado, situado no Condomínio Shangri-lá, Avenida Beira Rio, em Cuiabá/MT, onde foram localizados: uma pistola calibre .380, com dezenove munições intactas; um revólver calibre .38, com cinco munições intactas; e um revólver artesanal calibre 20, com onze munições intactas do mesmo calibre. A Polícia Civil realizou diligências na residência do réu Yuri Ramires Porto, ocasião em que foram localizados e apreendidos diversos objetos de interesse da investigação. Foram encontrados um Certificado de Registro de Arma de Fogo, registrado no SINARM sob o nº 2019/009075879-09, referente ao modelo RT856, e outro Certificado de Registro de Arma de Fogo, também registrado no SINARM, sob o nº 2003/005310938-55, referente ao modelo PT58HC Plus. Além disso, foram apreendidos armamentos, conforme pode ser comprovado pelo documento de id. 68297096, p. 13. Ainda na fase policial, a polícia apreendeu o aparelho telefônico do réu YURI RAMIREZ PORTO E SILVA e após a realização da perícia foram localizadas fotos em que ele usava vestimentas semelhantes às de policiais civis, além de imagens de armas de fogo, conforme consta no Id 122622862 – pág. 13, corroborando a versão da vítima de que os agentes se passaram por policiais. O investigador de polícia Wanker Ferreira Medeiros, na fase policial, relatou, conforme pode ser visto no documento de id. 68297096, p. 14, que durante a apuração dos fatos, investigadores receberam informações de que Halker Cristian Rodrigues Sampaio estaria praticando tentativa de extorsão contra a vítima Wagner Rogério Neves de Fogo, valendo-se de contato telefônico realizado a partir do Hotel DellVille. Ao diligenciarem no referido hotel, os policiais foram informados de que Halker já havia deixado o local, evadindo-se sem realizar o pagamento da hospedagem. O investigador informou que na ocasião em que estava no hotel, o No curso das investigações, o Yuri Ramirez Porto chegou perguntando pelo Halker e foi abordado pela equipe de policiais. Aduziu que ele teria se identificado como segurança e que foi entregar um carregador a Halker. Posteriormente, diante da atuação policial, Yuri revelou que Halker e outros indivíduos estariam em outro Hotel, o Viva Versátil. Em continuidade às diligências, os policiais localizaram Halker Cristian Rodrigues Sampaio, Kairo Rodrigues Pereira e Erlon Fábio Campos Júnior no segundo hotel indicado. Durante a abordagem, foi encontrado em poder de Halker um simulacro de pistola. Ainda, relatou na fase policial, que no desenrolar da investigação, com a autorização de Yuri Ramirez Porto, os agentes realizaram buscas em sua residência, onde localizaram um revólver calibre .38, uma pistola cromada, um pistolão gauge 20 (possivelmente de fabricação artesanal), diversas munições de calibres variados, um colete balístico, algemas e um aparelho de choque manual, este último localizado no interior de um veículo. Na fase policial, o Erlon, em depoimento prestado na delegacia (id. 68297096, p. 36, um dos suspeitos que estava junto com o Halker no momento da prisão, declarou que conheceu o Yuri semana antes da prisão e que o Yuri estava com o Halker no hotel. Também, na fase policial, a vítima, em depoimento prestado à autoridade policial, descreveu que um dos indivíduos tinha aproximadamente 90 quilos, 1,70m de estatura, era branco, utilizava coturno, farda preta e colete balístico. Relatou que este suposto policial portava duas pistolas, sendo uma cromada e outra preta, esta última aparentando ser uma pistola da marca Taurus. Informou ainda que, após a primeira extorsão, ocasião em que teve sua liberdade restringida, passou a receber diversas mensagens ameaçadoras, as quais estão armazenadas em seu aparelho celular e foram disponibilizadas para averiguação. Declarou que, no domingo, recebeu uma ligação do número (65) 98445-8565, em que o interlocutor se identificou como Felipe e afirmou que o declarante havia se esquecido do compromisso do dia anterior. Relatou também que, na data de hoje, seu escritório recebeu cinco chamadas telefônicas originadas do número (65) 3319-3000, sendo que sua secretária, Jasmim, atendeu duas delas. Na primeira ligação, foi perguntado sobre o declarante, ao que Jasmim respondeu que ele não estava; na segunda, o interlocutor pediu que fosse repassado o recado de que o declarante não deveria se esquecer do combinado, afirmando serem os policiais. Por fim, o declarante confirmou ter visualizado a última ligação originada desse número. Em juízo, a vítima WAGNER ROGÉRIO NEVES DE SOUZA esclareceu, com riqueza de detalhes, os fatos narrados na denúncia, afirmando que foi atraída até uma residência, sob o pretexto de receber honorários advocatícios, por um indivíduo identificado como Halker, com quem havia mantido contato anterior para tratar da análise de documentos referentes a empréstimos garantidos por bens. Relatou que, ao chegar à residência, localizada nas proximidades do bairro conhecido como Copo Sujo, foi surpreendido por Halker e por outro indivíduo, o qual afirmou ter reconhecido posteriormente na delegacia, onde o viu algemado ao corrimão da escadaria. Declarou, ainda, que, na época dos fatos, após a prisão de quatro suspeitos, conseguiu identificar Halker e Yuri, narrando que este último utilizava vestimentas típicas de agente de segurança e se autointitulava policial do GCCO. A vítima narrou, em seu depoimento prestado em juízo, que Halker foi o mais violento entre os agressores, chegando a lhe causar lesões físicas, motivo pelo qual afirmou ter desejado sua morte. Relatou que tanto Halker quanto Yuri estavam armados e anunciaram um falso flagrante policial. Halker, além de agredi-lo com coronhadas na cabeça, exigiu que desbloqueasse o telefone celular. Informou que foi algemado com as mãos para trás, obrigado a ajoelhar-se na cozinha da residência e mantido sob vigilância constante. Wagner esclareceu que Yuri vestia uniforme preto semelhante ao utilizado por vigilantes e portava uma pistola cromada, enquanto Halker trajava bermuda e camiseta, também armado. Segundo seu relato, Yuri forneceu a arma e a algema a Halker, mas não participou diretamente das agressões, limitando-se a permanecer em pé, observando os atos de violência. A vítima descreveu que foi ameaçada de morte caso não informasse o paradeiro de valores supostamente pertencentes a integrantes de organização criminosa. Posteriormente, foi retirada da residência e colocada em sua própria caminhonete, sendo levado até o posto Santa Elisa, onde os criminosos tentaram forçá-lo a prometer o pagamento de R$ 100.000,00, reduzindo depois o valor para R$ 30.000,00. Wagner afirmou que a intervenção de sua esposa, que rastreava sua localização pelo celular, e o esvaziamento do tanque de combustível dos sequestradores impediram a consumação de um resultado mais grave. Após ser liberado nas imediações de um posto de combustível, conseguiu entrar em contato com sua esposa e, em seguida, procurou auxílio policial. Em reconhecimento realizado na unidade policial, Wagner identificou de forma segura Halker e Yuri como autores da violência. Acrescentou ter percebido a presença de outras duas vozes durante o sequestro, indicando a participação de mais indivíduos, embora não tenha conseguido reconhecê-los visualmente. Durante a audiência, enfatizou que Halker foi o mentor da ação criminosa, responsável principal pelas ameaças e agressões, enquanto Yuri prestou suporte logístico e exerceu função intimidatória, ostentando armamento e vestimenta similar à utilizada por forças de segurança. Relatou também as consequências psicológicas dos fatos, mencionando a necessidade de mudar o endereço de seu escritório e de alterar aspectos de sua rotina familiar para preservar sua segurança. Por fim, declarou não ter interesse em pleitear indenização por danos morais em face de Yuri, considerando que este teria atuado de maneira subordinada a Halker. A testemunha WANKER FERREIRA MEDEIROS, em juízo, declarou estava lotado na Gerência de Combate ao Crime Organizado (GCCO) e investigou os fatos narrados na denuncia e fez as diligências determinada pelo Delegado de Polícia. Confirmou que as investigações começaram no Hotel Deville, onde, após checagem de ligações telefônicas, abordaram um indivíduo identificado como Yuri, que revelou informações sobre a localização de outro suspeito, Halker. Em diligência a outro hotel na Avenida Afonso Pena, encontraram Halker e mais dois indivíduos, tendo sido apreendidos um simulacro de pistola, drogas e, posteriormente, na casa de Yuri, um revólver registrado, uma pistola niquelada e uma arma artesanal (“pistolão”), além de uma capa de colete e uma algema. Informou que Halker tinha histórico criminal, incluindo registros de se apresentar falsamente como policial, e que Yuri era seu conhecido desde o período das Forças Armadas. Esclareceu que, embora Yuri tenha colaborado indicando as armas, havia alta probabilidade de envolvimento dele na prática criminosa, em especial pela posse da pistola prateada compatível com a descrição dada pela vítima. Declarou, ainda, que não participou das investigações posteriores à prisão e que não conversou diretamente com a vítima. Ao final, confirmou que Halker e outro suspeito, Ellon, tinham registros policiais anteriores juntos e que foram encontrados drogas e materiais suspeitos no decorrer da ação. A testemunha JASMIM NEVES VALLES, em juízo, alegou que, em 2019, trabalhava no escritório do advogado Wagner, vítima do crime de extorsão. Relatou que, na época dos fatos, recebeu uma ligação em telefone fixo do escritório, em que uma pessoa exigia o pagamento de determinada quantia sob ameaça, afirmando estarem em frente ao local. Confirmou que, ao olhar pela janela, avistou um carro estacionado, compatível com o descrito pelos interlocutores, o que lhe causou pânico. Informou que comunicou o fato imediatamente ao advogado Wagner, repassando o número de onde partiu a ligação, sendo este identificado como proveniente de um hotel. Afirmou que compareceu à delegacia após a prisão dos suspeitos, mas não conseguiu reconhecê-los, pois apenas manteve contato telefônico. Acrescentou que se recordava de que Halker, um dos suspeitos, já havia comparecido ao escritório meses antes, se apresentando como corretor de imóveis, interessado na venda de um apartamento. Confirmou que Wagner reconheceu Halker como um dos autores da extorsão, mas não se recordava se houve reconhecimento de outros envolvidos. Por fim, relatou que as ligações tinham conteúdo de ameaça e não de simples cobrança, e reafirmou que seu depoimento foi prejudicado pelo tempo decorrido desde os fatos. A testemunha de defesa MARIA LAURA BERLANDI E SILVA, declarou que, na época dos fatos, era casada com Yuri há cerca de 14 anos e que conviviam juntos. Relatou que, no dia 5 de setembro de 2019, embora não recordasse todos os detalhes, lembrava que Yuri tinha rotina de chegar em casa entre 18h e 18h30 e, na ocasião, confirmou que ele estava em serviço, mostrando-lhe mensagens no celular. Quanto ao dia 9 de setembro de 2019, narrou que, durante a tarde, estava na piscina do condomínio com a filha quando Yuri se ausentou rapidamente para entregar um carregador; posteriormente, policiais chegaram em sua residência e o conduziram à GCCO, sem lhe fornecer maiores explicações. Informou que as armas apreendidas pertenciam originalmente a seu pai e foram transferidas para Yuri para fins de realização de curso de instrutor de tiro, além de uma arma artesanal recebida por Yuri como presente de aniversário. Afirmou que Yuri era vigilante, instrutor de tiro e que nunca soube de qualquer envolvimento dele em práticas ilegais ou ilícitas. Declarou que, após o ocorrido, conversou com Yuri, que negou participação em qualquer crime, e que ela acreditou em sua versão, reforçada pelas mensagens que indicariam sua atividade de trabalho na data dos fatos. A declaração prestada pela testemunha de defesa Maria Laura Berlandi Silva, embora indique que o acusado Yuri possuía rotina de trabalho e comportamento regular, não é suficiente para afastar, de plano, a responsabilidade penal pelos fatos narrados na denúncia. Destaca-se que a testemunha limitou-se a afirmar, com base em suas percepções pessoais, que o acusado estava em serviço e que não tinha conhecimento de seu envolvimento em atividades ilícitas. Contudo, suas alegações se baseiam em elementos subjetivos e em informações repassadas pelo próprio réu, não constituindo prova hábil a elidir a materialidade e autoria delitiva eventualmente demonstradas nos autos. Ademais, a própria testemunha confirmou que Yuri mantinha, em sua residência, diversas armas de fogo, inclusive uma pistola e um revólver regularizados, bem como uma arma artesanal, fato que reforça a posse de armamento pelo acusado. Esta circunstância é relevante para o conjunto probatório, pois indica a disponibilidade e o acesso a instrumentos que, conforme narrado nos autos, teriam sido empregados na prática criminosa investigada. Portanto, a fala da testemunha, ainda que favorável sob certo aspecto, reforça o vínculo do réu com o material bélico encontrado, sem, contudo, afastar a possibilidade de sua efetiva participação no delito imputado. No interrogatório judicial, o réu YURI RAMIREZ PORTO E SILVA negou a autoria dos fatos, afirmando jamais ter visto a vítima, advogado Wagner, antes da audiência de custódia. Relatou que conhecia Halker, também acusado, desde o serviço militar em 2011, mas que somente voltaram a se comunicar em 2014, mantendo contato esporádico. Afirmou que acreditava que Halker fosse policial civil, pois este utilizava armamentos e distintivos supostamente oficiais. Explicou que, a pedido de Halker, deslocou-se até o Hotel Deville para entregar um carregador de celular e, ao chegar ao local, foi abordado por policiais civis, levado à GCCO e posteriormente preso. Narrando os fatos, disse que, ao ser abordado, teve seu celular revistado, foi conduzido sob ameaça até outro hotel, onde ocorreu a prisão de Halker e outros indivíduos. Relatou que, em sua residência, os policiais apreenderam uma pistola niquelada, um revólver registrado, uma algema e uma capa de colete, todos de sua propriedade para fins de trabalho como vigilante e instrutor de tiro. Afirmou que jamais participou de extorsão, que nunca esteve na residência onde a vítima relatou ter sido coagida e que a menção de seu nome por Halker seria uma tentativa deste de criar um álibi. Declarou que a amizade com Halker era restrita, sem convivência constante, e que apenas realizavam esporádicos treinos de tiro. Ressaltou que Halker também possuía uma arma cromada semelhante à sua, e que todas as suas armas eram devidamente registradas. Yuri afirmou que o episódio prejudicou gravemente sua vida pessoal e profissional, levando-o à perda de emprego, do casamento e à necessidade de tratamento psicológico. A defesa do réu Yuri Porto e Silva buscou afastar sua responsabilidade criminal alegando desconhecimento dos fatos e inexistência de contato com a vítima, sustentando que apenas teria se envolvido na situação ao atender a um pedido de favor de outro acusado, Halker. Todavia, tal tese não encontra respaldo nos elementos de prova constantes nos autos e deve ser refutada. Em primeiro lugar, cumpre destacar que a vítima, em seu depoimento judicial, foi extremamente minuciosa e coerente, descrevendo com precisão as circunstâncias da abordagem sofrida. Especificou, de forma reiterada, que um dos indivíduos portava uma pistola de cor cromada, trajava farda preta semelhante à dos policiais da Gerência de Combate ao Crime Organizado (GCCO), usava colete balístico e coturno, além de ter aproximadamente 1,70m de altura e ser de cor branca — características que coincidem exatamente com a fisionomia e os itens apreendidos com o réu Yuri. Importante salientar que, mesmo reconhecendo a participação do réu nos fatos, a vítima foi honesta ao declarar que o réu não teria lhe agredido fisicamente, limitando-se a apoiar a ação criminosa. Tal comportamento da vítima confere ainda mais veracidade ao seu relato, pois demonstra isenção e ausência de intenção de imputar falsamente fatos mais graves do que aqueles que efetivamente ocorreram. Ademais, reforçando a narrativa da vítima, o corréu Halker — já falecido —, em seu depoimento, afirmou que Yuri presenciou a ameaça feita à vítima no momento dos fatos. A fala de Halker compromete ainda mais a versão defensiva de Yuri, que, de maneira isolada e dissociada das demais provas, alegou que jamais teria visto a vítima anteriormente. A divergência entre as declarações do réu e as provas colhidas evidencia tentativa de ocultação da verdade. Ademais, o depoimento prestado pelo corréu Halker, na fase policial, documento em id 122628160, p. 24, reforça a vinculação de Yuri aos fatos. Em seu interrogatório, prestado na fase policial, o corréu Halker declarou que, na ocasião, o réu portava uma mochila contendo uma pistola de airsoft (simulacro), e que algumas munições encontradas, embora não fossem de sua propriedade, provavelmente pertenciam a Yuri, seu amigo de longa data e instrutor de tiro, com quem teria estado no estande TX2 no bairro Porto. Confirmou também que, na quinta-feira, dia 5 de setembro de 2019, estava na residência de Joãozinho Santos Sampaio, localizada na Rua Governador José Fragelli, bairro Campo Velho, em companhia de Yuri, quando a vítima Wagner teria comparecido ao local e proferido ameaças. Halker, ao narrar os fatos, mencionou expressamente a presença de Yuri no momento em que a vítima teria exigido a assinatura de confissão de dívida no valor de R$ 200.000,00, mesmo valor da franquia da empresa da vítima. Tais informações revelam não apenas a proximidade entre os corréus, mas também a efetiva presença de Yuri no cenário dos fatos delitivos, contrariando sua versão defensiva de que sequer conhecia a vítima. A divergência entre o depoimento de Yuri e as demais provas e declarações constantes nos autos evidencia tentativa deliberada de ocultar sua real participação. Ressalte-se que, conforme Laudo Pericial nº 2.10.2022.48706-01 (ID 122622862, p.12), apesar de não terem sido localizadas mensagens diretamente relacionadas à prática da extorsão, foram extraídas imagens do celular do réu Yuri, nas quais ele aparece trajando uniforme preto completo da empresa UNIFORT, incluindo gandola, calça, colete balístico, luvas, balaclava, rádio HT, algemas e arma de fogo. Tal indumentária é extremamente semelhante àquela utilizada pelos policiais da GCCO, conforme descrito pela vítima, fato que chamou a atenção dos investigadores e corrobora a identificação visual feita no momento da abordagem criminosa. Importante consignar que, embora a vítima tenha relatado que o conduzido Yuri não lhe tenha desferido agressões físicas, destacou, contudo, que o mesmo participou ativamente dos atos de extorsão, ao lado de Halker, contribuindo para a prática delitiva. Assim, resta caracterizado o concurso de agentes, na forma do artigo 29 do Código Penal, sendo ambos responsáveis pelo evento criminoso, nos termos da teoria monista adotada pelo ordenamento jurídico pátrio. O relato da vítima, aliado aos demais elementos de convicção constantes nos autos, demonstra de forma clara que o autuado, mesmo sem exercer violência física direta, participou da ação delituosa de maneira consciente e voluntária, reforçando o liame subjetivo necessário para a configuração do crime de extorsão em concurso de pessoas. Neste sentido: PENAL E PROCESSO PENAL – APELAÇÃO CRIMINAL – EXTORSÃO E AMEAÇA (ARTIGOS 158, § 1º, E 147, AMBOS, DO CÓDIGO PENAL) – SENTENÇA CONDENATÓRIA – IRRESIGNAÇÃO DEFENSIVA – PRETENDIDA ABSOLVIÇÃO POR INSUFICIÊNCIA DE PROVAS – INVIABILIDADE – FARTO CONJUNTO PROBATÓRIO – PALAVRAS DAS VÍTIMAS EM HARMONIA COM OS DEPOIMENTOS DAS TESTEMUNHAS – COMPROVAÇÃO DA MATERIALIDADE E AUTORIA DOS DELITOS – CONDENAÇÃO MANTIDA – DESCLASSIFICAÇÃO – INVIABILIDADE – CONFIGURADA GRAVE AMEAÇA PARA OBTENÇÃO DE VANTAGEM ECONÔMICA INDEVIDA – PLEITO DE EXCLUSÃO DA MAJORANTE DE CONCURSO DE PESSOAS – VIABILIDADE – READEQUAÇÃO DA PENA – ALTERAÇÃO DO REGIME FECHADO – IMPOSSIBILIDADE – RÉU REINCIDENTE E COM MAUS ANTECEDENTES – REGIME MANTIDO – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO, EM CONSONÂNCIA COM O MINISTÉRIO PÚBLICO. 1. A materialidade e autoria dos crimes de extorsão e ameaça estão comprovadas pelo conjunto probatório, incluindo boletim de ocorrência, depoimentos, mensagens de WhatsApp, áudios de ligações e confissão do réu, inviabilizando a absolvição. 2. Sabe-se que a palavra da vítima é importante em crimes patrimoniais, como a extorsão, principalmente quando é coerente e está alinhada com as demais provas. 3. O crime de extorsão consuma-se independentemente da obtenção da vantagem indevida (Súmula n. 96/STJ). 4. A desclassificação para exercício arbitrário das próprias razões é inviável, pois a conduta do réu ultrapassou a mera cobrança indevida, configurando grave ameaça para obtenção de vantagem econômica. 5. O afastamento da majorante do concurso de agentes é necessário, considerando a desclassificação da conduta do corréu para outro crime, não havendo outros elementos para sua manutenção. 6. A condição de reincidente do acusado e a incidência de circunstância judicial desfavorável (maus antecedentes) inviabilizam o estabelecimento do regime semiaberto para início de cumprimento de pena, de modo que deve ser mantido o regime inicial fechado. 7. Recurso parcialmente provido, em consonância com o parecer ministerial. (N.U 1012008-61.2023.8.11.0015, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, LIDIO MODESTO DA SILVA FILHO, Quarta Câmara Criminal, Julgado em 08/10/2024, Publicado no DJE 11/10/2024). Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE a pretensão constante na denúncia, com o fim de CONDENAR o réu YURI RAMIREZ PORTO E SILVA pela prática do crime previsto no artigo 158, §§ 1º e 3º, do Código Penal. Dosimetria da Pena Passo a fixar a pena, atento ao contido no art. 68 do Código Penal. Na primeira fase, observo que a culpabilidade do agente é normal ao tipo penal, que apesar de grave, não se justifica a exasperação além do mínimo legal. Quanto aos antecedentes, o réu é tecnicamente primário, não havendo condenações com trânsito em julgado que autorizem majoração por maus antecedentes. Assim, essa circunstância deve ser considerada neutra. Também não há nos autos elementos que permitam juízo desfavorável acerca da conduta social ou da personalidade do agente, o que impede a valoração negativa desses critérios. Os motivos do crime são inerentes ao tipo penal da extorsão e, por isso, não ensejam aumento da pena. As circunstâncias do crime, apesar de graves, são inerentes ao tipo penal e a causa de aumento, o que será avaliada em momento oportuno. As consequências normais ao tipo penal, inclusive, a vítima manifestou que não deseja a imposição de indenização mínima. Diante dessas considerações, fixo a pena-base em 06 (seis) anos de reclusão. Na segunda fase, não se identifica nos autos a presença de circunstâncias atenuantes ou agravantes. Na terceira fase, incide a causa de aumento por emprego de arma e em concurso de pessoas, nos termos do art. 158, §1º, do Código Penal, razão pela qual aumento a pena em 1/3 (um terço), fixando a pena definitiva em 08 (oito) anos de reclusão. Pena de multa Atendendo ao disposto no art. 49 e considerando as circunstâncias judiciais descritas no art. 59, caput, ambos do Código Penal, fixo a pena em 10 (dez) dias-multa. Em seguida, atento ao art. 60, caput, do Código Penal, ponderando a situação socioeconômica do réu, fixo valor do dia-multa em um trigésimo do salário mínimo. Fixação da Indenização Deixo de fixar o valor mínimo de reparação (CPP, art. 387, inc. IV), ante a ausência de provas, remetendo ao Juízo Cível a discussão sobre essa questão. Regime de pena A pena de reclusão deverá ser cumprida inicialmente em regime semiaberto, com fundamento no artigo art. 33, § 2º, “b”, do Código Penal. Substituição da pena. Incabível, nos termos do art. 44, I, do Código Penal, por se tratar de crime cometido com violência ou grave ameaça à pessoa, além de a pena ultrapassar o limite legal para substituição. Detração. Por ora, não há que se falar em alteração do regime com base na detração, remetendo-se a análise ao Juízo da Execução. Prisão preventiva. O réu respondeu ao processo em liberdade. Considerando que não há fatos novos que justifiquem a prisão cautelar, concedo-lhe o direito de apelar em liberdade, sem prejuízo de futura reavaliação pelo Juízo da Execução. Dispositivo. Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido da AÇÃO PENAL PÚBLICA com o fim de CONDENAR o réu YURI RAMIREZ PORTO E SILVA pela prática do crime previsto no art. 158, §§ 1º e 3º do Código Penal, à pena de 8 (oito) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa, fixado o valor do dia-multa em um trigésimo do salário mínimo, pena que será cumprida em regime inicialmente em regime inicial semiaberto, devendo aguardar em liberdade o trânsito em julgado da presente sentença. Em relação a Halker Cristian Rodrigues Sampaio, considerando a juntada da certidão de óbito (ID 190825194) DECLARO a extinção da punibilidade, com fundamento no artigo 107, inciso I, do Código Penal, em razão do falecimento do acusado. Intime-se conforme disposição do art. 369 e seguintes, do Código de Normas Gerais da Corregedoria-Geral da Justiça do Foro Judicial – CNGC. Disposições Finais Condeno o réu ao pagamento das custas e despesas processuais, ficando suspensa até que tenha condições financeiras para pagamento devidamente comprova pelos órgãos competentes, por ser pobre na forma da lei. Das destinações dos bens. Após o trânsito em julgado e verificada a ausência de interessados nos bens apreendidos, decreto o perdimento, com posterior destinação a entidades sociais registradas na Diretoria do Fórum, ou então a realização de leilão, conforme determinação da administração. Na hipótese de existência de fiança depositada nos autos ou dinheiro apreendido, autorizo a restituição, conforme estabelecido pelos artigos 336 e 337 do Código de Processo Penal (CPP). Não havendo procura após o transito em julgado, determino que permaneça depositado em conta única do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso. Caso não exista manifestação de interesse na restituição de armas apreendidas, estas deverão ser encaminhadas ao Comando do Exército da respectiva região para que sejam doadas a órgãos de segurança pública ou, dependendo do caso, destruídas. Arquive-se e comunique-se à Diretoria do Fórum que os bens estão à disposição. Cumpra-se. CUIABÁ, 26 de abril de 2025. Juiz(a) de Direito
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