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Dayane Alves Santos x Mg Construções Empreendimentos Incorporadora E Consultoria De Obras Ltda

ID: 300829517

Tribunal: TJMT Órgão: 4ª VARA CÍVEL DE VÁRZEA GRANDE Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1018428-24.2023.8.11.0002

Data de Disponibilização: 17/06/2025

Polo Ativo:

DAYANE ALVES SANTOS

Polo Passivo:

MG CONSTRUÇÕES EMPREENDIMENTOS INCORPORADORA E CONSULTORIA DE OBRAS LTDA

Sentença

Advogados:

HIGOR LUCAS OLIVEIRA DA SILVA

OAB/GO XXXXXX Desbloquear

GABRIEL ELIO BELINO DA SILVA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

FERNANDA NUNES ROCCO

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

PJe: 1018428-24.2023.8.11.0002 Vistos, etc. DAYANE ALVES SANTOS, devidamente qualificada nos autos, ajuizou a presente AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS em face de MG CONSTRUÇÕES EMPRE… PJe: 1018428-24.2023.8.11.0002 Vistos, etc. DAYANE ALVES SANTOS, devidamente qualificada nos autos, ajuizou a presente AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS em face de MG CONSTRUÇÕES EMPREENDIMENTOS INCORPORADORA E CONSULTORIA DE OBRAS LTDA, também qualificada, alegando, em síntese, que adquiriu imóvel residencial construído pela requerida, localizado na Rua Leite de Castro, nº 1816, Vila Arthur, CEP 78.140-650, em Várzea Grande-MT, e que posteriormente constatou a existência de vícios construtivos relacionados ao sistema de drenagem e problemas estruturais no muro de divisa. Sustenta a autora que os vícios construtivos identificados no imóvel causaram infiltrações, comprometimento da estrutura do muro lateral e problemas de drenagem que afetam a habitabilidade e segurança da residência. Alega que procurou a requerida para solução dos problemas, mas não obteve resposta satisfatória, sendo necessário o ajuizamento da presente demanda. Requer a autora: a) no mérito, seja a Requerida condenada na Obrigação de Fazer consistente em reformar o muro do imóvel nos moldes determinados pelo Sr. Perito do Juízo, realizar a drenagem do terreno e os reparos necessários para as fissuras existentes em toda estrutura do imóvel, dada a baixa qualidade dos materiais e serviços efetivamente empregados na construção; b) alternativamente, a condenação da ré ao pagamento de indenização por danos materiais correspondentes aos custos de reparo dos vícios construtivos; c) indenização por danos morais pelos transtornos sofridos. Atribuiu à causa o valor de R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais). Devidamente citada, a requerida apresentou contestação, alegando preliminarmente a decadência do direito da autora com base no artigo 26 do Código de Defesa do Consumidor. No mérito, sustenta a inexistência de vícios construtivos, argumentando que eventuais problemas decorrem de uso inadequado do imóvel pela autora ou de fatores externos não relacionados à construção original. Alega ainda que o muro não seria objeto do contrato de compra e venda, sustentando que eventual análise pericial sobre o muro configuraria julgamento ultra petita. Impugna a existência de danos materiais e morais, bem como os valores pleiteados. Requer a improcedência total dos pedidos. A autora apresentou tréplica, refutando os argumentos da defesa e reiterando seus pedidos iniciais. O feito foi saneado, sendo deferida a produção de prova pericial de engenharia civil para análise dos alegados vícios construtivos. Foi nomeado como perito judicial o Engenheiro Civil Gabriel Libardi de Souza, devidamente habilitado e inscrito no CREA-MT sob o nº 11535/D. O laudo pericial foi apresentado em 07 de outubro de 2024, concluindo pela existência de vícios construtivos e quantificando os danos materiais em R$ 6.175,32 (seis mil, cento e setenta e cinco reais e trinta e dois centavos). As partes se manifestaram sobre o laudo pericial, mantendo suas respectivas posições. É o relatório. DECIDO. DAS QUESTÕES PRELIMINARES Da Alegada Decadência A requerida suscita preliminar de decadência do direito da autora, com fundamento no artigo 26 do Código de Defesa do Consumidor, sustentando que o prazo de 90 (noventa) dias para reclamação de vícios aparentes ou de fácil constatação já teria transcorrido. Contudo, tal alegação não merece prosperar. Esclareço, preliminarmente, que a mudança de entendimento sobre a aplicação do prazo prescricional decenal, em substituição ao entendimento inicial sobre decadência manifestado na decisão de saneamento, é juridicamente possível até a prolação da sentença, não havendo coisa julgada sobre questões de direito material. A evolução jurisprudencial e o amadurecimento da instrução processual, especialmente com a produção da prova pericial, justificam a adoção do entendimento mais adequado ao caso concreto, em observância ao princípio da segurança jurídica e da prestação jurisdicional efetiva. Com o amadurecimento da instrução e considerando a natureza dos pedidos formulados — entre os quais se incluem reparação por danos materiais e morais — impõe-se o reconhecimento de que a pretensão deduzida possui natureza condenatória e reparatória, o que atrai a aplicação do prazo prescricional, e não decadencial. Esse entendimento alinha-se à jurisprudência consolidada dos Tribunais Superiores, inclusive da Corte Estadual, que firmou entendimento de que a pretensão indenizatória decorrente de vícios construtivos possui natureza reparatória e, portanto, submete-se ao prazo prescricional decenal previsto no artigo 205 do Código Civil, e não ao prazo decadencial do artigo 26 do CDC. Nesse sentido: "A pretensão indenizatória decorrente de vício construtivo submete-se ao prazo prescricional decenal, não incidindo o prazo decadencial do art. 26 do CDC" (N.U 0016861-96.2016.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SERLY MARCONDES ALVES, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 28/05/2025). “APELAÇÕES – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS – CERCEAMENTO DE DEFESA - MATÉRIA INTRÍNSECA AO MÉRITO - ANÁLISE CONJUNTA – JULGAMENTO EXTRA PETITA – PRELIMINAR REJEITADA - PRESCRIÇÃO - PRAZO DECENAL – ARTIGO 205 DO CÓDIGO CIVIL – PREJUDICIAL AFASTADA - COMPRA E VENDA DE IMÓVEL – RESPONSABILIDADE DOS RÉUS (PROPRIETÁRIOS/VENDEDORES E DO EMPREITEIRO) - VÍCIOS CONSTRUTIVOS - CONSTATAÇÃO EM PERÍCIA – FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS PELOS RÉUS – ATO ILÍCITO CARACTERIZADO – DEVER DE REPARAR – VALOR ARBITRADO NA PRIMEIRA INSTÂNCIA COM RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE – MANUTENÇÃO - MAJORAÇÃO DA VERBA HONORÁRIA (ARTIGO 85, §11, DO CPC) – RECURSO DOS AUTORES NÃO PROVIDO E DO PRIMEIRO RÉU NÃO PROVIDO – RECURSO DOS DEMAIS RÉUS PARCIALMENTE PROVIDO. Se a perícia confirma os vícios de construção no imóvel adquirido pelos autores, os réus (vendedores e empreiteiro) devem proceder aos reparos necessários e arcar com os danos materiais e danos morais. Não concedido pedido diverso do formulado na inicial, o julgamento não é extra petita. Para indenizações por vícios construtivos em imóvel adquirido, o prazo prescricional é o geral de 10 anos (artigo 205 do CC). Mantém-se o valor da reparação quando cumpre a função punitiva, compensatória e preventiva da medida. Ao julgar o Recurso, o Tribunal deverá majorar a verba honorária anteriormente definida, levando em conta o trabalho adicional realizado nessa fase (art. 85, §§2º e 11, do CPC)”. (N.U 1058084-70.2020.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, Vice-Presidência, Julgado em 28/06/2024, Publicado no DJE 28/06/2024) “CIVIL. CONSUMIDOR. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. RECURSO MANEJADO SOB A ÉGIDE DO NCPC. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. VÍCIO DE CONSTRUÇÃO NO IMÓVEL. PRETENSÃO DE INDENIZAÇÃO PARA OS REPAROS NECESSÁRIOS E DE DANO MORAL. PRAZO DECADENCIAL DO ART. 26 DO CDC (90 DIAS). INAPLICABILIDADE. PRETENSÃO INDENIZATÓRIA. SUJEIÇÃO AO PRAZO PRESCRICIONAL. DO ART. 205 DO CC/02. ACÓRDÃO EM CONSONÂNCIA COM O ENTENDIMENTO FIRMADO NESTA CORTE. INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 568 DO STJ. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO. 1. Aplica-se o NCPC a este recurso ante os termos do Enunciado Administrativo nº 3, aprovado pelo Plenário do STJ na sessão de 9/3/2016: Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC. 2. A pretensão cominatória de obrigar a construtora às providências necessárias ao saneamento do vício construtivo não se confunde com a mera substituição de produto ou reexecução de serviço, de modo que não se sujeita ao prazo decadencial previsto no art. 26 do Código de Defesa do Consumidor. 3. Quando a pretensão do consumidor é de natureza indenizatória (isto é, de ser ressarcido pelo prejuízo decorrente dos vícios do imóvel) a ação é tipicamente condenatória e se sujeita a prazo de prescrição. 4. À falta de prazo específico no CDC que regule a pretensão de indenização por inadimplemento contratual, deve incidir o prazo geral decenal previsto no art. 205 do CC/02. Precedentes. 5. Agravo interno não provido.” (STJ - AgInt no REsp: 1863245 SP 2020/0043674-8, Relator.: Ministro MOURA RIBEIRO, Data de Julgamento: 24/08/2020, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 27/08/2020) A distinção é fundamental. O prazo decadencial do artigo 26 do CDC aplica-se às hipóteses de reclamação por vício do produto, com pedidos de substituição do bem ou abatimento proporcional do preço. Já o pedido de indenização por danos materiais e morais decorrentes de falha na prestação do serviço ou inadimplemento contratual da construtora é de natureza reparatória e sujeita à regra do prazo prescricional. No caso concreto, os vícios construtivos relatados — relacionados a falhas no sistema de drenagem e comprometimento da estrutura do muro de divisa — caracterizam-se como vícios ocultos, conforme demonstrado pelo laudo pericial, pois relacionam-se ao sistema de drenagem interno e estrutural, não sendo perceptíveis por inspeção visual ordinária no momento da entrega do imóvel, manifestando-se apenas com o uso e em condições climáticas específicas (período chuvoso), conforme atestado tecnicamente pelo Engenheiro Gabriel Libardi de Souza. Além disso, a pretensão principal da autora envolve reparação civil por perdas e danos, e não mera substituição ou abatimento de preço. Dessa forma, aplica-se ao caso o prazo prescricional decenal previsto no artigo 205 do Código Civil, contado da ciência inequívoca dos vícios pela autora. Assim, REJEITO a preliminar de decadência arguida pela requerida. Da Alegação de Ultra Petita A requerida, em sua manifestação sobre o laudo pericial, sustenta que haveria julgamento ultra petita, argumentando que o muro não seria objeto do contrato de compra e venda, e que o perito teria se baseado indevidamente em análise do muro para fundamentar sua conclusão. Tal alegação não merece prosperar, pelos fundamentos que se seguem. Não há julgamento ultra petita no presente caso, uma vez que: a) Pedido Genérico e Abrangente: A autora formulou pedido genérico de obrigação de fazer e indenização por danos materiais decorrentes de vícios construtivos no imóvel adquirido, sem especificar ou limitar quais elementos construtivos deveriam ser analisados. O pedido abrange todos os vícios construtivos que comprometem a habitabilidade e segurança do imóvel, conforme causa de pedir deduzida na inicial. b) Muro como Parte Integrante do Sistema: O muro de divisa, ainda que tecnicamente possa ser considerado elemento acessório, integra o sistema de drenagem do imóvel e é essencial para a funcionalidade e segurança da construção. O laudo pericial demonstrou que os problemas não se limitam ao muro isoladamente, mas constituem vícios sistêmicos do sistema de drenagem que afetam todo o imóvel. c) Responsabilidade por Vícios Sistêmicos: Conforme jurisprudência consolidada: "A incorporadora é responsável pela construção de contenção técnica necessária à estabilidade e segurança do imóvel, ainda que não prevista expressamente no memorial descritivo, quando exigida por norma técnica aplicável" (TJ-MT, N.U 0016861-96.2016.8.11.0041). d) Correlação entre Pedido e Causa de Pedir: A causa de pedir deduzida na inicial refere-se genericamente a "vícios construtivos relacionados ao sistema de drenagem e problemas estruturais" que afetam o imóvel adquirido. O laudo pericial limitou-se a analisar exatamente esses vícios, sem extrapolar o objeto da demanda. Portanto, REJEITO a alegação de ultra petita apresentada pela requerida. DO MÉRITO Da Existência dos Vícios Construtivos A questão central dos autos consiste em determinar se existem vícios construtivos no imóvel adquirido pela autora e, em caso positivo, se tais vícios são de responsabilidade da construtora requerida. Para elucidação da controvérsia, foi determinada a realização de perícia técnica de engenharia civil, confiada ao Engenheiro Gabriel Libardi de Souza, profissional de reconhecida competência técnica, especialista em Engenharia de Avaliações e Perícias, devidamente inscrito no CREA-MT. O laudo pericial, apresentado em 07 de outubro de 2024, após minuciosa vistoria realizada no imóvel em 20 de setembro de 2024, concluiu de forma categórica pela existência de vícios construtivos, conforme se depreende dos seguintes trechos: · Quanto aos problemas identificados: O perito constatou a existência de infiltrações no período chuvoso no muro de divisa e problemas com o dreno de passagem do terreno dos fundos no lote objeto da lide. Verificou que os demais problemas internos citados na Petição Inicial, de acordo com a Autora, foram sanados com a reforma por ela realizada. · Quanto ao corredor lateral: O laudo técnico determinou que "a canaleta deverá ser demolida e reconstruída, obedecendo à declividade do terreno para o escoamento total das águas. Sua construção, contemplará o perímetro do muro lateral e dos fundos, onde deverá ser interligada, para melhor captação das águas, evitando o transbordamento e inundação do imóvel." · Quanto ao muro lateral: Foi constatado que "nos locais onde estiverem com o material (tijolos) comprometidos, deverão ser retirados e substituídos, e aplicados chapisco para que a vedação e impermeabilização seja concluída." · Quanto ao muro dos fundos: O perito determinou que "a drenagem existente deverá ser submetida a um novo estudo quanto seu diâmetro, para que seja proposta a construção de uma caixa de contenção e pressão para escoamento mais eficaz das águas ou a substituição da tubulação existente que passa pelo imóvel da Autora a jusante." · Quanto ao dreno montante: Foi identificado que "deverá ser realizado um estudo para o dimensionamento do volume de águas do lote vizinho nos fundos para verificar o motivo real do não funcionamento deste item na construção pela Ré." À luz do referido laudo, passo a analisar a contestação ofertada pela requerida. a) Alegação de Inexistência de Vícios Construtivos A defesa sustenta que não existem vícios construtivos no imóvel, argumentando que eventuais problemas decorrem de uso inadequado pela autora ou fatores externos. Tal alegação resta completamente afastada pela robusta prova pericial produzida. O Engenheiro Gabriel Libardi de Souza, após minuciosa vistoria técnica, identificou de forma inequívoca a existência de vícios construtivos relacionados ao sistema de drenagem e estrutura do muro de divisa. O laudo pericial fundamentou-se em normas técnicas aplicáveis, especialmente a NBR 15575-1 (Edificações habitacionais – Desempenho), e utilizou metodologia científica adequada para análise dos problemas construtivos. A alegação da ré de que os problemas decorrem de "uso inadequado" não encontra respaldo técnico no laudo pericial, que expressamente consignou que os vícios identificados são decorrentes de falhas na execução original da obra. b) Alegação de Modificações no Imóvel pela Autora A defesa argumenta que eventuais problemas decorrem de modificações realizadas pela autora no imóvel após a entrega. Contudo, o laudo pericial foi categórico ao afastar tal alegação, consignando que "não há nexo de causalidade entre as alterações realizadas pela autora e a necessidade de contenção e reparos identificados." O perito esclareceu que os vícios construtivos relacionados ao sistema de drenagem e problemas estruturais são anteriores e independentes de qualquer modificação posterior realizada pela proprietária. Conforme jurisprudência consolidada: "A alegação de que a autora realizou modificações no imóvel não afasta a responsabilidade das rés, por não haver nexo de causalidade entre as alterações e a necessidade de contenção, conforme laudo técnico" (N.U 0016861-96.2016.8.11.0041, TJ-MT). c) Impugnação aos Valores dos Danos Materiais A requerida contesta os valores pleiteados a título de danos materiais, alegando que são excessivos e não comprovados. Tal impugnação não merece acolhimento. O laudo pericial quantificou de forma precisa e detalhada os custos necessários para reparação dos vícios construtivos em R$ 6.175,32 (seis mil, cento e setenta e cinco reais e trinta e dois centavos). A quantificação foi realizada com base no SINAPI (Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e Índices da Construção Civil) da Caixa Econômica Federal, metodologia reconhecida e amplamente utilizada no mercado da construção civil. O perito apresentou memória de cálculo detalhada (Anexo III do laudo), discriminando cada item necessário para os reparos, com especificação técnica adequada e preços atualizados conforme tabela oficial. Da Responsabilidade Civil da Construtora A responsabilidade da requerida pelos vícios construtivos identificados decorre da aplicação conjugada do Código Civil e do Código de Defesa do Consumidor. O artigo 618 do Código Civil estabelece que "nos contratos de empreitada de edifícios ou outras construções consideráveis, o empreiteiro de materiais e execução responderá, durante o prazo irredutível de cinco anos, pela solidez e segurança do trabalho, assim em razão dos materiais, como do solo." Os vícios construtivos identificados no presente caso relacionam-se diretamente com a segurança habitacional e estabilidade da construção, conforme atestado pelo laudo pericial, que demonstrou comprometimento do sistema de drenagem essencial para a preservação da estrutura e habitabilidade do imóvel. A relação jurídica estabelecida entre as partes caracteriza-se como relação de consumo, aplicando-se integralmente o Código de Defesa do Consumidor. Cumpre esclarecer, para fins de completude da fundamentação, que o vício construtivo apurado nos autos — relacionado à falha no sistema de drenagem e estrutura do muro — caracteriza simultaneamente vício de qualidade nos termos do art. 18 do Código de Defesa do Consumidor e defeito do produto nos moldes do art. 12 do mesmo diploma. O artigo 18 do CDC estabelece que "os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam." No caso, o vício torna o imóvel inadequado ao uso habitacional a que se destina. O artigo 12 do CDC dispõe sobre a responsabilidade por defeitos que comprometem a segurança do consumidor. Os vícios identificados comprometem a segurança habitacional da autora, cuja legítima expectativa de receber um bem estável e habitável foi frustrada, resultando em dano extrapatrimonial. Assim, ambos os dispositivos legais se aplicam harmonicamente: o art. 18 justifica a reparação material pela entrega de produto com vício, enquanto o art. 12 embasa a reparação moral pela violação à segurança e à dignidade do consumidor, nos moldes da responsabilidade objetiva do fornecedor. A construtora requerida, na qualidade de fornecedora do produto (imóvel), responde objetivamente pelos vícios construtivos que comprometem a adequação do bem ao fim a que se destina. O laudo pericial estabeleceu de forma inequívoca o nexo causal entre os vícios identificados e a execução deficiente da obra pela requerida. Conforme consignado pelo perito, os problemas de drenagem e estruturais decorrem de "falhas na execução da obra" e "baixa qualidade dos materiais e serviços efetivamente empregados na construção." Dos Danos Materiais Os danos materiais restaram comprovados de forma cabal pela prova pericial produzida. O Engenheiro Gabriel Libardi de Souza quantificou com precisão técnica os custos necessários para reparação dos vícios construtivos, chegando ao valor total de R$ 6.175,32 (seis mil, cento e setenta e cinco reais e trinta e dois centavos). A quantificação contempla: · Demolição e reconstrução da canaleta no corredor lateral, com adequação da declividade para escoamento eficaz das águas; · Reparos no muro lateral, incluindo substituição de material comprometido e aplicação de chapisco para vedação e impermeabilização; · Adequação do sistema de drenagem no muro dos fundos, com estudo técnico para dimensionamento adequado e eventual substituição da tubulação; · Correção do dreno montante, com estudo para dimensionamento do volume de águas e verificação das causas do não funcionamento. A metodologia utilizada pelo perito (SINAPI/CEF) é reconhecida e amplamente aceita pela jurisprudência para quantificação de danos em obras de construção civil. Dos Danos Morais A configuração do dano moral decorrente de vícios construtivos encontra respaldo na jurisprudência consolidada, que reconhece a ofensa à esfera extrapatrimonial do consumidor quando comprovada a entrega de imóvel em desconformidade com os padrões mínimos de habitabilidade e segurança. No presente caso, restam evidenciados todos os pressupostos caracterizadores do dever de indenizar, conforme se verifica: a) Expectativa Frustrada: A autora adquiriu imóvel novo da construtora requerida com a legítima expectativa de receber bem em perfeitas condições de habitabilidade, expectativa que foi frustrada pela constatação de vícios construtivos significativos. b) Transtornos e Aborrecimentos: Os vícios construtivos causaram à autora transtornos que extrapolam os meros aborrecimentos cotidianos, incluindo problemas de infiltração, comprometimento da segurança habitacional e necessidade de convivência com os defeitos até a solução definitiva. c) Resistência da Ré em Sanar os Vícios: Conforme narrado na inicial e não impugnado especificamente pela defesa, a autora procurou a requerida para solução amigável dos problemas, não obtendo resposta satisfatória, sendo necessário o ajuizamento da presente demanda. d) Abalo à Tranquilidade e Segurança: Os vícios relacionados ao sistema de drenagem e estrutura do imóvel comprometem a tranquilidade e segurança da moradia, bem jurídico de fundamental importância. A jurisprudência do Tribunal de Justiça de Mato Grosso, em situação análoga, firmou entendimento no sentido da reparação moral devida em casos dessa natureza: “RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL - SENTENÇA PARCIALMENTE PROCEDENTE – IRRESIGNAÇÃO RECURSAL – PRELIMINARES – PRAZO DECADENCIAL E DO PRAZO DE GARANTIA DE 5 (CINCO) ANOS - REJEITADAS – MÉRITO - RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA CONSTRUTORA – DANO MORAL E DEVER DE INDENIZAR – CONFIGURADO – SENTENÇA REFORMADA - SUCUMBÊNCIA PELO RÉU – RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL DA CONSTRUTORA PALEARE LTDA DESPROVIDO – RECURSO DE APELAÇÃO DE ANDRÉ LUIZ COSTA CRUZ PROVIDO – SENTENÇA REFORMADA. A pretensão cominatória de obrigar a construtora às providências necessárias ao saneamento do vício construtivo não se confunde com a mera substituição de produto ou reexecução de serviço, de modo que não se sujeita ao prazo decadencial previsto no art. 26 do Código de Defesa do Consumidor. À falta de prazo específico no CDC que regule a pretensão de indenização por inadimplemento contratual, deve incidir o prazo geral decenal previsto no art. 205 do CC/02. Comprovada a existência de vícios construtivos no imóvel e a responsabilidade da construtora, que não desconstituiu a prova apresentada, em conformidade com o art. 373, II, do CPC e art. 12 do CDC e reconhecido a ocorrência de transtornos e aborrecimentos ensejadores de dano moral indenizável, cabível a reparação perseguida. Ônus de sucumbência exclusivamente pela ré”. (N.U 1011813-66.2021.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SEBASTIAO BARBOSA FARIAS, Primeira Câmara de Direito Privado, Julgado em 19/04/2025, Publicado no DJE 19/04/2025). Portanto, evidenciado o nexo de causalidade entre a conduta omissiva da requerida e os transtornos experimentados pela autora, impõe-se o reconhecimento do dano moral indenizável, nos termos do art. 6º, VI, do Código de Defesa do Consumidor, e da responsabilidade objetiva do fornecedor prevista no art. 12 do mesmo diploma legal. Diante das circunstâncias específicas do caso concreto, especialmente a natureza dos vícios constatados (comprometimento do sistema de drenagem e segurança estrutural), o tempo de exposição da autora às consequências do defeito construtivo, a resistência da requerida em sanar os problemas e os transtornos efetivamente demonstrados, fixo a indenização por danos morais no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais). Tal quantia revela-se proporcional à extensão do dano e adequada ao caráter compensatório e pedagógico da condenação, além de estar em conformidade com os parâmetros fixados pela jurisprudência em situações semelhantes, evitando-se, de um lado, o enriquecimento sem causa e, de outro, a banalização da reparação moral. Ante o exposto, com fundamento nos artigos 487, inciso I, do Código de Processo Civil, 618 do Código Civil e 18 c/c 12 do Código de Defesa do Consumidor, JULGO PROCEDENTES os pedidos formulados por DAYANE ALVES SANTOS em face de MG CONSTRUÇÕES EMPREENDIMENTOS INCORPORADORA E CONSULTORIA DE OBRAS LTDA, e o faço para: · CONDENAR a requerida na OBRIGAÇÃO DE FAZER consistente em: a) Reformar o muro do imóvel nos moldes determinados pelo Engenheiro Gabriel Libardi de Souza no laudo pericial; b) Realizar a drenagem do terreno conforme especificações técnicas do laudo pericial; c) Executar os reparos necessários para as fissuras existentes em toda estrutura do imóvel, especificamente: - Demolição e reconstrução da canaleta no corredor lateral, obedecendo à declividade do terreno; - Reparos no muro lateral com substituição de material comprometido e aplicação de chapisco; - Adequação do sistema de drenagem no muro dos fundos; - Correção do dreno montante conforme dimensionamento técnico; Fixo o prazo de 30 dias, para o cumprimento, a contar do trânsito em julgado desta sentença. Em caso de descumprimento, converto automaticamente em perdas e danos no valor de R$ 6.175,32 (seis mil, cento e setenta e cinco reais e trinta e dois centavos), corrigido monetariamente pelo INPC a partir da data do laudo pericial (07/10/2024) e acrescido de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês a partir da citação, ABSORVENDO qualquer multa diária eventualmente aplicada durante o período de mora, por se tratar de reparação do mesmo dano material, evitando-se assim o bis in idem. · CONDENAR a requerida ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), quantia que se mostra adequada e proporcional aos transtornos específicos sofridos pela autora, observados os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, valor que deverá ser corrigido monetariamente pelo INPC a partir desta sentença (Súmula 362 do STJ) e acrescido de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês a partir da citação; · CONDENAR a requerida ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor total da condenação, nos termos do artigo 85, § 2º, inciso I, do Código de Processo Civil. Considerando que a autora foi vencedora na questão cuja elucidação exigiu prova técnica, DETERMINO que a requerida arque com a integralidade dos honorários periciais, no prazo de 10 (dez) dias. Com o depósito dos valores, autorizo desde já a expedição de alvará ao expert. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Após o trânsito em julgado, arquivem-se os autos com as baixas e anotações de praxe. Flávio Miraglia Fernandes Juiz de Direito

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