Processo nº 0017095-31.2019.8.11.0055
ID: 278245217
Tribunal: TJMT
Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado
Classe: EMBARGOS DE DECLARAçãO CíVEL
Nº Processo: 0017095-31.2019.8.11.0055
Data de Disponibilização:
26/05/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
WESLLAYNE NATALLY DA SILVA
OAB/MT XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 0017095-31.2019.8.11.0055 Classe: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO CÍVEL (1689) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Bancá…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 0017095-31.2019.8.11.0055 Classe: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO CÍVEL (1689) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Bancários] Relator: Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA Turma Julgadora: [DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). MARCIO APARECIDO GUEDES] Parte(s): [FELISBERTO PEREIRA DA CRUZ - CPF: 710.338.908-04 (EMBARGADO), WESLLAYNE NATALLY DA SILVA - CPF: 042.770.971-70 (ADVOGADO), BANCO BMG SA - CNPJ: 61.186.680/0001-74 (EMBARGANTE), JOSE ARNALDO MARTINS DE SALES - CPF: 431.778.958-21 (ADVOGADO), GUSTAVO ANTONIO FERES PAIXAO - CPF: 020.382.917-48 (ADVOGADO), ELESBAO VITOR DA SILVA NETO - CPF: 514.040.441-91 (TERCEIRO INTERESSADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, ACOLHEU OS EMBARGOS. E M E N T A EMBARGANTE (S): BANCO BMG S/A e FELISBERTO PEREIRA DA CRUZ. EMBARGADO (S): OS MESMOS. EMENTA: DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO RECÍPROCOS. CONTRATO FRAUDULENTO DE CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. INEXISTÊNCIA DE CONTRADIÇÃO OU OMISSÃO. CONTA BANCÁRIA EM NOME DE TERCEIRO. AFASTAMENTO DA COMPENSAÇÃO. EMBARGOS DO BANCO REJEITADOS. EMBARGOS DO CONSUMIDOR ACOLHIDOS COM EFEITOS INFRINGENTES. I. CASO EM EXAME Embargos de declaração opostos, reciprocamente, por instituição financeira e consumidor contra acórdão que, ao julgar apelação, reconheceu a prescrição quinquenal, reduziu o valor da indenização por danos morais e determinou a compensação de valores supostamente depositados em conta bancária do autor. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Há duas questões em discussão: (i) verificar se houve omissão quanto à análise de argumentos relativos à regularidade da contratação e à responsabilidade da instituição financeira; (ii) verificar se houve erro material na identificação da titularidade da conta bancária considerada para fins de compensação. III. RAZÕES DE DECIDIR O acórdão embargado analisou de forma clara e fundamentada os elementos do caso, especialmente quanto à inexistência de contratação válida e à responsabilidade objetiva da instituição financeira, não se verificando omissão. O recurso foi utilizado indevidamente com o propósito de rediscutir o mérito da decisão, o que é incompatível com a natureza dos embargos de declaração. Quanto à titularidade da conta bancária, restou demonstrado nos autos que a conta apontada como de titularidade do consumidor foi aberta por terceiro, mediante fraude, caracterizando erro material na decisão embargada. Diante da ausência de comprovação de que os valores foram depositados em conta do consumidor, afasta-se a compensação determinada anteriormente, para evitar prejuízo indevido à parte. IV. DISPOSITIVO E TESE Embargos de declaração da instituição financeira rejeitados. Embargos de declaração do consumidor acolhidos com efeitos infringentes. Tese de julgamento: Não se configuram omissão, contradição ou erro material quando a decisão aborda de forma clara os fundamentos jurídicos da controvérsia. A tentativa de rediscutir o mérito por meio de embargos de declaração configura uso inadequado do recurso. É incabível a compensação de valores quando comprovado que os depósitos não foram realizados em conta de titularidade do consumidor. Dispositivos relevantes citados: CPC, arts. 1.022 e 1.023; CC, art. 884; CDC, art. 14. R E L A T Ó R I O RELATÓRIO EXMO. SR. DES. SEBASTIÃO DE ARRUDA ALMEIDA. Egrégia Câmara: Trata-se de embargos de declaração opostos, de forma recíproca, por BANCO BMG S.A. e FELIZBERTO PEREIRA DA CRUZ, contra acórdão que, em sede de apelação, deu parcial provimento ao recurso da instituição financeira, reconhecendo a prescrição quinquenal, minorando o valor da indenização por danos morais para R$ 5.000,00 e determinando a compensação dos valores eventualmente depositados na conta bancária do autor, a ser apurada em liquidação de sentença. O embargante BANCO BMG S.A sustenta omissão do acórdão quanto à análise de diversos saques realizados pelo autor, à sua suposta anuência às cláusulas contratuais, à inexistência de indícios de fraude e à responsabilidade por fato de terceiro. Requer, com base nos artigos 1.022, II, e 1.023 do CPC, a exclusão da condenação, ao argumento de que a contratação foi regular e que eventual fraude não lhe seria imputável. O embargante FELIZBERTO PEREIRA DA CRUZ, por sua vez, alega contradição e erro no acórdão, especificamente no trecho que a decisão reconhece a titularidade da conta bancária em que os valores foram depositados e admite a compensação. Sustenta que o laudo pericial comprovou que referida conta, mantida junto à Caixa Econômica Federal, foi aberta de forma fraudulenta por terceiro, não pertencendo ao embargante, e que a decisão incorreu em erro material ao considerá-la de sua titularidade. Defende, com isso, o afastamento da determinação de compensação dos valores. As contrarrazões do embargado FELIZBERTO PEREIRA DA CRUZ aos embargos da instituição financeira reforçam que este não comprovou a existência de contratação válida nem demonstrou que os valores foram depositados em conta de sua titularidade. Aduz, ainda, que os embargos da instituição financeira possuem caráter meramente protelatório, pleiteando a aplicação de multa. Por sua vez, o BANCO BMG S.A sustenta, em sua resposta, que não houve qualquer contradição ou erro na decisão, e que a compensação está devidamente fundamentada no conjunto probatório. É o relatório. Sebastião de Arruda Almeida Desembargador Relator V O T O R E L A T O R EMBARGANTE (S): BANCO BMG S/A e FELISBERTO PEREIRA DA CRUZ. EMBARGADO (S): OS MESMOS. VOTO Egrégia Câmara: Conforme relatado, trata-se de embargos de declaração opostos, de forma recíproca, por BANCO BMG S.A. e FELIZBERTO PEREIRA DA CRUZ, contra acórdão que, em sede de apelação, deu parcial provimento ao recurso da instituição financeira, reconhecendo a prescrição quinquenal, minorando o valor da indenização por danos morais para R$ 5.000,00 e determinando a compensação dos valores eventualmente depositados na conta bancária do autor, a ser apurada em liquidação de sentença. O recurso de embargos de declaração tem fundamentação vinculada e estrita, possuindo a finalidade de esclarecer obscuridades, eliminar contradição, suprir omissão ou corrigir erro material observados na sentença, acórdão ou decisão, conforme disposto no artigo 1.022, CPC, vejamos: Art. 1.022. Cabem embargos de declaração contra qualquer decisão judicial para: I - esclarecer obscuridade ou eliminar contradição; II - suprir omissão de ponto ou questão sobre o qual devia se pronunciar o juiz de ofício ou a requerimento; III - corrigir erro material. Caso não existam, na decisão judicial embargada, tais defeitos de forma, não há que interpor embargos de declaração, pois estes não devem ser utilizados para reexame e novo julgamento do que já foi decidido, dado que, para tanto, há o recurso próprio previsto na legislação. O acórdão embargado restou assim fundamentado: [...]APELANTE(S): BANCO BMG S.A. APELADO(S): FELISBERTO PEREIRA DA CRUZ. EMENTA. DIREITO CIVIL E CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO CUMULADA COM NULIDADE CONTRATUAL, REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PRELIMINAR. PREJUDICIAL DE MÉRITO. DECADÊNCIA. REJEIÇÃO. PRESCRIÇÃO PARCIAL. ACOLHIMENTO. MÉRITO. CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO. FALSIDADE DOCUMENTAL. PERÍCIA GRAFOTÉCNICA. RESPONSABILIDADE CIVIL DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. COMPROVADA. DANO MORAL. ADEQUAÇÃO AS FINALIDADES LEGAIS. COMPENSAÇÃO DE VALORES. POSSIBILIDADE. PARCIAL PROVIMENTO. I. CASO EM EXAME Recurso de apelação interposto por instituição financeira contra sentença que julgou parcialmente procedente ação declaratória de inexistência de débito, cumulada com pedidos de nulidade contratual, repetição do indébito e indenização por danos morais, sob alegação de fraude em contratação de cartão de crédito consignado. A sentença reconheceu a inexistência do contrato, determinou a restituição simples dos valores descontados, fixou indenização por danos morais e condenou o réu ao pagamento de custas e honorários. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há seis questões em discussão: (i) saber se se verifica a decadência da pretensão autoral; (ii) saber se incide a prescrição quinquenal sobre os valores pleiteados; (iii) saber se houve contratação válida entre as partes; (iv) saber se há direito à indenização por danos morais; (v) saber se o valor da indenização arbitrada comporta redução; (vi) saber se cabe compensação dos valores eventualmente depositados na conta do autor. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. Afastada a preliminar de decadência, pois se trata de relação de trato sucessivo, cujos efeitos se renovam periodicamente. 4. Acolhida a prejudicial de prescrição quinquenal, declarando-se prescritos os descontos anteriores a 29 de julho de 2019. 5. Restou demonstrada a inexistência de contratação válida, à luz da perícia grafotécnica que apontou falsidade da assinatura. Configurada falha na prestação do serviço. 6. A responsabilidade da instituição financeira é objetiva, nos termos do art. 14 do CDC. Descontos indevidos em benefício previdenciário geram dano moral indenizável. 7. O valor da indenização por danos morais deve ser reduzido para R$ 5.000,00, em observância ao princípio da razoabilidade. 8. Devidamente comprovados os depósitos de valores em conta do autor, admite-se sua compensação, a ser apurada em liquidação de sentença, para evitar enriquecimento sem causa. IV. DISPOSITIVO E TESE 9. Recurso conhecido e parcialmente provido. Tese de julgamento: “1. Incide a prescrição quinquenal sobre a pretensão de repetição de indébito em contratos bancários, uma vez que há autonomia entre as parcelas cobradas e, por conseguinte, prestações autônomas a cada período, o credor somente poderá cobrar as parcelas que venceram dentro do quinquídio que antecede ao ajuizamento da demanda. 2. A falsificação de assinatura em contrato de cartão de crédito consignado configura falha na prestação do serviço e enseja responsabilidade civil objetiva da instituição financeira. 3. Os descontos indevidos em benefício previdenciário são capazes de ensejar abalo moral que transcende o mero aborrecimento cotidiano . 4. O valor da indenização por dano moral deve observar os princípios da proporcionalidade e razoabilidade. 5. Os valores efetivamente creditados na conta do consumidor devem ser compensados em eventual condenação de restituição, sob pena de enriquecimento ilícito.” Dispositivos relevantes citados: CC, art. 884; CDC, arts. 14 e 27; CPC, art. 429, II. Jurisprudência relevante citada: TJMT, Ap. Cív. nº 1002401-39.2023.8.11.0010, Rel. Des. Márcio Vidal, j. 26.03.2024; TJMT, Ap. Cív. nº 1011894-15.2021.8.11.0041, Rel. Des. Márcio Vidal, j. 09.04.2024. RELATÓRIO EXMO. SR. DES. SEBASTIÃO DE ARRUDA ALMEIDA. Egrégia Câmara: Trata-se de Recurso de Apelação Cível interposto contra sentença proferida pelo Juízo da 5ª Vara Cível da Comarca de Tangará da Serra, nos autos da Ação Declaratória nº 0017095-31.2019.8.11.0055, que tem por objeto a declaração de inexistência de débito, cumulada com pedido de nulidade contratual, repetição do indébito e indenização por danos morais, em razão de alegado vício de consentimento na modalidade contratual pactuada junto ao banco Apelante. O juízo a quo julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais, nos seguintes termos: “Diante do exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE os pedidos formulados pela requerente para: I) DECLARAR a inexistência do contrato de empréstimo via cartão de crédito consignado – RMC e qualquer dívida dele proveniente eis que não contratado pela autora. II) Quanto aos danos materiais deverá ser restituída as parcelas descontadas na forma simples a qual não haverá necessidade de liquidação de sentença, já que poderá ser feita em cumprimento de sentença, cuja correção monetária deve ser feita pelo índice INPC, e juros de mora de 1% ao mês, a partir do desconto de cada parcela, nos termos da Sumula 43 do Superior Tribunal de Justiça (a correção monetária, em caso de danos materiais, corre desde a data do evento danoso.). III) CONDENAR a parte requerida ao pagamento a título de danos morais o montante de R$8.000,00 (oito mil reais). IV) CONDENAR a requerida ainda ao pagamento de custas e honorários sucumbenciais, arbitrados no patamar de 10% do valor da causa”. (g.n.) Em suas razões recursais a parte recorrente invoca os seguintes argumentos fático-jurídicos: 1. Preliminar 1.1. Da Decadência. 1.2. Da Prescrição parcial. 2. Mérito. 2.1. Da ausência de conduta ilícita – Regularidade do contrato. 2.2. Da ausência de comprovação de ocorrência dos danos morais. 2.3. Do combate ao valor indenizatório a título de danos morais. 2.4. Inexistência de danos materiais - Não cabimento da restituição de valores. 2.5. Da compensação dos valores depositados na conta bancária da consumidora. A parte apelada apresentou suas contrarrazões (ID. 273645931), rebatendo as alegações da apelante, e defendendo o desprovimento recursal. É o relatório. Sebastião de Arruda Almeida Desembargador Relator APELANTE(S): BANCO BMG S.A. APELADO(S): FELISBERTO PEREIRA DA CRUZ. VOTO Egrégia Câmara: De proêmio, consigno que o presente comporta juízo de admissibilidade positivo, em relação aos requisitos extrínsecos e intrínsecos da espécie recursal. Reitero que se trata de recurso de Apelação Cível interposto contra sentença proferida pelo Juízo da 5ª Vara Cível da Comarca de Tangará da Serra, nos autos da Ação Declaratória nº 0017095-31.2019.8.11.0055, que tem por objeto a declaração de inexistência de débito, cumulada com pedido de nulidade contratual, repetição do indébito e indenização por danos morais, em razão de alegado vício de consentimento na modalidade contratual pactuada junto ao banco Apelante. O juízo a quo julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais, nos seguintes termos: “Diante do exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE os pedidos formulados pela requerente para: I) DECLARAR a inexistência do contrato de empréstimo via cartão de crédito consignado – RMC e qualquer dívida dele proveniente eis que não contratado pela autora. II) Quanto aos danos materiais deverá ser restituída as parcelas descontadas na forma simples a qual não haverá necessidade de liquidação de sentença, já que poderá ser feita em cumprimento de sentença, cuja correção monetária deve ser feita pelo índice INPC, e juros de mora de 1% ao mês, a partir do desconto de cada parcela, nos termos da Sumula 43 do Superior Tribunal de Justiça (a correção monetária, em caso de danos materiais, corre desde a data do evento danoso.). III) CONDENAR a parte requerida ao pagamento a título de danos morais o montante de R$8.000,00 (oito mil reais). IV) CONDENAR a requerida ainda ao pagamento de custas e honorários sucumbenciais, arbitrados no patamar de 10% do valor da causa”. (g.n.) VOTO-PRELIMINAR 1. Prejudiciais de mérito arguido pela parte apelante BANCO BMG S.A. 1.1. Da ocorrência da prejudicial de mérito – Decadência. No que concerne à arguição preliminar das prejudiciais de mérito, especificamente a decadência, é pacífico, segundo a orientação jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça e os precedentes deste Sodalício, que, em se tratando de prestações de trato sucessivo, o prazo decadencial têm início a partir da data de vencimento da última parcela. Nesse sentido é a jurisprudência hodierna: EMENTA CIVL E PROCESSO CIVIL – APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO E NULIDADE CONTRATUAL C/C DEVOLUÇÃO EM DOBRO E POR DANOS MORAIS – PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE – VIOLAÇÃO – INOCORRÊNCIA – PRELIMINAR – REJEIÇÃO – DECADÊNCIA – PRESCRIÇÃO – PREJUDICIAIS DE MÉRITO – NÃO ACOLHIMNETO – CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC) –EMPRÉSTIMO CONSIGNADO – CONVERSÃO – SAQUE DE LIMITE DE CARTÃO DE CRÉDITO – DEVER DE INFORMAÇÃO – VIOLAÇÃO – ILEGALIDADE CONSTATAÇÃO – TAXA DE JUROS REMUNERATÓRIOS – ADEQUAÇÃO À MÉDIA PRATICADA NA ÉPOCA DO SAQUE – RESTITUIÇÃO DO INDÉBITO – FORMA SIMPLES – DANO MORAL – NÃO CONFIGURAÇÃO – SENTENÇA REFORMADA EM PARTE – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. Quando as razões recursais combatem os termos da sentença e encontram-se associadas aos temas abordados, a preliminar de não conhecimento do Apelo, por ausência de dialeticidade, deve ser rejeitada. 2. Sabe-se que, nos casos de revisão contratual de contratos bancários, com pedido de restituição de valores pagos indevidamente, o prazo prescricional se amolda à previsão decenal do artigo 205 do Código Civil. 3. Nas hipóteses que envolvem prestações de trato sucessivo, o pacto se renova ao longo do tempo, de forma automática, devido aos descontos efetuados mensalmente e, portanto, a cada novo desconto, o período de decadência é renovado e o termo inicial para contagem do prazo decadencial é o vencimento da última parcela. (N.U 1002401-39.2023.8.11.0010, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARCIO VIDAL, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 26/03/2024, Publicado no DJE 03/04/2024) (grifo nosso) Dessa forma, não se verifica nos autos a ocorrência da decadência, considerando que houve saques após o ajuizamento da demanda. Portanto, rejeito as preliminares de prescrição e decadência. É como voto. 1.2. Da Prescrição parcial. No que concerne a arguição preliminar da parte apelante, entendo que merece acolhimento, isto por que, no que concerne a prescrição dos descontos efetivados, tratando-se de reparação de danos causados por fato do serviço, o prazo prescricional é de 5 (cinco) anos, consoante art. 27 do Código de Defesa do Consumidor, in verbis: Art. 27. Prescreve em cinco anos a pretensão à reparação pelos danos causados por fato do produto ou do serviço prevista na Seção II deste Capítulo, iniciando-se a contagem do prazo a partir do conhecimento do dano e de sua autoria. Assim, diante de um contrato de prestação continuada, no qual há autonomia entre as parcelas cobradas e, por conseguinte, prestações autônomas a cada período, o credor somente poderá cobrar as parcelas que venceram dentro do quinquídio que antecede ao ajuizamento da demanda. Portanto, reputam-se prescritos os descontos incidentes sobre o período anterior a 29 de julho de 2019. Por tais razões, acolho a preliminar de prescrição quinquenal. É como voto. VOTO-MÉRITO 2.1. Da ausência de conduta ilícita. Após detido exame dos autos, concluo que a r. sentença guerreada deve ser mantida, não obstante as alegações da parte apelante, especialmente quanto à regularidade dos descontos efetuados em benefício previdenciário, em razão da ausência de contratação do empréstimo consignado discutido nos autos. É cediço que a pessoa idosa goza de especial proteção nas relações de consumo. Nesse sentido, importante trazer à baila o texto legal do art. 39, IV do Código de Defesa do Consumidor: Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas: [...] IV - prevalecer-se da fraqueza ou ignorância do consumidor, tendo em vista sua idade, saúde, conhecimento ou condição social, para impingir-lhe seus produtos ou serviços; In casu, verifica-se que quando foi pactuado o contrato discutido nos autos, a parte apelada possuía 65 (sessenta e cinco) anos, portanto, pessoa idosa conforme previsão do art. 1º do Estatuto do Idoso, in verbis: Art. 1º É instituído o Estatuto da Pessoa Idosa, destinado a regular os direitos assegurados às pessoas com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos. Pois bem. Em exame ao conjunto probatório formado nos autos, verifica-se que a instituição financeira deixou de comprovar a idoneidade do contrato celebrado entre as partes, apesar da impugnação específica quanto à assinatura do referido documento, considerando que a perícia grafotécnica chegou à seguinte conclusão (ID 273645908 – pág. 19): VII – CONSIDERAÇÕES FINAIS Em face do exposto, infere-se: O RG em nome de Felisberto Pereira da Cruz datado de 28/04/2018 trata-se de documento falso e as assinaturas questionadas NÃO PROVIERAM do punho escritor que produziu as assinaturas do conjunto padrão (FELISBERTO PEREIRA DA CRUZ) Desse modo, verifica-se que o negócio jurídico em exame foi firmado mediante fraude, configurando a responsabilidade civil da instituição financeira apelante. A perícia grafotécnica é um meio probatório essencial para verificar a autenticidade de assinaturas em documentos, especialmente em casos em que há alegações de falsificação. Nesse sentido se manifesta a jurisprudência hodierna: APELAÇÃO CÍVEL - INCIDENTE DE FALSIDADE - SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA - PRELIMINAR - CERCEAMENTO DO DIREITO DE DEFESA - ANÁLISE COM O MÉRITO - TERMO DE ADESÃO DE PESSOA FÍSICA - DOCUMENTO APRESENTADO POR MEIO DE CÓPIA REPROGRÁFICA - POSSIBILIDADE - JUNTADA DO ORIGINAL - DESNECESSIDADE - PROVA GRAFOTÉCNICA - PERÍCIA JUDICIAL - CONCLUSÃO - AUTENTICIDADE DA ASSINATURA - SENTENÇA REFORMADA - RECURSO PROVIDO. A ausência de motivos justos e razoáveis impede a desconsideração da prova pericial grafotécnica realizada em juízo, que conclui pela autenticidade das assinaturas apostas pelo autor, mormente quando a cópia do documento questionado mostra-se legível e em particular se observado que a perícia foi realizada dentro das normas técnicas e concluiu de forma suficiente e eficiente o encargo proposto. (TJ-MT - Apelação: 0023439-46.2014.8.11.0041, Relator: GUIOMAR TEODORO BORGES, Data de Julgamento: 14/03/2018, QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO, Data de Publicação: 19/03/2018) Logo, diante do conjunto fático-probatório formado nos autos, evidencia-se que a parte apelante não se desincumbiu, a teor do inciso II do art. 429 do Código de Processo Civil, do ônus de comprovar a existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor, in verbis: Art. 429. Incumbe o ônus da prova quando: [...] II - se tratar de impugnação da autenticidade, à parte que produziu o documento. Desse modo, tenho que a prestação do serviço pela parte apelante foi deficiente, uma vez que, ficou evidenciada nos autos o desconto indevido em benefício previdenciário, referente a parcelas de cartão de crédito consignado firmado mediante fraude. 2.2. Da ausência de comprovação de ocorrência dos danos morais. No que concerne ao pedido indenizatório, é importante salientar que o dano moral decorre do indevido desconto perpetrado pela instituição financeira apelante na conta bancária da parte apelada, oriundo de cartão de crédito consignado não contratado pelo consumidor. Sem dúvida, tal conduta gera desconforto, aflição e transtornos e, por isso, possui extensão suficiente para configurar o dano moral. Imperioso destacar, também, que o deslinde da questão fático-jurídica aqui registrada passa pela responsabilidade civil do fornecedor que, em casos tais, é objetiva, em face da sua condição de prestador de serviços que lhe impõe o dever de zelar pela perfeita qualidade do serviço prestado, em conformidade com os ditames do art. 14, “caput”, do Código de Defesa do Consumidor, senão vejamos: Art. 14. O fornecedor de serviços responde independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. Por isso, diante da falha na prestação dos serviços, penso que inegavelmente, trouxe desgaste emocional e prejuízos de ordem moral à parte apelada, indenizáveis, portanto Portanto, a meu ver, tal tese jurídica deve ser rejeitada, na medida em que os descontos indevidos no benefício previdenciário do apelado, decorrentes de negócio jurídico firmado mediante fraude, são capazes de ensejar abalo moral que transcende o mero aborrecimento cotidiano. Motivo pelo qual não há que se falar em inocorrência do dano moral indenizável. Nesse sentido se manifesta o Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso (TJMT): EMENTA DIREITO CIVIL E CONSUMIDOR – RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO INDENIZATÓRIA DECORRENTE DE DANOS MATERIAIS E MORAIS – CONTRATAÇÃO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO NÃO COMPROVADA – CONTRATO COM ASSINATURA FALSA – PERÍCIA GRAFOTÉCNICA – AS ASSINATURAS QUESTIONADAS APOSTAS NO CONTRATO NÃO EMANARAM DO PUNHO DO CORRENTISTA – FRAUDE CONFIGURADA – FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS – RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA – ATO ILÍCITO – NEXO DE CAUSALIDADE – DANO MORAL EVIDENCIADO – RECURSO DESPROVIDO. As instituições financeiras, diante da atividade de risco que desenvolvem, respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias, a teor do que disciplina a Súmula n. 479 do STJ. Na hipótese dos autos, a perícia grafotécnica concluiu que as assinaturas apostas no contrato não emanaram do punho do Recorrido, evidenciando a ocorrência de fraude na contratação do empréstimo discutido nos autos. Configurada a fraude na contratação, indiscutível a responsabilidade da instituição bancária, que possui o dever de manter em segurança os dados pessoais e bancários do correntista, bem como o acesso de seus sistemas internos, sendo devido o pagamento de indenização pelos danos suportados. O valor da indenização por dano moral deve ser arbitrado em consonância com princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, promovendo-se de modo justo a compensação do ofendido e a punição do ofensor. In casu, a quantia fixada de R$ 8.000,00 (oito mil reais) encontra-se adequada. (N.U 1011894-15.2021.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARCIO VIDAL, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 09/04/2024, Publicado no DJE 17/04/2024) (grifo nosso). Devendo ser rejeitado a tese da parte apelante, eis que, comprovado a responsabilidade civil objetiva da instituição financeira, ante a falha na prestação do serviço. 2.3. Do combate ao valor indenizatório a título de danos morais. A parte apelante irresignada com o valor arbitrado a título de danos morais pelo Juízo Singular, pleiteia subsidiariamente a minoração do “quantum” arbitrado. Neste ponto recursal, tenho que deve ser dada parcial guarida à pretensão dos recorrentes. É que o valor de R$ 8.000,00 (oito mil reais), destinados a recompor os prejuízos morais do apelante, para o caso em testilha, se afigura em desconformidade com a extensão dos danos efetivamente sofridos, a sua reparabilidade, além da finalidade pedagógica em relação à parte recorrida. Por tais motivos, entendo razoável a estipulação da quantia de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), a título de indenização por danos morais sofridos pelo consumidor apelante, atendendo-se ao binômio da reparabilidade do dano experimentado e o efeito pedagógico a ser imposto à instituição financeira. 2.4. Inexistência de danos materiais - Não cabimento da restituição de valores. A tese recursal não merece prosperar, uma vez que restou comprovada, nos autos, a realização de descontos indevidos no benefício previdenciário da parte apelada (ID. 274333928), oriundos de negócio jurídico nulo. Assim, é devida à parte apelada a restituição dos valores indevidamente descontados de sua aposentadoria, incumbindo à parte responsável pelos referidos descontos promover o ressarcimento, sob pena de enriquecimento ilícito, nos termos do art. 884 do Código Civil. Dessa forma, rejeito a tese recursal sustentada pela parte apelante. 3.8. Da compensação dos valores depositados na conta bancária da consumidora. No tocante a presente temática ventilada pela parte apelante, entendo que deve ser acolhido o pleito, eis que, restou demonstrado que o banco apelante realizou transferências de valores para a conta bancária de titularidade do sr. FELISBERTO PEREIRA DA CRUZ, não havendo prova em sentido contratou e/ou impugnação específica quanto ao recebimento de tais valores. Por óbvio, deve ser devolvido os referidos valores à instituição financeira ou que haja a compensação no proveito econômico auferido pela parte apelada, sob pena de enriquecimento ilícito (art. 884 do Código Civil). Conclusão Por essas razões, conheço do recurso e DOU-LHE PARCIAL PROVIMENTO, para o fim de: Acolher a preliminar de prescrição quinquenal, declarando prescritos os descontos anteriores a 29 de julho de 2019; Minorar o quantum indenizatório a título de danos morais para o importe de R$ 5.000,00 (cinco mil reais); Julgar procedente a compensação dos valores depositados na conta do consumidor, devendo ser apurado em liquidação de sentença; Mantendo-se, quanto ao mais, a sentença objurgada. Deixo de majorar os honorários recursais (art. 85, §11, do CPC), uma vez que está condicionado ao desprovimento ou não conhecimento do recurso da parte contrária, sendo, portanto, incabível quando for provida a apelação, ainda que parcialmente (STJ, Tema n. 1.059, REsp n. 1.864.633/RS, Rel. Min. Paulo Sérgio Domingues, Corte Especial, j. 09/11/2023, DJe 21/12/2023). Preclusa a via recursal, retornem os autos ao Juízo de origem. É como voto. Sebastião de Arruda Almeida Desembargador Relator [...] I – Dos embargos opostos pelo Banco BMG S.A. O embargante apontou a existência de omissão no acórdão, sob o argumento de que não teria havido manifestação acerca da regularidade da contratação, da anuência do autor às cláusulas contratuais e da inexistência de elementos que indicariam fraude, pleiteando, ao final, o afastamento da responsabilidade civil e da condenação imposta. Os embargos de declaração são opostos como instrumento processual destinado a eliminar da decisão judicial obscuridade, contradição ou omissão de ponto ou questão sobre o qual devia se pronunciar o juiz de ofício ou a requerimento, além de servir para a correção de erro material (art. 1.022 do CPC). No caso dos autos, o que o embargante demonstra é simples inconformismo com o teor do acórdão embargado, que, sobre a matéria em discussão, foi claro e explícito, embasando-se nos fatos e fundamentos jurídicos constantes dos autos e aplicando de modo fundamentado a legislação pertinente ao caso. No tocante à alegada omissão sobre a existência de contrato e valores depositados, o acórdão foi expresso ao afirmar: “Restou demonstrada a inexistência de contratação válida, à luz da perícia grafotécnica que apontou falsidade da assinatura. Configurada falha na prestação do serviço.” No mais, a responsabilidade civil da instituição financeira foi analisada de forma objetiva, nos termos do art. 14 do Código de Defesa do Consumidor: “A responsabilidade da instituição financeira é objetiva, nos termos do art. 14 do CDC.” Logo, não se verifica no julgado a ocorrência de qualquer dos vícios apontados no artigo 1.022 do CPC. Portanto, a decisão é clara, em seus fundamentos, há lógica entre a conclusão e suas premissas a não ensejar contradição, como todas as matérias questionadas na pretensão subjetiva foram examinadas a contento, não existindo, ainda, erro material a ser suprido. O mero inconformismo do Embargante não pode ensejar a oposição de embargos de declaração, os quais não são apropriados para rediscussão da matéria já decidida, ainda que, supostamente, incoerente, segundo o entendimento dele. Evidente, assim, a impropriedade do manejo dos embargos de declaração, que não se configuram como outra instância recursal, pois, mesmo para fins de prequestionamento, o uso deste recurso se limita à demonstração de ocorrência das hipóteses contempladas no art. 1.022, CPC. Dessa forma, não são admitidos os efeitos infringentes dos embargos, que a pretexto de esclarecer ou complementar o julgado anterior, buscam alterá-lo. II – Dos embargos opostos por Felisberto Pereira da Cruz O embargante apontou erro e contradição, afirmando que o acórdão reconheceu, indevidamente, a titularidade de conta bancária na qual teriam sido depositados valores objeto de compensação, sendo que tal conta não pertence ao autor, conforme comprovado por laudo pericial e documentos constantes dos autos. Revisitando os autos, tenho que assiste razão o Embargante. A decisão embargada assim consignou: “Devidamente comprovados os depósitos de valores em conta do autor, admite-se sua compensação, a ser apurada em liquidação de sentença, para evitar enriquecimento sem causa.” Contudo, a parte embargante demonstrou, com base em laudo pericial e outros documentos juntados aos autos, que a conta bancária utilizada para o depósito não lhe pertencia, tendo sido aberta por terceiro mediante fraude, conforme se extrai dos elementos probatórios, notadamente a ausência de vínculo do autor com a conta junto à Caixa Econômica Federal. Assim, constatado o vício e comprovada a ausência de titularidade da conta em que se depositaram os valores, acolho os embargos com efeitos infringentes para afastar a compensação determinada no acórdão. CONCLUSÃO Por essas razões, REJEITO os embargos de declaração apresentados por BANCO BMG S/A, e, de outro giro, ACOLHO os embargos de declaração opostos por FELIZBERTO PEREIRA DA CRUZ para com efeitos infringentes, para afastar a compensação dos valores depositados em conta bancária cuja titularidade não restou comprovada. É como voto. Sebastião de Arruda Almeida Desembargador Relator Data da sessão: Cuiabá-MT, 20/05/2025
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