1. Defensoria Pública Do Estado De Santa Catarina (Impetrante) x 2. Tribunal De Justiça Do Estado De Santa Catarina (Impetrado)
ID: 330895690
Tribunal: STJ
Órgão: SPF COORDENADORIA DE PROCESSAMENTO DE FEITOS DE DIREITO PENAL
Classe: HABEAS CORPUS
Nº Processo: 0123550-04.2025.3.00.0000
Data de Disponibilização:
22/07/2025
HC 994974/SC (2025/0123550-1)
RELATOR
:
MINISTRO RIBEIRO DANTAS
IMPETRANTE
:
DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE SANTA CATARINA
ADVOGADO
:
DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE SANTA CATARINA
IMPETRADO
:
TRIBU…
HC 994974/SC (2025/0123550-1)
RELATOR
:
MINISTRO RIBEIRO DANTAS
IMPETRANTE
:
DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE SANTA CATARINA
ADVOGADO
:
DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE SANTA CATARINA
IMPETRADO
:
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SANTA CATARINA
PACIENTE
:
CARLA REGINA FERNANDES
INTERESSADO
:
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA
DECISÃO
Trata-se de habeas corpus substitutivo de recurso próprio, com pedido liminar, impetrado em benefício de CARLA REGINA FERNANDES, contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina (APELAÇÃO CRIMINAL Nº 5015639-35.2021.8.24.0020/SC).
Consoante se extrai dos autos, a paciente foi condenada às penas de 10 meses de detenção, em regime inicial aberto, e 16 dias-multa pela prática do crime tipificado no art. 2.º, II, da Lei n. 8.137/1990, por vinte e sete vezes, em continuidade delitiva.
O Tribunal a quo negou provimento à apelação defensiva, nos termos da seguinte ementa:
“APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA EM CONTINUIDADE DELITUOSA (ART. 2º, II, DA LEI Nº 8.137/90 C/C ART 71, CAPUT, DO CÓDIGO PENAL, POR QUARENTA E SEIS VEZES). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DEFENSIVO. PRELIMINARES. A) CORREÇÃO, DE OFÍCIO, DE ERRO MATERIAL CONSTANTE DA PARTE DISPOSITIVA DO DECISUM. EQUÍVOCO QUANTO AO NÚMERO DE CONDUTAS PRATICADAS. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. B) RECONHECIMENTO, TAMBÉM EX OFFICIO, DA PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA, COM BASE NA PENA EM ABSTRATO, DE PARTE DAS CONDUTAS. PUNIBILIDADE EXTINTA. MÉRITO. PLEITOS ABSOLUTÓRIOS. A) ALEGADA INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA. NÃO ACOLHIMENTO. AUTORIA, MATERIALIDADE E ELEMENTO SUBJETIVO DEMONSTRADOS. PROVA DOCUMENTAL CORROBORADA PELA CONFISSÃO DA RÉ EM JUÍZO. AGENTE QUE, NA QUALIDADE DE TITULAR E ADMINISTRADORA DA PESSOA JURÍDICA, DEIXOU DE RECOLHER, NO PRAZO LEGAL, O TRIBUTO DEVIDO. EMPRESA QUE TEM O DEVER DE ARRECADAR DO CONTRIBUINTE DE FATO A QUANTIA MONETÁRIA EQUIVALENTE AO ICMS E, APÓS, REPASSÁ-LA AO FISCO. REITERAÇÃO DA CONDUTA SUFICIENTE A INDICAR A CONTUMÁCIA E O DOLO DE APROPRIAÇÃO. B) SUSTENTADA APLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INVIABILIDADE. VALOR SONEGADO QUE ULTRAPASSA AQUELE PREVISTO NA LEI ESTADUAL N. 12.646/03. C) ALEGADA INCIDÊNCIA DA EXCLUDENTE DE CULPABILIDADE DA INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA. IMPOSSIBILIDADE. SITUAÇÃO EXCEPCIONAL NÃO COMPROVADA NOS AUTOS. ÔNUS QUE COMPETIA À DEFESA, NOS TERMOS DO ARTIGO 156, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. ADEMAIS, EVENTUAL DIFICULDADE FINANCEIRA QUE NÃO EXCLUI A CULPABILIDADE. CONDENAÇÃO MANTIDA. AFASTAMENTO, DE OFÍCIO, DE UMA DAS PENAS SUBSTITUTIVAS. SANÇÃO INFERIOR A UM ANO. INTELIGÊNCIA DO ART. 44, DO CÓDIGO PENAL. REDUÇÃO, EX OFFICIO, DO VALOR FIXADO A TÍTULO DE VERBA INDENIZATÓRIA MÍNIMA. QUANTUM CIRCUNSCRITO À DÍVIDA PRINCIPAL, ACRESCIDA DE JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA, EXCLUÍDA A MULTA ADMINISTRATIVA. REDUÇÃO QUE SE IMPÕE. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. DE OFÍCIO, CORRIGIDO ERRO MATERIAL, RECONHECIDA A EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE EM RELAÇÃO A PARTE DAS CONDUTAS, AFASTADA UMA DAS PENAS SUBSTITUTIVAS E REDUZIDO O QUANTUM FIXADO A TÍTULO DE VERBA INDENIZATÓRIA.” (e-STJ, fls. 301)
Neste habeas corpus, o impetrante sustenta, em síntese, que "como a paciente foi condenada por um crime relacionado a um tributo estadual (ICMS), o parâmetro a ser utilizado para o princípio da insignificância deve ser o estabelecido pela respectiva legislação estadual. Em Santa Catarina, como visto, o valor mínimo para ajuizamento de execução fiscal é de R$ 50.000,00. Logo, sendo o débito fiscal imputado à paciente bastante inferior a esse valor, é caso de reconhecimento da atipicidade material da conduta" (e-STJ, fl. 6).
Aduz que "em nenhum momento, o dolo específico de apropriação foi comprovado no processo. Na verdade, sequer foi imputado formalmente à paciente na denúncia, que se limitou a descrever os meses de inadimplência fiscal" (e-STJ, fl. 8).
Aponta que, à época dos fatos, a paciente passava por dificuldades financeiras e precisou priorizar o pagamento de seus funcionários.
Argumenta que a paciente foi condenada criminalmente por mera inadimplência fiscal.
Por fim, narra que "somente quando a questão indenizatória for objeto de produção específica de provas e, portanto, de efetivo debate processual é que será possível, sem violar o contraditório e a ampla defesa, condenar o réu ao pagamento de indenização à vítima" (e-STJ, fl. 12).
Requer, ao final, a concessão da ordem para absolver a paciente e, subsidiariamente, afastar o valor fixado a título de indenização pelo crime tributário.
Requerimento de tutela de urgência indeferido (e-STJ, fl. 312).
O Ministério Público Federal manifestou-se pela denegação da ordem (e-STJ, fls. 321-333).
É o relatório.
Decido.
Esta Corte - HC 535.063/SP, Terceira Seção, Rel. Ministro Sebastião Reis Junior, julgado em 10/6/2020 - e o Supremo Tribunal Federal - AgRg no HC 180.365, Primeira Turma, Rel. Min. Rosa Weber, julgado em 27/3/2020; AgR no HC 147.210, Segunda Turma, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 30/10/2018 -, pacificaram orientação no sentido de que não cabe habeas corpus substitutivo do recurso legalmente previsto para a hipótese, impondo-se o não conhecimento da impetração, salvo quando constatada a existência de flagrante ilegalidade no ato judicial impugnado.
Primeiramente, o capítulo de afastamento do valor fixado a título de indenização pelo crime tributário não foi objeto das razões do recurso de apelação defensivo, de modo que não foram apreciadas quaisquer teses de eventual ilegalidade deste capítulo pelo Tribunal a quo. Por este motivo, inviável a apreciação do tema por esta Corte, sob pena de indevida supressão de instância e alargamento inconstitucional da hipótese de competência do Superior Tribunal de Justiça para julgamento de habeas corpus, constante no art. 105, I, "c", da Constituição da República.
Passo à análise da aplicação da alegada atipicidade material.
O Tribunal a quo assim afastou a incidência da insignificância:
"No que tange ao pleito de aplicação do princípio da insignificância, sob o entendimento de que o valor não repassado à Receita Estadual é inferior àquele estabelecido na Portaria GAB/PGE n. 58 de 20/07/2021, qual seja, R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), tenho que melhor sorte não assiste à Defesa.
Como decorrência da intervenção mínima, o princípio em questão deve ser aplicado de forma proporcional, afastando o emprego de graves sanções penais às condutas que não importem em lesão jurídica significativa.
No entanto, sua aplicabilidade deve ser avaliada com cautela, sopesando-se todas as circunstâncias de fato concernentes à pessoa do agente e circunstâncias do delito, sob pena de restar estimulada a prática reiterada de ilícitos de pequena monta.
[...]
Dito isso, cumpre esclarecer que, em se tratando de sonegação fiscal de imposto estadual (ICMS), o parâmetro utilizado por esta Corte para verificar a possível incidência do princípio da insignificância, é aquele indicado na Lei Estadual n° 12.646/03, especificamente em seu artigo 5º, que dispõe:
Art. 5º. Independentemente do transcurso do prazo prescricional, não será encaminhada à Procuradoria geral do Estado para ajuizamento a Dívida Ativa: I - de valor inscrito até R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais), relativa ao ICMS, exceto quando decorrente de multas não proporcionais ao valor do imposto ou da mercadoria;
In casu, consoante se extrai das Certidões de Dívida Ativa do Evento 1, OUT7 que o valor sonegado pela Apelante ultrapassa os vinte e cinco mil reais, razão pela qual não pode ser considerado insignificante.
[...]
Extrai-se do inteiro teor do Voto:
[...] Como o valor global devido pelo Recorrido é superior a R$ 20.000,00, ou seja, acima do limite previsto no art. 16 da Lei Estadual 15.856/12 com a redação que lhe foi dada pela Lei Estadual 17.427/17, não há que se falar em insignificância. Aliás, como visto, o art. 5º da Lei Estadual 12.646/03 trazia a previsão categórica de que não seriam sequer encaminhadas à Procuradoria Geral do Estado para ajuizamento de execução fiscal as dívidas ativas com valor igual ou inferior a R$ 2.500,00. Nos comandos legais que seguiram, não havia mais esse mandamento, falando a norma em dispensa de ajuizamento. Ademais, colhe-se de notícia do site da Procuradoria-Geral do Estado acerca da Portaria Gab/PGE 58/21: PGE/SC aumenta valor mínimo para cobrança de dívida ativa na Justiça Portaria publicada no Diário Oficial desta quarta-feira quer incentivar a desjudicialização na recuperação de valores devidos ao Estado. Já está em vigor o novo valor mínimo para ajuizamento de ação de cobrança da dívida ativa na Justiça pelo Estado de Santa Catarina. A partir de agora, só serão alvo de novas ações fiscais débitos inscritos em dívida ativa de pessoas físicas ou jurídicas com valor igual ou superior a R$ 50 mil. A Portaria GAB/PGE 58/2021 foi publicada no Diário Oficial do Estado (DOE) desta quinta-feira (22). O objetivo da norma é reduzir o congestionamento da execução fiscal e acelerar o recebimento de débitos de menor valor por meio de cobrança administrativa. Para o procurador-geral do Estado, Alisson de Bom de Souza, mecanismos como o protesto e outras formas extrajudiciais de recuperação da dívida desafogam o Poder Judiciário e contribuem para que o Estado receba os valores mais rapidamente, além de representarem a modernização desse procedimento em Santa Catarina. - A elevação do limite reduzirá em 60% o número de novas execuções propostas anualmente pela Procuradoria e promoverá a redistribuição de 6 mil execuções fiscais do Núcleo de Execuções Fiscais (Nefis) para o Núcleo de Cobrança Administrativa (NCA) - explica o chefe da PGE/SC (Disponível em:
. Acesso em 20.9.23). Vê-se, portanto, que não há renúncia ao crédito fiscal, mas apenas a desjudicialização da forma de cobrança, ao passo que dívidas inferiores a R$ 50.000,00 não deixarão de ser cobradas, somente o sendo extrajudicialmente [...]." (e-STJ, fls. 296-297)
Segundo entendimento desta Corte Superior, firmado no julgamento do REsp n. 1.709.029/MG, relatoria do eminente Ministro Sebastião Reis Júnior, sob rito do recursos repetitivos, Tema 157/STJ (modificado), "incide o princípio da insignificância aos crimes tributários federais e de descaminho quando o débito tributário verificado não ultrapassar o limite de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), a teor do disposto no art. 20 da Lei n. 10.522/2002, com as atualizações efetivadas pelas Portarias 75 e 130, ambas do Ministério da Fazenda.". Colaciono a ementa do acórdão do precedente qualificado:
"RECURSO ESPECIAL AFETADO AO RITO DOS REPETITIVOS PARA FINS DE REVISÃO DO TEMA N. 157. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA AOS CRIMES TRIBUTÁRIOS FEDERAIS E DE DESCAMINHO, CUJO DÉBITO NÃO EXCEDA R$ 10.000,00 (DEZ MIL REAIS). ART. 20 DA LEI N. 10.522/2002. ENTENDIMENTO QUE DESTOA DA ORIENTAÇÃO CONSOLIDADA NO STF, QUE TEM RECONHECIDO A ATIPICIDADE MATERIAL COM BASE NO PARÂMETRO FIXADO NAS PORTARIAS N. 75 E 130/MF - R$ 20.000,00 (VINTE MIL REAIS). ADEQUAÇÃO.
1. Considerando os princípios da segurança jurídica, da proteção da confiança e da isonomia, deve ser revisto o entendimento firmado, pelo julgamento, sob o rito dos repetitivos, do REsp n. 1.112.748/TO - Tema 157, de forma a adequá-lo ao entendimento externado pela Suprema Corte, o qual tem considerado o parâmetro fixado nas Portarias n. 75 e 130/MF - R$ 20.000,00 (vinte mil reais) para aplicação do princípio da insignificância aos crimes tributários federais e de descaminho.
2. Assim, a tese fixada passa a ser a seguinte: incide o princípio da insignificância aos crimes tributários federais e de descaminho quando o débito tributário verificado não ultrapassar o limite de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), a teor do disposto no art. 20 da Lei n. 10.522/2002, com as atualizações efetivadas pelas Portarias n. 75 e 130, ambas do Ministério da Fazenda.
3. Recurso especial provido para cassar o acórdão proferido no julgamento do Recurso em Sentido Estrito n. 0000196-17.2015.4.01.3803/MG, restabelecendo a decisão do Juízo da 2ª Vara Federal de Uberlândia - SJ/MG, que rejeitou a denúncia ofertada em desfavor do recorrente pela suposta prática do crime previsto no art. 334 do Código Penal, ante a atipicidade material da conduta (princípio da insignificância). Tema 157 modificado nos termos da tese ora fixada." (REsp n. 1.709.029/MG, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Terceira Seção, julgado em 28/2/2018, DJe de 4/4/2018.)
Na esfera estadual, a aplicação do princípio da insignificância deve observar a legislação local semelhante à normativa federal, que define os valores de referência para a persecução ou não de execuções fiscais.
Não se desconhece que, em Santa Catarina, a Lei Estadual n. 18.165/2021 incluiu o art. 142-A na Lei n. 3.938/1966, o qual definiu a competência do Procurador-Geral para estabelecer o valor mínimo para ajuizamento da ação de cobrança de dívidas do estado e de suas autarquias e fundações de direito público.
Assim, a Procuradoria-Geral do Estado de Santa Catarina estabeleceu a Portaria GAB/PGE n. 58/2021, que instituiu o valor de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) para o ajuizamento de ação de cobrança da dívida ativa.
Ocorre que a Quinta Turma tem precedentes, segundo os quais a Portaria GAB/PGESC n. 58/2021 do Estado de Santa Catarina, por não possuir natureza penal, e por não se tratar de lei em sentido estrito, mas apenas ato administrativo normativo, não pode ser aplicada retroativamente para fins de reconhecimento da insignificância penal (AgRg no HC n. 889.162/SC, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 17/6/2024, DJe de 20/6/2024). Assim, a retroatividade benéfica do ato administrativo que majorou o valor mínimo para execução fiscal não se aplica, uma vez que tal ato não se equipara a uma lei penal em sentido estrito, conforme disposto no art. 2º, parágrafo único, do CPP (AgRg no HC n. 826.605/SC, relator Ministro Carlos Cini Marchionatti (Desembargador Convocado TJRS), Quinta Turma, julgado em 18/3/2025, DJEN de 24/3/2025.)
Dessa forma, correto o acórdão do Tribunal estadual, pois destacou que a legislação estadual vigente ao tempo dos fatos (Lei 15.856/2012) estabelecia o piso para a dispensa da execução fiscal em R$ 2.500,00, de maneira que o montante informado extrapolou-o, uma vez que trata-se de R$ 26.932,56, não sendo aplicável o princípio da insignificância.
Sem razão quanto às teses de atipicidade formal do crime tributário imputado.
A Terceira Seção deste Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento do HC n.º 399.109/SC, pacificou o entendimento de que o não recolhimento do ICMS em operações próprias é fato típico (HC n.º 399.109/SC, Rel. Ministro JOEL ILAN PARCIONIK, Terceira Seção, julgado em 22/8/2018, DJe de 12/9/2018).
Com efeito, a Suprema Corte, em apreciação do RHC n.º 163.334/SC, fixou a seguinte tese a respeito da tipicidade do delito previsto no art. 2.º, II, da Lei n.º 8.137/1990: "O contribuinte que, de forma contumaz e com dolo de apropriação, deixa de recolher o ICMS cobrado do adquirente da mercadoria ou serviço incide no tipo penal do art. 2º, II, da Lei n.º 8.137/1990".
Confira-se, a propósito, a ementa do referido julgado:
Direito penal. Recurso em Habeas Corpus. Não recolhimento do valor de ICMS cobrado do adquirente da mercadoria ou serviço. Tipicidade.
1. O contribuinte que deixa de recolher o valor do ICMS cobrado do adquirente da mercadoria ou serviço apropria-se de valor de tributo, realizando o tipo penal do art. 2º, II, da Lei n.º 8.137/1990.
2. Em primeiro lugar, uma interpretação semântica e sistemática da regra penal indica a adequação típica da conduta, pois a lei não faz diferenciação entre as espécies de sujeitos passivos tributários, exigindo apenas a cobrança do valor do tributo seguida da falta de seu recolhimento aos cofres públicos.
3. Em segundo lugar, uma interpretação histórica, a partir dos trabalhos legislativos, demonstra a intenção do Congresso Nacional de tipificar a conduta. De igual modo, do ponto de vista do direito comparado, constata-se não se tratar de excentricidade brasileira, pois se encontram tipos penais assemelhados em países como Itália, Portugal e EUA.
4. Em terceiro lugar, uma interpretação teleológica voltada à proteção da ordem tributária e uma interpretação atenta às consequências da decisão conduzem ao reconhecimento da tipicidade da conduta. Por um lado, a apropriação indébita do ICMS, o tributo mais sonegado do País, gera graves danos ao erário e à livre concorrência. Por outro lado, é virtualmente impossível que alguém seja preso por esse delito.
5. Impõe-se, porém, uma interpretação restritiva do tipo, de modo que somente se considera criminosa a inadimplência sistemática, contumaz, verdadeiro modus operandi do empresário, seja para enriquecimento ilícito, para lesar a concorrência ou para financiar as próprias atividades.
6. A caracterização do crime depende da demonstração do dolo de apropriação, a ser apurado a partir de circunstâncias objetivas factuais, tais como o inadimplemento prolongado sem tentativa de regularização dos débitos, a venda de produtos abaixo do preço de custo, a criação de obstáculos à fiscalização, a utilização de “laranjas” no quadro societário, a falta de tentativa de regularização dos débitos, o encerramento irregular das suas atividades, a existência de débitos inscritos em dívida ativa em valor superior ao capital social integralizado etc.
7. Recurso desprovido.
8. Fixação da seguinte tese: O contribuinte que deixa de recolher, de forma contumaz e com dolo de apropriação, o ICMS cobrado do adquirente da mercadoria ou serviço incide no tipo penal do art. 2º, II, da Lei n.º 8.137/1990.
(RHC 163334, Relator(a): ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 18/12/2019, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-271 DIVULG 12/11/2020 PUBLIC 13/11/2020. Grifou-se.)
Como se vê, o referido precedente da Suprema Corte reforça a jurisprudência desta Corte a respeito da tipicidade do não recolhimento de ICMS cobrado do adquirente da mercadoria ou serviço, porém, acrescenta duas novas condições para a caracterização do delito: a) prática contumaz; e b) dolo de apropriação.
Acerca da atipicidade formal da conduta e excludente de culpabilidade, o Tribunal de origem assim afastou as referidas teses:
"Digo isso pois, na hipótese, tanto a autoria quanto a materialidade restaram devidamente comprovadas por meio dos Termos de Inscrição em Dívida Ativa, Demonstrativos de Débitos, Ficha Cadastral, Extratos de Parcelamento, cópia do Contrato Social, todos do Evento 1, dos autos de origem.
Destaco, no ponto, que, da análise da documentação mencionada, inexistem dúvidas de que Carla era a administradora da empresa Vecalfer Confecções Ltda no período em que não recolhidos os tributos.
Tal informação, aliás, restou confirmada pela própria Apelante, quando interrogada pela Autoridade Judiciária (Evento 69, Arquivo de Vídeo 1, dos autos de origem).
Consoante dispõe o art. 11, da Lei n. 8137/90, estabelece que "Quem, de qualquer modo, inclusive por meio de pessoa jurídica, concorre para os crimes definidos nesta lei, incide nas penas a estes cominadas, na medida de sua culpabilidade".
Acerca do assunto, esta Câmara possui entendimento assente no sentido de que:
A infração penal-tributária consistente em inadimplir ou não arrecadar corretamente o imposto aproveita aos proprietários e administradores da pessoa jurídica, os quais detêm o controle final do fato porque decidem sobre sua prática e suas circunstâncias, de modo que a disposição contratual que atribui a acusado, na época dos fatos, a administração da empresa, é suficiente, em regra, à comprovação da autoria, sendo dela o encargo de desconstituir a conclusão lógica que do escrito e comprovado sobressai. (Apelação Criminal n. 5004201-68.2023.8.24.0011, rel. Des. Sérgio Rizelo, j. 21/01/2025).
Assim é que, a despeito dos argumentos defensivos, entendo que a prova documental colhida no feito restou devidamente corroborada sob o crivo do contraditório, em especial pela confissão da ré, de modo que se revela inviável o acolhimento da alegada insuficiência probatória.
[...]
Também não há como acolher a alegada atipicidade decorrente da ausência de contumácia delituosa e da não comprovação do elemento subjetivo do Tipo.
O Órgão Pleno do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RHC 163.334/SC, publicado em 13/11/2020, firmou a tese de que "O contribuinte que, de forma contumaz e com dolo de apropriação, deixa de recolher o ICMS cobrado do adquirente da mercadoria ou serviço incide no tipo penal do art. 2º, II, da Lei nº 8.137/1990", ainda que devidamente escriturado e declarado.
[...]
Voltando ao caso sub judice, é possível observar que a Recorrente deixou de recolher o imposto devido por quarenta e seis vezes, em um período de aproximadamente setenta e oito meses (setembro de 2013 a março de 2020), fato este que indica, com bastante clareza, a contumácia e o dolo de apropriação.
[...]
Sustenta a Defesa, ainda, que a Apelante agiu sob o manto da excludente de culpabilidade da inexigibilidade de conduta diversa, sob o argumento de que a pessoa jurídica por ela administrava passou por dificuldades financeiras e, em virtude disso, Carla se viu obrigada a priorizar o pagamento de outras despesas, como o salário de funcionários.
Novamente sem razão.
Isso porque, como se sabe, em situações do jaez o encargo financeiro é suportado pelo consumidor final, de modo que o contribuinte, no caso a ora Recorrente, tinha o dever apenas de repassar ao erário os valores recolhidos.
Assim, a tese somente poderia ser aceita se fosse efetivamente comprovada a situação financeira excepcional, fato que necessita estar aliado à demonstração de que a agente apenas realizou a conduta criminosa para salvar outros interesses sociais decorrentes de seu negócio.
[...]
Contudo, da análise dos autos, observa que não foi juntada qualquer prova, nem mesmo testemunhal, acerca das dificuldades financeiras pelas quais a pessoa jurídica supostamente vinha passando, tampouco se demonstrou que os valores sonegados foram, de fato, utilizados para honrar compromissos obrigacionais de natureza equivalente ao fim a que se destina o tributo não recolhido, ônus este que incumbia à defesa, nos termos do art. 156, do Código de Processo Penal." (e-STJ, fls. 296-298)
No caso, a paciente foi condenado à pena por infração ao art. 2º, II, da Lei n. 8.137/90, porque deixou de recolher ICMS devido por quarenta e seis vezes, em um período de aproximadamente setenta e oito meses (setembro de 2013 a março de 2020), fato este que indica, com bastante clareza, a contumácia e o dolo de apropriação, que passou a ser exigida pelo STF, sendo típica a conduta do envolvido, impondo-se a manutenção de sua condenação.
Nesse contexto, a conduta do recorrente não configura mera inadimplência, ao revés, se enquadra na tipificação do art. art. 2, inciso II, da lei n. 8.137/90.
Portanto, ao contrário do que alega a defesa, o contribuinte que deixa de recolher, de forma contumaz e com dolo de apropriação, o ICMS cobrado do adquirente da mercadoria ou serviço incide no tipo penal do art. 2º, II, da Lei n. 8.137/1990 (STF, RHC 163.334/SC, Rel. Ministro ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 18/12/2019, DJe 12/11/2020) - (AgRg no REsp n. 2.049.204/SC, Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, DJe 16/6/2023; AgRg nos EDcl no REsp n. 2.013.545/SC, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 2/10/2023, DJe de 5/10/2023.), como no presente caso.
Nesse sentido:
AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. PENAL. PROCESSO PENAL. TRANSAÇÃO PENAL. QUESTÃO LEVANTADA EM SEDE DE APELAÇÃO. PRECLUSÃO. ANPP. ART. 28-A, DO CPP. REQUISITOS. EXISTÊNCIA DE CONDENAÇÃO RECORRÍVEL. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES DO STF E STJ. PRECLUSÃO. CITAÇÃO POR HORA CERTA. VÍCIO. AUSÊNCIA DE COMUNICAÇÃO. MERA FORMALIDADE. PREJUÍZO NÃO DEMONSTRADO. DELITO. ART. 2º, II, DA LEI N. 8.137/1990. ATIPICIDADE. ABSOLVIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. CONTUMÁCIA. DOLO DE APROPRIAÇÃO. TIPICIDADE CARCTERIZADA. AGRAVO DESPROVIDO.
1. No curso do processo criminal a defesa não questionou a ausência de oferecimento de transação penal ao recorrente, o que só veio a ocorrer por ocasião da interposição de recurso de apelação contra a sentença condenatória, situação que revela a preclusão do exame do tema.
2. No que concerne ao ANPP, por sua vez, a teor do art. 28-A do Código de Processo Penal, não sendo caso de arquivamento e tendo o investigado confessado formal e circunstancialmente a prática de infração penal sem violência ou grave ameaça e com pena mínima inferior a 4 (quatro) anos, o Ministério Público poderá propor acordo de não persecução penal, desde que necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime, mediante condições ajustadas cumulativa e alternativamente.
3. O Supremo Tribunal Federal no julgamento do HC n. 191.464/SC, de relatoria do Ministro ROBERTO BARROSO (DJe 18/9/2020) - que invocou os precedentes do HC n. 186.289/RS, Relatora Ministra CARMEN LÚCIA (DJe 1º/6/2020), e do ARE n. 1.171.894/RS, Relator Ministro MARCO AURÉLIO (DJe 21/2/2020) -, externou a impossibilidade de fazer-se incidir o ANPP quando já existente condenação, conquanto ela ainda esteja suscetível de impugnação.
4. Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento de que a retroatividade do art. 28-A do CPP, introduzido pela Lei n. 13.964/2019, se revela incompatível com o propósito do instituto, quando já recebida a denúncia e já encerrada a prestação jurisdicional nas instâncias ordinárias. Precedentes:
AgRg no REsp n. 2.011.688/SC, relator Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, Sexta Turma, julgado em 24/4/2023, DJe de 2/5/2023; AgRg no REsp n. 2.001.522/SP, relatora Ministra LAURITA VAZ, Sexta Turma, julgado em 24/4/2023, DJe de 28/4/2023; AgRg no HC n. 797.322/SC, relator Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, Quinta Turma, julgado em 25/4/2023, DJe de 28/4/2023; AgRg no REsp n. 2.050.499/SP, relator Ministro RIBEIRO DANTAS, Quinta Turma, julgado em 24/4/2023, DJe de 27/4/202; AgRg no RHC n. 167.973/MS, relator Ministro JESUÍNO RISSATO (Desembargador Convocado do TJDFT), Sexta Turma, julgado em 24/4/2023, DJe de 27/4/2023; AgRg no REsp n. 2.001.036/GO, relator Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, Sexta Turma, julgado em 24/4/2023, DJe de 26/4/2023; e AgRg no REsp n. 2.015.032/SC, relator Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, Quinta Turma, julgado em 24/4/2023, DJe de 26/4/2023.
5. In casu, embora tenha sido recebida a denúncia em 27/03/2020, portanto em data posterior à entrada a Lei n. 13.964/2019, que se deu em 23/1/2020, há que se ponderar que a questão concernente ao ANPP somente restou suscitada em sede de apelação, quando já havia inclusive sentença condenatória prolatada, não se podendo falar na aplicação do art. 28-A do CPP, em face também de preclusão.
6. No que concerne ao alegado vício da citação por hora certa, a "(. ..) jurisprudência desta Corte é no sentido de que o envio da correspondência mencionada no art. 229 do CPC, contendo a informação da citação por hora certa, é mera formalidade, não se constituindo como requisito para sua validade, que ocorreu de forma regular" (AgRg no REsp n. 1.537.625/RJ, Rel. Ministro Moura Ribeiro, 3ª T., DJe 13/10/2015, destaquei). No mesmo entendimento, cito, ainda, o AgRg no REsp 1.430.255/MG e o REsp 1.084.030/MG.
7. Ademais, é cediço que, "não se logrando êxito na comprovação do alegado prejuízo, tendo somente sido suscitada genericamente a matéria, mostra-se inviável, pois, o reconhecimento de qualquer nulidade processual, em atenção ao princípio do pas de nullité sans grief" (RHC n. 71.493/RJ, Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, 6ª T., DJe 12/9/2016).
8. Em relação ao pleito de absolvição por suposta atipicidade da conduta o Supremo Tribunal Federal, em apreciação do RHC n. 163.334/SC, fixou a seguinte tese a respeito da tipicidade do delito previsto no art. 2.º, II, da Lei n. 8.137/1990: "O contribuinte que, de forma contumaz e com dolo de apropriação, deixa de recolher o ICMS cobrado do adquirente da mercadoria ou serviço incide no tipo penal do art. 2º, II, da Lei nº 8.137/1990".
9. Na oportunidade, ficou assentado que "a caracterização do crime depende da demonstração do dolo de apropriação, a ser apurado a partir de circunstâncias objetivas factuais, tais como o inadimplemento prolongado sem tentativa de regularização dos débitos, a venda de produtos abaixo do preço de custo, a criação de obstáculos à fiscalização, a utilização de 'laranjas' no quadro societário, a falta de tentativa de regularização dos débitos, o encerramento irregular das suas atividades, a existência de débitos inscritos em dívida ativa em valor superior ao capital social integralizado etc" (RHC n. 163334, relator ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 18/12/2019, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-271 DIVULG 12/11/2020 PUBLIC 13/11/2020).
10. Precedente da Suprema Corte que reforça a jurisprudência desta Corte a respeito da tipicidade do não recolhimento de ICMS cobrado do adquirente da mercadoria ou serviço, porém, acrescenta duas novas condições para a caracterização do delito: a) prática contumaz e b) dolo de apropriação.
11. Na hipótese vertente, o recorrente foi condenado à pena de 10 (dez) meses de detenção, em regime inicial aberto, por infração ao art. 2º, II, da Lei n. 8.137/90, c/c o art. 71, caput, do CP, porque, na qualidade de sócio e administrador da empresa Lucas Vieira Santiago ME., deixou de efetuar, no prazo legal, por 11 (onze) vezes, em crime continuado, no período compreendido entre fevereiro de 2018 e março de 2019, o recolhimento aos cofres públicos do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços - ICMS, no valor de R$ 141.125,78 (cento e quarenta e um mil e cento e vinte e cinco reais e setenta e oito centavos), referente à Inscrição em Dívida Ativa n. 19046351451 RUAN TRANSPORTES LTDA. 12. Diante do entendimento exarado pela Suprema Corte, entendo que o razoável período de inadimplência fiscal (onze vezes) e o valor que deixou de ser recolhido (R$ 141.125,78 (cento e quarenta e um mil e cento e vinte e cinco reais e setenta e oito centavos)) é suficiente para comprovar a imputação da contumácia, que passou a ser exigida pelo STF, sendo típica a conduta do envolvido, impondo-se a manutenção de sua condenação.
13. Precedentes.
14. Agravo regimental desprovido.
(AgRg no REsp n. 2.094.085/SC, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 6/2/2024, DJe de 14/2/2024).
AGRAVO REGIMENTAL EM EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM RECURSO ESPECIAL. PENAL. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. APROPRIAÇÃO INDÉBITA TRIBUTÁRIA. ART. 2º, II, DA LEI 8.137/1990 NA FORMA DO ART. 71 DO CP. FALTA DE RECOLHIMENTO DO ICMS PRÓPRIO DECLARADO. TIPICIDADE CONFIGURADA. JURISPRUDÊNCIA DA TERCEIRA SEÇÃO DESTA CORTE SUPERIOR. HC N. 399.109/SC, DJE 12/9/2018. PLEITO DE AFASTAMENTO DA TIPICIDADE. CONTUMÁCIA E DOLO DE APROPRIAÇÃO RECONHECIDOS PELA INSTÂNCIA ORDINÁRIA.
1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é no sentido da tipicidade do não recolhimento de ICMS, na qualidade de operações próprias.
2. [...] a Terceira Seção deste Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento do HC n. 399.109/SC, pacificou o entendimento de que o não recolhimento do ICMS em operações próprias é fato típico (HC n. 399.109/SC, Rel. Ministro JOEL ILAN PARCIONIK, Terceira Seção, julgado em 22/8/2018, DJe de 12/9/2018) (AgRg no AREsp n. 1.792.837/SC, Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, DJe 8/4/2021).
3. A Corte catarinense dispôs as seguintes razões (fl. 274): [...], sobre o elemento subjetivo do tipo, convém ressaltar que a configuração da conduta criminosa prevista no art. 2º, II, da Lei 8.137/1990 dispensa a presença de especial fim de agir, bastando a configuração do dolo genérico, consistente na consciência, ainda que potencial, de deixar de "recolher, no prazo legal, valor de tributo ou de contribuição social, descontado ou cobrado, na qualidade de sujeito passivo de obrigação e que deveria recolher aos cofres públicos"(LIMA, Renato Brasileiro de. Legislação criminal especial comentada, 8ª ed., Salvador: juspodivm, 2020, p. 255), o que restou evidenciado no caso. [...] A contumácia igualmente se revela presente, mormente por ter o apelante cometido o crime por 8 (oito) vezes ao longo do ano de 2019, como visto. [...], o caso dos autos não trata apenas de um débito fiscal e de mero inadimplemento, mas sim da apropriação dos valores, pela empresa administrada pelo apelante, de impostos descontados ou cobrados de terceiros aos cofres públicos. É por isso que a má administração e falta de planejamento tributário não podem ser arguidas para eximir-se da obrigação, sendo inviável tanto a absolvição por atipicidade da conduta como a exclusão da culpabilidade pelo reconhecimento da inexigibilidade de conduta diversa.
4. [...], nos termos da jurisprudência desta Corte Superior, os crimes de sonegação fiscal e apropriação indébita previdenciária prescindem de dolo específico, sendo suficiente, para a sua caracterização, a presença do dolo genérico consistente na omissão voluntária do recolhimento, no prazo legal, dos valores devidos (AgRg no AREsp 469.137/RS, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 5/12/2017, DJe 13/12/2017) - (AgRg nos EDcl no AREsp n. 1.650.790/RN, Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, DJe 13/8/2020).
5. O contribuinte que deixa de recolher, de forma contumaz e com dolo de apropriação, o ICMS cobrado do adquirente da mercadoria ou serviço incide no tipo penal do art. 2º, II, da Lei n. 8.137/1990 (STF, RHC 163.334/SC, Rel. Ministro ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 18/12/2019, DJe 12/11/2020; grifei) - (AgRg no REsp n. 2.049.204/SC, Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, DJe 16/6/2023).
6. Agravo regimental improvido.
(AgRg nos EDcl no REsp n. 2.013.545/SC, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 2/10/2023, DJe de 5/10/2023).
PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. CRIME TRIBUTÁRIO. ICMS DECLARADO E NÃO PAGO. CONTUMÁCIA DELITIVA E DOLO DE APROPRIAÇÃO. DOZE AÇÕES ILÍCITAS EM CONTINUIDADE DELITIVA. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO.
1. O STJ entende ser típica a conduta de deixar de repassar ao fisco o ICMS indevidamente apropriado. A ausência de fraude na apuração do tributo não é pressuposto desse delito, visto que ele não é praticado na clandestinidade. A conduta dolosa consiste na consciência de não recolher o valor do tributo devido. Precedentes.
2. A contumácia delitiva e o dolo de apropriação foram estabelecidos com base nas doze ações delituosas praticadas em sequência, circunstância que não se coaduna com a tese da inexigibilidade de conduta diversa.
3. Cada período mensal de apuração do ICMS declarado e não pago configura uma ação ilícita. Na hipótese, foi constatado o inadimplemento de doze exações, o que caracteriza a continuidade delitiva.
4. Agravo regimental não provido.
(AgRg no HC n. 760.150/SC, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 17/4/2023, DJe de 19/4/2023).
Por fim, para reverter o entendimento firmado pelas instâncias ordinárias, seria necessário o revolvimento de fatos e provas, o que é vedado em sede de habeas corpus.
Por fim, o acórdão impugnado está em consonância com o entendimento desta Corte, no sentido de que dificuldades financeiras alegadas pela paciente “não configuram excludente de culpabilidade, pois [a] administrador[a] não demonstrou ter adotado medidas para regularizar a dívida tributária, como renegociação ou parcelamento. O STJ entende que a escolha do gestor de priorizar outras obrigações financeiras não afasta o dolo de apropriação no não recolhimento do tributo.” (REsp n. 2.052.151/SC, relatora Ministra Daniela Teixeira, Quinta Turma, julgado em 11/2/2025, DJEN de 17/2/2025).
Ante o exposto, não conheço do habeas corpus.
Publique-se. Intimem-se.
Relator
RIBEIRO DANTAS
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