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Ministério Público Do Estado Do Paraná x Aluisio Marcondes Stahlschmidt Filho

ID: 299402445

Tribunal: TJPR Órgão: Vara da Fazenda Pública de Palmas Classe: AçãO CIVIL DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA Nº Processo: 0001908-90.2023.8.16.0123

Data de Disponibilização: 16/06/2025

Polo Ativo:

MINISTéRIO PúBLICO DO ESTADO DO PARANá

Polo Passivo:

ALUISIO MARCONDES STAHLSCHMIDT FILHO

Conclusão

Advogados:

THEREZA CRISTINA ARAUJO DE BITTENCOURT

OAB/PR XXXXXX Desbloquear

MARCELO POSSAMAI

OAB/PR XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ COMARCA DE PALMAS VARA DA FAZENDA PÚBLICA DE PALMAS - PROJUDI Rua Capitão Paulo de Araújo, 731 - Fórum Estadual - São José - Palmas/PR - CEP: 85.555-000 - Fone: 4… PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ COMARCA DE PALMAS VARA DA FAZENDA PÚBLICA DE PALMAS - PROJUDI Rua Capitão Paulo de Araújo, 731 - Fórum Estadual - São José - Palmas/PR - CEP: 85.555-000 - Fone: 46 3263-2691 - E-mail: lasg@tjpr.jus.br Autos nº. 0001908-90.2023.8.16.0123 Autor(s): MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ Réu(s): ALUISIO MARCONDES STAHLSCHMIDT FILHO 1. Relatório Trata-se de ação civil pública de responsabilidade por ato de improbidade administrativa e de ressarcimento ao erário, com pedido de antecipação de tutela de urgência, proposta pelo Ministério Público do Estado do Paraná em face de Aluisio Marcondes Stalhschmidt Filho. Por medida de economia processual, reporto-me e transcrevo o relatório constante da decisão de mov. 41.1: “Em síntese, relatou o Ministério Público que foi instaurado o Inquérito Civil nº. MPPR0097.21.000220-6, com o objetivo de apurar o descumprimento pelos vereadores e servidores da Câmara Municipal de Palmas do dever de prestar contas das despesas de viagens realizadas a serviço e/ou interesse da Câmara Municipal de Palmas/PR. Que foram identificados diversos pagamentos de diárias realizados pela Câmara Municipal de Palmas/PR em favor do réu Aluisio Marcondes Stalhlschmidt Filho, assessor parlamentar na Câmara Legislativa de Palmas/PR no ano de 2018, sendo ressarcido pela participação de cursos e realização de viagens supostamente relacionados à atividade parlamentar. Disse que não foram encontrados documentos que revelem a prestação de contas da despesa empregada pela Câmara Municipal de Palmas/PR, assim como a ré não apresentou ao órgão documentos que comprovem o atendimento ao interesse público no uso das diárias, inexistindo informações sobre as atividades serem realizadas em prol do Município de Palmas/PR. Que referida circunstância violou o entendimento consolidado pelo Tribunal de Contas do Estado do Paraná no julgamento do Acórdão nº. 5764 /2016 acerca do uso de diárias pela Administração Pública e a própria normativa da Câmara Municipal de Palmas/PR, por meio da Resolução nº. 001/2019, além de constituírem verdadeira afronta à supremacia e indisponibilidade do interesse público. Discorreu que fez o levantamento das diárias usufruídas pela ré em situação de aparente ilegalidade, em razão da ausência de justificativa que atenda o interesse público para a realização da despesa. Que em reiteradas situações foi constatado que o total mensal pago em diárias excedeu a 50% do subsídio mensal, e em alguns casos o montante ultrapassou 100% do subsídio mensal recebido pelo beneficiário, sendo que essa situação descaracteriza a verba indenizatória da diária, constituindo verdadeira remuneração. Que por meio do Relatório de Auditoria nº. 01/2023 foi constatado que o réu recebeu o montante de R$15.405,66 (quinze mil e quatrocentos e cinco reais e sessenta e seis centavos) em diárias entre julho a novembro de 2018, em valores superiores a 50% do subsídio mensal, constituindo remuneração indireta. Afirmou que os pagamentos de diárias realizados pela Câmara Municipal de Palmas/PR são irregulares e não existe comprovação de atendimento do interesse público, tendo em vista a ausência de relatório de atividades desenvolvidas pela ré, atas de reuniões, encaminhamento de projetos/solicitação de verbas, discussão de projetos de leis, bem como constam nos cursos frequentados justificativas vagas e genéricas. Que houve ausência deliberada de atuação do controle interno da Casa Legislativa e não consta qualquer documento que comprove a realização das atividades e o efetivo atendimento do interesse público para as despesas com diárias realizadas no período, uma vez que a busca junto ao Portal Transparência da Câmara Municipal também não localizou quaisquer documentos anexos nesse sentido. Ao final, pugnou pela concessão de liminar a fim de que seja determinada a indisponibilidade de bens e ativos da ré, mediante ordem de bloqueio nos sistemas Sisbajud e Renajud, limitada a respectiva indisponibilidade ao valor de R$ 15.405,66 (quinze mil e quatrocentos e cinco reais e sessenta e seis centavos), referente ao total de diárias indenizadas ao réu e às diárias pagas em quantia acima de 50% do subsídio mensal do réu, devidamente atualizado, com a dispensa do contraditório prévio da parte contrária. Juntou documentos (eventos 1.2/.17). Foi determinada a intimação do réu para se manifestar (evento 9.1). O Município de Palmas/PR informou que não possui interesse em participar da demanda no polo ativo (evento 14.1). O réu se manifestou ao evento 39.1. Juntou documentos (eventos 39.2/.9).” Por decisão de mov. 41.1, o Juízo indeferiu o pedido liminar e recebeu a inicial. O réu foi citado (mov. 55.1), apresentando contestação ao mov. 58.1. Nessa oportunidade argumentou, em síntese, que as diárias foram devidamente aprovadas e, embora não tenha prestado contas no momento oportuno, apresentou documentos relativos à utilização das diárias junto de sua defesa. Ainda, defendeu a ausência de dolo em sua conduta, afirmando que a legislação de improbidade exige a comprovação de má-fé e intencionalidade, elementos que, segundo ele, não estão presentes no caso. Ainda, aduz que as alegações do Ministério Público são insuficientes para sustentar uma acusação de improbidade, uma vez que não há provas concretas que indiquem a prática de atos desonestos ou ilegais. Requereu, assim, a improcedência da ação. O Ministério Público apresentou impugnação à contestação, simultaneamente requereu o julgamento antecipado do feito (mov. 62.1). Dirimidas as questões relativas à competência do Juízo (mov. 81.1) vieram os autos conclusos para as providências do art. 17, §10º-C, da Lei nº 8.429/92 com redação dada pela Lei º 14.230/2021. É o relatório. DECIDO. 2. Fundamentação De acordo com o art. 17, §10-B, da Lei nº 8429/92, após a apresentação da contestação e, sendo o caso, ouvido o requerente, poderá o Juiz proceder ao julgamento conforme o estado do processo. No caso em exame, considerando o conteúdo probatório até então carreado aos autos, impõe-se o julgamento antecipado da demanda, eis que é desnecessária a produção de outras provas. Portanto, passo, desde logo, à análise do mérito da demanda. Dispõe o art. 37, §4°, da CRFB/88: Art. 37. [...] §4º - Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível. A norma constitucional de eficácia limitada acima transcrita foi regulamentada pela Lei nº. 8.429/92, que trouxe em seu bojo os atos de improbidade em que podem incorrer os agentes públicos, bem como as sanções aplicáveis e suas respectivas gradações. Os atos de improbidade são de tipificação aberta e o rol de condutas elencadas nos arts. 9º e 10 Lei nº. 8.429/92 é exemplificativo, enquanto que o rol do art. 11 possui tipificação fechada, ou seja, é taxativo. É certo que referida lei tem por objetivo punir, na esfera cível, a prática de ilícitos praticados por agentes da Administração Pública Direta e Indireta, além de ressarcir o erário dos prejuízos advindos dos atos lesivos à probidade administrativa. Assim, não pune a mera ilegalidade, mas a conduta ilegal ou imoral do agente público, e de todo aquele que o auxilie, exigindo, dessa forma, o elemento subjetivo para sua caracterização. Em obediência ao comando estabelecido no art. 37, §4º, da Constituição da República, a lei de improbidade estabeleceu os atos considerados como de improbidade administrativa e as sanções aplicáveis àqueles que os pratiquem, classificando-os em três ordens: atos que importam enriquecimento ilícito (art. 9º), atos que causam prejuízo ao erário (art. 10) e atos que atentam contra os princípios da administração pública (art. 11). Em um breve retrospecto, segundo a narrativa fática descrita na inicial, o Ministério Público afirma que o réu exerceu cargo de Assessor Parlamentar na Câmara Legislativa de Palmas/PR no ano de 2018, período em que foi ressarcido por diárias pagas pela Câmara Municipal sem a devida prestação de contas, ou apresentação de documentos comprobatórios do atendimento ao interesse público e, desta forma, teria desvirtuado a natureza das diárias (indenizatória, eventual e transitória), transformando-as em verdadeira complementação de proventos. As diárias se referem, conforme narrado pelo membro do Parquet, à realização de cursos e as respectivas viagens relacionadas à atividade parlamentar. Todavia, o réu teria deixado de apresentar prestação de contas quanto à despesa empregada e documentos que demonstrassem o interesse público relacionado ao uso das diárias. Defende que a conduta do réu violou o disposto no Acórdão nº 5764/2016 do Tribunal de Contas do Estado do Paraná, a Resolução nº 001/2019 da Câmara Municipal de Palmas, assim como representou inobservância dos postulados da supremacia e indisponibilidade do interesse público. Asseverou o órgão ministerial, que através de núcleo de apoio técnico especializado, elaborou levantamento das diárias com aparente irregularidade, tendo constatado que, em algumas situações, o total de diárias pagas mensalmente excederam 50% do subsídio do requerido, chegando a ultrapassar 100% em alguns casos. Defende que tal situação caracterizaria remuneração indireta. Pois bem. Em análise aos elementos de informação acostados com a inicial, verifica-se que foi apresentado o extrato total das diárias usufruídas pelo réu no período de 01/01/2018 até 21/12/2018, sendo elas (mov. 1.15): I) “PELA DESPESA EMPENHADA ORDEM DE SERVIÇO Nº 58/2018 AUTORIZA A DESLOCAR-SE DE PALMAS - PR A AGUAS DE CHAPECO -SC NO PERIODO DE 24 A 27 DE JULHO DE 2018 PARA PARTICIPAR DE CURSO CONHECIMENTO E EDUCAÇÃO, REDAÇÃO OFICIAL, NOVAS TENDENCIAS E PRATICAS PROFISSIONAIS NA GESTÃO PUBLICA E O SERVIDOR COMO AGENTE DE TRANSFORMAÇAO” - R$ 3.086,66, em 24.07.2018; i) “PELA DESPESA EMPENHADA ORDEM DE SERVIÇO Nº 108/2018 AUTORIZA A DESLOCAR-SE DE PALMAS - PR A BRASILIA - DF NO PERIODO DE 26 A 29 DE NOVEMBRO DE 2018 PARA REUNIÃO COM A DEPUTADA LEANDRE DAL PONTE, OSMAR BERTOLDI , ALIEL MACHADO E JOÃO ARRUDA” - R$ 3.086,66, em 23.11.2018; III) “PELA DESPESA EMPENHADA ORDEM DE SERVIÇO Nº 111/2018 AUTORIZA A DESLOCAR-SE DE PALMAS - PR A CURITIBA - PR NO PERIODO DE 30 DE NOVEMBRO DE 2018 PARA REUNIÕES COM OS DEPUTADOS ANIBELLE NETO E GUTO SILVA” - R$ 614,16, em 23.11.2018. Ainda, há relatório confeccionado pela auditoria (sob nº. 011/2023), em que estão listados os pagamentos de diárias com suposto caráter remuneratório. Em relação ao réu, consta do referido relatório as seguintes informações: Ao contestar a ação, o acusado apresentou documentos comprobatórios consistentes em um certificado, um ofício da Assembleia Legislativa do Estado do Paraná e diversas declarações, demonstrando que nos dias respectivos de recebimento das diárias, participou de seminário realizado na cidade de água de Chapecó (mov. 58.2); que compareceu, na companhia de alguns vereadores, ao gabinete parlamentar do Deputado Anibelli Neto (mov. 58.3); e declarações de comparecimento de gabinetes de deputados na Capital Federal. Dessa forma, em que pese à prestação de contas não tenha ocorrido no momento oportuno, houve demonstração de que as diárias foram empregadas para realização dos fins para os quais foram pleiteadas, atendendo ao disposto no do art. 7º da Resolução nº. 001/2019, in verbis: Art. 7º - Deverão os vereadores, assessores e servidores, no prazo máximo de 10 (dez) dias, após o retorno, comprovar a realização dos trabalhos realizados em prol da Câmara Municipal de Palmas, bem como apresentação de atestado ou certificado de frequência que comprove a participação do evento ou outro documento que certifique a presença do beneficiário no local de destino. Enfatizo, embora o requerido não tenha apresentado as comprovações no tempo prescrito na resolução, o fez por ocasião da contestação da ação, demonstrando documentalmente que as diárias foram empregadas para os fins descritos nas ordens de serviço. Ademais, as comprovações apresentadas revelam que as diárias foram empregadas para comparecimento a um seminário e viagens relacionadas à atividade parlamentar, denotando a utilização de acordo com o interesse público. Portanto, ao meu entender, a conduta do requerido, configura mera irregularidade, sendo sanada ao longo da tramitação processual. No que se refere à alegação de que as concessões das diárias teriam se prestado, em verdade, à caracterização de remuneração indireta, como forma de complementação da quantia mensal e fixa recebida, não existem elementos comprobatórios nesse sentido. Em que pese haja relatório confeccionado pela auditoria indicando o recebimento pelo réu, a título de diárias, acima de 100% da remuneração auferida à época pelo cargo exercido junto à Câmara de Vereadores, isso, por si só, não indica enriquecimento ilícito, vez que a citada resolução não traz qualquer vedação/limitação. Veja-se que a única limitação contida na resolução diz respeito ao limite de servidor usufruir de no máximo cinco diárias por mês, salvo autorização expressa do Presidente em casos excepcionais e devidamente fundamentados (art. 3º, §1º). Contudo, se esse limite foi excedido, isso nem sequer é objeto da controvérsia dos autos. Ainda, observa-se que a Resolução não exige a apresentação de recibos de gastos havidos no local da viagem ou deslocamento, com vistas a comprovar o emprego correto do numerário disponibilizado, apenas a comprovação de realização do trabalho mediante apresentação de “atestado ou certificado”. Dessa forma, entendo que não restou demonstrado que a conduta do agente teria se voltado ao enriquecimento ilícito em prejuízo do salutar emprego do patrimônio público. O ato ímprobo, para assim restar configurado, exige a prova do elemento subjetivo capaz de demonstrar a reprovabilidade extrema da conduta do agente, ou seja, neste caso se tratava do dolo de locupletar-se às custas do recebimento de diárias custeadas pelo patrimônio público, o que não foi comprovado pelo autor da ação. Registre-se que uma condenação por ato de improbidade não pode ser sustentada com base em suposições ou conjecturas, tampouco em dolo genérico (vontade livre e consciente de praticar o ato), pois a Lei de Improbidade Administrativa, especialmente após as mudanças praticadas pela Lei nº. 14.230 /2021, não visa punir meras irregularidades ou o inábil. Portanto, a improcedência dos pedidos iniciais em relação ao réu é medida que se impõe. Ressalta-se que o caso deve ser analisado conforme a distribuição dinâmica do ônus probatório, encontrando limite no disposto pelo art. 373, §§1º e 2º, do CPC: Art. 373. O ônus da prova incumbe: I - ao autor, quanto ao fato constitutivo de seu direito; II - ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor. § 1º Nos casos previstos em lei ou diante de peculiaridades da causa relacionadas à impossibilidade ou à excessiva dificuldade de cumprir o encargo nos termos do caput ou à maior facilidade de obtenção da prova do fato contrário, poderá o juiz atribuir o ônus da prova de modo diverso, desde que o faça por decisão fundamentada, caso em que deverá dar à parte a oportunidade de se desincumbir do ônus que lhe foi atribuído. § 2º A decisão prevista no § 1º deste artigo não pode gerar situação em que a desincumbência do encargo pela parte seja impossível ou excessivamente difícil. Também não se descuida da previsão do art. 17, §19, incisão II da Lei nº. 8.429/1992, com redação dada pela Lei nº. 14.230/2021: Art. 17. (...) § 19. Não se aplicam na ação de improbidade administrativa: (...) II - a imposição de ônus da prova ao réu, na forma dos §§ 1º e 2º do art. 373 da Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015. No mais, o órgão ministerial apenas apontou que as diárias foram recebidas pelo réu sem a devida comprovação de que foram empregadas nas finalidades a que se dispunham, contudo, isto não induz, obrigatoriamente, a uma tentativa de complementação de sua remuneração, mediante o recebimento indevido de verba pública. Nesse sentido: AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. RECEBIMENTO PARCIAL DA INICIAL. REALIZAÇÃO DE ADIANTAMENTOS DESTINADOS PARA PEQUENAS DESPESAS DE PRONTO PAGAMENTO DA SECRETARIA DE SAÚDE DE ANTONINA . PREVISÃO NA LEI MUNICIPAL Nº 12/2009. AUSÊNCIA DE ATOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. PRESTAÇÃO DE CONTAS REALIZADA, AINDA QUE DE MODO INADEQUADO. MERAS IRREGULARIDADES . AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE PREJUÍZOS AO ERÁRIO OU ENRIQUECIMENTO ILÍCITO. DOLO/MÁ-FÉ NÃO CONSTATADOS. DECISÃO MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO . (TJPR - 4ª Câmara Cível - 0045587-58.2022.8.16 .0000 - Antonina - Rel.: DESEMBARGADOR HAMILTON RAFAEL MARINS SCHWARTZ - J. 13.02 .2023) (TJ-PR - AI: 00455875820228160000 Antonina 0045587-58.2022.8.16 .0000 (Acórdão), Relator.: Hamilton Rafael Marins Schwartz, Data de Julgamento: 13/02/2023, 4ª Câmara Cível, Data de Publicação: 15/02/2023) Após as atualizações da Lei nº. 14.230/2021 na Lei nº. 8.429/1992, não basta o dolo genérico para a condenação, sendo imprescindível a demonstração de dolo específico, o que, contudo, não foi realizado. Portanto, a improcedência dos pedidos iniciais é medida que se impõe. 3. Dispositivo Por todo o exposto, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos iniciais, com resolução do mérito, nos termos do art. 487, I, do CPC, ante a ausência de comprovação da prática de ato ímprobo. Sem custas processuais e honorários advocatícios de sucumbência, ante a ausência de comprovada má-fé, nos termos do art. 23-B, da Lei 8.429/1992. Sem remessa necessária, nos termos do art. 17-C, §3°, da Lei de Improbidade. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Cumpram-se as disposições do Código de Normas da E. Corregedoria-Geral da Justiça e a Portaria do Juízo, no que aplicáveis. Diligências necessárias. Palmas/PR, datado e assinado digitalmente. Felipe Vargas Coan Juiz Substituto

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Elton Luiz Tonial x Delsir Foppa e outros

ID: 294331952

Tribunal: TJSC Órgão: 1ª Vara da Comarca de Fraiburgo Classe: EXECUçãO DE TíTULO EXTRAJUDICIAL Nº Processo: 0001908-36.2007.8.24.0024

Data de Disponibilização: 10/06/2025

Polo Ativo:

ELTON LUIZ TONIAL

Polo Passivo:

DELSIR FOPPA MATHEUS FOPPA

DESPACHO/DECISÃO

Advogados:

ELIZABET CORREA

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ADRIANA ANDREANI

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RAFAEL LENIESKY

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ALEXANDRE MAURÍCIO ANDREANI

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MARIA ALICE CASTAGNARO

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ANDERSON HEFFEL

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JOAO MARQUES VIEIRA FILHO

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JUNIOR VIANEI ZORNITA

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EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL Nº 0001908-36.2007.8.24.0024/SC EXEQUENTE : ELTON LUIZ TONIAL ADVOGADO(A) : JUNIOR VIANEI ZORNITA (OAB SC019734) ADVOGADO(A) : JOAO MARQUES VIEIRA FILHO (OAB SC00487… EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL Nº 0001908-36.2007.8.24.0024/SC EXEQUENTE : ELTON LUIZ TONIAL ADVOGADO(A) : JUNIOR VIANEI ZORNITA (OAB SC019734) ADVOGADO(A) : JOAO MARQUES VIEIRA FILHO (OAB SC004870) ADVOGADO(A) : ANDERSON HEFFEL (OAB SC026075) EXECUTADO : MATHEUS FOPPA ADVOGADO(A) : MARIA ALICE CASTAGNARO (OAB SC021132) ADVOGADO(A) : ALEXANDRE MAURÍCIO ANDREANI (OAB SC008609) ADVOGADO(A) : RAFAEL LENIESKY (OAB SC011893) ADVOGADO(A) : ADRIANA ANDREANI (OAB SC035436) EXECUTADO : DELSIR FOPPA ADVOGADO(A) : ELIZABET CORREA (OAB SC014985) DESPACHO/DECISÃO Da intimação das partes acerca da prescrição intercorrente Segundo a Súmula 150 do STF " prescreve a execução no mesmo prazo de prescrição da ação ". O cabimento da prescrição intercorrente em execuções fiscais e em matéria penal é incontroverso por expressa disposição legal (art. 40 da Lei n. 6.830/1980 e art. 110, §1º do CP). Na vigência do CPC/1973 , por ausência de previsão legal, o STJ fixou tese no Incidente de Assunção de Competência (IAC) 1 de: a) possibilidade de prescrição intercorrente nos casos de inércia da parte exequente por prazo superior ao da prescrição do título executivo; b) contagem do termo inicial da prescrição a partir (i) do fim da suspensão fixada na decisão judicial ou (ii) inexistindo prazo fixado, o transcurso de 1 ano (por aplicação analógica do art. 40, § 2º, da LEF); c) caso o processo estivesse suspenso durante a entrada em vigor do CPC/2015, considera-se a vigência inicial do novo CPC como termo inicial da prescrição (art. 1.056 do CPC/2015). Se não, vide a tese fixada no IAC 1, na íntegra: 1.1. Incide a prescrição intercorrente, nas causas regidas pelo CPC/73, quando o exequente permanece inerte por prazo superior ao de prescrição do direito material vindicado, conforme interpretação extraída do art. 202, parágrafo único, do Código Civil de 2002. 1.2. O termo inicial do prazo prescricional, na vigência do CPC/1973, conta-se do fim do prazo judicial de suspensão do processo ou, inexistindo prazo fixado, do transcurso de 1 (um) ano (aplicação analógica do art. 40, § 2º, da Lei 6.830/1980). 1.3. O termo inicial do art. 1.056 do CPC/2015 tem incidência apenas nas hipóteses em que o processo se encontrava suspenso na data da entrada em vigor da novel lei processual, uma vez que não se pode extrair interpretação que viabilize o reinício ou a reabertura de prazo prescricional ocorridos na vigência do revogado CPC/1973 (aplicação irretroativa da norma processual). 1.4. O contraditório é princípio que deve ser respeitado em todas as manifestações do Poder Judiciário, que deve zelar pela sua observância, inclusive nas hipóteses de declaração de ofício da prescrição intercorrente, devendo o credor ser previamente intimado para opor algum fato impeditivo à incidência da prescrição. O novo código (CPC/2015) estabeleceu, em sua redação original que: a) não existindo bens penhoráveis do executado, o processo era suspenso por 1 ano (art. 921, III c/c § 1º); b) decorrido o prazo de 1 ano da suspensão sem localização de bens, o processo era arquivado (§ 2º) e começaria a correr o prazo da prescrição intercorrente (§ 4º) Em 26.08.2021 foi publicada a Lei n. 14.195/2021 , e alterada a redação do art. 921, que, a partir da sua publicação (art. 58, V), passou a estabelecer: a) não sendo localizado o executado ou bens penhoráveis dele, o processo é suspenso por 1 ano (art. 921, III c/c § 1º); b) decorrido o prazo de 1 ano da suspensão sem localização de bens, o processo é arquivado (§ 2º); c) no entanto, houve modificação do termo inicial, deixando de ser o decurso do prazo de 1 ano da suspensão e passando a ser a ciência da primeira tentativa infrutífera de localização do devedor ou de bens penhoráveis; d) a efetiva citação, intimação do devedor ou constrição de bens penhoráveis interrompe o prazo prescricional e fica suspenso até a perfectibilização da citação ou intimação do executado, ou até a formalização da constrição, se necessária. Portanto, em resumo: 1) para os casos em que a prescrição intercorrente se operou durante a vigência do CPC/1973, isto é, antes de 18.03.2016 , o termo inicial da prescrição intercorrente será: (i) o fim do prazo de suspensão fixado na decisão judicial ou (ii) inexistindo estipulação expressa, o fim do prazo de 1 ano; 2) para os casos em que o processo ainda estava suspenso no dia em que entrou em vigor o CPC/2015 (18.03.2016), o termo inicial da prescrição intercorrente será (i) o fim do prazo de suspensão fixado na decisão judicial ou (ii) inexistindo estipulação expressa, a vigência inicial do novo CPC (ou seja, 18.03.2016); 3) para os casos em que a prescrição intercorrente se operou após a vigência do CPC/1973 e antes da Lei n. 14.195/2021, isto é, entre 18.03.2016 e 25.08.2021 , o termo inicial da prescrição intercorrente será AUTOMÁTICO, iniciando-se SEMPRE depois de decorrido 1 ano da suspensão ; 4) para os casos em que a prescrição intercorrente se operou após a vigência da Lei n. 14.195/2021, isto é, a partir de 26.08.2021 , o termo inicial da prescrição intercorrente também será AUTOMÁTICO, mas iniciando-se da ciência da primeira tentativa infrutífera de localização do executado ou de seus bens penhoráveis. Nesta hipótese, como a ciência da primeira tentativa infrutífera é, INVARIAVELMENTE, ANTERIOR à decisão que determina a suspensão do processo, o prazo prescricional fica suspenso por um ano (art. 921, § 1º). Se decorrido o prazo prescricional do título, descontada a suspensão de 1 ano, o feito estará eivado pela prescrição. Em todos os casos, se entre o termo inicial e final do prazo prescricional forem efetivamente penhorados bens, o prazo se reinicia (marco interruptivo) e, além disso, fica suspenso até a formalização da constrição. A propósito, o Grupo de Câmaras de Direito Comercial do TJSC editou a Súmula 64 prevendo que: " a mera renovação de diligências inexitosas ou rejeitadas sem a efetiva constrição patrimonial , ainda que antes das alterações promovidas pela Lei n. 14.195/2021, não interrompe o curso do prazo da prescrição intercorrente " Nesse cenário, independentemente se a prescrição se iniciou sob a égide do CPC/1973, do CPC/2015 ou da Lei n. 14.195/2021, o mero peticionamento não interrompe o prazo prescricional . Se não, vide o entendimento recentíssimo do TJSC: AGRAVO INTERNO EM APELAÇÃO. DECISÃO MONOCRÁTICA QUE CONHECEU DO RECURSO E NEGOU-LHE PROVIMENTO. INSURGÊNCIA DA PARTE APELANTE/EXEQUENTE. TESE DE INOCORRÊNCIA DA PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. NÃO ACOLHIMENTO. EXECUÇÃO EDIFICADA NA COBRANÇA DE TERMO DE CONFISSÃO E NOVAÇÃO DE DÍVIDA. APLICAÇÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL QUINQUENAL (ART. 206, § 5º, INCISO I, DO CC). FEITO SUSPENSO POR DECISÃO JUDICIAL NA VIGÊNCIA DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973 . TERMO INICIAL DO PRAZO PRESCRICIONAL QUE CONTA-SE DO FIM DO PRAZO ÂNUO DE SUSPENSÃO DO PROCESSO, EM OBSERVÂNCIA À TESE FIRMADA PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA NO JULGAMENTO DO IAC N. 1. ATOS PROCESSUAIS PRATICADOS DURANTE O QUINQUÊNIO POSTERIOR QUE NÃO OBSTAM A PRESCRIÇÃO, PORQUANTO NÃO EFETIVOS PARA A SATISFAÇÃO DO DÉBITO. INTELIGÊNCIA DA SÚMULA 64 DO TJSC . MANUTENÇÃO DA SENTENÇA QUE RECONHECEU A PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. [...] (TJSC, Apelação n. 0300165-37.2014.8.24.0002, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Joao Marcos Buch, Segunda Câmara de Direito Comercial, j. 18-02-2025). (grifou-se) Inclusive, as causas interruptivas também estão previstas no art. 202 do CC, 219 do CPC/1973 e 240 do CPC/2015. Além disso, sabe-se que a prescrição só é interrompida uma única vez , de modo que eventuais suspensões posteriores não têm o condão de interromper o prazo prescricional, mas tão somente deixar o prazo prescricional paralisado. Nesse sentido o TJSC: [...] 1. Nos termos do art. 202, caput, do Código Civil, a prescrição pode ser interrompida somente uma única vez. 2. Logo, em razão do princípio da unicidade da interrupção prescricional, mesmo diante de uma hipótese interruptiva extrajudicial (protesto de título) e outra em decorrência de ação judicial de cancelamento de protesto e título executivo, apenas admite-se a interrupção do prazo pelo primeiro dos eventos. [...] (TJSC, Apelação n. 5020290-38.2020.8.24.0023, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Janice Goulart Garcia Ubialli, Quarta Câmara de Direito Comercial, j. 08-08-2023). Ainda, consigno que o que interrompe a prescrição é a efetiva penhora de bens, de modo que caso algum bem tenha sido penhorado e, posteriormente, tenha sido reconhecida a impenhorabilidade dele, não resta caracterizada a causa interruptiva (reconhecimento da impenhorabilidade via Sistema Sisbajud, da impenhorabilidade de bem de família, impenhorabilidade de pequena propriedade rural, etc.). Por fim, anoto que desde o início da vigência da Lei n. 14.195/2021, não há necessidade de suspensão da execução para que se inicie o fluxo do prazo prescricional, tampouco de desídia do credor. Basta a ciência do credor sobre a primeira tentativa infrutífera de localização do devedor ou de bens penhoráveis e o mero decurso de tempo (independentemente de ter diligenciado em busca de bens) . Isto é, desde a Lei n. 14.195/2021, o despacho que determina a suspensão do processo tornou-se simples marco suspensivo do lapso prescricional , que perdura por um ano e que pode ser decretado uma única vez. Do caso concreto Trata-se de execução de título extrajudicial de nota promissória , assim, o prazo da prescrição intercorrente no presente caso é de 3 (três) anos , conforme art. 70 da Lei Uniforme de Genebra - LUG - Decreto n. 57.663/1966. A demanda foi ajuizada na data de 25/05/2007 . Se aplica ao feito a seguinte hipótese: 3) para os casos em que a prescrição intercorrente começou a correr após a vigência do CPC/1973 e antes da Lei n. 14.195/2021, isto é, entre 18.03.2016 e 25.08.2021 , o termo inicial da prescrição intercorrente será AUTOMÁTICO, iniciando-se SEMPRE depois de decorrido 1 ano da suspensão ; No caso dos autos, verifica-se que o processo foi suspenso em 3.6.2019 ( evento 208, DEC444 ). Em 3.6.2020 se iniciou o prazo prescricional de 3 anos , que se findou em 3.6.2023 . Ou seja, houve o transcurso de prazo superior a 3 anos , sem que fosse possível a efetivação de constrição sobre bens da parte executada. Nesse cenário, INTIMEM-SE as partes (caso tenha se manifestado nos autos, inclusive a parte executada), para manifestação sobre a ocorrência da prescrição intercorrente, na forma do art. 921, § 5º, do CPC, no prazo de 15 (quinze) dias.

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Empresa Pedrosa Ltda e outros x Juízo Da 17ª Vara Do Trabalho Do Recife

ID: 316120632

Tribunal: TRT6 Órgão: 1ª Seção Especializada Classe: MANDADO DE SEGURANçA CíVEL Nº Processo: 0001020-62.2025.5.06.0000

Data de Disponibilização: 04/07/2025

Polo Ativo:

EMPRESA PEDROSA LTDA MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO PAULO FERNANDO BERNARDINO DE SENA

Polo Passivo:

JUÍZO DA 17ª VARA DO TRABALHO DO RECIFE

Acórdão

Advogados:

BIANCA MARIA VENTURA CARVALHO DIAS

OAB/PE XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 6ª REGIÃO 1ª SEÇÃO ESPECIALIZADA Relatora: NISE PEDROSO LINS DE SOUSA MSCiv 0001020-62.2025.5.06.0000 IMPETRANTE: EMPRESA P… PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 6ª REGIÃO 1ª SEÇÃO ESPECIALIZADA Relatora: NISE PEDROSO LINS DE SOUSA MSCiv 0001020-62.2025.5.06.0000 IMPETRANTE: EMPRESA PEDROSA LTDA IMPETRADO: JUÍZO DA 17ª VARA DO TRABALHO DO RECIFE PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 6ª REGIÃO PROC. Nº TRT - 0001020-62.2025.5.06.0000 (MS) Órgão Julgador : 1ª Seção Especializada em Dissídios Individuais Relatora : Desembargadora Nise Pedroso Lins de Sousa Impetrante : EMPRESA PEDROSA LTDA. Impetrado : JUÍZO DA 17ª VARA DO TRABALHO DO RECIFE/PE Advogada : Bianca Maria Ventura Carvalho Dias Litisconsorte : PAULO FERNANDO BERNARDINO DA SENA DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO. MANDADO DE SEGURANÇA. IMPUGNAÇÃO A CÁLCULOS DE LIQUIDAÇÃO. GARANTIA DO JUÍZO. CONCESSÃO DA SEGURANÇA. I. CASO EM EXAME 1. Mandado de Segurança impetrado por empresa contra decisão judicial que condicionou a apreciação de impugnação a cálculos de liquidação trabalhista à garantia do juízo. A impetrante alegou ilegalidade da decisão, sustentando que a impugnação poderia ser analisada independentemente da garantia, com base no artigo 879, §2º, da CLT. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (i) definir se a decisão judicial que condicionou a análise da impugnação à garantia do juízo é legal; (ii) estabelecer se a impetrante possui direito líquido e certo à análise da impugnação sem a necessidade de garantia prévia. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A decisão judicial que condicionou a análise da impugnação à garantia do juízo contraria o artigo 879, §2º, da CLT, que garante o direito de impugnação aos cálculos de liquidação sem a necessidade de garantia prévia. 4. A interpretação sistemática dos artigos 879 e 884 da CLT indica que a garantia do juízo é exigida apenas para embargos à execução, não para impugnação da conta de liquidação. 5. Precedentes do Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região confirmam a ilegalidade da exigência de garantia do juízo para impugnação da conta de liquidação. IV. DISPOSITIVO E TESE 6. Segurança concedida. Tese de julgamento: 1. A análise da impugnação à conta de liquidação trabalhista, nos termos do artigo 879, §2º, da CLT, independe da garantia do juízo. Dispositivos relevantes citados: CLT, arts. 879, § 2º, e 884; CF, art. 5º, LXXVIII. Jurisprudência relevante citada: Precedentes do TRT da 6ª Região. Vistos etc. Trata-se de ação mandamental intentada pela EMPRESA PEDROSA LTDA., contra decisão proferida pelo Juízo da 17ª Vara do Trabalho do Recife - PE, nos autos da Reclamação Trabalhista nº 0000827-68.2021.5.06.0103, figurando, como litisconsorte, Paulo Fernando Bernardino da Sena. Nas razões documentadas no Id. a579f1a, a impetrante reputa ilegal o ato coator aduzindo, em síntese, que inexiste previsão legal no sentido de condicionar a possibilidade de impugnação à conta de liquidação, com base no artigo 879 da CLT, à garantia do Juízo, pois essa somente pode ser exigida para fins de oposição de embargos à execução, nos termos do artigo 884 da CLT. Assevera haver violação a direito líquido e certo seu e pede seja concedida medida liminar para que o Juízo de primeiro grau aprecie as impugnações aos cálculos apresentadas. Ao final pede a concessão definitiva da segurança para que "seja cassado a decisão da autoridade coatora nos autos da reclamação de nº 0000827-68.2021.5.06.0103". À causa atribuiu o valor de R$ 1.000,00 (mil reais). Em decisão exarada no Id. 0d8cbd4, deferi a medida liminar requerida. A autoridade apontada como coatora apresentou as informações de Id. 75440e3. Devidamente notificado, o litisconsorte não apresentou contestação, conforme certidão de Id. 6f7b56e. O Ministério Público do Trabalho, mediante parecer de Id. 05bd19f, da lavra do Procurador Regional Eduardo Varandas Araruna, opinou "pelo cabimento do mandamus e, no mérito, pela concessão da segurança postulada, confirmando-se a tutela de urgência concedida". É o relatório. VOTO: De logo, importante transcrever a decisão exarada pela autoridade apontada como coatora, que deu ensejo à impetração do mandamus em análise, in verbis (Id. 7c36cdb - realce no original): DECISÃO 1. Homologo os cálculos ID bb2a444 para que produzam seus legais efeitos. 2. Inicie-se a execução. 3. Esclareço que os insurgimentos acerca da conta de liquidação, com base no artigo 879 da CLT somente serão apreciados por ocasião da garantia do juízo, tal fato decorre de interpretação sistemática com o artigo 884 da CLT, que prevê: "Art. 884 - Garantida a execução ou penhorados os bens, terá o executado 5 (cinco) dias para apresentar embargos, cabendo igual prazo ao exequente para impugnação. § 1º - A matéria de defesa será restrita às alegações de cumprimento da decisão ou do acordo, quitação ou prescrição da dívida. § 2º - Se na defesa tiverem sido arroladas testemunhas, poderá o Juiz ou o Presidente do Tribunal, caso julgue necessários seus depoimentos, marcar audiência para a produção das provas, a qual deverá realizar-se dentro de 5 (cinco) dias. § 3º - Somente nos embargos à penhora poderá o executado impugnar a sentença de liquidação, cabendo ao exequente igual direito e no mesmo prazo." Referida interpretação é a que mais se coaduna com os artigos 879 e 884 da CLT, inclusive para fins de prestação jurisdicional célere, conforme princípio da duração razoável do processo, artigo 5º, LXXVIII, da CF/88, e dá mais efetividade ao procedimento executório na busca entregar o objeto da condenação ao exequente. Destaco ainda que desta decisão interlocutória não cabe recurso, conforme inteligência do artigo 893, § 1º da CLT c/c a Súmula nº 214 do TST. 4. Nos termos do artigo 876, parágrafo único, da CLT o Juiz do Trabalho executa de ofício as contribuições sociais previstas na alínea a do inciso I e no inciso II do caput do art. 195 da Constituição Federal. Portanto, detém autorização legal para executar o acessório da dívida principal ex officio. (...)" Pois bem. A presente ação de segurança tem como objeto a cassação da decisão exarada pela autoridade apontada como coatora, que condicionou a possibilidade de impugnação à conta de liquidação, com base nos artigos 879 e 884 da CLT, à garantia do juízo. Em juízo exauriente, após recebimento das informações prestadas pela autoridade apontada coatora, não vislumbro razão para alterar o posicionamento por mim adotado, quando do deferimento da medida liminar. No particular, o Juízo de primeiro grau concedeu prazo para impugnação da conta de liquidação com base no artigo 879, §2º, da CLT, ressaltando que eventual irresignação seria apreciada por ocasião da garantia do juízo. Depreende-se, ainda, que houve a imediata homologação da conta de liquidação, com o registro expresso para que fosse iniciada a execução, com a citação da parte demandada para pagamento ou garantia da execução, nos termos do art. 880 da CLT. Ora, muito embora na decisão proferida no Juízo de primeiro grau se visualize a busca de uma prestação jurisdicional célere e eficaz, o certo é que o legislador infraconstitucional, no já mencionado §2º do artigo 879 da CLT, estabeleceu que elaborada a conta e tornada líquida, o juízo deve abrir às partes prazo comum de oito dias para impugnação fundamentada com a indicação dos itens e valores objeto da discordância, sob pena de preclusão; e, uma vez ofertada a mencionada impugnação dentro do prazo, que independe de pagamento ou garantia da execução, negar o julgamento antes da homologação dos cálculos, com a devida vênia, tem traços de abusividade, revelando-se legítima a impetração do presente remédio constitucional. A propósito do tema, trago à colação os seguintes arestos extraídos da base jurisprudencial deste E. Regional: MANDADO DE SEGURANÇA. DIREITO LÍQUIDO E CERTO. Na sistemática do mandado de segurança, direito líquido e certo é aquele que se comprova de plano, cabalmente. No caso, a decisão do Juiz a quo de condicionar o julgamento das impugnações aos cálculos, ofertadas na forma do §2º do artigo 879 da CLT, à garantia do juízo, não encontra amparo legal, razão pela qual considero demonstrado o pressuposto fundamental para a concessão da segurança. A empresa impetrante possui o direito líquido e certo de discutir os cálculos de liquidação antes da homologação, sem dispor de seu patrimônio. O contraditório e a ampla defesa (artigo 5º, LV) constituem expressões de grande envergadura do Estado Democrático de Direito, de sorte que são restritas as hipóteses em que podem ser mitigados e/ou diferidos. Segurança concedida. (TRT da 6ª Região; Processo: 0002037-70.2024.5.06.0000; Data de assinatura: 10-12-2024; Órgão Julgador: Desembargador Ruy Salathiel de Albuquerque e Mello Ventura - 1ª Seção Especializada; Relator(a): RUY SALATHIEL DE ALBUQUERQUE E MELLO VENTURA) MANDADO DE SEGURANÇA. IMPUGNAÇÃO AOS CÁLCULOS. GARANTIA DO JUÍZO. INEXIGIBILIDADE. ARTIGO 879, §2º, DA CLT. VIOLAÇÃO À DIREITO LÍQUIDO E CERTO CARACTERIZADA. Dos elementos dos autos verifica-se que violado direito líquido e certo da impetrante na medida em que a autoridade coatora condicionou a análise da impugnação aos cálculos à garantia do Juízo, em desrespeito à norma contida no artigo 879, §2º, da CLT. Segurança concedida. (TRT da 6ª Região; Processo: 0000944-09.2023.5.06.0000; Data de assinatura: 06-11-2023; Órgão Julgador: Desembargador José Luciano Alexo da Silva - 1ª Seção Especializada; Relator(a): JOSE LUCIANO ALEXO DA SILVA) MANDADO DE SEGURANÇA. VIOLAÇÃO AO DIREITO LÍQUIDO E CERTO DA IMPETRANTE. ILEGALIDADE DO ATO COATOR DEMONSTRADA. Não respeitado o art. 879, § 2º, da CLT, que garante a impugnação aos cálculos, sem a necessidade imediata da garantia do juízo, resta evidenciada a violação ao direito líquido e certo da Impetrante, restando configurado o cerceamento do direito de defesa da parte e o descumprimento do devido processo legal pelo Órgão de Primeiro Grau. Segurança concedida. (TRT da 6ª Região; Processo: 0001908-02.2023.5.06.0000; Data de assinatura: 24-10-2023; Órgão Julgador: Desembargador Edmilson Alves da Silva - 1ª Seção Especializada; Relator(a): LARRY DA SILVA OLIVEIRA FILHO) Nesse quadro, portanto, reconheço como ilegal e violadora de direito líquido e certo a decisão impugnada, razão pela qual confirmo a liminar anteriormente deferida e suspendo, em definitivo, os efeitos da decisão atacada no ponto que condiciona o julgamento da impugnação aos cálculos de liquidação à garantia do juízo, devendo o(a) Magistrado(a) seguir com o trâmite da marcha executiva alinhado a legislação de base. CONCLUSÃO Ante o exposto, concedo a segurança para suspender os efeitos da decisão atacada no ponto que condiciona o julgamento da impugnação aos cálculos de liquidação à garantia do juízo, devendo o(a) Magistrado(a) seguir com o trâmite da marcha executiva alinhado à legislação de base. Custas no importe de R$ 20,00 (vinte reais), pelo litisconsorte PAULO FERNANDO BERNARDINO DA SENA, calculadas sobre o valor atribuído à causa. Intime-se a empresa impetrante e o litisconsorte, dando-se ciência à autoridade apontada como coatora, nos termos do artigo 11 da Lei nº 12.016/09. ACORDAM os membros da Primeira Seção Especializada do Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região, preliminarmente, por maioria, rejeitar a arguição de não cabimento do mandado de segurança, suscitada pelo Excelentíssimo Desembargador Edmilson Alves da Silva. No mérito, por maioria, conceder a segurança para suspender os efeitos da decisão atacada no ponto que condiciona o julgamento da impugnação aos cálculos a de liquidação à garantia do juízo, devendo o(a) Magistrado(a) seguir com o trâmite da marcha executiva alinhado à legislação de base; contra o voto do Excelentíssimo Desembargador Edmilson Alves da Silva que denegava a segurança. Custas no importe de R$ 20,00 (vinte reais), pelo litisconsorte PAULO FERNANDO BERNARDINO DA SENA, calculadas sobre o valor atribuído à causa. Intime-se a empresa impetrante e o litisconsorte, dando-se ciência à autoridade apontada como coatora, nos termos do artigo 11 da Lei nº 12.016/09. Recife, 30 de junho de 2025. NISE PEDROSO LINS DE SOUSA Desembargadora Relatora CERTIDÃO DE JULGAMENTO Certifico que, em sessão ordinária presencial, realizada em 30 de junho de 2025, sob a presidência do Excelentíssimo Desembargador Presidente RUY SALATHIEL DE ALBUQUERQUE E MELLO VENTURA, com a presença de Suas Excelências os Desembargadores Nise Pedroso Lins de Sousa (Relatora), Sergio Torres Teixeira, José Luciano Alexo da Silva, Milton Gouveia da Silva Filho, Fernando Cabral de Andrade Filho, Edmilson Alves da Silva; Vice-Presidente Eduardo Pugliesi, Gisane Barbosa de Araújo, Valdir José Silva de Carvalho, Maria Clara Saboya Albuquerque Bernardino; e a Procuradora-Chefe eventual da Procuradoria Regional do Trabalho da 6ª Região, Drª. Jailda Eulídia da Silva Pinto, resolveu a Primeira Seção Especializada deste Tribunal, preliminarmente, por maioria, rejeitar a arguição de não cabimento do mandado de segurança, suscitada pelo Excelentíssimo Desembargador Edmilson Alves da Silva. No mérito, por maioria, conceder a segurança para suspender os efeitos da decisão atacada no ponto que condiciona o julgamento da impugnação aos cálculos a de liquidação à garantia do juízo, devendo o(a) Magistrado(a) seguir com o trâmite da marcha executiva alinhado à legislação de base; contra o voto do Excelentíssimo Desembargador Edmilson Alves da Silva que denegava a segurança. Custas no importe de R$ 20,00 (vinte reais), pelo litisconsorte PAULO FERNANDO BERNARDINO DA SENA, calculadas sobre o valor atribuído à causa. Intime-se a empresa impetrante e o litisconsorte, dando-se ciência à autoridade apontada como coatora, nos termos do artigo 11 da Lei nº 12.016/09. O Excelentíssimo Desembargador Edmilson Alves da Silva apresentou justificativa de voto divergente quanto ao cabimento e ao mérito. Ausência justificada do Excelentíssimo Desembargador Corregedor Paulo Alcântara, em razão compensação de férias. Votos colhidos por ordem de assento, a partir do(a) Relator(a), nos termos do art. 102 do Regimento Interno do TRT6 (Redação da Resolução Administrativa TRT6 n.º 13/2022). KARINA DE POSSÍDIO MARQUES LUSTOSA Secretária do Tribunal Pleno - 1ª Seção Especializada NISE PEDROSO LINS DE SOUSA Relator VOTOS Voto do(a) Des(a). EDMILSON ALVES DA SILVA / Desembargador Edmilson Alves da Silva JUSTIFICATIVA DE VOTO DIVERGENTE Pedi justificativa de voto divergente, porque, com a devida vênia da ilustre Relatora, e tal qual o fiz nos casos dos Mandados de Segurança 0002037-70.2024.5.06.0000, citado no presente voto, de Relatoria do Desemb. Ruy Salathiel, e no Proc. 0000221-19.2025.5.06.0000(MSCiv), de relatoria do Desemb. Luciano Alexo (acórdão este publicado em 06.05.2025), dentre outros, entendo, tanto no que diz respeito ao cabimento do Mandado de Segurança, como no mérito, que não é o caso de concessão de alguma providência do tipo desejado pela Impetrante. Trago, porém, antes disso, como dado novo a esse debate, quando se trata da invocação do direito líquido e certo por parte de devedora assim a ter necessariamente a análise da impugnação aos cálculos pelo Juiz da causa sem o condicionamento colocado pelo julgador (a garantia da execução), aquilo que está regulamentado, vigente e que é aplicado na primeira instância, num grau de eficiência até mais elevado do que nesse que está vindo à discussão aqui, o texto do art. 2º do ATO CONJUNTO GP - CRT - 21/2023, deste Tribunal, que diz: 'Art. 2º. Apurados os cálculos originários da sentença ou do acordo não cumprido, será feita a citação para pagamento ou indicação de bens à penhora'. Isso tem orientado órgãos trabalhistas da primeira instância deste Tribunal a impulsionar a execução, 'ganhando' meses no trâmite dela, sem causar qualquer prejuízo a parte alguma - muito menos a devedoras como a Impetrante, que não podem estar invocando direito líquido e certo de atrasar o pagamento da dívida, com alegações em duplicidade sobre erros em cálculos não existentes, ao invés de cumprirem as coisas julgadas espontaneamente, depois de já causarem todos os males durante a relação de trabalho - numa sequência de atuação nociva até não conseguirem resistir mais à atuação da Justiça, depois de anos e anos. Esse procedimento que trago à tona pela primeira vez, que tem sido aplicado em Varas do Trabalho atendendo a um dos considerandos daquele ATO CONJUNTO, que é: CONSIDERANDO os princípios da razoável duração do processo, eficiência administrativa, efetividade, celeridade e economia processual, assim como o princípio da cooperação jurisdicional, previsto no artigo 69, II, do CPC, que imprimem presteza e aperfeiçoamento à prestação jurisdicional ... (dentre outros, evidentemente, e principalmente a regulamentação da atuação dos oficiais de justiça), chega a ir mais além do que o procedimento que no presente Mandado de Segurança (e em vários outros já vistos aqui) vem a ser questionado, isto é, ter sido dado prazo para a impugnação aos cálculos, mas ficando condicionada sua análise, corretamente, à garantia da dívida posteriormente. Note-se que, de maneira mais ainda efetiva, a hipótese que estou aqui mencionando como adendo envolve ir o julgador diretamente para a citação da devedora para pagamento ou indicação de bens à penhora (conforme está no ATO CONJUNTO 21/2023, em vigor desde 1º de março de 2024), sem se passar sequer por prazo para impugnação do que quer que seja, o que remete a entender que qualquer impugnação se dará só e apenas quando, por parte da devedora, ela garantir a execução. Chamo a atenção a isso, porque a ideia de um direito líquido e certo que tem sido trazida por devedoras assim, e acolhida nesta SEDI 1, me parece o uso indiscriminado do Mandado de Segurança para questionar qualquer incidente da execução, quando, a rigor, no caso particular, aquilo que a legislação formalmente diz que deva ocorrer - dar prazo para as partes impugnarem cálculos - e que mesmo assim comporta a interpretação que os órgãos trabalhistas têm dado, ocorreu em relação à Impetrante: o prazo não lhe foi retirado. O mais, fora disso, é interpretação da norma, dada pelo julgador, ao que não se pode emprestar a condição de ato ilegal ou praticado com abuso de poder. Apurados os cálculos originários da sentença, diz o citado ATO, não se dá sequer vista às partes, deixando-se de lado, em nome da celeridade, da economia processual, da efetividade..., o que o art. 879, § 2º, da CLT prevê, e nem assim se questiona existir direito líquido e certo por quem se depara com tal ato judicial fundado naquela autorização dada por esta Corte aos órgãos de primeiro grau. Então, extrair direito líquido e certo alegado pela parte que exige ter de haver a análise, duas vezes, de forma idêntica, sendo uma sem garantia da dívida e outra com a garantia, não me parece, para fins pelo menos de pedido de Mandado de Segurança, o que se deve garantir. Estamos, em síntese, em procedimentos relacionados à execução, em decisões que são irrecorríveis pela própria natureza, concedendo à parte devedora o direito ao 'recurso' do Mandado de Segurança, de forma indiscriminada, para toda e qualquer interpretação que o julgador na primeira instância empreste a normas jurídicas. Repito: qualquer interpretação jurídica. Sem que ela, devedora, precise garantir a dívida, pagá-la muito menos, porque aí não precisará recorrer/agravar, que é o que poderia fazer, desde que na hora certa. Logo, os princípios da razoável duração do processo, da eficiência administrativa, da efetividade, celeridade e economia processual não estão sendo observados nessa concessão de medida à devedora, privilegiando-se mais a forma da lei, a qual permite, sim, essa interpretação que está sendo dada no voto, evidentemente, mas igualmente permite aquela interpretação que foi dada no ato judicial de primeira instância ou até outra - como aquela que decorre da aplicação do ATO CONJUNTO aqui citado, que ultrapassa até essa discussão sobre dar ou não dar direito a impugnação qualquer, antes da citação para pagamento ou nomeação de bens à penhora. Nesse universo, direito líquido e certo, como aquele sobre o qual não resta qualquer dúvida a ninguém e que é apreensível de plano pelo julgador que se depara com a alegação que a pretensa detentora dele (caso da Impetrante aqui) traz, não me parece, com todo o respeito, existir. Nesse sentido, portanto, é que voto por denegar a segurança, tanto pela ausência de cabimento quanto no mérito propriamente dito, à falta aqui de um direito líquido e certo a proteger. RECIFE/PE, 03 de julho de 2025. RIVANI BEATRIZ CARNEIRO DE MELO Diretor de Secretaria Intimado(s) / Citado(s) - EMPRESA PEDROSA LTDA

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Aymore Credito, Financiamento E Investimento S.A. e outros x Aymore Credito, Financiamento E Investimento S.A. e outros

ID: 326644184

Tribunal: TJMT Órgão: Segunda Câmara de Direito Privado Classe: EMBARGOS DE DECLARAçãO CíVEL Nº Processo: 1017965-96.2022.8.11.0041

Data de Disponibilização: 16/07/2025

Polo Ativo:

AYMORE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. JOSELIA DE MORAES LUCIDOS

Polo Passivo:

AYMORE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. JOSELIA DE MORAES LUCIDOS

Acórdão

Advogados:

ALEXANDRE PACHER

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

EZIO AUGUSTO TIERRE NUNES DE ALMEIDA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

GERALDO UMBELINO NETO

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

NEY JOSE CAMPOS

OAB/MG XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1017965-96.2022.8.11.0041 Classe: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO CÍVEL (1689) Assunto: [Rescisão / Resolução, Compra e V… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1017965-96.2022.8.11.0041 Classe: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO CÍVEL (1689) Assunto: [Rescisão / Resolução, Compra e Venda, Protesto Indevido de Título] Relator: Des(a). TATIANE COLOMBO Turma Julgadora: [DES(A). TATIANE COLOMBO, DES(A). MARIA HELENA GARGAGLIONE POVOAS, DES(A). MARILSEN ANDRADE ADDARIO] Parte(s): [JOSELIA DE MORAES LUCIDOS - CPF: 065.826.991-72 (EMBARGANTE), GERALDO UMBELINO NETO - CPF: 871.800.571-34 (ADVOGADO), ALEXANDRE PACHER - CPF: 007.859.081-70 (ADVOGADO), SOLPAC COMPANY LTDA - CNPJ: 03.874.095/0001-60 (EMBARGANTE), MARCIRIO DA SILVA PEDROSO - CPF: 675.090.612-53 (ADVOGADO), ALEXANDRE APARECIDO DE LIMA - CPF: 109.991.658-52 (ADVOGADO), AYMORE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. - CNPJ: 07.707.650/0001-10 (EMBARGADO), NEY JOSE CAMPOS - CPF: 452.371.746-04 (ADVOGADO), SOLPAC COMPANY LTDA - CNPJ: 03.874.095/0001-60 (TERCEIRO INTERESSADO), EZIO AUGUSTO TIERRE NUNES DE ALMEIDA - CPF: 038.925.741-97 (ADVOGADO), JOSELIA DE MORAES LUCIDOS - CPF: 065.826.991-72 (EMBARGADO), EZIO AUGUSTO TIERRE NUNES DE ALMEIDA - CPF: 038.925.741-97 (ADVOGADO), ALEXANDRE PACHER - CPF: 007.859.081-70 (ADVOGADO), GERALDO UMBELINO NETO - CPF: 871.800.571-34 (ADVOGADO), AYMORE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. - CNPJ: 07.707.650/0001-10 (EMBARGANTE), NEY JOSE CAMPOS - CPF: 452.371.746-04 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). MARIA HELENA GARGAGLIONE POVOAS, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: EMBARGOS ACOLHIDOS. UNÂNIME. E M E N T A DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO OPOSTOS POR AMBAS AS PARTES. APLICAÇÃO DA LEI Nº 14.905/2024. JUROS MORATÓRIOS E CORREÇÃO MONETÁRIA. ALTERAÇÃO DO CÓDIGO CIVIL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. FIXAÇÃO SOBRE O VALOR DA CONDENAÇÃO. AUSÊNCIA DE EQUÍVOCO QUANTO À BASE DE CÁLCULO. EMBARGOS DA REQUERIDA ACOLHIDOS. EMBARGOS DA AUTORA REJEITADOS. I. CASO EM EXAME 1. Trata-se de Embargos de declaração opostos por Aymoré Crédito, Financiamento e Investimento S/A e por Joselia de Moraes Lucidos contra acórdão proferido em ação envolvendo cobrança de valores, atualização monetária e fixação de honorários advocatícios. A parte ré (Aymoré) alegou omissão quanto aos critérios legais de incidência dos juros moratórios e da correção monetária, diante da vigência da Lei nº 14.905/2024. A parte autora (Joselia) alegou omissão e obscuridade quanto à base de cálculo dos honorários advocatícios, sustentando que deveriam ser sobre o valor total do proveito econômico. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (i) verificar se há omissão no acórdão quanto à aplicação dos novos critérios legais de correção monetária e juros moratórios introduzidos pela Lei nº 14.905/2024; (ii) apurar se estão presentes os vícios de omissão ou obscuridade no julgamento que justifiquem nova apreciação da matéria, conforme alegado pela parte autora. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A omissão apontada pela parte ré é reconhecida, pois o acórdão deixou de aplicar os critérios legais introduzidos pela Lei nº 14.905/2024, que alterou os artigos 389 e 406 do Código Civil, determinando a aplicação do IPCA como índice de correção monetária e da taxa SELIC como taxa de juros moratórios, deduzido o IPCA. 4. A nova redação dos dispositivos legais citados possui natureza de norma de ordem pública e tem aplicação imediata aos processos em curso, inclusive na fase de liquidação e execução. 5. Em relação aos embargos da parte autora, não se identificam omissão ou obscuridade, pois o acórdão enfrentou de forma clara e fundamentada todas as matérias suscitadas, inclusive quanto à base de cálculo dos honorários, fixando-a conforme o art. 85, § 2º, do CPC, sobre o valor da condenação, diante da existência de condenação expressa. 6. Os embargos de declaração não se prestam à rediscussão do mérito já decidido, tampouco à manifestação de inconformismo da parte com o resultado do julgamento, quando ausentes vícios de omissão, obscuridade, contradição ou erro material. IV. DISPOSITIVO E TESE 7. Embargos de declaração da parte ré acolhidos com efeitos infringentes. Embargos de declaração da parte autora rejeitados. Tese de julgamento: 1. As alterações introduzidas pela Lei nº 14.905/2024 nos artigos 389 e 406 do Código Civil têm aplicação imediata aos processos em curso, devendo-se aplicar o IPCA como índice de correção monetária e a Taxa SELIC, deduzido o IPCA, como juros moratórios. 2. Não configuram omissão ou obscuridade as decisões que enfrentam de forma clara e fundamentada as teses suscitadas, sendo incabível o uso de embargos de declaração para rediscutir o mérito da decisão. R E L A T Ó R I O Egrégia Câmara, AYMORE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. opôs Embargos de Declaração em id. 291023879, alegando a existência de omissão no acórdão de id. 288979864, o qual desproveu em parte o Recurso de Apelação interposto pela Embargante. A Embargante alega que houve omissão no julgado quanto à necessária aplicação da Taxa SELIC como índice exclusivo para correção monetária e juros de mora, conforme entendimento pacificado do Superior Tribunal de Justiça até a entrada em vigor da Lei nº 14.905/2024. Sustenta que, conforme o princípio do “tempus regit actum”, até a modificação dos artigos 389 e 406 do Código Civil, promovida pela referida lei, a SELIC era o índice aplicável de forma exclusiva, sendo vedada a aplicação cumulativa de outros índices ou percentuais. Aduz que a jurisprudência do STJ, inclusive no julgamento do REsp 175.982/SP, já consolidava a aplicação única da SELIC até a entrada em vigor da nova legislação, e que, mesmo após sua vigência, tal índice deve ser aplicado aos processos em curso, inclusive os com sentença transitada em julgado. Pontua que a matéria relativa à correção monetária e aos juros de mora ostenta natureza de ordem pública, o que permite sua modificação de ofício pelo julgador, independentemente de provocação das partes, não incidindo a coisa julgada sobre tais aspectos por se tratar de obrigação de trato sucessivo. Assim, requer o acolhimento dos Embargos para que sejam “integrados/modificados os índices do julgado, em consonância ao balizamento previsto no art. 406 do Código Civil, no que toca à aplicação da Taxa SELIC, a título de correção monetária e juros de mora e, após a edição da Lei 14.905/24, com as modificações havidas nos art. 389 e 406 do mesmo Diploma”. Por sua vez, JOSELIA DE MORAES LUCIDOS opôs Embargos de Declaração em id. 291246871 apontando a existência de omissão e obscuridade no referido acórdão. A Autora/Embargante afirma que o acórdão embargado, ao reformar parcialmente a sentença para fixar os honorários advocatícios sobre o “valor da condenação”, incorreu em omissão e obscuridade, por não esclarecer se esse montante abrangeria, além da indenização por danos morais, também o valor econômico decorrente da rescisão contratual, que resultou na extinção de obrigação financeira significativa. Os valores relativos à extinção da obrigação possuem nítido caráter patrimonial e econômico quanto à indenização por danos morais e não podem ser desconsiderados no caso. Defende que a reforma promovida no acórdão não observou os parâmetros legais nem prestigiou a atuação do advogado que viabilizou a extinção de obrigação financeira indevida, destacando que o Juízo de primeiro grau já havia acolhido embargos de declaração para esclarecer que os honorários incidiram sobre o total do benefício econômico, e não apenas sobre a indenização moral. Argumenta que a negativa de reconhecimento do efeito econômico que integra o valor da condenação implica afronta direta aos princípios da equidade, razoabilidade e proporcionalidade e à dignidade da advocacia. Explana que no caso o melhor a se fazer é a aplicação dos honorários sucumbenciais, sobre o proveito econômico obtido com a rescisão dos contratos em comento. Pugna pelo acolhimento do Recurso para: a) Sanar a omissão e a obscuridade presentes no acórdão embargado, esclarecendo-se que o “valor da condenação” abrange não apenas a indenização por danos morais (R$ 8.000,00), mas também o valor patrimonial advindo da rescisão dos contratos (com a SOPAC - R$ 48.890,49 + encargos em caso de financiamento no valor de R$ 4.464,60 e com a AYMORÉ – R$ 66.969,00); b) Caso assim não entenda Vossa Excelência, requer a concessão de efeito modificativo, para que seja reformado o acórdão retro, mantendo-se a aplicação dos honorários sobre o proveito econômico, assim como já havia aplicado o MM Juízo de piso, uma vez que melhor atende ao caso concreto, já que a rescisão do contrato também trouxe benefícios a parte embargante, devendo incidir na base de cálculo dos honorários advocatícios já arbitrados; b.1) Subsidiariamente, revolvendo a aplicação da base de cálculo dos honorários sobre o proveito econômico, o que manteria a sentença do MM Juízo de piso por seus próprios fundamentos, tornando o resultado do julgamento da apelação interposta pelas Embargadas em NÃO PROVIDO, requer em atenção ao art. 85, §11 do CPC, sejam majorados os honorários já arbitrados. Contraminutas acostadas em id. 293122865 e id. 294869883. É o relato necessário. V O T O R E L A T O R Os embargos de declaração visam tão somente afastar obscuridade, contradição, omissão ou erro material na decisão, a teor do artigo 1.022 do Código de Processo Civil: Art. 1.022. Cabem embargos de declaração contra qualquer decisão judicial para: I - esclarecer obscuridade ou eliminar contradição; II - suprir omissão de ponto ou questão sobre o qual devia se pronunciar o juiz de ofício ou a requerimento; III - corrigir erro material. Parágrafo único. Considera-se omissa a decisão que: I - deixe de se manifestar sobre tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em incidente de assunção de competência aplicável ao caso sob julgamento; II - incorra em qualquer das condutas descritas no art. 489, § 1º. Portanto, os embargos declaratórios são denominados recursos de fundamentação vinculada, de modo que não se prestam à prolação de novo julgamento da causa. Em relação aos Embargos da embargante Aymore Credito, Financiamento e Investimento S/A, analisando-se o acórdão recorrido, observo que de fato existe omissão no que concerne à atualização da correção monetária e dos juros de mora, pois manteve a sua incidência pelo INPC, quando o correto seria a aplicação da Taxa SELIC e o IPCA. Isso porque com as recentes mudanças promovidas pela a Lei 14.905/2024, que alterou o Código Civil, no que tange a correção monetária e juros, deve ser aplicada a variação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), quando o índice não tiver sido convencionado ou não estar previsto em lei específica, e os juros serão fixados de acordo com a taxa legal, a qual corresponderá à taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic). Nesse sentido dispõem os artigos 389 e 406, §1° do Código Civil: Art. 389. Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros, atualização monetária e honorários de advogado. (Redação dada pela Lei nº 14.905, de 2024) Produção de efeitos Parágrafo único. Na hipótese de o índice de atualização monetária não ter sido convencionado ou não estar previsto em lei específica, será aplicada a variação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), apurado e divulgado pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), ou do índice que vier a substituí-lo. Art. 406. Quando não forem convencionados, ou quando o forem sem taxa estipulada, ou quando provierem de determinação da lei, os juros serão fixados de acordo com a taxa legal. (Redação dada pela Lei nº 14.905, de 2024). § 1º A taxa legal corresponderá à taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), deduzido o índice de atualização monetária de que trata o parágrafo único do art. 389 deste Código. (Incluído pela Lei nº 14.905, de 2024). Desse modo, a partir da vigência da Lei n. 14.905/2024, aplicam-se o IPCA para correção monetária e a taxa SELIC para juros moratórios, sendo o IPCA deduzido da SELIC, nos termos do novo caput do artigo 406 do Código Civil. Logo, em observância ao que dispõe a Lei 14.905/2024 quanto ao índice de correção monetária e aos juros moratórios, devem ser acolhidos os embargos de declaração para que sejam aplicados os índices corretos em observância à previsão legal expressa, a partir de sua vigência. Nesse sentido: EMBARGOS DECLARATÓRIOS EM ACÓRDÃO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE COBRANÇA SECURITÁRIA – PARCIAL PROCEDÊNCIA – DEVER DE INDENIZAR –QUITAÇÃO DAS CÉDULAS CRÉDITO – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO – OMISSÃO = CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA – OCORRÊNCIA – LEI Nº 14.905/2024 QUE ALTEROU O CÓDIGO CIVIL - OMISSÃO QUANTO AO ÔNUS SUCUMBENCIAL – INOCORRÊNCIA – EMBARGOS DA PARTE REQUERIDA ACOLHIDOS COM EFEITOS INFRINGENTES – EMBARGOS DA PARTE AUTORA NÃO ACOLHIDOS. 1. Devem ser acolhidos os embargos de declaração quando constatada a omissão no acórdão embargado quanto à aplicação da Lei nº 14.905/2024 que alterou os artigos 389 e 406, ambos do Código Civil para que seja aplicada a taxa Selic, além da aplicação do índice IPCA para correção monetária, a partir de sua vigência. (...). (N.U 0001908-97.2014.8.11.0009, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARILSEN ANDRADE ADDARIO, Segunda Câmara de Direito Privado, Julgado em 24/06/2025, Publicado no DJE 24/06/2025). (Destaquei). EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. VÍCIO REDIBITÓRIO EM CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA. RESTITUIÇÃO INTEGRAL DOS VALORES PAGOS SEM RETENÇÃO. CRITÉRIOS DE JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. APLICAÇÃO DA LEI Nº 14.905/2024. EMBARGOS ACOLHIDOS. I. CASO EM EXAME (...). III. RAZÕES DE DECIDIR 3. O acórdão embargado já apreciou expressamente a questão da devolução integral dos valores pagos, sem retenção, diante da caracterização de vício redibitório e inadimplemento contratual por parte da incorporadora, razão pela qual não há omissão quanto a esse ponto. 4. Constatou-se omissão quanto ao regime de incidência dos juros moratórios e da correção monetária, o que justifica o acolhimento parcial dos embargos para determinar a aplicação imediata da Lei nº 14.905/2024, que alterou os arts. 389 e 406 do Código Civil. 5. Com a nova redação legal, os juros moratórios devem observar a Taxa Selic, deduzido o IPCA, e a correção monetária deve seguir o IPCA, por se tratarem de normas de ordem pública com aplicação imediata às relações jurídicas ainda pendentes de liquidação e execução. IV. DISPOSITIVO E TESE Embargos de declaração acolhidos. Tese de julgamento: (...). 2. As alterações introduzidas pela Lei nº 14.905/2024 nos arts. 389 e 406 do Código Civil são de aplicação imediata, inclusive em processos em curso, determinando o uso do IPCA como índice de correção monetária e da Taxa Selic, deduzido o IPCA, para os juros moratórios. (N.U 1001595-96.2021.8.11.0002, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, TATIANE COLOMBO, Segunda Câmara de Direito Privado, Julgado em 20/05/2025, Publicado no DJE 20/05/2025). (Destaquei). Diante do exposto, ACOLHO os Embargos de Declaração opostos pela Requerida/Agravante para sanar a omissão apontada, determinando que os critérios de correção monetária e de juros de mora observem as disposições da Lei 14.905/2024, aplicando-se o IPCA como índice de correção monetária e a Taxa Selic para os juros moratórios, com a dedução do IPCA nesta última. No que concerne aos Embargos opostos por Joselia de Moraes Lucidos, verifica-se que a parte elege matéria de convicção desta Câmara para fundamentar suas pretensões, evidenciando que há nítida irresignação em relação ao conteúdo do julgado. A Autora/Embargante alega a ocorrência de omissão e obscuridade no v. acórdão, todavia, no caso dos autos não se constatam tais vícios, haja vista que todos os pontos foram enfrentados de maneira coerente e fundamentada pelo julgado. Dessa forma, como a decisão recorrida foi devidamente fundamentada, conforme estabelece o artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal, a insatisfação da parte Embargante tem a intenção de rediscutir a matéria, o que não se admite, pois resta expressado o convencimento do julgador. Importa consignar que no julgado o tema em discussão foi apreciado, nos seguintes termos: (...). No que tange ao pedido de alteração da base de cálculo dos honorários sucumbenciais, entendo que a sentença comporta reforma nesse ponto. Isso porque fixou os honorários sucumbenciais em 15% sobre o valor do proveito econômico obtido, quando o correto seria sobre o patamar da condenação, ante a ordem de preferência do artigo 85, §2° do Código de Processo Civil. Sobre o assunto: PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. BASE DE CÁLCULO, VALOR DA CAUSA. TEMA N. 1.076 DO STJ. IMPOSSIBILIDADE DE MENSURAÇÃO DO PROVEITO ECONÔMICO. REEXAME DE FATOS E PROVAS. SÚMULA N. 7/STJ. 1. O arbitramento dos honorários advocatícios deve seguir a regra geral estabelecida no art. 85, § 2º, do CPC, de acordo com a ordem de preferência nele estabelecida, a saber: 1º) nas causas em que houver condenação, este é o critério a ser utilizado pelo magistrado, observando o parâmetro legal entre 10% a 20%; 2º) nas causas em que não houver condenação, deve o magistrado arbitrar os honorários de acordo com o proveito econômico aferido; e 3º) não sendo possível mensurar o proveito econômico, sendo ele inestimável ou irrisório, a verba sucumbencial deve ser arbitrada de acordo com o valor da causa. (AgInt no AREsp n. 2 .260.221/SC, relator Ministro João Otávio de Noronha, Quarta Turma, julgado em 12/3/2024, DJe de 14/3/2024.) 2. Apenas se admite arbitramento de honorários por equidade quando, havendo ou não condenação a) o proveito econômico obtido pelo vencedor for inestimável ou irrisório; ou b) o valor da causa for muito baixo, o que não é a hipótese. 3. O reexame de fatos e provas é inadmissível em recurso especial. Incidência da Súmula n. 7/STJ.Agravo interno improvido. (STJ - AgInt nos EDcl no AREsp: 2324746 SC 2023/0078154-1, Relator.: Ministro HUMBERTO MARTINS, Data de Julgamento: 13/05/2024, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 15/05/2024). (Destaquei). Dessa forma, deve ser alterada a base de cálculo dos honorários, para que sejam fixados de acordo com o valor da condenação, nos termos do art. 85, §2º, do Código de Processo Civil. (...) - sic – id. 288979864. Nesse ponto, conforme pontuado no acórdão, é sedimentado na jurisprudência de que nas causas em que houver condenação, como no presente caso, este é o critério a ser utilizado pelo magistrado para a fixação dos honorários advocatícios. Sobre o assunto: APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE RESCISÃO CONTRATUAL – EMBARGOS DE DECLARAÇÃO OPOSTOS À SENTENÇA PELO AUTOR – INTERRUPÇÃO DO PRAZO PARA RECORRER – APLICAÇÃO PARA AMBAS AS PARTES – TEMPESTIVIDADE CONFIGURADA – VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE – NÃO CONSTATAÇÃO – IMPUGNAÇÃO ESPECÍFICA DAS RAZÕES DE DECIDIR – PRELIMINARES REJEITADAS – MÉRITO – RECONVENÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE – LEGALIDADE DAS ARRAS – MATÉRIA AFETA À DEMANDA PRINCIPAL – DANO MORAL NÃO DEMONSTRADO – HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS – PEDIDO DE ALTERAÇÃO DA BASE UTILIZADA PARA O ARBITRAMENTO – INVIABILIDADE – DEVIDA OBSERVÂNCIA AO §2º DO ART. 85 DO CPC – RECURSO NÃO PROVIDO. Os Embargos de Declaração não possuem efeito suspensivo e interrompem o prazo para ambas as partes recorrerem (art. 1.026 do CPC). (...). “A expressiva redação legal impõe concluir que: (a) o § 2º do referido art. 85 veicula a regra geral, de aplicação obrigatória, de que os honorários advocatícios sucumbenciais devem ser fixados no patamar de dez a vinte por cento, subsequentemente calculados sobre o valor: (a.1) da condenação; (a.2) do proveito econômico obtido; ou (a.3) do valor atualizado da causa; (REsp. 1.746.072/PR). (N.U 0024360-34.2016.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, Vice-Presidência, Julgado em 11/09/2024, Publicado no DJE 11/09/2024). (Destaquei). RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL C/C RESTITUIÇÃO DE VALORES E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – PROCEDÊNCIA – PRELIMINAR DE ILEGALIDADE DA APLICAÇÃO DA MULTA POR EMBARGOS PROTELATÓRIOS – ACOLHIMENTO – PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA POR JULGAMENTO EXTRA PETITA – ADEQUAÇÃO AOS LIMITES DO PEDIDO – MÉRITO – ATRASO NA ENTREGA DO IMÓVEL – RESCISÃO POR CULPA DA PROMITENTE VENDEDORA – ALEGAÇÃO DE CASO FORTUITO OU FORÇA MAIOR – PANDEMIA COVID 19 – NECESSIDADE DE PROVA CABAL – INAPLICABILIDADE DA LEI 13.786/2018 – APLICABILIDADE DO ART. 53 DO CDC – DEVOLUÇÃO INTEGRAL E EM PARCELA ÚNICA – SÚMULA 543 STJ – VALOR DAS PARCELAS PAGAS DIVERSO DO ALEGADO NA PETIÇÃO INICIAL – COMPROVAÇÃO – JUROS DE MORA – TERMO INICIAL – CITAÇÃO – DANO MORAL – CONFIGURAÇÃO – INDENIZAÇÃO DEVIDA – COMISSÃO DE CORRETAGEM – NÃO CONHECIMENTO DA MATÉRIA – AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL – HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS – FIXAÇÃO SOBRE O VALOR DA CONDENAÇÃO – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (...). Os honorários sucumbenciais devem ser fixados sobre o valor da condenação e não sobre o valor da causa, esta última somente pode ser aplicada quando não for possível mensurar o proveito econômico obtido ou não houve condenação, nos termos do art. 85, § 2º do CPC/15. (N.U 1011028-87.2022.8.11.0003, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARILSEN ANDRADE ADDARIO, Vice-Presidência, Julgado em 21/02/2024, Publicado no DJE 21/02/2024). (Destaquei). Assim, não vislumbro a existência de contradição, omissão ou obscuridade justificadora deste recurso. Logo, considerando que os embargos declaratórios não prestam para prolatar nova decisão de matérias já dirimidas, sobretudo quando fundamentadas por motivos suficientes para julgar a questão, a rejeição do recurso se revela medida adequada. Nesse sentido: PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÕES INEXISTENTES. REDISCUSSÃO DE MATÉRIA DE MÉRITO. IMPOSSIBILIDADE. 1. A solução correta e integral da controvérsia, com lastro em fundamentos suficientes, não configura omissão. 2. Os Embargos de Declaração não constituem instrumento adequado para a rediscussão da matéria de mérito consubstanciada na decisão recorrida, quando não presentes os vícios de omissão, obscuridade ou contradição, nos termos do art. 1.022 do CPC. 3. Embargos de Declaração rejeitados. (STJ - EDcl no REsp: 1549458 SP 2014/0130168-2, Relator: Ministro HERMAN BENJAMIN, Data de Julgamento: 11/04/2022, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 25/04/2022). Em assim sendo, REJEITO os embargos de declaração manejados pela Autora/Embargante. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 09/07/2025

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Aymore Credito, Financiamento E Investimento S.A. e outros x Aymore Credito, Financiamento E Investimento S.A. e outros

ID: 326644200

Tribunal: TJMT Órgão: Segunda Câmara de Direito Privado Classe: EMBARGOS DE DECLARAçãO CíVEL Nº Processo: 1017965-96.2022.8.11.0041

Data de Disponibilização: 16/07/2025

Polo Ativo:

AYMORE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. JOSELIA DE MORAES LUCIDOS

Polo Passivo:

AYMORE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. JOSELIA DE MORAES LUCIDOS

Acórdão

Advogados:

ALEXANDRE PACHER

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EZIO AUGUSTO TIERRE NUNES DE ALMEIDA

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GERALDO UMBELINO NETO

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NEY JOSE CAMPOS

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1017965-96.2022.8.11.0041 Classe: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO CÍVEL (1689) Assunto: [Rescisão / Resolução, Compra e V… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1017965-96.2022.8.11.0041 Classe: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO CÍVEL (1689) Assunto: [Rescisão / Resolução, Compra e Venda, Protesto Indevido de Título] Relator: Des(a). TATIANE COLOMBO Turma Julgadora: [DES(A). TATIANE COLOMBO, DES(A). MARIA HELENA GARGAGLIONE POVOAS, DES(A). MARILSEN ANDRADE ADDARIO] Parte(s): [JOSELIA DE MORAES LUCIDOS - CPF: 065.826.991-72 (EMBARGANTE), GERALDO UMBELINO NETO - CPF: 871.800.571-34 (ADVOGADO), ALEXANDRE PACHER - CPF: 007.859.081-70 (ADVOGADO), SOLPAC COMPANY LTDA - CNPJ: 03.874.095/0001-60 (EMBARGANTE), MARCIRIO DA SILVA PEDROSO - CPF: 675.090.612-53 (ADVOGADO), ALEXANDRE APARECIDO DE LIMA - CPF: 109.991.658-52 (ADVOGADO), AYMORE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. - CNPJ: 07.707.650/0001-10 (EMBARGADO), NEY JOSE CAMPOS - CPF: 452.371.746-04 (ADVOGADO), SOLPAC COMPANY LTDA - CNPJ: 03.874.095/0001-60 (TERCEIRO INTERESSADO), EZIO AUGUSTO TIERRE NUNES DE ALMEIDA - CPF: 038.925.741-97 (ADVOGADO), JOSELIA DE MORAES LUCIDOS - CPF: 065.826.991-72 (EMBARGADO), EZIO AUGUSTO TIERRE NUNES DE ALMEIDA - CPF: 038.925.741-97 (ADVOGADO), ALEXANDRE PACHER - CPF: 007.859.081-70 (ADVOGADO), GERALDO UMBELINO NETO - CPF: 871.800.571-34 (ADVOGADO), AYMORE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. - CNPJ: 07.707.650/0001-10 (EMBARGANTE), NEY JOSE CAMPOS - CPF: 452.371.746-04 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). MARIA HELENA GARGAGLIONE POVOAS, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: EMBARGOS ACOLHIDOS. UNÂNIME. E M E N T A DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO OPOSTOS POR AMBAS AS PARTES. APLICAÇÃO DA LEI Nº 14.905/2024. JUROS MORATÓRIOS E CORREÇÃO MONETÁRIA. ALTERAÇÃO DO CÓDIGO CIVIL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. FIXAÇÃO SOBRE O VALOR DA CONDENAÇÃO. AUSÊNCIA DE EQUÍVOCO QUANTO À BASE DE CÁLCULO. EMBARGOS DA REQUERIDA ACOLHIDOS. EMBARGOS DA AUTORA REJEITADOS. I. CASO EM EXAME 1. Trata-se de Embargos de declaração opostos por Aymoré Crédito, Financiamento e Investimento S/A e por Joselia de Moraes Lucidos contra acórdão proferido em ação envolvendo cobrança de valores, atualização monetária e fixação de honorários advocatícios. A parte ré (Aymoré) alegou omissão quanto aos critérios legais de incidência dos juros moratórios e da correção monetária, diante da vigência da Lei nº 14.905/2024. A parte autora (Joselia) alegou omissão e obscuridade quanto à base de cálculo dos honorários advocatícios, sustentando que deveriam ser sobre o valor total do proveito econômico. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (i) verificar se há omissão no acórdão quanto à aplicação dos novos critérios legais de correção monetária e juros moratórios introduzidos pela Lei nº 14.905/2024; (ii) apurar se estão presentes os vícios de omissão ou obscuridade no julgamento que justifiquem nova apreciação da matéria, conforme alegado pela parte autora. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A omissão apontada pela parte ré é reconhecida, pois o acórdão deixou de aplicar os critérios legais introduzidos pela Lei nº 14.905/2024, que alterou os artigos 389 e 406 do Código Civil, determinando a aplicação do IPCA como índice de correção monetária e da taxa SELIC como taxa de juros moratórios, deduzido o IPCA. 4. A nova redação dos dispositivos legais citados possui natureza de norma de ordem pública e tem aplicação imediata aos processos em curso, inclusive na fase de liquidação e execução. 5. Em relação aos embargos da parte autora, não se identificam omissão ou obscuridade, pois o acórdão enfrentou de forma clara e fundamentada todas as matérias suscitadas, inclusive quanto à base de cálculo dos honorários, fixando-a conforme o art. 85, § 2º, do CPC, sobre o valor da condenação, diante da existência de condenação expressa. 6. Os embargos de declaração não se prestam à rediscussão do mérito já decidido, tampouco à manifestação de inconformismo da parte com o resultado do julgamento, quando ausentes vícios de omissão, obscuridade, contradição ou erro material. IV. DISPOSITIVO E TESE 7. Embargos de declaração da parte ré acolhidos com efeitos infringentes. Embargos de declaração da parte autora rejeitados. Tese de julgamento: 1. As alterações introduzidas pela Lei nº 14.905/2024 nos artigos 389 e 406 do Código Civil têm aplicação imediata aos processos em curso, devendo-se aplicar o IPCA como índice de correção monetária e a Taxa SELIC, deduzido o IPCA, como juros moratórios. 2. Não configuram omissão ou obscuridade as decisões que enfrentam de forma clara e fundamentada as teses suscitadas, sendo incabível o uso de embargos de declaração para rediscutir o mérito da decisão. R E L A T Ó R I O Egrégia Câmara, AYMORE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. opôs Embargos de Declaração em id. 291023879, alegando a existência de omissão no acórdão de id. 288979864, o qual desproveu em parte o Recurso de Apelação interposto pela Embargante. A Embargante alega que houve omissão no julgado quanto à necessária aplicação da Taxa SELIC como índice exclusivo para correção monetária e juros de mora, conforme entendimento pacificado do Superior Tribunal de Justiça até a entrada em vigor da Lei nº 14.905/2024. Sustenta que, conforme o princípio do “tempus regit actum”, até a modificação dos artigos 389 e 406 do Código Civil, promovida pela referida lei, a SELIC era o índice aplicável de forma exclusiva, sendo vedada a aplicação cumulativa de outros índices ou percentuais. Aduz que a jurisprudência do STJ, inclusive no julgamento do REsp 175.982/SP, já consolidava a aplicação única da SELIC até a entrada em vigor da nova legislação, e que, mesmo após sua vigência, tal índice deve ser aplicado aos processos em curso, inclusive os com sentença transitada em julgado. Pontua que a matéria relativa à correção monetária e aos juros de mora ostenta natureza de ordem pública, o que permite sua modificação de ofício pelo julgador, independentemente de provocação das partes, não incidindo a coisa julgada sobre tais aspectos por se tratar de obrigação de trato sucessivo. Assim, requer o acolhimento dos Embargos para que sejam “integrados/modificados os índices do julgado, em consonância ao balizamento previsto no art. 406 do Código Civil, no que toca à aplicação da Taxa SELIC, a título de correção monetária e juros de mora e, após a edição da Lei 14.905/24, com as modificações havidas nos art. 389 e 406 do mesmo Diploma”. Por sua vez, JOSELIA DE MORAES LUCIDOS opôs Embargos de Declaração em id. 291246871 apontando a existência de omissão e obscuridade no referido acórdão. A Autora/Embargante afirma que o acórdão embargado, ao reformar parcialmente a sentença para fixar os honorários advocatícios sobre o “valor da condenação”, incorreu em omissão e obscuridade, por não esclarecer se esse montante abrangeria, além da indenização por danos morais, também o valor econômico decorrente da rescisão contratual, que resultou na extinção de obrigação financeira significativa. Os valores relativos à extinção da obrigação possuem nítido caráter patrimonial e econômico quanto à indenização por danos morais e não podem ser desconsiderados no caso. Defende que a reforma promovida no acórdão não observou os parâmetros legais nem prestigiou a atuação do advogado que viabilizou a extinção de obrigação financeira indevida, destacando que o Juízo de primeiro grau já havia acolhido embargos de declaração para esclarecer que os honorários incidiram sobre o total do benefício econômico, e não apenas sobre a indenização moral. Argumenta que a negativa de reconhecimento do efeito econômico que integra o valor da condenação implica afronta direta aos princípios da equidade, razoabilidade e proporcionalidade e à dignidade da advocacia. Explana que no caso o melhor a se fazer é a aplicação dos honorários sucumbenciais, sobre o proveito econômico obtido com a rescisão dos contratos em comento. Pugna pelo acolhimento do Recurso para: a) Sanar a omissão e a obscuridade presentes no acórdão embargado, esclarecendo-se que o “valor da condenação” abrange não apenas a indenização por danos morais (R$ 8.000,00), mas também o valor patrimonial advindo da rescisão dos contratos (com a SOPAC - R$ 48.890,49 + encargos em caso de financiamento no valor de R$ 4.464,60 e com a AYMORÉ – R$ 66.969,00); b) Caso assim não entenda Vossa Excelência, requer a concessão de efeito modificativo, para que seja reformado o acórdão retro, mantendo-se a aplicação dos honorários sobre o proveito econômico, assim como já havia aplicado o MM Juízo de piso, uma vez que melhor atende ao caso concreto, já que a rescisão do contrato também trouxe benefícios a parte embargante, devendo incidir na base de cálculo dos honorários advocatícios já arbitrados; b.1) Subsidiariamente, revolvendo a aplicação da base de cálculo dos honorários sobre o proveito econômico, o que manteria a sentença do MM Juízo de piso por seus próprios fundamentos, tornando o resultado do julgamento da apelação interposta pelas Embargadas em NÃO PROVIDO, requer em atenção ao art. 85, §11 do CPC, sejam majorados os honorários já arbitrados. Contraminutas acostadas em id. 293122865 e id. 294869883. É o relato necessário. V O T O R E L A T O R Os embargos de declaração visam tão somente afastar obscuridade, contradição, omissão ou erro material na decisão, a teor do artigo 1.022 do Código de Processo Civil: Art. 1.022. Cabem embargos de declaração contra qualquer decisão judicial para: I - esclarecer obscuridade ou eliminar contradição; II - suprir omissão de ponto ou questão sobre o qual devia se pronunciar o juiz de ofício ou a requerimento; III - corrigir erro material. Parágrafo único. Considera-se omissa a decisão que: I - deixe de se manifestar sobre tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em incidente de assunção de competência aplicável ao caso sob julgamento; II - incorra em qualquer das condutas descritas no art. 489, § 1º. Portanto, os embargos declaratórios são denominados recursos de fundamentação vinculada, de modo que não se prestam à prolação de novo julgamento da causa. Em relação aos Embargos da embargante Aymore Credito, Financiamento e Investimento S/A, analisando-se o acórdão recorrido, observo que de fato existe omissão no que concerne à atualização da correção monetária e dos juros de mora, pois manteve a sua incidência pelo INPC, quando o correto seria a aplicação da Taxa SELIC e o IPCA. Isso porque com as recentes mudanças promovidas pela a Lei 14.905/2024, que alterou o Código Civil, no que tange a correção monetária e juros, deve ser aplicada a variação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), quando o índice não tiver sido convencionado ou não estar previsto em lei específica, e os juros serão fixados de acordo com a taxa legal, a qual corresponderá à taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic). Nesse sentido dispõem os artigos 389 e 406, §1° do Código Civil: Art. 389. Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros, atualização monetária e honorários de advogado. (Redação dada pela Lei nº 14.905, de 2024) Produção de efeitos Parágrafo único. Na hipótese de o índice de atualização monetária não ter sido convencionado ou não estar previsto em lei específica, será aplicada a variação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), apurado e divulgado pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), ou do índice que vier a substituí-lo. Art. 406. Quando não forem convencionados, ou quando o forem sem taxa estipulada, ou quando provierem de determinação da lei, os juros serão fixados de acordo com a taxa legal. (Redação dada pela Lei nº 14.905, de 2024). § 1º A taxa legal corresponderá à taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), deduzido o índice de atualização monetária de que trata o parágrafo único do art. 389 deste Código. (Incluído pela Lei nº 14.905, de 2024). Desse modo, a partir da vigência da Lei n. 14.905/2024, aplicam-se o IPCA para correção monetária e a taxa SELIC para juros moratórios, sendo o IPCA deduzido da SELIC, nos termos do novo caput do artigo 406 do Código Civil. Logo, em observância ao que dispõe a Lei 14.905/2024 quanto ao índice de correção monetária e aos juros moratórios, devem ser acolhidos os embargos de declaração para que sejam aplicados os índices corretos em observância à previsão legal expressa, a partir de sua vigência. Nesse sentido: EMBARGOS DECLARATÓRIOS EM ACÓRDÃO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE COBRANÇA SECURITÁRIA – PARCIAL PROCEDÊNCIA – DEVER DE INDENIZAR –QUITAÇÃO DAS CÉDULAS CRÉDITO – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO – OMISSÃO = CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA – OCORRÊNCIA – LEI Nº 14.905/2024 QUE ALTEROU O CÓDIGO CIVIL - OMISSÃO QUANTO AO ÔNUS SUCUMBENCIAL – INOCORRÊNCIA – EMBARGOS DA PARTE REQUERIDA ACOLHIDOS COM EFEITOS INFRINGENTES – EMBARGOS DA PARTE AUTORA NÃO ACOLHIDOS. 1. Devem ser acolhidos os embargos de declaração quando constatada a omissão no acórdão embargado quanto à aplicação da Lei nº 14.905/2024 que alterou os artigos 389 e 406, ambos do Código Civil para que seja aplicada a taxa Selic, além da aplicação do índice IPCA para correção monetária, a partir de sua vigência. (...). (N.U 0001908-97.2014.8.11.0009, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARILSEN ANDRADE ADDARIO, Segunda Câmara de Direito Privado, Julgado em 24/06/2025, Publicado no DJE 24/06/2025). (Destaquei). EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. VÍCIO REDIBITÓRIO EM CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA. RESTITUIÇÃO INTEGRAL DOS VALORES PAGOS SEM RETENÇÃO. CRITÉRIOS DE JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. APLICAÇÃO DA LEI Nº 14.905/2024. EMBARGOS ACOLHIDOS. I. CASO EM EXAME (...). III. RAZÕES DE DECIDIR 3. O acórdão embargado já apreciou expressamente a questão da devolução integral dos valores pagos, sem retenção, diante da caracterização de vício redibitório e inadimplemento contratual por parte da incorporadora, razão pela qual não há omissão quanto a esse ponto. 4. Constatou-se omissão quanto ao regime de incidência dos juros moratórios e da correção monetária, o que justifica o acolhimento parcial dos embargos para determinar a aplicação imediata da Lei nº 14.905/2024, que alterou os arts. 389 e 406 do Código Civil. 5. Com a nova redação legal, os juros moratórios devem observar a Taxa Selic, deduzido o IPCA, e a correção monetária deve seguir o IPCA, por se tratarem de normas de ordem pública com aplicação imediata às relações jurídicas ainda pendentes de liquidação e execução. IV. DISPOSITIVO E TESE Embargos de declaração acolhidos. Tese de julgamento: (...). 2. As alterações introduzidas pela Lei nº 14.905/2024 nos arts. 389 e 406 do Código Civil são de aplicação imediata, inclusive em processos em curso, determinando o uso do IPCA como índice de correção monetária e da Taxa Selic, deduzido o IPCA, para os juros moratórios. (N.U 1001595-96.2021.8.11.0002, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, TATIANE COLOMBO, Segunda Câmara de Direito Privado, Julgado em 20/05/2025, Publicado no DJE 20/05/2025). (Destaquei). Diante do exposto, ACOLHO os Embargos de Declaração opostos pela Requerida/Agravante para sanar a omissão apontada, determinando que os critérios de correção monetária e de juros de mora observem as disposições da Lei 14.905/2024, aplicando-se o IPCA como índice de correção monetária e a Taxa Selic para os juros moratórios, com a dedução do IPCA nesta última. No que concerne aos Embargos opostos por Joselia de Moraes Lucidos, verifica-se que a parte elege matéria de convicção desta Câmara para fundamentar suas pretensões, evidenciando que há nítida irresignação em relação ao conteúdo do julgado. A Autora/Embargante alega a ocorrência de omissão e obscuridade no v. acórdão, todavia, no caso dos autos não se constatam tais vícios, haja vista que todos os pontos foram enfrentados de maneira coerente e fundamentada pelo julgado. Dessa forma, como a decisão recorrida foi devidamente fundamentada, conforme estabelece o artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal, a insatisfação da parte Embargante tem a intenção de rediscutir a matéria, o que não se admite, pois resta expressado o convencimento do julgador. Importa consignar que no julgado o tema em discussão foi apreciado, nos seguintes termos: (...). No que tange ao pedido de alteração da base de cálculo dos honorários sucumbenciais, entendo que a sentença comporta reforma nesse ponto. Isso porque fixou os honorários sucumbenciais em 15% sobre o valor do proveito econômico obtido, quando o correto seria sobre o patamar da condenação, ante a ordem de preferência do artigo 85, §2° do Código de Processo Civil. Sobre o assunto: PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. BASE DE CÁLCULO, VALOR DA CAUSA. TEMA N. 1.076 DO STJ. IMPOSSIBILIDADE DE MENSURAÇÃO DO PROVEITO ECONÔMICO. REEXAME DE FATOS E PROVAS. SÚMULA N. 7/STJ. 1. O arbitramento dos honorários advocatícios deve seguir a regra geral estabelecida no art. 85, § 2º, do CPC, de acordo com a ordem de preferência nele estabelecida, a saber: 1º) nas causas em que houver condenação, este é o critério a ser utilizado pelo magistrado, observando o parâmetro legal entre 10% a 20%; 2º) nas causas em que não houver condenação, deve o magistrado arbitrar os honorários de acordo com o proveito econômico aferido; e 3º) não sendo possível mensurar o proveito econômico, sendo ele inestimável ou irrisório, a verba sucumbencial deve ser arbitrada de acordo com o valor da causa. (AgInt no AREsp n. 2 .260.221/SC, relator Ministro João Otávio de Noronha, Quarta Turma, julgado em 12/3/2024, DJe de 14/3/2024.) 2. Apenas se admite arbitramento de honorários por equidade quando, havendo ou não condenação a) o proveito econômico obtido pelo vencedor for inestimável ou irrisório; ou b) o valor da causa for muito baixo, o que não é a hipótese. 3. O reexame de fatos e provas é inadmissível em recurso especial. Incidência da Súmula n. 7/STJ.Agravo interno improvido. (STJ - AgInt nos EDcl no AREsp: 2324746 SC 2023/0078154-1, Relator.: Ministro HUMBERTO MARTINS, Data de Julgamento: 13/05/2024, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 15/05/2024). (Destaquei). Dessa forma, deve ser alterada a base de cálculo dos honorários, para que sejam fixados de acordo com o valor da condenação, nos termos do art. 85, §2º, do Código de Processo Civil. (...) - sic – id. 288979864. Nesse ponto, conforme pontuado no acórdão, é sedimentado na jurisprudência de que nas causas em que houver condenação, como no presente caso, este é o critério a ser utilizado pelo magistrado para a fixação dos honorários advocatícios. Sobre o assunto: APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE RESCISÃO CONTRATUAL – EMBARGOS DE DECLARAÇÃO OPOSTOS À SENTENÇA PELO AUTOR – INTERRUPÇÃO DO PRAZO PARA RECORRER – APLICAÇÃO PARA AMBAS AS PARTES – TEMPESTIVIDADE CONFIGURADA – VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE – NÃO CONSTATAÇÃO – IMPUGNAÇÃO ESPECÍFICA DAS RAZÕES DE DECIDIR – PRELIMINARES REJEITADAS – MÉRITO – RECONVENÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE – LEGALIDADE DAS ARRAS – MATÉRIA AFETA À DEMANDA PRINCIPAL – DANO MORAL NÃO DEMONSTRADO – HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS – PEDIDO DE ALTERAÇÃO DA BASE UTILIZADA PARA O ARBITRAMENTO – INVIABILIDADE – DEVIDA OBSERVÂNCIA AO §2º DO ART. 85 DO CPC – RECURSO NÃO PROVIDO. Os Embargos de Declaração não possuem efeito suspensivo e interrompem o prazo para ambas as partes recorrerem (art. 1.026 do CPC). (...). “A expressiva redação legal impõe concluir que: (a) o § 2º do referido art. 85 veicula a regra geral, de aplicação obrigatória, de que os honorários advocatícios sucumbenciais devem ser fixados no patamar de dez a vinte por cento, subsequentemente calculados sobre o valor: (a.1) da condenação; (a.2) do proveito econômico obtido; ou (a.3) do valor atualizado da causa; (REsp. 1.746.072/PR). (N.U 0024360-34.2016.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, Vice-Presidência, Julgado em 11/09/2024, Publicado no DJE 11/09/2024). (Destaquei). RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL C/C RESTITUIÇÃO DE VALORES E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – PROCEDÊNCIA – PRELIMINAR DE ILEGALIDADE DA APLICAÇÃO DA MULTA POR EMBARGOS PROTELATÓRIOS – ACOLHIMENTO – PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA POR JULGAMENTO EXTRA PETITA – ADEQUAÇÃO AOS LIMITES DO PEDIDO – MÉRITO – ATRASO NA ENTREGA DO IMÓVEL – RESCISÃO POR CULPA DA PROMITENTE VENDEDORA – ALEGAÇÃO DE CASO FORTUITO OU FORÇA MAIOR – PANDEMIA COVID 19 – NECESSIDADE DE PROVA CABAL – INAPLICABILIDADE DA LEI 13.786/2018 – APLICABILIDADE DO ART. 53 DO CDC – DEVOLUÇÃO INTEGRAL E EM PARCELA ÚNICA – SÚMULA 543 STJ – VALOR DAS PARCELAS PAGAS DIVERSO DO ALEGADO NA PETIÇÃO INICIAL – COMPROVAÇÃO – JUROS DE MORA – TERMO INICIAL – CITAÇÃO – DANO MORAL – CONFIGURAÇÃO – INDENIZAÇÃO DEVIDA – COMISSÃO DE CORRETAGEM – NÃO CONHECIMENTO DA MATÉRIA – AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL – HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS – FIXAÇÃO SOBRE O VALOR DA CONDENAÇÃO – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (...). Os honorários sucumbenciais devem ser fixados sobre o valor da condenação e não sobre o valor da causa, esta última somente pode ser aplicada quando não for possível mensurar o proveito econômico obtido ou não houve condenação, nos termos do art. 85, § 2º do CPC/15. (N.U 1011028-87.2022.8.11.0003, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARILSEN ANDRADE ADDARIO, Vice-Presidência, Julgado em 21/02/2024, Publicado no DJE 21/02/2024). (Destaquei). Assim, não vislumbro a existência de contradição, omissão ou obscuridade justificadora deste recurso. Logo, considerando que os embargos declaratórios não prestam para prolatar nova decisão de matérias já dirimidas, sobretudo quando fundamentadas por motivos suficientes para julgar a questão, a rejeição do recurso se revela medida adequada. Nesse sentido: PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÕES INEXISTENTES. REDISCUSSÃO DE MATÉRIA DE MÉRITO. IMPOSSIBILIDADE. 1. A solução correta e integral da controvérsia, com lastro em fundamentos suficientes, não configura omissão. 2. Os Embargos de Declaração não constituem instrumento adequado para a rediscussão da matéria de mérito consubstanciada na decisão recorrida, quando não presentes os vícios de omissão, obscuridade ou contradição, nos termos do art. 1.022 do CPC. 3. Embargos de Declaração rejeitados. (STJ - EDcl no REsp: 1549458 SP 2014/0130168-2, Relator: Ministro HERMAN BENJAMIN, Data de Julgamento: 11/04/2022, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 25/04/2022). Em assim sendo, REJEITO os embargos de declaração manejados pela Autora/Embargante. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 09/07/2025

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Processo nº 0801714-81.2022.8.10.0051

ID: 310320340

Tribunal: TJMA Órgão: 3ª VARA DE PEDREIRAS Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO Nº Processo: 0801714-81.2022.8.10.0051

Data de Disponibilização: 30/06/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

FRANCISCO MARCIO PEREIRA FERREIRA

Sentença (expediente)

Advogados:

PLACIDO ARRAIS DA CRUZ NETO

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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO MARANHÃO NAUJ - NÚCLEO DE APOIO ÀS UNIDADES JUDICIAIS Processo: 0801714-81.2022.8.10.0051 AÇÃO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO (283) Autor: MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO D… PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO MARANHÃO NAUJ - NÚCLEO DE APOIO ÀS UNIDADES JUDICIAIS Processo: 0801714-81.2022.8.10.0051 AÇÃO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO (283) Autor: MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DO MARANHAO Requerido: FRANCISCO MARCIO PEREIRA FERREIRA SENTENÇA O MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL, no uso de suas atribuições constitucionais e legais, ofereceu denúncia em desfavor de FRANCISCO MÁRCIO PEREIRA FERREIRA, qualificado no ID 67514831, pela prática dos crimes capitulados no art. 14 e art. 15, ambos da Lei 10.826/03, além do art.147; art.150, §1º, na forma do art.14, II; do art. 129, § 1º, I e III; do art. 129, §2º, IV; tudo nos termos do art.129, §§9º, 10º e 13º, todos do Código Penal, na forma da Lei 11.340/06, praticado em desfavor de ELZANIR GOMES DA SILVA e do art. 147 do Código Penal e 21 da Lei de Contravenção Penal, praticado em desfavor de MARIA GOMES DA SILVA, na forma da Lei 11.340/06. Segundo a inicial acusatória, no dia 08/12/2021, por volta da 20h30m, no povoado Olho D’Agua, zona rural de Pedreiras/MA, o denunciado, portando uma arma de fogo, de uso permitido, sem autorização, em desacordo com determinação legal ou regulamentar, após tentar invadir o domicílio da primeira vítima, disparou a referida arma, em lugar habitado, via pública, maculou a integridade física da vítima ELZANIR GOMES DA SILVA, quando ameaçando-a, ainda praticou vias de fato e ameaçou a segunda vítima, MARIA GOMES DA SILVA. Informa que a primeira vítima é ex-cunhada do denunciado, sendo a segunda vítima ex-sogra do denunciado. Relata o Parquet que, no dia e local acima mencionados, a primeira vítima e seu companheiro retornavam para a residência comum quando foram surpreendidos pelo denunciado que se encontrava escondido atrás de um cajueiro, na proximidade da casa da primeira vítima. No momento, relatam os autos que o acusado, portando uma arma de fogo calibre 12, disse: “PERDEU, PERDEU, PERDEU”. Narra que a primeira vítima conseguiu socorrer-se dentro de casa, quando o acusado, não satisfeito, continuou seu intento, na tentativa de adentrar na residência, passando a chutar a porta e dizer: “ELZANIR NÃO CORRE, SE NÃO, EU ATIRO”. Afirma que, dentro da residência, a primeira vítima e seu companheiro se jogaram ao chão, segurando a porta, evitando que o denunciado conseguisse entrar. Contudo, não satisfeito, relatam os autos que o denunciado continuava a chutar a porta na tentativa de adentrar sem autorização no referido imóvel. Destaca que, em dado momento, não conseguindo invadir o domicílio da primeira vítima, o denunciado, de posse da espingarda calibre 12, efetuou um disparo na porta da residência, que transpassando atingiu a coxa esquerda da primeira vítima, que estava no interior da residência e, em seguida, mesmo após o disparo e ainda portando a referida espingarda, o denunciado continuou na tentativa de adentrar na casa da vítima. Ressalta que, diante da situação, a segunda vítima, mãe da primeira vítima e ex-sogra do denunciado, se aproximando e chamando sua atenção, foi por ele abordada, quando a "agarrou" pelos braços e disse: “AGORA EU VOU LHE MATAR VELHA SEM VERGONHA”, quando o denunciado colocou o cano da arma no pescoço de MARIA GOMES, dizendo a vítima que chamaria a polícia, todavia, mesmo diante do informe, disse o denunciado não ter medo de polícia, quando deu um soco no tórax da segunda vítima, levando-a ao chão, quando evadiu-se do local. Assim, entendendo presentes os indícios de autoria e materialidade dos crimes narrados, pleiteou o Ministério Público a condenação do acusado nas sanções a eles cominadas. A denúncia foi recebida no dia 24 de maio de 2022 (ID 67631596). No ID 85208533, juntada de laudo de exame de corpo de delito realizado na vítima Elzanir Gomes da Silva. Citado, o acusado apresentou Resposta à acusação, conforme petição de ID 132449142. Realizada audiência de instrução, foram ouvidas as vítimas, testemunhas de acusação bem como interrogado o acusado (ID 139656141). Em alegações finais, o Ministério Público pugnou seja o réu condenado nos termos da denúncia (ID 139988162). A defesa, por seu turno, apresentou alegações finais pleiteando a absolvição do acusado e, em caso de condenação, a fixação da pena no mínimo legal (ID 141077515). Vieram os autos conclusos. É o relatório. Decido. Trata-se, in casu, de ação penal movida pelo Ministério Público em face de FRANCISCO MÁRCIO PEREIRA FERREIRA, em que este é acusado da prática dos crimes capitulados no art. 14 e art. 15, ambos da Lei 10.826/03, além do art.147; art.150, §1º, na forma do art.14, II; do art. 129, § 1º, I e III; do art. 129, §2º, IV; tudo nos termos do art.129, §§9º, 10º e 13º, todos do Código Penal, na forma da Lei 11.340/06, praticado em desfavor de ELZANIR GOMES DA SILVA e do art. 147 do Código Penal e 21 da Lei de Contravenção Penal, praticado em desfavor de MARIA GOMES DA SILVA, na forma da Lei 11.340/06. Inicialmente, verifica-se a ocorrência da prescrição da pretensão punitiva em relação aos crimes de ameaça e contravenção penal de vias de fato imputados ao acusado. Como se sabe, da prática de ilícitos penais nasce para o Estado o direito de punir. No entanto, este direito deve ser exercido dentro de prazos legais determinados, sob pena de, em havendo inércia do Estado, ocorrer a perda de tal direito, caracterizando-se a prescrição. A lei penal prevê duas espécies de prescrição: a prescrição da pretensão punitiva e a prescrição da pretensão executória. A primeira se refere à perda do direito do Estado de formar um título executivo judicial (Prescrição antes do trânsito em julgado). Já a segunda, extingue o direito do estado de executar sua decisão, também em razão do decurso do tempo (Prescrição depois do trânsito em julgado). Importante frisar que a prescrição antes de transitada em julgado a sentença condenatória, regula-se pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime. O artigo 147 do Código Penal normatiza que a pena para o crime em comento é de detenção, de 01 (um) a 06 (seis) meses, ou multa. Já o artigo 21 do Decreto-Lei n.º 3.688/41 normatiza que a pena para a contravenção em comento é de prisão simples, de quinze dias a três meses, ou multa. O art. 119 do Código Penal prevê que, "no caso de concurso de crimes, a extinção da punibilidade incidirá sobre a pena de cada um, isoladamente". Nos termos do art. 109, VI, do Código Penal, a prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, salvo o disposto no § 1o do art. 110 deste Código, regula-se pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime, verificando-se: VI - em 3 (três) anos, se o máximo da pena é inferior a 1 (um) ano. Destarte, considerando que desde a data do recebimento da denúncia (24/05/2022) já se passaram mais de três anos, sem ter havido outra causa interruptiva, a declaração de extinção da punibilidade torna-se absolutamente necessária, por se tratar de disposição cogente. O art. 107, IV, do CP normatiza que “extingue-se a punibilidade: (....) IV – pela prescrição, decadência e perempção”. Ademais, vale ressaltar por oportuno que, na espécie, a extinção da punibilidade, consubstanciada na prescrição, pode também ser declarada de ofício pelo Juiz, por constituir-se matéria de ordem pública, nos termos do artigo 61 do Código de Processo Penal. Nesse sentido, deve ser declarada extinta a punibilidade do acusado em relação aos delitos previstos no art. 47, do CPB e art. 21, da Lei de Contravenções Penais, tendo em vista a ocorrência da prescrição. Resta a análise dos demais delitos imputados ao acusado. Para a condenação do acusado faz-se necessário que exista prova cristalina e conclusiva da materialidade e autoria dos delitos. Assim, passo a verificar esses aspectos. Realizada a instrução processual, verifica-se a oitiva das duas vítimas, quatro testemunhas de acusação e o interrogatório do acusado. A vítima Elzanir Gomes da Silva declarou: “que a depoente estava chegando em casa com o seu esposo e o acusado estava atrás do pé de caju; que quando foram abrir a porta de casa, o acusado saiu gritando, dizendo: 'perdeu, perdeu'; que o acusado disse que queria a irmã da depoente, a filha dela e o esposo dela; que o acusado falou: 'cadê a Jacinta, quero ela e a menina, que vou matar ela, a menina e o esposo dela'; que a depoente e o esposo conseguiram correr para dentro de casa, mas não conseguiu trancar a porta porque a chave ficou para fora; que o esposo da depoente deitou no chão segurando a porta e pediu que deitasse também; que a depoente não conseguiu deitar e o acusado chutava a porta muito forte; que quando o acusado chutou e não conseguiu, ele atirou onde ele estava sentindo onde estavam segurando a porta; que a depoente caiu por cima de seu esposo; que o acusado arrodeava a casa gritando que era de pcc, que se saíssem para fora tinha louco do lado de fora e podia matar eles dois; que ficaram só na porta; que depois a mãe da depoente chegou e só escutou os gritos; que nessa hora a depoente ligou para sua cunhada e para policia; que o policial ficou na linha com a depoente; que a depoente disse ao policial onde tinha levado o tiro; que o acusado ficou agredindo a mãe da depoente do lado de fora e a mãe da depoente gritando; que depois escutaram um tiro fora de casa, onde o acusado matou um cachorro; que o marido da depoente conseguiu abrir a porta, trancar a mãe desta e prestar socorro para a depoente; que o corpo de bombeiros e policia chegou e depois a ambulância; que o acusado saiu e foi a igreja procurar a irmã da depoente; que foram socorridos e o acusado sumiu; que a policia ainda procurou pelo acusado, mas não o encontrou; que quando o fato ocorreu já passava das 21h; que a depoente estava chegando em casa quando o acusado os abordou; que o acusado já estava com a arma na mão; que o marido da depoente estava na porta tentando abrir; que a depoente estava na moto sentada; que quando o marido da depoente destravou a porta, o acusado saiu gritando 'perdeu, perdeu' e viu a arma; que o acusado chutou a porta tentando entrar na casa; que a depoente não deixou o acusado entrar e ele deu um tiro na porta; que a depoente tem certeza que o acusado atirou para pegar nela; que o acusado deu um tiro na porta e outro já subindo o morro, quando atirou no cachorro; que o tiro pegou na coxa esquerda da depoente; que a depoente passou por 3 cirurgias; que a depoente não consegue ainda andar direito; que depois do tiro, o acusado só empurrou mais uma vez a porta e ficou rodeando a casa; que a depoente não ouviu o acusado dizer a sua mãe que iria matá-la; que a mãe da depoente contou isso ao esposo da depoente; que a mãe da depoente disse que o acusado teria machucado ela nas costelas com um soco e ela caiu; que depois disso o acusado passa várias vezes na casa da mãe da depoente; que soube que o acusado disse para outras pessoas que no dia que visse a depoente passando na estrada iria lhe matar; que a depoente já tinha discutido anteriormente com o acusado porque ele agredia sua irmã, usava droga dentro de casa e agredia ela”. A vítima Maria Gomes da Silva relatou: "que o acusado atirou na Elzanir e subiu para o seu lado e lhe agarrou e ficou lhe batendo com a espingarda; que o acusado saiu empurrando a depoente e caiu; que a depoente conseguiu se levantar e saiu pedindo ajuda; que o acusado colocou a arma no pescoço da depoente e depois bateu em sua costela; que a depoente não lembra se o acusado disse que iria lhe matar; que o acusado deu um tiro na porta da casa da Elzanir; que a bala atingiu a perna da Elzanir; que acha que o acusado queria entrar na casa da Elzanir, mas não conseguiu; que isso aconteceu às 21h; que quando Elzanir chegou da igreja, o acusado já estava lá esperando; que a depoente não sabe o que o acusado disse para Elzanir quando ela chegou em casa; que o acusado conviveu 9 anos com a outra filha da depoente". A informante Raimunda Maria do Nascimento narrou: "que é tia do acusado; que a depoente estava em casa deitada quando o vizinho lhe chamou; que a depoente saiu para fora e a policia já estava lá; que a depoente ficou sabendo depois do ocorrido; que disseram a depoente que o acusado tinha entrado na casa da Elzanir e tinha atirado nela; que o acusado foi companheiro da Jacinta; que nessa época o acusado e a Jacinta não estavam mais juntos; que a depoente não viu o tiro; que a depoente nunca viu o acusado com arma; que a depoente não conversou com a Maria Gomes sobre o ocorrido; que a depoente não ouviu o tiro porque mora um pouco distante; que a depoente nunca foi na casa da Elzanir". A testemunha Maria das Graças Meneses Santos informou: "que a depoente estava voltando da igreja com a Maria Gomes; que quando a depoente chegou já estava tendo a confusão; que a depoente viu o acusado ameaçando a vítima Maria Gomes; que a depoente não viu quando o acusado deu soco nela; que viu que o acusado estava com uma arma; que não escutou o tiro; que não ouviu o acusado dizer para Elzanir não correr; que no outro dia soube que a Elzanir levou o tiro; que a Elzanir ficou com sequelas do tiro; que conhece o acusado de vista; que não tinha visto o acusado outras vezes pelo povoado; que o acusado tem uma tia que mora no povoado; que a depoente estava no morro no momento e a Elzanir mora mais embaixo; que quando foram descendo que a depoente viu o acusado com a arma; que não viu o acusado apontando a arma para a Maria Gomes; que estava todo tempo com a Maria Gomes”. A testemunha Jailson Lima Oliveira afirmou: "que o depoente estava na missa e quando chegou em casa, saiu um homem de trás do cajueiro dizendo 'perdeu, perdeu'; que o depoente pensava que era um assalto; que a Elzanir quem lhe disse de quem se tratava; que entraram em casa; que o depoente se jogou na porta para segurar a porta; que o depoente disse a Elzanir que se jogasse no chão também; que o acusado chutou a porta várias vezes; que o acusado disparou um tiro; que o tiro pegou na Elzanir, na perna; que o depoente ficou segurando a porta; que com o tiro, a mãe da Elzanir gritando, o acusado foi para onde ela; que depois o acusado continuou batendo na porta; que o acusado saiu e deu uns tiros lá por cima e depois chegou ambulância, polícia; que o acusado é companheiro da Elzanir; que vinha com ela da missa; que o acusado já estava com a arma na mão apontada para a direção deles; que o acusado ficou tentando entrar na casa; que enquanto o acusado forçava a entrada, ele atirou na porta; que o tiro pegou na Elzanir, na coxa; que o acusado disse para Elzanir não correr senão ele atiraria; que em razão do tiro a Elzanir ficou impossibilitada de caminhar corretamente; que o depoente não viu o que o acusado fez com a Maria Gomes; que a vítima Maria Gomes relatou que o acusado segurou ela pelos braços e colocou a arma no pescoço dela; que a vítima Maria Gomes também contou que o acusado disse que iria mata-la e que ele teria dado um soco nas costelas dela; que após o fato, o depoente ouviu dizer que o acusado teria falado que ainda não tinha terminado, que ele iria matar”. A testemunha Giselda Ferreira contou: "que ligaram para a depoente depois do acontecido e foi ajudar a vítima; que a depoente é irmã da vítima Maria Gomes; que a depoente não estava na casa da Elzanir quando isso aconteceu; que contaram à depoente que o acusado teria batido em sua irmã, ela tinha caído no chão e atirado na Elzanir; que a Maria lhe contou que o acusado colocou a arma no pescoço dela e lhe deu um soco na costela; que também soube que o acusado ameaçou a Maria Gomes de morte; que os vizinhos também lhe contaram que o acusado disse que a Elzanir não corresse se não lhe atiraria; que soube também que o acusado tentou entrar na casa da Elzanir e deu um tiro na porta; que a confusão é por causa da separação com a Jacinta; que sabia que o acusado não era um bom marido e judiava dela e a irmã a defendia; que soube de outras pessoas que o acusado mandava recado ameaçando após o fato”. O Réu, por seu turno, ao ser interrogado, disse: "que no dia do fato, o interrogado foi no povoado tentar conversar com a Jacinta; que quando o interrogado chegou no povoado, foi abordado por Elzanir e o esposo dela; que o esposo da Elzanir entrou em casa e disse que ia pegar uma arma; que o interrogado estava com uma arma e deu um tiro em direção a porta para amedrontar ele; que o interrogado tem parentes no povoado; que no dia dos fatos, o interrogado estava no povoado pra falar com a Jacinta sobre a filha; que a casa da Elzanir é na beira da estrada; que o interrogado atirou na direção da porta; que o interrogado não tinha intenção de invadir o imóvel; que quando o interrogado chegou, já foi recebido com agressão; que se o interrogado quisesse, tinha conseguido entrar na casa; que não tinha intenção de matar ninguém nesse dia, que só queria tentar acordo com a Jacinta; que só tinha um cartucho na arma; que a ama é caseira, de só um tiro; que a Maria Gomes tentou lhe agredir; que só colocou a mão nela, afastando-a e saiu; que ela pode ter caído, mas não empurrou ela para cair; que não tem rancor da família da Jacinta; que não ameaçou a família da Jacinta; que não tem contato deles". Pois bem. Quanto a imputação do crime previsto no art. 14, da Lei n.º 10.826/2003, do cotejo das provas colhidas, tem-se que tanto a materialidade quanto a autoria restaram categoricamente evidenciadas, diante dos depoimentos colhidos em Juízo e confissão do próprio acusado. Ambas as vítimas ouvidas confirmaram que o acusado portava uma arma de fogo no dia dos fatos, o que foi ratificado pelos depoimentos das testemunhas Maria das Graças e Jailson. Além disso, o próprio acusado informou que portava o artefato quando esteve no povoado. Importante destacar que o delito em apreço é classificado como de mera conduta e de perigo abstrato, configurando-se tão somente pela realização da ação descrita no tipo penal. Nesse sentido é a jurisprudência: PROCESSO PENAL APELAÇÃO CRIMINAL - PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO DESMUNICIADA - CONDUTA TÍPICA - CRIME DE MERA CONDUTA E DE PERIGO ABSTRATO -OCORRÊNCIA DA CONSUMAÇÃO COM A SIMPLES PRÁTICA DA CONDUTA DESCRITA NO TIPO LEGAL - CONDENAÇÃO QUE SE IMPÕE - REFORMA DA SENTENÇA - RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO 1. O porte ilegal de arma de uso permitido desmuniciada é crime de perigo abstrato. Vislumbra-se conduta perigosa para a segurança pública. 2. O fato da arma de fogo de uso permitido apreendida em poder do Apelado não estar municiada não afasta a figura típica do art. 14 da Lei nº 10.826/2003, sendo irrelevante o desmuniciamento. 3. Recurso de Apelação conhecido e provido. (TJ-AM - Apelacao : APL 20110063178 AM 2011.006317-8 ÓRGÃO Julgador: Primeira Câmara Criminal Julgamento: 10/12/2012 Relator: Des. João mauro Bessa). APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA A INCOLUMIDADE PÚBLICA. PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO (ART. 14, CAPUT, DA LEI N. 10.826/03). SENTENÇA ABSOLUTÓRIA. RECURSO MINISTERIAL. PLEITO VISANDO A CONDENAÇÃO. ALEGAÇÃO DE QUE A ARMA DE FOGO DESMUNICIADA NÃO CONFIGURA ATIPICIDADE DA CONDUTA. ACOLHIMENTO. CRIME DE MERA CONDUTA E DE PERIGO ABSTRATO. OCORRÊNCIA DA CONSUMAÇÃO COM A SIMPLES PRÁTICA DA CONDUTA DESCRITA NO TIPO PENAL. CONDENAÇÃO QUE SE IMPÕE. APLICAÇÃO DA DOSIMETRIA. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO PROVIDO. O porte ilegal de arma de fogo (Lei n. 10.826/2003, art. 14) se trata de crime de mera conduta, ou seja, prescinde da comprovação de efetivo prejuízo à vítima para sua configuração. Também, é de perigo abstrato, cujo risco inerente à conduta é presumido pelo tipo penal, bastando o porte ilegal da arma, sem permissão e em desacordo com a lei, para que o cometimento do crime esteja estampado no ato praticado (Apelação Criminal n. , de Itajaí, rela. Desa. Salete Silva Sommariva, Segunda Câmara Criminal, j. 30-6-2009). (TJ-SC - Apelação Criminal : APR 20120078581 SC 2012.007858-1 – órgão julgador: 1ª Câmara Criminal – Julgamento: 03/09/2012 – Relator: Marli Mosimann Vargas). Desse modo, a vista da comprovação material do fato e de sua autoria, bem como a par da atestada potencialidade lesiva da arma de fogo, dúvidas não pairam sobre sua responsabilidade criminal, encontrando-se incurso nas penas do art. 14, da Lei nº 10.826/2003. No que tange ao delito previsto no art. 15, da Lei n.º 10.826/2003, encontra-se normatizado da seguinte forma: “Art. 15. Disparar arma de fogo ou acionar munição em lugar habitado ou em suas adjacências, em via pública ou em direção a ela, desde que essa conduta não tenha como finalidade a prática de outro crime: Pena – reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa”. O tipo penal em análise traz a figura delitiva do disparo de arma de fogo. Para a configuração desse delito, basta o agente acionar arma de fogo em lugar habitado, já que se trata de delito de mera conduta e de perigo abstrato, no qual o bem jurídico protegido é a incolumidade pública, não se perquirindo qual a intenção - dolo - do agente[1]. Restou evidenciado pelas provas testemunhais que o denunciado de fato disparou arma de fogo em lugar habitado, uma vez que o fez em local de acesso ao povoado em que reside a vítima. Assim, não restam dúvidas de que a materialidade delitiva está devidamente comprovada. Quanto à alegação do patrono do réu de que deve ser aplicado o princípio da consunção, não merece acolhimento, pois o porte ilegal de arma de fogo precedeu à prática do disparo. Conforme se depreende da dinâmica dos fatos, de acordo com os depoimentos das vítimas e testemunhas, o acusado surpreendeu a vítima, já armado, quando esta chegava à sua residência, caracterizando aí o porte ilegal de arma de fogo. Consta, ainda, que após efetuar um disparo na porta da residência da vítima, o acusado, enquanto saía do povoado, no morro de acesso ao mesmo, efetuou outro disparo de arma de fogo. Assim, tem-se que o crime de porte de arma de fogo ocorreu em situação diversa e anterior ao momento do disparo, resultando em contextos distintos e desígnios autônomos, impossibilitando o reconhecimento do mencionado princípio. Nesse sentido, é o entendimento jurisprudencial: APELAÇÃO CRIMINAL – PORTE ILEGAL DE ARMAMENTO E DISPARO DE ARMA DE FOGO – APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO – INVIABILIDADE – DESÍGNIOS AUTÔNOMOS – INAPLICABILIDADE DE ANPP – FALTA DE INTERESSE RECURSAL QUANTO AOS PEDIDOS SUBSIDIÁRIOS – PRETENSÕES ALCANÇADAS EM PRIMEIRO GRAU – RECURSO DESPROVIDO, EM CONSONÂNCIA COM O PARECER MINISTERIAL. “Incabível o pleito de absorção do crime de porte ilegal de arma pelo de disparo de arma de fogo (princípio da consunção), notadamente diante dos contextos fáticos distintos a evidenciar ocorrência de designíos autônomos, pois o porte ilegal da arma antecedeu à prática do disparo.” (TJMT, Ap. nº 0001908-16 .2019.8.11.0044) “Ainda que o art . 28-A, § 14.º, do Código de Processo Penal preveja a possibilidade de o réu pleitear a remessa dos autos ao órgão superior do Ministério Público, na hipótese de recusa da acusação em ofertar o acordo de não persecução penal, se verificada a manifesta inadmissibilidade do benefício, pode o magistrado indeferir o pedido, determinando o prosseguimento da instrução criminal, sem que isso configure nulidade processual (...).” (TJMT, Ap. 1018847-75.2022 .8.11.0003) (TJ-MT - APELAÇÃO CRIMINAL: 1002109-65.2022 .8.11.0050, Relator.: ORLANDO DE ALMEIDA PERRI, Data de Julgamento: 07/05/2024, Primeira Câmara Criminal, Data de Publicação: 10/05/2024) APELAÇÃO CRIME – CRIMES DE PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO E DISPARO DE ARMA DE FOGO (ARTS. 14 E 15, AMBOS DA LEI Nº 10.826/03)– PROCEDÊNCIA.APELO DA DEFESA – 1 . PLEITO PELA ABSOLVIÇÃO DO RÉU POR INSUFICIÊNCIA DE PROVAS QUANTO AO DELITO DE DISPARO DE ARMA DE FOGO – NÃO ACOLHIMENTO – DEPOIMENTOS DOS POLICIAIS MILITARES E DEMAIS TESTEMUNHAS – VALIDADE E RELEVÂNCIA – CONDENAÇÃO FUNDAMENTADA NO DEPOIMENTO DE POLICIAIS – MEIO DE PROVA IDÔNEO - 2. PRESCINDIBILIDADE DA APREENSÃO DA ARMA OU DA EXISTÊNCIA DE LAUDO PERICIAL – COMPROVAÇÃO DO DELITO POR OUTROS MEIOS – ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL – CONJUNTO PROBATÓRIO APTO A ENSEJAR O DECRETO CONDENATÓRIO – MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS – 3. PLEITO PELA APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO ENTRE O DELITO DE PORTE E DISPARO DE ARMA DE FOGO – NÃO CABIMENTO – DELITOS AUTÔNOMOS – RECURSO DESPROVIDO. 1 . Havendo provas e elementos que atestam a prática do delito de disparo de arma de fogo, não há como acolher o pedido de absolvição. "(...) 3. Segundo a jurisprudência consolidada desta Corte, o depoimento dos policiais prestado em Juízo constitui meio de prova idôneo a resultar na condenação do réu, notadamente quando ausente qualquer dúvida sobre a imparcialidade dos agentes, cabendo à defesa o ônus de demonstrar a imprestabilidade da prova, o que não ocorreu no presente caso. Precedentes. ( AgRg no HC 759 .876/MT, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 16/8/2022, DJe de 22/8/2022.) (...).”. (STJ – AgRg no AREsp 2129808 / SP, Rel. Min . REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julg. 06/12/2022). 2. Segundo jurisprudência dominante, para a caracterização do delito previsto no artigo 15 da Lei nº 10 .826/03, é prescindível a apreensão da arma de fogo, ou mesmo a existência de laudo pericial, quando outros elementos presentes nos autos confirmam, de modo firme e seguro, a presença de arma e os disparos efetuados. 3. Não tendo os fatos sido praticados no mesmo contexto, inviável e aplicação do princípio da consunção aos crimes de porte ilegal e disparo de arma de fogo. (TJPR - 2ª Câmara Criminal - 0001632-86 .2014.8.16.0119 - Nova Esperança - Rel .: DESEMBARGADOR LUIS CARLOS XAVIER - J. 02.05.2023) (TJ-PR - APL: 00016328620148160119 Nova Esperança 0001632-86 .2014.8.16.0119 (Acórdão), Relator.: Luis Carlos Xavier, Data de Julgamento: 02/05/2023, 2ª Câmara Criminal, Data de Publicação: 03/05/2023) No caso do delito de invasão de domicílio, destaco que o crime configura-se quando o indivíduo entra ou permanece, clandestina ou astuciosamente, ou contra a vontade expressa ou tácita de quem de direito, em casa alheia ou em suas dependências. (CP, art. 150), in verbis: Art. 150 - Entrar ou permanecer, clandestina ou astuciosamente, ou contra a vontade expressa ou tácita de quem de direito, em casa alheia ou em suas dependências: Pena - detenção, de um a três meses, ou multa. Pena - detenção, de seis meses a dois anos, além da pena correspondente à violência. § 1º - Se o crime é cometido durante a noite, ou em lugar ermo, ou com o emprego de violência ou de arma, ou por duas ou mais pessoas: Pena - detenção, de seis meses a dois anos, além da pena correspondente à violência. A Constituição Federal, em seu art. 5°, XI, de modo específico, garante a inviolabilidade do domicílio, salvo se houver consentimento do morador, flagrante delito, desastre ou necessidade de prestar socorro, ou ainda, durante o dia, por determinação judicial. Trata-se de crime que tem por elemento subjetivo o dolo, não tendo a previsão da forma culposa e, como há a expressão “contra a vontade de quem de direito”, também não se admite que esse tipo penal seja praticado através de dolo eventual, pois não se pode assumir o risco de estar ingressando no lar alheio contra a vontade do morador, pois quem ingressa sabe que não pode fazê-lo, ou tem dúvida, o que já é suficiente para a afastar o dolo. É dizer ainda que deve-se conceituar o elemento casa para se entender melhor o tipo penal. Os §§ 4° e 5° do art. 150 em comento elucidam esse aspecto quando especificam que casa é qualquer lugar onde alguém habite, que, em regra, não é um local público. Com amparo nessas assertivas, tenho que a prática do crime imputado na denúncia foi devidamente comprovado, eis que os elementos de informação colhidos e as provas produzidas, sob contraditório judicial, são firmes no sentido de que o acusado tentou adentrar na casa da vítima, sem a sua permissão ou de outra pessoa, conforme o tipo penal. Observa-se que tanto a vítima Elzenir quanto a testemunha Jailson relataram que o acusado chutou a porta de entrada da residência diversas vezes, somente não alcançando seu intento em razão do Jailson ter segurado a porta. Dessa forma, verifico haver elementos suficientes para embasar um decreto condenatório em desfavor do réu pelo crime de invasão de domicílio com emprego de arma, na modalidade tentada. Por fim, tem-se a imputação ao acusado do crime de lesão corporal. A materialidade delitiva encontra-se devidamente comprovada por meio dos exames de corpo de delito acostados aos autos, por meio do qual se verifica a constatação de lesões na vítima no dia dos fatos. No que se refere à autoria, entendo que também suficientemente demonstrada, tendo a palavra da vítima sido corroborada pelos demais depoimentos testemunhais. O acusado negou ter disparado a arma de fogo com intuito de lesionar a vítima. Segundo ele, queria apenas amedrontar esta e o seu esposo, que ameaçou pegar uma arma de fogo. No entanto, a autodefesa do réu não encontra-se comprovada por nenhum outro elemento probatório. Não consta nos autos nenhuma evidencia de que a vítima Elzanir e seu esposo mencionaram possuir arma de fogo. Além disso, restou demonstrado que o acusado, antes que a vítima entrasse em sua residência, disse à mesma que não corresse senão atiraria, denotando-se, assim, o intento do acusado em lesionar a vítima. Sabe-se que nos delitos perpetrados sob a égide da Lei Maria da Penha, a palavra da vítima sempre foi reputada de grande relevância, mas desde que se apresente de forma lógica e coerente. E, no presente caso, entendo que encontra-se em harmonia com os demais elementos presentes nos autos, como as provas colhidas em sede inquisitorial e judicial. Nesse sentido, é o entendimento jurisprudencial: EMENTA: APELAÇÃO CRIMINAL - LESÃO CORPORAL EM ÂMBITO DOMÉSTICO - ABSOLVIÇÃO - IMPOSSIBILIDADE - AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS - DEPOIMENTO DOS POLICIAIS - VALIDADE. Comprovada a autoria e a materialidade, sobretudo pelo depoimento da vítima e dos militares que atenderam a ocorrência, de rigor a manutenção da condenação do acusado pela infração a que denunciado. Os depoimentos dos policiais gozam de presunção de veracidade, sobretudo quando corroborados pelos demais documentos trazidos aos autos, não sendo sua condição funcional, por si só, elemento suficiente pra afastar a validade de suas declarações. (TJ-MG - APR: 10621200002619001 São Gotardo, Relator: Maria das Graças Rocha Santos, Data de Julgamento: 26/10/2022, Câmaras Especializadas Crimina / 9ª Câmara Criminal Especializa, Data de Publicação: 28/10/2022) Violência doméstica. Lesão corporal. Provas. 1 - Nos crimes cometidos em situação de violência doméstica e familiar, a palavra da vítima tem especial relevância, sobretudo quando corroborada pelas demais provas dos autos - laudo de exame de corpo de delito e depoimentos de testemunha que presenciou os fatos e policial militar que atendeu a ocorrência. 2 - Se não há dúvidas de que o réu agrediu a vítima e da agressão resultou lesão corporal, pequenas divergências quanto à dinâmica dos fatos não são capazes de enfraquecer o depoimento da vítima e eximir o réu da responsabilidade penal. 3 - Apelação não provida. (TJ-DF 00003925420178070007 DF 0000392-54.2017.8.07.0007, Relator: JAIR SOARES, Data de Julgamento: 04/06/2020, 2ª Turma Criminal, Data de Publicação: Publicado no PJe : 23/06/2020 . Pág.: Sem Página Cadastrada.). Portanto, não resta dúvida que a vítima sofreu lesão corporal, constatada pelo exame de corpo de delito, provocada pelo acusado. Frisa-se, ainda, a existência do dolo na ação do acusado, que é o elemento subjetivo da conduta, in casu, a vontade livre e consciente de lesionar a vítima (animus laedendi). Logo, inconteste a autoria, a materialidade delitiva e o elemento subjetivo, da conduta, incorrendo o réu na conduta do art. 129, § 1º, I, §§ 9º e 10º, do CPB, cumulada com Lei n° 11.340/2006. Isto porque, conforme exame de corpo de delito, o referido delito teve como consequência apenas a incapacidade para as ocupações habituais, por mais de trinta dias, não sendo possível determinar se houve debilidade ou incapacidade permanente. Outrossim, depreende-se dos autos que os fatos envolvem violência doméstica, uma vez que o acusado foi casado com a irmã da vítima por longo período, prevalecendo-se aquele das relações domésticas existente entre os mesmos, devendo incidir, ainda, a causa de aumento de pena prevista no § 10, do art. 129, do CPB. No mais, inaplicável os benefícios da Lei nº 9099/95, em face da vedação expressa da Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006) no art. 41. Verificando que o crime de lesão corporal foi praticado em data anterior a vigência da Lei n.º 14.994/2024, aplica-se ao caso a pena vigente à época dos fatos, em observância ao princípio da retroatividade benéfica, consagrado no art. 5º, XL, da CF. Presente a agravante prevista no art. 61, II, “f”, do CPB, ressaltando que não se trata de bis in idem a sua incidência ao presente caso, nos termos do Tema Repetitivo 1197 do STJ. Reconheço a atenuante da confissão espontânea em relação ao delito de porte de arma de fogo. Diante do exposto, em face das razões apontadas, e pelo que dos autos consta, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE A DENÚNCIA para CONDENAR o acusado FRANCISCO MÁRCIO PEREIRA FERREIRA, nas penas do art. 14 e art. 15, ambos da Lei 10.826/03; art.150, §1º, na forma do art.14, II; art. 129, § 1º, I, nos termos do art.129, §§9º, 10º, do Código Penal, na forma da Lei 11.340/06. Por fim, nos termos do art. 107, inc. IV c/c art. 109, inciso VI, ambos do Código Penal Brasileiro, DECLARO EXTINTA A PUNIBILIDADE DE FRANCISCO MÁRCIO PEREIRA FERREIRA, em razão da prescrição da pretensão punitiva por parte do Estado em relação ao delito tipificado no art. 147, do CPB e art. 21, da Lei de Contravenções Penais. Passo, assim, a dosar a pena a ser-lhe aplicada, nos termos do art. 68, do CPB. DOSIMETRIA DA PENA - DO CRIME DO ART. 14, DA LEI N.º 10.826/2003 Analisadas as diretrizes do art. 59, do Código Penal, denoto que o réu agiu com culpabilidade normal à espécie, nada tendo a valorar; No tocante aos antecedentes, verifica-se que o réu não possui condenação por crime anterior; não há elementos que desabonem a conduta social do condenado no seio social, ambiente familiar ou no trabalho; Não houve exame psicológico para se averiguar a personalidade do agente pelo que deve ser considerada neutra; o motivo do delito, não restou esclarecido; as circunstâncias se encontram narradas nos autos, nada tendo a se valorar; a conduta não teve maiores consequências, sendo que não se pode cogitar sobre comportamento da vítima. À vista dessas circunstâncias analisadas individualmente é que fixo a pena-base privativa de liberdade no mínimo legal em 02 (dois) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa. Na segunda fase da dosimetria da pena, deixo de aplicar qualquer circunstância agravante, pois inexiste no caso. Presente a atenuante da confissão espontânea, razão pela qual diminuo a pena base à fração de 1/6. Contudo, como da redução resulta pena privativa inferior ao mínimo legal, o que é inadmissível nessa fase, nos termos da súmula 231 do STJ, mantenho a pena de 02 (dois) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa. Por fim, na terceira fase, não percebo a presença de quaisquer causas de aumento ou diminuição de pena, seja da parte geral ou especial. ASSIM, FIXO EM TERCEIRA FASE A PENA EM 02 (DOIS) ANOS DE RECLUSÃO E 10 (DEZ) DIAS-MULTA. - DO CRIME DO ART. 15, DA LEI N.º 10.826/2003 Analisadas as diretrizes do art. 59, do Código Penal, denoto que a culpabilidade é normal à espécie, nada tendo a valorar; No tocante aos antecedentes, verifica-se que o réu não possui condenação por crime anterior; não há elementos que desabonem a conduta social do condenado no seio social, ambiente familiar ou no trabalho; Não houve exame psicológico para se averiguar a personalidade do agente pelo que deve ser considerada neutra; os motivos que levaram o agente a cometer o crime e as circunstâncias do mesmo não pesam em desfavor do réu; as consequências do crime não foram demasiadamente maléficas, não havendo grande extensão ou repercussão social; no caso, não houve vítima. À vista dessas circunstâncias analisadas individualmente é que fixo a pena-base privativa de liberdade em 02 (dois) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa. Na segunda fase da dosimetria, verifico que inexistem atenuantes e agravantes. Por fim, em terceira fase, não percebo a presença de quaisquer causas de aumento e/ou diminuição de pena. ASSIM, FIXO EM TERCEIRA FASE A PENA EM 02 (DOIS) ANOS DE RECLUSÃO E 10 (DEZ) DIAS-MULTA. - DO CRIME DO ART. 150, § 1º, DO CPB Pela análise das circunstâncias judiciais do art. 59 do CP, constata-se: Culpabilidade Considerando que o acusado não extrapolou o dolo do delito, nada tenho a valorar; antecedentes não possui condenação por crime anterior; conduta social e personalidade não existem dados pejorativos; os motivos, as circunstâncias e as consequências do delito são neutros; comportamento da vítima: não lhe é aproveitável. À vista dessas circunstâncias analisadas individualmente é que fixo a pena-base privativa de liberdade em 06 (seis) meses de detenção. Na segunda fase da dosimetria, deixo de aplicar qualquer circunstância atenuante pois inexiste no caso. Presente a agravante prevista no art. 61, inciso II, alínea “f”, do Código Penal (Tema Repetitivo 1197), razão pela qual elevo a pena base a fração de 1/6. Portanto, fixo, em segunda fase, a pena em 07 (sete) meses de detenção. Por fim, na terceira fase, inexistem causas de aumento, seja da parte especial ou geral. Presente a causa de diminuição de pena prevista no art. 14, II, do CPB. Assim, reduzo a pena em 2/3 e, FIXO-A EM TERCEIRA FASE EM DETENÇÃO DE 02 (DOIS) MESES E 10 (DEZ) DIAS. - DO CRIME DO ART. 129, § 1º, I, DO CPB Pela análise das circunstâncias judiciais do art. 59 do CP, constata-se que o grau de culpabilidade é normal à espécie, nada havendo a valorar. No tocante aos antecedentes, verifica-se que o réu não possui condenação por crime anterior. No que respeita à conduta social, nada fora colhido nos autos, pelo que deve ser considerada neutra. Em relação à personalidade, inexistem elementos suficientes para avaliá-la. Quanto aos motivos, nada a considerar. No que se refere às circunstâncias, nada a considerar. As consequências não são desfavoráveis, posto que não foram além da consumação. Por fim, inexistiu participação da vítima para o cometimento do ilícito. Desse modo, fixo a pena-base em 01 (um) ano de reclusão. Na segunda fase da dosimetria, deixo de aplicar qualquer circunstância atenuante, pois inexiste no caso. Presente a agravante prevista no art. 61, inciso II, alínea “f”, do Código Penal (Tema Repetitivo 1197), razão pela qual elevo a pena base a fração de 1/6. Portanto, fixo, em segunda fase, a pena em 01 (um) ano e 02 (dois) meses de reclusão. Por fim, na terceira fase, inexistem causas de diminuição de pena, seja da parte especial ou geral. Presente a causa de aumento de pena prevista no art. 129, § 10, do CPB, pelo que elevo a pena a fração de 1/3. Assim, FIXO A PENA EM TERCEIRA FASE EM RECLUSÃO DE 01 (UM) ANO, 06 (SEIS) MESES E 20 (VINTE) DIAS. - DO SOMATÓRIO Considerando o concurso de crimes, reconheço o concurso material do art. 69 do Código Penal e somo as penas fixadas, TORNANDO-A EM DEFINITIVO EM 05 (CINCO) ANOS, 06 (SEIS) MESES E 20 (VINTE) DIAS DE RECLUSAO E 20 (VINTE) DIAS MULTA E 02 (DOIS) MESES E 10 (DEZ) DIAS DE DETENÇAO, a ser cumprida em regime inicialmente semiaberto, nos termos do art. 33, § 2º, “b”, do CP. Deixo de substituir a pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, ante a vedação do art. 17 da lei 11.340/2006 e Súmula 588 do STJ, bem como por não satisfazer o requisito previsto no art. 44, I, do CPB. Igualmente, deixo de conceder a suspensão condicional da pena, haja vista que a pena definitiva excede a 02 (dois) anos, não preenchendo o requisito previsto no art. 77, caput, do CPB. O dia-multa deverá ser calculado na base de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo do fato, em atenção à situação econômica do réu, devendo ser recolhida nos termos previstos no artigo 50 do Código Penal, sob pena de, por inadimplemento, ser considerada dívida de valor. Concedo ao acusado o direito de recorrer em liberdade, ante a ausência dos requisitos da prisão preventiva (art. 312 do código de processo penal). Transitada em julgado, providencie a secretaria judicial: a) oficiar a justiça eleitoral, para suspensão dos direitos políticos (art. 15, III, da Constituição Federal); b) lançar o nome do réu no rol dos culpados; c) preencher e remeter o boletim individual à secretaria de segurança pública; d) forme-se a guia de execução definitiva no SEEU (arts. 105/106 da LEP), inclusive com oportuna abertura de vista ao Ministério Público nos referidos autos. Sem custas, diante da condição econômica do réu. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Cumpra-se. SERVE A PRESENTE SENTENÇA COMO MANDADO. Pedreiras/MA, data do sistema. PEDRO HENRIQUE HOLANDA PASCOAL Juiz de Direito Auxiliar NAUJ – Núcleo de Apoio às Unidades Judiciais (Portaria nº 3730/2024-CGJ)

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Processo nº 5610426-17.2021.8.09.0149

ID: 309137630

Tribunal: TJGO Órgão: 3ª Câmara Criminal Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO Nº Processo: 5610426-17.2021.8.09.0149

Data de Disponibilização: 27/06/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

JOAO PAULO SOUZA DA SILVA

Ementa

Advogados:

ARLEN LUIS BATISTA SILVA

OAB/GO XXXXXX Desbloquear

Ementa: DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. INVASÃO DOMICILIAR. NULIDADE DAS PROVAS AFASTADA. ABSOLVIÇÃO POR INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. APLICAÇÃO DO T… Ementa: DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. INVASÃO DOMICILIAR. NULIDADE DAS PROVAS AFASTADA. ABSOLVIÇÃO POR INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. APLICAÇÃO DO TRÁFICO PRIVILEGIADO. REDUÇÃO DE PENA. SUBSTITUIÇÃO POR RESTRITIVAS DE DIREITOS. PROVIMENTO PARCIAL.I. CASO EM EXAME1. Apelações criminais interpostas por João Paulo Souza da Silva, Júlia Rodrigues Lima e Juliana Rodrigues Lima contra sentença condenatória que os absolveu da imputação do art. 35 da Lei nº 11.343/06 e os condenou pelo crime de tráfico de drogas (art. 33, caput, c/c art. 40, VI, da mesma lei). João Paulo foi condenado à pena de 6 anos, 9 meses e 20 dias de reclusão, em regime semiaberto, e as rés Júlia e Juliana à pena de 5 anos, 8 meses e 10 dias de reclusão, também em regime semiaberto. Os recorrentes alegaram nulidade por suposta invasão domiciliar, pleitearam absolvição por ausência de provas e, subsidiariamente, desclassificação da conduta, reconhecimento de tráfico privilegiado e aplicação da confissão como atenuante.II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO2. Há três questões em discussão: (i) analisar se é nula a prova decorrente do ingresso policial no domicílio dos réus sem mandado judicial; (ii) verificar se há prova suficiente para a condenação das rés Júlia e Juliana Rodrigues Lima; (iii) apurar se João Paulo Souza da Silva faz jus à redução da pena pela incidência do tráfico privilegiado e à substituição da pena privativa de liberdade.III. RAZÕES DE DECIDIR3. O ingresso dos policiais na residência dos apelantes é válido, pois amparado em fundadas razões derivadas de denúncia anônima, vigilância prévia, comportamento suspeito e flagrante delito, conforme prevê a exceção constitucional à inviolabilidade do domicílio (CF/1988, art. 5º, XI).4. A abordagem dos policiais, relatada de forma coesa e corroborada por demais elementos de prova, justifica a regularidade das diligências, não havendo vício que invalide as provas obtidas.5. A absolvição das rés Júlia e Juliana Rodrigues Lima se impõe por insuficiência de provas, pois não foram encontradas drogas em sua posse, não houve testemunho direto de sua participação no tráfico e o fato de estarem no local não é suficiente para a condenação.6. A condenação de João Paulo Souza da Silva encontra-se amparada em provas robustas, incluindo flagrante com grande quantidade de drogas.7. A sentença deixou de aplicar indevidamente a causa de diminuição prevista no art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/06, com fundamento em ações penais em curso, em afronta ao entendimento firmado no Tema Repetitivo 1139 do STJ, devendo ser reconhecido o tráfico privilegiado.8. A pena de João Paulo deve ser reduzida em 2/3, com consequente fixação de regime aberto e substituição por duas penas restritivas de direitos, por preenchimento dos requisitos do art. 44 do Código Penal.IV. DISPOSITIVO E TESE9. Recursos parcialmente providos.Tese de julgamento:É válida a prova obtida por ingresso domiciliar quando amparada em fundadas razões, denúncia anônima, diligência prévia e flagrante delito, conforme o art. 5º, XI, da CF/1988.A absolvição por insuficiência de provas impõe-se quando inexistem elementos seguros e inequívocos de autoria delitiva, especialmente em delitos que exigem dolo específico.A existência de inquéritos ou ações penais em curso não obsta a aplicação da causa de diminuição de pena prevista no art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/06.Preenchidos os requisitos do art. 44 do Código Penal, a pena privativa de liberdade pode ser substituída por restritivas de direitos, mesmo nos crimes de tráfico privilegiado.Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, XI; CPP, arts. 386, VII; CP, arts. 33, § 2º, c, § 3º, e 44; Lei nº 11.343/06, arts. 33, caput, § 4º, e 40, VI.Jurisprudência relevante citada: STJ, AgRg nos EDcl no HC n. 773.027/SP, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, 5ª Turma, j. 01/12/2022, DJe 01/12/2022; STJ, AgRg no REsp n. 2.085.474/PR, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, 6ª Turma, j. 18/12/2023, DJe 20/12/2023; TJGO, ApC 0104450-36.2017.8.09.0110, Rel. Des. Itaney Francisco Campos, j. 14/11/2023; TJGO, ApC 5104925-47.2021.8.09.0018, Rel. Des. Adegmar José Ferreira, j. 31/01/2023; STJ, AgRg nos EDcl no RHC 123.884/MG, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, 5ª Turma, j. 12/05/2020. PODER JUDICIÁRIO Tribunal de Justiça do Estado de Goiás Gabinete Desembargador Roberto Horácio Rezende 3ª Câmara Criminal APELAÇÃO CRIMINAL Nº 5610426-17.2021.8.09.0149 COMARCA DE PALMEIRAS DE GOIÁS1ºAPELANTE: JOÃO PAULO SOUZA DA SILVA2º APELANTE: JÚLIA RODRIGUES LIMA3º APELANTE: JULIANA RODRIGUE LIMAAPELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁSRELATOR: Dr. GILMAR LUIZ COELHO – Juiz Substituto em Segundo Grau VOTO Conforme relatado, trata-se de recursos de Apelação Criminal interpostos por JOÃO PAULO SOUZA DA SILVA, nascido em 29/10/1996, respondendo ao processo em liberdade, JÚLIA RODRIGUES LIMA, nascida em 24/04/1997, respondendo ao processo em liberdade, e JULIANA RODRIGUES LIMA, nascida em 22/06/1998, respondendo ao processo em liberdade, contra a sentença condenatória proferida no Juízo da Vara Criminal da Comarca de Palmeiras de Goiás, pela MM. Juíza de Direito, Dra. Isabella Luiza Alonso Bittencourt, que absolveu os processados da imputação prevista pelo art. 35, da Lei nº 11.343/06, e os condenou pela prática do art. 33, caput, c/c art. 40, inciso VI, da Lei nº 11.343/06, fixada, a JOÃO PAULO SOUZA DA SILVA, a pena de 06 (seis) anos, 09 (nove) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, no regime inicial semiaberto, 680 (seiscentos e oitenta) dias-multa, no menor valor permitido. Às rés JULIANA RODRIGUES LIMA e JÚLIA RODRIGUES LIMA foram fixadas as penas de 05 (cinco) anos, 08 (oito) meses e 10 (dez) dias de reclusão, no regime inicial semiaberto, 565 (quinhentos e sessenta e cinco) dias-multa, no menor valor permitido. Descontente, a ré JULIANA RODRIGUES LIMA interpõe o presente recurso de apelação (mov. 220), via procurador dativo, buscando a absolvição, com base no art. 386, VII, do CPP, por insuficiência de provas. Alternativa e subsidiariamente, requer a redução da pena mediante a aplicação de maior redução pelo tráfico privilegiado ou o reconhecimento de exclusão de culpabilidade por coação moral irresistível. Em seguida, JULIANA RODRIGUES LIMA, constitui novo advogado e, junto com JOÃO PAULO SOUZA DA SILVA e JÚLIA RODRIGUES LIMA, interpõem recurso de apelação (mov. 226), indicando, em suas razões (mov.253), a nulidade das provas em razão de suposta invasão de domicílio, absolvição por ausência de provas, e, subsidiariamente, a desclassificação do delito para o de uso próprio, a aplicação da maior redução pelo tráfico privilegiado e o reconhecimento da atenuante da confissão. Pois bem. Tendo em conta a interposição de dois recursos de apelação pela ré Juliana Rodrigues Lima e em observância ao princípio da unirrecorribilidade das decisões, conheço apenas da primeira insurgência apresentada (mov. 220), e não conheço do recurso interposto pela referida ré na mov. 253, por preclusão consumativa, sem prejuízo, contudo, do amplo efeito devolutivo da apelação. Ressalta-se que a apreciação dos dois recursos far-se-á em conjunto, por didática processual e considerando a similitude de fundamentos. 1. Da preliminar de nulidade da busca domiciliar Os apelantes JOÃO PAULO SOUZA DA SILVA e JÚLIA RODRIGUES LIMA suscitaram a preliminar de nulidade das provas obtidas pela suposta vulneração do princípio da inviolabilidade domiciliar, afirmando que os policiais militares adentraram à residência sem mandado judicial ou fundadas razões para tanto. Contudo, as alegações não merecem acolhida. De acordo com os depoimentos colhidos dos policiais atuantes na ocorrência, a abordagem se deu em decorrência de denúncia anônima feita anteriormente por um vizinho, que observou movimentações suspeitas em uma residência. A denúncia indicava que o local estaria sendo utilizado para o armazenamento de entorpecentes e que João Paulo, conhecido na cidade pelo envolvimento com o tráfico de drogas, estaria diretamente ligado à situação. Diante dessas informações, a equipe policial passou a monitorar o imóvel por meio de patrulhamentos frequentes, com o objetivo de verificar qualquer movimentação suspeita que justificasse a abordagem. No dia dos fatos, ao passarem em frente à residência, os policiais avistaram João Paulo saindo pelo portão com uma caixa nas mãos, acompanhado de um menor de idade, que carregava uma sacola. Ao perceberem a presença da viatura, ambos retornaram abruptamente para o interior da casa e iniciaram fuga pelos fundos do imóvel, pulando muros em sequência. Imediatamente, os policiais acionaram reforço e ingressaram no imóvel em perseguição aos suspeitos, pulando muros e acompanhando o trajeto da fuga. Durante a ação, Júlia e Juliana, que estavam com o João Paulo e Thiago, também tentaram fugir, sendo que uma delas chegou a se ferir ao cair e machucar o joelho. João Paulo foi alcançado e detido por um tenente da equipe de apoio. Ao verificarem o conteúdo da caixa e da sacola abandonadas no momento da fuga, os policiais encontraram porções de substância semelhante à maconha. Nesse cenário, tem-se que o contexto fático que antecedeu as prisões do apelantes legitimou o ingresso dos militares nas residências, estando demonstradas a materialidade e autoria delitivas do delito, com prova robusta quanto às condutas trazer consigo e “ter em depósito”, diante da apreensão de substâncias entorpecentes, tornando inviável o acolhimento da tese de nulidade. Registra-se que o valor dos depoimentos testemunhais de policiais, sob o crivo do contraditório, reveste-se de inquestionável eficácia probatória, não podendo ser desqualificados só pelo fato de serem agentes estatais, mormente quando há harmonia nos relatos acerca da forma de abordagem dos processados, culminando na apreensão dos tóxicos. As suspeitas relatadas pelos policiais, decorrentes de investigação prévia, se confirmaram com a apreensão dos entorpecentes. Ademais, desnecessária a autorização judicial para o adentramento domiciliar, ante a presença de elementos objetivos e racionais justificadores do ingresso nas residências, ante todo o contexto narrado, o que torna a prova válida, estando amparada na exceção constitucional da situação de flagrância, nos termos do disposto no art. 5º, inciso XI, da Constituição Federal: “Art. 5º (…) XI - a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial; (...)” Sobre a prisão em flagrante nos crimes permanentes, oportuna a lição de Renato Brasileiro de Lima: “Crime permanente é aquele cuja consumação, pela natureza do bem jurídico ofendido, pode protrair-se no tempo, detendo o agente o poder de fazer cessar o estado antijurídico por ele realizado. Vejamos alguns exemplos: (...) tráfico de drogas (Lei n. 11.343/06, art. 33, caput), em algumas modalidades como guardar, trazer consigo, transportar, ter em depósito, etc. (destaquei). Nesses casos, enquanto não cessar a permanência, o agente encontra-se em situação de flagrância, ensejando, assim, a efetivação de sua prisão em flagrante, independentemente de prévia autorização judicial. Em todos esses crimes permanentes, em relação aos quais a prisão em flagrante é possível a qualquer momento, enquanto não cessar a permanência (CPP, art. 303), a Constituição Federal autoriza a violação ao domicílio mesmo sem prévia autorização judicial (art. 5º, XI). Assim, supondo-se (sublinhei) um delito de tráfico de drogas, na modalidade ‘ter em depósito’, delito de natureza permanente, no qual a consumação se prolonga no tempo e, consequentemente persiste o estado de flagrância, admite-se, ainda que em período noturno, e sem autorização judicial, o ingresso da polícia na casa em que está sendo praticado tal crime, com a consequente prisão em flagrante dos agentes e apreensão do material relativo à prática criminosa” (Código de Processo Penal comentado, Editora Jus PODIVM, p. 822). Esse o entender dos Tribunais Superiores: “Agravo regimental no recurso extraordinário com agravo. 2. Direito Processual Penal. 3. Crime do art. 16 da Lei 10.826/2003 (porte ilegal de arma) e do art. 33 da Lei 11.343/2006 (tráfico de drogas). 4. Alegada violação ao art. 5º, inciso XI, da Constituição Federal. Não configuração. Justificativa ‘a posteriori’ realizada. 5. Tema 280 da sistemática de repercussão geral. 6. Argumentos incapazes de infirmar a decisão agravada. 7. Agravo regimental a que se nega provimento.” (RE 1092572 AgR/SP, DJe-170 publicação 06/08/2019, Relator Ministro GILMAR MENDES). “AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL PENAL. LEGISLAÇÃO EXTRAVAGANTE. TRÁFICO DE DROGAS (95 G DE MACONHA). VIOLAÇÃO DO ART. 240, § 1º, DO CPP. TESE DE NULIDADE. PROVAS ILÍCITAS. TEORIA DOS FRUTOS DA ÁRVORE ENVENENADA. INVASÃO DOMICILIAR. FUNDADAS RAZÕES. (…) De tal modo, pelas narrativas dos agentes de segurança pública que atuaram no caso, e pelo cotejo dos elementos investigativos dos autos nº 0001908-29.2021.8.16.0069, assim como as em observância das circunstâncias fáticas que permeiam todo o caso em análise, restara demonstrada a preexistência de denúncia anônima, investigação e flagrante delito. 3. O Superior Tribunal de Justiça, em acréscimo, possui firme jurisprudência no sentido de que o ingresso regular em domicílio alheio depende, para sua validade e regularidade, da existência de fundadas razões (justa causa) que sinalizem para a possibilidade de mitigação do direito fundamental em questão. É dizer, somente quando o contexto fático anterior à invasão permitir a conclusão acerca da ocorrência de crime no interior da residência é que se mostra possível sacrificar o direito à inviolabilidade do domicílio. [...] No caso, consoante o quadro fático narrado pela Corte local, embora a investigação tenha iniciado em razão de denúncia anônima, foram colhidos elementos através de diligências/investigação no sentido de que o paciente estaria envolvido com o tráfico de drogas, o que afasta a alegada ilicitude da prova (AgRg nos EDcl no HC n. 773.027/SP, Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, DJe 1º/12/2022). 4. Agravo regimental desprovido. (AgRg no REsp n. 2.085.474/PR, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 18/12/2023, DJe de 20/12/2023.) No mesmo sentido a jurisprudência da Casa: “APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE DROGAS. VIOLAÇÃO DE DOMICÍLIO. INOCORRÊNCIA. CREDIBILIDADE DOS DEPOIMENTOS DOS POLICIAIS. (…) O ingresso regular em domicílio alheio depende, para sua validade e regularidade, da existência de fundadas razões (justa causa) que sinalizem para a possibilidade de mitigação do direito fundamental em questão. Quando o contexto fático anterior ao adentramento permitir a conclusão indicativa da ocorrência de crime no interior da residência, mostra-se possível sacrificar o direito à inviolabilidade do domicílio. 2. Depoimentos prestados por policiais não são, em si, inidôneos, na medida em que provém de agentes públicos no exercício de suas atribuições, especialmente quando prestados em juízo, sob o crivo do contraditório e em consonância com as demais provas coligidas nos autos. Seus relatos, colhidos à luz do contraditório e da ampla defesa, são aptos a dar suporte ao édito condenatório. 3. Comprovadas nos autos a materialidade e autoria do crime descrito no artigo 33, caput, da Lei nº 11.343/06, a condenação é medida impositiva. (...)” APELAÇÃO CONHECIDA E DESPROVIDA. (TJGO, PROCESSO CRIMINAL -> Recursos -> Apelação Criminal 0104450-36.2017.8.09.0110, Rel. Des(a). DESEMBARGADOR ITANEY FRANCISCO CAMPOS, 1ª Câmara Criminal, julgado em 14/11/2023, DJe de 14/11/2023). “APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. NULIDADE DAS PROVAS EM RAZÃO DA AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA PARA ABORDAGEM POLICIAL E INVASÃO DE DOMICÍLIO. ABSOLVIÇÃO. NÃO CABIMENTO. 1. Inexiste ilegalidade da abordagem policial quando há fundadas suspeitas da prática de ilícito, justificando a abordagem e a revista pessoal e veicular. 2. Não cabe a alegação de violação de domicílio, pois os policiais, durante abordagem em via pública, apreenderam grande quantidade de entorpecente em poder do apelante após abordagem lícita, situação ensejadora da justa causa para adentramento na residência. APELO CONHECIDO E DESPROVIDO.” (TJGO, PROCESSO CRIMINAL -> Recursos -> Apelação Criminal 5490476-48.2020.8.09.0149, Rel. Des(a). CLAUBER COSTA ABREU, 1ª Câmara Criminal, julgado em 26/10/2023, DJe de 26/10/2023). 2. Quanto ao mérito 2.1. Dos pleitos absolutórios e desclassificatório A materialidade delitiva restou comprovada pelo Auto de Prisão em Flagrante, Auto de Exibição e Apreensão, (mov. 01), Laudo de Perícia Criminal de Identificação de Drogas e Substâncias Correlatas (Exame Definitivo) mov. 171., tudo isso corroborado pelos depoimentos testemunhais colhidos ao longo das duas fases da persecução penal. No que concerne à autoria delitiva, verifica-se, indene de dúvidas, que João Paulo Souza da Silva e Tiago Souza Gonçalves, traziam consigo drogas, sendo que o primeiro segurava uma caixa contendo entorpecentes e o outro uma sacola, também com drogas no seu interior. Assim que visualizaram os policiais, eles empreenderam fuga, correndo para o interior da residência, local onde foram encontradas mais porções de drogas. Ainda que o menor Tiago Souza Gonçalves tente assumir a propriedade de toda a droga, os policiais atuantes na ocorrência afirmaram que João Paulo, no momento do flagrante, segurava uma caixa contendo maconha e que se trata de pessoa conhecida na região como traficante, bem como que no trajeto para a delegacia João Paulo pediu para que Tiago assumisse a prática do delito. A testemunha Jair Alves da Silva, policial militar, relatou, em Juízo (mídia na mov. 163), que: ”Não tem parentesco, amizade ou inimizade com os réus. Os vizinhos viram uma movimentação diferente no local e denunciaram à polícia, as denúncias estavam presentes por cerca de uma semana. No patrulhamento no local, viram João segurando uma caixa e uma pessoa menor de idade, Tiago, com uma sacola. João correu para dentro da casa e jogou a caixa pelo muro. Duas mulheres saíram correndo pelo muro. Na caixa tinha porções de maconha. A casa era alugada por João Paulo, alugada para guardar drogas. Que não chegou a falar com o proprietário da casa, porque não disseram quem era o dono da casa. O menor de idade disse que foi ao local comprar drogas. Os itens na casa não indicavam moradia. Uma das mulheres era namorada de João Paulo. Júlia e Juliana estavam dentro da casa. Não sabe se Júlia e Juliana tinham envolvimento com tráfico de drogas. Passavam com frequência pela casa por causa das denúncias; no dia do fato também houve denúncia. Um informante, usuário de drogas, informou que Juliana alugou a casa a pedido de João Paulo. Não foi encontrado com Júlia e Juliana nenhuma droga”. A testemunha Luiz Paulo Alves de Oliveira, policial militar, relatou, em Juízo (mídia na mov. 163): “Não tem parentesco, amizade ou inimizade com os réus. É de conhecimento da sociedade que o irmão de João Paulo, João Kleber, é traficante, e que João Paulo ficou responsável pelo tráfico na cidade de Palmeiras. Recebeu uma denúncia de um vizinho sobre uma movimentação estranha na casa e foram patrulhar no local. Avistaram João Paulo segurando uma caixa e Tiago com uma sacola, onde havia drogas, maconha e cocaína. Quando avistaram os policiais, ambos tentaram fugir, João Paulo soltou a casa e foi pega pelo cerco policial, enquanto Tiago foi encontrado em outra casa; Juliana e Júlia que estavam na casa foram encontradas na casa ao lado, uma delas se machucou pulando o muro. Na caixa tinha maconha, cocaína e uma balança de precisão; na sacola tinha 500g de cocaína. Ao chegarem na delegacia, João Paulo disse em alto e bom-tom para Tiago assumir a droga como sua, para “assumir o BO”. Após, foram para a casa de João Paulo, onde encontraram uma balança, ziplocs e uma porção de cocaína. Tiago disse no momento que teria ido à casa de João Paulo buscar 500g de cocaína. Julia e Juliana andavam com Tiago e João Paulo. Foi informado que Júlia alugou a casa para João Paulo. Que ainda hoje, Tiago, Júlia, Juliana e João Paulo atuam no tráfico de drogas. Não foi encontrado com Júlia e Juliana nenhuma droga. João Paulo estava de carro e Tiago de moto, ambas apreendidas”. Desse modo, ao contrário do que aponta a defesa, o Ministério Público provou a autoria pelo apelante João Paulo do delito de tráfico de drogas não havendo falar em absolvição, tampouco em desclassificação para a conduta prevista pelo art. 28 da Lei nº 11.343/06. Registra-se que a condição de usuário não é incompatível com a de traficante, pois o viciado, em geral, acaba se desviando para a atividade mercantil, em função da degeneração produzida pelo consumo excessivo de drogas. Sendo assim, cabia à defesa do recorrente comprovar que a substância se destinava ao seu consumo pessoal, ônus do qual não se desincumbiu, nos termos do que exige o art. 156 do Código de Processo Penal. Com efeito, a desclassificação da conduta de tráfico ilícito de drogas para o tipo penal de posse de drogas para consumo pessoal somente pode ser operada se restar sobejamente demonstrado nos autos o propósito único e exclusivo do consumo próprio da substância tóxica, elemento subjetivo especial do tipo não constatado no caso em comento. Nessa senda, tenho por incontestável o tráfico de drogas pelo apelante João Paulo pois a prova oral judicializada, aliada às circunstâncias da prisão, convergem à certeza quanto à finalidade de difusão ilícita da substância alucinógena, cuja constatação “independe da prática de ato explícito de comércio, desde que existam outros elementos que permitam conectar o denunciado à venda de entorpecentes, tal como ocorre nos autos (…)” (STJ, AgRg nos EDcl no RHC 123.884/MG, Rel Min. REYNALDO SOARES DA FONSECA, 5ª Turma, j. 12/05/2020). Assim, da análise das provas, tem-se que a tese da defesa do apelante João Paulo ser apenas consumidor de droga é inverossímil. Não condiz com o conjunto probatório dos autos, nem com a lógica que se permite deduzir dos fatos comprovados, mormente porque dentro da caixa de papelão que ele trazia nas mãos foram encontrados 03 (três) tabletes de maconha, acondicionados em fita plástica bege; 04 (quatro) porções de cocaína, acondicionadas em plástico filme transparente; 03 (três) porções de maconha, também acondicionadas em plástico filme transparente e 01 (uma) balança de precisão, devendo ser preservado o édito condenatório pelo delito de tráfico de entorpecentes. Relativamente às rés Juliana Rodrigues Lima e Júlia Rodrigues Lima, da análise do conjunto probatório não se extrai a certeza necessária para fundamentar contra elas um decreto condenatório pelo crime tipificado pelo artigo 33, caput da Lei nº 11.343/2006. Observa-se que os depoimentos dos policias responsáveis pelo flagrante dão conta de que visualizaram João Paulo e Thiago segurando caixa e sacola contendo as drogas, mas disseram que nada foi encontrado com Juliana e Júlia. Nada obstante a indicação de que a casa utilizada para o comércio de drogas havia sido locada por Juliana, não há provas da informação nos autos, sequer consta a indicação do nome do proprietário do imóvel para verificação do alegado. Ainda, o fato de elas terem fugido do local pulando muros após a abordagem policial, desacompanhado de outros elementos seguros da atuação delitiva de ambas, não se mostra suficiente a solução condenatória. Também não foram arroladas outras testemunhas que pudessem indicar a atuação das rés com João Paulo e Thiago na prática da traficância, de modo que os fatos narrados trazem incerteza acerca do envolvimento de Juliana e Júlia na prática do delito previsto pelo art. 33, da Lei nº 11.343/06, e, ainda que haja indícios de que elas agiam com os rapazes no comércio espúrio, não há nos autos provas suficientes, cabais, de que elas, de fato, participaram da conduta delituosa pela qual foram condenadas. É cediço que o processo penal não autoriza conclusões condenatórias baseadas somente em suposições ou indícios. A prova deve estar clara, escorreita e sem qualquer dúvida a respeito da autoria do delito para ensejar sentença condenatória. Na hipótese dos autos, a prova de que JULIANA e JÚLIA RODRIGUES LIMA praticaram o crime de tráfico de drogas mostra-se frágil e insegura, sendo incapaz de solver a dúvida que milita em favor das acusadas, que negam a autoria. Para a caracterização do crime de tráfico de drogas é necessário que reste evidenciada a vontade livre e consciente de praticar qualquer conduta descrita no tipo penal do artigo 33, caput, da Lei nº 11.343/06, com o intuito de difundir ilicitamente a droga. Assim, da análise do contexto probatório não se tem prova cabal do envolvimento de JULIANA e JÚLIA com a droga apreendida, de forma que a autoria imputada a elas não resta patenteada nos autos. Cediço que o ônus da prova cabe às partes, devendo a acusação demonstrar de forma plena e convincente a imputação descrita na denúncia, bastando que haja dúvida quanto aos fatos para que prevaleça o princípio do in dubio pro reo. (TJGO, Apelação Criminal 5104925-47.2021.8.09.0018, Rel. Des. Adegmar José Ferreira, 1ª Câmara Criminal, julgado em 31/01/2023, DJe de 31/01/2023.) No caso, a acusação não conseguiu provar que JULIANA e JÚLIA RODRIGUES LIMA participaram, de qualquer forma, do crime de tráfico de drogas, impondo-se, assim, sua absolvição por insuficiência de provas, nos termos do artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal. Sendo assim, reformo a decisão atacada e, por conseguinte, absolvo as rés JULIANA RODRIGUES LIMA e JÚLIA RODRIGUES LIMA, da prática do delito previsto pelo art. 33, caput, da Lei nº 11.343/06. 3. Da pena imposta ao réu João Paulo Souza da Silva Na 1ª fase da dosimetria, de maneira escorreita, a sentenciante valorou desfavoravelmente ao réu a natureza e quantidade das drogas, impondo a sanção inicial em 05 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão, quantitativo que não merece reparos, porquanto nos termos do artigo 42 da Lei n. 11.343/06, é correta a utilização da natureza/quantidade da droga apreendida para afastar a pena-base do mínimo legal. Em relação ao quantum de aumento de pena na primeira fase da dosimetria, a jurisprudência das Cortes Superiores firmou-se no sentido de que os parâmetros para a exasperação da reprimenda devem observar o critério da discricionariedade juridicamente vinculada, a qual, por sua vez, está submetida aos princípios da proporcionalidade, da razoabilidade, da suficiência da reprovação e da prevenção ao crime. Por tais razões, não se admite a adoção de critério meramente matemático, atrelado apenas ao número de circunstâncias judiciais desfavoráveis. Deve-se, na verdade, analisar os elementos que indiquem eventual gravidade concreta do delito, além das condições pessoais de cada agente, de forma que uma circunstância judicial desfavorável poderá receber mais desvalor que outra, exatamente em obediência aos princípios da individualização da pena e da própria proporcionalidade. Dentro desse contexto e observada a conduta em concreto, o aumento da pena-base em razão da natureza da droga apreendida é idôneo e proporcional, além de estar em consonância com o disposto no art. 42 da Lei nº 11.343/2006, e com a jurisprudência firmada acerca do tema Logo, não há alterações a serem realizadas na pena-base. Na 2ª fase, corretamente reconhecida a ausência de atenuantes e agravantes, mormente porque não verificada a confissão da prática delitiva, o que obsta o reconhecimento da atenuante, mantenho a pena intermediária em 05 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão. Na 3ª fase, a magistrada deixou de reconhecer a causa de diminuição do tráfico privilegiado ao argumento de que o réu possui ações penais em andamento, contudo, a justificativa apresentada contraria o entendimento do Tema Repetitivo 1139, que prevê “É vedada a utilização de inquéritos e/ou ações penais em curso para impedir a aplicação do art. 33, § 4.º, da Lei n. 11.343/06”, razão pela qual reformo a sentença no ponto mencionado, para reconhecer que o réu faz jus à referida minorante. Desse modo, reduzo a reprimenda intermediária em 2/3 (dois terços), concretizando a pena em 01 (um) ano, 11 (onze) meses e 10 (dez) dias de reclusão. Em seguida, acertadamente reconhecida a causa de aumento prevista pelo art. 40, inciso VI, da Lei nº 11.343/06, mantenho a majoração da pena em 1/6 (um sexto), mínimo legal, ficando a pena definitiva do apelante João Paulo, após a alteração aqui procedida, em 02 (dois) anos, 03 (três) meses e 06 (seis) dias de reclusão, e 226 (duzentos e vinte e seis) dias-multa, no menor valor permitido. Na mesma linha, tendo em conta o quantum da pena reformada, altero o regime inicial de cumprimento de pena para o aberto, ex vi do artigo 33, §2º 'c', e § 3º, do Código Penal. Presentes os requisitos do artigo 44 do Código Penal, substituo a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária, no valor de 01 (um) salário-mínimo, em termos e condições a serem estabelecidas pelo Juízo da Execução Penal.Dispositivo: Ao cabo do exposto, acolhendo, em parte, o parecer Ministerial de Cúpula, conheço, em parte, dos recursos de apelação, DOU PROVIMENTO aos recursos interpostos por JULIANA RODRIGUES LIMA e JÚLIA RODRIGUES LIMA, para absolvê-las com fundamento no art. 386, inciso VII, do Código de Processo Penal, conforme explanado no voto. DOU PARCIAL PROVIMENTO ao recurso interposto por JOÃO PAULO SOUZA DA SILVA, para aplicar a causa de diminuição de pena prevista no artigo 33, §4º, da Lei n. 11.343/06, no patamar máximo de 2/3 (dois terços), reduzindo a pena corpórea e de multa; alterar o regime expiatório para o aberto e possibilitar a substituição da pena corpórea por restritivas. É como voto. GILMAR LUIZ COELHOJuiz Substituto em Segundo GrauRELATOR(Datado e assinado eletronicamente) APELAÇÃO CRIMINAL Nº 5610426-17.2021.8.09.0149 COMARCA DE PALMEIRAS DE GOIÁS1ºAPELANTE: JOÃO PAULO SOUZA DA SILVA2º APELANTE: JÚLIA RODRIGUES LIMA3º APELANTE: JULIANA RODRIGUE LIMAAPELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁSRELATOR: Dr. GILMAR LUIZ COELHO – Juiz Substituto em Segundo Grau Ementa: DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. INVASÃO DOMICILIAR. NULIDADE DAS PROVAS AFASTADA. ABSOLVIÇÃO POR INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. APLICAÇÃO DO TRÁFICO PRIVILEGIADO. REDUÇÃO DE PENA. SUBSTITUIÇÃO POR RESTRITIVAS DE DIREITOS. PROVIMENTO PARCIAL.I. CASO EM EXAME1. Apelações criminais interpostas por João Paulo Souza da Silva, Júlia Rodrigues Lima e Juliana Rodrigues Lima contra sentença condenatória que os absolveu da imputação do art. 35 da Lei nº 11.343/06 e os condenou pelo crime de tráfico de drogas (art. 33, caput, c/c art. 40, VI, da mesma lei). João Paulo foi condenado à pena de 6 anos, 9 meses e 20 dias de reclusão, em regime semiaberto, e as rés Júlia e Juliana à pena de 5 anos, 8 meses e 10 dias de reclusão, também em regime semiaberto. Os recorrentes alegaram nulidade por suposta invasão domiciliar, pleitearam absolvição por ausência de provas e, subsidiariamente, desclassificação da conduta, reconhecimento de tráfico privilegiado e aplicação da confissão como atenuante.II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO2. Há três questões em discussão: (i) analisar se é nula a prova decorrente do ingresso policial no domicílio dos réus sem mandado judicial; (ii) verificar se há prova suficiente para a condenação das rés Júlia e Juliana Rodrigues Lima; (iii) apurar se João Paulo Souza da Silva faz jus à redução da pena pela incidência do tráfico privilegiado e à substituição da pena privativa de liberdade.III. RAZÕES DE DECIDIR3. O ingresso dos policiais na residência dos apelantes é válido, pois amparado em fundadas razões derivadas de denúncia anônima, vigilância prévia, comportamento suspeito e flagrante delito, conforme prevê a exceção constitucional à inviolabilidade do domicílio (CF/1988, art. 5º, XI).4. A abordagem dos policiais, relatada de forma coesa e corroborada por demais elementos de prova, justifica a regularidade das diligências, não havendo vício que invalide as provas obtidas.5. A absolvição das rés Júlia e Juliana Rodrigues Lima se impõe por insuficiência de provas, pois não foram encontradas drogas em sua posse, não houve testemunho direto de sua participação no tráfico e o fato de estarem no local não é suficiente para a condenação.6. A condenação de João Paulo Souza da Silva encontra-se amparada em provas robustas, incluindo flagrante com grande quantidade de drogas.7. A sentença deixou de aplicar indevidamente a causa de diminuição prevista no art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/06, com fundamento em ações penais em curso, em afronta ao entendimento firmado no Tema Repetitivo 1139 do STJ, devendo ser reconhecido o tráfico privilegiado.8. A pena de João Paulo deve ser reduzida em 2/3, com consequente fixação de regime aberto e substituição por duas penas restritivas de direitos, por preenchimento dos requisitos do art. 44 do Código Penal.IV. DISPOSITIVO E TESE9. Recursos parcialmente providos.Tese de julgamento:É válida a prova obtida por ingresso domiciliar quando amparada em fundadas razões, denúncia anônima, diligência prévia e flagrante delito, conforme o art. 5º, XI, da CF/1988.A absolvição por insuficiência de provas impõe-se quando inexistem elementos seguros e inequívocos de autoria delitiva, especialmente em delitos que exigem dolo específico.A existência de inquéritos ou ações penais em curso não obsta a aplicação da causa de diminuição de pena prevista no art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/06.Preenchidos os requisitos do art. 44 do Código Penal, a pena privativa de liberdade pode ser substituída por restritivas de direitos, mesmo nos crimes de tráfico privilegiado.Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, XI; CPP, arts. 386, VII; CP, arts. 33, § 2º, c, § 3º, e 44; Lei nº 11.343/06, arts. 33, caput, § 4º, e 40, VI.Jurisprudência relevante citada: STJ, AgRg nos EDcl no HC n. 773.027/SP, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, 5ª Turma, j. 01/12/2022, DJe 01/12/2022; STJ, AgRg no REsp n. 2.085.474/PR, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, 6ª Turma, j. 18/12/2023, DJe 20/12/2023; TJGO, ApC 0104450-36.2017.8.09.0110, Rel. Des. Itaney Francisco Campos, j. 14/11/2023; TJGO, ApC 5104925-47.2021.8.09.0018, Rel. Des. Adegmar José Ferreira, j. 31/01/2023; STJ, AgRg nos EDcl no RHC 123.884/MG, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, 5ª Turma, j. 12/05/2020. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os presentes autos da Apelação Criminal nº 5610426-17.2021.8.09.0149 ACORDAM os integrantes da Segunda Turma Julgadora da Terceira Câmara Criminal do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, na sessão virtual do dia 16 de junho de 2025, proferir deliberação no expediente conforme votação e composição registradas no extrato de ata do respectivo julgamento, à unanimidade, em conhecer em parte dos recursos e dar-lhe provimento ao segundo e terceiro apelante e dar parcialmente ao primeiro apelo, nos termos do voto do Relator. Presidiu a sessão o Desembargador Donizete Martins de Oliveira. Procuradoria-Geral de Justiça representada conforme extrato da ata. Goiânia, 16 de junho de 2025. GILMAR LUIZ COELHOJuiz Substituto em Segundo GrauRELATOR(Datado e assinado eletronicamente)B2

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Processo nº 5610426-17.2021.8.09.0149

ID: 309137640

Tribunal: TJGO Órgão: 3ª Câmara Criminal Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO Nº Processo: 5610426-17.2021.8.09.0149

Data de Disponibilização: 27/06/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

JULIA RODRIGUES LIMA

Ementa

Advogados:

ARLEN LUIS BATISTA SILVA

OAB/GO XXXXXX Desbloquear

Ementa: DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. INVASÃO DOMICILIAR. NULIDADE DAS PROVAS AFASTADA. ABSOLVIÇÃO POR INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. APLICAÇÃO DO T… Ementa: DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. INVASÃO DOMICILIAR. NULIDADE DAS PROVAS AFASTADA. ABSOLVIÇÃO POR INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. APLICAÇÃO DO TRÁFICO PRIVILEGIADO. REDUÇÃO DE PENA. SUBSTITUIÇÃO POR RESTRITIVAS DE DIREITOS. PROVIMENTO PARCIAL.I. CASO EM EXAME1. Apelações criminais interpostas por João Paulo Souza da Silva, Júlia Rodrigues Lima e Juliana Rodrigues Lima contra sentença condenatória que os absolveu da imputação do art. 35 da Lei nº 11.343/06 e os condenou pelo crime de tráfico de drogas (art. 33, caput, c/c art. 40, VI, da mesma lei). João Paulo foi condenado à pena de 6 anos, 9 meses e 20 dias de reclusão, em regime semiaberto, e as rés Júlia e Juliana à pena de 5 anos, 8 meses e 10 dias de reclusão, também em regime semiaberto. Os recorrentes alegaram nulidade por suposta invasão domiciliar, pleitearam absolvição por ausência de provas e, subsidiariamente, desclassificação da conduta, reconhecimento de tráfico privilegiado e aplicação da confissão como atenuante.II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO2. Há três questões em discussão: (i) analisar se é nula a prova decorrente do ingresso policial no domicílio dos réus sem mandado judicial; (ii) verificar se há prova suficiente para a condenação das rés Júlia e Juliana Rodrigues Lima; (iii) apurar se João Paulo Souza da Silva faz jus à redução da pena pela incidência do tráfico privilegiado e à substituição da pena privativa de liberdade.III. RAZÕES DE DECIDIR3. O ingresso dos policiais na residência dos apelantes é válido, pois amparado em fundadas razões derivadas de denúncia anônima, vigilância prévia, comportamento suspeito e flagrante delito, conforme prevê a exceção constitucional à inviolabilidade do domicílio (CF/1988, art. 5º, XI).4. A abordagem dos policiais, relatada de forma coesa e corroborada por demais elementos de prova, justifica a regularidade das diligências, não havendo vício que invalide as provas obtidas.5. A absolvição das rés Júlia e Juliana Rodrigues Lima se impõe por insuficiência de provas, pois não foram encontradas drogas em sua posse, não houve testemunho direto de sua participação no tráfico e o fato de estarem no local não é suficiente para a condenação.6. A condenação de João Paulo Souza da Silva encontra-se amparada em provas robustas, incluindo flagrante com grande quantidade de drogas.7. A sentença deixou de aplicar indevidamente a causa de diminuição prevista no art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/06, com fundamento em ações penais em curso, em afronta ao entendimento firmado no Tema Repetitivo 1139 do STJ, devendo ser reconhecido o tráfico privilegiado.8. A pena de João Paulo deve ser reduzida em 2/3, com consequente fixação de regime aberto e substituição por duas penas restritivas de direitos, por preenchimento dos requisitos do art. 44 do Código Penal.IV. DISPOSITIVO E TESE9. Recursos parcialmente providos.Tese de julgamento:É válida a prova obtida por ingresso domiciliar quando amparada em fundadas razões, denúncia anônima, diligência prévia e flagrante delito, conforme o art. 5º, XI, da CF/1988.A absolvição por insuficiência de provas impõe-se quando inexistem elementos seguros e inequívocos de autoria delitiva, especialmente em delitos que exigem dolo específico.A existência de inquéritos ou ações penais em curso não obsta a aplicação da causa de diminuição de pena prevista no art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/06.Preenchidos os requisitos do art. 44 do Código Penal, a pena privativa de liberdade pode ser substituída por restritivas de direitos, mesmo nos crimes de tráfico privilegiado.Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, XI; CPP, arts. 386, VII; CP, arts. 33, § 2º, c, § 3º, e 44; Lei nº 11.343/06, arts. 33, caput, § 4º, e 40, VI.Jurisprudência relevante citada: STJ, AgRg nos EDcl no HC n. 773.027/SP, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, 5ª Turma, j. 01/12/2022, DJe 01/12/2022; STJ, AgRg no REsp n. 2.085.474/PR, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, 6ª Turma, j. 18/12/2023, DJe 20/12/2023; TJGO, ApC 0104450-36.2017.8.09.0110, Rel. Des. Itaney Francisco Campos, j. 14/11/2023; TJGO, ApC 5104925-47.2021.8.09.0018, Rel. Des. Adegmar José Ferreira, j. 31/01/2023; STJ, AgRg nos EDcl no RHC 123.884/MG, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, 5ª Turma, j. 12/05/2020. PODER JUDICIÁRIO Tribunal de Justiça do Estado de Goiás Gabinete Desembargador Roberto Horácio Rezende 3ª Câmara Criminal APELAÇÃO CRIMINAL Nº 5610426-17.2021.8.09.0149 COMARCA DE PALMEIRAS DE GOIÁS1ºAPELANTE: JOÃO PAULO SOUZA DA SILVA2º APELANTE: JÚLIA RODRIGUES LIMA3º APELANTE: JULIANA RODRIGUE LIMAAPELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁSRELATOR: Dr. GILMAR LUIZ COELHO – Juiz Substituto em Segundo Grau VOTO Conforme relatado, trata-se de recursos de Apelação Criminal interpostos por JOÃO PAULO SOUZA DA SILVA, nascido em 29/10/1996, respondendo ao processo em liberdade, JÚLIA RODRIGUES LIMA, nascida em 24/04/1997, respondendo ao processo em liberdade, e JULIANA RODRIGUES LIMA, nascida em 22/06/1998, respondendo ao processo em liberdade, contra a sentença condenatória proferida no Juízo da Vara Criminal da Comarca de Palmeiras de Goiás, pela MM. Juíza de Direito, Dra. Isabella Luiza Alonso Bittencourt, que absolveu os processados da imputação prevista pelo art. 35, da Lei nº 11.343/06, e os condenou pela prática do art. 33, caput, c/c art. 40, inciso VI, da Lei nº 11.343/06, fixada, a JOÃO PAULO SOUZA DA SILVA, a pena de 06 (seis) anos, 09 (nove) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, no regime inicial semiaberto, 680 (seiscentos e oitenta) dias-multa, no menor valor permitido. Às rés JULIANA RODRIGUES LIMA e JÚLIA RODRIGUES LIMA foram fixadas as penas de 05 (cinco) anos, 08 (oito) meses e 10 (dez) dias de reclusão, no regime inicial semiaberto, 565 (quinhentos e sessenta e cinco) dias-multa, no menor valor permitido. Descontente, a ré JULIANA RODRIGUES LIMA interpõe o presente recurso de apelação (mov. 220), via procurador dativo, buscando a absolvição, com base no art. 386, VII, do CPP, por insuficiência de provas. Alternativa e subsidiariamente, requer a redução da pena mediante a aplicação de maior redução pelo tráfico privilegiado ou o reconhecimento de exclusão de culpabilidade por coação moral irresistível. Em seguida, JULIANA RODRIGUES LIMA, constitui novo advogado e, junto com JOÃO PAULO SOUZA DA SILVA e JÚLIA RODRIGUES LIMA, interpõem recurso de apelação (mov. 226), indicando, em suas razões (mov.253), a nulidade das provas em razão de suposta invasão de domicílio, absolvição por ausência de provas, e, subsidiariamente, a desclassificação do delito para o de uso próprio, a aplicação da maior redução pelo tráfico privilegiado e o reconhecimento da atenuante da confissão. Pois bem. Tendo em conta a interposição de dois recursos de apelação pela ré Juliana Rodrigues Lima e em observância ao princípio da unirrecorribilidade das decisões, conheço apenas da primeira insurgência apresentada (mov. 220), e não conheço do recurso interposto pela referida ré na mov. 253, por preclusão consumativa, sem prejuízo, contudo, do amplo efeito devolutivo da apelação. Ressalta-se que a apreciação dos dois recursos far-se-á em conjunto, por didática processual e considerando a similitude de fundamentos. 1. Da preliminar de nulidade da busca domiciliar Os apelantes JOÃO PAULO SOUZA DA SILVA e JÚLIA RODRIGUES LIMA suscitaram a preliminar de nulidade das provas obtidas pela suposta vulneração do princípio da inviolabilidade domiciliar, afirmando que os policiais militares adentraram à residência sem mandado judicial ou fundadas razões para tanto. Contudo, as alegações não merecem acolhida. De acordo com os depoimentos colhidos dos policiais atuantes na ocorrência, a abordagem se deu em decorrência de denúncia anônima feita anteriormente por um vizinho, que observou movimentações suspeitas em uma residência. A denúncia indicava que o local estaria sendo utilizado para o armazenamento de entorpecentes e que João Paulo, conhecido na cidade pelo envolvimento com o tráfico de drogas, estaria diretamente ligado à situação. Diante dessas informações, a equipe policial passou a monitorar o imóvel por meio de patrulhamentos frequentes, com o objetivo de verificar qualquer movimentação suspeita que justificasse a abordagem. No dia dos fatos, ao passarem em frente à residência, os policiais avistaram João Paulo saindo pelo portão com uma caixa nas mãos, acompanhado de um menor de idade, que carregava uma sacola. Ao perceberem a presença da viatura, ambos retornaram abruptamente para o interior da casa e iniciaram fuga pelos fundos do imóvel, pulando muros em sequência. Imediatamente, os policiais acionaram reforço e ingressaram no imóvel em perseguição aos suspeitos, pulando muros e acompanhando o trajeto da fuga. Durante a ação, Júlia e Juliana, que estavam com o João Paulo e Thiago, também tentaram fugir, sendo que uma delas chegou a se ferir ao cair e machucar o joelho. João Paulo foi alcançado e detido por um tenente da equipe de apoio. Ao verificarem o conteúdo da caixa e da sacola abandonadas no momento da fuga, os policiais encontraram porções de substância semelhante à maconha. Nesse cenário, tem-se que o contexto fático que antecedeu as prisões do apelantes legitimou o ingresso dos militares nas residências, estando demonstradas a materialidade e autoria delitivas do delito, com prova robusta quanto às condutas trazer consigo e “ter em depósito”, diante da apreensão de substâncias entorpecentes, tornando inviável o acolhimento da tese de nulidade. Registra-se que o valor dos depoimentos testemunhais de policiais, sob o crivo do contraditório, reveste-se de inquestionável eficácia probatória, não podendo ser desqualificados só pelo fato de serem agentes estatais, mormente quando há harmonia nos relatos acerca da forma de abordagem dos processados, culminando na apreensão dos tóxicos. As suspeitas relatadas pelos policiais, decorrentes de investigação prévia, se confirmaram com a apreensão dos entorpecentes. Ademais, desnecessária a autorização judicial para o adentramento domiciliar, ante a presença de elementos objetivos e racionais justificadores do ingresso nas residências, ante todo o contexto narrado, o que torna a prova válida, estando amparada na exceção constitucional da situação de flagrância, nos termos do disposto no art. 5º, inciso XI, da Constituição Federal: “Art. 5º (…) XI - a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial; (...)” Sobre a prisão em flagrante nos crimes permanentes, oportuna a lição de Renato Brasileiro de Lima: “Crime permanente é aquele cuja consumação, pela natureza do bem jurídico ofendido, pode protrair-se no tempo, detendo o agente o poder de fazer cessar o estado antijurídico por ele realizado. Vejamos alguns exemplos: (...) tráfico de drogas (Lei n. 11.343/06, art. 33, caput), em algumas modalidades como guardar, trazer consigo, transportar, ter em depósito, etc. (destaquei). Nesses casos, enquanto não cessar a permanência, o agente encontra-se em situação de flagrância, ensejando, assim, a efetivação de sua prisão em flagrante, independentemente de prévia autorização judicial. Em todos esses crimes permanentes, em relação aos quais a prisão em flagrante é possível a qualquer momento, enquanto não cessar a permanência (CPP, art. 303), a Constituição Federal autoriza a violação ao domicílio mesmo sem prévia autorização judicial (art. 5º, XI). Assim, supondo-se (sublinhei) um delito de tráfico de drogas, na modalidade ‘ter em depósito’, delito de natureza permanente, no qual a consumação se prolonga no tempo e, consequentemente persiste o estado de flagrância, admite-se, ainda que em período noturno, e sem autorização judicial, o ingresso da polícia na casa em que está sendo praticado tal crime, com a consequente prisão em flagrante dos agentes e apreensão do material relativo à prática criminosa” (Código de Processo Penal comentado, Editora Jus PODIVM, p. 822). Esse o entender dos Tribunais Superiores: “Agravo regimental no recurso extraordinário com agravo. 2. Direito Processual Penal. 3. Crime do art. 16 da Lei 10.826/2003 (porte ilegal de arma) e do art. 33 da Lei 11.343/2006 (tráfico de drogas). 4. Alegada violação ao art. 5º, inciso XI, da Constituição Federal. Não configuração. Justificativa ‘a posteriori’ realizada. 5. Tema 280 da sistemática de repercussão geral. 6. Argumentos incapazes de infirmar a decisão agravada. 7. Agravo regimental a que se nega provimento.” (RE 1092572 AgR/SP, DJe-170 publicação 06/08/2019, Relator Ministro GILMAR MENDES). “AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL PENAL. LEGISLAÇÃO EXTRAVAGANTE. TRÁFICO DE DROGAS (95 G DE MACONHA). VIOLAÇÃO DO ART. 240, § 1º, DO CPP. TESE DE NULIDADE. PROVAS ILÍCITAS. TEORIA DOS FRUTOS DA ÁRVORE ENVENENADA. INVASÃO DOMICILIAR. FUNDADAS RAZÕES. (…) De tal modo, pelas narrativas dos agentes de segurança pública que atuaram no caso, e pelo cotejo dos elementos investigativos dos autos nº 0001908-29.2021.8.16.0069, assim como as em observância das circunstâncias fáticas que permeiam todo o caso em análise, restara demonstrada a preexistência de denúncia anônima, investigação e flagrante delito. 3. O Superior Tribunal de Justiça, em acréscimo, possui firme jurisprudência no sentido de que o ingresso regular em domicílio alheio depende, para sua validade e regularidade, da existência de fundadas razões (justa causa) que sinalizem para a possibilidade de mitigação do direito fundamental em questão. É dizer, somente quando o contexto fático anterior à invasão permitir a conclusão acerca da ocorrência de crime no interior da residência é que se mostra possível sacrificar o direito à inviolabilidade do domicílio. [...] No caso, consoante o quadro fático narrado pela Corte local, embora a investigação tenha iniciado em razão de denúncia anônima, foram colhidos elementos através de diligências/investigação no sentido de que o paciente estaria envolvido com o tráfico de drogas, o que afasta a alegada ilicitude da prova (AgRg nos EDcl no HC n. 773.027/SP, Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, DJe 1º/12/2022). 4. Agravo regimental desprovido. (AgRg no REsp n. 2.085.474/PR, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 18/12/2023, DJe de 20/12/2023.) No mesmo sentido a jurisprudência da Casa: “APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE DROGAS. VIOLAÇÃO DE DOMICÍLIO. INOCORRÊNCIA. CREDIBILIDADE DOS DEPOIMENTOS DOS POLICIAIS. (…) O ingresso regular em domicílio alheio depende, para sua validade e regularidade, da existência de fundadas razões (justa causa) que sinalizem para a possibilidade de mitigação do direito fundamental em questão. Quando o contexto fático anterior ao adentramento permitir a conclusão indicativa da ocorrência de crime no interior da residência, mostra-se possível sacrificar o direito à inviolabilidade do domicílio. 2. Depoimentos prestados por policiais não são, em si, inidôneos, na medida em que provém de agentes públicos no exercício de suas atribuições, especialmente quando prestados em juízo, sob o crivo do contraditório e em consonância com as demais provas coligidas nos autos. Seus relatos, colhidos à luz do contraditório e da ampla defesa, são aptos a dar suporte ao édito condenatório. 3. Comprovadas nos autos a materialidade e autoria do crime descrito no artigo 33, caput, da Lei nº 11.343/06, a condenação é medida impositiva. (...)” APELAÇÃO CONHECIDA E DESPROVIDA. (TJGO, PROCESSO CRIMINAL -> Recursos -> Apelação Criminal 0104450-36.2017.8.09.0110, Rel. Des(a). DESEMBARGADOR ITANEY FRANCISCO CAMPOS, 1ª Câmara Criminal, julgado em 14/11/2023, DJe de 14/11/2023). “APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. NULIDADE DAS PROVAS EM RAZÃO DA AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA PARA ABORDAGEM POLICIAL E INVASÃO DE DOMICÍLIO. ABSOLVIÇÃO. NÃO CABIMENTO. 1. Inexiste ilegalidade da abordagem policial quando há fundadas suspeitas da prática de ilícito, justificando a abordagem e a revista pessoal e veicular. 2. Não cabe a alegação de violação de domicílio, pois os policiais, durante abordagem em via pública, apreenderam grande quantidade de entorpecente em poder do apelante após abordagem lícita, situação ensejadora da justa causa para adentramento na residência. APELO CONHECIDO E DESPROVIDO.” (TJGO, PROCESSO CRIMINAL -> Recursos -> Apelação Criminal 5490476-48.2020.8.09.0149, Rel. Des(a). CLAUBER COSTA ABREU, 1ª Câmara Criminal, julgado em 26/10/2023, DJe de 26/10/2023). 2. Quanto ao mérito 2.1. Dos pleitos absolutórios e desclassificatório A materialidade delitiva restou comprovada pelo Auto de Prisão em Flagrante, Auto de Exibição e Apreensão, (mov. 01), Laudo de Perícia Criminal de Identificação de Drogas e Substâncias Correlatas (Exame Definitivo) mov. 171., tudo isso corroborado pelos depoimentos testemunhais colhidos ao longo das duas fases da persecução penal. No que concerne à autoria delitiva, verifica-se, indene de dúvidas, que João Paulo Souza da Silva e Tiago Souza Gonçalves, traziam consigo drogas, sendo que o primeiro segurava uma caixa contendo entorpecentes e o outro uma sacola, também com drogas no seu interior. Assim que visualizaram os policiais, eles empreenderam fuga, correndo para o interior da residência, local onde foram encontradas mais porções de drogas. Ainda que o menor Tiago Souza Gonçalves tente assumir a propriedade de toda a droga, os policiais atuantes na ocorrência afirmaram que João Paulo, no momento do flagrante, segurava uma caixa contendo maconha e que se trata de pessoa conhecida na região como traficante, bem como que no trajeto para a delegacia João Paulo pediu para que Tiago assumisse a prática do delito. A testemunha Jair Alves da Silva, policial militar, relatou, em Juízo (mídia na mov. 163), que: ”Não tem parentesco, amizade ou inimizade com os réus. Os vizinhos viram uma movimentação diferente no local e denunciaram à polícia, as denúncias estavam presentes por cerca de uma semana. No patrulhamento no local, viram João segurando uma caixa e uma pessoa menor de idade, Tiago, com uma sacola. João correu para dentro da casa e jogou a caixa pelo muro. Duas mulheres saíram correndo pelo muro. Na caixa tinha porções de maconha. A casa era alugada por João Paulo, alugada para guardar drogas. Que não chegou a falar com o proprietário da casa, porque não disseram quem era o dono da casa. O menor de idade disse que foi ao local comprar drogas. Os itens na casa não indicavam moradia. Uma das mulheres era namorada de João Paulo. Júlia e Juliana estavam dentro da casa. Não sabe se Júlia e Juliana tinham envolvimento com tráfico de drogas. Passavam com frequência pela casa por causa das denúncias; no dia do fato também houve denúncia. Um informante, usuário de drogas, informou que Juliana alugou a casa a pedido de João Paulo. Não foi encontrado com Júlia e Juliana nenhuma droga”. A testemunha Luiz Paulo Alves de Oliveira, policial militar, relatou, em Juízo (mídia na mov. 163): “Não tem parentesco, amizade ou inimizade com os réus. É de conhecimento da sociedade que o irmão de João Paulo, João Kleber, é traficante, e que João Paulo ficou responsável pelo tráfico na cidade de Palmeiras. Recebeu uma denúncia de um vizinho sobre uma movimentação estranha na casa e foram patrulhar no local. Avistaram João Paulo segurando uma caixa e Tiago com uma sacola, onde havia drogas, maconha e cocaína. Quando avistaram os policiais, ambos tentaram fugir, João Paulo soltou a casa e foi pega pelo cerco policial, enquanto Tiago foi encontrado em outra casa; Juliana e Júlia que estavam na casa foram encontradas na casa ao lado, uma delas se machucou pulando o muro. Na caixa tinha maconha, cocaína e uma balança de precisão; na sacola tinha 500g de cocaína. Ao chegarem na delegacia, João Paulo disse em alto e bom-tom para Tiago assumir a droga como sua, para “assumir o BO”. Após, foram para a casa de João Paulo, onde encontraram uma balança, ziplocs e uma porção de cocaína. Tiago disse no momento que teria ido à casa de João Paulo buscar 500g de cocaína. Julia e Juliana andavam com Tiago e João Paulo. Foi informado que Júlia alugou a casa para João Paulo. Que ainda hoje, Tiago, Júlia, Juliana e João Paulo atuam no tráfico de drogas. Não foi encontrado com Júlia e Juliana nenhuma droga. João Paulo estava de carro e Tiago de moto, ambas apreendidas”. Desse modo, ao contrário do que aponta a defesa, o Ministério Público provou a autoria pelo apelante João Paulo do delito de tráfico de drogas não havendo falar em absolvição, tampouco em desclassificação para a conduta prevista pelo art. 28 da Lei nº 11.343/06. Registra-se que a condição de usuário não é incompatível com a de traficante, pois o viciado, em geral, acaba se desviando para a atividade mercantil, em função da degeneração produzida pelo consumo excessivo de drogas. Sendo assim, cabia à defesa do recorrente comprovar que a substância se destinava ao seu consumo pessoal, ônus do qual não se desincumbiu, nos termos do que exige o art. 156 do Código de Processo Penal. Com efeito, a desclassificação da conduta de tráfico ilícito de drogas para o tipo penal de posse de drogas para consumo pessoal somente pode ser operada se restar sobejamente demonstrado nos autos o propósito único e exclusivo do consumo próprio da substância tóxica, elemento subjetivo especial do tipo não constatado no caso em comento. Nessa senda, tenho por incontestável o tráfico de drogas pelo apelante João Paulo pois a prova oral judicializada, aliada às circunstâncias da prisão, convergem à certeza quanto à finalidade de difusão ilícita da substância alucinógena, cuja constatação “independe da prática de ato explícito de comércio, desde que existam outros elementos que permitam conectar o denunciado à venda de entorpecentes, tal como ocorre nos autos (…)” (STJ, AgRg nos EDcl no RHC 123.884/MG, Rel Min. REYNALDO SOARES DA FONSECA, 5ª Turma, j. 12/05/2020). Assim, da análise das provas, tem-se que a tese da defesa do apelante João Paulo ser apenas consumidor de droga é inverossímil. Não condiz com o conjunto probatório dos autos, nem com a lógica que se permite deduzir dos fatos comprovados, mormente porque dentro da caixa de papelão que ele trazia nas mãos foram encontrados 03 (três) tabletes de maconha, acondicionados em fita plástica bege; 04 (quatro) porções de cocaína, acondicionadas em plástico filme transparente; 03 (três) porções de maconha, também acondicionadas em plástico filme transparente e 01 (uma) balança de precisão, devendo ser preservado o édito condenatório pelo delito de tráfico de entorpecentes. Relativamente às rés Juliana Rodrigues Lima e Júlia Rodrigues Lima, da análise do conjunto probatório não se extrai a certeza necessária para fundamentar contra elas um decreto condenatório pelo crime tipificado pelo artigo 33, caput da Lei nº 11.343/2006. Observa-se que os depoimentos dos policias responsáveis pelo flagrante dão conta de que visualizaram João Paulo e Thiago segurando caixa e sacola contendo as drogas, mas disseram que nada foi encontrado com Juliana e Júlia. Nada obstante a indicação de que a casa utilizada para o comércio de drogas havia sido locada por Juliana, não há provas da informação nos autos, sequer consta a indicação do nome do proprietário do imóvel para verificação do alegado. Ainda, o fato de elas terem fugido do local pulando muros após a abordagem policial, desacompanhado de outros elementos seguros da atuação delitiva de ambas, não se mostra suficiente a solução condenatória. Também não foram arroladas outras testemunhas que pudessem indicar a atuação das rés com João Paulo e Thiago na prática da traficância, de modo que os fatos narrados trazem incerteza acerca do envolvimento de Juliana e Júlia na prática do delito previsto pelo art. 33, da Lei nº 11.343/06, e, ainda que haja indícios de que elas agiam com os rapazes no comércio espúrio, não há nos autos provas suficientes, cabais, de que elas, de fato, participaram da conduta delituosa pela qual foram condenadas. É cediço que o processo penal não autoriza conclusões condenatórias baseadas somente em suposições ou indícios. A prova deve estar clara, escorreita e sem qualquer dúvida a respeito da autoria do delito para ensejar sentença condenatória. Na hipótese dos autos, a prova de que JULIANA e JÚLIA RODRIGUES LIMA praticaram o crime de tráfico de drogas mostra-se frágil e insegura, sendo incapaz de solver a dúvida que milita em favor das acusadas, que negam a autoria. Para a caracterização do crime de tráfico de drogas é necessário que reste evidenciada a vontade livre e consciente de praticar qualquer conduta descrita no tipo penal do artigo 33, caput, da Lei nº 11.343/06, com o intuito de difundir ilicitamente a droga. Assim, da análise do contexto probatório não se tem prova cabal do envolvimento de JULIANA e JÚLIA com a droga apreendida, de forma que a autoria imputada a elas não resta patenteada nos autos. Cediço que o ônus da prova cabe às partes, devendo a acusação demonstrar de forma plena e convincente a imputação descrita na denúncia, bastando que haja dúvida quanto aos fatos para que prevaleça o princípio do in dubio pro reo. (TJGO, Apelação Criminal 5104925-47.2021.8.09.0018, Rel. Des. Adegmar José Ferreira, 1ª Câmara Criminal, julgado em 31/01/2023, DJe de 31/01/2023.) No caso, a acusação não conseguiu provar que JULIANA e JÚLIA RODRIGUES LIMA participaram, de qualquer forma, do crime de tráfico de drogas, impondo-se, assim, sua absolvição por insuficiência de provas, nos termos do artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal. Sendo assim, reformo a decisão atacada e, por conseguinte, absolvo as rés JULIANA RODRIGUES LIMA e JÚLIA RODRIGUES LIMA, da prática do delito previsto pelo art. 33, caput, da Lei nº 11.343/06. 3. Da pena imposta ao réu João Paulo Souza da Silva Na 1ª fase da dosimetria, de maneira escorreita, a sentenciante valorou desfavoravelmente ao réu a natureza e quantidade das drogas, impondo a sanção inicial em 05 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão, quantitativo que não merece reparos, porquanto nos termos do artigo 42 da Lei n. 11.343/06, é correta a utilização da natureza/quantidade da droga apreendida para afastar a pena-base do mínimo legal. Em relação ao quantum de aumento de pena na primeira fase da dosimetria, a jurisprudência das Cortes Superiores firmou-se no sentido de que os parâmetros para a exasperação da reprimenda devem observar o critério da discricionariedade juridicamente vinculada, a qual, por sua vez, está submetida aos princípios da proporcionalidade, da razoabilidade, da suficiência da reprovação e da prevenção ao crime. Por tais razões, não se admite a adoção de critério meramente matemático, atrelado apenas ao número de circunstâncias judiciais desfavoráveis. Deve-se, na verdade, analisar os elementos que indiquem eventual gravidade concreta do delito, além das condições pessoais de cada agente, de forma que uma circunstância judicial desfavorável poderá receber mais desvalor que outra, exatamente em obediência aos princípios da individualização da pena e da própria proporcionalidade. Dentro desse contexto e observada a conduta em concreto, o aumento da pena-base em razão da natureza da droga apreendida é idôneo e proporcional, além de estar em consonância com o disposto no art. 42 da Lei nº 11.343/2006, e com a jurisprudência firmada acerca do tema Logo, não há alterações a serem realizadas na pena-base. Na 2ª fase, corretamente reconhecida a ausência de atenuantes e agravantes, mormente porque não verificada a confissão da prática delitiva, o que obsta o reconhecimento da atenuante, mantenho a pena intermediária em 05 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão. Na 3ª fase, a magistrada deixou de reconhecer a causa de diminuição do tráfico privilegiado ao argumento de que o réu possui ações penais em andamento, contudo, a justificativa apresentada contraria o entendimento do Tema Repetitivo 1139, que prevê “É vedada a utilização de inquéritos e/ou ações penais em curso para impedir a aplicação do art. 33, § 4.º, da Lei n. 11.343/06”, razão pela qual reformo a sentença no ponto mencionado, para reconhecer que o réu faz jus à referida minorante. Desse modo, reduzo a reprimenda intermediária em 2/3 (dois terços), concretizando a pena em 01 (um) ano, 11 (onze) meses e 10 (dez) dias de reclusão. Em seguida, acertadamente reconhecida a causa de aumento prevista pelo art. 40, inciso VI, da Lei nº 11.343/06, mantenho a majoração da pena em 1/6 (um sexto), mínimo legal, ficando a pena definitiva do apelante João Paulo, após a alteração aqui procedida, em 02 (dois) anos, 03 (três) meses e 06 (seis) dias de reclusão, e 226 (duzentos e vinte e seis) dias-multa, no menor valor permitido. Na mesma linha, tendo em conta o quantum da pena reformada, altero o regime inicial de cumprimento de pena para o aberto, ex vi do artigo 33, §2º 'c', e § 3º, do Código Penal. Presentes os requisitos do artigo 44 do Código Penal, substituo a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária, no valor de 01 (um) salário-mínimo, em termos e condições a serem estabelecidas pelo Juízo da Execução Penal.Dispositivo: Ao cabo do exposto, acolhendo, em parte, o parecer Ministerial de Cúpula, conheço, em parte, dos recursos de apelação, DOU PROVIMENTO aos recursos interpostos por JULIANA RODRIGUES LIMA e JÚLIA RODRIGUES LIMA, para absolvê-las com fundamento no art. 386, inciso VII, do Código de Processo Penal, conforme explanado no voto. DOU PARCIAL PROVIMENTO ao recurso interposto por JOÃO PAULO SOUZA DA SILVA, para aplicar a causa de diminuição de pena prevista no artigo 33, §4º, da Lei n. 11.343/06, no patamar máximo de 2/3 (dois terços), reduzindo a pena corpórea e de multa; alterar o regime expiatório para o aberto e possibilitar a substituição da pena corpórea por restritivas. É como voto. GILMAR LUIZ COELHOJuiz Substituto em Segundo GrauRELATOR(Datado e assinado eletronicamente) APELAÇÃO CRIMINAL Nº 5610426-17.2021.8.09.0149 COMARCA DE PALMEIRAS DE GOIÁS1ºAPELANTE: JOÃO PAULO SOUZA DA SILVA2º APELANTE: JÚLIA RODRIGUES LIMA3º APELANTE: JULIANA RODRIGUE LIMAAPELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁSRELATOR: Dr. GILMAR LUIZ COELHO – Juiz Substituto em Segundo Grau Ementa: DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. INVASÃO DOMICILIAR. NULIDADE DAS PROVAS AFASTADA. ABSOLVIÇÃO POR INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. APLICAÇÃO DO TRÁFICO PRIVILEGIADO. REDUÇÃO DE PENA. SUBSTITUIÇÃO POR RESTRITIVAS DE DIREITOS. PROVIMENTO PARCIAL.I. CASO EM EXAME1. Apelações criminais interpostas por João Paulo Souza da Silva, Júlia Rodrigues Lima e Juliana Rodrigues Lima contra sentença condenatória que os absolveu da imputação do art. 35 da Lei nº 11.343/06 e os condenou pelo crime de tráfico de drogas (art. 33, caput, c/c art. 40, VI, da mesma lei). João Paulo foi condenado à pena de 6 anos, 9 meses e 20 dias de reclusão, em regime semiaberto, e as rés Júlia e Juliana à pena de 5 anos, 8 meses e 10 dias de reclusão, também em regime semiaberto. Os recorrentes alegaram nulidade por suposta invasão domiciliar, pleitearam absolvição por ausência de provas e, subsidiariamente, desclassificação da conduta, reconhecimento de tráfico privilegiado e aplicação da confissão como atenuante.II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO2. Há três questões em discussão: (i) analisar se é nula a prova decorrente do ingresso policial no domicílio dos réus sem mandado judicial; (ii) verificar se há prova suficiente para a condenação das rés Júlia e Juliana Rodrigues Lima; (iii) apurar se João Paulo Souza da Silva faz jus à redução da pena pela incidência do tráfico privilegiado e à substituição da pena privativa de liberdade.III. RAZÕES DE DECIDIR3. O ingresso dos policiais na residência dos apelantes é válido, pois amparado em fundadas razões derivadas de denúncia anônima, vigilância prévia, comportamento suspeito e flagrante delito, conforme prevê a exceção constitucional à inviolabilidade do domicílio (CF/1988, art. 5º, XI).4. A abordagem dos policiais, relatada de forma coesa e corroborada por demais elementos de prova, justifica a regularidade das diligências, não havendo vício que invalide as provas obtidas.5. A absolvição das rés Júlia e Juliana Rodrigues Lima se impõe por insuficiência de provas, pois não foram encontradas drogas em sua posse, não houve testemunho direto de sua participação no tráfico e o fato de estarem no local não é suficiente para a condenação.6. A condenação de João Paulo Souza da Silva encontra-se amparada em provas robustas, incluindo flagrante com grande quantidade de drogas.7. A sentença deixou de aplicar indevidamente a causa de diminuição prevista no art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/06, com fundamento em ações penais em curso, em afronta ao entendimento firmado no Tema Repetitivo 1139 do STJ, devendo ser reconhecido o tráfico privilegiado.8. A pena de João Paulo deve ser reduzida em 2/3, com consequente fixação de regime aberto e substituição por duas penas restritivas de direitos, por preenchimento dos requisitos do art. 44 do Código Penal.IV. DISPOSITIVO E TESE9. Recursos parcialmente providos.Tese de julgamento:É válida a prova obtida por ingresso domiciliar quando amparada em fundadas razões, denúncia anônima, diligência prévia e flagrante delito, conforme o art. 5º, XI, da CF/1988.A absolvição por insuficiência de provas impõe-se quando inexistem elementos seguros e inequívocos de autoria delitiva, especialmente em delitos que exigem dolo específico.A existência de inquéritos ou ações penais em curso não obsta a aplicação da causa de diminuição de pena prevista no art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/06.Preenchidos os requisitos do art. 44 do Código Penal, a pena privativa de liberdade pode ser substituída por restritivas de direitos, mesmo nos crimes de tráfico privilegiado.Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, XI; CPP, arts. 386, VII; CP, arts. 33, § 2º, c, § 3º, e 44; Lei nº 11.343/06, arts. 33, caput, § 4º, e 40, VI.Jurisprudência relevante citada: STJ, AgRg nos EDcl no HC n. 773.027/SP, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, 5ª Turma, j. 01/12/2022, DJe 01/12/2022; STJ, AgRg no REsp n. 2.085.474/PR, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, 6ª Turma, j. 18/12/2023, DJe 20/12/2023; TJGO, ApC 0104450-36.2017.8.09.0110, Rel. Des. Itaney Francisco Campos, j. 14/11/2023; TJGO, ApC 5104925-47.2021.8.09.0018, Rel. Des. Adegmar José Ferreira, j. 31/01/2023; STJ, AgRg nos EDcl no RHC 123.884/MG, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, 5ª Turma, j. 12/05/2020. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os presentes autos da Apelação Criminal nº 5610426-17.2021.8.09.0149 ACORDAM os integrantes da Segunda Turma Julgadora da Terceira Câmara Criminal do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, na sessão virtual do dia 16 de junho de 2025, proferir deliberação no expediente conforme votação e composição registradas no extrato de ata do respectivo julgamento, à unanimidade, em conhecer em parte dos recursos e dar-lhe provimento ao segundo e terceiro apelante e dar parcialmente ao primeiro apelo, nos termos do voto do Relator. Presidiu a sessão o Desembargador Donizete Martins de Oliveira. Procuradoria-Geral de Justiça representada conforme extrato da ata. Goiânia, 16 de junho de 2025. GILMAR LUIZ COELHOJuiz Substituto em Segundo GrauRELATOR(Datado e assinado eletronicamente)B2

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Processo nº 5610426-17.2021.8.09.0149

ID: 309137649

Tribunal: TJGO Órgão: 3ª Câmara Criminal Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO Nº Processo: 5610426-17.2021.8.09.0149

Data de Disponibilização: 27/06/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

JULIANA RODRIGUES LIMA

Ementa

Advogados:

ARLEN LUIS BATISTA SILVA

OAB/GO XXXXXX Desbloquear

Ementa: DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. INVASÃO DOMICILIAR. NULIDADE DAS PROVAS AFASTADA. ABSOLVIÇÃO POR INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. APLICAÇÃO DO T… Ementa: DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. INVASÃO DOMICILIAR. NULIDADE DAS PROVAS AFASTADA. ABSOLVIÇÃO POR INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. APLICAÇÃO DO TRÁFICO PRIVILEGIADO. REDUÇÃO DE PENA. SUBSTITUIÇÃO POR RESTRITIVAS DE DIREITOS. PROVIMENTO PARCIAL.I. CASO EM EXAME1. Apelações criminais interpostas por João Paulo Souza da Silva, Júlia Rodrigues Lima e Juliana Rodrigues Lima contra sentença condenatória que os absolveu da imputação do art. 35 da Lei nº 11.343/06 e os condenou pelo crime de tráfico de drogas (art. 33, caput, c/c art. 40, VI, da mesma lei). João Paulo foi condenado à pena de 6 anos, 9 meses e 20 dias de reclusão, em regime semiaberto, e as rés Júlia e Juliana à pena de 5 anos, 8 meses e 10 dias de reclusão, também em regime semiaberto. Os recorrentes alegaram nulidade por suposta invasão domiciliar, pleitearam absolvição por ausência de provas e, subsidiariamente, desclassificação da conduta, reconhecimento de tráfico privilegiado e aplicação da confissão como atenuante.II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO2. Há três questões em discussão: (i) analisar se é nula a prova decorrente do ingresso policial no domicílio dos réus sem mandado judicial; (ii) verificar se há prova suficiente para a condenação das rés Júlia e Juliana Rodrigues Lima; (iii) apurar se João Paulo Souza da Silva faz jus à redução da pena pela incidência do tráfico privilegiado e à substituição da pena privativa de liberdade.III. RAZÕES DE DECIDIR3. O ingresso dos policiais na residência dos apelantes é válido, pois amparado em fundadas razões derivadas de denúncia anônima, vigilância prévia, comportamento suspeito e flagrante delito, conforme prevê a exceção constitucional à inviolabilidade do domicílio (CF/1988, art. 5º, XI).4. A abordagem dos policiais, relatada de forma coesa e corroborada por demais elementos de prova, justifica a regularidade das diligências, não havendo vício que invalide as provas obtidas.5. A absolvição das rés Júlia e Juliana Rodrigues Lima se impõe por insuficiência de provas, pois não foram encontradas drogas em sua posse, não houve testemunho direto de sua participação no tráfico e o fato de estarem no local não é suficiente para a condenação.6. A condenação de João Paulo Souza da Silva encontra-se amparada em provas robustas, incluindo flagrante com grande quantidade de drogas.7. A sentença deixou de aplicar indevidamente a causa de diminuição prevista no art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/06, com fundamento em ações penais em curso, em afronta ao entendimento firmado no Tema Repetitivo 1139 do STJ, devendo ser reconhecido o tráfico privilegiado.8. A pena de João Paulo deve ser reduzida em 2/3, com consequente fixação de regime aberto e substituição por duas penas restritivas de direitos, por preenchimento dos requisitos do art. 44 do Código Penal.IV. DISPOSITIVO E TESE9. Recursos parcialmente providos.Tese de julgamento:É válida a prova obtida por ingresso domiciliar quando amparada em fundadas razões, denúncia anônima, diligência prévia e flagrante delito, conforme o art. 5º, XI, da CF/1988.A absolvição por insuficiência de provas impõe-se quando inexistem elementos seguros e inequívocos de autoria delitiva, especialmente em delitos que exigem dolo específico.A existência de inquéritos ou ações penais em curso não obsta a aplicação da causa de diminuição de pena prevista no art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/06.Preenchidos os requisitos do art. 44 do Código Penal, a pena privativa de liberdade pode ser substituída por restritivas de direitos, mesmo nos crimes de tráfico privilegiado.Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, XI; CPP, arts. 386, VII; CP, arts. 33, § 2º, c, § 3º, e 44; Lei nº 11.343/06, arts. 33, caput, § 4º, e 40, VI.Jurisprudência relevante citada: STJ, AgRg nos EDcl no HC n. 773.027/SP, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, 5ª Turma, j. 01/12/2022, DJe 01/12/2022; STJ, AgRg no REsp n. 2.085.474/PR, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, 6ª Turma, j. 18/12/2023, DJe 20/12/2023; TJGO, ApC 0104450-36.2017.8.09.0110, Rel. Des. Itaney Francisco Campos, j. 14/11/2023; TJGO, ApC 5104925-47.2021.8.09.0018, Rel. Des. Adegmar José Ferreira, j. 31/01/2023; STJ, AgRg nos EDcl no RHC 123.884/MG, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, 5ª Turma, j. 12/05/2020. PODER JUDICIÁRIO Tribunal de Justiça do Estado de Goiás Gabinete Desembargador Roberto Horácio Rezende 3ª Câmara Criminal APELAÇÃO CRIMINAL Nº 5610426-17.2021.8.09.0149 COMARCA DE PALMEIRAS DE GOIÁS1ºAPELANTE: JOÃO PAULO SOUZA DA SILVA2º APELANTE: JÚLIA RODRIGUES LIMA3º APELANTE: JULIANA RODRIGUE LIMAAPELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁSRELATOR: Dr. GILMAR LUIZ COELHO – Juiz Substituto em Segundo Grau VOTO Conforme relatado, trata-se de recursos de Apelação Criminal interpostos por JOÃO PAULO SOUZA DA SILVA, nascido em 29/10/1996, respondendo ao processo em liberdade, JÚLIA RODRIGUES LIMA, nascida em 24/04/1997, respondendo ao processo em liberdade, e JULIANA RODRIGUES LIMA, nascida em 22/06/1998, respondendo ao processo em liberdade, contra a sentença condenatória proferida no Juízo da Vara Criminal da Comarca de Palmeiras de Goiás, pela MM. Juíza de Direito, Dra. Isabella Luiza Alonso Bittencourt, que absolveu os processados da imputação prevista pelo art. 35, da Lei nº 11.343/06, e os condenou pela prática do art. 33, caput, c/c art. 40, inciso VI, da Lei nº 11.343/06, fixada, a JOÃO PAULO SOUZA DA SILVA, a pena de 06 (seis) anos, 09 (nove) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, no regime inicial semiaberto, 680 (seiscentos e oitenta) dias-multa, no menor valor permitido. Às rés JULIANA RODRIGUES LIMA e JÚLIA RODRIGUES LIMA foram fixadas as penas de 05 (cinco) anos, 08 (oito) meses e 10 (dez) dias de reclusão, no regime inicial semiaberto, 565 (quinhentos e sessenta e cinco) dias-multa, no menor valor permitido. Descontente, a ré JULIANA RODRIGUES LIMA interpõe o presente recurso de apelação (mov. 220), via procurador dativo, buscando a absolvição, com base no art. 386, VII, do CPP, por insuficiência de provas. Alternativa e subsidiariamente, requer a redução da pena mediante a aplicação de maior redução pelo tráfico privilegiado ou o reconhecimento de exclusão de culpabilidade por coação moral irresistível. Em seguida, JULIANA RODRIGUES LIMA, constitui novo advogado e, junto com JOÃO PAULO SOUZA DA SILVA e JÚLIA RODRIGUES LIMA, interpõem recurso de apelação (mov. 226), indicando, em suas razões (mov.253), a nulidade das provas em razão de suposta invasão de domicílio, absolvição por ausência de provas, e, subsidiariamente, a desclassificação do delito para o de uso próprio, a aplicação da maior redução pelo tráfico privilegiado e o reconhecimento da atenuante da confissão. Pois bem. Tendo em conta a interposição de dois recursos de apelação pela ré Juliana Rodrigues Lima e em observância ao princípio da unirrecorribilidade das decisões, conheço apenas da primeira insurgência apresentada (mov. 220), e não conheço do recurso interposto pela referida ré na mov. 253, por preclusão consumativa, sem prejuízo, contudo, do amplo efeito devolutivo da apelação. Ressalta-se que a apreciação dos dois recursos far-se-á em conjunto, por didática processual e considerando a similitude de fundamentos. 1. Da preliminar de nulidade da busca domiciliar Os apelantes JOÃO PAULO SOUZA DA SILVA e JÚLIA RODRIGUES LIMA suscitaram a preliminar de nulidade das provas obtidas pela suposta vulneração do princípio da inviolabilidade domiciliar, afirmando que os policiais militares adentraram à residência sem mandado judicial ou fundadas razões para tanto. Contudo, as alegações não merecem acolhida. De acordo com os depoimentos colhidos dos policiais atuantes na ocorrência, a abordagem se deu em decorrência de denúncia anônima feita anteriormente por um vizinho, que observou movimentações suspeitas em uma residência. A denúncia indicava que o local estaria sendo utilizado para o armazenamento de entorpecentes e que João Paulo, conhecido na cidade pelo envolvimento com o tráfico de drogas, estaria diretamente ligado à situação. Diante dessas informações, a equipe policial passou a monitorar o imóvel por meio de patrulhamentos frequentes, com o objetivo de verificar qualquer movimentação suspeita que justificasse a abordagem. No dia dos fatos, ao passarem em frente à residência, os policiais avistaram João Paulo saindo pelo portão com uma caixa nas mãos, acompanhado de um menor de idade, que carregava uma sacola. Ao perceberem a presença da viatura, ambos retornaram abruptamente para o interior da casa e iniciaram fuga pelos fundos do imóvel, pulando muros em sequência. Imediatamente, os policiais acionaram reforço e ingressaram no imóvel em perseguição aos suspeitos, pulando muros e acompanhando o trajeto da fuga. Durante a ação, Júlia e Juliana, que estavam com o João Paulo e Thiago, também tentaram fugir, sendo que uma delas chegou a se ferir ao cair e machucar o joelho. João Paulo foi alcançado e detido por um tenente da equipe de apoio. Ao verificarem o conteúdo da caixa e da sacola abandonadas no momento da fuga, os policiais encontraram porções de substância semelhante à maconha. Nesse cenário, tem-se que o contexto fático que antecedeu as prisões do apelantes legitimou o ingresso dos militares nas residências, estando demonstradas a materialidade e autoria delitivas do delito, com prova robusta quanto às condutas trazer consigo e “ter em depósito”, diante da apreensão de substâncias entorpecentes, tornando inviável o acolhimento da tese de nulidade. Registra-se que o valor dos depoimentos testemunhais de policiais, sob o crivo do contraditório, reveste-se de inquestionável eficácia probatória, não podendo ser desqualificados só pelo fato de serem agentes estatais, mormente quando há harmonia nos relatos acerca da forma de abordagem dos processados, culminando na apreensão dos tóxicos. As suspeitas relatadas pelos policiais, decorrentes de investigação prévia, se confirmaram com a apreensão dos entorpecentes. Ademais, desnecessária a autorização judicial para o adentramento domiciliar, ante a presença de elementos objetivos e racionais justificadores do ingresso nas residências, ante todo o contexto narrado, o que torna a prova válida, estando amparada na exceção constitucional da situação de flagrância, nos termos do disposto no art. 5º, inciso XI, da Constituição Federal: “Art. 5º (…) XI - a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial; (...)” Sobre a prisão em flagrante nos crimes permanentes, oportuna a lição de Renato Brasileiro de Lima: “Crime permanente é aquele cuja consumação, pela natureza do bem jurídico ofendido, pode protrair-se no tempo, detendo o agente o poder de fazer cessar o estado antijurídico por ele realizado. Vejamos alguns exemplos: (...) tráfico de drogas (Lei n. 11.343/06, art. 33, caput), em algumas modalidades como guardar, trazer consigo, transportar, ter em depósito, etc. (destaquei). Nesses casos, enquanto não cessar a permanência, o agente encontra-se em situação de flagrância, ensejando, assim, a efetivação de sua prisão em flagrante, independentemente de prévia autorização judicial. Em todos esses crimes permanentes, em relação aos quais a prisão em flagrante é possível a qualquer momento, enquanto não cessar a permanência (CPP, art. 303), a Constituição Federal autoriza a violação ao domicílio mesmo sem prévia autorização judicial (art. 5º, XI). Assim, supondo-se (sublinhei) um delito de tráfico de drogas, na modalidade ‘ter em depósito’, delito de natureza permanente, no qual a consumação se prolonga no tempo e, consequentemente persiste o estado de flagrância, admite-se, ainda que em período noturno, e sem autorização judicial, o ingresso da polícia na casa em que está sendo praticado tal crime, com a consequente prisão em flagrante dos agentes e apreensão do material relativo à prática criminosa” (Código de Processo Penal comentado, Editora Jus PODIVM, p. 822). Esse o entender dos Tribunais Superiores: “Agravo regimental no recurso extraordinário com agravo. 2. Direito Processual Penal. 3. Crime do art. 16 da Lei 10.826/2003 (porte ilegal de arma) e do art. 33 da Lei 11.343/2006 (tráfico de drogas). 4. Alegada violação ao art. 5º, inciso XI, da Constituição Federal. Não configuração. Justificativa ‘a posteriori’ realizada. 5. Tema 280 da sistemática de repercussão geral. 6. Argumentos incapazes de infirmar a decisão agravada. 7. Agravo regimental a que se nega provimento.” (RE 1092572 AgR/SP, DJe-170 publicação 06/08/2019, Relator Ministro GILMAR MENDES). “AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL PENAL. LEGISLAÇÃO EXTRAVAGANTE. TRÁFICO DE DROGAS (95 G DE MACONHA). VIOLAÇÃO DO ART. 240, § 1º, DO CPP. TESE DE NULIDADE. PROVAS ILÍCITAS. TEORIA DOS FRUTOS DA ÁRVORE ENVENENADA. INVASÃO DOMICILIAR. FUNDADAS RAZÕES. (…) De tal modo, pelas narrativas dos agentes de segurança pública que atuaram no caso, e pelo cotejo dos elementos investigativos dos autos nº 0001908-29.2021.8.16.0069, assim como as em observância das circunstâncias fáticas que permeiam todo o caso em análise, restara demonstrada a preexistência de denúncia anônima, investigação e flagrante delito. 3. O Superior Tribunal de Justiça, em acréscimo, possui firme jurisprudência no sentido de que o ingresso regular em domicílio alheio depende, para sua validade e regularidade, da existência de fundadas razões (justa causa) que sinalizem para a possibilidade de mitigação do direito fundamental em questão. É dizer, somente quando o contexto fático anterior à invasão permitir a conclusão acerca da ocorrência de crime no interior da residência é que se mostra possível sacrificar o direito à inviolabilidade do domicílio. [...] No caso, consoante o quadro fático narrado pela Corte local, embora a investigação tenha iniciado em razão de denúncia anônima, foram colhidos elementos através de diligências/investigação no sentido de que o paciente estaria envolvido com o tráfico de drogas, o que afasta a alegada ilicitude da prova (AgRg nos EDcl no HC n. 773.027/SP, Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, DJe 1º/12/2022). 4. Agravo regimental desprovido. (AgRg no REsp n. 2.085.474/PR, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 18/12/2023, DJe de 20/12/2023.) No mesmo sentido a jurisprudência da Casa: “APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE DROGAS. VIOLAÇÃO DE DOMICÍLIO. INOCORRÊNCIA. CREDIBILIDADE DOS DEPOIMENTOS DOS POLICIAIS. (…) O ingresso regular em domicílio alheio depende, para sua validade e regularidade, da existência de fundadas razões (justa causa) que sinalizem para a possibilidade de mitigação do direito fundamental em questão. Quando o contexto fático anterior ao adentramento permitir a conclusão indicativa da ocorrência de crime no interior da residência, mostra-se possível sacrificar o direito à inviolabilidade do domicílio. 2. Depoimentos prestados por policiais não são, em si, inidôneos, na medida em que provém de agentes públicos no exercício de suas atribuições, especialmente quando prestados em juízo, sob o crivo do contraditório e em consonância com as demais provas coligidas nos autos. Seus relatos, colhidos à luz do contraditório e da ampla defesa, são aptos a dar suporte ao édito condenatório. 3. Comprovadas nos autos a materialidade e autoria do crime descrito no artigo 33, caput, da Lei nº 11.343/06, a condenação é medida impositiva. (...)” APELAÇÃO CONHECIDA E DESPROVIDA. (TJGO, PROCESSO CRIMINAL -> Recursos -> Apelação Criminal 0104450-36.2017.8.09.0110, Rel. Des(a). DESEMBARGADOR ITANEY FRANCISCO CAMPOS, 1ª Câmara Criminal, julgado em 14/11/2023, DJe de 14/11/2023). “APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. NULIDADE DAS PROVAS EM RAZÃO DA AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA PARA ABORDAGEM POLICIAL E INVASÃO DE DOMICÍLIO. ABSOLVIÇÃO. NÃO CABIMENTO. 1. Inexiste ilegalidade da abordagem policial quando há fundadas suspeitas da prática de ilícito, justificando a abordagem e a revista pessoal e veicular. 2. Não cabe a alegação de violação de domicílio, pois os policiais, durante abordagem em via pública, apreenderam grande quantidade de entorpecente em poder do apelante após abordagem lícita, situação ensejadora da justa causa para adentramento na residência. APELO CONHECIDO E DESPROVIDO.” (TJGO, PROCESSO CRIMINAL -> Recursos -> Apelação Criminal 5490476-48.2020.8.09.0149, Rel. Des(a). CLAUBER COSTA ABREU, 1ª Câmara Criminal, julgado em 26/10/2023, DJe de 26/10/2023). 2. Quanto ao mérito 2.1. Dos pleitos absolutórios e desclassificatório A materialidade delitiva restou comprovada pelo Auto de Prisão em Flagrante, Auto de Exibição e Apreensão, (mov. 01), Laudo de Perícia Criminal de Identificação de Drogas e Substâncias Correlatas (Exame Definitivo) mov. 171., tudo isso corroborado pelos depoimentos testemunhais colhidos ao longo das duas fases da persecução penal. No que concerne à autoria delitiva, verifica-se, indene de dúvidas, que João Paulo Souza da Silva e Tiago Souza Gonçalves, traziam consigo drogas, sendo que o primeiro segurava uma caixa contendo entorpecentes e o outro uma sacola, também com drogas no seu interior. Assim que visualizaram os policiais, eles empreenderam fuga, correndo para o interior da residência, local onde foram encontradas mais porções de drogas. Ainda que o menor Tiago Souza Gonçalves tente assumir a propriedade de toda a droga, os policiais atuantes na ocorrência afirmaram que João Paulo, no momento do flagrante, segurava uma caixa contendo maconha e que se trata de pessoa conhecida na região como traficante, bem como que no trajeto para a delegacia João Paulo pediu para que Tiago assumisse a prática do delito. A testemunha Jair Alves da Silva, policial militar, relatou, em Juízo (mídia na mov. 163), que: ”Não tem parentesco, amizade ou inimizade com os réus. Os vizinhos viram uma movimentação diferente no local e denunciaram à polícia, as denúncias estavam presentes por cerca de uma semana. No patrulhamento no local, viram João segurando uma caixa e uma pessoa menor de idade, Tiago, com uma sacola. João correu para dentro da casa e jogou a caixa pelo muro. Duas mulheres saíram correndo pelo muro. Na caixa tinha porções de maconha. A casa era alugada por João Paulo, alugada para guardar drogas. Que não chegou a falar com o proprietário da casa, porque não disseram quem era o dono da casa. O menor de idade disse que foi ao local comprar drogas. Os itens na casa não indicavam moradia. Uma das mulheres era namorada de João Paulo. Júlia e Juliana estavam dentro da casa. Não sabe se Júlia e Juliana tinham envolvimento com tráfico de drogas. Passavam com frequência pela casa por causa das denúncias; no dia do fato também houve denúncia. Um informante, usuário de drogas, informou que Juliana alugou a casa a pedido de João Paulo. Não foi encontrado com Júlia e Juliana nenhuma droga”. A testemunha Luiz Paulo Alves de Oliveira, policial militar, relatou, em Juízo (mídia na mov. 163): “Não tem parentesco, amizade ou inimizade com os réus. É de conhecimento da sociedade que o irmão de João Paulo, João Kleber, é traficante, e que João Paulo ficou responsável pelo tráfico na cidade de Palmeiras. Recebeu uma denúncia de um vizinho sobre uma movimentação estranha na casa e foram patrulhar no local. Avistaram João Paulo segurando uma caixa e Tiago com uma sacola, onde havia drogas, maconha e cocaína. Quando avistaram os policiais, ambos tentaram fugir, João Paulo soltou a casa e foi pega pelo cerco policial, enquanto Tiago foi encontrado em outra casa; Juliana e Júlia que estavam na casa foram encontradas na casa ao lado, uma delas se machucou pulando o muro. Na caixa tinha maconha, cocaína e uma balança de precisão; na sacola tinha 500g de cocaína. Ao chegarem na delegacia, João Paulo disse em alto e bom-tom para Tiago assumir a droga como sua, para “assumir o BO”. Após, foram para a casa de João Paulo, onde encontraram uma balança, ziplocs e uma porção de cocaína. Tiago disse no momento que teria ido à casa de João Paulo buscar 500g de cocaína. Julia e Juliana andavam com Tiago e João Paulo. Foi informado que Júlia alugou a casa para João Paulo. Que ainda hoje, Tiago, Júlia, Juliana e João Paulo atuam no tráfico de drogas. Não foi encontrado com Júlia e Juliana nenhuma droga. João Paulo estava de carro e Tiago de moto, ambas apreendidas”. Desse modo, ao contrário do que aponta a defesa, o Ministério Público provou a autoria pelo apelante João Paulo do delito de tráfico de drogas não havendo falar em absolvição, tampouco em desclassificação para a conduta prevista pelo art. 28 da Lei nº 11.343/06. Registra-se que a condição de usuário não é incompatível com a de traficante, pois o viciado, em geral, acaba se desviando para a atividade mercantil, em função da degeneração produzida pelo consumo excessivo de drogas. Sendo assim, cabia à defesa do recorrente comprovar que a substância se destinava ao seu consumo pessoal, ônus do qual não se desincumbiu, nos termos do que exige o art. 156 do Código de Processo Penal. Com efeito, a desclassificação da conduta de tráfico ilícito de drogas para o tipo penal de posse de drogas para consumo pessoal somente pode ser operada se restar sobejamente demonstrado nos autos o propósito único e exclusivo do consumo próprio da substância tóxica, elemento subjetivo especial do tipo não constatado no caso em comento. Nessa senda, tenho por incontestável o tráfico de drogas pelo apelante João Paulo pois a prova oral judicializada, aliada às circunstâncias da prisão, convergem à certeza quanto à finalidade de difusão ilícita da substância alucinógena, cuja constatação “independe da prática de ato explícito de comércio, desde que existam outros elementos que permitam conectar o denunciado à venda de entorpecentes, tal como ocorre nos autos (…)” (STJ, AgRg nos EDcl no RHC 123.884/MG, Rel Min. REYNALDO SOARES DA FONSECA, 5ª Turma, j. 12/05/2020). Assim, da análise das provas, tem-se que a tese da defesa do apelante João Paulo ser apenas consumidor de droga é inverossímil. Não condiz com o conjunto probatório dos autos, nem com a lógica que se permite deduzir dos fatos comprovados, mormente porque dentro da caixa de papelão que ele trazia nas mãos foram encontrados 03 (três) tabletes de maconha, acondicionados em fita plástica bege; 04 (quatro) porções de cocaína, acondicionadas em plástico filme transparente; 03 (três) porções de maconha, também acondicionadas em plástico filme transparente e 01 (uma) balança de precisão, devendo ser preservado o édito condenatório pelo delito de tráfico de entorpecentes. Relativamente às rés Juliana Rodrigues Lima e Júlia Rodrigues Lima, da análise do conjunto probatório não se extrai a certeza necessária para fundamentar contra elas um decreto condenatório pelo crime tipificado pelo artigo 33, caput da Lei nº 11.343/2006. Observa-se que os depoimentos dos policias responsáveis pelo flagrante dão conta de que visualizaram João Paulo e Thiago segurando caixa e sacola contendo as drogas, mas disseram que nada foi encontrado com Juliana e Júlia. Nada obstante a indicação de que a casa utilizada para o comércio de drogas havia sido locada por Juliana, não há provas da informação nos autos, sequer consta a indicação do nome do proprietário do imóvel para verificação do alegado. Ainda, o fato de elas terem fugido do local pulando muros após a abordagem policial, desacompanhado de outros elementos seguros da atuação delitiva de ambas, não se mostra suficiente a solução condenatória. Também não foram arroladas outras testemunhas que pudessem indicar a atuação das rés com João Paulo e Thiago na prática da traficância, de modo que os fatos narrados trazem incerteza acerca do envolvimento de Juliana e Júlia na prática do delito previsto pelo art. 33, da Lei nº 11.343/06, e, ainda que haja indícios de que elas agiam com os rapazes no comércio espúrio, não há nos autos provas suficientes, cabais, de que elas, de fato, participaram da conduta delituosa pela qual foram condenadas. É cediço que o processo penal não autoriza conclusões condenatórias baseadas somente em suposições ou indícios. A prova deve estar clara, escorreita e sem qualquer dúvida a respeito da autoria do delito para ensejar sentença condenatória. Na hipótese dos autos, a prova de que JULIANA e JÚLIA RODRIGUES LIMA praticaram o crime de tráfico de drogas mostra-se frágil e insegura, sendo incapaz de solver a dúvida que milita em favor das acusadas, que negam a autoria. Para a caracterização do crime de tráfico de drogas é necessário que reste evidenciada a vontade livre e consciente de praticar qualquer conduta descrita no tipo penal do artigo 33, caput, da Lei nº 11.343/06, com o intuito de difundir ilicitamente a droga. Assim, da análise do contexto probatório não se tem prova cabal do envolvimento de JULIANA e JÚLIA com a droga apreendida, de forma que a autoria imputada a elas não resta patenteada nos autos. Cediço que o ônus da prova cabe às partes, devendo a acusação demonstrar de forma plena e convincente a imputação descrita na denúncia, bastando que haja dúvida quanto aos fatos para que prevaleça o princípio do in dubio pro reo. (TJGO, Apelação Criminal 5104925-47.2021.8.09.0018, Rel. Des. Adegmar José Ferreira, 1ª Câmara Criminal, julgado em 31/01/2023, DJe de 31/01/2023.) No caso, a acusação não conseguiu provar que JULIANA e JÚLIA RODRIGUES LIMA participaram, de qualquer forma, do crime de tráfico de drogas, impondo-se, assim, sua absolvição por insuficiência de provas, nos termos do artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal. Sendo assim, reformo a decisão atacada e, por conseguinte, absolvo as rés JULIANA RODRIGUES LIMA e JÚLIA RODRIGUES LIMA, da prática do delito previsto pelo art. 33, caput, da Lei nº 11.343/06. 3. Da pena imposta ao réu João Paulo Souza da Silva Na 1ª fase da dosimetria, de maneira escorreita, a sentenciante valorou desfavoravelmente ao réu a natureza e quantidade das drogas, impondo a sanção inicial em 05 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão, quantitativo que não merece reparos, porquanto nos termos do artigo 42 da Lei n. 11.343/06, é correta a utilização da natureza/quantidade da droga apreendida para afastar a pena-base do mínimo legal. Em relação ao quantum de aumento de pena na primeira fase da dosimetria, a jurisprudência das Cortes Superiores firmou-se no sentido de que os parâmetros para a exasperação da reprimenda devem observar o critério da discricionariedade juridicamente vinculada, a qual, por sua vez, está submetida aos princípios da proporcionalidade, da razoabilidade, da suficiência da reprovação e da prevenção ao crime. Por tais razões, não se admite a adoção de critério meramente matemático, atrelado apenas ao número de circunstâncias judiciais desfavoráveis. Deve-se, na verdade, analisar os elementos que indiquem eventual gravidade concreta do delito, além das condições pessoais de cada agente, de forma que uma circunstância judicial desfavorável poderá receber mais desvalor que outra, exatamente em obediência aos princípios da individualização da pena e da própria proporcionalidade. Dentro desse contexto e observada a conduta em concreto, o aumento da pena-base em razão da natureza da droga apreendida é idôneo e proporcional, além de estar em consonância com o disposto no art. 42 da Lei nº 11.343/2006, e com a jurisprudência firmada acerca do tema Logo, não há alterações a serem realizadas na pena-base. Na 2ª fase, corretamente reconhecida a ausência de atenuantes e agravantes, mormente porque não verificada a confissão da prática delitiva, o que obsta o reconhecimento da atenuante, mantenho a pena intermediária em 05 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão. Na 3ª fase, a magistrada deixou de reconhecer a causa de diminuição do tráfico privilegiado ao argumento de que o réu possui ações penais em andamento, contudo, a justificativa apresentada contraria o entendimento do Tema Repetitivo 1139, que prevê “É vedada a utilização de inquéritos e/ou ações penais em curso para impedir a aplicação do art. 33, § 4.º, da Lei n. 11.343/06”, razão pela qual reformo a sentença no ponto mencionado, para reconhecer que o réu faz jus à referida minorante. Desse modo, reduzo a reprimenda intermediária em 2/3 (dois terços), concretizando a pena em 01 (um) ano, 11 (onze) meses e 10 (dez) dias de reclusão. Em seguida, acertadamente reconhecida a causa de aumento prevista pelo art. 40, inciso VI, da Lei nº 11.343/06, mantenho a majoração da pena em 1/6 (um sexto), mínimo legal, ficando a pena definitiva do apelante João Paulo, após a alteração aqui procedida, em 02 (dois) anos, 03 (três) meses e 06 (seis) dias de reclusão, e 226 (duzentos e vinte e seis) dias-multa, no menor valor permitido. Na mesma linha, tendo em conta o quantum da pena reformada, altero o regime inicial de cumprimento de pena para o aberto, ex vi do artigo 33, §2º 'c', e § 3º, do Código Penal. Presentes os requisitos do artigo 44 do Código Penal, substituo a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária, no valor de 01 (um) salário-mínimo, em termos e condições a serem estabelecidas pelo Juízo da Execução Penal.Dispositivo: Ao cabo do exposto, acolhendo, em parte, o parecer Ministerial de Cúpula, conheço, em parte, dos recursos de apelação, DOU PROVIMENTO aos recursos interpostos por JULIANA RODRIGUES LIMA e JÚLIA RODRIGUES LIMA, para absolvê-las com fundamento no art. 386, inciso VII, do Código de Processo Penal, conforme explanado no voto. DOU PARCIAL PROVIMENTO ao recurso interposto por JOÃO PAULO SOUZA DA SILVA, para aplicar a causa de diminuição de pena prevista no artigo 33, §4º, da Lei n. 11.343/06, no patamar máximo de 2/3 (dois terços), reduzindo a pena corpórea e de multa; alterar o regime expiatório para o aberto e possibilitar a substituição da pena corpórea por restritivas. É como voto. GILMAR LUIZ COELHOJuiz Substituto em Segundo GrauRELATOR(Datado e assinado eletronicamente) APELAÇÃO CRIMINAL Nº 5610426-17.2021.8.09.0149 COMARCA DE PALMEIRAS DE GOIÁS1ºAPELANTE: JOÃO PAULO SOUZA DA SILVA2º APELANTE: JÚLIA RODRIGUES LIMA3º APELANTE: JULIANA RODRIGUE LIMAAPELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁSRELATOR: Dr. GILMAR LUIZ COELHO – Juiz Substituto em Segundo Grau Ementa: DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. INVASÃO DOMICILIAR. NULIDADE DAS PROVAS AFASTADA. ABSOLVIÇÃO POR INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. APLICAÇÃO DO TRÁFICO PRIVILEGIADO. REDUÇÃO DE PENA. SUBSTITUIÇÃO POR RESTRITIVAS DE DIREITOS. PROVIMENTO PARCIAL.I. CASO EM EXAME1. Apelações criminais interpostas por João Paulo Souza da Silva, Júlia Rodrigues Lima e Juliana Rodrigues Lima contra sentença condenatória que os absolveu da imputação do art. 35 da Lei nº 11.343/06 e os condenou pelo crime de tráfico de drogas (art. 33, caput, c/c art. 40, VI, da mesma lei). João Paulo foi condenado à pena de 6 anos, 9 meses e 20 dias de reclusão, em regime semiaberto, e as rés Júlia e Juliana à pena de 5 anos, 8 meses e 10 dias de reclusão, também em regime semiaberto. Os recorrentes alegaram nulidade por suposta invasão domiciliar, pleitearam absolvição por ausência de provas e, subsidiariamente, desclassificação da conduta, reconhecimento de tráfico privilegiado e aplicação da confissão como atenuante.II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO2. Há três questões em discussão: (i) analisar se é nula a prova decorrente do ingresso policial no domicílio dos réus sem mandado judicial; (ii) verificar se há prova suficiente para a condenação das rés Júlia e Juliana Rodrigues Lima; (iii) apurar se João Paulo Souza da Silva faz jus à redução da pena pela incidência do tráfico privilegiado e à substituição da pena privativa de liberdade.III. RAZÕES DE DECIDIR3. O ingresso dos policiais na residência dos apelantes é válido, pois amparado em fundadas razões derivadas de denúncia anônima, vigilância prévia, comportamento suspeito e flagrante delito, conforme prevê a exceção constitucional à inviolabilidade do domicílio (CF/1988, art. 5º, XI).4. A abordagem dos policiais, relatada de forma coesa e corroborada por demais elementos de prova, justifica a regularidade das diligências, não havendo vício que invalide as provas obtidas.5. A absolvição das rés Júlia e Juliana Rodrigues Lima se impõe por insuficiência de provas, pois não foram encontradas drogas em sua posse, não houve testemunho direto de sua participação no tráfico e o fato de estarem no local não é suficiente para a condenação.6. A condenação de João Paulo Souza da Silva encontra-se amparada em provas robustas, incluindo flagrante com grande quantidade de drogas.7. A sentença deixou de aplicar indevidamente a causa de diminuição prevista no art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/06, com fundamento em ações penais em curso, em afronta ao entendimento firmado no Tema Repetitivo 1139 do STJ, devendo ser reconhecido o tráfico privilegiado.8. A pena de João Paulo deve ser reduzida em 2/3, com consequente fixação de regime aberto e substituição por duas penas restritivas de direitos, por preenchimento dos requisitos do art. 44 do Código Penal.IV. DISPOSITIVO E TESE9. Recursos parcialmente providos.Tese de julgamento:É válida a prova obtida por ingresso domiciliar quando amparada em fundadas razões, denúncia anônima, diligência prévia e flagrante delito, conforme o art. 5º, XI, da CF/1988.A absolvição por insuficiência de provas impõe-se quando inexistem elementos seguros e inequívocos de autoria delitiva, especialmente em delitos que exigem dolo específico.A existência de inquéritos ou ações penais em curso não obsta a aplicação da causa de diminuição de pena prevista no art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/06.Preenchidos os requisitos do art. 44 do Código Penal, a pena privativa de liberdade pode ser substituída por restritivas de direitos, mesmo nos crimes de tráfico privilegiado.Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, XI; CPP, arts. 386, VII; CP, arts. 33, § 2º, c, § 3º, e 44; Lei nº 11.343/06, arts. 33, caput, § 4º, e 40, VI.Jurisprudência relevante citada: STJ, AgRg nos EDcl no HC n. 773.027/SP, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, 5ª Turma, j. 01/12/2022, DJe 01/12/2022; STJ, AgRg no REsp n. 2.085.474/PR, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, 6ª Turma, j. 18/12/2023, DJe 20/12/2023; TJGO, ApC 0104450-36.2017.8.09.0110, Rel. Des. Itaney Francisco Campos, j. 14/11/2023; TJGO, ApC 5104925-47.2021.8.09.0018, Rel. Des. Adegmar José Ferreira, j. 31/01/2023; STJ, AgRg nos EDcl no RHC 123.884/MG, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, 5ª Turma, j. 12/05/2020. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os presentes autos da Apelação Criminal nº 5610426-17.2021.8.09.0149 ACORDAM os integrantes da Segunda Turma Julgadora da Terceira Câmara Criminal do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, na sessão virtual do dia 16 de junho de 2025, proferir deliberação no expediente conforme votação e composição registradas no extrato de ata do respectivo julgamento, à unanimidade, em conhecer em parte dos recursos e dar-lhe provimento ao segundo e terceiro apelante e dar parcialmente ao primeiro apelo, nos termos do voto do Relator. Presidiu a sessão o Desembargador Donizete Martins de Oliveira. Procuradoria-Geral de Justiça representada conforme extrato da ata. Goiânia, 16 de junho de 2025. GILMAR LUIZ COELHOJuiz Substituto em Segundo GrauRELATOR(Datado e assinado eletronicamente)B2

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Processo nº 5215797-82.2022.8.09.0087

ID: 299453415

Tribunal: TJGO Órgão: 3ª Câmara Criminal Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO SUMáRIO Nº Processo: 5215797-82.2022.8.09.0087

Data de Disponibilização: 16/06/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

CELSOMAR HENRIQUE ANASTACIO

Relatório e Voto

Advogados:

FELIPE PEREIRA DE ALMEIDA

OAB/GO XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO Tribunal de Justiça do Estado de Goiás Gabinete Desembargador Roberto Horácio Rezende 3ª Câmara Criminal APELAÇÃO CRIMINAL Nº 5215797-82.2022.8.09.… PODER JUDICIÁRIO Tribunal de Justiça do Estado de Goiás Gabinete Desembargador Roberto Horácio Rezende 3ª Câmara Criminal APELAÇÃO CRIMINAL Nº 5215797-82.2022.8.09.0087 COMARCA DE ITUMBIARA 1ºAPELANTE: WILLIAN DA SILVA ALVES JÚNIOR 2º APELANTE: CELSOMAR HENRIQUE ANASTÁCIO APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS RELATOR: Desembargador ROBERTO HORÁCIO REZENDE VOTO Presentes os pressupostos de admissibilidade dos recursos, deles conheço. Conforme relatado, trata-se de recursos de Apelação Criminal interpostos por WILLIAN DA SILVA ALVES JÚNIOR, nascido em 12/11/1999, respondendo ao processo em liberdade, e CELSOMAR HENRIQUE ANASTÁCIO, nascido em 01/01/1992, respondendo ao processo em liberdade, contra a sentença condenatória proferida no Juízo da 2ª Vara Criminal da Comarca de Itumbiara, pela MM. Juíza de Direito, Dra. Natácia Lopes Magalhães, pela prática dos crimes tipificados pelo pelo art. 33, caput, e 35, da Lei nº 11.343/06, fixada, a CELSOMAR HENRIQUE ANASTÁCIO, a pena total de 08 (oito) anos, 05 (cinco) meses e 15 (quinze) dias de reclusão, no regime inicial fechado, 1.158 (mil cento e cinquenta e oito) dias-multa, no menor valor permitido. Ao réu WILLIAN DA SILVA ALVES JÚNIOR estabeleceu-se a pena de 09 (nove) anos de reclusão, no regime inicial fechado, 1.300 (mil e trezentos) dias-multa, no menor valor permitido. Condenados, ainda, cada um dos réus, ao pagamento de indenização por danos morais coletivos, no valor de 05 (cinco) salários-mínimos. Descontente, o processado WILLIAN DA SILVA ALVES JÚNIOR interpõe o presente recurso de apelação (mov. 232), indicando, preliminarmente, i) ilicitude das provas produzidas nos autos ante a inobservância do direito à inviolabilidade domiciliar; ii) nulidade decorrente da quebra de cadeia de custódia. Alternativa e subsidiariamente, requer a absolvição da imputação por insuficiência de provas, a desclassificação da conduta para a prevista no art. 28, da Lei nº 11.343/06 ou a redução da pena imposta mediante incidência da menor fração redutora pelo tráfico privilegiado, a redução do valor fixado a título indenizatório e a isenção das custas processuais. Também irresignado, o processado CELSOMAR HENRIQUE ANASTÁCIO, igualmente, interpõe recurso de apelação (mov. 239), indicando a preliminar de nulidade em razão da quebra da cadeia de custódia. No mérito, requer a absolvição das imputações ou a aplicação da pena no mínimo legal com aplicação da causa de redução prevista pelo art. 46, da Lei nº 11.343/06. Pois bem. Ressalta-se que a apreciação dos recursos far-se-á em conjunto, por didática processual e considerando a similitude de fundamentos. 1. Das preliminares 1.1.Nulidade da busca domiciliar O apelante Willian da Silva Alves Júnior, levantou a preliminar de nulidade das provas obtidas pela suposta vulneração do princípio da inviolabilidade domiciliar, sob alegação de que os policiais militares adentraram a sua residência sem mandado judicial ou fundadas razões para tanto. Contudo, as alegações não merecem acolhida. De acordo com os depoimentos colhidos dos policiais civis Romendes Antônio do Carmo, Glaiton Sílvio Simplício Campos e Tito Velhinho Silveira Lima, em juízo (mídia na mov.196), foram recebidas denúncias anônimas apontando que os recorrentes estariam envolvidos, de forma conjunta, com o tráfico de drogas em suas respectivas residências. Os policiais afirmaram que, para verificar a procedência dessas informações recebidas, realizaram diversas ações de vigilância nos endereços indicados e que durante essas observações, feitas em dias e horários variados, identificou-se uma movimentação constante de pessoas nas casas dos acusados, condizente com a prática de tráfico. Segundo os relatos, pessoas já conhecidas da polícia por serem usuárias de entorpecentes chegavam aos locais, batiam nas portas, eram atendidas rapidamente e saíam logo em seguida. Esse comportamento não correspondia a visitas de natureza social, como de amigos ou parentes. Embora não tenha havido abordagens diretas aos indivíduos que frequentavam as residências investigadas — principalmente porque, conforme esclareceu a testemunha Tito, a interceptação de usuários nas proximidades poderia prejudicar o andamento da investigação —, a conclusão de que ali ocorria tráfico de drogas não foi baseada apenas em suposições. Primeiramente, porque os frequentadores já eram identificados pela polícia como usuários, devido a abordagens anteriores; em segundo lugar, porque o padrão de comportamento observado era bastante característico: os visitantes permaneciam por pouquíssimo tempo nos locais. Os policiais, também, relataram de forma unânime que os acusados visitavam frequentemente as casas um do outro. Notou-se, inclusive, que após as idas de Celsomar à residência de William, a movimentação de usuários aumentava de maneira expressiva, sugerindo que Celsomar estaria reabastecendo William com entorpecentes. No dia da ocorrência, os agentes, ao perceberem uma movimentação fora do comum, abordaram William no momento em que ele deixava sua casa. Durante a revista, encontrou-se uma porção de maconha em sua posse. Ao ser questionado, William confirmou ter mais drogas em casa e apontou Celsomar como seu fornecedor, indicando ainda que o restante dos entorpecentes estava na residência deste. Na casa de William, os policiais encontraram dezenas de porções de drogas já fracionadas e preparadas para venda. Com base nessas informações, uma equipe se deslocou até a residência de Celsomar, onde foram localizadas outras quantidades de entorpecentes, além de dinheiro e uma balança de precisão. Nesse cenário, tem-se que o contexto fático que antecedeu as prisões do apelantes legitimou o ingresso dos militares nas residências, estando demonstradas a materialidade e autoria delitivas de ambos os delitos, com prova robusta quanto às condutas trazer consigo e “ter em depósito”, diante da apreensão de substâncias entorpecentes, tornando inviável o acolhimento das teses de nulidade. Registra-se que o valor dos depoimentos testemunhais de policiais, sob o crivo do contraditório, reveste-se de inquestionável eficácia probatória, não podendo ser desqualificados só pelo fato de serem agentes estatais, sobretudo quando há harmonia nos relatos acerca da forma de abordagem dos processados, culminando na apreensão dos tóxicos. As suspeitas relatadas pelos policiais, decorrentes de investigação prévia, se confirmaram com a apreensão dos entorpecentes. Ademais, desnecessária a autorização judicial para o adentramento domiciliar, ante a presença de elementos objetivos e racionais justificadores do ingresso nas residências, ante todo o contexto narrado, o que torna a prova válida, estando amparada na exceção constitucional da situação de flagrância, nos termos do disposto no art. 5º, inciso XI, da Constituição Federal: “Art. 5º (…) XI - a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial; (...)” Sobre a prisão em flagrante nos crimes permanentes, oportuna a lição de Renato Brasileiro de Lima: “Crime permanente é aquele cuja consumação, pela natureza do bem jurídico ofendido, pode protrair-se no tempo, detendo o agente o poder de fazer cessar o estado antijurídico por ele realizado. Vejamos alguns exemplos: (...) tráfico de drogas (Lei n. 11.343/06, art. 33, caput), em algumas modalidades como guardar, trazer consigo, transportar, ter em depósito, etc. (destaquei). Nesses casos, enquanto não cessar a permanência, o agente encontra-se em situação de flagrância, ensejando, assim, a efetivação de sua prisão em flagrante, independentemente de prévia autorização judicial. Em todos esses crimes permanentes, em relação aos quais a prisão em flagrante é possível a qualquer momento, enquanto não cessar a permanência (CPP, art. 303), a Constituição Federal autoriza a violação ao domicílio mesmo sem prévia autorização judicial (art. 5º, XI). Assim, supondo-se (sublinhei) um delito de tráfico de drogas, na modalidade ‘ter em depósito’, delito de natureza permanente, no qual a consumação se prolonga no tempo e, consequentemente persiste o estado de flagrância, admite-se, ainda que em período noturno, e sem autorização judicial, o ingresso da polícia na casa em que está sendo praticado tal crime, com a consequente prisão em flagrante dos agentes e apreensão do material relativo à prática criminosa” (Código de Processo Penal comentado, Editora Jus PODIVM, p. 822). Esse o entender dos Tribunais Superiores: “Agravo regimental no recurso extraordinário com agravo. 2. Direito Processual Penal. 3. Crime do art. 16 da Lei 10.826/2003 (porte ilegal de arma) e do art. 33 da Lei 11.343/2006 (tráfico de drogas). 4. Alegada violação ao art. 5º, inciso XI, da Constituição Federal. Não configuração. Justificativa ‘a posteriori’ realizada. 5. Tema 280 da sistemática de repercussão geral. 6. Argumentos incapazes de infirmar a decisão agravada. 7. Agravo regimental a que se nega provimento.” (RE 1092572 AgR/SP, DJe-170 publicação 06/08/2019, Relator Ministro GILMAR MENDES). “AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL PENAL. LEGISLAÇÃO EXTRAVAGANTE. TRÁFICO DE DROGAS (95 G DE MACONHA). VIOLAÇÃO DO ART. 240, § 1º, DO CPP. TESE DE NULIDADE. PROVAS ILÍCITAS. TEORIA DOS FRUTOS DA ÁRVORE ENVENENADA. INVASÃO DOMICILIAR. FUNDADAS RAZÕES. (…) De tal modo, pelas narrativas dos agentes de segurança pública que atuaram no caso, e pelo cotejo dos elementos investigativos dos autos nº 0001908-29.2021.8.16.0069, assim como as em observância das circunstâncias fáticas que permeiam todo o caso em análise, restara demonstrada a preexistência de denúncia anônima, investigação e flagrante delito. 3. O Superior Tribunal de Justiça, em acréscimo, possui firme jurisprudência no sentido de que o ingresso regular em domicílio alheio depende, para sua validade e regularidade, da existência de fundadas razões (justa causa) que sinalizem para a possibilidade de mitigação do direito fundamental em questão. É dizer, somente quando o contexto fático anterior à invasão permitir a conclusão acerca da ocorrência de crime no interior da residência é que se mostra possível sacrificar o direito à inviolabilidade do domicílio. [...] No caso, consoante o quadro fático narrado pela Corte local, embora a investigação tenha iniciado em razão de denúncia anônima, foram colhidos elementos através de diligências/investigação no sentido de que o paciente estaria envolvido com o tráfico de drogas, o que afasta a alegada ilicitude da prova (AgRg nos EDcl no HC n. 773.027/SP, Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, DJe 1º/12/2022). 4. Agravo regimental desprovido. (AgRg no REsp n. 2.085.474/PR, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 18/12/2023, DJe de 20/12/2023.) No mesmo sentido a jurisprudência da Casa: “APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE DROGAS. VIOLAÇÃO DE DOMICÍLIO. INOCORRÊNCIA. CREDIBILIDADE DOS DEPOIMENTOS DOS POLICIAIS. (…) O ingresso regular em domicílio alheio depende, para sua validade e regularidade, da existência de fundadas razões (justa causa) que sinalizem para a possibilidade de mitigação do direito fundamental em questão. Quando o contexto fático anterior ao adentramento permitir a conclusão indicativa da ocorrência de crime no interior da residência, mostra-se possível sacrificar o direito à inviolabilidade do domicílio. 2. Depoimentos prestados por policiais não são, em si, inidôneos, na medida em que provém de agentes públicos no exercício de suas atribuições, especialmente quando prestados em juízo, sob o crivo do contraditório e em consonância com as demais provas coligidas nos autos. Seus relatos, colhidos à luz do contraditório e da ampla defesa, são aptos a dar suporte ao édito condenatório. 3. Comprovadas nos autos a materialidade e autoria do crime descrito no artigo 33, caput, da Lei nº 11.343/06, a condenação é medida impositiva. (...)” APELAÇÃO CONHECIDA E DESPROVIDA. (TJGO, PROCESSO CRIMINAL -> Recursos -> Apelação Criminal 0104450-36.2017.8.09.0110, Rel. Des(a). DESEMBARGADOR ITANEY FRANCISCO CAMPOS, 1ª Câmara Criminal, julgado em 14/11/2023, DJe de 14/11/2023) “APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. NULIDADE DAS PROVAS EM RAZÃO DA AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA PARA ABORDAGEM POLICIAL E INVASÃO DE DOMICÍLIO. ABSOLVIÇÃO. NÃO CABIMENTO. 1. Inexiste ilegalidade da abordagem policial quando há fundadas suspeitas da prática de ilícito, justificando a abordagem e a revista pessoal e veicular. 2. Não cabe a alegação de violação de domicílio, pois os policiais, durante abordagem em via pública, apreenderam grande quantidade de entorpecente em poder do apelante após abordagem lícita, situação ensejadora da justa causa para adentramento na residência. APELO CONHECIDO E DESPROVIDO.” (TJGO, PROCESSO CRIMINAL -> Recursos -> Apelação Criminal 5490476-48.2020.8.09.0149, Rel. Des(a). CLAUBER COSTA ABREU, 1ª Câmara Criminal, julgado em 26/10/2023, DJe de 26/10/2023). 1.2. Nulidade por quebra da cadeia de custódia Ambos os apelantes suscitaram a preliminar de nulidade das provas por quebra da cadeia de custódia, indicando mácula no armazenamento e análise das drogas apreendidas. Contudo, não se verifica a presença de indícios de que a fonte de prova tenha sido modificada, maculada, adulterada, ou mesmo substituída. Cediço que a Lei 13.964/2019, vigente desde 23/01/2020, inseriu no Código de Processo Penal conceitos de criminalística acerca de local de crime, visando a preservação da história cronológica do vestígio por meio da documentação da cadeia de custódia. Em relação ao crime de tráfico de entorpecentes, o vestígio, que poderá se tornar a evidência do crime, é material fungível normalmente transportado pelo indivíduo acusado, que deve ser encaminhado pelo policial militar à Delegacia de Polícia que, por sua vez, remeterá ao instituto de criminalística para a realização do laudo pericial. No caso dos autos, observou-se o procedimento. Verifica-se que, na data da prisão em flagrante, após coleta da droga na cena do crime, os policiais a transportaram e a entregaram à autoridade policial. Na Delegacia, documentou-se a apreensão das drogas, lavrando-se o termo de exibição e apreensão correspondente (Termo de Exibição e Apreensão mov. 01, fl. 41). Então, a Delegacia de Itumbiara encaminhou a droga para a Superintendência de Polícia Técnico-Científica, onde se realizou o exame de constatação provisório da droga, com registro SPI 280 RG 19676/2022. Ficou consignado no referido laudo que os materiais submetidos a teste químico tratavam-se de cocaína e maconha, além da informação de que o material estava submetido ao lacre de n.º 195313, e, após descontada a quantidade consumida nas primeiras análises, foi encaminhado à delegacia requisitante para exames complementares sob novo número de lacre, agora 195314. (mov. 01, fl. 54). Em seguida, a Polícia Científica efetuou o laudo pericial definitivo RG 19677/2022 – SEQFOR 5087/2022 (mov. 57), constatando que de fato as substâncias apreendidas eram maconha e cocaína, e indicando que “O material encaminhado para exame, ao que consta, é proveniente de amostragem do material descrito no Laudo de Constatação identificado com RG 19676/2022 SPI/SQ 280/2022.” Assim, possível verificar o histórico de encaminhamento da droga, e não há identificação de possível irregularidade na destinação do material ilícito apreendido até a chegada aos peritos, sobretudo porque as substâncias foram minuciosamente descritas nos documentos. A diferença na numeração dos lacres constantes do laudo de constatação provisório e do laudo pericial definitivo, não gera, por si só, nulidade da prova, sobretudo quando verificado que o laudo definitivo menciona que as substâncias analisadas naquele momento eram as provenientes do material apreendido no laudo provisório, mov. 57. A cadeia de custódia não é um fim em si, não é elemento apto a demonstrar a veracidade ou falsidade de afirmações sobre fatos. Eventual irregularidade verificada na cadeia, ou seja, a eventual quebra da cadeia de custódia, não gera, necessariamente, a ilicitude ou ilegitimidade da prova. Esse, aliás, é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, “O instituto da quebra da cadeia de custódia refere-se à idoneidade do caminho que deve ser percorrido pela prova até sua análise pelo magistrado, e uma vez ocorrida qualquer interferência durante o trâmite processual, esta pode implicar, mas não necessariamente, a sua imprestabilidade (AgRg no RHC n. 147.885/SP, relator Ministro OLINDO MENEZES (Desembargador Convocado do TRF 1ª Região), Sexta Turma, julgado em 7/12/2021, DJe de 13/12/2021)” (5ª Turma, AgRg nos EDcl no REsp n. 2.039.175/PR, Rel. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, j. 18/4/2023, DJe de 24/4/2023). Para que uma prova seja tida por imprestável, ilegítima ou ilícita, é necessário que, além da quebra da cadeia de custódia, haja algum indício de que a fonte de prova tenha sido modificada, maculada, adulterada, substituída, o que não ocorreu no presente caso, pois não há nenhum elemento que indique tais vícios apenas pela diferença nos números dos lacres. Verifico que a quantidade e a natureza de droga apreendida, referidas no termo de apreensão, são aquelas descritas tanto no laudo de constatação provisório quanto no laudo definitivo de identificação de droga. Por isso, não há identificação de possível irregularidade na destinação do material ilícito apreendido até a chegada aos peritos, sobretudo porque as substâncias foram minuciosamente descritas nos documentos mencionados. De forma que o procedimento previsto nos arts. 158-A a 158-F do CPP foi observado, não havendo falar, portanto, em nulidade. Rechaçadas as preliminares, passo a análise do mérito recursal. 2. Quanto ao mérito 2.1. Do pleito absolutório e desclassificatório formulado por WILLIAN DA SILVA ALVES JÚNIOR A materialidade e autoria delitivas restaram comprovadas pelo Auto de Prisão em Flagrante, Auto de Exibição e Apreensão, (mov. 01), Laudo de Perícia Criminal de Identificação de Drogas e Substâncias Correlatas (Exame Definitivo) mov. 57, tudo isso corroborado pelos depoimentos testemunhais colhidos ao longo das duas fases da persecução penal. Ouvido na investigação judicial, o 1º apelante, Willian da Silva Alves Júnior, negou a autoria do crime imputado, dizendo ser usuário de entorpecentes e não ter contato com Celsomar. Todavia, a sua versão dos fatos enfrenta os elementos de convicção dos autos, que indicam, de forma segura, que ele mantinha em depósito porções de drogas para comercialização, tendo sido encontradas 14 (quatorze) porções de crack, sendo 12 embaladas individualmente em plástico e duas sem embalagem: 04 (quatro) porções de crack fragmentadas (pulverizadas); 01 (um) tablete grande de maconha: 02 (dois) pequenas porções de maconha. Desse modo, ao contrário do que aponta a defesa, o Ministério Público provou a autoria pelo 1º apelante do delito de tráfico de drogas não havendo falar em absolvição, tampouco em desclassificação para a conduta prevista pelo art. 28 da Lei nº 11.343/06. Registra-se que a condição de usuário não é incompatível com a de traficante, pois o viciado, em geral, acaba se desviando para a atividade mercantil, em função da degeneração produzida pelo consumo excessivo de drogas. Sendo assim, cabia à defesa do recorrente comprovar que a substância se destinava ao seu consumo pessoal, ônus do qual não se desincumbiu, nos termos do que exige o art. 156 do Código de Processo Penal. Com efeito, a desclassificação da conduta de tráfico ilícito de drogas para o tipo penal de posse de drogas para consumo pessoal somente pode ser operada se restar sobejamente demonstrado nos autos o propósito único e exclusivo do consumo próprio da substância tóxica, elemento subjetivo especial do tipo não constatado no caso em comento. Nessa senda, tenho por incontestável o tráfico de drogas pelo apelante, pois a prova oral judicializada, aliada às circunstâncias da prisão, convergem à certeza quanto à finalidade de difusão ilícita da substância alucinógena, cuja constatação “independe da prática de ato explícito de comércio, desde que existam outros elementos que permitam conectar o denunciado à venda de entorpecentes, tal como ocorre nos autos (…)” (STJ, AgRg nos EDcl no RHC 123.884/MG, Rel Min. REYNALDO SOARES DA FONSECA, 5ª Turma, j. 12/05/2020). Assim, da análise das provas, tem-se que a tese da defesa do 1º apelante ser apenas consumidor de droga é inverossímil. Não condiz com o conjunto probatório dos autos, nem com a lógica que se permite deduzir dos fatos comprovados, devendo ser preservado o édito condenatório pelo delito de tráfico de entorpecentes. 2.2. Do pleito absolutório formulado por CELSOMAR HENRIQUE ANASTÁCIO quanto ao delito de tráfico de entorpecentes Celsomar, o 2º apelante, também, negou a traficância, mas, sua negativa de autoria não encontra respaldo na prova dos autos, eis que abordado pelos policiais após investigação que dava conta de intensa movimentação na porta de sua residência, local onde foram apreendidas 27 (vinte e sete) porções de crack embaladas individualmente em plástico; 01 (uma) balança digital e a quantia de R$ 266,00 (duzentos e sessenta e seis reais). Vê-se, portanto, que a versão do 2º apelante de que não havia drogas em sua residência, carece de credibilidade, tendo em vista a prova colhida nos autos, mormente o testemunho dos policiais ouvidos em juízo, esclarecendo as circunstâncias que envolveram a prisão em flagrante de Celsomar, nos termos da denúncia, em depoimentos convergentes e harmônicos entre si. Ressalte-se que os agentes estatais possuem fé pública, de maneira que seus depoimentos só podem ser desconsiderados mediante prova robusta, o que não se verifica, já que os testemunhos, congruentes e harmoniosos entre si, foram prestados em juízo, em respeito aos princípios do contraditório e da ampla defesa. Confira-se: “APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE DROGAS. VIOLAÇÃO DE DOMICÍLIO. INOCORRÊNCIA. CREDIBILIDADE DOS DEPOIMENTOS DOS POLICIAIS. (…) Depoimentos prestados por policiais não são, em si, inidôneos, na medida em que provém de agentes públicos no exercício de suas atribuições, especialmente quando prestados em juízo, sob o crivo do contraditório e em consonância com as demais provas coligidas nos autos. Seus relatos, colhidos à luz do contraditório e da ampla defesa, são aptos a dar suporte ao édito condenatório. (…)” (TJGO, PROCESSO CRIMINAL -> Recursos -> Apelação Criminal 0104450-36.2017.8.09.0110, Rel. Des(a). DESEMBARGADOR ITANEY FRANCISCO CAMPOS, 1ª Câmara Criminal, julgado em 14/11/2023, DJe de 14/11/2023). Não há, dentre os elementos obtidos no curso da instrução processual, qualquer indício apto a desmerecer as afirmações dos policiais atuantes na ocorrência que culminou na prisão dos apelantes, razão para a validação dos depoimentos prestados e, consequentemente, a preservação da condenação. Também não há falar no acolhimento do pleito de isenção de pena previsto pelo art. 45, da Lei nº 11.343/06, pois o referido dispositivo somente se aplica em caso de inteira incapacidade de se determinar, hipótese que não se aplica ao réu porquanto o laudo de insanidade mental atestou que “ao tempo da ação era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato e parcialmente capaz de se determinar.”(mov. 83). 3. Do crime de associação para o tráfico, previsto pelo art. 35, da Lei nº 11.343/06. Para a configuração do crime de associação para o tráfico, é necessária a união de duas ou mais pessoas com o fim de praticar, reiteradamente ou não, algum dos delitos previstos nos artigos 33, caput, e §1º, ou 34 da Lei de Antidrogas. É imprescindível o dolo de se associar com estabilidade e permanência, uma vez que a reunião ocasional de duas ou mais pessoas não é suficiente para a configuração do tipo previsto pelo art. 35 da Lei 11.343/2006. Portanto, para haver o crime autônomo de associação para o tráfico, é imprescindível que os agentes estejam agindo em liame subjetivo com a finalidade permanente de tráfico de drogas, ou seja, de maneira estável, conjunta e rotineira, pois a união de esforços ocasional e transitória caracteriza apenas o concurso eventual, rechaçado pela lei em comento. No caso em disceptação, ao contrário da conclusão alcançada pela magistrada sentenciante, observo que não restou suficientemente demonstrada a efetiva associação permanente dos réus, com estabilidade, organização e divisão de tarefas entre os agentes a fim de praticar atos de traficância. Inobstante a narrativa uníssona dos policiais atuantes na investigação dos fatos no sentido de que os réus agiam juntos na traficância, apenas tal fato não é suficiente para comprovar o liame subjetivo necessário da finalidade permanente de tráfico de drogas, ou seja, de maneira estável, conjunta e rotineira. Confira-se o escólio de Guilherme de Souza Nucci: “Elemento subjetivo: é o dolo. Exige-se elemento subjetivo do tipo específico, consistente no ânimo de associação, de caráter duradouro e estável. Do contrário, seria um mero concurso de agentes para a prática do crime de tráfico. Para a configuração do delito do art. 35 (…) é fundamental se reúnam com o propósito de manter uma meta comum (...)” (Leis Penais e Processuais Penais Comentadas, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010, p. 379). Desse modo, a meu ver, o sujeito processual acusação não conseguiu demonstrar a efetiva associação permanente dos réus, com estabilidade, organização e divisão de tarefas entre os sócios a fim de praticar atos de traficância, não havendo elementos de convicção bastantes para demonstrar o vínculo associativo. O que se comprovou foi que os réus possuíam em depósito grande quantidade de drogas, prontas para a comercialização. Contudo, desse fato, por si só, não decorre a conclusão de vínculo associativo. Os policiais relataram que, durante monitoramentos e campana, observaram que a residência de um acusado era frequentada pelo outro, de forma recíproca, tudo indicando que um fornecia droga para o outro, e vice-versa. Uma das testemunhas apontou que Celsomar seria o chefe, fornecendo drogas para William. Embora tais elementos realmente indiquem que, para o caso, Celsomar e William atuaram conjuntamente, não parece suficiente para comprovar, inequivocamente, um vínculo associativo estável, organizado e com divisão de tarefas, pairando dúvida a este respeito. Imperativo salientar, uma vez mais, que o vínculo permanente entre os agentes deve ser comprovado e não apenas presumido. De forma que, comprovada a mera reunião eventual dos apelantes, não se verifica a existência de arcabouço probatório suficiente à condenação dos processados pela prática do crime de associação para o tráfico. Nessa ordem: “Para configuração do crime autônomo de associação para o tráfico, faz-se necessário que os agentes estejam agindo em liame subjetivo e com a finalidade permanente de mercancia de entorpecentes, de maneira estável e rotineira. Não sendo o caso dos autos, a absolvição é medida que se impõe. (…)” (TJGO, PROCESSO CRIMINAL -> Recursos -> Apelação Criminal 0120569-03.2019.8.09.0175, Rel. Des(a). Aureliano Albuquerque Amorim, 3ª Câmara Criminal, julgado em 05/09/2022, DJe de 05/09/2022). Logo, inexistindo prova segura do vínculo associativo estável e permanente, com fins de difusão ilícita de drogas, não há como manter a condenação dos apelantes quanto ao crime tipificado pelo art. 35 da Lei nº 11.343/2006, a teor do art. 386, inciso VII, do Código de Processo Penal. 4. Quanto à dosimetria das penas Afastada a condenação pelo crime de associação para o tráfico, remanescem as penas referentes ao crime de tráfico, cujo processo dosimétrico passo a analisar. 4.1. WILLIAN DA SILVA ALVES JÚNIOR Na 1ª fase da dosimetria, de maneira escorreita, a sentenciante valorou desfavoravelmente ao réu a natureza das drogas, impondo a sanção inicial em 06 (seis) anos de reclusão, quantitativo que não merece reparos, porquanto nos termos do artigo 42 da Lei n. 11.343/06, é correta a utilização da natureza/quantidade da droga apreendida para afastar a pena-base do mínimo legal. Em relação ao quantum de aumento de pena na primeira fase da dosimetria, a jurisprudência das Cortes Superiores firmou-se no sentido de que os parâmetros para a exasperação da reprimenda devem observar o critério da discricionariedade juridicamente vinculada, a qual, por sua vez, está submetida aos princípios da proporcionalidade, da razoabilidade, da suficiência da reprovação e da prevenção ao crime. Por tais razões, não se admite a adoção de critério meramente matemático, atrelado apenas ao número de circunstâncias judiciais desfavoráveis. Deve-se, na verdade, analisar os elementos que indiquem eventual gravidade concreta do delito, além das condições pessoais de cada agente, de forma que uma circunstância judicial desfavorável poderá receber mais desvalor que outra, exatamente em obediência aos princípios da individualização da pena e da própria proporcionalidade. Dentro desse contexto e observada a conduta em concreto, o aumento da pena-base em razão da natureza da droga apreendida é idôneo e proporcional, além de estar em consonância com o disposto no art. 42 da Lei nº 11.343/2006, e com a jurisprudência firmada acerca do tema Logo, não há alterações a serem realizadas na pena-base. Na 2ª fase, corretamente reconhecida a ausência de atenuantes e agravantes, mantenho a pena intermediária em 06 (seis) anos de reclusão. Na 3ª fase, afastada a condenação pelo delito de associação para o tráfico (único fundamento utilizado pela magistrada para negar o benefício do privilégio) o réu faz jus agora à incidência da causa de diminuição de pena prevista no § 4º do artigo 33 da Lei de Drogas, pois, preenche os requisitos legais, quais sejam, ser primário, de bons antecedentes, não se dedicar a atividades criminosas e nem integrar organização criminosa, razão pela qual reduzo a reprimenda intermediária em 2/3 (dois terços), concretizando a pena em 02 (dois) anos de reclusão, no regime inicial aberto, substituída por 02 (duas) restritivas de direito: prestação pecuniária no valor de 01 (um) salário-mínimo e prestação de serviço à comunidade a ser definida pelo Juízo da execução, 200 (duzentos) dias-multa, no menor valor permitido. Por fim, o pedido de gratuidade (isenção das custas processuais), visando a inexigibilidade do pagamento das custas, deve ser oportunamente endereçado ao Juízo das Execuções, considerando a possibilidade de alteração da situação financeira dos réus até lá (AgRg no AREsp n. 1371623/SC, Rel. Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, julgado em 11/4/2019, DJe 30/4/2019). 4.2. CELSOMAR HENRIQUE ANASTÁCIO Quanto ao 2º apelante, não comporta modificação a reprimenda imposta. Na análise das circunstâncias judiciais a magistrada valorou desfavoravelmente ao réu os antecedentes e a natureza das drogas, impondo a sanção inicial em 07 (sete) anos de reclusão, quantitativo que não merece reparos, porquanto nos termos do artigo 42 da Lei n. 11.343/06, é correta a utilização da natureza/quantidade da droga apreendida para afastar a pena-base do mínimo legal. Sabe-se que a exasperação da pena-base não se dá por critério objetivo ou matemático, devendo ser analisados elementos que indiquem eventual gravidade concreta do delito, além das condições pessoais do agente, de forma que uma circunstância judicial desfavorável poderá receber mais desvalor que outra, exatamente em obediência aos princípios da individualização da pena e da própria proporcionalidade. Assim, não há obrigatoriedade na adoção de alguma fração específica para cada circunstância judicial negativa, seja ela de 1/6 sobre a pena-base, 1/8 do intervalo entre as penas mínima e máxima ou mesmo outro valor. Tais frações são parâmetros aceitos pela jurisprudência do STJ, mas não se revestem de caráter obrigatório, exigindo-se apenas que seja proporcional o critério utilizado. No caso em comento, a sentenciante utilizou a fração de 1/10 incidente sobre a semissoma dos extremos, mais benéfica, inclusive, do que os parâmetros jurisprudenciais recomendados, não havendo equívoco no cálculo realizado. Confira-se: “(…) Não há direito subjetivo do réu à aplicação do quantum de aumento de 1/6 sobre a pena mínima, na primeira fase da dosimetria da pena, para cada circunstância judicial valorada negativamente. Afinal, embora tal fração configure um dos parâmetros aceitos por este STJ, não é obrigatória a sua aplicação, até porque a fixação da pena-base não precisa seguir um critério matemático rígido. Precedentes. 2. A exasperação feita na origem foi inclusive inferior ao que resultaria da aplicação do critério de aumento de 1/8 sobre o intervalo de apenamento, que também é um dos parâmetros (conquanto não vinculantes) admitidos neste Tribunal Superior, de modo que inexiste ilegalidade a sanar. (…) 4. Agravo regimental desprovido.” (AgRg no AREsp n. 2.341.296/PR, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 22/8/2023, DJe de 28/8/2023.) Na 2ª fase dosimétrica, corretamente reconhecida a agravante da reincidência (mov. 212), com aumento razoável da sanção para 08 (oito) anos e 02 (dois) meses de reclusão, quantitativo que não comporta reparos porque proporcional e adequado ao caso em deslinde. Na 3ª fase, mantenho o redutor em 1/3 (um terço) decorrente da causa de diminuição de pena prevista pelo art. 46, da Lei nº 11.343/06 (o réu era parcialmente incapaz de se determinar de acordo com a compreensão da ilicitude do fato, conforme laudo homologado do Exame de Insanidade Mental), de modo que mantenho a pena estabelecida em 05 (cinco) anos, 05 (cinco) meses e 10 (dez) dias de reclusão, pagamento de 545 (quinhentos e quarenta e cinco) dias-multa (quantum proporcional à sanção corporal), no menor valor permitido. Preservo o regime inicial fechado de cumprimento de pena, ex vi do artigo 33, § 2º, letra “a”, do Código Penal Brasileiro. 5. Da indenização por danos morais coletivos Merece acolhida o pleito de afastamento da obrigação de pagamento de indenização por danos morais coletivos, pois a verificação do dano causado deve ser concretamente aferida, mediante instrução processual específica, na qual se demonstre a relevância do dano causado à sociedade, bem como a proporcionalidade do valor fixado. Confira-se: “(…) No tocante à fixação de indenização por danos morais coletivos, entende-se que a ausência de instrução probatória específica, indispensável para apuração da extensão e relevância do dano à sociedade, impede a sua fixação, ainda que exista pedido expresso do Ministério Público. A fixação de danos coletivos requer demonstração concreta, não se tratando de hipótese de dano presumido. 8. A jurisprudência do STJ é pacífica ao exigir instrução específica para a fixação de valor mínimo de reparação por danos morais coletivos, em observância aos princípios do contraditório e da ampla defesa. IV. AGRAVO CONHECIDO PARA NEGAR PROVIMENTO AO RESP. RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO.” (REsp n. 2.144.002/MG, relatora Ministra Daniela Teixeira, Quinta Turma, julgado em 18/2/2025, DJEN de 25/2/2025.) Ademais, a Terceira Seção do STJ acolheu recentemente a proposta de afetação do REsp 2.188.922-MG, REsp 2.188.771-MG e REsp 2.189.504-MG ao rito dos recursos repetitivos, a fim de uniformizar o entendimento a respeito da controvérsia: “Analisar se é cabível a fixação de reparação mínima por danos morais coletivos sem razão da condenação por crimes de tráfico de drogas e, caso seja cabível, se o referido dano é presumido ou exige produção de prova específica.” Dessa forma inexistindo preceito vinculante a respeito, filio-me à corrente acima explicitada, no sentido de que necessária a instrução específica para a fixação de valor mínimo de reparação por danos morais coletivos, em observância aos princípios do contraditório e ampla defesa, o que não se verificou no caso concreto. Dessarte, afasta-se a imposição, aos réus, da obrigação de pagamento de indenização por danos morais coletivos. Dispositivo: Na confluência do exposto, desacolhendo o pronunciamento ministerial, CONHEÇO dos apelos e DOU-LHES PARCIAL PROVIMENTO, para absolver os réus quanto ao crime de associação para o tráfico, afastar a obrigação de pagamento de indenização por danos morais coletivos, bem como aplicar a causa de diminuição de pena prevista pelo art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/06 ao 1º apelante. É como voto. Desembargador ROBERTO HORÁCIO REZENDE RELATOR (Datado e assinado eletronicamente) B2/01 APELAÇÃO CRIMINAL Nº 5215797-82.2022.8.09.0087 COMARCA DE ITUMBIARA 1ºAPELANTE: WILLIAN DA SILVA ALVES JÚNIOR 2º APELANTE: CELSOMAR HENRIQUE ANASTÁCIO APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS RELATOR: Desembargador ROBERTO HORÁCIO REZENDE EMENTA: DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO DE DROGAS. PRELIMINARES DE NULIDADE DA PROVA POR VIOLAÇÃO DE DOMICÍLIO E QUEBRA DA CADEIA DE CUSTÓDIA. REJEIÇÃO. ABSOLVIÇÃO PELO CRIME DE ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. AFASTAMENTO DA CONDENAÇÃO AO PAGAMENTO DE DANOS MORAIS COLETIVOS. PARCIAL PROVIMENTO DOS RECURSOS. I. Caso em exame 1. Apelações criminais interpostas por WILLIAN DA SILVA ALVES JÚNIOR e CELSOMAR HENRIQUE ANASTÁCIO contra sentença que os condenou por tráfico de drogas (art. 33, caput) e associação para o tráfico (art. 35), ambos da Lei 11.343/06, com penas fixadas em regime fechado. Alegações de nulidades e pedido de absolvição ou desclassificação da conduta. II. Questão em discussão 2. Há quatro questões em discussão: (i) saber se houve nulidade da prova obtida em razão de violação de domicílio sem mandado judicial ou flagrante caracterizado; (ii) saber se houve quebra da cadeia de custódia do material apreendido; (iii) saber se estão presentes os elementos do tipo penal do art. 35 da Lei 11.343/06 para justificar a condenação por associação para o tráfico; e (iv) saber se é cabível a fixação de indenização por danos morais coletivos em sentença penal condenatória. III. Razões de decidir 3. A entrada dos policiais nas residências dos réus foi precedida de fundada suspeita, corroborada por diligências de vigilância e flagrante delito, dispensando mandado judicial, nos termos do art. 5º, XI, da CF/1988. 4. A cadeia de custódia foi devidamente preservada, não havendo comprovação de adulteração do material apreendido; divergência nos lacres é irrelevante quando não demonstrado prejuízo. 5. Não restou comprovada a existência de vínculo estável e permanente entre os réus com o fim específico de traficar drogas, sendo incabível a condenação pelo crime do art. 35 da Lei de Drogas. 6. A condenação ao pagamento de danos morais coletivos carece de base legal na esfera penal e deve ser afastada. IV. Dispositivo e tese 7. Recursos conhecidos e parcialmente providos. Mantida a condenação por tráfico de drogas e absolvidos os réus do crime de associação para o tráfico. Afastada a condenação ao pagamento de danos morais coletivos. Tese de julgamento: "1. É válida a prova obtida em situação de flagrância que justifique o ingresso dos policiais em domicílio sem mandado judicial, desde que amparada por elementos objetivos e fundada suspeita. 2. A divergência entre os números dos lacres dos laudos provisório e definitivo não compromete a cadeia de custódia se preservada a identidade do material e inexistente indício de adulteração. 3. A ausência de prova do vínculo associativo estável e permanente entre os réus impõe a absolvição pelo crime do art. 35 da Lei 11.343/06. 4. A condenação ao pagamento de danos morais coletivos não se insere na competência da jurisdição penal e deve ser afastada quando não decorrente de pedido específico formulado em ação cível.” Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, XI; CPP, arts. 158-A a 158-F; Lei 11.343/2006, arts. 33 e 35. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgRg no RHC 147.885/SP, Rel. Min. Olindo Menezes, j. 07/12/2021; STJ, HC 598.051/SP, Rel. Min. Ribeiro Dantas, j. 22/06/2021. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os presentes autos da Apelação Criminal nº 5215797-82.2022.8.09.0087 ACORDAM os integrantes da Segunda Turma Julgadora da Terceira Câmara Criminal do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, na sessão presencial do dia 10 de junho de 2025, proferir deliberação no expediente conforme votação e composição registradas no extrato de ata do respectivo julgamento, à unanimidade, em conhecer dos recursos e provê-los parcialmente, nos termos do voto do Relator. Esteve presente e fez sustentação oral o advogado do 1º apelante, Dr. José Coelho Barcelos Borges, OAB/GO 30737. Presidiu a sessão a Desembargadora Carmecy Rosa Maria Alves de Oliveira. Procuradoria-Geral de Justiça representada conforme extrato da ata. Goiânia, 10 de junho de 2025. Desembargador ROBERTO HORÁCIO REZENDE RELATOR (Datado e assinado eletronicamente) EMENTA: DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO DE DROGAS. PRELIMINARES DE NULIDADE DA PROVA POR VIOLAÇÃO DE DOMICÍLIO E QUEBRA DA CADEIA DE CUSTÓDIA. REJEIÇÃO. ABSOLVIÇÃO PELO CRIME DE ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. AFASTAMENTO DA CONDENAÇÃO AO PAGAMENTO DE DANOS MORAIS COLETIVOS. PARCIAL PROVIMENTO DOS RECURSOS. I. Caso em exame 1. Apelações criminais interpostas por WILLIAN DA SILVA ALVES JÚNIOR e CELSOMAR HENRIQUE ANASTÁCIO contra sentença que os condenou por tráfico de drogas (art. 33, caput) e associação para o tráfico (art. 35), ambos da Lei 11.343/06, com penas fixadas em regime fechado. Alegações de nulidades e pedido de absolvição ou desclassificação da conduta. II. Questão em discussão 2. Há quatro questões em discussão: (i) saber se houve nulidade da prova obtida em razão de violação de domicílio sem mandado judicial ou flagrante caracterizado; (ii) saber se houve quebra da cadeia de custódia do material apreendido; (iii) saber se estão presentes os elementos do tipo penal do art. 35 da Lei 11.343/06 para justificar a condenação por associação para o tráfico; e (iv) saber se é cabível a fixação de indenização por danos morais coletivos em sentença penal condenatória. III. Razões de decidir 3. A entrada dos policiais nas residências dos réus foi precedida de fundada suspeita, corroborada por diligências de vigilância e flagrante delito, dispensando mandado judicial, nos termos do art. 5º, XI, da CF/1988. 4. A cadeia de custódia foi devidamente preservada, não havendo comprovação de adulteração do material apreendido; divergência nos lacres é irrelevante quando não demonstrado prejuízo. 5. Não restou comprovada a existência de vínculo estável e permanente entre os réus com o fim específico de traficar drogas, sendo incabível a condenação pelo crime do art. 35 da Lei de Drogas. 6. A condenação ao pagamento de danos morais coletivos carece de base legal na esfera penal e deve ser afastada. IV. Dispositivo e tese 7. Recursos conhecidos e parcialmente providos. Mantida a condenação por tráfico de drogas e absolvidos os réus do crime de associação para o tráfico. Afastada a condenação ao pagamento de danos morais coletivos. Tese de julgamento: "1. É válida a prova obtida em situação de flagrância que justifique o ingresso dos policiais em domicílio sem mandado judicial, desde que amparada por elementos objetivos e fundada suspeita. 2. A divergência entre os números dos lacres dos laudos provisório e definitivo não compromete a cadeia de custódia se preservada a identidade do material e inexistente indício de adulteração. 3. A ausência de prova do vínculo associativo estável e permanente entre os réus impõe a absolvição pelo crime do art. 35 da Lei 11.343/06. 4. A condenação ao pagamento de danos morais coletivos não se insere na competência da jurisdição penal e deve ser afastada quando não decorrente de pedido específico formulado em ação cível.” Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, XI; CPP, arts. 158-A a 158-F; Lei 11.343/2006, arts. 33 e 35. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgRg no RHC 147.885/SP, Rel. Min. Olindo Menezes, j. 07/12/2021; STJ, HC 598.051/SP, Rel. Min. Ribeiro Dantas, j. 22/06/2021.

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