Kerly Rodrigues Batista x Kerly Rodrigues Batista
ID: 324488546
Tribunal: TJMT
Órgão: Quarta Câmara Criminal
Classe: APELAçãO CRIMINAL
Nº Processo: 1000587-25.2024.8.11.0020
Data de Disponibilização:
14/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
VALDINEI REIS SOUZA
OAB/DF XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUARTA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1000587-25.2024.8.11.0020 Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Assunto: [Decorrente de Violência Doméstica] Relator: Des(a). JUV…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUARTA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1000587-25.2024.8.11.0020 Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Assunto: [Decorrente de Violência Doméstica] Relator: Des(a). JUVENAL PEREIRA DA SILVA Turma Julgadora: [DES(A). JUVENAL PEREIRA DA SILVA, DES(A). LIDIO MODESTO DA SILVA FILHO, DES(A). HELIO NISHIYAMA] Parte(s): [POLÍCIA JUDICIÁRIA CIVIL DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0029-45 (APELANTE), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (APELANTE), KERLY RODRIGUES BATISTA - CPF: 978.032.351-15 (APELADO), VALDINEI REIS SOUZA - CPF: 006.774.621-74 (ADVOGADO), CARLOS BORGES DOS SANTOS - CPF: 697.145.171-68 (ASSISTENTE), ZILDA BARBOSA DOS SANTOS - CPF: 026.035.021-40 (VÍTIMA), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (APELADO), KERLY RODRIGUES BATISTA - CPF: 978.032.351-15 (APELANTE), VALDINEI REIS SOUZA - CPF: 006.774.621-74 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUARTA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). JUVENAL PEREIRA DA SILVA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE DEU PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR. E M E N T A DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA A MULHER. LESÃO CORPORAL. DOSIMETRIA DA PENA. DANO MORAL. GRATUIDADE DE JUSTIÇA. RECURSO DEFENSIVO DESPROVIDO E MINISTERIAL PARCIALMENTE PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Recursos de apelação interpostos pela defesa e pelo Ministério Público contra sentença penal condenatória que reconheceu a prática de crime de lesão corporal, previsto no art. 129, § 13, do Código Penal, combinado com a Lei n. 11.340/2006 (Lei Maria da Penha), e impôs pena de 1 (um) ano de reclusão em regime inicial aberto, cumulada com o pagamento de 1 (um) salário mínimo à vítima a título de indenização. A defesa pleiteia absolvição por ausência de dolo ou provas, subsidiariamente a redução da pena-base e a exclusão da indenização por dano moral. O Ministério Público requer majoração da pena-base e do valor indenizatório. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há cinco questões em discussão: (i) definir se há provas suficientes para a manutenção da condenação penal; (ii) estabelecer se a conduta do réu foi dolosa; (iii) verificar a existência de erro na fixação da pena-base; (iv) determinar a validade da condenação à indenização por dano moral; e (v) analisar a possibilidade de isenção de custas e despesas processuais. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A palavra da vítima, em casos de violência doméstica e familiar, tem especial relevância probatória, sobretudo quando coerente, firme e corroborada por outras provas, como laudo pericial, documentos policiais e depoimentos testemunhais. 4. A autoria e a materialidade do crime de lesão corporal restam suficientemente comprovadas nos autos, evidenciando agressões físicas, tentativa de enforcamento e uso de estilhaço de vidro pelo réu contra a companheira. 5. O dolo genérico necessário à configuração do crime de lesão corporal se evidencia pela voluntariedade do agente em realizar conduta violenta apta a lesionar a vítima, sendo irrelevante o resultado específico ou a intenção deliberada de produzir o dano. 6. Inviável a redução da pena-base para o mínimo legal, pois esta já havia sido fixada no patamar mínimo na sentença recorrida, o que configura ausência de interesse recursal. 7. É válida a condenação ao pagamento de indenização por dano moral, tendo em vista o pedido expresso na denúncia e a possibilidade de sua fixação mesmo sem instrução probatória específica, conforme Tema 983 do STJ e Enunciado n. 14-A da TCCR. 8. O pedido de isenção de custas deve ser analisado na fase de execução penal, não cabendo ao juízo de conhecimento afastar a condenação prevista no art. 804 do CPP, sendo a exigibilidade suspensa nos termos do art. 98, § 3º, do CPC. 9. Assiste razão ao Ministério Público quanto à majoração da pena-base, uma vez que a embriaguez voluntária do réu, circunstância agravante das condições do crime, foi indevidamente desconsiderada, autorizando sua valoração negativa nos termos do art. 59 do Código Penal. 10. Fixado acréscimo de 4 meses e 15 dias na pena-base, com aumento proporcional e justificado diante da especial reprovabilidade da conduta, especialmente pela embriaguez e violência exacerbada. 11. Inviável o pedido de majoração do valor indenizatório, porquanto o valor de um salário-mínimo revela-se proporcional à gravidade do fato e à capacidade financeira do ofensor. IV. DISPOSITIVO E TESE 12. Recurso defensivo desprovido. Recurso ministerial parcialmente provido. Tese de julgamento: 1. A palavra da vítima, em contexto de violência doméstica, possui especial relevância probatória quando coerente e corroborada por outros elementos de prova. 2. O dolo no crime de lesão corporal é configurado pela prática consciente de conduta violenta apta a gerar lesão, sendo desnecessário o dolo específico. 3. A embriaguez voluntária, quando agrava a reprovabilidade da conduta, é circunstância idônea para a majoração da pena-base nos termos do art. 59 do Código Penal. 4. A condenação por danos morais dispensa instrução específica quando houver pedido expresso na denúncia, conforme entendimento pacificado no Tema 983 do STJ. 5. A gratuidade de justiça não isenta o condenado das custas processuais, cabendo ao juízo da execução avaliar eventual suspensão da exigibilidade. Dispositivos relevantes citados: CP, arts. 59 e 129, § 13; CPP, arts. 387, IV, e 804; CPC, art. 98, §§ 2º e 3º; Lei n. 11.340/2006. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgRg no AREsp 2657189/TO, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, DJe 18.10.2024; STJ, REsp 1610041/MG (Tema 983), Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, Terceira Seção, DJe 01.08.2017; TJMT, N.U 1030553-89.2021.8.11.0003, Quarta Câmara Criminal, j. 08.10.2024, DJe 11.10.2024; TJMT, N.U 1004200-11.2023.8.11.0013, Quarta Câmara Criminal, j. 11.02.2025, DJe 13.02.2025. R E L A T Ó R I O Egrégia Câmara: Trata-se de recursos de apelação interpostos pelo Ministério Público e por Kerly Rodrigues Batista, contra sentença prolatada pelo Juízo da 1ª Vara da Comarca de Alto Taquari que, nos autos da ação penal n. 1000587-25.2024.8.11.0020, julgou procedente a denúncia e condenou Kerly pela prática do crime de lesão corporal, previsto no art. 129, § 13º, do Código Penal, com as implicações da Lei n. 11.343/2006, à pena de 1 (um) ano de reclusão, em regime inicial aberto, e o pagamento de 1 (um) salário mínimo à vítima, a título de indenização, nos termos do art. 387, IV, do CPP (sentença acostada ao id. 283955928). Nas razões recursais, o Ministério Público de primeiro grau, almeja a reforma parcial do édito condenatório, para que seja majorada a pena-base pela valoração negativa da circunstância judicial atinente ao fato de o delito ter sido praticado sob efeito de álcool, além do aumento do quantum indenizatório para valor não inferior a R$ 3.000,00 (três mil reais). (id. 283955938) Já o apelante Kerly Rodrigues Batista, sustenta a ausência de provas robustas para a condenação, a insuficiência do depoimento da vítima como elemento único, a ausência de dolo e, subsidiariamente, pleiteia a redução da pena ao mínimo legal e a exclusão da reparação de danos morais. Por fim, almeja a concessão do benefício da justiça e a isenção das custas processuais. (id. 283955942) As contrarrazões foram apresentadas pelas partes, consoante se infere das peças encartadas aos ids. 283955941 e 283955946. A Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra da eminente Dra. Josane Fátima de Carvalho Guariente, opinou pelo provimento parcial do recurso ministerial para valorar negativamente as circunstâncias do crime, em razão da embriaguez voluntária do réu; e, pelo não conhecimento do recurso defensivo no tocante ao pedido de redução da pena base, ante a evidente ausência de interesse recursal, e DESPROVIMENTO do apelo nos demais pontos, verbis: “Síntese ministerial: Recursos de Apelação Criminal – Violência Doméstica – Lesão Corporal (artigo 129, §13º, do Código Penal, com as implicações da Lei nº 11.340/2006) – Condenação – Irresignação defensiva e ministerial. Recurso de Ministério Público: Requer a majoração da pena base aplicada, mediante a valoração negativa das circunstâncias do crime na primeira etapa dosimétrica, haja vista o réu ter praticado o crime sob a influência de álcool – Possibilidade – A embriaguez voluntária do agente, deve ser considerada como fator negativo na análise das circunstâncias do crime, uma vez que potencializa o risco da conduta e a vulnerabilidade da vítima – Precedentes do STJ e do TJ/MT. Requer ainda, o aumento do quantum fixado pelo magistrado a quo a título de reparação dos danos causados à vítima, “para valor não inferior a R$ 3.000,00 (três mil reais).” – Inviabilidade – Embora o valor de 01 (um) salário mínimo arbitrado pelo juízo de primeiro grau possa parecer módico em um primeiro momento, é necessário considerar as condições econômicas do réu na fixação do quantum indenizatório, sob pena de tornar a obrigação inexequível. Consta dos autos que o réu declarou, em seu interrogatório extrajudicial, possuir renda mensal de R$ 2.000,00 (dois mil reais), exercendo a função de trabalhador rural. A defesa também enfatizou em suas razões recursais que o apelante "sobrevive do trabalho braçal a qual desempenha realizando serviço em fazenda" e que possui "renda estimada em menos de 2 (dois) salários mínimos.” – Sendo assim, entendo razoável e proporcional a fixação do quantum indenizatório em um salário mínimo, permitindo que a obrigação seja cumprida sem comprometer de maneira irrazoável a subsistência do apelado. Recurso da Defesa: Pretendida a absolvição por insuficiência de provas ou ausência de dolo – Improcedência – Materialidade e autoria delitivas comprovadas. A narrativa da vítima é convergente com as lesões atestadas no mapa topográfico para localização de lesões, razão pela qual não se deve desmerecer a versão apresentada pela ofendida – Em delitos praticados no âmbito familiar, a palavra da vítima ganha superlativa importância para a elucidação dos fatos, isso porque, na maioria das vezes, aqueles crimes são praticados longe dos olhos de testemunha, no recôndito do lar, como no presente caso – Precedentes do STJ e do TJ/MT – Ademais, em crimes de lesão corporal no contexto de violência doméstica, o dolo manifesta-se na própria ação de ofender a integridade física da vítima. Requestada a redução da pena base ao mínimo legal – Inexiste possibilidade jurídica do pedido de redução da pena, já aplicada em seu patamar mínimo, caracterizando evidente falta de interesse recursal neste ponto específico, o que impõe seu não conhecimento – Impossibilidade no acolhimento dos pleitos, que visam o afastamento da indenização imposta a título de dano moral à vítima e/ou a redução da quantia fixada. Tema 983, do STJ – O Superior Tribunal de Justiça assinala que o merecimento à indenização é ínsito à própria condição de vítima de violência doméstica e familiar – O dano moral é derivação direta da ocorrência das violências sofridas pela vítima – Outrossim, considerando que a análise para fixação de valor indenizatório deve se limitar à observância da função pedagógica de desestimulo à reiteração delitiva e a extensão do dano, sem causar prejuízo ao agressor, bem como sem gerar enriquecimento indevido por parte da vítima, tem-se que valor fixado é justo e adequado ao caso – Pretendida a concessão da justiça gratuita e isenção de custas – Impossibilidade – Competência do Juízo da Execução Penal. O parecer é pelo conhecimento e provimento parcial do recurso ministerial; e, pelo conhecimento parcial do recurso defensivo e, na parte conhecida, pelo seu desprovimento.” É o relatório. V O T O R E L A T O R Egrégia Câmara: Consoante relatado, trata-se de recursos de apelação interpostos pelo Ministério Público e por Kerly Rodrigues Batista, contra sentença prolatada pelo Juízo da 1ª Vara da Comarca de Alto Taquari que, nos autos da ação penal n. 1000587-25.2024.8.11.0020, julgou procedente a denúncia e condenou Kerly pela prática do crime de lesão corporal, previsto no art. 129, § 13º, do Código Penal, com as implicações da Lei n. 11.343/2006, à pena de 1 (um) ano de reclusão, em regime inicial aberto, e o pagamento de 1 (um) salário mínimo à vítima, a título de indenização, nos termos do art. 387, IV, do CPP. (sentença acostada ao id. 283955928). A defesa, de forma ampla, postula a absolvição de Kerly por ausência de provas ou de dolo da conduta. Subsidiariamente, pleiteia a redução da pena-base ao mínimo legal e a exclusão da reparação de danos morais, almejando, ainda, a concessão do benefício da justiça e a isenção das custas processuais. O Ministério Público, por sua vez, insurgiu-se contra a pena, buscando a sua majoração e do quantum fixado para reparação de dano. Para melhor compreensão do caso em debate, segue a transcrição da exordial acusatória: “(...) no dia 28 de março de 2024, por volta das 17h05min, na Rua Semião Martins Teixeira, casa de esquina, Município de Ponte Branca/MT, Kerly Rodrigues Batista, contra a mulher, por razões da condição do sexo feminino, ofendeu a integridade corporal da Sra. Zilda Barbosa dos Santos, sua companheira. Segundo se apurou, por ocasião dos fatos, o denunciado, embriagado, investiu fisicamente contra a ofendida e, nesse contexto, passou a enforcá-la. A vítima, no afã de se defender, travou luta corporal com o indiciado e precisou, em certo momento, fazer uso de uma faca, para se desvencilhar dele. Infere-se que o denunciado, ainda durante a prática delitiva, apossou-se de estilhaço de vidro e tentou golpear a ofendida, mas não logrou êxito. Em razão do entrevero, a ofendida sofreu a lesão materializada no Laudo Pericial de Id. 151916680. Por fim, a Polícia Militar foi acionada e logrou prender o denunciado em flagrante delito. Em vista do exposto, o Ministério Público DENUNCIA Kerly Rodrigues Batista como incurso no art. 129, § 13, do Código Penal, na forma da Lei Federal nº 11.340/2006 (...)” (id. 283955868). Do pleito absolutório formulado pela defesa: Em que pesem as alegações defensivas, ressai dos autos a comprovação da materialidade delitiva por meio dos seguintes documentos: auto de prisão em flagrante (id. 283955410); boletim de ocorrência (id. 283955411); termo de representação criminal (id. 283955428); mapa topográfico para localização de lesões (id. 283955432); pedido de providências protetivas (id. 283955443); relatório policial (id. 283955448); bem como pela prova oral produzida durante a instrução processual e sob o crivo do contraditório e da ampla defesa. De acordo com a vítima Zilda Barbosa dos Santos, na fase policial, relatou que mantém um relacionamento de cerca de três anos com Kerly Rodrigues Batista e que, no dia dos fatos (28/03/2024), após ambos consumirem bebida alcoólica na casa do cunhado, o acusado, tomado por ciúmes, começou a quebrar o armário da cozinha, passou a enforcá-la e a insultá-la com palavras de baixo calão. Diante da agressão, gritou por socorro e, em defesa, desferiu um golpe de faca nas costas do agressor. Relatou ainda que, no momento do golpe, Kerly tentava passar um estilhaço de vidro em seu pescoço. A guarnição policial chegou logo após, conduzindo ambos à Delegacia. Acrescentou que essa foi a segunda vez que foi agredida por ele e que sofreu um arranhão no joelho. Solicitou o deferimento de medida protetiva de urgência e manifestou desejo de representar criminalmente por injúria. No tocante à prova oral produzida em juízo, observa-se que os relatos prestados pela ofendida Zilda e pela testemunha policial militar Carlos Borges dos Santos revelam-se convergentes e dotados de firmeza, compondo um arcabouço probatório coeso e suficientemente consistente. Tal uniformidade nas versões apresentadas reforça a verossimilhança das imputações e confere sustentação segura à manutenção do decreto condenatório. Com efeito, em juízo, a vítima Zilda Barbosa dos Santos declarou que, no dia dos fatos, após ter ido preparar o almoço na casa do sogro, retornou para casa sozinha, enquanto o companheiro, Kerly, permaneceu bebendo na residência do irmão. Mais tarde, ele chegou embriagado e iniciou um episódio de violência, desferindo murros nos armários. Ao tentar puxar seu cabelo, a vítima reagiu com um soco. Afirmou que gritou por socorro e que a vizinha acionou a polícia. Disse ainda que o réu jogou um pedaço de vidro no chão, cujos estilhaços a atingiram, e que, para se defender, utilizou uma faca, provocando apenas um pequeno risco. Relatou que sofreu escoriações nas paredes da casa durante a briga e mencionou que não era a primeira vez que o acusado agia com agressividade. Confirmou que, naquele momento, estavam sozinhos na residência. Corroborando as palavras da ofendida, o policial militar Carlos Borges dos Santos relatou, em juízo, que atendeu à ocorrência após uma ligação anônima informando que uma mulher estava pedindo socorro. Ao chegar à residência, encontrou Kerly Rodrigues Batista fechando o portão, o qual relatou ter tido um desentendimento com sua esposa e autorizou a entrada da guarnição. No interior da casa, os policiais notaram o armário quebrado e estilhaços de vidro no chão. A vítima informou que ambos haviam ingerido bebida alcoólica e, após discussão, entraram em luta corporal. Disse que Kerly tentou agredi-la com um pedaço de vidro, e que ela, para se defender, pegou uma faca e acabou por feri-lo. A briga já havia cessado com a chegada da polícia, e a vítima manifestou o desejo de registrar a ocorrência, sendo, então, conduzida à delegacia de Alto Araguaia-MT. Já o apelante Kerly Rodrigues Batista alegou, em juízo, que ambos estavam bebendo na casa do irmão dele, já falecido. Segundo ele, após a companheira ir embora, permaneceu no local e, ao chegar em casa e abrir o portão, foi surpreendido por agressões da vítima, que teria desferido murros e socos e, posteriormente, apanhado uma faca. Alega que, para se defender, conteve a vítima contra a parede áspera da residência, causando-lhe escoriações. Afirmou que foi atingido por um risco de faca nas costas, que ela estava exaltada por ciúmes e devido ao seu estado de embriaguez. Admitiu ter quebrado o vidro do armário em razão de raiva, mas negou ter lançado qualquer objeto contra a vítima. Declarou, por fim, que estavam sozinhos no imóvel durante o episódio. Desse modo, após detida análise das provas colhidas nos autos, conclui-se pelo acerto da sentença de primeiro grau, sendo evidentes as provas em relação ao crime de lesão corporal, diante das declarações seguras prestadas pela vítima, em ambas as fases processuais. À vista deste cenário, ao contrário do sustentado pelo apelante, entendo que a autoria e materialidade do delito restam devidamente comprovadas pelo acervo probatório dos autos, inexistindo qualquer dúvida a respeito da dinâmica dos fatos delituosos e da responsabilidade penal do réu. É cediço que nos crimes de violência doméstica e familiar contra a mulher, a palavra da vítima é de extrema importância, mormente quando harmônica e coesa, como ocorre no caso dos autos. Nesse sentido a jurisprudência proclama que em crimes praticados no âmbito doméstico e familiar, a palavra da vítima assume especial relevância, visto que normalmente são praticados longe de testemunhas oculares, aproveitando-se o agente do vínculo que mantém com a ofendida, conforme se vê nos acórdãos a seguir; verbis: “APELAÇÃO CRIMINAL – DANO QUALIFICADO – AMEAÇA - LESÃO CORPORAL (ARTIGOS ART. 163, § ÚNICO, I, 147 E 129, § 13, TODOS DO CÓDIGO PENAL, COM OBSERVÂNCIA DA LEI N. 11.340/2006) – SENTENÇA CONDENATÓRIA – IRRESIGNAÇÃO DEFENSIVA – PRETENDIDA ABOLVIÇÃO POR AUSÊNCIA DE PROVAS DE TODOS OS FATOS NARRADOS NA DENÚNCIA (art. 386, VII, do CPP) – IMPOSSIBILIDADE - CONDUTA TÍPICA DEVIDAMENTE COMPROVADA – MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVA EVIDENCIADAS – DISPENSABILIDADE DE LAUDO PERICIAL FACE À EXISTÊNCIA DE DEMAIS PROVAS – DELITOS “ÀS ESCURAS” - DECLARAÇÕES DA VÍTIMA E INFORMANTE CONFIRMADAS EM JUÍZO – DEPOIMENTOS UNÍSSONOS - LAUDO PERICIAL COMPROVANDO AS LESÕES NA VÍTIMA – RELEVÂNCIA DA PALAVRA DA VÍTIMA – CONTEXTO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR (...) 2. No contexto da violência doméstica, a palavra da ofendida tem especial valor probatório, mormente quando narra os fatos de forma coerente e harmônica em todas as oportunidades em que é ouvida e está corroborada por laudo pericial, que descreve a existência de lesões corporais compatíveis com as agressões relatadas. (...) 4. Não há falar-se em absolvição em decorrência do princípio in dubio pro reo, quando a dinâmica dos fatos foi ratificada em juízo no sentido de que o acusado/apelante discutiu e ameaçou, evoluindo para as lesões constatadas em laudo de exame de corpo de delito. 5. A manutenção da condenação do apelante em relação aos crimes de dano, lesão corporal e ameaça é justificada quando as declarações da vítima são consistentes, coerentes e corroboradas por outras provas. (...)”. (N.U 1030553-89.2021.8.11.0003, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, LIDIO MODESTO DA SILVA FILHO, Quarta Câmara Criminal, Julgado em 08/10/2024, Publicado no DJE 11/10/2024). “Em contexto de violência doméstica e familiar contra a mulher, é de se emprestar especial relevância à palavra da vítima. Não há que se falar em absolvição do crime de ameaça quando comprovado nos autos a materialidade e autoria do fato atribuído ao agente, especialmente se a narrativa apresentada pela ofendida é segura, coerente e se harmoniza às provas dos autos, a comprovar a agressão sofrida”. (N.U 1010492-67.2022.8.11.0006, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, JOSE ZUQUIM NOGUEIRA, Segunda Câmara Criminal, Julgado em 11/11/2024, Publicado no DJE 18/11/2024). Destaca-se, por oportuno, que as agressões narradas pela vítima foram corroboradas pelo mapa de localização de lesões, o qual pode ser visto no id. 283955432, de cujo documento se depreende que houve ofensa à sua integridade corporal, posto que apresentava escoriações na cabeça e cotovelo, compatível com os fatos narrados em juízo. No tocante à tese defensiva de ausência de dolo, cumpre esclarecer que o crime de lesão corporal, previsto no art. 129 do Código Penal, exige apenas o dolo genérico, ou seja, a consciência e vontade de praticar conduta apta a produzir lesão à integridade física de outrem, sendo absolutamente despiciendo o dolo específico ou um propósito deliberado de causar o dano. No presente caso, a sequência fática delineada nos autos demonstra, de forma inequívoca, a presença do dolo na conduta do apelante, na medida em que, após o consumo voluntário de bebida alcoólica, passou a agredir fisicamente sua companheira, danificou o mobiliário da residência e chegou a manejar um estilhaço de vidro, inserido esse comportamento em um cenário típico de violência doméstica e familiar, caracterizado por animosidade, descontrole emocional e manifesta intenção de ofender a integridade da vítima que, por sua vez, tentou se defender do agressor. A presença do animus laedendi decorre não de uma confissão expressa de intenção de ferir, mas sim da análise objetiva da conduta empreendida e do resultado por ela produzido. No delito de lesão corporal, é suficiente que o agente queira realizar a ação típica, sendo irrelevante que não deseje o exato resultado lesivo que, porventura, se concretize. Trata-se da aplicação da teoria do dolo direto de primeiro grau ou, no mínimo, de dolo eventual. Portanto, ao agir de forma voluntária, ainda que em contexto de acalorada discussão, o apelante assumiu o risco de produzir o resultado lesivo que efetivamente se verificou, o que descaracteriza por completo a pretensão de desclassificação para modalidade culposa ou eventual absolvição por atipicidade. O ordenamento jurídico penal não tutela a imprudência deliberada travestida de arrependimento extemporâneo. Assim sendo, o pleito defensivo pela absolvição com fundamento na ausência de dolo, carece de respaldo jurídico e fático, devendo ser rechaçado de forma integral. Do pedido de redução da pena-base: No que tange ao pedido de redução da pena, conforme ressaltado no parecer ministerial, constata-se manifesta ausência de interesse recursal, porquanto a pena-base foi fixada pelo Juízo de origem no patamar mínimo legal de 1 (um) ano de reclusão, considerando-se todas as circunstâncias judiciais previstas no art. 59 do Código Penal como favoráveis ou neutras ao acusado. Dessa forma, inexistindo margem legal para nova redução da pena já imposta no seu limite mínimo, revela-se juridicamente inviável a pretensão recursal nesse ponto, o que enseja o não conhecimento do recurso quanto a esta específica matéria, por evidente carência de interesse recursal. Do pedido de exclusão do dever de indenizar: No que concerne ao afastamento da condenação de indenização por danos morais arbitrado na sentença condenatória, no valor de um salário-mínimo vigente à época dos fatos, é imperioso concluir que não assiste razão ao apelante. Isso porque consta pedido expresso na denúncia visando a condenação do apelante ao pagamento de dano moral em favor da vítima, o que garantiu a possibilidade de produção de provas (id. 283955868). Por conseguinte, na medida em que explicitado na denúncia, desde a citação e durante toda a instrução processual, a pretensão indenizatória do dominus litis era de conhecimento do apelante e de sua defesa técnica, de forma que foi possibilitada a ele, durante toda a instrução, tanto argumentar quanto produzir provas ou, de qualquer modo, se manifestar contra o aludido pedido indenizatório. Se o apelante não o fez, então é o caso de preclusão temporal, mas isso não significa que não lhe foi dada oportunidade para tal desiderato. Ao contrário, durante toda a instrução, havia possibilidade plena de atuação no sentido de rebater o pleito indenizatório, concretizando-se, a favor da defesa, o postulado do contraditório, na perspectiva substancial de efetivo poder de influência sobre o órgão jurisdicional. Destaque-se, ainda nessa senda, que conquanto tenha índole civil, o pedido de indenização por dano moral não deflagra uma instrução em separado, eis que tal indenização é consectário lógico da configuração da infração penal, que é caracterizada, como se sabe, pela conduta do agente, aliada ao dano psicológico à vítima, que, no caso destes autos, também é inerente à infração já reconhecida, de modo que ressai naturalmente a indenização invectivada como fator de recomposição do dano causado, na seara cível da vítima, pelo apelante pela conduta criminosa pela qual foi condenado. Entretanto, impende ressaltar que, mesmo detendo, o apelante, da possibilidade de efetiva produção probatória, em casos como o discutido nestes autos, tal requisito é dispensado pelo Superior Tribunal de Justiça, que, a partir do julgamento de recursos repetitivos, consolidou o Tema 983 nos seguintes moldes: “Nos casos de violência contra a mulher praticados no âmbito doméstico e familiar, é possível a fixação de valor mínimo indenizatório a título de dano moral, desde que haja pedido expresso da acusação ou da parte ofendida, ainda que não especificada a quantia, e independentemente de instrução probatória”. Esse mesmo entendimento vem sendo reiteradamente adotado por este Egrégio Tribunal de Justiça, conforme cristalizado no Enunciado Orientativo n. 14-A da Turma de Câmaras Criminais Reunidas (TCCR), segundo o qual: “A condenação a título de reparação de danos morais pressupõe pedido expresso do Ministério Público, da vítima ou de seu representante legal, mas dispensa instrução específica e efetiva comprovação do prejuízo, podendo o Juiz fixar o valor mínimo com base na gravidade e no modus operandi do delito.” Tal diretriz reconhece que, nos crimes praticados em contexto de violência doméstica e familiar, a reparação mínima a título de danos morais pode ser arbitrada judicialmente com base na ofensa perpetrada, independentemente de produção de prova específica quanto à extensão do dano, desde que requerida expressamente por legitimado. Por consequência, tanto pelo pedido de indenização constar na denúncia e permitir o contraditório durante todo o processo – contra-argumento e produção de provas – quanto pela prescindibilidade de tais fatores, na hipótese, não cabe cogitar de nenhuma ilegalidade na fixação de condenação ao pagamento, pelo apelante, de dano moral em favor da vítima. Dessarte, sem maiores delongas, deve ser mantida a reparação pelos danos morais, nos exatos termos em que fora deliberado na sentença, pois condizente e proporcional com o fato atribuído ao apelante, derivado da prática do crime de lesão corporal contra a vítima. Do pedido de gratuidade, isenção das custas e despesas processuais: Acerca da concessão dos benefícios da justiça gratuita, visando à isenção do pagamento das custas e despesas processuais pelo apelante, é imperativo anotar que esse pleito não tem consistência, porque sobre esse tema o art. 804 do Código de Processo Penal, é de clareza solar ao dispor que a sentença ou o acórdão, que julgar a ação, qualquer incidente ou recurso, condenará nas custas o vencido. Por conta disso, o juiz está obrigado a proceder tal condenação, sendo imperioso destacar que essa obrigatoriedade também está prevista no § 2º do art. 98 do Código de Processo Civil, que passou a regular a matéria nestes termos: Art. 98. [...] § 2.º A concessão de gratuidade não afasta a responsabilidade do beneficiário pelas despesas processuais e pelos honorários advocatícios decorrentes de sua sucumbência. Destacamos. Vê-se, pois, que inexiste previsão legal autorizadora da isenção do pagamento das despesas e custas processuais, porquanto, o que assegura o § 3º do art. 98 do Código de Processo Civil, ao carente financeiramente, é a suspensão de exigibilidade da referida obrigação enquanto perdurar o estado de insuficiência financeira do condenado, pelo prazo máximo de 5 (cinco) anos, quando, então, não havendo a quitação do débito e o credor não demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão da gratuidade, extingue-se as obrigações do beneficiário, consoante se infere da redação do dispositivo legal acima mencionado, in verbis: Art. 98. [...] § 3º. Vencido o beneficiário, as obrigações decorrentes de sua sucumbência ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade e somente poderão ser executadas se, nos 5 (cinco) anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que as certificou, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade, extinguindo-se, passado esse prazo, tais obrigações do beneficiário. [...]. Destacamos. Além do mais, não sendo exigível, de imediato, o pagamento da referida obrigação, é prudente que a análise da insuficiência financeira do apelante seja realizada na fase executiva, eis que, o assunto, haverá de merecer análise oportuna pelo juízo competente, sob pena de supressão de instância, não havendo, desse modo, falar-se em inobservância ao disposto no art. 5º, LXXIV, da Constituição Federal. E tal afirmação tem pertinência, eis que a exequibilidade, ou não, da referida obrigação é matéria a ser tratada no juízo das execuções penais, que levará em conta a sua situação econômico-financeira, quando da apreciação do pedido, momento no qual, ele poderá ou não, ser beneficiado com a isenção condicional. A propósito, no que alude à temática, esta é a posição deste Tribunal de Justiça: “A isenção das custas processuais não se aplica automaticamente aos beneficiários da justiça gratuita, sendo possível apenas a suspensão de sua exigibilidade pelo prazo de 5 anos, contados da sentença final, após o qual, persistindo a miserabilidade do sujeito, a obrigação restará prescrita, sendo de competência do d. Juízo da Execução Penal a análise da possibilidade ou não de suspensão da obrigação..” (TJMT, N.U 0000616- 16.2014.8.11.0094, Rel. Des. Gilberto Giraldelli, Terceira Câmara Criminal, Julgado em 12/02/2025, Publicado no DJE 14/02/2025). “(...) eventual suspensão da exigibilidade, em virtude da precária condição financeira do condenado, constitui matéria a ser aferida no momento do cumprimento da sentença, pelo juízo competente” (TJMT. N.U 1017165-89.2023.8.11.0055, Rel. Des. Orlando de Almeida Perri, Primeira Câmara Criminal, DJe 10/12/2024). Dessa forma, o pedido de isenção de custas e despesas processuais deve ser direcionado ao Juízo da Vara de Execuções Penais, o qual possui competência para decidir temas relacionados à fase executória, conforme jurisprudência consolidada pelo Superior Tribunal de Justiça (REsp 748.664/RS, Quinta Turma, DJe 06/08/2007). Do apelo do Ministério Público: Assiste plena razão ao Ministério Público quanto à pretensão de majoração da pena-base, diante da necessidade de valoração negativa das circunstâncias do crime. A análise dos autos revela que o apelado praticou o delito sob a influência de álcool, elemento que, longe de justificar ou atenuar a sua conduta, aumenta significativamente sua reprovabilidade, haja vista o risco potencializado à integridade da vítima e a maior agressividade decorrente do estado de embriaguez. Trata-se, portanto, de circunstância relevante a ser considerada na primeira fase da dosimetria da pena, nos termos do art. 59 do Código Penal, especialmente no tocante à análise das circunstâncias do crime. O juízo a quo, contudo, deixou de valorar negativamente esse aspecto, incorrendo em omissão. Ressalta-se que tanto a vítima quanto a testemunha policial afirmaram que o réu se encontrava embriagado no momento dos fatos. O próprio acusado, em sede de interrogatório judicial, confessou o uso de bebida alcoólica, conforme trecho: “Estávamos bebendo na casa do meu falecido irmão (...) Ela estava nervosa porque eu estava bêbado.” Dessa forma, impõe-se a retificação da dosimetria com a devida valoração negativa dessa circunstância, nos termos da jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça, que admite a embriaguez voluntária como fator de exasperação da pena-base, verbis: “Quanto à valoração negativa da vetorial das circunstâncias do crime, o TJ reconheceu que o estado de embriaguez do acusado, por ocasião das práticas delitivas, era motivo idôneo para a negativação. Correto o entendimento da origem. Com efeito, à luz da jurisprudência desta Corte, o estado de embriaguez do agente não pode ser reputado elemento ínsito ao crime de ameaça, tampouco ao de lesão corporal. Portanto, no caso dos autos, o fato de o recorrente estar embriagado no momento da prática dos delitos é motivo idôneo para negativação da vetorial das circunstâncias do crime. Precedentes.” (STJ – AgRg no AREsp: 2657189 TO 2024/0199137-4, Relator.: Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, Data de Julgamento: 15/10/2024, T5 – QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 18/10/2024). Destacamos No mesmo sentido é o posicionamento desta Corte de Justiça: “Conforme jurisprudência da Corte Superior, “o estado de embriaguez do agente não pode ser reputado elemento ínsito ao crime (...) de lesão corporal. Portanto, (...) o fato de o recorrente estar embriagado no momento da prática dos delitos é motivo idôneo para negativação da vetorial das circunstâncias do crime”. (STJ - AgRg no AREsp: 2657189 TO 2024/0199137-4, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, T5 - Quinta Turma, j. em 15/10/2024, Data de Publicação: DJe 18/10/2024). IV. Dispositivo e tese: Recurso desprovido. Tese de julgamento: “1. O consumo de álcool como circunstância judicial desfavorável pode ser considerado na dosimetria da pena quando evidenciado que a embriaguez influenciou negativamente o contexto do ato criminoso, especialmente em situações de violência doméstica. 2. A embriaguez, não sendo elementar do tipo penal, é motivo idôneo para negativação da vetorial das circunstâncias do crime”. (N.U 1004200-11.2023.8.11.0013, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, LIDIO MODESTO DA SILVA FILHO, Quarta Câmara Criminal, Julgado em 11/02/2025, Publicado no DJE 13/02/2025). Destacamos Do contexto dos autos, infere-se que a conduta perpetrada pelo réu revela-se dotada de especial censurabilidade, não apenas pela circunstância de estar embriagado, mas também pelo grau de violência empregado. O acusado, além de quebrar o armário da cozinha, utilizou estilhaços de vidro como instrumento ameaçador e tentou enforcar a vítima, atitudes que evidenciam elevada agressividade e risco concreto à integridade física da ofendida, claramente exacerbados pelo estado de embriaguez voluntária. Diante desse contexto, mostra-se imperiosa a valoração negativa das circunstâncias do crime na primeira fase da dosimetria, conforme autoriza o art. 59 do Código Penal, exigindo-se a majoração da pena-base para além do mínimo legal, como forma de refletir adequadamente a maior reprovabilidade da conduta. Adotando-se a fração de 1/8 do intervalo entre o mínimo (1 ano) e o máximo (4 anos) da pena cominada – parâmetro consagrado na jurisprudência pátria –, obtém-se um acréscimo de 4 meses e 15 dias, resultando em uma pena-base de 1 (um) ano, 4 (quatro) meses e 15 (quinze) dias de reclusão. Tal quantitativo atende ao critério da proporcionalidade e ao princípio da individualização da pena. Da almejada majoração do valor indenizatório: Quanto ao pedido ministerial de majoração do valor fixado a título de reparação por danos morais, entendo que uma análise criteriosa do caso impõe uma postura de moderação e razoabilidade na fixação do quantum indenizatório. É certo que, conforme jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça, em se tratando de violência doméstica, os danos morais são presumidos (in re ipsa), decorrendo diretamente da própria natureza da ofensa, dispensando-se a demonstração concreta do prejuízo sofrido. Todavia, não se pode olvidar que a fixação do valor da indenização deve observar não apenas a gravidade do fato e o caráter pedagógico da sanção, mas também a capacidade econômica do ofensor, sob pena de comprometer a exequibilidade da obrigação e vulnerar o princípio da proporcionalidade. Nos autos, o réu declarou possuir renda mensal de aproximadamente R$ 2.000,00, exercendo atividade braçal como trabalhador rural. A própria defesa reiterou tal condição nas razões recursais, destacando sua subsistência com menos de dois salários mínimos. Dessarte, conquanto seja legítimo o intento ministerial de ver majorado o valor fixado, o montante de R$ 3.000,00 pleiteado revela-se excessivo frente às condições econômicas do apelado, correspondendo a mais de um mês e meio de sua renda integral, o que poderia inviabilizar o cumprimento da obrigação sem comprometer a dignidade mínima do ofensor. Assim, sopesando o necessário equilíbrio entre o ressarcimento à vítima, a função educativa da medida e a viabilidade econômica do devedor, reputo adequado manter o valor arbitrado pelo juízo a quo, correspondente a 01 (um) salário-mínimo, ou seja, R$ 1.412,00 (mil quatrocentos e doze reais), quantia suficiente para atender à finalidade reparatória, sem configurar imposição desarrazoada. À vista de todo o exposto, em consonância com o parecer ministerial, não conheço do pedido da defesa de redução da pena-base para o mínimo legal e nego provimento ao seu recurso em relação as demais teses. Em relação recurso do Ministério Público dou provimento parcial para majorar a sanção basilar imposta a Kerly Rodrigues Batista para 1 (um) ano, 4 (quatro) meses e 15 (quinze) dias de reclusão, em regime aberto, mantidos os demais termos do édito condenatório. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 08/07/2025
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