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Processo nº 1012973-89.2022.8.11.0042

ID: 330000931

Tribunal: TJMT Órgão: Primeira Câmara Criminal Classe: APELAçãO CRIMINAL Nº Processo: 1012973-89.2022.8.11.0042

Data de Disponibilização: 21/07/2025

Polo Ativo:

LUIZ CARLOS ANTONIO DE OLIVEIRA

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

ALESSANDRO CASTRO DA SILVA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1012973-89.2022.8.11.0042 Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Assunto: [Injúria, Violência Doméstica Contra a Mulher, Vias de… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1012973-89.2022.8.11.0042 Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Assunto: [Injúria, Violência Doméstica Contra a Mulher, Vias de fato] Relator: Des(a). ORLANDO DE ALMEIDA PERRI Turma Julgadora: [DES(A). ORLANDO DE ALMEIDA PERRI, DES(A). MARCOS MACHADO, DES(A). WESLEY SANCHEZ LACERDA] Parte(s): [POLÍCIA JUDICIÁRIA CIVIL DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0029-45 (APELADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (APELADO), LUIZ CARLOS ANTONIO DE OLIVEIRA - CPF: 627.759.361-72 (APELANTE), ALESSANDRO CASTRO DA SILVA - CPF: 023.436.831-40 (ADVOGADO), LUCIANA DA COSTA RAMOS OLIVEIRA - CPF: 005.470.751-03 (VÍTIMA)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). WESLEY SANCHEZ LACERDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 1012973-89.2022.8.11.0042 APELANTE: LUIZ CARLOS ANTONIO DE OLIVEIRA APELADO: MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO EMENTA. DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. INFRAÇÃO ENVOLVENDO VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER. VIAS DE FATO. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA ESTATAL. REJEIÇÃO. INOCORRÊNCIA DO TRANSCURSO DO LAPSO TEMPORAL PREVISTO EM LEI. PRETENDIDA ABSOLVIÇÃO POR INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA. DESCABIMENTO. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS PELO RELATO FIRME E COERENTE DA VÍTIMA EM AMBAS AS FASES DA PERSECUÇÃO PENAL. PRESCINDIBILIDADE DE LAUDO PERICIAL. DELITO QUE NEM SEMPRE DEIXA VESTÍGIOS. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame. 1. Recurso de apelação interposto contra sentença que condenou o acusado à pena de 17 dias de prisão simples, no regime inicial aberto, pela prática de vias de fato (art. 21 da LCP), com incidência da Lei Maria da Penha. II. Questões em discussão. 2. Há duas questões em discussão, saber se: (i) operou-se a prescrição da pretensão punitiva estatal; (ii) a absolvição é devida por insuficiência de provas quanto à autoria delitiva. III. Razões de decidir. 3.1. Não ocorrendo o transcurso do lapso temporal previsto em lei, descabida a extinção da punibilidade por força da prescrição da pretensão punitiva estatal. 3.2. A materialidade e autoria delitivas estão comprovadas por boletim de ocorrência, avaliação de risco, medidas protetivas e declarações firmes da vítima em todas as fases processuais. 3.3. A jurisprudência reconhece o especial valor probatório da palavra da vítima em casos de violência doméstica, quando coerente e verossímil. 3.4. A negativa do acusado não encontra respaldo nos autos, sendo insuficiente para afastar a condenação. IV. Dispositivo e tese 4. Recurso desprovido. Teses de julgamento: “1. Não se reconhece a prescrição da pretensão punitiva quando não transcorrido o prazo legal, especialmente diante de causa interruptiva válida”. “2. É válida a condenação por vias de fato no contexto de violência doméstica com base no depoimento firme e coerente da vítima, ainda que desacompanhado de laudo pericial.” Dispositivos relevantes citados: CP, arts. 107, IV; 109, VI; 117, I. Jurisprudência relevante citada: TJMT, Apelação Criminal n. 1000395-26.2023.8.11.0021, Rel. Des. Rui Ramos Ribeiro; Apelação Criminal n. 1006099-65.2020.8.11.0040, Rel. Des. Pedro Sakamoto. ESTADO DE MATO GROSSO TRIBUNAL DE JUSTIÇA PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 1012973-89.2022.8.11.0042 APELANTE: LUIZ CARLOS ANTÔNIO DE OLIVEIRA APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO R E L A T Ó R I O Cuida-se de Recurso de Apelação Criminal aforado por LUIZ CARLOS ANTÔNIO DE OLIVEIRA, contra a sentença proferida pelo Juízo da 2ª Vara Esp. De Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher de Cuiabá/MT (autos n. 1012973-89.2022.8.11.0042), que julgou a denúncia procedente e o condenou à pena de 17 (dezessete) dias de prisão simples, no regime inicial aberto, pela prática de vias de fato [art. 21, da Lei de Contravenções Penais], com as implicações da Lei n. 11.340/2006. A defesa postula: 1) o reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva estatal, haja vista o transcurso de “mais de 2 anos entre o fato [...] e a sentença condenatória”; 2) a absolvição do acusado, sob o argumento de que as provas constantes nos autos se mostram frágeis e insuficientes para caracterizar a autoria do delito, notadamente em razão da ausência de juntada de laudo pericial, devendo prevalecer a parêmia in dubio pro reo [doc. digital n. 277196374]. A 22ª Promotoria de Justiça Criminal de Cuiabá/MT manifesta-se pelo desprovimento do apelo defensivo [doc. digital n. 279405362]. O Procurador de Justiça, Élio Américo, opina pelo improvimento do recurso [doc. digital n. 290657929]. É o relatório. Inclua-se em pauta para julgamento. PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 1012973-89.2022.8.11.0042 VOTO EXMO. SR. DES. ORLANDO DE ALMEIDA PERRI (RELATOR) Egrégia Câmara: O Ministério Público denunciou LUIZ CARLOS ANTÔNIO pela prática do delito previsto no artigo 21, da lei de Contravenções Penais, com as implicações na Lei n. 11.340/06, consoante se extrai de trechos da exordial acusatória, verbis: “Consta do incluso Inquérito Policial que, no dia 19 junho de 2022, por volta das 16h00min, em residência situada na Cardeal, número 26, bairro CPA IV, nesta cidade e Comarca de Cuiabá/MT, ciente da ilicitude e reprovabilidade de sua conduta, o denunciado LUIZ CARLOS ANTÔNIO DE OLIVEIRA praticou vias de fato contra a vítima Luciana da Costa Ramos Oliveira, sua companheira. Ressai dos autos que o denunciado e a vítima conviveram por cerca de vinte e dois anos e tiveram três filhos em comum. Ressai do Inquérito Policial, que durante o relacionamento, o denunciado injuriava a vítima constantemente, conforme registro de Boletim de Ocorrência de n. 2021.34558, razão pela qual ela decidiu se separar, porém, mas adiante acabou por reatar o relacionamento com o denunciado. Na data do fato, por volta das 16h, o denunciado chegou na residência com sinais de embriaguez, ao que o filho do casal perguntou ao denunciado “pai você me deixou sozinho?”, e foi surpreendido com o denunciado dizendo “te deixaram sozinho, não nega a raça que tem mesmo”, momento que a vítima se aproximou para observar o que estava acontecendo. Ato contínuo, sem motivo aparente, o denunciado passou a ofender a vítima, não satisfeito, o increpado a empurrou. [...]” (doc. digital n. 265034257). Por não ter sido oferecida queixa-crime em relação ao crime previsto no artigo 147, caput, do Código Penal, o juízo sentenciante extinguiu a punibilidade do acusado; contudo, julgou procedente a denúncia para condená-lo pela contravenção penal de vias de fato. Em síntese, a defesa busca o reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva e, subsidiariamente, a absolvição do acusado pela falta de provas da autoria delitiva. QUESTÃO PREJUDICIAL DE MÉRITO. RECONHECIMENTO DA PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA ESTATAL RETROATIVA. A defesa sustenta que, em razão da reprimenda imposta [17 (dezessete) dias de prisão simples], a prescrição deve se operar no prazo de 2 (dois) anos, nos termos dos artigos 107, IV e 109, VI, do Código Penal. Sustenta que os fatos remontam o dia 19 de junho de 2022 e que a sentença condenatória somente foi prolatada em 2 de dezembro de 2024, configurando-se, no seu entender, o transcurso do lapso prescricional legal. Entretanto, equivoca-se o douto defensor em seu raciocínio, porquanto: 1) o delito em questão ocorreu em 19 de junho de 2022, sendo inaplicável a antiga redação do artigo 109, VI, do Código Penal, que previa o prazo prescricional de 2 (dois) anos, em razão da alteração promovida pela Lei n. 12.234/2010; 2) ainda que se cogitasse, em tese, a argumentação apresentada – o que, repita-se não é o caso dos autos –, desconsiderou-se a causa interruptiva do prazo prescricional prevista no artigo 117, I, do Código Penal, consistente no recebimento da denúncia, ocorrido em 18 de dezembro de 2023. Desse modo, não transcorrido o prazo prescricional de 3 (três) anos previsto no ordenamento jurídico vigente [CP, art, 109, VI], rejeito a questão prejudicial suscitada pela defesa. M É R I T O Em relação à absolvição, o pedido não merece acolhimento. A materialidade e a autoria delitiva estão consubstanciadas no boletim de ocorrência n. 2022.169748 (doc. digital n. 265032441 – p. 2-4), formulário nacional de avaliação de risco violência doméstica e familiar contra a mulher (doc. digital n. 265032441 – p. 5-7), pedido de providências protetivas (doc. digital n. 265032441 – p. 16-17), relatório policial n. 2022.12.10108 (doc. digital n. 265032448), e nos depoimentos de testemunhas. L. da C.R.O. descreveu o ocorrido da seguinte maneira: “O autor dos fatos se trata de seu marido, LUIZ CARLOS ANTONIO DE OLIVEIRA, 45 anos de idade, vendedor, que estão casados há 22 (VINTE E DOIS) anos e que estão separados de corpos há 02 (DOIS) meses, e que juntos possuem três filhos, LUDYMILLA CRISTINA DA COSTA OLIVEIRA, 20 (VINTE) anos de idade, LUCAS EMANUEL DA COSTA OLIVEIRA, 05 (CINCO) anos de idade e MARIA LUIZA DA COSTA OLIVEIRA, 11 (ONZE) anos de idade; Perguntado qual a data e horário dos fatos relatados, ela respondeu QUE: O último fato ocorreu dia 19/06/2022, por volta das 16:00 horas; Perguntado quais as circunstâncias do evento, ou seja, como aconteceram todos os fatos, ela respondeu [...]. QUE o inicio do relacionamento destes era tranquilo. QUE após 02 (DOIS) anos de casados, o suspeito mudou totalmente seu comportamento para com a vítima. QUE o suspeito é muito nervoso e descontrolado. QUE o suspeito passou a humilhar a vítima dizendo VOCÊ É PORCARIA, VOCÊ NÃO SERVE PARA FAZER NADA, NEM MULHER NA CAMA VOCÊ PRESTA PARA SER. QUE o suspeito faz uso abusivo de álcool. QUE diariamente o suspeito está alcoolizado. QUE a vítima registrou Boletim de Ocorrências contra o suspeito nº 2021.34558, sobre o Crime de Injúria Real, e que foi solicitado Medidas Protetivas de Urgência. QUE estes não ficaram juntos por mais de 60 (SESSENTA) dias. QUE a vítima reatou o relacionamento com o suspeito pois ainda sentia sentimentos pelo suspeito e em razão dos filhos destes, mas que estes estavam residindo separados. QUE no mês de FEVEREIRO/2022, estes retornaram a residir juntos. QUE o suspeito voltou com os mesmos comportamentos agressivos. QUE a vítima desenvolveu HIPERTENSÃO, e teve que fazer atividade física, e que o suspeito passou a dizer a vítima VOCÊ ESTA INDO NA ACADEMIA ATRÁS DE HOMEM, que a vítima não dizia nada para não gerar mais discussões. QUE o suspeito passou a insinuar que a vítima estava o traindo, mas que a vítima negou pois é mentira. QUE o suspeito diz a vítima, a seus filhos e familiares EU TENHO OUTRA MULHER MESMO, LUCIANA NÃO PRESTA PRA NADA NA CAMA. QUE no mês de ABRIL/2022, a vítima viu mensagens no aparelho celular do suspeito com outra mulher, e que a vítima após ver decidiu ignorar o suspeito, que o suspeito percebeu e foi perguntar o que havia acontecido, e que esta disse ter lido mensagens do suspeito com outra mulher no celular do mesmo, e que o suspeito negou dizendo ser cliente deste. QUE após esse fato estes se separaram de corpos. QUE na data do fato dia 19/06/2022 por volta das 16:00 horas, o suspeito chegou na residência bêbado, e que o filho menor LUCAS destes perguntou ao suspeito PAI VOCÊ ME DEIXOU SOZINHO?, e que o suspeito alterado disse ao menor TE DEIXARAM SOZINHO, NÃO NEGA A RAÇA QUE TEM MESMO, que a vítima estava na residência, e que foi ver o que estava acontecendo, e que o suspeito quando viu a vítima disse VOCÊ É UMA VAGABUNDA MESMO, SUA PORCARIA, que a vítima disse OLHA O QUE VOCÊ ESTA FALANDO, AS CRIANÇAS ESTÃO PERTO, PARA POR FAVOR, que o suspeito disse a vítima ALÉM DE VOCÊ ESTAR COM AMANTES, VOCÊ É UMA LÉSBICA, que a vítima disse PENSE O QUE VOCÊ QUISER, EU ESTOU COM A MENTE TRANQUILA, que o suspeito EMPURROU a vítima, e que quase a vítima bateu na parede, e que o suspeito continuou xingando a vítima VAGABUNDA, e que a vítima disse FALA QUE EU SOU VAGABUNDA DE NOVO, e que o suspeito disse É VAGABUNDA, PROSTITUTA, RAPARIGA, e que a vítima EMPURROU o suspeito, e que o suspeito disse VAI PROCURAR A MARIA DA PENHA SUA VAGABUNDA. QUE os fatos foram presenciados pelos filhos menores destes. QUE a vítima foi trabalhar no dia do fato e não retornou a residência até o momento. QUE a vítima solicita o afastamento do agressor do lar e deseja sua recondução ao lar. QUE a vítima está muito abalada emocionalmente. QUE a vítima irá encaminhar ao e-mail desta especializada a cópia do documento dos menores para o pedido de Pensão Alimentícia. Perguntado qual o teor da ameaça e se o autor utilizou de algum instrumento, qual foi ele, ela respondeu QUE: NÃO HOUVE AMEAÇA; Perguntado se na data dos fatos, além de ter sido AMEAÇADA, a declarante também sofreu a prática de outros crimes, como, injúria, calúnia ou difamação e, neste caso, qual o teor da ofensa, ela respondeu QUE: INJÚRIA REAL; Perguntado se após os fatos a declarante continuou tendo contato com o autor, ela respondeu QUE: NÃO; Perguntado se houve testemunhas presenciais dos fatos, quem são e onde podem ser localizadas, ela respondeu QUE: NÃO; Perguntado se a declarante deseja representar criminalmente contra o(a) autor(a) a fim de que seja investigado (a), processado(a) e condenado(a) pela prática do crime, ela respondeu: SIM; Perguntado se a declarante gostaria de receber MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA, ela respondeu que: SIM; Perguntado se a declarante gostaria de tecer alguma observação a respeito do evento, ela respondeu QUE: QUE DESEJA MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA A FIM DE GARANTIR SUA INTEGRIDADE FÍSICA E PSICOLÓGICA; Perguntado se a declarante tem interesse no ressarcimento dos danos materiais e/ou morais e, qual o valor da indenização, ela respondeu QUE: NÃO; Perguntado se a declarante gostaria de receber o serviço da PATRULHA MARIA DA PENHA, ela respondeu QUE: SIM, deseja receber o serviço da PATRULHA MARIA DA PENHA; Perguntado se a declarante deseja ir para Casa de Amparo, ela respondeu QUE: NÃO [...]” (doc. digital n. 265032441). Quando interrogado, LUIZ fez uso do direito constitucional ao silêncio (doc. digital n. 265032442). Em juízo foi ouvida a vítima e realizado o interrogatório do acusado. Nesta etapa, L. reafirmou as declarações prestadas e acrescentou: “Ofendida: Nessa data foi quando eu estava no quarto e achei que ele estava em casa com meu filho […]. Sai e vi meu filho sozinho […], falou que o pai tinha saído […]. Ele chegou embriagado do bar e eu questionei ele, e aí ele me disse: é uma vagabunda […]. E falou que era eu quem tinha largado o menino […], me xingou de tudo […]. Ele nem procurava saber onde eu tava, mas ele sabe por onde eu andava e me xingou […]. Ele falava que eu era lésbica, falou tanta coisa […] nesse dia discutimos na frente da criança […] xingou minha mãe, minha irmã […]. Saiu na área falando que eu era uma puta, biscate […]. Ele me empurrou, discutimos, ele me empurrou eu fui até na parede […], começou a gritar […]. A gente estava afastado de corpos […], peguei um monte de mensagem de mulher no celular dele […]. Já teve outras vezes que ele me agrediu. Uma vez me ameaçou de morte […] da segunda vez ele queria […] me agrediu. Me forçou a ter relação sexual com ele. Essas situações foram anteriores […]. Peguei as crianças e fui embora […] ele queria briga, caçar briga de qualquer jeito e falou para eu procurar a Lei Maria da Penha […] e ele ficou na casa […]. Eu me senti humilhada, fiquei com problema emocional por muito tempo, fiquei hipertensa, tomo medicação […]. Na casa só estava eu e as crianças. Defesa: […] no dia, ele xingou a senhora, tem como contar […] o que aconteceu para entendermos essa história. Ofendida: Cheguei em casa, ele estava em casa, tava descansando […], nunca tive conhecimento de amigos dele. Ele ficou em casa, eu tava no quarto […]. Ele era muito alterado, ofendia mesmo, era só xingamento […]. O fato foi num domingo […]. Defesa: No dia, ele chegou sem motivo e empurrou? Ofendida: Foi o que eu contei, estava no quarto, largou meu menino sozinho e foi para o bar. Vi meu filho sozinho […], ele falou que tinha ido pro bar […]. Quando ele chegou falei o porquê tinha deixado o menino sozinho […] aí começou […] a me xingar de tudo […] na frente dos meus filhos. Ele começou a sair na rua, gritando […]. Ele me empurrou, quando tava discutindo ele me empurrou. Ele queria brigar […], peguei meus filhos e fui para casa da minha mãe […]. Eu não ia chamar a polícia na frente dos meus filhos, jamais queria ver meus filhos sofrendo mais ainda, por isso saí da casa […]. Defesa: Esse empurrão que ele deu na senhora, machucou a senhora [...]? Ofendida: Ele me empurrou contra a parede. E quando a gente tava discutindo ele veio pra cima de novo […]. A gente depois ficou morando em casas separadas, depois ele resolveu voltar […] que ele não tinha condição […] eu falei, tudo bem, mas continuou as mesmas coisas, mesmos problemas […]” (mídia: 1012973-89.2022.8.11.0042 - Depoimento da vitima Luciana da Costa Ramos.mp4) Quando interrogado, o acusado negou as práticas delitivas e relatou: “Luiz Carlos: Convivi maravilhosos vinte anos […]. Luciana é uma pessoa maravilhosa […]. A gente sempre viveu bem. Dia de domingo ela trabalha no água parque […], sempre vivemos harmoniosamente bem. Nego veementemente esses fatos […]. Jamais, saí e deixei meu filho sozinho […]. Nada aconteceu nessa data […]. Eu desconheço porque dessa denúncia […]. Assistente de acusação: O senhor tem problema com álcool? Luiz Carlos: Eu não […]. Jamais […]” (mídia: 1012973-89.2022.8.11.0042 - interrogatorio do acusado Luiz Carlos.mp4) No caso em apreço, extrai-se dos autos que, nas duas oportunidades em que foi ouvida, a vítima, L., manteve a coerência e linearidade de seu relato. Narrou que, na data dos fatos, o apelante ausentou-se do lar para consumir bebida alcoólica em um bar situado nas imediações da residência do casal, deixando, no interior do imóvel, um dos filhos menores, cuja responsabilidade lhe competia naquele momento. Afirmou que, ao regressar, interpelou o recorrente acerca de sua conduta negligente, ocasião em que ele teria iniciado uma sequência de ofensas verbais, e, em seguida, a empurrou com força, lançando-a contra a parede. Acrescentou que tal episódio não foi isolado, mas inserido em um contexto de violência doméstica reiterada, na qual, sempre sob efeito de álcool, o acusado a insultava verbalmente e a submetia a agressões psicológicas. Ao final, disse que teve que se submeter a tratamento com medicamentos e que, em razão do histórico de violência, requereu a concessão de medidas protetivas de urgência em desfavor dele. LUIZ CARLOS, por sua vez, foi interrogado apenas em juízo, oportunidade em que apresentou versão exculpatória, negando qualquer episódio de agressão ou abuso, bem como minimizou a relação conflituosa com a vítima, a quem descreveu como “uma pessoa maravilhosa”. Por fim, negou possuir qualquer problema com o consumo de álcool e afirmou desconhecer os motivos pelos quais estaria sendo acusado na presente ação penal. Como é cediço, as vias de fato se caracterizam como uma agressão mais leve, que não deixa vestígios. A contravenção penal é assim definida por Guilherme de Souza Nucci, verbis: “O tipo penal padece de vício quanto à taxatividade, pois não específica em que consiste, exatamente, esse formato de violência. Aliás, a doutrina termina definindo – o que seria trabalho do legislador – esta contravenção penal por exclusão, isto é, constitui vias de fato toda agressão física contra a pessoa, desde que não constitua lesão corporal. Por todos, confira-se a lição de Marcelo Jardim Linhares: ‘conceituam-se as vias de fato como a briga ou a luta quando delas não resulta crime; como a violência empregada contra a pessoa, de que não decorre ofensa à sua integridade física. Em síntese, vias de fato são a prática de perigo menor, atos de provocação exercitados materialmente sobre a pessoa, ou contra a pessoa. Assim, empurrá-la sem razão, sacudi-la, rasgar-lhe a roupa, agredi-la a tapas, a socos ou a pontapés, arrebatar-lhe qualquer objeto das mãos ou arrancar-lhe alguma peça do vestuário, puxar-lhe os cabelos, molestando-a [...]” (Leis Penais e Processuais Penais Comentadas, vol. 1, 8. ed., Forense: Rio de Janeiro, 2014, p. 110/111, grifei). Na mesma linha, adverte Silvio Maciel, “o preceito secundário dispõe que o art. 21 somente se aplica se o fato não constitui crime. Trata-se, assim, de contravenção subsidiária (subsidiariedade expressa). Se a vítima sofre lesões, haverá o crime de lesões corporais (art. 129, §§ 1º a 11 do CP) ou tentativa de homicídio (art. 121 do CP)” (Legislação Criminal Especial. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009, p. 81). Nessa ordem de ideias, evidenciada a coerência e firmeza das declarações prestadas pela vítima, tanto na fase inquisitorial quanto em juízo, mostra-se plenamente configurada a prática da contravenção penal tipificada no artigo 21, do Dec. Lei n. 3.688/1941. Ressalte-se que, em se tratando de infração de menor potencial ofensivo, e ausente prova concreta de motivação espúria ou animosidade capaz de comprometer a credibilidade da vítima, suas declarações, harmônicas e revestidas de verossimilhança, possuem especial relevância probatória e podem, por si sós, embasar o édito condenatório, conforme reiterada jurisprudência do Superior de Justiça. Ademais, a negativa isolada do apelante não se mostra suficiente para infirmar o conjunto probatório, mormente quando ausente qualquer elemento capaz de demonstrar inveracidade na narrativa de sua ex-convivente, sendo certo que as vias de fato prescindem de prova pericial, bastando, para sua configuração, a comprovação da agressão física sem lesões corporais evidentes, o que se verifica na hipótese dos autos. Nesse sentido: “APELAÇÃO CRIMINAL – SENTENÇA CONDENATÓRIA – ARTIGO 21, DA LEI N.º 3.688/1941, ART 147 E 163, PARÁGRAFO ÚNICO, I, AMBOS DO CÓDIGO PENAL – IRRESIGNAÇÃO DEFENSIVA – ABSOLVIÇÃO EM RELAÇÃO [...] VIAS DE FATOS – INVIABILIDADE – MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS – PALAVRAS DAS VÍTIMAS EM AMBAS AS FASES QUE POSSUI ESPECIAL RELEVÂNCIA EM CRIMES DESTE JAEZ – COTEJO PROBATÓRIO HARMÔNICO – ABSOLVIÇÃO INVIÁVEL – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. Em se tratando de crimes praticados no âmbito doméstico, a palavra da vítima tem valor probante diferenciado, desde que corroborada por outros elementos probatórios, tal como ocorrido na espécie [...]” (N.U 1000395-26.2023.8.11.0021, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, RUI RAMOS RIBEIRO, Segunda Câmara Criminal, Julgado em 18/03/2025, Publicado no DJE 21/03/2025) “APELAÇÃO CRIMINAL – CONTRAVENÇÃO PENAL DE VIAS DE FATOS NO ÂMBITO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA - CONDENAÇÃO – RECURSO DEFENSIVO - ABSOLVIÇÃO, POR INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA – IMPOSSIBILIDADE - MATERIALIDADE E AUTORIA DO CRIME DEVIDAMENTE COMPROVADA – RELEVÂNCIA DA PALAVRA DA VÍTIMA NAS INFRAÇÕES PENAIS PRATICADAS EM CONTEXTO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA A MULHER [...] CONDENAÇÃO MANTIDA [...] RECURSO DESPROVIDO. Nos crimes praticados em situação de violência doméstica contra a mulher, a palavra da vítima tem especial valor probatório, mormente quando narra os fatos de forma coerente e harmônica em todas as oportunidades em que é ouvida e não há contraprova capaz de desmerecer o relato [...]” (N.U 1006099-65.2020.8.11.0040, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, PEDRO SAKAMOTO, Segunda Câmara Criminal, Julgado em 06/08/2024, Publicado no DJE 15/08/2024) Com essas considerações, em consonância com o parecer ministerial, DESPROVEJO o apelo defensivo, mantendo-se inalterada a sentença vergastada. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 15/07/2025

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