Processo nº 1001650-41.2023.8.11.0046
ID: 317881259
Tribunal: TJMT
Órgão: Primeira Câmara Criminal
Classe: APELAçãO CRIMINAL
Nº Processo: 1001650-41.2023.8.11.0046
Data de Disponibilização:
07/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
DAVI FERREIRA DE PAULA
OAB/MT XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1001650-41.2023.8.11.0046 Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Assunto: [Crimes de Tráfico Ilícito e Uso Indevido de Drogas] R…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1001650-41.2023.8.11.0046 Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Assunto: [Crimes de Tráfico Ilícito e Uso Indevido de Drogas] Relator: Des(a). MARCOS MACHADO Turma Julgadora: [DES(A). MARCOS MACHADO, DES(A). WESLEY SANCHEZ LACERDA, DES(A). ORLANDO DE ALMEIDA PERRI] Parte(s): [BRUNO NUNES DO NASCIMENTO - CPF: 085.232.551-76 (APELANTE), DAVI FERREIRA DE PAULA - CPF: 415.295.701-82 (ADVOGADO), POLÍCIA JUDICIÁRIA CIVIL DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0029-45 (APELADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (APELADO), WEVERSON ARON DOS SANTOS SILVA (TERCEIRO INTERESSADO), CARLOS SILVA ARAUJO - CPF: 672.490.862-00 (TERCEIRO INTERESSADO), CLEBSON MARCELINO PEREIRA - CPF: 008.737.582-69 (TERCEIRO INTERESSADO), SOCIEDADE (VÍTIMA)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). WESLEY SANCHEZ LACERDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU PARCIALMENTE O RECURSO. E M E N T A Ementa: Direito penal e processual penal. Apelação criminal. tráfico de drogas. Nulidade da busca e apreensão domiciliar. Insuficiência de provas para a condenação. Desclassificação para uso pessoal. Tráfico privilegiado. Recurso provido parcialmente. I. Caso em exame Apelação criminal interposta contra sentença que condenou o apelante por tráfico de drogas a 5 (cinco) anos de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa, em regime inicial semiaberto, visando o provimento para que sejam anuladas as provas decorrentes da busca e apreensão domiciliar e absolvido, também por insuficiência probatória ou desclassificado o tráfico para posse de entorpecentes para consumo pessoal. Em pedido subsidiário, a redução das penas. II. Questão em discussão Há três questões: (1) a nulidade da busca e apreensão domiciliar sob assertiva de que: a) “na r. decisão, não consta data, nem assinatura do juiz que determinou a decisão. Também não consta o dia em que foi cumprida a busca e apreensão na residência do acusado”, b) a diligência teria sido fundamentada de “forma genérica”. No mérito, sustenta que: 1) as provas seriam insuficientes para a condenação; 2) a droga apreendida se destinada ao consumo próprio; 3) faria jus à minorante do tráfico privilegiado “na fração máxima de 2/3 (dois terços); com a substituição da pena privativa de liberdade por 2 (duas) restritiva de direitos”, por ser primário, possuir bons antecedentes, não se dedicar à atividade ilícita e não ser membro de organização criminosa. III. Razões de decidir 1. A busca domiciliar foi regularmente autorizada por decisão judicial fundamentada, baseada em relatório de investigação e diligências policiais que confirmaram movimentação típica de ponto de venda de drogas, inexistindo nulidade a ser reconhecida. 2. As declarações coerentes dos policiais militares (TJMT, Enunciado Criminal 8), são suficientes para caracterizar tráfico de substâncias entorpecentes, o qual “classifica-se como crime de ação múltipla ou misto alternativo e, portanto, consuma-se com a prática de qualquer das condutas nele descritas” (TJMT, Enunciado Criminal 7), dentre elas “guardar” e “ter em depósito” substâncias entorpecentes para fins de comercialização. 3. As apreensões de maconha, balança de precisão, plástico filme e anotações sobre a comercialização e entorpecentes permitem aferir a destinação mercantil das drogas, por indicarem “intuito de mercancia”. 4. O ônus de provar a destinação exclusiva para uso próprio das drogas apreendidas cabe à Defesa, “não bastando mera alegação, máxime quando a natureza, o local e as condições em que se desenvolveu a ação apontam para conclusão diversa”, mesmo porque a condição de usuário não elide a responsabilização do agente por comercializar drogas, notadamente por ser comum a figura do traficante-usuário ou usuário-traficante, que vende a substância para sustentar o próprio vício. 5. A condenação criminal por fato posterior constitui fundamento inidôneo para caracterizar dedicação às atividades criminosas e “obstar a aplicação do redutor previsto no § 4º do art. 33 da Lei 11.343/2006” (STJ, AgRg no HC nº 578687/SP – Relator: Min. Reynaldo Soares da Fonseca – 26.5.2020). Isso porque o c. STJ, em julgamento de recursos repetitivos [Tema 1139], firmou orientação de ser vedada a utilização de inquéritos e/ou ações penais em andamento para afastar o redutor do tráfico privilegiado. 6. A quantidade de droga apreendida [2,32g (dois gramas e trinta e dois centigramas) de maconha] não permite deduzir traficância em larga escala, notadamente por ser inexpressiva, segundo interpretação do c. STJ. 7. Os agentes policiais não presenciaram ou visualizaram qualquer ato de comercialização ilícita de entorpecentes praticado pelo apelante e inexistem investigações posteriores que demonstrassem habitualidade delitiva ou seu envolvimento em organização criminosa, como por exemplo quebra de sigilo telefônico, extração de dados de aparelho celular, oitiva de usuários ou identificação de rede de distribuição de entorpecentes. 8. A primariedade à época dos fatos, quantidade de droga e a ausência de provas da habitualidade delitiva autorizam o reconhecimento do tráfico privilegiado no de 2/3 (dois terços). IV. Dispositivo e tese Recurso provido parcialmente para readequar as penas do apelante a 1 (um) ano e 8 (oito) meses de reclusão e 166 (cento e sessenta e seis) dias-multa, em regime aberto, substituída a reprimenda corporal por 2 (duas) restritivas de direitos, a critério do Juízo da Execução Penal. Teses de julgamento: 1. A decisão que defere busca e apreensão domiciliar se afigura válida quando baseada em indícios concretos e diligências investigativas prévias que justificam a medida cautelar. 2. A apreensão de entorpecentes, apetrechos e anotações típicas da traficância, corroborada por depoimentos policiais harmônicos, autoriza a condenação por tráfico de drogas. 3. A existência de condenação posterior não afasta, por si só, a aplicação da minorante do tráfico privilegiado, cuja análise deve considerar a situação fática à época dos fatos. 4. Mostra-se cabível a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos quando preenchidos os requisitos do art. 44 do Código Penal, diante da pena inferior a quatro anos e das circunstâncias pessoais favoráveis do réu. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, XI; CPP, arts. 240, §1º, 243, 248, 593, I; CP, arts. 44 e 107; Lei nº 11.343/2006, arts. 28 e 33, caput e §4º. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgRg no HC nº 797.460/SP, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, j. 24.5.2023; STJ, AgRg no HC 843.658/SP, Rel. Min. Jesuíno Rissato, j. 1.3.2024; TJMT, AP nº 0000432-61.2017.8.11.0092, Rel. Des. Luiz Ferreira da Silva, j. 5.12.2022; TJMT, Enunciados Criminais nº 3, 7 e 8; STJ, AgRg no HC nº 578.687/SP, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 26.5.2020; STJ, AgRg nos EDcl no HC nº 771.741/SP, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 26.6.2023; STF, RE nº 635.659, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 26.6.2024 (Tema 506); TJSC, HC nº 5025005-95.2020.8.24.0000, Rel. Des. Sidney Eloy Dalabrida, j. 10.9.2020; TJMT, Ap nº 1007955-14.2023.8.11.0055, Rel. Des. Rondon Bassil Dower Filho, j. 7.2.2024; TJMT, AP nº 124790/2016, Rel. Des. Orlando de Almeida Perri, j. 27.10.2016; TJMT, Ap nº 0011751-16.2016.8.11.0042, Rel. Des. Orlando de Almeida Perri, j. 31.10.2023; TJMT, Ap nº 0004323-41.2019, Rel. Des. Jorge Luiz Tadeu Rodrigues, j. 17.5.2024; STJ, REsp nº 1977027/PR e REsp nº 1977180/PR, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 10.8.2022 (Tema 1139). R E L A T Ó R I O PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL APELAÇÃO Nº 1001650-41.2023.8.11.0046 - CLASSE CNJ – 417 - COMARCA DE COMODORO APELANTE(S): BRUNO NUNES DO NASCIMENTO APELADOS(S): MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL R E L A T Ó R I O Apelação criminal interposta por BRUNO NUNES DO NASCIMENTO contra sentença proferida pelo Juízo da 2ª Vara da Comarca de Comodoro, nos autos de ação penal (PJE nº 1001650-41.2023.8.11.0046), que o condenou por tráfico de drogas a 5 (cinco) anos de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa, em regime inicial semiaberto - art. 33, caput, da Lei nº 11.343/2006 - (ID 279690370). O apelante suscita: 1) a nulidade da busca e apreensão domiciliar sob assertiva de que: a) “na r. decisão, não consta data, nem assinatura do juiz que determinou a decisão. Também não consta o dia em que foi cumprida a busca e apreensão na residência do acusado”, b) a diligência teria sido fundamentada de “forma genérica”. No mérito, sustenta que: 1) as provas seriam insuficientes para a condenação; 2) a droga apreendida se destinada ao consumo próprio; 3) faria jus à minorante do tráfico privilegiado “na fração máxima de 2/3 (dois terços); com a substituição da pena privativa de liberdade por 2 (duas) restritiva de direitos”, por ser primário, possuir bons antecedentes, não se dedicar à atividade ilícita e não ser membro de organização criminosa. Pede o provimento para que sejam anuladas as provas decorrentes da busca e apreensão domiciliar e absolvido, também por insuficiência probatória ou desclassificado o tráfico para posse de entorpecentes para consumo pessoal. Em pedido subsidiário, a redução das penas (ID 284334391). A 2ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE COMODORO pugna pelo desprovimento do apelo (ID 288958897). A i. Procuradoria de Justiça Criminal opina pelo desprovimento, em parecer assim sintetizado: “EMENTA. APELAÇÃO CRIMINAL – IRRESIGNAÇÃO DEFENSIVA – ART. 33, CAPUT, DA LEI N° 11.343/06 – CONDENAÇÃO – PRELIMINAR – ILEGALIDADE DO MANDADO DE BUSCA E APREENSÃO – MÉRITO – ABSOLVIÇÃO – APLICAÇÃO DA CAUSA DE DIMINUIÇÃO DA PENA DO § 4º, DO ARTIGO 33, DA LEI Nº 11.343/2006 – SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVAS DE DIREITOS – DESCLASSIFICAÇÃO DO ART. 33 PARA O ART. 28 DA LEI Nº 11.343/2006 – IMPROCEDÊNCIA DAS TESES. Pretendido reconhecimento da ilegalidade do mandado de busca e apreensão – Improcedência. Adequação do mandado – Fundadas razões para a busca domiciliar - Decisão que autorizou a busca e apreensão devidamente fundamentada - Ausência de vício que possa levar à nulidade do mandado. Pretendida absolvição – Improcedência. Materialidade - Auto de apreensão - Laudo pericial – Relatório de busca e apreensão - Autoria do crime corroborada pelos depoimentos harmônicos - Depoimento policial – Robustez probatória – Elementos de prova incompatíveis com a absolvição. Pretendida aplicação da redutora do tráfico privilegiado – Improcedência. Não cumprimento dos requisitos para a diminuição de pena nos termos do art. 33, §4º, da lei 11.343/06. Pretendida substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos – Improcedência. Ausência de preenchimento dos requisitos objetivos e subjetivos previsto no art. 44 do” (Esther Louise Asvolinsque Peixoto, procuradora de Justiça - ID 289898856) É o relatório. V O T O R E L A T O R VOTO (PRELIMINAR - NULIDADE DA BUSCA E APREENSÃO DOMICILIAR) EXMO. SR. DES. MARCOS MACHADO (RELATOR) Egrégia Câmara: O apelante suscita a nulidade da busca e apreensão domiciliar sob assertiva de que: a) “na r. decisão, não consta data, nem assinatura do juiz que determinou a decisão. Também não consta o dia em que foi cumprida a busca e apreensão na residência do acusado”, b) a diligência teria sido fundamentada de “forma genérica”. Vejamos. Em 6.6.2022, o Núcleo da Polícia Militar de Nova Lacerda/MT recebeu informação de uma usuária de drogas no sentido de que “na noite anterior esteve na boca de fumo conhecida como boca do bruninho, mais precisamente rua lino ferreira dos santos n° 07, a mesma denunciante está tendo problemas familiares por uso de entorpecentes, que na noite fumou dois telefones na boca, que ela tem nota fiscal dos mesmos, que a droga estava em uma gaveta de fácil acesso, contendo também na casa balança de precisão e instrumentos de manuseio dos entorpecentes, na oportunidade de nos comunicar o fato pediu para não ser identificada por medo de atentado contra sua vida” (Boletim de Ocorrência nº 2022.152475 – ID 279689524 – fls. 2)). Em 7.6.2022, o Delegado de Polícia de Comodoro [Ricardo Marques Sato] ordenou o encaminhamento “à equipe de investigação para levantamento de informações e diligências necessárias, no sentido de averiguar a veracidade dos fatos, elaborando relatório circunstanciado” (Despacho nº 2022.3.100500 – ID 279689524 – fls. 3), motivo pelo qual foi instaurado o Auto de Investigação Preliminar nº 115.11.2022.14357 (ID 279689524 – fls. 1). Consoante se extrai do Relatório de Investigação nº 2022.13.38219, subscrito por investigadores de Polícia [Carlos Silva Araújo, Jackson da Silva Oliveira, Carlos Mozair dos Santos e Vanderlúcio Lizi de Lima], “a movimentação vinda da casa, alvo das investigações era constante enquanto a vigilância ocorria [...]. Indivíduos que provavelmente eram usuários ou faziam o comércio de entorpecentes entravam e saíam da casa a todo o momento, sendo inclusive um homem visualizado saindo de lá fumando um cigarro que pelas características tratava se de substância entorpecente. [...]. Por fim, é sabido que na cidade de Nova Lacerda existe a problemática do tráfico de entorpecentes, já tendo ocorrido operações culminando em prisões de nomes do tráfico naquela cidade, com apreensões de drogas e armamento. Logo, a necessidade de uma apuração através de meios mais robustos e precisos, para evitar o crescimento do tráfico naquela cidade de Nova Lacerda. Para isso se faz necessário uma autorização e expedição de mandado” (ID 279689524 – fls. 4/14). Em 20.6.2022, a autoridade policial representou pela busca e Apreensão domiciliar na residência do apelante BRUNO NUNES DO NASCIMENTO (ID 279689524 – fls. 15/18). Em 18.7.2022, o Juízo singular deferiu a busca domiciliar com a seguinte fundamentação: “[…] Esta representação objetiva a expedição de mandado de busca e apreensão a ser cumprido em endereço residencial situado nesta unidade jurisdicional, cujo pleito originou-se a partir do auto de investigação preliminar n. 115.11.2022.14357 (A.I.P. 118/2022), com vistas a apuração da prática dos delitos de tráfico de drogas e associação para o tráfico, perpetrado, em tese, pelos investigados Bruno Nunes do Nascimento, vulgo “Bruninho”, e Letícia Lorraine. Segundo consta nos autos, conforme narrado no Boletim de ocorrência n. 2022.152475, confeccionado pela Polícia Militar, em síntese, um indivíduo, que pediu para não ser identificado, suposto usuário de drogas, relatou que no dia 05 de junho de 2022 foi até uma boca de fumo conhecida como "Boca do Bruninho" e trocou 02 (dois) aparelhos telefônicos por droga. Informou que quando esteve no local visualizou que a droga estava armazenada em uma gaveta da residência, acompanhado de uma balança de precisão e instrumentos de manuseio para os entorpecentes. Narrou ainda que o local informado já é conhecido dos policiais por haver grande fluxo de usuários de drogas e que a residência pertence aos suspeitos Bruninho e Letícia Lorraine, bem como estes são os responsáveis pela mercancia de drogas no local, inclusive que são membros da Facção Criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC). Diante das informações a polícia civil realizou diligências para identificação dos suspeitos e colheita de maiores informações, de modo que, consoante relatório de investigação n. 2022.13.38219, identificou-se que um dos suspeitos se trata da pessoa de Bruno Nunes Nascimento, vulgo “Bruninho”, o qual possui antecedentes criminais por crimes de corrupção de menor (1x), dirigir veículo sem permissão (1x), quadrilha ou bando (2x) e furto (2x). Foram realizadas também campanas nas proximidades do referido endereço (Rua Lino Ferreira dos Santos, nº 07, localizado em frente ao muro da escola municipal Getúlio Vargas, cidade de Nova Lacerda/MT), conforme mídias constantes no ID 88270174, ocasião em que se observou no decorrer dos dias a existência de uma grande movimentação de pessoas na referida residência, aparentando se tratar de usuários de entorpecentes que estavam comprando drogas (Relatório de Investigação nº 2022.13.38219). Assim, denota-se que os elementos colhidos no auto de investigação preliminar possuem fundadas razões da imprescindibilidade da busca e apreensão requerida, justamente, para colher elementos de convicção da suposta prática delitiva, tais como instrumentos do crime ou mesmo seus objetos. Desde já friso, entretanto, que não há qualquer óbice à expedição de mandado de busca a apreensão nos casos em que sequer há inquérito policial instaurado, como no presente, uma vez que o auto de investigação preliminar instaurado pela autoridade policial revela indícios legais suficientes para o deferimento da representação. [...] Com efeito, o fato narrado é grave e revela a necessidade e a indispensabilidade da concessão da drástica e excepcional medida investigativa, porquanto envolvendo possível crime praticado, em tese, pelo representado, razão pela qual o deferimento da representação é medida que se impõe. Pelo exposto, com fulcro no art. 5º, XI, última parte, da CF/88, e art. 240, § 1º, alíneas “b”, “d”, “e” e “h”, do CPP, defiro a representação formulada pela Polícia Judiciária Civil do Estado de Mato Grosso e, em consequência, determino a busca e apreensão domiciliar em face de Bruno Nunes do Nascimento, vulgo “Bruninho”, e Letícia Lorraine, autorizando a realização de diligências no endereço residencial à Rua Lino Ferreira dos Santos nº 07, Bairro Sol Nascente, localizado em frente ao muro da escola municipal Getúlio Vargas, em Nova Lacerda/MT. Expeça-mandado de busca e apreensão, a fim de que os comandos do presente veredicto sejam imediatamente cumpridos pela autoridade policial, devendo ser observado o que dispõe os art. 243 e art. 248, ambos do Código de Processo Penal, entregando-se uma das vias aos indivíduos indicados. […].” (Antonio Carlos Pereira de Sousa Junior, juíza de Direito – ID 279689524 – fls. 25/27) Em 5.8.2022, os investigadores de Polícia [Clebson Marcelino Pereira, Carlos Silva Araújo e Carlos Mozair dos Santos] cumpriram o mandado de busca e apreensão domiciliar no imóvel localizado à rua Lino Ferreira Santos, próximo à escola Getúlio Vargas, no município de Nova Lacerda/MT [residência de BRUNO NUNES DO NASCIMENTO] e apreenderam “1 (uma) balança de precisão com a figura de caveira na tampa; 4 (quatro) folhas avulsas contendo anotações; 2 (dois) cadernos com anotações; 1 (um) bloco com anotações; 1 (um) caderno da Cooperativa Sicredi com anotações; 1 (uma) porção de substância análoga à maconha; 1 (uma) porção de ‘pó branco’ aparentando ser entorpecente; 2 (dois) pen drives; 2 (dois) papel filme (rolo cortado); 1 (um) celular de cor preta da marca LG K9, IMEI-A: 357155-10-449885-3; 1 (um) celular de cor azul, da marca SAMSUNG, IMEI: 351837/11/267420/5; 1 (um) celular de cor azul clara, da marca MOTOROLA; 1 (uma) garrafa pet de 2 litros, contendo em mais da metade um ‘pó branco’, provavelmente entorpecente”, conforme Relatório de Busca e Apreensão nº 2022.13.53517 (ID 279689524 – fls. 28/37). Em 31.7.2023, BRUNO NUNES DO NASCIMENTO foi denunciado por tráfico de drogas - art. 33, caput, da Lei nº 11.343/2006 - (ID 279689863 – fls. 1/3). O apelante suscitou a referida preliminar em memoriais finais (ID 279690369 – fls. 1/14). Na sentença condenatória, o juiz da causa afastou a tese de nulidade da busca e apreensão domiciliar nos termos das seguintes premissas: “[...] Da preliminar ilegalidade do mandado de busca e apreensão: Em resumo, alega a defesa nulidade do mandado de busca e apreensão, sob o argumento que não consta data, nem assinatura do juiz que determinou decisão, além de não ter o dia em que foi cumprida a busca e apreensão na residência do acusado. Sem maiores delongas, não há fundamento nas conjecturas da defesa, isso porque a decisão que determinou a busca e apreensão domiciliar foi devidamente assinada, conforme verifica-se dos autos nº 1002303-77.2022.8.11.0046 - ID: 90215075 (Signatário: ANTONIO CARLOS PEREIRA DE SOUSA JUNIOR, Data: 18/07/2022 18:40:00, CN Certificado, CN=ANTONIO CARLOS PEREIRA DE SOUSA JUNIOR:23946,OU=MAGISTRADO,OU=Tribunal de Justica Mato Grosso - TJMT,OU=30940707000149,OU=Cert-JUS Institucional - A3,OU=Autoridade Certificadora da Justica - AC-JUS,O=ICP-Brasil,C=BR, Emissor: CN=AC SOLUTI-JUS v5,OU=SMIME,OU=Autoridade Certificadora da Justica v5,O=ICP-Brasil,C=BR). Da mesma forma, resta evidenciado que o Mandado de Busca e Apreensão Domiciliar foi devidamente cumprido 05/08/2022, por volta das 17h15min, consoante consignado no processo nº 1002303-77.2022.8.11.0046 no ID: 92135576. Assim, REJEITO a preliminar aventada. Da preliminar de nulidade da busca e apreensão - ausência de diligências investigativas efetivas e insuficiência de elementos para a concessão do mandado de busca a apreensão: A d. Defesa arguiu nulidade da busca e apreensão domiciliar, por entender que a decisão que determinou o mandado de busca e apreensão é genérica. No ponto, ao examinar minunciosamente as provas contidas nos autos, constata-se que ao reverso do que entende a Defesa, haviam fundadas razões para a busca domiciliar, além de existirem informações anteriores a respeito da traficância realizada pelo o réu. No caso em apreço, a decisão da busca e apreensão foi devidamente fundamentada, descrevendo expressamente que havia uma investigação prévia que justificasse a medida, além disso, não há que se falar em nulidade de mandado de busca e, consequentemente, das provas obtidas com a realização da diligência. [...].” (Ricardo Garcia Maziero, juiz de Direito - ID 209045210) Pois bem. A busca e apreensão domiciliar está fundamentada na imprescindibilidade da medida para o deslinde das investigações relativas ao tráfico de drogas, noticiado por usuária de entorpecentes que não quis se identificar, no sentido de que o apelante estaria utilizando sua residência como “boca de fumo”, em imóvel localizado à rua Lino Ferreira Santos, próximo à escola Getúlio Vargas, no município de Nova Lacerda/MT. Observa-se que a informação recebida pela polícia militar de Nova Lacerda/MT foi confirmada pelo Relatório de Investigação nº 2022.13.38219, elaborado por investigadores de Polícia [Carlos Silva Araújo, Jackson da Silva Oliveira, Carlos Mozair dos Santos e Vanderlúcio Lizi de Lima], os quais consignaram que “os indícios, o comportamento, movimentação na casa, reforçado pela informação trazida e a experiência da equipe investigativa para locais de boca de fumo e comércio de drogas, há forte probabilidade do ponto investigado ser um local de depósito, uso e comércio de entorpecentes” (ID 279689524 – fls. 4/14). O temor da pessoa noticiante foi destacado pelo delegado de Polícia [Ricardo Marques Sarto] na representação pela medida cautelar de busca e apreensão: “a comunicante relatou que estaria tendo problemas familiares, bem como pediu para não ser identificada com medo de sofrer represália” (ID 279689524 – fls. 15/18). No tráfico de drogas, a informação sem identificação do denunciante por temor reverencial, medo de represália e alienação moral ou física [realidade histórica no controle ao tráfico ilícito de drogas], possui relevância ao direito penal, visto que o silêncio/obediência da comunidade em relação aos traficantes de drogas constitui um mecanismo social de defesa diante do risco de morte e da inexistência de soluções institucionais adequadas (SILVA, Luiz Antônio Machado da Silva; LEITE, Márcia Pereira. Violência, crime e polícia: o que os favelados dizem quando falam desses temas?. Disponível em: www.scielo.br). A decisão foi assinada digitalmente[1] pelo juiz da causa [Antônio Carlos Pereira de Sousa Junior] no incidente processual de busca e apreensão domiciliar, tendo sido registrado que o mandado de busca e apreensão foi devidamente cumprido em 5.8.2022, por volta das 17h15min, conforme Relatório de Busca e Apreensão nº 2022.13.53517 (ID 279689524 – fls. 28/37). A busca e apreensão em domicílio [de natureza cautelar preparatória] pode ser autorizada quando fundadas razões evidenciarem a necessidade da colheita de elementos de convicção para apuração de práticas delituosos (CPP, art. 240, § 1º), sobretudo quando “demonstrada a existência dos requisitos necessários para a decretação das medidas, escorado nos argumentos da representação policial” (STJ, AgRg no HC nº 797.460/SP – Relator: Min. Joel Ilan Paciornik – 24.5.2023). Nesse quadro, o ato judicial impugnado [decisão que autorizou a busca e apreensão domiciliar] possui fundamento idôneo, ao se considerar a “apuração de notitia criminis realizada por policiais civis, que ensejou representação da autoridade para a expedição de mandado de busca e apreensão, expedido por juiz de direito, não se verificando a apontada lesão ao direito de inviolabilidade domiciliar” (STJ, AgRg no HC 843658/SP – Relator: Min. Jesuíno Rissato [Des. Convocado do TJDFT] – Sexta Turma – 1º.3.2024). Em situação semelhante, este e. Tribunal decidiu: “Inexiste nulidade a ser reconhecida na busca a apreensão domiciliar quando calcado em decisão fundamentada acerca da necessidade da diligência para reprimir o tráfico de drogas e crimes correlatos na cidade” (TJMT, AP nº 0000432-61.2017.8.11.0092 - Relator: Des. Luiz Ferreira da Silva - Segunda Câmara Criminal - 5.12.2022). Com essas considerações, REJEITA-SE a preliminar. V O T O (MÉRITO) EXMO. SR. DES. MARCOS MACHADO (RELATOR) Egrégia Câmara: O recurso é cabível (CPP, art. 593, I), manejado por quem tem interesse (CPP, art. 577) e não se verifica hipótese de extinção de punibilidade (CP, art. 107). Consta da denúncia que: “[...] No dia 06 de junho e 05 de agosto de 2022, por volta das 10h00min, em uma residência particular, localizada na Rua Lino Ferreira dos Santos, Bairro Centro, em frente ao portão de entrada da Escola Getúlio Vargas em Nova Lacerda/MT, o denunciado BRUNO NUNES DO NASCIMENTO, ciente da ilicitude e reprovabilidade de sua conduta, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regular, guardava e tinha em depósito 02,32 g (duas gramas e trinta e dois centigramas) de maconha (cannabis sativa), e 1.387,33 g (um quilo, trezentas e oitenta gramas e trinta e três centigramas) de ácido bórico, bem como resquícios de cocaína, conforme laudo de pericial nº 410.2.04.2022.009176-03 (ID 118409426), cujas substâncias são capazes de causar dependência física e/ou psíquica, de acordo com a RDC n. 13 de 26/03/2010, que regulamenta a Portaria n. 344/1998, da Secretaria Nacional de Vigilância Sanitária do Ministério de Saúde, sendo de uso proscrito em todo território nacional. [...] ANTE O EXPOSTO, o Ministério Público denuncia a Vossa Excelência BRUNO NUNES DO NASCIMENTO como incurso nas sanções do crime previsto no artigo 33, caput da Lei Federal nº 11343/06 [...].” (Leoni Carvalho Neto, promotor de Justiça – ID 279689863) O Juízo singular reconheceu a responsabilidade penal e dosou as penas nos seguintes termos: “A MATERIALIDADE está devidamente comprovada pelos documentos acostados ao Inquérito Policial nº 115.4.2023.11493 (I.P. 80/2023), sobretudo pelo Auto de Apreensão (ID: 118409426 – Pág. 38), Laudo Pericial n° 410.2.04.2022.009176-03 (ID: 118409426 – Pág. 57/61), Relatório de Busca e Apreensão N° 2022.13.53217 (ID: 118409426 – Pág. 28/61), corroborados pelos depoimentos colhidos perante a autoridade policial, bem como em Juízo, tudo demonstrando a ocorrência do delito. [...] No ponto, a autoria delitiva é incontestável, considerando os depoimentos dos agentes de segurança Carlos Silva Araújo e Clebson Marcelino Pereira, tanto na fase policial (ID: 118409426 – Pág. 52/56), como depois em Juízo (Relatório Mídias ID: 175273599), prestaram declarações dizendo como ocorreram as diligências para apuração do delito e apontaram categoricamente o réu como autor do delito, portanto, constato existirem elementos suficientes para prolatar sentença condenatória. Assim, consigno que o agente público Clebson Marcelino Pereira, em juízo, informou que a Policia Militar de Nova Lacerda/MT recebeu uma denúncia anônima dando conta que o réu comercializava substâncias entorpecentes em sua residência. Diante disso, a Policia Civil foi até o local e constatou que havia grande movimentação na casa do réu. Depois de alguns dias fazendo campana, a equipe de policiais verificou que o acusado mudou de endereço, sendo que neste novo local havia uma movimentação anormal. Ademais, explicou que com base na denúncia anônima e nas informações levantadas pelos investigadores, foi feito um pedido de representação de busca domiciliar, pois havia elementos convincentes que o réu praticava tráfico de drogas. Além disso, disse que ao chegarem à residência para cumprir o mandado, o réu não estava, nesta oportunidade, os agentes públicos ficaram monitorando o local, contudo, o acusado ao retornar foi avisado por um vizinho da presença dos policiais, em seguida, evadiu-se do local. Outrossim, esclareceu que na residência alvo da busca morava o réu, porém, não soube precisar quantas pessoas residiam com ele. Cito, ainda, as palavras de Clebson Marcelino Pereira, durante a audiência de instrução e julgamento, “verbis”: [...] De igual modo, o Policial Militar Carlos Silva Araújo narrou que após denúncia anônima e investigações preliminares, foi dado cumprimento ao mandado de busca domiciliar na casa réu, pois havia informações que a residência era utilizada como ponto de comercialização de drogas. Narrou que, ao adentraram a residência para dar cumprimento no mandado de buscar domiciliar, foi constatado que o réu não estava na casa, posteriormente, o mesmo chegou na garupa de uma motocicleta, todavia, ao ver os policiais empreendeu fuga. No mais, asseverou que não lograram êxito em capturar o réu, porém, na residência alvo foi localizada uma porção de substância entorpecente, apetrechos típicos do tráfico, uma balança de precisão e quantia em dinheiro. Anoto, por oportuno, as seguintes declarações do agente público Carlos Silva Araújo: “(...) É importante frisar também que no local foram encontradas algumas anotações nos cadernos, geralmente essas anotações tem muito haver com controle de caixa de quem trafica; sic (...)” Logo, não merece desprezo as palavras dos policiais que atenderam a ocorrência, que, na condição de servidores públicos, no exercício de suas funções, gozam de fé pública, havendo presunção de idoneidade de suas alegações, ainda mais quando suas afirmações são compatíveis com o conjunto probatório, revestindo-se tais depoimentos de inquestionável eficácia probatória, sobretudo quando prestados em juízo, sob a garantia do contraditório e da ampla defesa. Nessa linha de intelecção, ressalto que os depoimentos dos agentes públicos que atuaram na diligência, foram perfeitamente convergentes, claros e precisos, revestindo-se de forte valor probante, consonante entendimento do E. Tribunal de Justiça deste Estado: “INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA Nº 101532/2015 Disponibilizado no DJE Edição nº 9998, de 11/04/2017, publicado em 12/04/2017. Os depoimentos de policiais, desde que harmônicos com as demais provas, são idôneos para sustentar a condenação criminal.” [...] Outrossim, vieram aos autos o laudo das substâncias apreendidas, sendo o resultado positivo para a presença de canabinoides, entre eles o THC (tetrahidrocanabinoides), substâncias presentes na planta Cannabis sp. (MACONHA), item C e COCAÍNA item D. Assim como, nos itens A (garrafa pet) e B, apresentou resultado positivo para presença de ÁCIDO BÓRICO, substância utilizada como insumo no processo de preparação de drogas, consoante Laudo Pericial n° 410.2.04.2022.009176-03 (ID: 118409426 – Pág. 57/61). Além disso, todos os testemunhos colhidos durante a persecução penal confirmam a autoria delitiva em relação ao réu. O Enunciado Orientativo 7 do TJMT dispõe: “O delito de tráfico de drogas, previsto no art. 33 da Lei n. 11.343/2006, é classificado como de ação múltipla ou misto alternativo e, portanto, consuma-se com a prática de qualquer das condutas nele descritas”, o que ocorreu no caso em tela, uma vez que o réu tinha em depósito, 01 (uma) porção de 02,32 g de maconha, 02 (dois) rolos de plástico filme, 01 (uma) balança de precisão, 01 (uma) porção de 16 g de ácido bórico, 02 (dois) pen drive, 03 (três) celulares e 01 (uma) garrafa PET contendo 1.371,33 g de ácido bórico, além de resquícios de cocaína, conforme consta do Auto de Apreensão (ID: 118409426 – Pág. 38). Ainda, cumpre observar, que a combativa defesa pleiteia pela absolvição do acusado com base no principio do “in dubio pro reo”, argumentando que há fragilidade no conjunto probatório, ante a negativa de autoria apresentada pelo réu. A narrativa do réu se mostra isolada e desprovida de credibilidade, destoando do quadro probatório sólido e convergente que comprova sua autoria no tráfico. Nesse contexto, vale lembrar que já se decidiu que “A simples negativa de autoria pelo acusado, desacompanhada de qualquer substrato probante, não prospera diante das declarações fornecidas pela vítima em ambas às fases procedimentais, as quais estão amparadas pelos demais elementos probantes existentes no processo, conjunto suficiente para a manutenção do édito probatório.” (TJMT, Apelação nº 47703/2012).” As justificativas lançadas em juízo pelo réu, sobretudo a alegação que as drogas e os objetos típicos de traficância pertenciam a uma terceira pessoa por nome de Carlos Eduardo vulgo Neguinho, não se afiguram minimamente plausíveis, mormente em confronto com as robustas provas angariadas durante a persecução penal, assim, não há como se falar em absolvição, uma vez que ficou amplamente comprovado nos autos que o réu tinha em depósito em sua residência substâncias ilícitas e objetos destinados à mercancia. Ressalto que: “existindo provas suficientes quanto à autoria e materialidade do delito imputado ao acusado, ora apelante, a confirmarem a ocorrência da prática do delito de porte ilegal de arma de fogo e munição de uso permitido, não há que se falar em absolvição. 3. RECURSO DESPROVIDO.” (RAC 0004323-41.2019, Rel. Des. Jorge Luiz Tadeu Rodrigues, 2ª Câmara Criminal, DJE 17.5.2024). Destaquei. [...] Ademais, estou convencido de que o réu praticou os atos ilícitos descritos na denúncia, vez que há no processo um enorme acervo probatório demonstrando que o mesmo cometeu o crime de tráfico de drogas. [...] A defesa sustenta que o réu faz jus à aplicação da benesse do tráfico privilegiado, uma vez que preenchidos os requisitos do § 4, do artigo 33, da Lei n. 11.343/2006, o qual dispõe: [...] In casu, não há que se falar em reconhecimento do tráfico privilegiado [art. 33, §4º, Lei nº 11.343/06], isso porque para a redução da pena de 1/6 a 2/3, faz-se necessário o preenchimento cumulativo dos seguintes requisitos: (I) primariedade; (II) bons antecedentes; (III) não se dedique às atividades criminosas; e (IV) não integre organização criminosa. Nesse ponto, compulsandos os autos nº 1001154-12.2023.8.11.0046, da 1º Vara da Comarca de Comodoro/MT, verifica-se que o réu ja foi condenação em primeiro grau pelo mesmo crime de trafico de drohas, demosntrando que se dedica a pratica criminosas e tem o trafico de drogas como o seu meio de sobrevivência, C o que afasta, de plano, a aplicação do benefício. [...] Para além disso, ressalto que o Enunciado Orientativo n. 30 da TCCR/TJMT consolida que: “quantidade, a forma de acondicionamento da droga apreendida, como também a existência de apetrechos utilizados para comercialização de substância entorpecentes, são fundamentos idôneos a evidenciar dedicação à atividade criminosa, de modo a afastar a aplicação da causa de diminuição de pena prevista no art. 33, § 4°, da Lei n. 11.343/2006. (Redação alterada pelo Incidente de Uniformização de Jurisprudência nº 100269/2017, disponibilizado no DJE nº 10257, em 16/05/2018) grifo nosso”. Quanto a alegação da defesa de desclassificação do delito de tráfico pra aquele previsto no art. 28, da Lei n. 11343/06, não merece prosperar. [...] In casu, entendo que os elementos colhidos durante as diligências do Inquérito Policial, bem como as provas produzidas em Juízo impedem o acolhimento da tese desclassificatória posta sob debate. Apesar da defesa afirma que o acusado é usuário, o fato é que não trouxe nenhuma prova que possibilitasse concluir a veracidade de suas alegações, aliás, “a condição de usuário de drogas não elide a responsabilização do agente pelo delito tipificado no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006. INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA Nº 101532/2015 Disponibilizado no DJE Edição nº 9998, de 11/04/2017, publicado em 12/04/2017." Ainda, vale anotar que embora a defesa alegue que a quantidade de entorpecente apreendido seja relativamente pequena, tal fato não descaracteriza o delito de tráfico de drogas, ante a existência de outras provas nos autos que confirmam a prática do mesmo. [...] Não vislumbro nos autos qualquer causa excludente de ilicitude; não agiu o acusado em legítima defesa, estado de necessidade, estrito cumprimento do dever legal ou em exercício regular de um direito. [...] Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido formulado na Denúncia ofertada pelo Ministério Público para CONDENAR o réu BRUNO NUNES DO NASCIMENTO pela prática do delito descrito no artigo 33 da Lei Federal nº 11.343/06. A seguir, passo à dosimetria da pena. [...] Assim sendo, mantenho a pena intermediária em 05 (cinco) anos de reclusão e ao pagamento de 500 (quinhentos) dias-multa. Na TERCEIRA FASE DE APLICAÇÃO DA PENA, não existem causas de aumento e diminuição de pena. Pelos motivos acima expostos, fixo em definitivo a pena em 05 (cinco) anos de reclusão e ao pagamento de 500 (quinhentos) dias-multa. Isto posto, CONDENO o acusado BRUNO NUNES DO NASCIMENTO a cumprir a pena privativa de liberdade 05 (cinco) anos de reclusão e ao pagamento de 500 (quinhentos) dias-multa, pelo crime de tráfico de drogas (artigo 33, caput, da Lei 11.340/2006). Fixo o dia-multa na ordem de 1/30, do valor do salário mínimo vigente à época dos fatos, devidamente corrigido. Diante do quantum da pena imposta, fixo o regime inicial de cumprimento da pena será o SEMIABERTO em atenção ao disposto no art. 33, caput, § 2°, ‘a’ e ‘b’, do Código Penal. Deixo de proceder à substituição da pena nos termos do art. 44, do Código Penal, tendo em vista que o réu não preenche os requisitos para concessão da benesse legal, eis que a pena aplicada é superior a quatro anos.” (Ricardo Garcia Maziero, juiz de Direito – ID 279690370) Pois bem. A materialidade está comprovada pelo Laudo Pericial nº 410.2.04.2022.009176-03 (ID 279689524 – fls. 57/61), Relatório de Busca e Apreensão nº 2022.13.53217 (ID 279689524 – fls. 28/37), Auto de Apreensão (ID 279689524 – fls. 43/44), os quais não sofreram qualquer impugnação. Na fase policial, foram ouvidos Weverson Aron dos Santos Silva, testemunha (ID 279689524 – fls. 43/44), Clebson Marcelino Pereira, investigador de Polícia (ID 279689524 – fls. 52/53), Carlos Silva Araújo, investigador de Polícia (ID 279689524 – fls. 54/55), BRUNO NUNES DO NASCIMENTO, apelante (ID 279689525 – fls. 1/3). Em Juízo, colheram-se os depoimentos de Clebson Marcelino Pereira, investigador de Polícia (ID 279690366), Carlos Silva Araújo, investigador de Polícia (ID 279690366) e o interrogatório de BRUNO NUNES DO NASCIMENTO, apelante (ID 279690366). Dito isso, vejamos. Os investigadores de Polícia [Clebson Marcelino Pereira e Carlos Silva Araújo] descreveram, coerentemente, em ambas as fases da persecução penal, as apreensões de 1 porção de maconha com peso de 2,32g (dois gramas e trinta e dois centigramas), 1 (uma) garrafa [pet] contendo 1.371,33kg (um quilo, trezentas e oitenta gramas e trinta e três centigramas) de ácido bórico, 2 (dois) rolos de plástico filme, 1 (uma) balança de precisão, 3 (três) aparelhos celulares, 4 (quatro) folhas avulsas, 2 (dois) cadernos e 1 (um) bloco de folhas, todos com anotações, no dia 5.8.2022, por volta das 10h, na residência do apelante BRUNO NUNES DO NASCIMENTO, localizada à rua Lino Ferreira Santos, próximo à escola Getúlio Vargas, no município de Nova Lacerda/MT. Essas narrativas [dos referidos policiais] são convergentes e revelam que: 1) a Polícia Militar de Nova Lacerda/MT recebeu denúncia anônima indicando que o apelante comercializava substâncias entorpecentes em sua residência; 2) em ato contínuo, a Polícia Civil dirigiu-se ao local e constatou intensa movimentação de pessoas no local; 3) após a realização de campanas, verificaram que o apelante havia mudado de casa; 4) nesse novo endereço, também foi constatada movimentação atípica; 5) diante dos indícios de que que o apelante praticava tráfico de drogas, o Delegado de Polícia representou pela expedição de mandado de busca e apreensão domiciliar; 6) no dia 5.8.2022, cumpriram a diligência (PJE nº 1002303-77.2022.8.11.0046); 7) ingressaram no quintal da residência e chamaram pelo nome do investigado, mas não obtiveram; 8) logo após, ouviram o barulho de uma motocicleta, conduzida por Weverton Aron dos Santos Silva, tendo como passageiro BRUNO NUNES DO NASCIMENTO; 9) o apelante conseguiu fugir dos agentes policiais; 10) realizada a abordagem e busca pessoal de Weverton, encontraram em sua posse um aparelho celular Xiaomi/Redmi de cor rosa/azul, R$ 50,00 (cinquenta reais) em dinheiro e um cartão da Caixa Econômica Federal, tendo ele acompanhado a busca na residência; 11) realizada a busca domiciliar, apreenderam uma pequena porção de substância análoga à maconha, uma garrafa [pet] com ácido bórico, uma balança de precisão, papel filme e cadernos de anotações referentes à venda de substâncias entorpecentes; 12) efetuaram diligências nas proximidades do local, mas não localizaram o apelante (ID 279689524 – fls. 43/44; ID 279689524 – fls. 52/53; ID 279690366). Com efeito, as declarações coerentes dos policiais militares (TJMT, Enunciado Criminal 8), são suficientes para caracterizar tráfico de substâncias entorpecentes, o qual “classifica-se como crime de ação múltipla ou misto alternativo e, portanto, consuma-se com a prática de qualquer das condutas nele descritas” (TJMT, Enunciado Criminal 7), dentre elas “guardar” e “ter em depósito” substâncias entorpecentes para fins de comercialização. As apreensões de maconha, balança de precisão, plástico filme e anotações sobre a comercialização e entorpecentes permitem aferir a destinação mercantil das drogas, por indicarem “intuito de mercancia”, conforme decidido pelo c. STF no julgamento do RE nº 635.659, com repercussão geral (Tema 506 – Relator: Min. Gilmar Mendes – 26.6.2024). A conduta de ter em depósito consigo pequena quantidade de drogas, para preparar e vender conforme a procura de usuários, com o propósito de dificultar a configuração da traficância e, consequentemente, “a atuação dos agentes da segurança pública”, configura uma das modalidades de tráfico urbano (TJSC, HC nº 5025005-95.2020.8.24.0000 – Relator: Des. Sidney Eloy Dalabrida – Quarta Câmara Criminal – 10.9.2020) e se enquadra no conceito do “tráfico formiguinha”, cuja modalidade pressupõe a posse de pequena quantidade de droga para distribuição no varejo a usuários indeterminados (TJMT, Ap nº 1007955-14.2023.8.11.0055 – Relator: Des. Rondon Bassil Dower Filho – 7.2.2024). Nesse tipo de tráfico, o agente costuma realizar idas e vindas às bocas-de-fumo com o objetivo de apanhar drogas para fornecê-las conforme a procura dos usuários (OLIVEIRA, Adriano. As peças e os mecanismos do fenômeno tráfico de drogas e do crime organizado. Disponível em: repositorio.ufpe.br). Mesmo não pertencendo à estrutura do narcotráfico em larga escala, o tráfico “formiguinha”, após se fortalecer economicamente mediante a conquista de clientela, pode vir a transformar-se em uma organização com condições suficientes para legalizar o seu lucro por meio de “lavagem de dinheiro” (OLIVERA, Joselma Gomes Pereira. O Adolescente e o Tráfico de Drogas na Cidade de Dourados: Sob uma perspectiva subcultural. Disponível em: jspui/bitstream/prefix/967). De mais a mais, o ônus de provar a destinação exclusiva para uso próprio das drogas apreendidas cabe à Defesa, “não bastando mera alegação, máxime quando a natureza, o local e as condições em que se desenvolveu a ação apontam para conclusão diversa” (TJMT, AP nº 124790/2016 - Relator: Des. Orlando de Almeida Perri - Primeira Câmara Criminal - 27.10.2016), mesmo porque a condição de usuário não elide a responsabilização do agente por comercializar drogas (TJMT, Enunciado Criminal 3), notadamente por ser comum a figura do traficante-usuário ou usuário-traficante, que vende a substância para sustentar o próprio vício (CONTE, Marta. HENN, Ronaldo César. OLIVEIRA, Carmen Silveira de Oliveira. WOLFF, Maria Palma. “Passes e impasses: lei de drogas”. Revista Latinoam Psicopat Fund., São Paulo, v. 11, n. 4, p. 602-615, dezembro 2008). Ao caso, aplicável o seguinte julgado desta e. Câmara: “Apresenta-se injustificável o pedido de absolvição/desclassificação do tráfico de drogas quando os elementos de convicção existentes nos autos comprovam que os entorpecentes apreendidos seriam destinados à comercialização.” (TJMT, Ap nº 0011751-16.2016.8.11.0042 - Relator: Des. Orlando de Almeida Perri - Primeira Câmara Criminal – 31.10.2023) Portanto, a responsabilização penal do apelante [BRUNO NUNES DO NASCIMENTO] por tráfico de drogas deve ser preservada. Passa-se à revisão da dosimetria das penas. Na primeira fase, o Juízo singular fixou a pena-base no mínimo legal, qual seja 5 (cinco) anos de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa. Na segunda fase, não incidem agravantes A atenuante da confissão espontânea foi reconhecida, mas não aplicada. Isso porque “a incidência da circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal”, por força da Súmula 231 do c. STJ: “A incidência da circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal”. Consequentemente, deve ser mantida a pena intermediária em 5 (cinco) anos de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa. Na terceira fase, inexistem majorantes. O Juízo singular não aplicou o tráfico privilegiado ao considerar que a condenação do apelante por tráfico de drogas em outra ação penal (PJE nº 1001154-12.2023.8.11.0046) denota que “se dedica a práticas criminosas e tem o tráfico de drogas como o seu meio de sobrevivência” (Ricardo Garcia Maziero, juiz de Direito – ID 279690370). Ocorre que essa condenação [por tráfico de drogas a 5 (cinco) anos de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa] deriva de fato posterior [9.2.2023] aos apurados neste julgamento [5.8.2022]. A condenação criminal por fato posterior constitui fundamento inidôneo para caracterizar dedicação às atividades criminosas e “obstar a aplicação do redutor previsto no § 4º do art. 33 da Lei 11.343/2006” (STJ, AgRg no HC nº 578687/SP – Relator: Min. Reynaldo Soares da Fonseca – 26.5.2020). Isso porque o c. STJ, em julgamento de recursos repetitivos [Tema 1139], firmou orientação de ser vedada a utilização de inquéritos e/ou ações penais em andamento para afastar o redutor do tráfico privilegiado (REsp nº 1977027/PR e REsp nº 1977180/PR - Relatora: Min. Laurita Vaz - Julgados em 10.8.2022). A atual jurisprudência consolidada pelo c. STJ, em tema extraído do julgamento de recursos repetitivos, deve ser observada e respeitada, considerado seu efeito vinculativo (CPC, art. 1.039). Ademais, a quantidade de droga apreendida (2,32g - dois gramas e trinta e dois centigramas - de maconha) não permite deduzir traficância em larga escala, notadamente por ser inexpressiva, segundo interpretação do c. STJ (HC nº 482.656/SP - Relator: Min. Reynaldo Soares da Fonseca – Quinta Turma – 1º.3.2019). Não bastasse, os agentes policiais [Clebson Marcelino Pereira e Carlos Silva Araújo] não presenciaram ou visualizaram qualquer ato de comercialização ilícita de entorpecentes praticado pelo apelante e inexistem investigações posteriores que demonstrassem habitualidade delitiva ou seu envolvimento em organização criminosa, como por exemplo quebra de sigilo telefônico, extração de dados de aparelho celular, oitiva de usuários ou identificação de rede de distribuição de entorpecentes. Consideradas essas circunstâncias [primariedade à época dos fatos, quantidade de droga e a ausência de provas da habitualidade delitiva], o reconhecimento do tráfico privilegiado constitui direito subjetivo do apelante. No tocante ao patamar de redução, a apreensão de quantidade inexpressiva de maconha, a pena deve ser reduzida no patamar de 2/3 (dois terços), conforme entendimento do c. STJ: “Não tendo sido apreendida na hipótese quantidade de substância ilícita que demonstre reprovabilidade superior àquela inerente ao delito de tráfico de drogas, e não tendo sido indicadas outras circunstâncias aptas a ensejar a modulação da minorante, deve incidir o redutor no grau máximo de 2/3” (AgRg nos EDcl no HC n. 771.741/SP, Relatora: Min. Laurita Vaz – 26.6.2023). Por efeito, totalizam-se as penas definitivas do apelante a 1 (um) ano e 8 (oito) meses de reclusão e 166 (cento e sessenta e seis) dias-multa, em regime aberto, com substituição da reprimenda corporal por 2 (duas) restritivas de direitos (CP, art. 44). Com essas considerações, recurso conhecido e PROVIDO PARCIALMENTE para readequar as penas do apelante BRUNO NUNES DO NASCIMENTO a 1 (um) ano e 8 (oito) meses de reclusão e 166 (cento e sessenta e seis) dias-multa, em regime aberto, substituída a reprimenda corporal por 2 (duas) restritivas de direitos, a critério do Juízo da Execução Penal. É como voto. [1] Signatário: ANTONIO CARLOS PEREIRA DE SOUSA JUNIOR, Data: 18/07/2022 18:40:00, CN Certificado, CN=ANTONIO CARLOS PEREIRA DE SOUSA JUNIOR:23946,OU=MAGISTRADO,OU=Tribunal de Justica Mato Grosso - TJMT,OU=30940707000149,OU=Cert-JUS Institucional - A3,OU=Autoridade Certificadora da Justica - AC-JUS,O=ICP-Brasil,C=BR, Emissor: CN=AC SOLUTI-JUS v5,OU=SMIME,OU=Autoridade Certificadora da Justica v5,O=ICP-Brasil,C=BR Data da sessão: Cuiabá-MT, 01/07/2025
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