Resultados para o tribunal: STJ

Resultados para "5004384-30.2023.8.13.0210"

1. Marcelo Machado Tavares (Recorrente) x 2. Ministério Público Federal (Recorrido)

ID: 333032571

Tribunal: STJ Órgão: SPF COORDENADORIA DE PROCESSAMENTO DE FEITOS DE DIREITO PENAL Classe: RECURSO ORDINáRIO EM HABEAS CORPUS Nº Processo: 5029844-45.2024.4.03.0000

Data de Disponibilização: 24/07/2025

Polo Ativo:

1. MARCELO MACHADO TAVARES (RECORRENTE)

Polo Passivo:

2. MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (RECORRIDO)

DESPACHO / DECISÃO

Advogados:

LEONARDO ASSIS DA SILVA FILHO

OAB/PA XXXXXX Desbloquear

RAFAEL FECURY NOGUEIRA

OAB/PA XXXXXX Desbloquear

RHC 214231/SP (2025/0124377-7) RELATOR : MINISTRO REYNALDO SOARES DA FONSECA RECORRENTE : MARCELO MACHADO TAVARES ADVOGADOS : RAFAEL FECURY NOGUEIRA - PA012452 LEONARDO ASSIS DA SILVA FILHO - PA03191… RHC 214231/SP (2025/0124377-7) RELATOR : MINISTRO REYNALDO SOARES DA FONSECA RECORRENTE : MARCELO MACHADO TAVARES ADVOGADOS : RAFAEL FECURY NOGUEIRA - PA012452 LEONARDO ASSIS DA SILVA FILHO - PA031917 RECORRIDO : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL DECISÃO Trata-se de recurso em habeas corpus, com pedido liminar, interposto por RAFAEL FECURY NOGUEIRA contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (HC n. 5029844-45.2024.4.03.0000). Consta dos autos que o recorrente foi denunciado como incurso no art. 293, V, c/c § 1º, I, do CP. Irresignada, a defesa impetrou prévio writ, o qual foi julgado nos termos da seguinte ementa (e-STJ fls. 124): PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. LITISPENDÊNCIA. 1. Inocorrência de litispendência porque o uso das guias falsificadas não se exauriu no âmbito de apenas um dos contratos firmados pelo paciente, e sim em contextos distintos e, como tal, a potencialidade lesiva da fraude não se exauriu com a apresentação única a apenas um dos órgãos públicos contratantes. 2. A tese de que a falsificação absorve o uso porque este seria post factum impunível, no caso, não procede. Ainda que o próprio paciente tenha falsificado as guias de recolhimento, o uso posterior se deu por mais de uma vez com finalidades distintas, em contextos diversos, e desse modo o crime-meio (o falso) não pode prevalecer sobre o crime-fim (o uso). 3. Ordem denegada. No presente recurso, a defesa aduz, em síntese, que há litispendência entre o feito n. 5013909-22.2020.4.03.6105 (1ª Vara Federal de Campinas) e o de n. 5004384-15.2023.4.04.7000 (23ª Vara Federal de Curitiba). Assevera, em suma, que ambos os feitos objeto da presente argumentação tratam, em verdade, do mesmo crime, a saber a falsificação das GFIP’S, sendo que essas mesmas falsificações foram, pelo mesmo motivo de obtenção de lucro, empregadas em contratos tanto em Campinas quanto em Curitiba. Por isso, é cristalina a existência de litispendência decorrente do reconhecimento de que o uso de documento falso constitui mero exaurimento da mesma falsificação sobre a qual versam ambos os processos (e-STJ fl. 144). Esclarece, nesse contexto, que o que está em jogo não é a ocorrência de uma única falsificação ou a possibilidade em abstrato do reconhecimento da litispendência, mas sim exatamente se concretamente o ilícito de falsificação possui capacidade de absorver o ilícito de uso de documento falsificado, assim consumando a identidade entre os feitos e, por conseguinte, a litispendência (e-STJ fl. 139). Requer, ao fim, o reconhecimento da litispendência entre o feito n. 5013909-22.2020.4.03.6105 (1ª Vara Federal de Campinas) e o de n. 5004384-15.2023.4.04.7000 (23ª Vara Federal de Curitiba). Não houve pedido liminar. O Ministério Público Federal se manifestou, às e-STJ fls. 162/164, nos seguintes termos: RECURSO EM HABEAS CORPUS. FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO PÚBLICO E USO DO DOCUMENTO FALSO PARA FIRMAR CONTRATOS COM ÓRGÃOS PÚBLICOS DIVERSOS. NÃO EXAURIMENTO DO POTENCIAL LESIVO. CONSUNÇÃO NÃO CARACTERIZADA. INEXISTÊNCIA DE LITISPENDÊNCIA ENTRE AS AÇÕES. DESPROVIMENTO. 1. Segundo entendimento do STJ, “[n]os casos de falsificações, para que se reconheça a consunção, é necessário que a conduta imputada seja definida como fase de preparação ou de execução de outro delito, além do exaurimento do potencial lesivo do documento” (AgRg no AR Esp n. 2.493.291/RS, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 19/3/2024, D Je de 2/4/2024). 2. Na espécie, como consignado no acórdão impugnado, as guias de recolhimento falsificadas foram utilizadas ilicitamente em contextos distintos, para firmar contratos com diferentes órgãos públicos, o que bem evidencia a permanência de seu potencial lesivo para burlar outros negócios jurídicos. Logo, não exaurido o potencial lesivo do falso, não há falar em aplicação do princípio da consunção. 3. Tratando-se de condutas ilícitas diversas, inviável o reconhecimento de litispendência entre as ações. 4. Parecer pelo desprovimento do recurso ordinário. É o relatório. Decido. Busca da defesa o reconhecimento da litispendência entre o feito n. 5013909-22.2020.4.03.6105 (1ª Vara Federal de Campinas) e o de n. 5004384-15.2023.4.04.7000 (23ª Vara Federal de Curitiba). Como é de conhecimento, A litispendência guarda relação com a ideia de que ninguém pode ser processado quando está pendente de julgamento um litígio com as mesmas partes (eadem personae), sobre os mesmos fatos (eadem res), e com a mesma pretensão (eadem petendi), que é expressa por antiga máxima latina, o ne bis in idem (RHC n. 104.123/SP, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 17/9/2019, DJe de 20/9/2019). A Corte de origem, ao examinar o feito, assim decidiu (e-STJ fls. 117/122): Litispendência é uma defesa indireta, voltada, no caso, ao trancamento da ação penal de origem, na qual o paciente foi denunciado pela prática, em tese, do crime previsto no art. 293, V, c. c. § 1º, I do Código Penal, no seguinte contexto (ID 308571853): Em 19/08/2019 foi celebrado um contrato administrativo entre a ALFÂNDEGA INTERNACIONAL DO AEROPORTO DE VIRACOPOS (contratante) e a empresa PEOPLE RH & SERVIÇOS TERCEIRIZADOS EIRELI (contratada), CNPJ nº 11.980.040/0001-63, localizada na Av. Generalíssimo Deodoro, nº 645, térreo, setores 1, 2 e 3, Umarizal, em Belém/PA, de propriedade, à época, de MARCELO MACHADO TAVARES, com a seguinte cláusula obrigacional à empresa contratada: 123. Fornecer, sempre que solicitados pela Contratante, os comprovantes do cumprimento das obrigações previdenciárias, do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS, e do pagamento dos salários e demais benefícios trabalhistas dos empregados colocados à disposição da Contratante. Em sede de fiscalização do contrato, ao consultar o sistema GFIPWEB da previdência social, a administração da ALFÂNDEGA DE VIRACOPOS constatou a ausência de recolhimento das parcelas referentes ao INSS das competências de 09/2019, 11/2019, 13/2019 e 01/2020, embora a PEOPLE RH & SERVIÇOS tivesse efetuado as respectivas retenções dos valores nas folhas de pagamento dos funcionários terceirizados que prestavam serviços na Aduana. Devidamente notificado, MARCELO MACHADO TAVARES providenciou fossem apresentadas, à ALFÂNDEGA DE VIRACOPOS, em fevereiro de 2020, em data incerta, via email, as respectivas Guias de Pagamento (GFIP’s) que comprovariam os recolhimentos das competências acima, porém, o sistema DATAPREV continuava a apontar a ausência de pagamento dos valores devidos para as competências de 09/2019 e 11/2019. Da análise detida das GFIP’s apresentadas pelo DENUNCIADO, referentes à essas duas competências, verificou-se que possuíam o mesmo número de autenticação bancária promovida, supostamente, pelo Banco Bradesco, qual seja, 003.777.897.368.142. Outrossim, a autenticação da competência de 11/09 datava de 19/09/2019, ou seja, dois meses antes da data dos fatos geradores, restando evidente que se tratavam de documentos falsificados (ID 43788657). Os impetrantes alegam que há bis in idem na acusação porque o paciente foi denunciado e condenado pelos mesmos fatos na Ação Penal n.5004384-15.2023.4.04.7000, pela 23ª Vara Federal de Curitiba, tendo sido aplicada a pena de 5 (cinco) anos de reclusão, em regime inicial semiaberto, e 24 dias-multa (IDs 308072928 e 308072929). No entanto, sobre o incidente, o juízo impetrado assim decidiu ao ratificar o recebimento da denúncia (ID 308571854): Em que pese a litispendência ser matéria oponível via exceção, nos termos do que prevê o artigo 95, inciso III, do CPP, aprecio o pedido de reconhecimento de litispendência formulado em sede de resposta eis que manifestamente improcedente. Destaca-se que a defesa não junta qualquer documento em sua peça processual a fim de corroborar o alegado. No entanto, em mera consulta processual aos autos 5004384-15.2023.4.04.7000, perante o site da Justiça Federal do Paraná, verifica-se que a imputação ao réu pela prática do delito previsto no mesmo tipo penal a ele atribuído no presente feito se refere a condutas praticadas no âmbito de contratos celebrados com a Procuradoria da República no Estado do Paraná e com o Ministério Público do Trabalho/Procuradoria Regional do Trabalho da 9ª Região, diferentemente do presente feito, em que os documentos falsos foram apresentados perante a Alfândega do Aeroporto Internacional de Viracopos, sem, portanto, identidade de fato a ensejar o reconhecimento da litispendência. Não há falar em identidade entre as ações penais. De acordo com a denúncia que levou à condenação do paciente pela Justiça Federal do Paraná (ID 308072928; sem os destaques no original): 1º FATO – FALSIFICAR/USAR GUIAS DA PREVIDÊNCIA SOCIAL – ART. 293, V e §1º, I DO CÓDIGO PENAL CONTRATO N. 10/2019 CELEBRADO COM A PROCURADORIA DA REPÚBLICA NO ESTADO DO PARANÁ Pelo menos entre os meses de setembro a dezembro de 2019, o denunciado MARCELO MACHADO TAVARES, na qualidade de gestor da empresa People RH & Serviços Terceirizados Eireli, ciente da ilicitude e reprovabilidade de sua conduta, falsificou e posteriormente usou Guias da Previdência Social – GPS adulteradas junto ao contratante UNIÃO – PROCURADORIA DA REPÚBLICA NO ESTADO DO PARANÁ. Depreende-se do teor da certidão de ev. 1, PORT_INST_IPL1, fl. 07, que no dia 13/03/2020, a Coordenadoria de Administração da Procuradoria da República no Paraná recebeu ligação de Vinícius Rafael dos Santos Pereira, o qual informou acerca da possível adulteração dos comprovantes de pagamento bancário das Guias de Previdência Social, enviados mensalmente à fiscalização administrativa do contrato em execução n. 10/2019. Ato contínuo, no âmbito administrativo, instaurou-se o Procedimento de Gestão Administrativa – PGEA n. 1.25.000.000933/2020-24, no bojo do qual foi confeccionado o MEMORANDO n. 347/2020/DICGC/PRPR com a seguinte informação ( ev. 1, PORT_INST_IPL1, fl. 79 e 80) (...) 2. Da análise minuciosa das guias e comprovantes de pagamento, verificou-se que há indícios de que os comprovantes de transação bancária possam ter sido adulterados. Nota-se que na página 09, o comprovante de pagamento da GPS de competência 08/19, possui o mesmo código de autenticação e o mesmo número de controle do comprovante de pagamento de folhas 13, da GPS de competência 11/19. Sendo que ainda no documento de folhas 13, pode ser verificado que a data de operação é 20/11/19 e a data de pagamento, 19/09/19, indicando assim sua adulteração. Já no comprovante bancário de folhas 15, observa-se que a data de operação é 19/12/19, mas a data de pagamento é 19/11/19, sendo que a GPS a qual se refere foi emitida em 09/12/19. 3. Aparentemente, não foram detectados indícios da mesma natureza nos documentos relativos ao FGTS. [...] Por ocasião do encerramento do PGEA 1.25.000.000933/2020-24, concluiu-se pela presença de indícios da falsificação dos comprovantes enviados pela empresa, envolvendo as competências de 08/2019, 09/2019, 11/2019 e 12/2019 [...] 2º FATO – FALSIFICAR/USAR GUIAS DA PREVIDÊNCIA SOCIAL – ART. 293, V e §1º, I DO CÓDIGO PENAL CONTRATO N. 020/2019 CELEBRADO COM O MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO/PROCURADORIA REGIONAL DO TRABALHO DA 9ª REGIÃO Pelo menos entre os meses de setembro a dezembro de 2019, o denunciado MARCELO MACHADO TAVARES, na qualidade de gestor da empresa People RH & Serviços Terceirizados Eireli, ciente da ilicitude e reprovabilidade de sua conduta, falsificou e posteriormente usou Guias da Previdência Social – GPS adulteradas junto ao contratante UNIÃO – PROCURADORIA REGIONAL DO TRABALHO DA 9ª REGIÃO. Depreende-se que tal como ocorreu no fato 1 acima narrado, no dia 13/03/2020, o Ministério Público do Trabalho também recebeu ligação de Vinícius Rafael dos Santos Pereira, informando acerca da possível adulteração dos comprovantes de pagamento referentes às Guias de Previdência Social (ev. 4, fl. 51) [...] Nesse contexto, diligenciou-se ao MPT para que fornecesse as Guias da Previdência Social (GPS) do Contrato 020/2019 (ev. 29, fls. 14 e ss.), as quais, ao serem submetidas à análise da instituição financeira, chegou-se a conclusão de também terem sido falsificadas (ev. 33, fl. 05): “(...) não identificamos os pagamentos das transações bancarias ocorridas em nome da empresa People RH e Serviços Tercerizados Eireli EPP CNPJ: 11.980.040/0001-63”. (...) Pontua-se tratarem as referidas guias das competências 12/2019 (ev. 29, fl. 14); 09/2019 (ev. 29, fl. 26) e 11/2019 (ev. 29, fl. 31). Pois bem. Dos fatos narrados consta que o paciente, na condição de titular da PEOPLE RH & SERVIÇOS TERCEIRIZADOS EIRELI, firmou contratos com órgãos públicos de São Paulo (Alfândega Internacional administrativos distintos do Aeroporto de Viracopos) e do Paraná (Procuradoria da República e Procuradoria Regional do Trabalho) e, instado a comprovar as obrigações previdenciárias decorrentes das avenças, teria apresentado guias falsificadas a tais órgãos. No entanto, segundo os impetrantes, nas duas ações penais "abordam-se exatamente as mesmas falsificações, das mesmas Guias de Recolhimento, do mesmo período". Partindo-se dessa premissa, é fácil concluir que o uso das guias falsificadas não se exauriu no âmbito de apenas um dos contratos firmados. E isso basta para afastar a litispendência. O uso das guias se deu em contextos distintos e, como tal, a potencialidade lesiva da fraude não se exauriu com a apresentação única a apenas um dos órgãos contratantes. A tese de que a falsificação absorve o uso porque este seria post factum impunível, no caso, não procede. Ainda que o próprio paciente tenha falsificado as guias de recolhimento, o uso posterior se deu por mais de uma vez com finalidades distintas, em contextos diversos, e desse modo o crime-meio (o falso) não pode prevalecer sobre o crime-fim (o uso). Nesse sentido, transcrevo a manifestação da Procuradoria Regional da República (ID 310010787): Embora os Impetrantes tragam tese conhecida, ou seja, quando o mesmo agente falsifica documento e o utiliza, deve responder apenas pela falsificação, tal critério depende do exaurimento do documento falso em seu uso posterior à falsificação, ou seja, o documento falso utilizado deve demarcar que o iter criminis da falsificação foi finalizado, sem início de novo ciclo delitivo com o mesmo documento falsificado. No caso concreto, não houve tal exaurimento, pois, após a utilização dos documentos falsos em um contexto (no Paraná), houve novo uso dos mesmos documentos falsos em outro local e órgão (na Alfândega do Aeroporto de Viracopos). Há assim, duas séries distintas de crimes, sem exaurimento do delito. E, como já delineado, o não exaurimento do falso em sua utilização é patente, pois houve uso de documento falso tanto em Curitiba/PR quanto em Campinas/SP, em três órgãos administrativos distintos (Procuradoria da República no Estado do Paraná, Procuradoria Regional do Trabalho da 9ª Região/PR e Alfândega do Aeroporto Internacional de Viracopos) [...]. Posto isso, DENEGO A ORDEM de habeas corpus. É o voto. Como se vê, o paciente foi denunciado e condenado por fatos similares em ambas as ações penais (n. 5013909-22.2020.4.03.6105 - 1ª Vara Federal de Campinas e n. 5004384-15.2023.4.04.7000 - 23ª Vara Federal de Curitiba), contudo, o Tribunal de origem afastou a ocorrência de litispendência sob o fundamento de que embora os processos se refiram a crimes da mesma natureza, foram praticados em contextos fáticos distintos, de forma que não há que se falar em litispendência se as condutas delitivas imputadas se referem a fatos diversos. Destacou, ainda, afastando a pretensão defensiva de consunção entre os crimes de falsificação e uso de documento falso, e, por conseguinte, da litispendência, que o uso das guias falsificadas não se exauriu no âmbito de apenas um dos contratos firmados. E isso basta para afastar a litispendência. O uso das guias se deu em contextos distintos e, como tal, a potencialidade lesiva da fraude não se exauriu com a apresentação única a apenas um dos órgãos contratantes. A tese de que a falsificação absorve o uso porque este seria post factum impunível, no caso, não procede. Com efeito, na espécie, constata-se que as guias falsificadas foram utilizadas perante a Procuradoria da República no Estado do Paraná, Procuradoria Regional do Trabalho da 9ª Região/PR e Alfândega do Aeroporto Internacional de Viracopos. De tal modo, após a utilização dos documentos falsos em um contexto (no Paraná), houve novo uso dos mesmos documentos falsos em outro local e órgão (na Alfândega do Aeroporto de Viracopos). Há assim, duas séries distintas de crimes, sem exaurimento do delito. E, como já delineado, o não exaurimento do falso em sua utilização é patente, pois houve uso de documento falso tanto em Curitiba/PR quanto em Campinas/SP, em três órgãos administrativos distintos (e-STJ fls. 121). Ao ensejo, tratando-se de fatos distintos veiculados em ações penais diversas, não há que se falar em litispendência (HC n. 497.023/ES, relator Ministro Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, julgado em 11/6/2019, DJe de 21/6/2019). Ainda que assim não o fosse, destaco, conforme pacífica orientação jurisprudencial desta Corte Superior, que a verificação da litispendência em sede de habeas corpus, por demandar o reexame da matéria fática para o trancamento da ação penal, não é cabível nos estreitos limites da ordem constitucional impetrada. Nesse sentido, são os seguintes julgados do STJ: AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS DENEGADO. TRÁFICO E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. LAVAGEM DE DINHEIRO. PRISÃO PREVENTIVA. IDONEIDADE DA FUNDAMENTAÇÃO. ACÓRDÃO DO TRIBUNAL ESTADUAL EM CONFORMIDADE COM A JURISPRUDÊNCIA DO STJ INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA. NULIDADE NÃO CONFIGURADA. PROCEDIMENTO PRÉVIO. PRECEDENTES. TESE DE INAUTORIZADO ACESSO AO WHATSAPP. INOVAÇÃO RECURSAL. ALEGAÇÃO DE LITISPENDÊNCIA. QUESTÃO PREJUDICADA. NECESSIDADE DE REEXAME APROFUNDADO DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. INADMISSIBILIDADE. [...] 5. Em relação à tese de litispendência apresentada pela defesa, em relação ao crime previsto no art. 35, caput, da Lei n. 11.343/2006, com a superveniência da prolação de sentença do processo sem o julgamento do mérito - bem como de sentença condenatória -, ficou esvaziado o objeto da presente impetração. Ademais, é inadmissível em habeas corpus a análise aprofundada da questão da identidade de crimes, por demandar reexame de matéria fático-probatória. Precedentes. 6. Agravo regimental improvido. (AgRg no HC n. 659.077/SP, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 21/6/2022, DJe de 27/6/2022.) - negritei. HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. TRÁFICO E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO DE DROGAS. POSSE E PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO. CORRUPÇÃO DE MENORES. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS DE AUTORIA E MATERIALIDADE. NECESSIDADE DE ANÁLISE DE PROVAS. VIA INADEQUADA. IMPUTAÇÃO DA PRÁTICA CRIMINOSA SOMENTE APÓS A MAIORIDADE. CRIMES PERMANENTES. PRISÃO PREVENTIVA. ENVOLVIMENTO COM ESTRUTURADA ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA QUE ATUA NO COMÉRCIO ILEGAL DE DROGAS. CONDIÇÕES PESSOAIS FAVORÁVEIS. IRRELEVÂNCIA. MEDIDAS CAUTELARES DIVERSAS DA PRISÃO. INSUFICIÊNCIA, NO CASO. SUPOSTA LITISPENDÊNCIA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO VERIFICADO. EXTENSÃO DE EFEITOS. IMPOSSIBILIDADE. DIVERSIDADE DE SITUAÇÃO FÁTICO-PROCESSUAL. EXCESSO DE PRAZO. NÃO OCORRÊNCIA. DEMAIS QUESTÕES. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. HABEAS CORPUS PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESSA EXTENSÃO, DENEGADA A ORDEM, COM RECOMENDAÇÃO. [...] 7. "[...] a análise acerca da litispendência exige meticuloso exame sobre seus elementos configuradores - identidade de partes, dos fatos e da pretensão - o que demandaria o reexame de matéria fática, o que é vedado nos estreitos limites da via impugnativa" (AgRg no RHC 132.716/PA, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 03/11/2020, DJe 16/11/2020). Além disso, como bem destacado pelo Tribunal de origem, as condutas imputadas à Paciente nos autos originários são mais abrangentes que aquelas referidas em outra ação penal. [...] (HC n. 581.296/ES, relatora Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, julgado em 23/3/2021, DJe de 5/4/2021.) - negritei. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EM HABEAS CORPUS. ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO TRANSNACIONAL DE DROGAS. LITISPENDÊNCIA. FATOS APURADOS EM DISTINTOS ESTADOS SOBERANOS. BIS IN IDEM. NÃO OCORRÊNCIA. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. A litispendência guarda relação com a ideia de que ninguém pode ser processado quando está pendente de julgamento um litígio com as mesmas partes (eadem personae), sobre os mesmos fatos (eadem res), e com a mesma pretensão (eadem petendi), que é expressa por antiga máxima latina, o ne bis in idem. 2. Pela análise de normativa internacionais incorporada e vigentes no ordenamento jurídico brasileiro, constata-se a regra de que é a sentença definitiva oriunda de distintos Estados soberanos - e não a existência de litígio pendente de julgamento - que pode obstar a formação, a continuação ou a sobrevivência da relação jurídica processual que configuraria a litispendência. 3. Não há elementos suficientes nos autos para se afirmar, com certeza, que a investigação realizada no Uruguai envolveu exatamente as mesmas condutas. Ademais, caso se reconheça, na jurisdição ordinária, que o recorrente haja respondido, no Uruguai, pelos mesmos fatos delituosos a que veio a ser condenado no Brasil, dúvidas não há de que incidirá o art. 8º do Código Penal: "A pena cumprida no estrangeiro atenua a pena imposta no Brasil pelo mesmo crime, quando diversas, ou nela é computada, quando idênticas". Tal dispositivo, embora não cuide propriamente da proibição de dupla punição e persecução penais, dispõe sobre o modo como deve ser resolvida a situação de quem é punido por distintos Estados soberanos pela prática do mesmo delito. 4. Não se afigura possível, na via estreita do habeas corpus, avaliar a extensão das investigações realizadas numa e noutra ação penal, bem como os fatos delituosos objeto de um e de outro processo, para se concluir, com precisão, se há ou não bis in idem ou litispendência. 5. A questão da litispendência há de ser enfrentada e dirimida nas instâncias ordinárias, onde o maior âmbito da cognição - horizontal e vertical - permitirá a aferição da efetiva ocorrência do alegado pressuposto negativo da validade da relação processual. 6. Agravo regimental não provido. (AgRg no RHC n. 106.983/SP, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 28/4/2020, DJe de 30/4/2020.) - negritei. PROCESSO PENAL. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL POR AUSÊNCIA DE INDÍCIOS MÍNIMOS PARA SUSTENTÁ-LA. ASSERTIVA DE LITISPENDÊNCIA. EXAME APROFUNDADO DE PROVAS. IMPOSSIBILIDADE NA VIA ELEITA. RECURSO DESPROVIDO. 1. Para se concluir pela existência de litispendência e que o paciente deveria ser absolvido sumariamente, é necessário o exame aprofundado de provas, inviável em sede de habeas corpus. 2. Recurso ordinário desprovido. (RHC n. 103.316/MG, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 21/5/2019, DJe de 3/6/2019.) - negritei. HABEAS CORPUS. IMPETRAÇÃO SUBSTITUTIVA DO RECURSO PRÓPRIO. NÃO CABIMENTO. TRÁFICO DE DROGAS E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA. NULIDADE. FUNDAMENTAÇÃO ADEQUADA. LITISPENDÊNCIA. CAUSAS DE PEDIR DIVERSAS. ATIPICIDADE DE CONDUTA. NECESSIDADE DE REEXAME DE FATOS E DE PROVAS. DOSIMETRIA. TERCEIRA FASE. AUMENTO SUPERIOR À FRAÇÃO MÍNIMA. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. VÍCIOS NÃO VERIFICADOS. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. [...] 5. A Corte de origem rechaçou os argumentos em favor da litispendência por não haver constatado identidade de causa de pedir entre os processos supracitados e esta ação penal. Para que se chegue a conclusão diversa e se reconheça a litispendência tal como pretende a defesa, é necessário ingressar no conjunto fático-probatório dos autos. Tal providência, contudo, não se coaduna com os estreitos limites cognitivos do habeas corpus, segundo entendimento jurisprudencial consolidado nesta Corte. 6. Do mesmo modo, a tese absolutória quanto ao crime de tráfico de drogas depende de nova incursão no conjunto fático-probatório, providência inviável na via eleita. 7. É certo afirmar que a simples constatação da existência de duas ou mais majorantes não é suficiente para que a pena seja alçada a patamar acima da fração mínima prevista - 1/6 - , sendo necessário, para tanto, a ocorrência de circunstâncias reveladoras de gravidade capazes de reclamar maior severidade na reprovação da conduta. 8. Na espécie, foram apresentados elementos que demonstram a gravidade concreta da conduta, especialmente em razão do envolvimento de grande número de menores e de armas, o que justifica a escolha de fração superior à mínima. 9. Habeas corpus não conhecido. (HC n. 429.289/RJ, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 4/4/2019, DJe de 30/4/2019.) - negritei. Ante o exposto, nego provimento ao recurso em habeas corpus. Publique-se. Relator REYNALDO SOARES DA FONSECA

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