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Processo nº 5739373-13.2024.8.09.0011

ID: 334873784

Tribunal: TJGO Órgão: 10ª Câmara Cível Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 5739373-13.2024.8.09.0011

Data de Disponibilização: 25/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

SANEAMENTO DE GOIAS S.A.

DECISÃO MONOCRÁTICA

Advogados:

RAFAELLA BARBOSA COELHO PEIXOTO

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PAULO EUGENIO DE CASTRO POZZOBOM

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PODER JUDICIÁRIO Tribunal de Justiça do Estado de Goiás 10ª Câmara Cível Gabinete do Desembargador Silvânio Divino de Alvarenga gab.sdalvarenga@tjgo.jus.b APELAÇÃO CÍVEL N. 573… PODER JUDICIÁRIO Tribunal de Justiça do Estado de Goiás 10ª Câmara Cível Gabinete do Desembargador Silvânio Divino de Alvarenga gab.sdalvarenga@tjgo.jus.b APELAÇÃO CÍVEL N. 5739373-13.2024.8.09.0011 COMARCA DE APARECIDA DE GOIÂNIA APELANTE: SANEAMENTO DE GOIAS S.A. APELADO: CLEITON SOARES SILVA RELATOR: SILVÂNIO DIVINO DE ALVARENGA Direito Civil e do Consumidor. Apelação Cível. Ação Indenizatória por Danos Morais Decorrentes de Interrupção Prolongada no Fornecimento de Água. Serviço Essencial. Dano Moral in re ipsa. Legitimidade do Consumidor Fático. Valor Indenizatório Mantido. Recurso Desprovido.I. Caso em exame1. Apelação cível interposta por Saneamento de Goiás S.A. (SANEAGO) contra sentença que julgou parcialmente procedente pedido de indenização por danos morais, em razão da interrupção no fornecimento de água em sua residência entre 09/07/2024 e 16/07/2024, afetando seis pessoas, inclusive um bebê. A sentença fixou indenização no valor de R$ 3.000,00.II. Questão em discussão2. Há duas questões em discussão: (i) saber se o recorrido, não sendo titular da fatura, possui legitimidade ativa para postular indenização por falha na prestação de serviço essencial; e (ii) saber se a interrupção prolongada no fornecimento de água configura dano moral indenizável, ainda que decorrente de situação emergencial.III. Razões de decidir3. O recorrido é consumidor fático, residindo no imóvel afetado e utilizando o serviço, o que lhe confere legitimidade ativa nos termos dos arts. 2º e 17 do CDC.4. A interrupção prolongada de serviço essencial, como o fornecimento de água, por sete dias consecutivos, gera dano moral presumido (in re ipsa), sendo irrelevante a apresentação de laudos técnicos para sua caracterização.5. A SANEAGO não apresentou prova robusta de caso fortuito ou força maior, tampouco demonstrou atuação tempestiva e eficaz para mitigar os danos.6. O valor de R$ 3.000,00 mostra-se proporcional, razoável e compatível com a jurisprudência do Tribunal.7. Honorários advocatícios majorados para 12% sobre o valor da causa, conforme jurisprudência do STJ (Tema 1.076).IV. Dispositivo e tese8. Recurso conhecido e desprovido. Sentença mantida, com majoração dos honorários.Tese de julgamento: “1. O consumidor fático possui legitimidade ativa para pleitear indenização decorrente da má prestação de serviço público essencial. 2. A interrupção prolongada e não justificada no fornecimento de água configura falha na prestação do serviço e enseja reparação por dano moral in re ipsa.”Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 37, § 6º; CDC, arts. 2º, 14, 17, 22; CPC, art. 85, § 2º.Jurisprudência relevante citada: TJ-GO, Súmula nº 32; TJ-PE, Apelação Cível nº 00016213220188172110, Rel. Des. Raimundo Nonato; TJ-MG, Apelação Cível nº 50033324420248130313, Rel. Des. Richardson Xavier Brant; STJ, AgInt nos EDcl no AREsp 1336265/SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze. DECISÃO MONOCRÁTICA Trata-se de APELAÇÃO CÍVEL interposta pela SANEAMENTO DE GOIAS S.A. contra sentença proferida pela juíza de direito da 4ª vara cível da comarca de Aparecida de Goiânia, Grymã Guerreiro Caetano Bento, nos autos da ação de indenização por danos morais e materiais proposta em seu desfavor por CLEITON SOARES SILVA. Ao ajuizar a ação de origem, Cleiton Soares Silva narrou a ocorrência de danos decorrentes da interrupção do serviço de saneamento básico em sua residência. Informou, na ocasião, que, acompanhado de sua família, composta por 06 (seis) pessoas, inclusive um bebê de cinco meses, experimentou a suspensão do fornecimento de água no período compreendido entre 09/07/2024 e 16/07/2024. Conforme alegado na petição inicial, a causa da interrupção teria sido o rompimento de um cano na via pública onde se localiza o imóvel. O autor afirmou que, após a realização de reparo inicial pela ré, o registro de água de sua residência foi desligado e, posteriormente, a via foi asfaltada, o que impossibilitou a reabertura do dispositivo pelos próprios moradores. Relatou, ainda, que, apesar de ter efetuado contatos diários com a ré, a qual, reiteradamente, prometia solucionar o problema no prazo de 24 (vinte quatro) horas, a interrupção persistiu por uma semana. Sustentou que, em razão da ausência de abastecimento, sua família enfrentou diversos transtornos, como a impossibilidade de realizar a higiene pessoal e o preparo de alimentos, sendo obrigada a buscar água em baldes nas residências de familiares e amigos, situação que lhes teria causado constrangimento e abalo moral.Diante desse contexto, pleiteou a condenação da Saneamento de Goiás S.A. ao pagamento de indenização por danos morais. Regularmente processado o feito, sobreveio sentença de mérito que julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais, nos seguintes termos (mov. 32): “Em casos tais, é usual que os fornecedores aleguem que o fato sofrido pelos autores se trate de mero aborrecimento, incapaz de gerar dano moral.Sob o pálio da figura do “mero aborrecimento”, tem-se admitido cada vez mais o abuso em desfavor dos consumidores, que são a parte de clara hipossuficiência e vulnerabilidade nas relações negociais.Todavia, destaco que não é porque a falta de zelo para com o interesse do consumidor se tornou banal que tal proceder deva ser suportado como vicissitude da vida diária.É nítido que a parte autora sofreu lesão em seu aspecto anímico, decorrente da preocupação, raiva e impotência diante da atitude claramente desidiosa da ré. E mais, embora a conduta não tenha sido comprovadamente eivada de dolo, é de patente culpa grave, que a ele se assemelha, merecendo reprovação à altura.Presentes os requisitos necessários à configuração da responsabilidade civil e do dever de indenizar pela parte ré, resta arbitrar um valor razoável a título de danos morais, levando em consideração a capacidade econômica das partes e a extensão do dano causado.Quanto ao dano, considera que o polo ativo teve o serviço prestado de forma precária.Observando os critérios acima expostos, e tomando por conta a capacidade econômica das partes, o grau de culpa e a extensão do dano, tenho por bem estipular em R$ 3.000,00 (três mil reais) o valor da indenização pelo dano moral.Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos iniciais para, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil:a) CONDENAR o Réu ao pagamento do valor de R$ 3.000,00 (três mil reais) o valor da indenização pelo dano moral.Ante o princípio da causalidade, condeno a parte requerida ao pagamento das custas processuais, e dos honorários advocatícios, os quais arbitro em 10% do valor da condenação, nos termos do artigo 85, § 2º, do Código de Processo Civil.” Rejeitados embargos de declaração (mov. 39). Inconformada, Saneamento Goiás S.A. interpôs o presente recurso de apelação (mov. 44), reiterando as teses sustentadas na contestação e nos embargos de declaração. Em sede preliminar, postulou o acolhimento da alegação de ilegitimidade ativa do apelado, sob o argumento de que este não comprovou residir no imóvel supostamente afetado, tratando-se o dano moral de direito personalíssimo, além de constar a fatura de água em nome de terceira pessoa. No mérito, defendeu a inexistência de falha na prestação do serviço, afirmando que a interrupção ocorreu em razão de manutenção emergência, especificamente, o rompimento de adutora, o que afastaria a caracterização de descontinuidade indevida no fornecimento. Ressaltou que não houve redução do consumo de água no período mencionado e que o Apelado não comprovou despesas extraordinárias decorrentes da suposta falha. Alegou, ainda, que o dano moral não seria presumido (in re ipsa) e que a inversão do ônus da prova não eximiria o autor de demonstrar minimamente o fato constitutivo de seu direito. De forma subsidiária, requereu a redução do valor arbitrado a título de indenização por danos morais para R$ 1.000,00, bem como a majoração dos honorários advocatícios no mesmo patamar, considerando o impacto financeiro na empresa pública estadual. A Apelante comprovou o recolhimento das custas recursais. O recorrido, Cleiton Soares Silva, apresentou contrarrazões (mov. 48), pugnando pelo desprovimento do recurso e pela manutenção integral da sentença. É o relatório. Passo à análise. 1. Do julgamento monocrático: Cumpre destacar que o feito comporta julgamento monocrático, nos termos do artigo 932 do Código de Processo Civil. 2. Da ilegitimidade ativa: A apelante, Saneamento Goiás S.A., ao interpor o recurso descrito em epígrafe, reitera a preliminar de ilegitimidade ativa do apelado, sustentando que este não teria comprovado ser o titular da conta de água do imóvel objeto da controvérsia, uma vez que o serviço estaria vinculado a terceiro, Sra. Maria da Conceição Silva. Defende, ainda, que o dano moral possui natureza personalíssima, não sendo extensível a quem não figure como usuário direto do contrato. Tal alegação, contudo, não merece prosperar e deve ser rejeitada. De plano, registro que no contexto das relações de consumo envolvendo a prestação de serviços públicos essenciais, como o fornecimento de água, a proteção conferida pelo ordenamento jurídico transcende o formalismo contratual. O Código de Defesa do Consumidor ao adotar a noção de “consumidor por equiparação” ou “consumidor de fato”, prevista no art. 2º, contempla como consumidor toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatária final. No caso em apreço, embora o apelado, Cleiton Soares Silva, não figure como titular cadastral da conta de água, restou comprovado que reside no imóvel e, por conseguinte, utiliza efetivamente o serviço. A interrupção do fornecimento de água, serviço essencial à vida e à dignidade da pessoa humana, atinge diretamente os residentes do imóvel, independentemente de quem conste como contratante junto à concessionária. Embora o dano moral possua natureza personalíssima, sua configuração decorre da violação a direitos da personalidade, como o bem-estar, a tranquilidade e a dignidade, os quais restam notoriamente afetados pela privação de recurso tão fundamental. Assim, a ausência de titularidade formal da conta não constitui óbice ao pleito indenizatório quando demonstrado o prejuízo concreto e direto experimentado por quem depende do serviço para a satisfação de suas necessidades básicas. Sirvo-me do seguinte julgado para melhor exemplificar o entendimento dos Tribunais pátrios a respeito da legitimidade referida: “(…) O entendimento restritivo adotado na sentença recorrida não se alinha à jurisprudência consolidada do STJ e dos Tribunais estaduais, que reconhecem a legitimidade do consumidor fático para discutir a prestação de serviços essenciais. 5. O Código de Defesa do Consumidor ( CDC) ampara a legitimidade do usuário direto do serviço, conforme os arts . 2º e 17, que ampliam o conceito de consumidor para abranger aqueles que, de fato, sofrem os impactos da relação de consumo. 6. A negativa da concessionária em reconhecer a legitimidade da consumidora fática viola os princípios da boa-fé objetiva e da vulnerabilidade do consumidor, além da obrigação de continuidade dos serviços essenciais prevista no art. 22 do CDC. (TJ-PE - APELAÇÃO CÍVEL: 00016213220188172110, Relator.: RAIMUNDO NONATO DE SOUZA BRAID FILHO, Data de Julgamento: 08/04/2025, Gabinete do Des. Stênio José de Sousa Neiva Coêlho (4ª CC). Tal orientação é relevante, pois, ao afirmar a natureza pessoal da obrigação, reconhece-se, por consequência, a legitimidade de quem efetivamente usufrui do serviço e sofre os efeitos de sua inadequada prestação. A petição inicial, ao indicar o endereço do Apelado e a composição familiar no local, inclusive com menção à presença de um recém-nascido, reforça a condição do recorrido como destinatário final do serviço prestado. Outrossim, a qualificação do apelado na petição inicial, aliada à narrativa fática e aos documentos juntados aos autos, evidencia de forma suficiente o vínculo com o bem. Destacam-se, nesse contexto, a procuração assinada por Cleiton Soares Silva e a declaração de hipossuficiência, ambas indicando como endereço residencial o imóvel situado no Conjunto Madre Germana, em Aparecida de Goiânia, local onde ocorreu a interrupção. Ressalte-se, ademais, que eventual controvérsia acerca da autenticidade das assinaturas já foi devidamente superada na instância de origem. Dessa forma, é inequívoco que o apelado, na condição de residente e usuário de fato do serviço público essencial, detém legitimidade ativa para pleitear reparação pelos danos que a ele foram causados. A ausência de titularidade formal da conta de água não pode servir de subterfúgio para afastar a responsabilidade da concessionária diante da falha na prestação do serviço, especialmente quando demonstrado que a família do recorrido dependia integralmente do fornecimento para a manutenção de condições mínimas de existência digna. Ante o exposto, rejeita-se a preliminar de ilegitimidade ativa, mantendo-se hígida a sentença recorrida nesse ponto. 3. Do mérito recursal: A recorrente sustenta não ter havido falha na prestação do serviço, afirmando que a interrupção no abastecimento de água decorreu do rompimento de um cano na via pública, configurando situação emergencial, e que todas as providências para o reparo foram adotadas em tempo razoável. Para justificar a inexistência de descontinuidade no fornecimento, invoca o art. 6º, § 3º, da Lei nº 8.987/1995 e o art. 40 da Lei nº 11.445/2007. Argumenta, ainda, que o histórico de consumo da unidade não demonstrou redução significativa e que a ausência de reservatório na residência, em desacordo com a NBR 5626/1998 e a Resolução nº 009/2014 da AGR, caracterizaria culpa exclusiva do consumidor, afastando sua responsabilidade. Tais alegações, contudo, não se revelam convincentes nem suficientes para infirmar a conclusão sentencial. A Apelante também afirma não haver comprovação do dano moral, sustentando que este não seria in re ipsa e que os vídeos apresentados pelo Apelado seriam insuficientes, por carecerem de elementos complementares, como laudos psicológicos ou comprovantes de gastos. Subsidiariamente, requer, caso mantida a condenação, a redução do valor da indenização para R$ 1.000,00 por autor, bem como a fixação dos honorários advocatícios no mesmo montante, sob o argumento de que se trata de patrimônio público da SANEAGO. Contudo, em sentido contrário às alegações da Apelante, é pacífico o entendimento jurisprudencial no sentido de que o dano moral decorrente da interrupção prolongada de serviços públicos essenciais, como o fornecimento de água, é presumido (in re ipsa). Isso significa que a própria privação do serviço, por tempo considerável, já configura lesão à dignidade do consumidor, dispensando a comprovação de sofrimento psicológico ou prejuízos materiais específicos, por extrapolar o mero aborrecimento cotidiano. Nesse sentido, os seguintes julgados: EMENTA: DIREITO CIVIL E ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO INDENIZATÓRIA POR DANOS MORAIS. CORTE INDEVIDO NO FORNECIMENTO DE ÁGUA . SERVIÇO ESSENCIAL. DANO MORAL CONFIGURADO. DESPROVIMENTO. 1 . Apelação cível interposta contra sentença que condenou a concessionária de serviço público ao pagamento de R$ 7.000,00 a título de indenização por danos morais, em razão do corte indevido do fornecimento de água na residência do autor. 2. A questão consiste em verificar se o corte no fornecimento de água caracteriza danos morais indenizáveis e se o valor fixado está adequado . 3. A interrupção indevida do fornecimento de água, bem essencial, em duas ocasiões, sem justificativa plausível, causou transtornos e abalos ao autor, configurando o dano moral. 4. O valor da indenização fixado em R$ 7 .000,00 atende aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, considerando o duplo corte indevido. 5. Recurso desprovido. (TJ-MG - Apelação Cível: 50033324420248130313, Relator.: Des .(a) Richardson Xavier Brant (JD Convocado), Data de Julgamento: 01/11/2024, Câmaras Cíveis / 5ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 01/11/2024) CONSUMIDOR. FORNECIMENTO DE ÁGUA. Hipótese em que os consumidores demonstraram a indevida sustação de serviço essencial, de matriz contínua. Falha na prestação . Responsabilidade objetiva da SABESP, que admitiu certa interrupção de fornecimento. Inversão do ônus da prova. Dano moral in re ipsa caracterizado. Teoria do desvio produtivo . Reparação moral elevada para R$ 16.000,00, sendo R$ 8.000,00 para cada autor, considerando a demora na solução do problema. Razoabilidade, de acordo com os critérios regularmente adotados por esta Corte em casos análogos . Recurso provido em parte. (TJ-SP - AC: 10058325320208260177 SP 1005832-53.2020.8 .26.0177, Relator.: Ferreira da Cruz, Data de Julgamento: 07/11/2022, 28ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 07/11/2022) Embora o Superior Tribunal de Justiça tenha atenuado esse entendimento em hipóteses excepcionais, como no REsp 1.705.314/RS, que tratava de interrupção provocada por evento climático severo, prevalece a orientação de que a descontinuidade injustificada e prolongada de serviço essencial enseja reparação por dano moral. A ausência de fornecimento de água por 07 (sete) dias consecutivos, em imóvel habitado por 06 (seis) pessoas, inclusive um recém-nascido, impõe evidente sofrimento, preocupação e frustração de necessidades básicas, como higiene, alimentação e limpeza. Trata-se, portanto, de circunstância que, por sua própria gravidade, configura dano presumido, sendo desnecessária a juntada de laudos técnicos ou recibos para fins indenizatórios. No caso em exame, verificou-se que a interrupção foi prolongada e que o usuário mantinha-se adimplente. Assim, a sentença impugnada agiu corretamente ao diferenciar a situação analisada de casos em que a suspensão do serviço foi prontamente solucionada, fundamentando a condenação na essencialidade da prestação e na extensão da interrupção, fatores suficientes para configurar o dano moral A responsabilidade pela adequada gestão dos recursos é da própria concessionária, não sendo admissível que a coletividade arque com os prejuízos decorrentes de falhas reiteradas na prestação de serviços essenciais. Destaca-se que, oportunamente, que o apelado narrou, de forma minuciosa, os transtornos enfrentados, como a necessidade de buscar água em outras residências, o que reforça a gravidade da situação. Por sua vez, a SANEAGO não apresentou provas robustas de que o serviço foi restabelecido em prazo razoável, tampouco de que tenha adotado medidas eficazes para mitigar os danos durante o período da interrupção. Embora a Apelante tenha juntado registros de atendimento e laudos técnicos que atestam a existência de vazamentos e a realização de reparos (mov. 21), tais documentos não são suficientes para eximi-la da responsabilidade pelo atraso no restabelecimento do serviço. A responsabilidade da SANEAGO, como concessionária de serviço público, é objetiva, nos termos do art. 37, § 6º, da Constituição Federal e do art. 14 do CDC, bastando a demonstração do dano e do nexo causal. A excludente de responsabilidade por caso fortuito ou força maior exige prova de que o evento foi imprevisível, inevitável e que não houve omissão da empresa quanto às medidas de prevenção e contenção dos prejuízos, o que não se verifica nos autos. Em relação ao valor da indenização, a quantia fixada em R$ 3.000,00 (três mil reais) pelo juízo a quo mostra-se adequada e proporcional, considerando os transtornos suportados, a capacidade econômica da concessionária e o caráter pedagógico da condenação. A indenização por danos morais não visa ao enriquecimento do ofendido, mas sim à compensação pelo sofrimento vivenciado e à prevenção de práticas lesivas futuras. O montante arbitrado reflete a gravidade da falha, a essencialidade do serviço interrompido e a condição da empresa, que, apesar de estatal, tem o dever de assegurar a prestação contínua e eficiente de serviços públicos. Ademais, é sabido que a reforma da verba indenizatória deve obedecer o seguinte verbete sumulado por este Tribunal de Justiça: “Súmula n. 32, TJ/GO: A verba indenizatória do dano moral somente será modificada se não atendidos pela sentença os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade na fixação do valor da condenação.” Assim, tendo em vista que o valor de R$ 3.000,00 (três mil reais) encontra respaldo nos parâmetros adotados por este Tribunal em casos análogos, revelando-se compatível com a jurisprudência e não ofendendo os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, resta imperiosa sua manutenção. É importante destacar, por fim, o caráter essencial do serviço de saneamento básico, em especial o fornecimento de água potável, indispensável à vida e à dignidade humana, sendo a continuidade princípio que deve reger a atividade da recorrente, nos termos do artigo 22 do Código de Defesa do Consumidor, o qual dispõe impõe aos prestadores de serviços públicos o dever de garantir serviços "adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos". Ainda que a legislação admita interrupções em situações emergenciais ou para reparos, tais interrupções devem ser pontuais e resolvidas no menor tempo possível. No caso em análise, a interrupção perdurou de 09/07/2024 a 16/07/2024, período absolutamente desarrazoado, sobretudo diante da ausência de comunicação prévia eficaz e de medidas alternativas de abastecimento emergencial. No que diz respeito ao argumento de que o consumo da unidade não apresentou queda, destaca-se que a medição mensal pode não refletir fielmente o impacto de uma interrupção parcial de 07 (sete) dias, sobretudo se houve consumo nos demais dias do mês ou se a medição foi estimada. Por fim, quanto à tese de culpa exclusiva do consumidor por não possuir reservatório, ainda que as normas técnicas recomendem tal instalação, essa ausência não afasta a responsabilidade da concessionária por falhas na prestação do serviço. O reservatório é uma medida complementar, não um requisito que exonere a empresa de seu dever de assegurar o abastecimento contínuo. A interrupção total por período prolongado, como no presente caso, configura falha grave que não pode ser imputada ao consumidor. Diante do exposto, os argumentos da recorrente não se sustentam frente ao conjunto probatório e às normas aplicáveis. A interrupção prolongada do fornecimento de água constitui falha na prestação do serviço, gerando responsabilidade objetiva da concessionária, sendo irrelevantes as alegações de caso fortuito ou culpa exclusiva do consumidor diante da essencialidade do serviço e da extensão da privação. 4. Da verba sucumbencial: Por fim, quanto aos honorários advocatícios, a sentença de primeiro grau os fixou em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, que foi de R$ 3.000,00 (três mil reais). Todavia, diante do valor irrisório da condenação, o qual resultaria em verba honorária irrisória e desproporcional ao trabalho desempenhado pelo patrono da parte autora, impõe-se a aplicação do entendimento consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça no Tema Repetitivo nº 1.076. Veja-se: “Tese firmada, tema 1.076 do STJ: i) A fixação dos honorários por apreciação equitativa não é permitida quando os valores da condenação, da causa ou o proveito econômico da demanda forem elevados. É obrigatória nesses casos a observância dos percentuais previstos nos §§ 2º ou 3º do artigo 85 do CPC - a depender da presença da Fazenda Pública na lide -, os quais serão subsequentemente calculados sobre o valor: (a) da condenação; ou (b) do proveito econômico obtido; ou (c) do valor atualizado da causa. ii) Apenas se admite arbitramento de honorários por equidade quando, havendo ou não condenação: (a) o proveito econômico obtido pelo vencedor for inestimável ou irrisório; ou (b) o valor da causa for muito baixo. No caso em apreço, a adoção do valor da causa como critério, fixado em R$ 40.000,00 (quarenta mil reais), revela-se mais compatível com a complexidade da demanda, a dignidade do exercício profissional e a vedação à desvalorização dos honorários advocatícios. Reforço, em arremate, que, conforme entendimento assentado pela jurisprudência, os honorários advocatícios, enquanto consectários legais da condenação principal, possuem natureza de ordem pública, podendo ser revistos a qualquer momento e até mesmo de ofício, sem que isso configure reformatio in pejus (STJ - AgInt nos EDcl no AREsp: 1336265 SP 2018/0189203-8, Relator.: Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, Data de Julgamento: 25/03/2019, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 28/03/2019) 5. Do dispositivo: Diante do exposto, conheço do recurso de apelação e nego-lhe provimento, mantendo inalterada a sentença combatida por estes e por seus próprios fundamentos. Por fim, de ofício, reformo a sentença quanto aos honorários advocatícios, os quais fixo, considerada a majoração em sede recursal, em 12% (doze por cento) sobre o valor atualizado da causa, nos termos da fundamentação supra. É como decido. Após o trânsito em julgado, remetam-se os autos à origem, para os fins de mister. Intimem-se. Cumpra-se. Goiânia, datado e assinado digitalmente. DES. SILVÂNIO DIVINO DE ALVARENGA RELATOR114/cl

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Processo nº 5739373-13.2024.8.09.0011

ID: 334873818

Tribunal: TJGO Órgão: 10ª Câmara Cível Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 5739373-13.2024.8.09.0011

Data de Disponibilização: 25/07/2025

Polo Ativo:

CLEITON SOARES SILVA

Polo Passivo:

DECISÃO MONOCRÁTICA

Advogados:

RAPHAEL DA ROCHA PEREIRA DIAS

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BRUNA SIMÕES BARROS

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PODER JUDICIÁRIO Tribunal de Justiça do Estado de Goiás 10ª Câmara Cível Gabinete do Desembargador Silvânio Divino de Alvarenga gab.sdalvarenga@tjgo.jus.b APELAÇÃO CÍVEL N. 573… PODER JUDICIÁRIO Tribunal de Justiça do Estado de Goiás 10ª Câmara Cível Gabinete do Desembargador Silvânio Divino de Alvarenga gab.sdalvarenga@tjgo.jus.b APELAÇÃO CÍVEL N. 5739373-13.2024.8.09.0011 COMARCA DE APARECIDA DE GOIÂNIA APELANTE: SANEAMENTO DE GOIAS S.A. APELADO: CLEITON SOARES SILVA RELATOR: SILVÂNIO DIVINO DE ALVARENGA Direito Civil e do Consumidor. Apelação Cível. Ação Indenizatória por Danos Morais Decorrentes de Interrupção Prolongada no Fornecimento de Água. Serviço Essencial. Dano Moral in re ipsa. Legitimidade do Consumidor Fático. Valor Indenizatório Mantido. Recurso Desprovido.I. Caso em exame1. Apelação cível interposta por Saneamento de Goiás S.A. (SANEAGO) contra sentença que julgou parcialmente procedente pedido de indenização por danos morais, em razão da interrupção no fornecimento de água em sua residência entre 09/07/2024 e 16/07/2024, afetando seis pessoas, inclusive um bebê. A sentença fixou indenização no valor de R$ 3.000,00.II. Questão em discussão2. Há duas questões em discussão: (i) saber se o recorrido, não sendo titular da fatura, possui legitimidade ativa para postular indenização por falha na prestação de serviço essencial; e (ii) saber se a interrupção prolongada no fornecimento de água configura dano moral indenizável, ainda que decorrente de situação emergencial.III. Razões de decidir3. O recorrido é consumidor fático, residindo no imóvel afetado e utilizando o serviço, o que lhe confere legitimidade ativa nos termos dos arts. 2º e 17 do CDC.4. A interrupção prolongada de serviço essencial, como o fornecimento de água, por sete dias consecutivos, gera dano moral presumido (in re ipsa), sendo irrelevante a apresentação de laudos técnicos para sua caracterização.5. A SANEAGO não apresentou prova robusta de caso fortuito ou força maior, tampouco demonstrou atuação tempestiva e eficaz para mitigar os danos.6. O valor de R$ 3.000,00 mostra-se proporcional, razoável e compatível com a jurisprudência do Tribunal.7. Honorários advocatícios majorados para 12% sobre o valor da causa, conforme jurisprudência do STJ (Tema 1.076).IV. Dispositivo e tese8. Recurso conhecido e desprovido. Sentença mantida, com majoração dos honorários.Tese de julgamento: “1. O consumidor fático possui legitimidade ativa para pleitear indenização decorrente da má prestação de serviço público essencial. 2. A interrupção prolongada e não justificada no fornecimento de água configura falha na prestação do serviço e enseja reparação por dano moral in re ipsa.”Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 37, § 6º; CDC, arts. 2º, 14, 17, 22; CPC, art. 85, § 2º.Jurisprudência relevante citada: TJ-GO, Súmula nº 32; TJ-PE, Apelação Cível nº 00016213220188172110, Rel. Des. Raimundo Nonato; TJ-MG, Apelação Cível nº 50033324420248130313, Rel. Des. Richardson Xavier Brant; STJ, AgInt nos EDcl no AREsp 1336265/SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze. DECISÃO MONOCRÁTICA Trata-se de APELAÇÃO CÍVEL interposta pela SANEAMENTO DE GOIAS S.A. contra sentença proferida pela juíza de direito da 4ª vara cível da comarca de Aparecida de Goiânia, Grymã Guerreiro Caetano Bento, nos autos da ação de indenização por danos morais e materiais proposta em seu desfavor por CLEITON SOARES SILVA. Ao ajuizar a ação de origem, Cleiton Soares Silva narrou a ocorrência de danos decorrentes da interrupção do serviço de saneamento básico em sua residência. Informou, na ocasião, que, acompanhado de sua família, composta por 06 (seis) pessoas, inclusive um bebê de cinco meses, experimentou a suspensão do fornecimento de água no período compreendido entre 09/07/2024 e 16/07/2024. Conforme alegado na petição inicial, a causa da interrupção teria sido o rompimento de um cano na via pública onde se localiza o imóvel. O autor afirmou que, após a realização de reparo inicial pela ré, o registro de água de sua residência foi desligado e, posteriormente, a via foi asfaltada, o que impossibilitou a reabertura do dispositivo pelos próprios moradores. Relatou, ainda, que, apesar de ter efetuado contatos diários com a ré, a qual, reiteradamente, prometia solucionar o problema no prazo de 24 (vinte quatro) horas, a interrupção persistiu por uma semana. Sustentou que, em razão da ausência de abastecimento, sua família enfrentou diversos transtornos, como a impossibilidade de realizar a higiene pessoal e o preparo de alimentos, sendo obrigada a buscar água em baldes nas residências de familiares e amigos, situação que lhes teria causado constrangimento e abalo moral.Diante desse contexto, pleiteou a condenação da Saneamento de Goiás S.A. ao pagamento de indenização por danos morais. Regularmente processado o feito, sobreveio sentença de mérito que julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais, nos seguintes termos (mov. 32): “Em casos tais, é usual que os fornecedores aleguem que o fato sofrido pelos autores se trate de mero aborrecimento, incapaz de gerar dano moral.Sob o pálio da figura do “mero aborrecimento”, tem-se admitido cada vez mais o abuso em desfavor dos consumidores, que são a parte de clara hipossuficiência e vulnerabilidade nas relações negociais.Todavia, destaco que não é porque a falta de zelo para com o interesse do consumidor se tornou banal que tal proceder deva ser suportado como vicissitude da vida diária.É nítido que a parte autora sofreu lesão em seu aspecto anímico, decorrente da preocupação, raiva e impotência diante da atitude claramente desidiosa da ré. E mais, embora a conduta não tenha sido comprovadamente eivada de dolo, é de patente culpa grave, que a ele se assemelha, merecendo reprovação à altura.Presentes os requisitos necessários à configuração da responsabilidade civil e do dever de indenizar pela parte ré, resta arbitrar um valor razoável a título de danos morais, levando em consideração a capacidade econômica das partes e a extensão do dano causado.Quanto ao dano, considera que o polo ativo teve o serviço prestado de forma precária.Observando os critérios acima expostos, e tomando por conta a capacidade econômica das partes, o grau de culpa e a extensão do dano, tenho por bem estipular em R$ 3.000,00 (três mil reais) o valor da indenização pelo dano moral.Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos iniciais para, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil:a) CONDENAR o Réu ao pagamento do valor de R$ 3.000,00 (três mil reais) o valor da indenização pelo dano moral.Ante o princípio da causalidade, condeno a parte requerida ao pagamento das custas processuais, e dos honorários advocatícios, os quais arbitro em 10% do valor da condenação, nos termos do artigo 85, § 2º, do Código de Processo Civil.” Rejeitados embargos de declaração (mov. 39). Inconformada, Saneamento Goiás S.A. interpôs o presente recurso de apelação (mov. 44), reiterando as teses sustentadas na contestação e nos embargos de declaração. Em sede preliminar, postulou o acolhimento da alegação de ilegitimidade ativa do apelado, sob o argumento de que este não comprovou residir no imóvel supostamente afetado, tratando-se o dano moral de direito personalíssimo, além de constar a fatura de água em nome de terceira pessoa. No mérito, defendeu a inexistência de falha na prestação do serviço, afirmando que a interrupção ocorreu em razão de manutenção emergência, especificamente, o rompimento de adutora, o que afastaria a caracterização de descontinuidade indevida no fornecimento. Ressaltou que não houve redução do consumo de água no período mencionado e que o Apelado não comprovou despesas extraordinárias decorrentes da suposta falha. Alegou, ainda, que o dano moral não seria presumido (in re ipsa) e que a inversão do ônus da prova não eximiria o autor de demonstrar minimamente o fato constitutivo de seu direito. De forma subsidiária, requereu a redução do valor arbitrado a título de indenização por danos morais para R$ 1.000,00, bem como a majoração dos honorários advocatícios no mesmo patamar, considerando o impacto financeiro na empresa pública estadual. A Apelante comprovou o recolhimento das custas recursais. O recorrido, Cleiton Soares Silva, apresentou contrarrazões (mov. 48), pugnando pelo desprovimento do recurso e pela manutenção integral da sentença. É o relatório. Passo à análise. 1. Do julgamento monocrático: Cumpre destacar que o feito comporta julgamento monocrático, nos termos do artigo 932 do Código de Processo Civil. 2. Da ilegitimidade ativa: A apelante, Saneamento Goiás S.A., ao interpor o recurso descrito em epígrafe, reitera a preliminar de ilegitimidade ativa do apelado, sustentando que este não teria comprovado ser o titular da conta de água do imóvel objeto da controvérsia, uma vez que o serviço estaria vinculado a terceiro, Sra. Maria da Conceição Silva. Defende, ainda, que o dano moral possui natureza personalíssima, não sendo extensível a quem não figure como usuário direto do contrato. Tal alegação, contudo, não merece prosperar e deve ser rejeitada. De plano, registro que no contexto das relações de consumo envolvendo a prestação de serviços públicos essenciais, como o fornecimento de água, a proteção conferida pelo ordenamento jurídico transcende o formalismo contratual. O Código de Defesa do Consumidor ao adotar a noção de “consumidor por equiparação” ou “consumidor de fato”, prevista no art. 2º, contempla como consumidor toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatária final. No caso em apreço, embora o apelado, Cleiton Soares Silva, não figure como titular cadastral da conta de água, restou comprovado que reside no imóvel e, por conseguinte, utiliza efetivamente o serviço. A interrupção do fornecimento de água, serviço essencial à vida e à dignidade da pessoa humana, atinge diretamente os residentes do imóvel, independentemente de quem conste como contratante junto à concessionária. Embora o dano moral possua natureza personalíssima, sua configuração decorre da violação a direitos da personalidade, como o bem-estar, a tranquilidade e a dignidade, os quais restam notoriamente afetados pela privação de recurso tão fundamental. Assim, a ausência de titularidade formal da conta não constitui óbice ao pleito indenizatório quando demonstrado o prejuízo concreto e direto experimentado por quem depende do serviço para a satisfação de suas necessidades básicas. Sirvo-me do seguinte julgado para melhor exemplificar o entendimento dos Tribunais pátrios a respeito da legitimidade referida: “(…) O entendimento restritivo adotado na sentença recorrida não se alinha à jurisprudência consolidada do STJ e dos Tribunais estaduais, que reconhecem a legitimidade do consumidor fático para discutir a prestação de serviços essenciais. 5. O Código de Defesa do Consumidor ( CDC) ampara a legitimidade do usuário direto do serviço, conforme os arts . 2º e 17, que ampliam o conceito de consumidor para abranger aqueles que, de fato, sofrem os impactos da relação de consumo. 6. A negativa da concessionária em reconhecer a legitimidade da consumidora fática viola os princípios da boa-fé objetiva e da vulnerabilidade do consumidor, além da obrigação de continuidade dos serviços essenciais prevista no art. 22 do CDC. (TJ-PE - APELAÇÃO CÍVEL: 00016213220188172110, Relator.: RAIMUNDO NONATO DE SOUZA BRAID FILHO, Data de Julgamento: 08/04/2025, Gabinete do Des. Stênio José de Sousa Neiva Coêlho (4ª CC). Tal orientação é relevante, pois, ao afirmar a natureza pessoal da obrigação, reconhece-se, por consequência, a legitimidade de quem efetivamente usufrui do serviço e sofre os efeitos de sua inadequada prestação. A petição inicial, ao indicar o endereço do Apelado e a composição familiar no local, inclusive com menção à presença de um recém-nascido, reforça a condição do recorrido como destinatário final do serviço prestado. Outrossim, a qualificação do apelado na petição inicial, aliada à narrativa fática e aos documentos juntados aos autos, evidencia de forma suficiente o vínculo com o bem. Destacam-se, nesse contexto, a procuração assinada por Cleiton Soares Silva e a declaração de hipossuficiência, ambas indicando como endereço residencial o imóvel situado no Conjunto Madre Germana, em Aparecida de Goiânia, local onde ocorreu a interrupção. Ressalte-se, ademais, que eventual controvérsia acerca da autenticidade das assinaturas já foi devidamente superada na instância de origem. Dessa forma, é inequívoco que o apelado, na condição de residente e usuário de fato do serviço público essencial, detém legitimidade ativa para pleitear reparação pelos danos que a ele foram causados. A ausência de titularidade formal da conta de água não pode servir de subterfúgio para afastar a responsabilidade da concessionária diante da falha na prestação do serviço, especialmente quando demonstrado que a família do recorrido dependia integralmente do fornecimento para a manutenção de condições mínimas de existência digna. Ante o exposto, rejeita-se a preliminar de ilegitimidade ativa, mantendo-se hígida a sentença recorrida nesse ponto. 3. Do mérito recursal: A recorrente sustenta não ter havido falha na prestação do serviço, afirmando que a interrupção no abastecimento de água decorreu do rompimento de um cano na via pública, configurando situação emergencial, e que todas as providências para o reparo foram adotadas em tempo razoável. Para justificar a inexistência de descontinuidade no fornecimento, invoca o art. 6º, § 3º, da Lei nº 8.987/1995 e o art. 40 da Lei nº 11.445/2007. Argumenta, ainda, que o histórico de consumo da unidade não demonstrou redução significativa e que a ausência de reservatório na residência, em desacordo com a NBR 5626/1998 e a Resolução nº 009/2014 da AGR, caracterizaria culpa exclusiva do consumidor, afastando sua responsabilidade. Tais alegações, contudo, não se revelam convincentes nem suficientes para infirmar a conclusão sentencial. A Apelante também afirma não haver comprovação do dano moral, sustentando que este não seria in re ipsa e que os vídeos apresentados pelo Apelado seriam insuficientes, por carecerem de elementos complementares, como laudos psicológicos ou comprovantes de gastos. Subsidiariamente, requer, caso mantida a condenação, a redução do valor da indenização para R$ 1.000,00 por autor, bem como a fixação dos honorários advocatícios no mesmo montante, sob o argumento de que se trata de patrimônio público da SANEAGO. Contudo, em sentido contrário às alegações da Apelante, é pacífico o entendimento jurisprudencial no sentido de que o dano moral decorrente da interrupção prolongada de serviços públicos essenciais, como o fornecimento de água, é presumido (in re ipsa). Isso significa que a própria privação do serviço, por tempo considerável, já configura lesão à dignidade do consumidor, dispensando a comprovação de sofrimento psicológico ou prejuízos materiais específicos, por extrapolar o mero aborrecimento cotidiano. Nesse sentido, os seguintes julgados: EMENTA: DIREITO CIVIL E ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO INDENIZATÓRIA POR DANOS MORAIS. CORTE INDEVIDO NO FORNECIMENTO DE ÁGUA . SERVIÇO ESSENCIAL. DANO MORAL CONFIGURADO. DESPROVIMENTO. 1 . Apelação cível interposta contra sentença que condenou a concessionária de serviço público ao pagamento de R$ 7.000,00 a título de indenização por danos morais, em razão do corte indevido do fornecimento de água na residência do autor. 2. A questão consiste em verificar se o corte no fornecimento de água caracteriza danos morais indenizáveis e se o valor fixado está adequado . 3. A interrupção indevida do fornecimento de água, bem essencial, em duas ocasiões, sem justificativa plausível, causou transtornos e abalos ao autor, configurando o dano moral. 4. O valor da indenização fixado em R$ 7 .000,00 atende aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, considerando o duplo corte indevido. 5. Recurso desprovido. (TJ-MG - Apelação Cível: 50033324420248130313, Relator.: Des .(a) Richardson Xavier Brant (JD Convocado), Data de Julgamento: 01/11/2024, Câmaras Cíveis / 5ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 01/11/2024) CONSUMIDOR. FORNECIMENTO DE ÁGUA. Hipótese em que os consumidores demonstraram a indevida sustação de serviço essencial, de matriz contínua. Falha na prestação . Responsabilidade objetiva da SABESP, que admitiu certa interrupção de fornecimento. Inversão do ônus da prova. Dano moral in re ipsa caracterizado. Teoria do desvio produtivo . Reparação moral elevada para R$ 16.000,00, sendo R$ 8.000,00 para cada autor, considerando a demora na solução do problema. Razoabilidade, de acordo com os critérios regularmente adotados por esta Corte em casos análogos . Recurso provido em parte. (TJ-SP - AC: 10058325320208260177 SP 1005832-53.2020.8 .26.0177, Relator.: Ferreira da Cruz, Data de Julgamento: 07/11/2022, 28ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 07/11/2022) Embora o Superior Tribunal de Justiça tenha atenuado esse entendimento em hipóteses excepcionais, como no REsp 1.705.314/RS, que tratava de interrupção provocada por evento climático severo, prevalece a orientação de que a descontinuidade injustificada e prolongada de serviço essencial enseja reparação por dano moral. A ausência de fornecimento de água por 07 (sete) dias consecutivos, em imóvel habitado por 06 (seis) pessoas, inclusive um recém-nascido, impõe evidente sofrimento, preocupação e frustração de necessidades básicas, como higiene, alimentação e limpeza. Trata-se, portanto, de circunstância que, por sua própria gravidade, configura dano presumido, sendo desnecessária a juntada de laudos técnicos ou recibos para fins indenizatórios. No caso em exame, verificou-se que a interrupção foi prolongada e que o usuário mantinha-se adimplente. Assim, a sentença impugnada agiu corretamente ao diferenciar a situação analisada de casos em que a suspensão do serviço foi prontamente solucionada, fundamentando a condenação na essencialidade da prestação e na extensão da interrupção, fatores suficientes para configurar o dano moral A responsabilidade pela adequada gestão dos recursos é da própria concessionária, não sendo admissível que a coletividade arque com os prejuízos decorrentes de falhas reiteradas na prestação de serviços essenciais. Destaca-se que, oportunamente, que o apelado narrou, de forma minuciosa, os transtornos enfrentados, como a necessidade de buscar água em outras residências, o que reforça a gravidade da situação. Por sua vez, a SANEAGO não apresentou provas robustas de que o serviço foi restabelecido em prazo razoável, tampouco de que tenha adotado medidas eficazes para mitigar os danos durante o período da interrupção. Embora a Apelante tenha juntado registros de atendimento e laudos técnicos que atestam a existência de vazamentos e a realização de reparos (mov. 21), tais documentos não são suficientes para eximi-la da responsabilidade pelo atraso no restabelecimento do serviço. A responsabilidade da SANEAGO, como concessionária de serviço público, é objetiva, nos termos do art. 37, § 6º, da Constituição Federal e do art. 14 do CDC, bastando a demonstração do dano e do nexo causal. A excludente de responsabilidade por caso fortuito ou força maior exige prova de que o evento foi imprevisível, inevitável e que não houve omissão da empresa quanto às medidas de prevenção e contenção dos prejuízos, o que não se verifica nos autos. Em relação ao valor da indenização, a quantia fixada em R$ 3.000,00 (três mil reais) pelo juízo a quo mostra-se adequada e proporcional, considerando os transtornos suportados, a capacidade econômica da concessionária e o caráter pedagógico da condenação. A indenização por danos morais não visa ao enriquecimento do ofendido, mas sim à compensação pelo sofrimento vivenciado e à prevenção de práticas lesivas futuras. O montante arbitrado reflete a gravidade da falha, a essencialidade do serviço interrompido e a condição da empresa, que, apesar de estatal, tem o dever de assegurar a prestação contínua e eficiente de serviços públicos. Ademais, é sabido que a reforma da verba indenizatória deve obedecer o seguinte verbete sumulado por este Tribunal de Justiça: “Súmula n. 32, TJ/GO: A verba indenizatória do dano moral somente será modificada se não atendidos pela sentença os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade na fixação do valor da condenação.” Assim, tendo em vista que o valor de R$ 3.000,00 (três mil reais) encontra respaldo nos parâmetros adotados por este Tribunal em casos análogos, revelando-se compatível com a jurisprudência e não ofendendo os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, resta imperiosa sua manutenção. É importante destacar, por fim, o caráter essencial do serviço de saneamento básico, em especial o fornecimento de água potável, indispensável à vida e à dignidade humana, sendo a continuidade princípio que deve reger a atividade da recorrente, nos termos do artigo 22 do Código de Defesa do Consumidor, o qual dispõe impõe aos prestadores de serviços públicos o dever de garantir serviços "adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos". Ainda que a legislação admita interrupções em situações emergenciais ou para reparos, tais interrupções devem ser pontuais e resolvidas no menor tempo possível. No caso em análise, a interrupção perdurou de 09/07/2024 a 16/07/2024, período absolutamente desarrazoado, sobretudo diante da ausência de comunicação prévia eficaz e de medidas alternativas de abastecimento emergencial. No que diz respeito ao argumento de que o consumo da unidade não apresentou queda, destaca-se que a medição mensal pode não refletir fielmente o impacto de uma interrupção parcial de 07 (sete) dias, sobretudo se houve consumo nos demais dias do mês ou se a medição foi estimada. Por fim, quanto à tese de culpa exclusiva do consumidor por não possuir reservatório, ainda que as normas técnicas recomendem tal instalação, essa ausência não afasta a responsabilidade da concessionária por falhas na prestação do serviço. O reservatório é uma medida complementar, não um requisito que exonere a empresa de seu dever de assegurar o abastecimento contínuo. A interrupção total por período prolongado, como no presente caso, configura falha grave que não pode ser imputada ao consumidor. Diante do exposto, os argumentos da recorrente não se sustentam frente ao conjunto probatório e às normas aplicáveis. A interrupção prolongada do fornecimento de água constitui falha na prestação do serviço, gerando responsabilidade objetiva da concessionária, sendo irrelevantes as alegações de caso fortuito ou culpa exclusiva do consumidor diante da essencialidade do serviço e da extensão da privação. 4. Da verba sucumbencial: Por fim, quanto aos honorários advocatícios, a sentença de primeiro grau os fixou em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, que foi de R$ 3.000,00 (três mil reais). Todavia, diante do valor irrisório da condenação, o qual resultaria em verba honorária irrisória e desproporcional ao trabalho desempenhado pelo patrono da parte autora, impõe-se a aplicação do entendimento consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça no Tema Repetitivo nº 1.076. Veja-se: “Tese firmada, tema 1.076 do STJ: i) A fixação dos honorários por apreciação equitativa não é permitida quando os valores da condenação, da causa ou o proveito econômico da demanda forem elevados. É obrigatória nesses casos a observância dos percentuais previstos nos §§ 2º ou 3º do artigo 85 do CPC - a depender da presença da Fazenda Pública na lide -, os quais serão subsequentemente calculados sobre o valor: (a) da condenação; ou (b) do proveito econômico obtido; ou (c) do valor atualizado da causa. ii) Apenas se admite arbitramento de honorários por equidade quando, havendo ou não condenação: (a) o proveito econômico obtido pelo vencedor for inestimável ou irrisório; ou (b) o valor da causa for muito baixo. No caso em apreço, a adoção do valor da causa como critério, fixado em R$ 40.000,00 (quarenta mil reais), revela-se mais compatível com a complexidade da demanda, a dignidade do exercício profissional e a vedação à desvalorização dos honorários advocatícios. Reforço, em arremate, que, conforme entendimento assentado pela jurisprudência, os honorários advocatícios, enquanto consectários legais da condenação principal, possuem natureza de ordem pública, podendo ser revistos a qualquer momento e até mesmo de ofício, sem que isso configure reformatio in pejus (STJ - AgInt nos EDcl no AREsp: 1336265 SP 2018/0189203-8, Relator.: Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, Data de Julgamento: 25/03/2019, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 28/03/2019) 5. Do dispositivo: Diante do exposto, conheço do recurso de apelação e nego-lhe provimento, mantendo inalterada a sentença combatida por estes e por seus próprios fundamentos. Por fim, de ofício, reformo a sentença quanto aos honorários advocatícios, os quais fixo, considerada a majoração em sede recursal, em 12% (doze por cento) sobre o valor atualizado da causa, nos termos da fundamentação supra. É como decido. Após o trânsito em julgado, remetam-se os autos à origem, para os fins de mister. Intimem-se. Cumpra-se. Goiânia, datado e assinado digitalmente. DES. SILVÂNIO DIVINO DE ALVARENGA RELATOR114/cl

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