Processo nº 0000200-85.2018.4.03.6004
ID: 320738468
Tribunal: TRF3
Órgão: Gab. 43 - DES. FED. ALI MAZLOUM
Classe: APELAçãO CRIMINAL
Nº Processo: 0000200-85.2018.4.03.6004
Data de Disponibilização:
09/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
JOAO ARMANDO PREZA DA SILVA
OAB/MS XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 5ª Turma APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0000200-85.2018.4.03.6004 RELATOR: Gab. 43 - DES. FED. ALI MAZLOUM APELANTE: IRLLAN KARDEC DE OLIVEIRA Advo…
PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 5ª Turma APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0000200-85.2018.4.03.6004 RELATOR: Gab. 43 - DES. FED. ALI MAZLOUM APELANTE: IRLLAN KARDEC DE OLIVEIRA Advogado do(a) APELANTE: JOAO ARMANDO PREZA DA SILVA - MS14703-A APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP OUTROS PARTICIPANTES: PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 5ª Turma APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0000200-85.2018.4.03.6004 RELATOR: Gab. 43 - DES. FED. ALI MAZLOUM APELANTE: IRLLAN KARDEC DE OLIVEIRA Advogado do(a) APELANTE: JOAO ARMANDO PREZA DA SILVA - MS14703-A APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL NO ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL VARA DE ORIGEM: 1ª VARA FEDERAL DE CORUMBÁ/MS R E L A T Ó R I O O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL ALI MAZLOUM: Trata-se de apelação criminal interposta pela defesa de IRLLAN KARDEC DE OLIVEIRA (DN: 22/01/1969 – cópia da carteira de identidade (RG) de ID 277531332, p. 1) em face da r. sentença de ID 277531396, proferida pelo Juízo Federal da 1ª Vara Federal de Corumbá/SP que julgou procedente a denúncia para condenar a ré a pena de 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de reclusão, no regime inicial semiaberto sob o fundamento de se tratar de réu reincidente, e pagamento de 67(sessenta e sete) dias-multa, no valor unitários de 1/30 (um trigésimo) do salário-mínimo à época do fato devidamente atualizado, como incursos nas sanções do art. 171, §3º, do Código Penal, vedada a substituição da pena corporal por penas restritivas de direitos diante da reincidência (art. 44, II, do CP). Narra a denúncia (ID 277531331, págs. 2/5), em síntese, que no período compreendido entre os meses de março de 2013 e junho de 2017, no município de Corumbá/MS, IRLLAN KARDEC DE OLIVEIRA, de forma consciente e voluntária, obteve para si, mediante fraude, vantagem ilícita consistente na percepção indevida do benefício assistencial Bolsa Família, em prejuízo da União Federal, tendo recebido indevidamente a quantia de R$11.282,00 (onze mil, duzentos e oitenta e dois reais). Segundo a denúncia, verificou-se que, embora não se enquadrasse nas hipóteses previstas na Lei nº10.834/04, ou seja, família pobre ou em situação de extrema pobreza, IRLLAN KARDEC prestou informações falsas no momento de sua inscrição no Cadastro Único de Programas Sociais do Governo Federal, declarando possuir renda per capita no importe de R$60,00 (sessenta reais). Além disso, constatou-se que a acusada IRLLAN KARDEC, a época dos fatos, era proprietária da empresa “IRLLAN KARDEC DE OLIVEIRA - ME (CNPJ 12.739.032/0001-92)”, e também proprietária do veículo GM/S10, ano 2016, Placas QAA 8218, cor vermelha, com renda mensal superior ao que permitia o recebimento do benefício assistencial Bolsa Família, restando patente que a acusada não se enquadra no núcleo das famílias pobres. Por fim, narra a denúncia que a ré responde a outra Ação Penal de nº0008835-38.2016.4.03.6000 por crime de lavagem de dinheiro e evasão de divisas (CD- Rom anexado aos autos), em que a acusada movimentava vultosas quantias de dinheiro, repassando-as a outras contas, cujos valores tinham sua origem e destino relacionados ao crime de tráfico internacional de drogas. A denúncia foi recebida em 17.07.2018 (ID 277531331, págs. 6/7) e a sentença publicada em 14.07.2023 (ID 277531396). A Defesa da apelante apresentou suas razões de apelo em 2º grau (ID 278145074), nos termos do art. 600, §4º, do CPP, requerendo, em síntese: (a) a absolvição da apelante por ausência de provas de que agiu com dolo, nos termos do art. 386, V e VII, do CPP; (b) redução da pena-base e a de multa no mínimo legal; (c) isenção quanto ao pagamento da reparação de dano, arbitrado no valor de R$ 11.282,00 (onze mil, duzentos e oitenta e dois reais), alegando incapacidade financeira da apelante. Aberta vista à Procuradoria Regional da República, opinou pela dispensa da oferta de contrarrazões ministeriais, alegando o caráter facultativo e despiciendo das contrarrazões pelo Parquet Federal de 1ª instância, e lançou parecer em que opina pelo desprovimento do recurso da defesa (ID 143995356). A Procuradoria Regional da República, em parecer, manifestou-se pelo desprovimento do recurso interposto (ID 278777805). É o relatório. À revisão, nos termos regimentais. PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 5ª Turma APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0000200-85.2018.4.03.6004 RELATOR: Gab. 43 - DES. FED. ALI MAZLOUM APELANTE: IRLLAN KARDEC DE OLIVEIRA Advogado do(a) APELANTE: JOAO ARMANDO PREZA DA SILVA - MS14703-A APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL NO ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL VARA DE ORIGEM: 1ª VARA FEDERAL DE CORUMBÁ/MS V O T O O SENHOR JUIZ FEDERAL CONVOCADO FÁBIO MÜZEL: Trata-se de recurso de apelação intentado pela Defesa de Irllan Kardec de Oliveira em face de sentença que o condenou à pena privativa de liberdade de 02 (dois) anos e 04 (quatro) meses de reclusão, regime inicial semiaberto, além do pagamento de 67 (sessenta e sete) dias-multa, no valor unitário de 1/30 do salário mínimo vigente à época dos fatos, por cometimento do crime previsto no artigo 171, § 3º, do Código Penal. Descreve a denúncia que, no período compreendido entre os meses de março de 2013 e junho de 2017, no município de Corumbá/MS, Irllan Kardec, de forma consciente e voluntária, obteve para si, mediante fraude, vantagem ilícita consistente na percepção indevida do benefício assistencial Bolsa Família. Consta dos autos que, no decorrer das investigações realizadas no bojo do IPL no 0093/2016 - DPF/CRA/MS, instaurado para apurar a prática de crimes de lavagem de dinheiro e evasão de divisas, foi verificado que Irllan Kardec teria recebido indevidamente a quantia de R$ 11.282,00 (onze mil, duzentos e oitenta e dois reais), em prejuízo da União. Segundo a denúncia, verificou-se que, embora não se enquadrasse nas hipóteses previstas na Lei nº10.834/04, ou seja, família pobre ou em situação de extrema pobreza, a ré prestou informações falsas no momento de sua inscrição no Cadastro Único de Programas Sociais do Governo Federal, declarando possuir renda per capita no importe de R$60,00 (sessenta reais). Conforme informação prestada pela Secretaria Municipal de Assistência Social do Programa Bolsa Família/Cadastro Único, a acusada, embora não tenha realizado cadastro físico, realizou seu cadastro único online para Programas Sociais do Governo Federal em 23/01/2013, declarando a mencionada renda per capita familiar, e realizou sua última atualização cadastral em 29/01/2018, mantendo as mesmas informações falsas do cadastro. Apesar de não ter colacionado documentos comprobatórios por ocasião do seu cadastramento, tal renda per capita é incompatível com o Extrato da Declaração do Imposto de Renda da acusada constante do CD-ROM (anexo aos autos), donde se infere que era proprietária da empresa “IRLLAN KARDEC DE OLIVEIRA - ME (CNPJ 12.739.032/0001-92)”, com renda mensal superior ao que permitia o recebimento do benefício assistencial Bolsa Família, restando patente que a acusada não se enquadra no núcleo das famílias pobres. Além disso, constatou-se que a acusada Irllan Kardec é proprietária do veículo GM/S10, ano 2016, Placas QAA 8218, cor vermelha, de modo que resta patente que a denunciada não se enquadra no núcleo das famílias pobres, os quais têm renda mensal entre R$ 77,01 (setenta e sete reais e um centavos) e R$ 154,00 (cento e cinquenta e quatro reais), para que pudesse perceber o benefício. Por fim, narra a denúncia que a ré responde a outra Ação Penal de nº0008835-38.2016.4.03.6000 por crime de lavagem de dinheiro e evasão de divisas (CD- Rom anexado aos autos), em que a acusada movimentava vultosas quantias de dinheiro, repassando-as a outras contas, cujos valores tinham sua origem e destino relacionados ao crime de tráfico internacional de drogas. Assim, segundo a denúncia, Irllan Kardec, de forma deliberada, prestou informações falsas quanto à sua renda familiar, induzindo a erro entidade de direito público, com o fim de obter vantagem ilícita, consistente no recebimento do benefício social Bolsa Família. Observo, inicialmente, que a materialidade delitiva está comprovada pelos seguintes elementos de convicção: (a) Informação nº 019/2016 – DPF/CRA/MS dada pela Base de Inteligência Policial (BIP) da Delegacia da Polícia Federal em Corumbá/MS que informou que a ré Irllan Kardec é beneficiária do Programa de Assistência Social “Bolsa Família”, tendo recebido o benefício nos anos de 2013, 2014, 2015 e 2016, sendo que desde o início do pagamento do benefício até a presente data, Irllan já auferiu com o Programa a quantia de R$8.358,00 (oito mil, trezentos e cinquenta e oito reais) (ID 277531328, págs. 8/13); (b) extratos de transferência de recursos do programa “Bolsa Família” pelo Portal da Transparência do Governo Federal destinados a favorecida Irllan Kardec (ID 277531328, págs. 16/19 e ID 277531329, págs. 1/5); (c) Ofício da Secretaria Municipal de Assistência Social do Programa Bolsa Família/Cad. Único, da Prefeitura Municipal de Corumbá/MS em resposta ao procedimento investigatório da Polícia Federal que traz documentos do programa social “Bolsa Família” relativos ao Cadastro Único de Programas Sociais do Governo Federal (Cad. Único), SIBEC e SICON, informando que a Responsável Familiar Irllan Kardec fez sua inclusão e de sua família no referido cadastro em 23/01/2013 e realizou sua última atualização cadastral em 29/01/2018 (ID 277531329, págs. 18-20 e ID 277531330, págs. 1/6); (d) cópias de documentos pessoais da ré e certidão de nascimento das filhas, bem como declaração falsa de insuficiência econômica da ré assinada de próprio punho (ID 277531332, págs. 1/8); (e) declarações de IR da acusada relativas aos exercícios de 2014 e 2015 – Dossie de Irllan - e provas produzidas no bojo dos Autos 0008835-38.2016.4.03.6000, principalmente no que tange à propriedade do veículo GM/S10, ano 2016, Placas QAA-8218, apreendido conforme Termo de Apreensão nº 50/2017 e movimentações financeiras comprovadas no Relatório de Análise nº001/2017 (ID 277531393 – IPL 93/2016 e apensos - link de acesso no navegador da internet bit.ly/44j7UJD). Assim, dúvidas não há quanto a materialidade delitiva, uma vez que ficou comprovado que a ré/apelante, embora não tenha realizado cadastro físico, realizou seu cadastro online para Programas Sociais do Governo Federal em 23/01/2013, declarando a mencionada renda per capita familiar (no importe de R$60,00), realizando sua última atualização cadastral em 29/01/2018, mantendo as mesmas informações. Da autoria. A defesa sustenta a ausência de prova da autoria, requerendo a absolvição da apelante, nos termos do art. 386, inciso VII, do Código de Processo Penal, por ausência de prova do dolo. Vejamos. Consta dos autos que a apelante obteve para si vantagem ilícita em prejuízo de entidade de direito público, induzindo-a e mantendo-a em erro mediante fraude, recebendo valores do programa “Bolsa Família” sem preencher os requisitos necessários, no período de março de 2013 e junho de 2017, em Corumbá/MS. Para execução do intento, a acusada realizou requerimento do programa “Bolsa Família” e, durante o recebimento do benefício e conhecedora da renda máxima familiar por pessoa, recebendo indevidamente o benefício assistencial, realizando inclusive atualização cadastral com as mesmas informações falsas, a fim de manter em erro a entidade de direito público. Perante a autoridade policial a ré confirmou receber o benefício do “Bolsa Família” mesmo não preenchendo os requisitos necessários, alegando que teria sido ofertado a ela o benefício por uma assistente social no final de 2012, e início de 2013. E, por fim, a ré confirmou que já no ano de 2014 realizava movimentações financeiras no esquema de “lavagem de dinheiro”, porém alega que não sabia do caráter ilícito da sua conduta, pensando que era um “trabalho” (ID 277531393 – link de acesso no navegador da internet bit.ly/44j7UJD). Passo a transcrever resumidamente os principais depoimentos das testemunhas de acusação, bem como do interrogatório da ré prestados em Juízo, que interessam ao deslinde do presente feito. Registro que a defesa desistiu das oitivas de testemunhas que arrolou (Termo de Audiência de ID 277531377). Eduardo Henrique Ferreira, agente da Polícia Federal, afirmou que se recorda que durante a investigação relacionada com possível crime de lavagem de capitais, foi possível constatar, através do portal de transparência, que a ré recebia o benefício assistencial “Bolsa Família”. Ressaltou que o estilo de vida da ré era totalmente incompatível com o benefício, na prática ela não se enquadrava nos requisitos exigidos para receber o benefício, pois ela possuía veículo e residência de alto valor, até mesmo pela movimentação financeira da ré que era totalmente incompatível para o recebimento do benefício. Por fim, afirmou que o estilo de vida da ré era incompatível com os requisitos necessários para se enquadrar no programa “bolsa família”, pois ela ostentava veículos de luxo, seu círculo social na cidade, suas visitas a restaurantes, idas a bancos e saques em dinheiro demonstravam incompatibilidade patrimonial (mídia audiovisual encartada aos autos). Mariana Almeida Veloso Oliveira, também agente da Polícia Federal, afirmou que se recorda que Irllan morava aparentemente numa casa normal, de classe média, porém havia adquirido um veículo novo de alto valor naquele mesmo ano das investigações, além de se recordar que a ré movimentava grande quantidade de dinheiro em suas contas bancárias, mas declarava uma renda bem baixa para ser beneficiária do “Bolsa Família”, incompatível com que ela ostentava e com as movimentações financeiras nas contas bancárias dela, mas não se recorda exatamente quais eram esses valores. Reafirmou que com certeza a renda declarada por ela não era compatível com o benefício do “Bolsa Família”, que para receber tinha que ter uma renda bem baixa, e claramente não era o que ela e suas filhas demonstravam no dia a dia (mídia audiovisual encartada aos autos). Clarissa Souza Santiago, assistente social que coordena o programa “Bolsa Família” em Corumbá/MS, afirmou que não se recorda da senhora Irllan Kardec, nem de ter colaborado com a investigação da Polícia Federal em face da ré presente na audiência (mídia audiovisual encartada aos autos) e, portanto, nada acrescentou ao acervo probatório. Por fim, a ré foi interrogada, e sustentou que não ocorreu fraude no recebimento do benefício, uma vez que o benefício lhe foi oferecido por uma assistente social, pois à época se encontrava numa situação muito difícil, relatando que tinha acabado de sair da cadeia, estava desempregada, seu marido estava preso e seus filhos estudavam em uma escola estadual chamada Dom Bosco e, por conta disso, a escola, ciente da situação, encaminhou a interrogada a uma assistente social do CRAS (Centro de Referência de Assistência Social) para o recebimento do “Bolsa Família”. Disse que, neste período (por volta do início de 2013) tinha um só colchão em sua casa onde dormia ela e seus filhos, não tinha fogão, não tinha nada, enfrentando uma situação financeira muito difícil, e diante dos fatos começou a receber ajuda do Governo, e somente 4 anos depois lhe foi oferecido um “trabalho” em que atuava como "laranja", porém naquele momento não tinha consciência disso, hoje sabe e até responde a um processo penal por conta disto e, inclusive, ficou presa. Alegou que naquele período de 2013 até 2017 sobreviveu apenas com a ajuda do seu sogro e trabalhos informais de faxina, lavagem de roupas e manicure, ganhando com esses “bicos” cerca de R$250,00 (duzentos e cinquenta) a R$300,00 (trezentos reais) por mês, mas passava por dificuldades, sendo ajudada pelo padre da escola e pelo benefício do “Bolsa Família”. Alegou que sua declaração do IR foi feita depois que começou a trabalhar com “lavagem de dinheiro”, mas ignorava que era crime, e o dinheiro só entrava e saía da sua conta e recebia uma porcentagem de meio por cento, e o veículo que estava em seu nome (GM/S10, ano 2016, placas QAA-8218) na realidade não era de sua propriedade, que só atuava como “laranja”. Disse que quando passou a receber esses valores em sua conta bancária do grupo criminoso de “lavagem de dinheiro, não informou o Governo Federal para “cortar” o benefício do “Bolsa Família” porque não tinha conhecimento que era obrigada a informar, só sabendo hoje que era um benefício só para quem não tinha renda. Alegou que recebeu uma visita de uma assistente social em sua residência, fez um cadastro e passou a receber o benefício quatro meses depois retroativos à data do cadastro, alegando que não usou de má fé, não sabendo que a partir que tivesse uma renda teria que informar a coordenadora do programa “Bolsa Família”. Por fim, negou que houvesse atualizado o cadastro na plataforma do CAD (cadastro único) em 2018 ou qualquer outro ano, recordando-se apenas que depois de um determinado tempo recebeu visita de uma assistente social que não questionou sua renda familiar. Negou que sua residência é própria, que a casa onde mora é de seu sogro que a isentou do pagamento de alugueres, residindo nela somente com seus filhos, e que atualmente vende roupas pela internet e, às vezes, compra por atacado usando o CNPJ da referida empresa (salão de beleza) (mídia audiovisual encartada aos autos), que era de “fachada”. Conforme Relatório da Base de Inteligência Policial (BIP) da Delegacia da Polícia Federal em Corumbá/MS, a investigada Irllan Kardec é proprietária de um salão de beleza na rua Dom de Aquino, nº 2.403 (nome de fantasia “Ianna Empreendimentos”, CNPJ 12.379.032/0001-92), em Corumbá/MS, e em consulta ao banco de dados disponíveis, constatou-se que a referida empresa não possui funcionários ativos, fato que chamou a atenção dada as atividades da empresa (salão de beleza), além de Irllan Kardec ser proprietária de dois veículos (GM/S10 Rodeio, cor branca, ano 2011, placa NRL 8448, e GM/S10, cor vermelha, ano 2016, placa QAA 8218), tendo a investigada envolvimento com o tráfico de drogas, pois sua atuação na cidade de Corumbá/MS seria receber o repasse de numerários, utilizando diversas contas bancárias de sua titularidade, bem como de pessoas jurídicas ligadas a ela e, posteriormente, distribuir aos fornecedores de drogas bolivianos (Informação Policial 10/2016 – DPF/CRA/MS – IPL 93/2016 e apensos de ID 277531393 – link de acesso no navegador da internet bit.ly/44j7UJD). A Defesa alega ausência de prova do dolo na conduta da apelante. Ora, a indicar uma possível vontade da ré/apelante na prática de estelionato contra o Ministério do Desenvolvimento Social, pode-se se inferir a partir de seu cadastro Único online para Programas Sociais do Governo Federal em janeiro de 2013, declarando a ré/apelante que ela e sua família viviam com a renda per capita no importe de R$60,00 (sessenta reais), e sua atualização cadastral em janeiro de 2018 no CADÚnico, mantendo as mesmas informações falsas do cadastro inicial, objetivando o recebimento do benefício do “Bolsa Família”, entendo que, no presente caso, há comprovação suficiente do dolo em sua conduta. Não se trata a ré/apelante de pessoa simples e de baixa instrução, pois possui ensino médio completo, conforme ela própria declarou em seu interrogatório judicial (mídia audiovisual encartada aos autos), ademais até as pessoas mais simples e de baixa escolaridade tinham condições de saber quais eram os requisitos necessários para ser beneficiário do “Bolsa Família” por se tratar de programa assistencial de conhecimento popular, amplamente divulgado pelo próprio Governo Federal e pela mídia (rádio, TV, redes sociais, sites oficiais do Governo etc.), não sendo plausível que a ré tenha realizado saques reiterados, contínuos (de 2013 a 2017) de um benefício assistencial para quem vive em situação de extrema pobreza enquanto participava de um esquema criminoso de “lavagem de dinheiro” e evasão de divisas, cujos valores tinham sua origem no crime de tráfico internacional de drogas (Autos nº 0008835-38.2016.4.03.6000), recebendo uma porcentagem de lucro nesses delitos, ainda que pequena, segundo ela de 0,5% (meio por cento), mas que supera em muito o requisito para percepção do benefício do programa assistencial do “Bolsa Família”. Ainda a reforçar a inquestionável responsabilidade penal da ré constam nos autos os depoimentos dos policiais federais Eduardo Henrique e Mariana Almeida que participaram das investigações para apurar o cometimento dos crimes de lavagem de dinheiro e evasão de divisas praticadas por Irllan Kardec, foram uníssonos em afirmar em Juízo (mídias audiovisuais encartadas aos autos) que no decorrer da investigação recordam que a ré tinha uma elevada movimentação bancária e que ostentava um estilo de vida totalmente incompatível com quem recebe um benefício assistencial do Governo Federal como o “Bolsa Família” que é pago para pessoas de baixíssima renda. As provas demonstram os valores recebidos indevidamente pela ré/apelante a título de “Bolsa Família” (R$ 11.282,00) por prestar informações falsas no momento de sua inscrição no Cadastro Único de Programas Sociais do Governo Federal, declarando renda familiar per capita incompatível com sua declaração do IRPF e bens em seu nome (veículo GM/S10, ano 2016, Placas QAA 8218 e proprietária de um salão de beleza), estando ciente que prestava informações falsas acerca de seu rendimento familiar e de que não se enquadrava no núcleo de famílias extremamente pobres ou miseráveis, com o nítido propósito de receber os recursos advindos do programa social “Bolsa Família”. Demostrado, portanto, a consciência e a vontade da ré em praticar o crime, não sendo cabível absolvição com base no art. 386, VII, do Código de Processo Penal. Comprovadas a materialidade, a autoria e o dolo, a condenação deve ser mantida. Passo à análise da dosimetria. Dosimetria. A sentença fixou a pena nos seguintes termos (ID 277531396, negritos no original): “A pena prevista para a infração capitulada no art. 171, caput, do Código Penal, está compreendida entre 1 e 5 anos de reclusão e multa. a) quanto à culpabilidade, o grau de reprovabilidade e o dolo apresentam-se normais à espécie; b) a parte acusada possui maus antecedentes certificados nos autos, qual seja a ação penal n° 180/97 oriunda do Juízo da Comarca de Nova Granada/SP, com trânsito em julgado na data de 19/01/1998 (id. 294387005) c) não existem elementos que retratem a conduta social e a personalidade da parte ré; d) nada a ponderar sobre os motivos do crime; e) relativamente às circunstâncias do crime, observo que o crime foi praticado de modo usual; f) as consequências do crime não são especialmente reprováveis para o tipo; g) nada a ponderar a respeito do comportamento da vítima. Assim, com base no artigo 59 do Código Pena, fixo a pena-base acima do mínimo legal, em 1 ano e 6 meses de reclusão, e 43 dias-multa. Na segunda fase, presente a agravante da reincidência, visto a condenação por tráfico de drogas com trânsito em julgado em 09/04/2007, nos autos 0001967-08.2007.8.12.0008 (id. 23513154 - Pág. 14), pelo que agravo a pena em 1/6, agora fixada em 1 ano e 9 meses de reclusão, e 50 dias-multa. Na terceira fase, presente a majorante prevista no art. 171, § 3°, pelo que aumento a pena em 1/3, restando a pena definitiva fixada em 2 anos e 4 meses de reclusão, e 67 dias-multa. (...) Fixo como regime inicial para cumprimento da pena o semiaberto, nos termos do CP, 33, § 2º, visto a reincidência. A substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos não se mostra possível, ante a reincidência (art. 44, II, Código Penal). A parte ré se encontra em liberdade, não se fazem presentes os motivos autorizadores da decretação da prisão preventiva. Poderá, portanto, apelar em liberdade. Condenado a ré à reparação do dano causado, e arbitro seu o valor de R$ 11.282,00 (onze mil, duzentos e oitenta e dois reais), que deverão ser destinados à União, vítima do delito, devidamente atualizados. Condeno a parte acusada ao pagamento das custas processuais. Considerando a renda declarada em audiência de instrução (Id 105117850) e a declaração de hipossuficiência de Id 23513206, fls. 08, concedo-lhe os benefícios da gratuidade de justiça.” A combativa Defesa requer a redução da pena-base e a de multa em seu mínimo legal. Assiste-lhe parcial razão. Na primeira fase, a r. sentença considerou os maus antecedentes (a ré possui uma condenação transitada em julgado em 19/01/1998 por tráfico de drogas (art. 12 da antiga Lei nº 6.368/76, Autos nº 008.07.001967-0 - Certidão de ID 277531395), ou seja, em data bem anterior ao crime aqui tratado (ocorrido em 23.01.2013), o que não gera a reincidência (CP, art. 64,I) porque, indubitavelmente, transcorreu prazo superior a 5 anos entre a data do cumprimento da pena e o novo delito, porém configura maus antecedentes, o que não ofende a Súmula nº 444 do STJ. Registro que a questão da exasperação da pena-base com fundamento em condenações transitadas em julgado há mais de 5 (cinco) anos teve repercussão geral reconhecida no Recurso Extraordinário nº 593.818-RG/SC, de relatoria do Ministro Roberto Barroso, com conclusão de julgamento pelo Supremo Tribunal Federal em 17.08.2020, com fixação da tese de que “Não se aplica ao reconhecimento dos maus antecedentes o prazo quinquenal de prescrição da reincidência, previsto no art. 64, I, do Código Penal”. Desse modo, com base no entendimento acima, não vejo como afastar a avaliação desfavorável dos maus antecedentes, como a única circunstância judicial desfavorável à ré, razão pela qual a sentença fixou a pena-base acima do mínimo na fração de 1/2 (metade), ou seja, em 1 (um) ano e 6 (seis) meses de reclusão. O Código Penal adotou o critério trifásico para fixação das penas, porém não determinou condições específicas para majoração da pena-base, tampouco estipulou critérios aritméticos absolutos dentro dos limites mínimo e máximo da sanção, de modo que o julgador possui certa discricionariedade fundamentada pelos elementos concretos dos autos e pelos princípios da razoabilidade e proporcionalidade. E pelos parâmetros adotados pela colenda Quinta Turma enseja a majoração da pena-base na fração de 1/6 (um sexto) acima do mínimo legal pela valoração negativa somente dos maus antecedentes, pelo que reduzo a pena-base para 1 (um) anos e 2 (dois) meses de reclusão, e pagamento de 11 (onze) dias-multa. Na segunda fase a ré Irllan Kardec não confessou a prática do crime, de modo que para ela descabe a atenuante e preservo a agravante da reincidência, porque a ré possui outra condenação criminal por tráfico de drogas (art. 12, c. c. o art. 18, III, ambos da antiga Lei de Drogas) perante a 1ª Vara Criminal da Justiça Estadual de Corumbá/MS (Autos nº 0001967-08.2007.8.12.0008), com trânsito em julgado em 09/04/2007, sendo que esta condenação definitiva não foi utilizada para majoração da pena-base a título de maus antecedentes e não alcançada pelo período depurador (CP, art. 64, I). A pena por esse delito (fato ocorrido em 28/09/2005) foi de 8 anos e 8 meses de reclusão, em regime fechado, com condenação criminal passada em julgado em 09/04/2007 (conforme Certidão de ID 277531330, pág. 14). Os fatos aqui tratados se deram em 23/01/2013 (denúncia de ID277531331, págs. 2/5), e considerando não haver notícias nos autos sobre o cumprimento ou extinção da pena pelo fato anterior, é nítida que a execução dessa pena anterior de mais de 8 anos) não pode ter se dado fora do quinquênio depurador (CP, art. 64, I), configurando-se a reincidência. Assim sendo, nesta fase mantenho o acréscimo pela reincidência (CP, artigo, 64, I) em 1/6 (um sexto), o que ora resulta na pena intermediária de 1 (um) ano, 4 (quatro) meses e 10 (dez) dias de reclusão, mais pagamento de 12 (doze) dias-multa. Na terceira fase, presente a majorante prevista no art. 171, § 3°, do Código Penal, pelo que aumento a pena em 1/3, restando a pena definitiva ora fixada em 1 (um) ano, 9 (nove) meses e 23 (vinte e três) dias de reclusão, mais o pagamento proporcional de 16 (dezesseis) dias-multa, à razão unitária de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos, a ser corrigido monetariamente quando do efetivo pagamento, tal como estabelecido na sentença. Ainda nesta terceira fase, não foi considerado na sentença o aumento pela continuidade delitiva (CP, art. 71), uma vez que a ré recebeu indevidamente os valores do programa “Bolsa Família” sem preencher os requisitos necessários, no período de março de 2013 a junho de 2017, porém, não se pode inovar agora, em recurso exclusivo da defesa, sob pena de reformatio in peius. O regime inicial de cumprimento foi fixado no semiaberto (CP, art. 33, § 2º, "b"), sob o fundamento de a ré ser reincidente. Diante do quantum de pena ora fixado (1 ano, 9 meses e 23 dias de reclusão) em princípio, caberia o regime inicial aberto, entretanto, devido a presença da reincidência em razão de condenação transitada em julgado por outro delito anterior ao aqui tratado (Certidão de ID 277531330, pág. 14), mantenho o regime imediatamente mais gravoso, qual seja, o semiaberto para cumprimento da pena privativa de liberdade, nos termos do art. 33, §2º, alínea “b”, do Código Penal, a teor da Súmula 269 do STJ: "É admissível a adoção do regime prisional semi-aberto aos reincidentes condenados a pena igual ou inferior a 4 (quatro) anos se favoráveis as circunstâncias judiciais." Assim, incabível a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, uma vez que se trata de réu reincidente e que ostenta maus antecedentes, nos termos do artigo 44, II, do Código Penal. Do ressarcimento ao Erário. Por fim, a combativa Defesa requer seja afastada a condenação à indenização prevista no art. 387, IV, do CPP, sob a alegação de a apelante não possuir condições financeiras para adimpli-la, pois é pessoa simples, de baixa renda, e sobrevive laborando como diarista e manicure. À defesa não assiste razão. Na sentença restou fixado o valor mínimo de reparação dos danos nestes termos (sentença de ID 277531396): “Condenado a ré à reparação do dano causado, e arbitro seu o valor de R$ 11.282,00 (onze mil, duzentos e oitenta e dois reais), que deverão ser destinados à União, vítima do delito, devidamente atualizados.” E, para que seja fixado, na sentença criminal, o valor mínimo para reparação dos danos causados à vítima (art. 387, IV, do CP), é necessário que haja pedido expresso e formal, feito pelo Ministério Público ou pelo ofendido, a fim de que seja oportunizado ao réu o contraditório e sob pena de violação ao princípio da ampla defesa (STJ, 6ª Turma, AgRg no AREsp 389.234/DF, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 08/10/2013). A aludida formalidade foi cumprida, já que o MPF requereu, ao ofertar a denúncia, conforme de infere da parte final da peça exordial acusatória em ID 277531331, pág. 5, verbis: "Por fim, requer a Vossa Excelência que, ao final da instrução, ao proferir a sentença condenatória, fixe valor mínimo para a reparação dos danos causados pela infração, considerando os prejuízos causados à União”. Ademais, a fixação do valor mínimo a título de reparação não encontra óbice pois há, nos autos, prova do prejuízo suportado pelo INSS com a conduta descrita na denúncia, não se trata de questão complexa que possa demandar dilação probatória para apuração desse valor e, por outro lado, inexiste comprovação de que o INSS tenha sido indenizado pelo prejuízo sofrido com o estelionato imputado à ré. De acordo com o art. 91, I, do CP, a condenação do acusado torna certa a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime. Trata-se de efeito automático da condenação previsto na legislação penal, cabendo ao Magistrado fixar o valor mínimo para indenização, tratando-se de dispositivo legal de comando cogente, sendo correta a fixação do valor pelo Juiz sentenciante, nos termos do que determina o artigo 387, inciso IV, do Código de Processo Penal, conforme assinalou a ilustre Procuradoria Regional da República. No caso, a concessão e pagamento do benefício do programa “Bolsa Família” apenas ocorreu mediante fraude pela ré praticada, razão pela qual indefiro o pedido defensivo de isenção do pagamento previsto no art. 387, IV, do CPP, dado que a circunstância de ser supostamente hipossuficiente, o que não foi comprovado documentalmente pela defesa, não a isenta da condenação no pagamento a título de reparação mínima dos danos causados à União. Registro que eventual impossibilidade no pagamento do valor mínimo indenizatório deverá ser apreciada pelo Juízo das Execuções Penais, que terá melhores condições de aferir a situação financeira da condenada. Em suma, mantenho a condenação de ressarcimento ao erário dos valores fraudados, fixado pela r. sentença (R$ 11.282,00 – onze mil, duzentos e oitenta e dois reais), pois houve pedido expresso na denúncia para tal condenação, não violando, assim, o princípio da ampla defesa e do contraditório. Ante o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO ao recurso de apelação interposto pela defesa de IRLLAN KARDEC DE OLIVEIRA para reduzir sua pena-base, do que resulta para o apelante, pela prática do crime do art. 171, §3º, do CP, a pena definitiva de 1 (um) ano, 9 (nove) meses e 23 (vinte e três) dias de reclusão, em regime inicial semiaberto, e pagamento de 16 (dezesseis) dias-multa, cada qual no valor unitário mínimo legal vigente ao tempo do crime, vedada a substituição da pena corporal por restritivas de direitos. É o voto. Autos: APELAÇÃO CRIMINAL - 0000200-85.2018.4.03.6004 Requerente: IRLLAN KARDEC DE OLIVEIRA Requerido: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL NO ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL Ementa: DIREITO PENAL. PROCESSO PENAL. ARTIGO 171, § 3º, DO CP. MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO COMPROVADOS. CONDENAÇÃO CONFIRMADA. DOSIMETRIA DA PENA REVISTA. REDUÇÃO DA PENA-BASE DA RÉ. REDUÇÃO DA PENA DE MULTA PROPORCIONALMENTE. MANTIDO O REGIME DE PENA MAIS GRAVOSO. REINCIDÊNCIA. INDENIZAÇÃO MÍNIMA. RECURSO DA DEFESA A QUE SE DÁ PARCIAL PROVIMENTO. I. Caso em exame. 1. Apelação contra a decisão que condenou a ré pela prática delitiva descrita no art. 171, §3º, do CP. II. Questão em discussão. 2. A questão em discussão consiste na alegação de defesa de que não há provas de que a apelante agiu com dolo quanto ao crime de estelionato previdenciário. Subsidiariamente, em caso de confirmação da condenação, requer a apelante: (a) a redução da pena-base e a de multa no mínimo legal; (b) isenção quanto a condenação mínima de reparação dos danos causados pela ré à União, arbitrado no valor de R$ 11.282,00 (onze mil, duzentos e oitenta e dois reais), alegando incapacidade financeira da apelante. III. Razões de decidir. 3. Materialidade delitiva comprovada pelo conjunto probatório acostado aos autos. 4. Comprovada a autoria e o dolo em relação a ré, ora apelante. O conjunto probatório permite a conclusão com segurança e além de qualquer dúvida razoável que a prática de estelionato contra o Ministério do Desenvolvimento Social se deu pela ré a partir de seu cadastro Único online para Programas Sociais do Governo Federal em janeiro de 2013, declarando a ré/apelante que ela e sua família vivia com a renda per capita no importe de R$60,00 (sessenta reais), e sua atualização cadastral em janeiro de 2018 no CADÚnico, mantendo as mesmas informações falsas do cadastro inicial, objetivando o recebimento do benefício do “Bolsa Família”, o que comprova o dolo em sua conduta. 5. Ainda a reforçar a inquestionável responsabilidade penal da ré constam nos autos os depoimentos dos policiais federais que participaram das investigações para apurar o cometimento dos crimes de lavagem de dinheiro e evasão de divisas praticadas pela ré/apelante, foram uníssonos em afirmar em Juízo (mídias audiovisuais encartadas aos autos) que no decorrer da investigação recordam que a ré tinha uma elevada movimentação bancária e que ostentava um estilo de vida totalmente incompatível com quem recebe um benefício assistencial do Governo Federal como o “Bolsa Família” que é pago para pessoas de baixíssima renda. 6. As provas demonstram os valores recebidos indevidamente pela ré/apelante a título de “Bolsa Família” (R$ 11.282,00) por prestar informações falsas no momento de sua inscrição no Cadastro Único de Programas Sociais do Governo Federal, declarando renda familiar per capita incompatível com sua declaração do IRPF e bens em seu nome (veículo GM/S10, ano 2016, Placas QAA 8218 e proprietária de um salão de beleza), estando ciente que prestava informações falsas acerca de seu rendimento familiar e de que não se enquadrava no núcleo de famílias extremamente pobres ou miseráveis, com o nítido propósito de receber os recursos advindos do programa social “Bolsa Família”. Demostrado, portanto, a consciência e a vontade da ré em praticar o crime, não sendo cabível absolvição com base no art. 386, VII, do Código de Processo Penal. 7. Dosimetria. Na primeira fase houve a avaliação desfavorável dos maus antecedentes (uma condenação definitiva anterior, o que não fere a Súmula 444 STJ), como a única circunstância judicial desfavorável à ré, razão pela qual a sentença fixou a pena-base acima do mínimo na fração de 1/2 (metade). Majoração da pena-base da ré reduzida de 1/2 (metade) para 1/6 (um sexto) acima do mínimo legal pela valoração negativa somente dos maus antecedentes, conforme parâmetros adotados por esta colenda Quinta Turma Julgadora. Pena-base fixada em 1 ano e 2 meses de reclusão, e proporcionalmente reduzida a pena de multa para 11 (onze) dias-multa. 8. Na segunda fase não há atenuantes, preservada a agravante da reincidência porque a ré possui outra condenação criminal por tráfico de drogas (art. 12, c. c. o art. 18, III, ambos da antiga Lei de Drogas- Autos nº 0001967-08.2007.8.12.0008), com trânsito em julgado em 09/04/2007, sendo que esta condenação definitiva não foi utilizada para majoração da pena-base a título de maus antecedentes e não alcançada pelo período depurador (CP, art. 64, I). Mantido o acréscimo pela reincidência (CP, artigo, 64, I) em 1/6 (um sexto). Pena intermediária de 1 (um) ano, 4 (quatro) meses e 10 (dez) dias de reclusão, e proporcionalmente 12 (doze) dias-multa. 9. Na terceira fase, aplicada a majorante prevista no art. 171, § 3°, CP. Pena aumentada em 1/3, restando a pena definitiva ora fixada em 1 (um) ano, 9 (nove) meses e 23 (vinte e três) dias de reclusão, e pagamento proporcional de 16 (dezesseis) dias-multa, cada dia multa no valor unitário mínimo legal, corrigido monetariamente quando do efetivo pagamento, tal como estabelecido na sentença. 10. Ainda nesta fase não foi considerado na sentença o aumento pela continuidade delitiva (CP, art. 71), uma vez que a ré recebeu indevidamente os valores do programa “Bolsa Família” sem preencher os requisitos necessários, no período de março de 2013 a junho de 2017, porém, não se pode inovar agora, em recurso exclusivo da defesa, sob pena de odiosa reformatio in pejus. 11. Diante do quantum de pena ora fixado (1 ano, 9 meses e 23 dias de reclusão) em princípio, caberia o regime inicial aberto, entretanto, devido a presença da reincidência (condenação definitiva por outro delito anterior ao aqui tratado – certidão anexada aos autos), mantido o regime inicial imediatamente mais gravoso, qual seja, o semiaberto (CP, art. 33, §2º, alínea “b”). Súmula 269 do STJ. Incabível a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, uma vez que se trata de réu reincidente (CP, art. 44, II). Incabível a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, uma vez que se trata de réu reincidente, nos termos do artigo 44, II, do Código Penal. 12. Do ressarcimento ao Erário. Mantida a condenação de ressarcimento ao erário dos valores fraudados, fixado pela r. sentença (R$ 11.282,00 – onze mil, duzentos e oitenta e dois reais), pois houve pedido expresso na denúncia para tal condenação, não violando, assim, o princípio da ampla defesa. IV. Dispositivo e tese. 13. Apelação da defesa parcialmente provida. Condenação mantida. Reduzida a pena-base e proporcionalmente a de multa. Mantido o regime inicial semiaberto por se tratar de ré reincidente (CP, art. 33, §2º, “b” e Súmula 269 do STJ). Tese de Julgamento: ”1. Materialidade, autoria e dolo comprovados pelo conjunto probatório acostado aos autos. 2. Condenação mantida. 3. Majoração da pena-base da ré reduzida de 1/2 (metade) para 1/6 (um sexto) acima do mínimo legal pela valoração negativa somente dos maus antecedentes (uma condenação definitiva, o que não fere a Súmula nº 444), conforme parâmetros adotados por esta colenda Quinta Turma Julgadora. 4. Preservada a agravante da reincidência porque a ré possui outra condenação criminal por tráfico de drogas, sendo que esta condenação definitiva não foi utilizada para majoração da pena-base a título de maus antecedentes e não alcançada pelo período depurador (CP, art. 64, I). 5. Majorante prevista no art. 171, § 3°, do Código Penal. Pena aumentada em 1/3. 6. Não foi considerado na sentença o aumento pela continuidade delitiva (CP, art. 71). Não se pode inovar agora, em recurso exclusivo da defesa, sob pena de reformatio in pejus. 7. Regime inicial mais gravoso mantido (semiaberto). Ré reincidente. 8. Mantida a condenação de ressarcimento ao erário dos valores fraudados, fixado pela r. sentença, pois houve pedido expresso na denúncia para tal condenação, não violando, assim, o princípio da ampla defesa.” ________________________________________________________________ Dispositivos relevantes citados: Súmulas 269 e 444; CP, arts. 171, §3º, 33, §2º, “b”, 59, 64, I, 91, I; CPP, art. 387, IV. Jurisprudência relevante citada: STJ - AgRg no AREsp 389.234/DF, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, j. 08/10/2013. ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Quinta Turma, por unanimidade decidiu DAR PARCIAL PROVIMENTO ao recurso de apelação interposto pela defesa de IRLLAN KARDEC DE OLIVEIRA para reduzir sua pena-base, do que resulta para o apelante, pela prática do crime do art. 171, §3º, do CP, a pena definitiva de 1 (um) ano, 9 (nove) meses e 23 (vinte e três) dias de reclusão, em regime inicial semiaberto, e pagamento de 16 (dezesseis) dias-multa, cada qual no valor unitário mínimo legal vigente ao tempo do crime, vedada a substituição da pena corporal por restritivas de direitos, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. FÁBIO MÜZEL Juiz Federal
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