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Carine Jamile Feitosa Da Silva Maia x Banco Bradesco Financiamentos S/A e outros

ID: 319568671

Tribunal: TJBA Órgão: 1ª V DOS FEITOS DE REL DE CONS CIV E COMERCIAIS DE BARREIRAS Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 8001356-46.2019.8.05.0022

Data de Disponibilização: 08/07/2025

Polo Ativo:

CARINE JAMILE FEITOSA DA SILVA MAIA

Polo Passivo:

BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S/A GMAC ADMINISTRADORA DE CONSORCIOS LTDA. MAPFRE SEGUROS GERAIS S.A.

Sentença

Advogados:

FELIPE D AGUIAR ROCHA FERREIRA

OAB/RJ XXXXXX Desbloquear

ADAHILTON DE OLIVEIRA PINHO

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

CARLOS EDUARDO CAVALCANTE RAMOS

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

ROBERTA BEATRIZ DO NASCIMENTO

OAB/BA XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA 1ª V DOS FEITOS DE REL DE CONS CIV E COMERCIAIS DE BARREIRAS Processo: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL n. 8001356-46.2019.8.05.0022 Órgão J… PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA 1ª V DOS FEITOS DE REL DE CONS CIV E COMERCIAIS DE BARREIRAS Processo: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL n. 8001356-46.2019.8.05.0022 Órgão Julgador: 1ª V DOS FEITOS DE REL DE CONS CIV E COMERCIAIS DE BARREIRAS AUTOR: CARINE JAMILE FEITOSA DA SILVA MAIA Advogado(s): REU: GMAC ADMINISTRADORA DE CONSORCIOS LTDA. e outros (2) Advogado(s): ROBERTA BEATRIZ DO NASCIMENTO registrado(a) civilmente como ROBERTA BEATRIZ DO NASCIMENTO (OAB:BA46617), CARLOS EDUARDO CAVALCANTE RAMOS (OAB:BA37489), ADAHILTON DE OLIVEIRA PINHO (OAB:BA48727), FELIPE D AGUIAR ROCHA FERREIRA (OAB:RJ150735) SENTENÇA I - RELATÓRIO CARINE JAMILE FEITOSA DA SILVA MAIA, brasileira, casada, professora universitária, CPF nº 016.559.755-01, representada pela Defensoria Pública do Estado da Bahia, ajuizou AÇÃO DE REVISÃO CONTRATUAL COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA em face de GMAC ADMINISTRADORA DE CONSÓRCIOS LTDA., MAPFRE SEGUROS GERAIS S.A. e BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A., todas devidamente qualificadas nos autos. Alega a autora, em síntese, que firmou contrato de consórcio com os réus para aquisição de veículo, mas que, após o nascimento de sua filha, passou a enfrentar dificuldades financeiras que a impossibilitaram de cumprir as obrigações contratuais. Sustenta encontrar-se em situação de superendividamento, com comprometimento do mínimo existencial, razão pela qual requer a renegociação da dívida com limitação das parcelas mensais ao valor máximo de R$ 205,71. Em sede de tutela antecipada, pleiteou a suspensão da cobrança das parcelas vincendas até o julgamento definitivo da demanda. A inicial veio instruída com os documentos de fls. 24131422 a 24131487. Devidamente citados, os réus apresentaram contestação tempestiva. MAPFRE SEGUROS GERAIS S.A. (ids. 171139045 a 171139047), arguiu preliminares de inépcia da inicial, ausência de regulamentação sobre mínimo existencial e falta de interesse de agir. No mérito, sustentou a inaplicabilidade da Lei 14.181/21, a impossibilidade de repactuação de contratos com garantia real e a observância do princípio do pacta sunt servanda. GMAC ADMINISTRADORA DE CONSÓRCIOS LTDA. (id. 148467045), alegou inadequação da via eleita e disponibilização de vias administrativas para renegociação, pugnando pela improcedência dos pedidos. BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A. (ids. 141286320), corroborou os argumentos dos demais réus, sustentando a impossibilidade de revisão contratual e a necessidade de observância da força obrigatória dos contratos. Réplica ao id. 180042047, refutando as alegações defensivas e reiterando os argumentos da inicial. Instadas a especificar provas, as partes requereram o julgamento antecipado da lide (ids. 353024044, 350064938 e 356621660). Designada audiência de conciliação para 06/03/2024, a mesma restou infrutífera, conforme ata de id. 434328216. É o relatório. Passo a fundamentar e decidir. II - FUNDAMENTAÇÃO 2.1 - DAS PRELIMINARES 2.1.1 - DA INÉPCIA DA INICIAL A ré MAPFRE arguiu inépcia da inicial sob o fundamento de que não foram atendidos os requisitos mínimos da Lei 14.181/21, especificamente a ausência de proposta de plano de pagamento com prazo máximo de 5 anos e demonstração detalhada dos custos mensais indispensáveis à preservação do mínimo existencial. A preliminar não merece acolhimento. Nos termos do art. 330, §1º do CPC, considera-se inepta a petição inicial quando lhe faltar pedido ou causa de pedir, o pedido for indeterminado, da narração dos fatos não decorrer logicamente a conclusão ou contiver pedidos incompatíveis entre si. In casu, a petição inicial apresenta de forma clara e objetiva: (i) causa de pedir próxima - o superendividamento decorrente do nascimento da filha; (ii) causa de pedir remota - o direito à revisão contratual por onerosidade excessiva; (iii) pedido determinado - renegociação com limitação das parcelas mensais a R$ 205,71; (iv) nexo lógico entre os fatos narrados e a conclusão pleiteada. Ademais, a exigência dos requisitos específicos da Lei 14.181/21 não se aplica ao caso, considerando que referida lei entrou em vigor apenas em 02/07/2021, sendo posterior ao ajuizamento da presente ação (30/04/2019). Pela garantia constitucional da irretroatividade das leis (art. 5º, XXXVI da CF/88) e pelo princípio tempus regit actum, o pedido deve ser analisado com base na legislação vigente ao tempo da propositura da ação. Assim, REJEITO a preliminar de inépcia da inicial. 2.1.2 - DA AUSÊNCIA DE REGULAMENTAÇÃO SOBRE MÍNIMO EXISTENCIAL Sustenta a ré que a Lei 14.181/21 carece de regulamentação complementar específica para definição do mínimo existencial, sendo inaplicável até a devida regulamentação. A preliminar se confunde com o mérito e deve ser rejeitada. Como já fundamentado, o pedido autoral não se baseia na Lei do Superendividamento, mas sim no direito básico do consumidor à revisão de cláusulas contratuais quando se tornarem excessivamente onerosas por fatos supervenientes, previsto no art. 6º, V do CDC desde sua promulgação em 1990. A ausência de regulamentação específica da Lei 14.181/21 não impede a aplicação dos princípios gerais de proteção ao consumidor já consolidados no ordenamento jurídico. Assim, REJEITO a preliminar. 2.1.3 - DA FALTA DE INTERESSE DE AGIR Alega a ré que a autora não demonstrou qualquer situação de infortúnio ou fatos imprevisíveis que justifiquem a alteração contratual, não havendo interesse de agir por ausência de lesão ou ameaça a direito. A preliminar não procede. O interesse de agir se caracteriza pelo binômio necessidade-adequação. A autora demonstra: (i) necessidade - alegação de impossibilidade de cumprir as obrigações contratuais nos moldes pactuados em razão de alteração em sua situação financeira; (ii) adequação - a via jurisdicional é adequada para a revisão contratual pleiteada. A análise da efetiva ocorrência do fato superveniente e sua capacidade de justificar a revisão contratual constitui questão de mérito, não se confundindo com as condições da ação. Assim, REJEITO a preliminar de falta de interesse de agir. 2.2 - DO MÉRITO 2.2.1 - DA APLICABILIDADE DA LEI 14.181/21 Questão de relevante importância nos autos refere-se à aplicabilidade da Lei 14.181/21 (Lei do Superendividamento) ao caso em exame. Os réus sustentam que a autora não preencheu os requisitos da referida lei, enquanto a autora alega que seu pedido não se fundamenta na Lei do Superendividamento, mas exclusivamente no art. 6º do CDC. A razão assiste à autora. A Lei 14.181/21 entrou em vigor em 02/07/2021, sendo manifestamente posterior ao ajuizamento da presente ação (30/04/2019). Pela garantia constitucional da irretroatividade das leis (art. 5º, XXXVI da CF/88) e pelo princípio tempus regit actum, aplica-se a legislação vigente ao tempo da propositura da ação. Outrossim, a revisão contratual por onerosidade excessiva já era prevista no CDC desde 1990 (art. 6º, V), não havendo necessidade de invocar legislação superveniente. O instituto da Lei do Superendividamento constitui procedimento específico adicional, mas não exclui a possibilidade de revisão judicial com base nos princípios gerais do direito do consumidor. 2.2.2 - DOS CONTRATOS COM GARANTIA REAL Os réus alegam que o contrato de consórcio com alienação fiduciária se enquadra como "contrato de crédito com garantia real", estando excluído da repactuação conforme §1º do art. 104-A do CDC. O argumento não prospera. Primeiramente, conforme já fundamentado, a Lei 14.181/21 não se aplica ao caso por questões de direito intertemporal. Em segundo lugar, a exclusão prevista no §1º do art. 104-A do CDC refere-se especificamente ao processo de repactuação por superendividamento, não impedindo a revisão judicial por onerosidade excessiva com base no art. 6º, V do CDC. A existência de garantia real não constitui, per se, óbice intransponível à revisão contratual quando presentes os requisitos da onerosidade excessiva, conforme orientação jurisprudencial consolidada. 2.2.3 - DA CARACTERIZAÇÃO DO SUPERENDIVIDAMENTO E ONEROSIDADE EXCESSIVA Cerne da questão reside na análise da efetiva caracterização do superendividamento e da onerosidade excessiva alegados pela autora. Para configuração da onerosidade excessiva, nos termos do art. 317 do Código Civil c/c art. 6º, V do CDC, exige-se: (i) desproporção superveniente entre a prestação devida e o momento de sua execução; (ii) imprevisibilidade do evento modificador; (iii) boa-fé do devedor. Analisando-se as provas dos autos: A autora comprova que: (i) possui renda mensal de R$ 3.600,00 como professora universitária; (ii) contraiu obrigação relativa a consórcio para aquisição de veículo; (iii) alega que o nascimento da filha alterou substancialmente sua situação financeira. Contudo, a prova produzida nos autos não demonstra de forma convincente a caracterização da onerosidade excessiva, pelos seguintes fundamentos: a) Ausência de demonstração efetiva do comprometimento do mínimo existencial: Embora a autora tenha juntado planilha de gastos mensais (ID 24131473), a análise dos valores demonstra que sua renda de R$ 3.600,00 é superior à média nacional e não há prova robusta de que o cumprimento das obrigações contratuais comprometa efetivamente sua subsistência e de sua família. b) Insuficiência da prova do caráter imprevisível do fato superveniente: O nascimento de filhos, embora possa gerar despesas adicionais, não constitui, em regra, fato extraordinário e imprevisível justificador da revisão contratual. Considerando que a autora é casada, tal evento poderia ser razoavelmente previsto no momento da contratação. A jurisprudência nacional tem entendimento consolidado no sentido de que a mera alegação de dificuldades financeiras, sem demonstração concreta e robusta da impossibilidade de cumprimento das obrigações, não justifica a revisão contratual. A propósito: Revisional de contrato. Financiamento estudantil. Dificuldade financeira superveniente. Impossibilidade . A superveniência, por si, de dificuldade financeira do devedor não implica revisão do contrato de financiamento estudantil, sobremodo se não há alegação de abusividade ou ilegalidade no contrato, cuja obrigação foi assumida livre e espontaneamente. (TJ-RO - AC: 70097398220208220002 RO 7009739-82.2020.822 .0002, Data de Julgamento: 30/11/2021). Compromisso de compra de venda. Ação revisional de contrato. Financiamento Imobiliário. CDHU . Pedido de renegociação do contrato em razão de dificuldades financeiras e problemas de saúde dos adquirentes. Incidência da norma do art. 11, § 1º da Lei nº 8.692/93 . Inaplicabilidade da teoria da imprevisão. Precedentes. Sentença de improcedência do pedido mantida. Recurso desprovido. (TJ-SP - AC: 10054779020218260344 SP 1005477-90.2021.8.26 .0344, Relator.: Alexandre Marcondes, Data de Julgamento: 18/02/2022, 1ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 18/02/2022). ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. CONTRATOS BANCÁRIOS. AÇÃO REVISIONAL . CONTRATO DE MÚTUO. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR ( CDC). REVISÃO CONTRATUAL. DIFICULDADES FINANCEIRAS . REDUÇÃO DA RENDA. IMPOSSIBILIDADE. DESPROVIMENTO. 1 . O Código de Defesa do Consumidor é aplicável aos contratos do Sistema Financeiro Habitacional. 2. A dificuldade financeira da apelante para custear o pagamento das prestações do financiamento habitacional, por si só, não é suficiente para revisar o contrato. 3 . Inexiste obrigação legal da Caixa Econômica Federal de renegociar a dívida, sendo admitida tal possibilidade em determinadas modalidades contratuais e condições específicas (p.ex. artigos 4º, § 4º, e artigo 11, § 2º, da Lei nº 8.692/1993) . 4. Qualquer provimento jurisdicional impositivo nesse sentido configuraria ingerência indevida do Poder Judiciário na esfera da autonomia da vontade e a liberdade contratual das partes. 5. Apelo desprovido . (TRF-4 - AC: 50086318920214047200 SC, Relator.: VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS, Data de Julgamento: 25/01/2023, QUARTA TURMA). c) Disponibilidade de vias administrativas não utilizadas: Os réus demonstraram nos autos a disponibilização de diversos canais administrativos para renegociação de dívidas (centrais de renegociação, internet banking, feirões), não tendo a autora comprovado a tentativa de utilização de tais mecanismos antes do ajuizamento da ação. 2.2.4 - DO PRINCÍPIO DA FORÇA OBRIGATÓRIA DOS CONTRATOS O art. 421, parágrafo único do Código Civil, introduzido pela Lei 13.874/19, estabelece que "nas relações contratuais privadas, prevalecerão o princípio da intervenção mínima e a excepcionalidade da revisão contratual". Embora nas relações de consumo o CDC permita a revisão de cláusulas que se tornarem excessivamente onerosas (art. 6º, V), tal possibilidade deve ser exercida de forma excepcional, quando efetivamente demonstrados os requisitos legais. In casu, não restaram suficientemente comprovados os pressupostos autorizadores da revisão contratual, devendo prevalecer o princípio do pacta sunt servanda, em observância à segurança jurídica das relações contratuais. 2.2.5 - DA INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA A autora pleiteou a inversão do ônus probatório com base no art. 6º, VIII do CDC. A inversão do ônus da prova constitui faculdade judicial (art. 6º, VIII do CDC) e exige a presença de seus requisitos: verossimilhança das alegações ou hipossuficiência do consumidor. Embora reconheça a hipossuficiência técnica da autora em relação aos réus, a inversão do ônus probatório não altera o resultado da demanda, vez que o que se exigia da autora era a demonstração de sua própria situação econômica e do comprometimento de seu mínimo existencial, prova de produção relativamente simples e que estava ao seu alcance. A prova produzida pela autora, embora demonstre sua situação econômica, não foi suficiente para comprovar a efetiva caracterização da onerosidade excessiva alegada. III - DISPOSITIVO Ante o exposto, e por tudo mais que dos autos consta, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados por CARINE JAMILE FEITOSA DA SILVA MAIA em face de GMAC ADMINISTRADORA DE CONSÓRCIOS LTDA., MAPFRE SEGUROS GERAIS S.A. e BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A., fazendo-o com fundamento no art. 487, I do Código de Processo Civil. Em consequência, JULGO EXTINTO o processo com resolução do mérito. CONDENO a autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 10% sobre o valor da causa para cada um dos réus, com base no art. 85, §2º do CPC, considerando a complexidade da demanda e o trabalho desenvolvido pelos patronos. Todavia, considerando que a autora é beneficiária da justiça gratuita, a exigibilidade das verbas de sucumbência fica SUSPENSA nos termos do art. 98, §3º do CPC. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Transitada em julgado, ARQUIVEM-SE os autos, observadas as formalidades legais. Serve cópia autêntica do(a) presente como mandado, ofício e termo, com vistas ao célere cumprimento das comunicações processuais e providências determinadas. Barreiras - BA, datado e assinado eletronicamente. José Mendes Lima Aguiar Juiz Auxiliar (Dec. Jud. 802/2024)

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